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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel 1

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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UUMM RROOMMAANNCCEE IIMMPPOOSSSSÍÍVVEELL BBYY

JACQUIE D’ALESSANDRO SÉRIE REGÊNCIA HISTÓRICA, 04

Disponibilização/Tradução/Pesquisa: Yuna, Gisa, Mare e Rosie

Revisão : Sandra Muller

Revisão Final e Formatação: Gabriela Martins

Projeto Revisoras Traduções

Este livro é dedicado com amor ao meu filho, Christopher. Obrigado por encher minha vida de música, fazer-

me rir e converter cada dia em uma grande aventura, inclusive esses dias sem passeios no Jardim Zoológico

nem ATV. Quero-te.

E como sempre, ao meu maravilhoso marido Joe, que não deixa de me animar. Se existisse um prêmio para o

Homem Mais Paciente, sem dúvida que tu o ganharias. Obrigado por me brindares sempre, com o teu apoio e

com o teu carinho. Já te disse hoje o quanto te amo?

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Argumento

Colin Oliver, o visconde Sutton, deixa sua amada casa rural para procurar uma esposa em Londres. Sem

dúvida, alguém bastante diferente de Madame Alexandra Larchmont: ela não está entre os da nobreza , mas é

bela como poucas, e também é uma cartomante que se dedica a jogar cartas nos salões da alta sociedade.

Entretanto, Colin tem boas razões para não tirar o olhar de cima dela...

Durante anos, as cartas preveniram Alexandra contra o desconhecido de cabelos escuros, que causará estragos

na sua vida, na noite em que o conheceu o seu primeiro pensamento foi fugir. Por desgraça, também acerta ao

ouvir a trama de um assassinato e, a única pessoa a quem pode recorrer é ao homem, que sabe que deveria

afastar-se, um homem que a observa com um olhar francamente ávido.

O que acontece quando um olhar apaixonado começa a brilhar no rosto de um homem perigoso?

AGRADECIMENTO

Gostaria de agradecer às pessoas que cito a seguir, por sua inestimável ajuda e apoio.

Às minhas editoras, Erica Tsang, e a todas as pessoas maravilhosas que trabalham no Avon/Harper Collins por

sua amabilidade e fôlego, e por contribuírem em fazer realidade os meus sonhos.

A meu agente Damaris Rowland, por sua fé e sabedoria. A Jenni Grizzle e a Wendy Etherington por me manter

com vida e estarem sempre dispostas a compartilhar uma garrafa de champanhe e um pedaço de bolo de

queijo

Também desejo agradecer a Sue Grimshaw, Kathy Baker, Kay e Jim Johnson, Kathy e Dick Guse, Leoa e Art

D'Alessandro, e a Michelle, Steve e Lindsey Grossman.

Um grande abraço a minhas amigas Connie Brockway, Marsha Canham, Virginia Henley, Jill Gregory, Sandy

Hingston, Julia London, Kathleen Givens, Sherri Browning e Julie Ortolon, assim como à autoras da série

Temptation.

Um agradecimento muito especial aos membros do Georgia Romance Writers.

E por último, obrigado a todas as maravilhosas leitoras que me escrevem, eu adoro ter notícias vossas!

Capítulo I

A festa anual de lorde e lady Malloran, promete ser este ano mais emocionante que nunca, já que contrataram para

entretenimento os serviços da misteriosa e solicitada cartomante, madame Larchmont. Dado que as previsões da madame

são estranhamente precisas, sua presença em qualquer festa garante o êxito da mesma. Também estará presente o visconde

Sutton, um bom partido, que acaba de retornar a Londres, depois de uma prolongada estadia em sua propriedade na

Cornualha e quem, segundo rumores, procura por uma esposa. Não seria delicioso que madame Larchmont dissesse com

quem, profetizam as cartas que vai casar-se?

DA PÁGINA DA SOCIEDADE DO LONDON TIMES.

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Alexandra Larchmont cravou em lady Miranda um olhar intenso que contribuía para dar maior

credibilidade às suas previsões. Dado que lady Miranda era a segunda prima da anfitriã de Alex, lady

Malloran, queria assegurar-se de que a jovem ficasse contente com a leitura de suas cartas.

—Embora adivinho pelas cartas e sua aura que sofreu no passado, seu presente está cheio de grandes

promessas, festas, jóias e fabulosos vestidos.

Os olhos de lady Miranda brilharam de alegria.

—Excelente. E meu futuro? —sussurrou, inclinando-se para Alex.

A moça estava a ponto de baixar o olhar para consultar as cartas, quando a apinhada multidão de

convidados da festa, se separou um pouco e sua atenção se viu atraída, pela visão de um homem alto e

moreno.

O pânico percorreu suas terminações nervosas, e seus músculos se retesaram, porque face aos quatro

anos transcorridos desde a última vez que o viu, o reconheceu imediatamente. Nas melhores circunstâncias

não seria um homem fácil de esquecer, e as circunstâncias de seu último encontro jamais poderiam descrever-

se como «melhores». Embora ignorasse seu nome, sua imagem estava gravada a fogo em sua memória.

Desejou com todas suas forças, que tivesse permanecido alí e não a quatro metros de distância. Se ele a

reconhecesse, destruiria tudo o que tanto tinha trabalhado.

Seu instinto gritava que fugisse, mas permaneceu onde estava. Como se estivesse apanhada em um horrível

pesadelo que avançava devagar, seu olhar vagou pela silhueta dele. Estava vestido de forma impecável, em

traje negro de etiqueta, e seu cabelo escuro brilhava, ao resplendor das dúzias de velas com tremelitante chama

que se encontravam na aranha pendurada no tecto. Levava na mão uma taça de champanhe , a jovem

estremeceu; passou as palmas húmidas das mãos pelos braços, enquanto recordava com todo detalhe a força

daquelas mãos grandes, que a agarraram e a impediram de escapar. Por necessidade, tinha aprendido desde

muito jovem a dominar os seus medos, mas aquele homem a tinha alarmado e acovardado, como ninguém o

tinha feito jamais, nem antes nem depois de seu único encontro.

As cartas a tinham avisado sobre ele —o estranho moreno com os olhos de uma intensa cor verde que faria

estragos em sua existência— anos antes que o visse pela primeira vez. As cartas também haviam previsto que

algum dia voltaria a vê-lo. Por desgraça, as cartas não a tinham preparado para que algum dia fosse aquele

preciso momento.

Elevou a vista e observou com uma tremenda sensação de alarme, como o olhar dele percorria devagar a

multidão. Em questão de segundos esse olhar cairia sobre ela.

—Sente-se bem, madame Larchmont? Ficou pálida como a cera.

A voz de lady Miranda obrigou Alex a afastar o olhar do homem. A jovem a observava com os olhos

entreabertos. Antes de responder, Alex procurou em seu interior essa expressão inescrutável, que tão bons

resultados lhe tinha dado sempre.

—Estou um pouco acalorada, coisa que por desgraça interrompe minha energia psíquica — disse com voz bem

modulada, em um tom sereno, aperfeiçoado tempo atrás, que não deixava entrever sua agitação interior—. um

pouco de ar me fará bem, e me permitirá voltar a comunicar-me com os espíritos. Se me desculpar...

Seu olhar retornou ao homem por um instante. Uma jovem de grande beleza, que reconheceu como lady

Margaret, filha de lorde Ralstrom, aproximou-se dele, sorrindo com uma inconfundível expressão de

encantamento. Sem dúvida uma mulher assim, manteria seu interesse o tempo suficiente para que ela pudesse

escapar.

Envolveu as cartas rapidamente em uma peça de seda de cor bronze, deslizou o baralho dentro do profundo

bolso de seu vestido, e se levantou a toda pressa. Sentiu um calafrio de apreensão e o peso de um olhar sobre

ela. Ao levantar a vista, ficou sem fôlego.

Os olhos de uma intensa cor verde a avaliavam, com uma penetrante intensidade que produziu-lhe frio e calor

ao mesmo tempo. E, que a imobilizou igual ao que as suas mãos tinham feito quatro anos atrás. O coração deu

um tombo, e pela mente da moça cruzou o pensamento de que sem dúvida haveria dúzias de mulheres, que

fariam o impossível para receber a atenção daquele homem. Entretanto, Alex não era uma delas.

Reconhecia-a? Alex não podia sabê-lo, pois sua expressão não demonstrava nada. Mas não pensava perder

tempo em averiguá-lo.

—Os espíritos me chamam; tenho que ir —disse a lady Miranda antes de dar uma rápida volta e desaparecer

entre a multidão, com uma habilidade que era fruto de anos de prática.

Por desgraça, não sabia aonde ía. Todo seu ser estava consumido por uma só idéia: escapar. A mesma idéia que

o estranho tinha introduzido nela, a última vez que se encontraram.

Deteve-se antes de ír até um extremo do salão, consternada e frustrada. Maldição, levada pelo pânico, tinha

fugido na direcção errada. A mesa para jogar as cartas estava instalada perto das portas de vidro, que

conduziam ao exterior, e portanto, nesse momento estava do outro lado do salão cheio de gente. Além disso,

havia dúzias de convidados entre ela e o corredor que levava há porta da rua, uma situação que resultava

ainda mais fastidiosa, porque sucumbir ao pânico não era próprio dela. Entretanto, não podia negar a agitação

que a dominava.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Observou a multidão com um rápido olhar. O coração deu-lhe um tombo, quando o seu olhar posou no

homem de olhos verdes. Franzia o sobrecenho como se, ele também observasse a multidão. Em busca dela?

Movida por um desespero que não podia controlar, deslizou-se pelo corredor mais próximo. Com o coração

acelarado, fez um esforço para não correr, para não demonstrar nenhum sinal externo de desespero, em caso

de se encontrar com alguém. Uma porta aberta à esquerda oferecia a esperança de um refúgio, mas, ao

aproximar-se ouviu vozes masculinas procedentes do interior e seguiu em frente. Passou por entre outras

soleiras, mas não parou, decidida a pôr toda a distância possível entre o homem e ela. Ele não revistaria a casa

para encontrá-la, caso a procurasse.

Sua mente trabalhava a toda velocidade. Tinha somente que achar um local... e se possível na parte posterior

da casa. Saíria ao jardim pela janela e logo desapareceria pelas ruelas. Certamente, lady Malloran se zangaria, e

sem dúvida Alex perderia os honorários de toda a noite, uma perspectiva que a preocupava, já que necessitava

desse dinheiro. Teria que dar alguma desculpa, alegando uma perda de contacto com os espíritos, uma

profunda fadiga psíquica ou algo semelhante para que sua reputação não fosse prejudicada. É obvio, seus

esforços bem poderiam ser em vão, e tudo por causa de um estranho. As ramificações do que podia significar

para seu futuro enfrentar-se com o passado...

Afastou da sua mente a perturbadora idéia. O futuro com que tinha que preocupar-se nesse momento, só

abrangia os seguintes minutos. Uma vez que escapasse dali, então se preocuparia com o amanhã.

O corredor dava uma série de voltas, e de repente a jovem encontrou-se na penumbra. Os sons procedentes da

festa — as risadas, os bate-papos, o tinido do cristal— diminuíram até converter-se em um murmúrio apagado

e indescritível. Depois de voltar outra esquina, viu uma porta fechada. Excelente. Pelo que sabia das casas do

Mayfair, o mais provável era que o quarto fosse uma biblioteca ou um estúdio, e estava claro que não era

utilizado para a festa. Avançou depressa, apoiou a orelha na porta de madeira e a seguir se ajoelhou para

espionar pelo buraco da fechadura. convencida de que o local estava vazio, moveu o puxador em latão, abriu a

porta o suficiente para deslizar-se através dela e logo a fechou.

Apoiou-se de costas contra a polida superfície de carvalho, inspirou com força para tranquilizar-se e levou a

cabo uma rápida inspecção do quarto, que, como ela supunha, era um estudio. Em vista das paredes forradas

de madeira escura e do sofá e das poltronas de couro marrom, de claro ar masculino, não havia dúvida de que

era domínio de lorde Malloran. Fixou o olhar na janela do outro lado do estudio, através da qual brilhava o

luar Era a única iluminação que tinha, e ela permitiu-se desfrutar de um instante de alívio. A fuga a chamava, a

menos de sete metros de distância.

Entretanto, quando estava a ponto de afastar-se da porta, um ruído a paralisou. O alívio desvaneceu-se, e a

tensão voltou a dominá-la. Alex apoiou a orelha na fresta situada entre a porta e o marco.

—Aí está o estúdio—disse uma voz baixa e profunda—. Nele poderemos falar sem que ninguém nos

interrompa.

Podia piorar sua sorte naquela noite? Impulsionada à acção, Alex cruzou o quarto correndo. Sem tempo para

escapar pela janela, ocultou-se atrás das pesadas cortinas de veludo, agradecendo a escuridão existente e

amaldiçoando sua estupidez, por vacilar um segundo que fosse para tomar fôlego. Apoiou as costas nas frias

vidraças. Sua saída. Agora não lhe servia de nada.

O suave roçar da porta ao abrir-se, foi seguido uns segundos mais tarde por um estalo ao fechar-se. Logo se

ouviu um estalo mais forte que indicou, que agora a porta estava fechada com chave. Ficou muito quieta, e

recordou-se que ao longo dos anos, tinha saído bem preparada de situações piores do que aquela. Mais vezes

das que queria recordar. Só tens que te manter tranquila, em silêncio e paciente, disse-se.

—A data e o lugar estão decididos.

A jovem reconheceu imediatamente a bronca voz masculina como a mesma que tinha ouvido uns segundos

atrás, através da fresta da porta.

—Quando? —disse outra voz, um áspero sussurro apenas audível.

—Na festa do Wexhall, no dia vinte.

—Está tudo preparado?

—Sim. Acreditarão que se trata de um trágico acidente. Ninguém suspeitará.

— Se assegure disso – disse num áspero sussurro.

Era a autêntica voz da pessoa ou tinha a intenção de disfarçá-la? Alex supôs que devia ser o último. Nunca se

sabia quando poderiam ser ouvidos por descuido em uma casa replecta de convidados e serventes. Ou

jogadoras de cartas escondidas por trás das cortinas.

—Nada de enganos. Não há dúvida que sua morte dará lugar a investigações —acrescentou.

—Não tem que se preocupar, contratou o melhor.

—Te pagará como tal, desde que tudo aconteça conforme o planejado.

—Assim será. E, falando de pagamento... Tenho que receber um pouco mais agora que tudo está preparado, tal

como acordamos.

—Ocuparei-me que o entreguem amanhã. Não tem que existir mais contacto entre nós depois disto.

—Entendido. Agora tenho que voltar a servir bebidas aos lords elegantes antes que sintam minha falta.

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—Com o dinheiro que pago, logo será você que organizará festas elegantes.

Um som de repugnância encheu o ar.

—Ora, não desperdiçarei o dinheiro em festas. Assim que isto termine, não voltará a ver-me em Londres.

—Sem dúvida, isso é o melhor - respondeu um suave sussurro.

—Vou comprar uma casa, junto ao mar. Contratarei a um criado. Por uma vez na minha vida, será a mim que

servem.

Ouviram-se alguns passos amortecidos, e Alex, sem atrever-se apenas a respirar, visualizou os dois homens

atravessando o estúdio. Ao cabo de uns segundos soou o estalo da porta que se abria. Embora seu forte instinto

de conservação pedisse que não se movesse, espionando pela borda da cortina e por um instante viu as costas

de um homem alto e moreno que estava vestido com o uniforme dos Malloran, inconfundível com seus

adornos dourados. Era evidente que se tratava do homem menos instruído, que falava com voz mais bronca.

Com quem tinha falado? Ela esticou o pescoço, mas a porta se fechou, ocultando-a em um silêncio sepulcral.

Ficou detrás da cortina, respirando devagar para tratar de dominar o pavor doentio que a atravessava. Alguém

ia ser assassinado... no dia 20. Mas quem?

Não é teu assunto, advertiu-a a voz interior que a tinha ajudado a sobreviver nos bairros mais pobres de

Londres. Tem já suficientes problemas com que se preocupar.

Sim, tinha-os. E sabia muito bem o que acontecia às pessoas que colocavam o nariz nos assuntos alheios.

Tendiam a perder o nariz. Ou algo pior.

Fechou os olhos com força e amaldiçoou-se por perguntar-se se aquela noite podia piorar, porque era evidente

que sim. Tudo em seu interior pedia a gritos que esquecesse o que tinha ouvido. Que o ignorasse. Que fugisse.

Sem perder um instante. Enquanto tivesse a possibilidade de fazê-lo. Antes que o criado dos Malloran, ou a

pessoa que sem dúvida o tinha contratado para matar, descobrissem sua ausência da festa e perguntassem por

que tinha desaparecido a diversão. Antes que a procurassem e a encontrassem. Escondida naquelo quarto.

Onde acabavam de comentar seu plano criminoso.

Mas sabia que, por mais que tentasse, nunca poderia esquecer o que tinha ouvido. Remoeria-lhe a consciência,

essa aborrecida voz interior que a atormentava quando ela menos desejava.

Entretanto, o que fazer com essa informação? Estava claro que o alvo era alguém importante. «Não há dúvida

de que sua morte dará lugar a investigações.» Terei que dizer a alguém. Alguém que pudesse deter esse crime

antes que fosse cometido. Alguém que não era ela.

Mas quem? Um magistrado? A moça tragou saliva, passou a vida evitando os magistrados e a gente dessa

classe, e tendo em conta seu passado, certamente preferia deixar as coisas como estavam. Além disso, quem ia

acreditar nela, uma mulher que ganhava a vida, com muita dificuldade tirando cartas? No instante em que

cometessem o assassinato daquela pessoa importante, acreditariam-na culpada, ou algo um pouco parecido. O

que fosse. Dariam-lhe caça como se fosse uma raposa. Jogariam-na em uma cela. Revolveu-lhe o estômago.

Nunca mais.

Entretanto, ver-se-ía colocada à força em sua própria prisão privada, se não tentava ao menos avisar a pessoa

que estava em perigo, fosse quem fosse. Com um olhar ansioso para a janela que a atraía, com a doce tentação

da liberdade, saiu detrás da cortina e caminhou depressa até a elegante escrivaninha de madeira. Tirou em

seguida uma folha de papel cavalinho , humedeceu a pluma no tinteiro e escreveu uma breve nota. A seguir

dobrou o papel duas vezes e escreveu «Lorde Malloran, urgente e confidencial» no exterior. Deixou-o sobre a

escrivaninha, prendendo-o com um peso de papel de cristal em forma de ovo, que apoiou sobre uma esquina.

Então respirou fundo e disse à sua consciência que deixasse de resmungar.

Fazia o possível para salvar a futura vítima. Agora tinha que salvar-se a si mesma.

Aproximou-se da janela e olhou através das vidraças para o pequeno jardim, que por sorte estava vazio, sem

dúvida devido ao frio impróprio da estação. Por fim algo lhe saía bem. Ao observar a distância de cinco metros

até o chão, fez uma careta. A última vez que deu um salto assim escorregou e torceu o tornozelo. Considerou

por um momento a possibilidade de retornar seus passos e sair pela porta da rua, mas um tornozelo dolorido

resultava muito mais atractivo que tropeçar com o homem de olhos verdes ou com a dupla criminosa que

vagava pela festa. Não, a janela oferecia a única oportunidade de sair daquela confusão.

Depois de um último olhar, para assegurar-se de que o jardim continuava livre de convidados, Alex abriu a

janela, e com um movimento ágil, passou as pernas por cima do marco. Apoiou as mãos no parapeito,

imprimiu ao corpo uma hábil contorção e logo, com cuidado, baixou com os dedos dobrados sobre o batente,

de cara à áspera fachada de pedra. Inspirou com força, apertou a ponta de suas botas de suave pele contra o

muro de pedra, deu um impulso e soltou-se.

Seu estômago ascendeu de repente. Durante um breve instante, pareceu-lhe que voava. Logo aterrissou com

suavidade, dobrando os joelhos e tocando com as palmas a terra fria e húmida. Ao ficar em pé, esteve a ponto

de desatar a rir de pura alegria por sua façanha, enquanto sacudia as mãos. Era livre. Tinha somente que

desaparecer entre as sombras. Voltou-se, decidida a dirigir-se para as ruelas.

E encontrou-se olhando uma gravata branca como a neve.

Uma gravata branca como a neve, que estava somente alguns centímetros de seu nariz. Inspirou de repente,

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sobressaltada, e percebeu o aroma de roupa recém engomada misturado com um odor de sândalo. Deu em

seguida um passo atrás, mas deteve-se, quando os seus ombros chocaram contra a pedra áspera da casa.

Umas mãos fortes prenderam os seus braços.

—Quieta — disse uma profunda voz masculina.

Quando é que a sua sorte se havia tornado tão horrivelmente má? Aquela noite ía de mal a pior.

Os dedos dobraram-se contra sua pele, descoberta pelas mangas curtas e afaroladas de seu vestido, e a jovem

observou que o homem não levava luvas. Sentiu que a percorria um formigueiro que sem dúvida não era mais

que chateio. Decidida a libertar-se depressa daquele irritante obstáculo em seus planos de fuga, Alex levantou

o queixo.

E olhou os olhos familiares do estranho.

Capítulo II

A irritação de Alex evaporou, e um sentimento de alarme rugiu através dela com tanta força que a jovem

enjoou. Uma vozinha interior ordenou para se afastar dele, mas não pôde mover-se. Só pôde olhar aqueles

olhos insondáveis, que a observavam com uma expressão impenetrável. Todos seus músculos retesaram,

atendendo-a com o medo que acreditava ter vencido tempo atrás.

Um tenso silêncio, que pareceu durar uma eternidade cresceu entre eles, enquanto Alex lutava por dominar

seu pavor e mostrar-se serena.

Algo bateu as asas no olhar dele... algo que desapareceu antes que Alex pudesse decifrá-lo. Algo que a moça

rogou que não fosse reconhecimento. Entretanto, que outra coisa podia ser? Sem dúvida, não se tratava de uma

coincidência, que precisamente ele, aparecesse justamente por debaixo dessa janela, nesse momento concreto.

Os anos que tinha vivido fugindo de seu passado, finalmente a tinham alcançado. Na forma desse estranho que

seguia agarrando-a com firmeza. Recorrendo a todas suas reservas, Alex desfez-se de sua apreensão e

recuperou seu aprumo. Sabia como sair de situações difíceis, embora nada no porte dele o classificava como

um parvo, uma observação que a jovem decidiu ignorar estupidamente quatro anos atrás.

—Sente-se bem, Madame Larchmont?

Qualquer pequena fresta de esperança, de que ele ignorasse sua identidade desvaneceu-se com a pergunta. A

moça endireitou as costas e levantou o queixo.

—Sabe quem sou.

Uma sobrancelha escura arqueou-se.

—Esperava que não soubesse?

Uma garota pode sonhar, disse-se ela.

—Duvidava-o, porque é evidente que se está ultrapassando —respondeu a jovem olhando com intenção as

mãos, que a continuavam a agarrar .— Pode- me soltar, senhor.

Ele obedeceu imediatamente e deu um passo atrás. A Alex pareceu-lhe que os seus dedos deslizavam um

instante, sob sua pele nua antes de soltá-la. Um tremor a percorreu; sem dúvida devido ao fresco ar nocturno

que roçou a zona que tinha sido aquecida com as palmas dele.

—Feriu-se ao tropeçar? —perguntou ele, com voz preocupada, olhando-a de cima a abaixo.

—Ao tropeçar?

—Sim. Estava a caminhar pelo jardim quando ouvi um ruído. Ao voltar a esquina, vi-a levantar e sacudir as

mãos. Espero que não esteja ferida.

—Pois... não, obrigado. Estou bem.

Alex, confusa, observou-o com atenção. Orgulhava-se de sua capacidade para ler os pensamentos das pessoas,

e a expressão daquele homem, muito visível ao resplendor da lua cheia, revelava sómente um interesse cortês,

talvez com um pingo de curiosidade. Ao que parecia, ignorava que ela tivesse saltado pela janela.

Voltou a olhá-lo. Nos olhos daquele homem não brilhava nem a mais ligeira sombra de reconhecimento. Era

possível que não recordasse seu anterior encontro, que só a conhecesse dessa mesma noite? Invadiu-a uma

quebra de onda de alívio, embora durasse pouco. A intensidade, com a que ele a tinha olhado cuidadosamente

no salão tinha que significar algo. Se não a recordava, o que devia ser?

O homem moveu-se, e a jovem esticou os músculos. Entretanto, limitou-se a tirar um lenço do bolso interior do

colete.

—Para que limpe as mãos —disse, lhe oferecendo a peça de tecido branco com um gesto galante.

Já recuperada todo a compostura, Alex dissimulou suas suspeitas a respeito das motivações do homem com a

habilidade de uma experiente atriz e sacudiu a cabeça.

—Obrigado, mas as luvas protegeram-me as mãos. Estou perfeitamente —disse, antes de obsequiá-lo com seu

olhar mais autoritária—. Que fazia no jardim?

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O homem sorriu, e ela resistiu o impulso de piscar. Em outras circunstâncias, poderia ter ficado deslumbrada

por aquele cintilar devastadoramente atraente de dentes brancos e homogêneos, como imaginava que devia

ocorrer à maioria das mulheres. Por sorte, ela era imune ao atractivo daquele homem.

—Como a senhora, tomar um pouco o ar —respondeu—. Além disso, desejava afastar-me da multidão por um

momento... embora encontrar a Madame Larchmont tenha sido um prazer inesperado.

Ainda desconfiada, embora disposta a seguir o jogo, Alex inclinou a cabeça para agradecer o cumprimento.

—Tem uma vantagem sobre mim, senhor, pois eu ignoro seu nome.

Suas atractivas feições revelaram um gesto envergonhado, muito autêntico para ser fingido, e o homem

guardou o lenço.

—Desculpe-me. Sou Colin Oliver, visconde Sutton —esclareceu, inclinando-se ante ela—. Ao seu serviço.

Alex tragou saliva. Reconhecia o nome, é obvio. Lorde Sutton era um dos melhores partidos da temporada,

sobre tudo porque se dizia que procurava esposa e não seria necessário arrastá-lo até o altar. Um nobre muito

respeitado e com poder. Se a recordasse de antes... Alex estremeceu. Podia estragar tudo aquilo pelo que tanto

tinha trabalhado e lutado.

Ele voltou a sorrir.

—Vejo por sua expressão que meu nome resulta-lhe familiar. Leu por acaso o artigo no Times de hoje?

Seu alívio por não ser reconhecida imediatamente se viu temperado por um absurdo ressentimento ao ver que

não a recordava, sobre tudo porque ela o recordava com todo detalhe. Tão insignificante resultava?

Alex separou de sua mente a ridícula pergunta. Pelo amor de Deus, deveria estar dando saltos de alegria

perante sua má memória. Além disso, por que a iria recordar? Seu encontro tinha sido muito breve. Um

arrogante membro da nobreza dificilmente se fixaria no rosto de uma suja miúda de rua.

A nuvem de desastre que se abatia sobre seu sustento e todos seus planos de futuro retrocedeu... um pouco.

Não podia dissipar a estranha sensação de que, apesar de todas as aparências, o homem estava a brincar com

ela. Alex devia permanecer em guarda, e para isso necessitava informação. As cartas haviam predito o

reaparecimento daquele estranho em sua vida e que desempenharia nela uma função destacada. Mas não sabia

por que e precisava averiguá-lo.

—Pois sim, tenho lido o artigo do Times—disse, o brindando com seu melhor e mais misterioso sorriso—.

Acredito que meia Londres confia em que eu possa prever com quem se casará.

Ele riu entre dentes com voz profunda e sonora.

—Eu também o confio. A verdade, economizar-me-ia muito tempo. Posso acompanhá-la para dentro? —

perguntou enquanto lhe oferecia o braço—. Espero com ansiedade meu turno para que me tire as cartas.

Alex vacilou. Não desejava retornar à casa em que o criminoso criado dos Malloran e seu sócio se moviam

entre os convidados.

—Obrigado, mas já estava de saída.

—Tão cedo?

A jovem estendeu as mãos.

—Quando os espíritos me chamam a casa, devo obedecer.

—chamaram já sua carruagem?

Ela ocultou sua careta de desgosto. Era típico de um aristocrata mimado dar como obvio que todo mundo

tinha uma carruagem ao seu dispor. Alex levantou um pouco o queixo.

—Pensava tomar um carro de aluguer.

O homem descartou essa possibilidade com um gesto.

—Nem pensar. É muito tarde para uma dama viajar sozinha. Pedirei minha carruagem agora mesmo, e a

acompanharei a casa.

—Agradeço a oferta, lorde Sutton. Entretanto, estou acostumada a voltar sozinha para casa.

—Pode ser, mas não é necessário que o faça esta noite.

—Não me ocorreria o tirar da festa, em que muito bem poderia conhecer sua futura esposa.

—Já vi as ofertas de esta noite e estou certo de que a mulher dos meus sonhos não se encontra no salão de lady

Malloran. A verdade é que a mulher mais interessante que conheci hoje, está diante de mim —disse ele com

um sorriso cálido, simpático e impregnado de picardia —. Acredite, seria um grande favor que me faria, se me

permitisse acompanhá-la a casa.

Estava-se divertindo à sua custa? Possivelmente. Mas se era assim, ela tinha que sabê-lo. Sentia uma enorme

curiosidade por aquele homem que —estava convencida disso— era o que tinha desempenhado uma função

tão destacada em suas cartas durante anos, e não lhe ocorria nenhuma razão para recusar sua oferta, que não

soasse a grosseria, assim a jovem assentiu.

—Muito bem.

Ele estendeu o braço no ângulo perfeito.

—Vá com cuidado. Não queria que voltasse a tropeçar.

Havia um brilho de humor em sua voz? Alex o observou, mas a expressão dele não vacilou.

—Não, eu não gostaria de voltar a tropeçar —conveio ela.

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Com os dedos enluvados, a jovem deu-lhe o braço e ambos avançaram pela estreita franja de erva que corria ao

longo da casa para a fachada. Os firmes músculos do antebraço do homem se dobraram sob os dedos da moça,

e ela pensou que devia gostar de montar a cavalo. Alex observou surpreendida que coxeava um pouco da

perna esquerda. Quatro anos atrás não sofria aquela claudicação. Em realidade, caminhava muito depressa.

Muito.

Quando chegaram aos degraus da entrada apareceu um lacaio, e Alex ficou rígida, temendo que o servente alto

e moreno fosse a pessoa que tinha ouvido no estudio.

—Sua carruagem, lorde Sutton?

A jovem suspirou aliviada e se obrigou a relaxar. Não era sua voz. Não se tratava do mesmo homem.

—Sim, obrigado —respondeu lorde Sutton, antes de voltar-se para a moça—. Leva algum xaile ou outros

pertences que terei que recolher?

Céus, entre tanta confusão esqueceu-se disso.

—Sim, meu gorro e minha capa de veludo verde.

Alex olhou as amplas portas duplas que conduziam ao vestíbulo. Supôs que devia voltar a entrar para

despedir-se de lady Malloran, mas a simples idéia de fazê-lo produzia-lhe calafrios.

—Por que não espera aqui enquanto me ocupo de nossos pertences e me despeço de nossa anfitriã em seu

nome?

—De acordo, obrigado —disse ela em seu tom mais régio, confiando em que não se notasse o alívio que sentia.

Ele entrou na casa, e Alex aproveitou para respirar a gosto pela primeira vez desde que o tinha visto no salão.

Talvez não fosse o homem que, conforme as reiteradas predições das cartas, ia entrar de novo em sua vida, mas

sua intuição, que nunca lhe tinha falhado, dizia-lhe que se tratava dele. Se pudesse lançar-lhe as cartas, talvez

fosse possível averiguar mais. Entretanto, para fazer isso teria-lhe feito falta estar mais tempo em sua

companhia. Em tal caso, arriscaria-se a que ele a recordasse?

Agora, ao poder pensar com claridade, dava-se conta que só tinha que negar qualquer encontro anterior,

afirmar que devia parecer-se com alguém que ele tinha visto somente uma vez, em uns breves instantes. Era

evidente que não lhe resultava familiar. Entretanto, Alex o recordava intensamente. Aquele homem tinha-se

feito inesquecível no percurso de uns quantos minutos frenéticos.

Resultava evidente que ela não era feita de uma massa tão memorável, algo que de novo, de forma

inexplicável, fez com que se sentisse ofendida. A jovem olhou para o céu. Ofendida? Estava louca de atar. Que

ele não a recordasse só podia descrever-se como uma milagrosa bênção.

Seus pensamentos foram interrompidos, quando parou diante da casa, uma elegante carruagem laqueada em

negro, cuja porta era decorada com um brasão, puxado por um formoso par de cavalos dourados.

—Bem a tempo —disse a voz profunda de lorde Sutton nas suas costas.

antes que pudesse voltar-se, o homem colocou-lhe a capa sobre os ombros. Quando a jovem amarrour as

ataduras, seus dedos roçaram os dele. Notou que lorde Sutton ficava imóvel, muito perto dela.

Escandalosamente perto. Tão perto que a calidez de seu fôlego acariciou-lhe a nuca. O calor das suas mãos

penetrou suas finas luvas de encaixe, e a pele da jovem estremeceu ante o contacto. Antes que Alex pudesse

reagir de alguma forma que não fosse ficar ali e assimilar o perturbada que se sentia perante ele, o homem deu

um passo atrás.

Irritada consigo mesma, Alex amarrou as fitas do pescoço, mas, para maior mortificação, os dedos tremeram

um pouco ao atar os largos cordões e o resultado foi um laço incompetente e frouxo.

Lorde Sutton colocou-se ao seu lado, tranquilo e imperturbável, e estendeu seu gorro, que Alex optou por não

colocar em vista de sua recente experiência com os laços.

—Lady Malloran está muito desgostada por sua saída —disse ele—, assim tomei a liberdade de explicar que

quando os espíritos lhe falam, não tem mais remedio que fazer-lhes caso, e que disseram-lhe muito claramente

que era hora de voltar para casa. Espero que as minhas palavras contem com sua aprovação.

A jovem examinou seu semblante em busca de algum sinal de brincadeira, mas sua voz e expressão eram

sérias. A luz saía a torrentes pelas altas janelas da casa, destacando seus formosos traços, e Alex recordou

imediatamente que não tinha podido afastar seu olhar dele a primeira vez que o viu entre a multidão no

Vauxhall, quatro anos atrás. Alto e etremamente atractivo, estava sozinho, sob uma árvore, com as costas

apoiadas contra o robusto tronco, observando as pessoas que passavam por ele. Alex sentiu em seguida uma

afinidade. Sabia muito bem o que era sentir-se só e observar as pessoas que passavam ao largo. Como só o

olhar, todas suas fantasias secretas e inalcançáveis de ser arrebatada por um herói, bonito e elegante tinham

convergido em sua mente, atribuindo a ele o papel do seu cavalheiro de brilhante armadura. Esse que a

manteria a salvo, mataria seus dragões e faria desaparecer a dolorosa solidão e o medo sempre presente.

Sonhos tolos e impossíveis, como muito bem sabia sua mente, mas aos que seu estúpido coração se agarrava de

todos os modos.

Ao longo dos anos tinha observado a incontáveis aristocratas e os tinha descartado sem pensar, mas ele tinha

algo que atraía sua imaginação e a excitava de uma forma que jamais tinha experimentado, de uma forma

perturbadora, excitante e emocionante que a confundia e intrigava ao mesmo tempo, e que apesar do seu

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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aspecto de cavalheiro, emanava um aura contraditória de melancolia mesclada com um toque de perigo e

mistério que a atraiu como se fosse um ladrão ante um esconderijo de jóias.

Não habia dúvida de que era um dos membros da alta sociedade que perambulavam pela zona, e entretanto se

mantinha à margem deles. Cada detalhe de sua aparência, desde aqueles olhos irresistíveis até as altas maçãs

do rosto e o nariz reto e clássico, passando pelo queixo quadrado e seu próprio porte, assinalava-o como um

cavalheiro de alto berço. Não era dos que gostava, e certamente não era daquelas a quem ele gostava.

Agora estava observando-o, e seu olhar se deteve no lábio superior, de forma perfeita, e logo no lábio inferior,

mais grosso. Como fazia para sua boca parecer suave e firme ao mesmo tempo? Certamente, um homem

abençoado com um atractivo tão extraordinário não teria problemas para encontrar esposa. Sem dúvida, faria-

lhe falta uma vassoura para varrer as dúzias de moças dispostas. Mmm... Haveria algo de certo no rumor que

afirmava que um lábio inferior grosso em um homem indicava que possuía um sensual...?

—O que disse a lady Malloran conta com sua aprovação, madame Larchmont?

A pergunta formulada em voz baixa a obrigou a levantar a vista. Lorde Sutton a observava com uma expressão

impenetrável que a impediu de saber se dava conta da fascinação que ela sentia por sua boca, mas em qualquer

caso pronunciou uma silenciosa oração de agradecimento por ter perdido muito tempo atrás a capacidade de

ruborizar-se. Se se dava conta, era evidente que essa informação não provocava nenhum tipo de reacção nele,

com a possível excepção do aborrecimento, algo que não deveria ofender sua vaidade feminina, mas que não

obstante o fazia, por estranho que resultasse.

Santo céu, talvez estivesse de verdade louca de atar. Aquele homem, em menos de uma hora, tinha-a

perturbado mais do que qualquer outro homem o tinha obtido em algum momento de sua vida. O certo era

que o único homem que a tinha perturbado jamais era... ele. Quatro anos atrás. Sim, disse-se Alex, e olhe quão

desastroso resultou esse encontro.

Devia estar muito acostumado a deixar embevecidas as mulheres. Assaltou-a um desejo entristecedor de

assegurar que seu embevecimento tinha sido uma aberração de tudo inexplicável e imprópria dela, mas

conseguiu reprimir o impulso e o olhou directamente nos olhos.

—Como o explicou a lady Malloran é de todo certo, sim, conta com minha aprovação. Obrigado.

—Não há de que. Vamos? —sugeriu o homem, indicando a carruagem.

Recusando a ajuda do lacaio, lorde Sutton a ajudou a subir.

—Onde vive? —perguntou.

A jovem nomeou uma parte da cidade que, embora não era a mais elegante, sem dúvida era respeitável.

Depois de repetir suas palavras ao chofer, lorde Sutton reuniu-se com a moça e acomodou seu desenvolvido

corpo frente a ela, sobre as suaves almofadas de veludo cinza. Segundos depois de a porta se fechar, o veículo

ficou em movimento com uma sacudida.

O exíguo espaço do interior da luxuosa carruagem fazia que o largo e robusto corpo de lorde Sutton parecesse

ainda mais largo, seus ombros, mais amplos, e suas musculosas pernas, mais largas. Perturbada de uma forma

que não gostava nem era capaz de explicar, Alex desviou sua atenção dele e baixou o olhar, mas não encontrou

alívio, pois seus olhos se fixaram na prega de sua própria capa, que descansava sobre a ponta de uma das

brilhantes botas negras do homem. Experimentou uma sensação estranha ao ver que sua roupa tocava a dele.

Resultava muito... íntimo, e a jovem trocou de posição em seu assento de forma que o veludo verde de sua

capa se separasse da bota.

Negando-se a examinar seu alívio com muita atenção, Alex inspirou com força, e qualquer sensação de calma

interior se desvaneceu como uma nuvem de vapor quando seus sentidos se encheram com os agradáveis

aromas de roupa recém engomada e sândalo que já tinha percebido quando esteve a ponto de colocar o nariz

na gravata de lorde Sutton. Ele cheirava... a limpo, de uma forma que Alex não estava acostumado a associar

com os homens. Segundo sua experiência, empestavam a perfumes ou a aroma de corpo sem lavar.

—Quanto tempo está a viver em Londres, madame Larchmont?

A jovem sacudiu-se mentalmente e voltou a centrar sua atenção nele. Parecia muito depravado, mas tinha

esticado a perna esquerda, e Alex perguntou-se, se lhe doeria. Embora o rosto de lorde Sutton estivesse entre

as sombras, ela viu que a observava com um interesse cortês.

— Há vários anos que vivo na cidade —disse ela, antes de trocar habilmente de assunto—. Conforme me

contaram, fazia tempo que não vinha a Londres, pois vivia na propriedade que possui sua família na

Cornualha.

Ele assentiu.

—Sim. O prefiro , já alguma vez esteve lá?

—Na Cornualha? Não. Como é?

O homem adoptou uma expressão pensativa.

—Bonito, embora se tivesse que escolher uma só palavra para descrevê-lo escolheria «tranqüilo». O aroma, o

som e a vista do mar são coisas que jogo muito de menos cada vez que parto dali.

Lorde Sutton estendeu o braço sobre as costas do assento com um gesto imperturbável e a observou com outra

de suas expressões inescrutáveis, algo que resultava, por uma lado frustrante e por outro extranhamente

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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fascinante, pois geralmente lia com facilidade os pensamentos das pessoas.

—Diga-me, senhor, falava sério quando disse que queria que lhe jogasse as cartas?

Ele sorriu.

—É obvio. Sempre me agrada, entregar-me a uma diversão inofensiva.

A jovem arqueou uma sobrancelha.

—Não acredita no poder ou a exactidão do tarot?

—A verdade, é que nunca pensei muito nisso, mas tenho que reconhecer que minha reação inicial é de

cepticismo. Custa-me dar crédito a um baralho.

—Senhor, desafia-me a o fazer mudar de opinião.

—Asseguro-lhe que se me fizer mudar de opinião será uma verdadeira provocação. Temo-me que tudo aquilo

relacionado com a natureza mística vai contra meu temperamento pragmático.

—Entretanto, está disposto a dar-e uma oportunidade Para o convencer?

—Convencer-me do que, exactamente?

—De que as cartas podem falar do passado e do presente, e predizer o futuro com exactidão. Em mãos da

lançadora de cartas adequada.

—Que seria você.

—É obvio.

—Então digamos que estou disposto a deixar que me jogue as cartas. Está por ver se puder ou não convencer-e

—disse, encolhendo os ombros.

—Devo advertir que possivelmente necessite muito tempo para fazê-lo, pois os cépticos sempre requerem

maior esforço.

Ele sorriu.

—Diz isso para me sentir alarmado.

—Talvez devesse —respondeu ela, devolvendo o sorriso—. Por jogar as cartas cobro por cotas de quinze

minutos.

—Já. E seus honorários?

Sem piscar, Alex indicou um numero que triplicava o seu preço normal.

Lorde Sutton arqueou as sobrancelhas.

—Com uns honorários assim, madame, a gente poderia sentir a tentação de chamá-la...

—Lançadora de cartas de primeira categoria? —sugeriu ela amavelmente ao ver que o homem vacilava.

Ele se inclinou para diante até apoiar os antebraços sobre os joelhos. Seus olhos brilharam na penumbra

enquanto a olhavam com fixidez.

—Ladra.

Foi uma sorte que estivessem sumidos na penumbra, pois Alex notou que o sangue lhe fugia do rosto. O

coração lhe deu um tombo, e de repente pareceu que tivesse desaparecido todo o ar do interior da carruagem.

Antes que pudesse recuperar-se, lorde Sutton apoiou-se no respaldo e sorriu.

—Mas suponho que e uns serviços tiverem uma grande procura, como tenho entendido que ocorre com os

seus, cabe esperar preços exagerados.

Sua expressão parecia por completo inocente. Entretanto, a jovem não podia afastar a incômoda sensação de

ser um camundongo entre as garras de um gato. Alex humedeceu os lábios ressecados e logo adoptou uma

expressão altiva.

—Sim, cabe esperar preços exagerados nessas circunstâncias.

—Por tudo esse dinheiro, espero receber muita informação.

—Direi-lhe tudo sobre sí, lorde Sutton. Inclusive o que que talvez não deseje saber.

—Excelente. A verdade, eu adoraria que me dissesse com quem estou destinado a me casar para que possa

começar a cortejar a jovem dama. Eu gostaria que todo o processo conclua-se o antes possível para poder

retornar a Cornualles.

—Que romântico dasua parte! —disse ela, em tom muito seco.

—Temo-me que não tem nada de romântico que um homem em minha situação procure esposa. Em realidade

não é mais que um acordo de negócios. Suspeito que por isso há tantos matrimônios infelizes entre os de

minha classe.

Ela o observou durante vários segundos antes de falar.

—Parece quase... melancólico.

—Sim? Suponho que é porque meu pai contraiu segundas núpcias recentemente e meu irmão mais novo acaba

de casar-se. Ambos ão tremendamente felizes —disse ele, esboçando um sorriso—. E eu me alegro por eles.

Mas não posso negar que há uma parte de mim que sente inveja. Ambos se casaram por amor.

—E você deseja fazer o mesmo? —perguntou ela, sem poder dissimular sua surpresa.

—Não importa se o desejo ou não, porque não posso me permitir ao luxo de apoiar minha eleição de uma

esposa nos caprichos do coração —disse, antes de voltar-se para olhar pelo guichê. Um músculo se moveu em

sua mandíbula. Alex viu o rosto de lorde Sutton reflectido no cristal e se sentiu impressionada por sua triste

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expressão—. Tampouco tenho tempo para fazê-lo —murmurou.

Palavras intrigantes pelas que, teria gostado de lhe perguntar. Entretanto, antes que pudesse fazê-lo, o homem

voltou a olhá-la. Seus lábios curvaram-se devagar em um sorriso que obrigou Alex a tomar consciência de sua

presença. Uma consciência que a alagou de uma calidez insólita e que a levou a reprimir o impulso de

remover-se em seu assento.

—Mas agora espero que me diga que minha futura esposa é um diamante sem defeito, de primeira categoria —

continuou ele—. Uma dama de alta berço e impecável educação, que não só é a candidata perfeita para ser

minha esposa, mas também a mulher pela qual me apaixonarei ridícula e loucamente.

Embora Alex não estivesse segura da capacidade daquele homem para apaixonar-se, não duvidava nem por

um momento que o caminho que percorria se achava semeado de corações femininos.

—É seu maior desejo apaixonar-se ridícula e loucamente?

—A verdade, ficaria conformado com que minha prometida fosse suportável e não parecesse uma carpa.

—Quer dizer que, enquanto seja rica e proceda de uma família aristocrática cujas posses encaixem bem com as

suas, já valerá. Não é assim?

—É uma forma um tanto brusca de dizê-lo, mas sim.

—Teria pensado que um homem com seu... temperamento pragmático, como há dito, apreciaria a franqueza.

—E é verdade que a aprecio. O que acontece é que não estou acostumado, para a ouvir dos lábios de uma

dama. Segundo minha experiência, as mulheres tendem a falar por enigmas, em lugar de dizerem

simplesmente o que pensam.

—De verdade? Que interessante, porque me parece que são os cavalheiros quem se mostram muito menos

abertos que as mulheres!

Ele sacudiu a cabeça.

—Impossível. Os homens são sinceros por natureza. As mulheres são muito mais...

— Espertas?

—ia dizer retorcidas.

A expressão de lorde Sutton não revelava nada, e Alex voltou a experimentar a perturbadora sensação de que o

homem estava jogando com ela. Pois, se assim era, estava condenado à decepção, porque ela não tinha intenção

de o deixar ganhar.

—Para ser um homem que deseja conseguir esposa, não parece ter em muito boa conta as de meu gênero,

senhor.

—Ao contrário, admiro muitíssimo a arte feminina da conversação engenhosa e evasiva —respondeu lorde

Sutton com um sorriso—. Somente, eu gostaria de ser mais perito em traduzir os sentidos ocultos.

Alex adoptou sua expressão mais inocente.

—Temo-me que não sei a que se refere.

—Então me permita lhe pôr um exemplo. Quando uma dama diz que não está desgostada, observei que a

maioria das vezes não só está zangada, a não ser furiosa. Por que não responder simplesmente, como faria um

cavalheiro, «sim, estou desgostada»?

—Entretanto, vocês os cavalheiros se ultrapassariam com o conhaque e logo recorreriam aos murros ou às

pistolas ao amanhecer —disse ela, com um elegante gesto de desprezo—. Sim, isso resulta muito mais

civilizado.

—Ao menos é sincero.

—De verdade? Está claro, senhor, que formou essa opinião sem ter tido as suficientes conversações com

cavalheiros. Segundo minha experiência, quase tudo o que sai de sua boca está carregado de sentido oculto, e

esse outro sentido quase sempre tem que ver com coisas de uma... natureza amorosa.

—Ah, sim? Quer dizer...?

—Por exemplo —disse ela—, quando um cavalheiro elogia a uma mulher o vestido, seu olhar sempre se fixa no

peito dela. portanto, embora diga «eu gosto de seu vestido», o que quer dizer é «eu gosto de seu decote».

Ele assentiu devagar.

—Muito interessante. Se um cavalheiro lhe perguntar «gosta de dançar?», o que quer dizer em realidade?

—Sem dúvida você sabe melhor que eu, senhor.

Um sorriso dançava nas comissuras dos lábios dele.

—Talvez, mas sinto muita curiosidade por essa sua teoria de que tudo o que diz um homem significa outra

coisa. O que você acredita que pretende dizer?

—«Gosta de dançar?» significa em realidade «quero tocá-la».

—Já. E «está preciosa» significa...

—«Desejo beijá-la.»

—E «gosta de dar um passeio pelo jardim?» é...

—«Espero apaixoná-la» —disse ela, estendendo as mãos com um sorriso—. O vê? Tudo são somente corteses

eufemismos para o que de verdade quer. Que é...

— A levar para a cama.

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As palavras ditas em voz baixa flutuaram no ar entre eles. Ressonaram na mente do Alex, projectando calor a

cada uma de suas terminações nervosas. Estava claro que tampouco lorde Sutton era contrário à franqueza. A

jovem inclinou a cabeça.

—É muito cínica sendo tão jovem.

—Pode que ser que seja mais velha do que acredita. E além disso, meu trabalho me dá a oportunidade de

observar de perto a natureza humana.

—E chegou à conclusão de que tudo o que dizem os homens tem um sentido oculto de natureza sensual.

—Devo confessar que eu não observei que seja assim.

A jovem sorriu.

—Certamente é, porque não diz a outros cavalheiros que deseja dançar com eles, nem eles lhe dizem que

gostam de seu vestido.

—Ah, já. Então afirma que os homens são sinceros com outros homens, e que os enganos surgem quando

falamos com as mulheres.

—Não sei se são sinceros entre si, mas quando se trata de conversar com as mulheres, não há dúvida de que

andam com muitos rodeios.

—E não há dúvida de que as mulheres falam em enigma e de que a maioria de suas palavras são só corteses

eufemismos para o que de verdade querem.

—E o que imagina que querem as mulheres?

—O dinheiro de um homem, seu amparo e seu coração, este último em bandeja de prata incrustada de

diamantes, por favor.

Alex arqueou uma sobrancelha.

—Quem é o cínico agora?

—A verdade, mas estou de acordo consigo, embora do ponto de vista do meu gênero.

—Então diz que as mulheres são sinceras com outras mulheres, e que os enganos surgem quando falamos com

os homens —disse a jovem, repetindo as palavras dele.

—Isso parece. Alguém se pergunta se homens e mulheres não deveriam falar apenas do tempo.

Ela pôs-se a rir.

—Deseja eliminar da conversação todos os matizes e toda a sofisticação, senhor?

—Não, só o engano —respondeu o homem, deitando a cabeça para trás e observando-a da penumbra—. E isso

me leva a me perguntar se esta noite não teremos sido você e eu vítimas desses enganos.

O regozijo do Alex desvaneceu, e a moça, nervosa, reprimiu o impulso de atirar do veludo de sua capa.

—Como eu não necessito seu amparo nem seu coração, e o senhor vai em busca de uma esposa aristocrática,

não há necessidade de engano entre nós.

Ele a observou durante vários segundos, e Alex conteve o fôlego.

—Observo que não disse que não necessita meu dinheiro —disse lorde Sutton em voz baixa.

A jovem soltou o ar devagar e logo o brindou com meio sorriso.

—Porque tenho a intenção de que gaste um bom bocado desse dinheiro em troca de meus serviços de

adivinhação.

Lorde Sutton forçou um sorriso.

—Certamente, não posso a acusar de falta de sinceridade, madame. A verdade, sua franqueza me espanta.

—Não me parece um homem que se assuste com facilidade, lorde Sutton.

—Não, madame. Asseguro-lhe que não o sou.

Olhou-a fixamente nos olhos, e uma vez mais Alex se encontrou apanhada em seu irresistível olhar, sem poder

afastar a vista. A jovem não lhe ocorria nada que dizer, e ele também ficou em silêncio. Já não foi necessário

tratar de tirar um novo tema de conversação, porque nesse momento a carruagem diminuiu a marcha antes de

deter-se. O homem olhou pela janela.

—Chegamos —disse.

Abriu a porta, baixou e logo estendeu a mão para ajudá-la a apear-se. Seus fortes dedos envolveram os dela, e

uma labareda subiu pelo braço da jovem. Quando suas botas tocaram os paralelepípedos, o homem a soltou, e

os dedos do Alex se curvaram para dentro de forma involuntária como se tratassem de reter aquele calor tão

perturbador.

—Obrigado por me acompanhar, lorde Sutton.

—Não há de que. Quanto a minha tiragem de tarot... está livre amanhã pela tarde, digamos às três mais ou

menos, em minha casa de Park Lane?

Alex vacilou, dividida entre o impulso de pôr fim aquela relação, que percebia carregada de correntes ocultas,

e seu desejo não só de averiguar mais coisas sobre ele, mas também de obter a escandalosa soma de dinheiro

que lorde Sutton tinha aceito lhe pagar. Necessitava aquele dinheiro desesperadamente...

—Sinto muito, mas já tenho um compromisso às três. Vai bem às quatro? —disse ela em seguida, por medo de

mudar de opinião.

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—Parece-me perfeito. Envio-lhe minha carruagem?

—Obrigado, mas eu me encarregarei de meu próprio transporte. E não é necessário que me acompanhe até a

porta.

Ele inclinou a cabeça.

—Como deseje.

—Boa noite, lorde Sutton.

A jovem decidiu não estender a mão, mas, para sua surpresa, ele sim estendeu a sua. Como não desejava

mostrar-se descortês, Alex esticou sua mão. Sem deixar de olhá-la nos olhos, o homem tomou seus dedos com

suavidade e os levantou. O olhar da jovem se elevou até sua fascinante boca, enquanto seu corpo inteiro

acelerava em espera de que aqueles lábios tocassem o dorso de seus dedos. Em lugar disso, lorde Sutton voltou

a mão dela e apertou seus lábios contra a pele sensível do interior do pulso . A calidez de seu fôlego penetrou o

delicado encaixe das luvas de Alex, e um intenso e ardente calor atravessou seu corpo. Como era possível que

um roçar tão breve fizesse tremer seus joelhos?

Embora o contacto de seus lábios contra a pele dela fosse apenas de uns segundos, a Alex não pareceu nada

decente. Estava claro que tinha que o desenganar de qualquer intenção que abrigasse a respeito de sua

disponibilidade para fazer algo mais que lhe jogar as cartas.

A jovem retirou a mão. Os dedos ardiam, como se lhe tivessem incorporado fogo. Levantou o queixo.

—Se por acaso não está informado, lorde Sutton, não levo o título de madame para impressionar ou como

parte de quao místicismo rodeia meu trabalho de lançadora de cartas. Existe realmente um monsieur

Larchmont.

O homem permaneceu em silencio durante vários segundos e Alex teve que esforçar-se por sustentar seu olhar

firme e penetrante, que parecia abrir-se passo directamente até sua alma, revelando todas as mentiras que ela

tinha contado.

Por fim, inclinou-se ante a jovem com gesto formal.

—É um homem afortunado —murmurou—. Até manhã, madame Larchmont.

Desconfiando de sua própria voz, Alex sacudiu a cabeça antes de voltar a esquina a toda pressa para a entrada

lateral do modesto edifício de tijolo. Assim que voltou a esquina, pôs-se a correr e entrou em um beco. Ali se

agachou em um oco em sombras e apertou as costas contra a pedra áspera. Com o coração desbocado aguçou o

ouvido, escutando os sons da carruagem que partia. Não se moveu até que se desvaneceu o eco dos cascos dos

cavalos contra os paralelepípedos. Continuando, deslizou-se fora do oco e se dirigiu a bom passo para a parte

menos elegante da cidade, mais perto do Saint Giles, movendo-se como a fumaça entre os becos sujos e

estreitos que tão bem conhecia.

Era hora de retornar a casa.

Capítulo III

Colin abriu a porta de ferro forjado que levava a sua casa. A lua deslizou detrás de uma nuvem, eliminando o

resplendor prateado que flutuava sobre o Mayfair uns momentos antes. Volutas de bruma dançavam em torno

de suas botas, mas o nebuloso vapor não era tão denso ali, detrás de Hyde Park, como do outro lado da cidade,

onde tinha deixado madame Larchmont uma hora atrás.

Subiu os degraus de tijolo com o rosto contraído pela dor que lhe palpitava na perna esquerda. Quando sua

bota pisou no último degrau, abriu-se a porta de carvalho e o recebeu uma figura alta que sustentava um

candelabro muito ornamentado. Colin apagou imediatamente toda expressão de seu rosto, embora não estava

seguro de que sua dissimulação servisse de muito ante Ellis, a quem nada lhe escapava.

—Boa noite, senhor —entoou Ellis na mesma voz sonora que Colin conhecia desde sua infância—. Pouco

depois de sair, entregaram uma mensagem para sí. O deixei sobre a escrivaninha da biblioteca, junto com seu

jantar habitual. Gostará de uma taça de chocolate?

Ellis sabia tudo o que ocorria dentro da casa, até o último detalhe, incluindo a predileção infantil do Colin por

deslizar-se pelo corrimão e roubar doces da cozinha. Com o tempo Colin tinha superado sua afeição pelos

corrimões, mas seu amor pelos doces não tinha diminuído nem um ápice, como bem sabia Ellis, ao igual ao

hábito de Colin de retirar-se aos a seus aposentos mal chegava a casa.

Este sacudiu a cabeça.

—Obrigado, mas me temo que esta noite necessite conhaque.

O olhar do Ellis se encheu de inquietação e se fixou por um instante na perna do Colin.

—Esquento-lhe uma manta?

—Não, obrigado, Ellis. O conhaque bastará. O verei pela manhã.

—Boa noite, senhor.

Depois de desejar ao mordomo boa noite, Colin rechaçou o candelabro e se introduziu no escuro corredor que

levava a biblioteca. Conhecia muito bem aquela casa, e se alegrava de que as profundas sombras lhe evitassem

ter que olhar os retratos de seus antepassados que, como marcos historicos, adornavam as paredes forradas de

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seda. Já de menino não gostava de olhá-los; sempre sentia que seus severos olhares o seguiam como soubessem

que se dispunha a fazer alguma travessura, salmodiando advertências sobre a importância do dever e as

obrigações que lhe impunha seu título. Como se não lhe metessem na cabeça as palavras «dever» e «obrigação»

da manhã de noite.

Depois de entrar na biblioteca, fechou a porta nas suas costas e cruzou imediatamente o tapete Axminster de

cor marrom para as licoreiras, ignorando o doloroso puxão que suas largas passadas lhe causavam na perna.

Colin se serve uma generosa porção do potente licor, observando suas mãos trêmulas com o cenho franzido.

Teria gostado de atribuir aquele pequeno tremor ao esgotamento, à fome ou a qualquer outra coisa que não

fosse a verdadeira causa, mas tinha aprendido tempo atrás que, embora mentir a outras pessoas formava parte

da forma em que tinha decidido viver sua vida, mentir a si mesmo era uma inútil perda de tempo.

Tomou o conhaque de um só gole, fechando os olhos para absorver e saborear o calor que descia por sua

garganta. Se tivesse podido evocar algo um pouco parecido com diversão, teria se rido de si mesmo por sentir-

se tão agitado. Abriu os olhos, serve-se outra taça e logo se aproximou da chaminé com passos desiguais.

Depois de acomodar-se no fofo sofá de brocado, inclinou-se para diante e apoiou os cotovelos nos joelhos

separados. Com a taça de cristal esculpido entre seus dedos, Colin fixou o olhar nas chamas que dançavam.

A imagem dela surgiu em seguida em sua mente, acompanhada da comoção que experimentou ao vê-la no

salão de lady Malloran.

Madame Larchmont. Alexandra, como tinha sabido por lady Malloran. Por fim, um nome acompanhava ao

rosto que o obcecava há quatro anos.

Tinha-a reconhecido imediatamente, sentindo um murro nas vísceras que o deixou sem fôlego. Observava os

convidados de lady Malloran sem muito interesse quando seu olhar deu com a lançadora de cartas da que

tinha ouvido falar várias pessoas. Embora a tivesse contratado para animar a festa, Colin não tinha prestado

muita atenção, pois o tarot não tinha nenhum interesse para ele.

Então ela elevou o olhar. E os olhos do Colin se fixaram em seu rosto... esses rasgos inesquecíveis que ficaram

gravados em sua memória no primeiro instante em que os viu em Vauxhall aquela remota noite do verão. Ele a

olhou incrédulo, e durante vários segundos pareceu que todo seu ser se aplacava, seu coração, sua respiração,

seu sangue. E, como ocorreu aquela primeira vez, desvaneceu-se todo o resto, a multidão, o ruído e as risadas,

deixando-os só aos dois. Enquanto a olhava, as palavras «Graças a Deus está viva» ressonaram em sua mente.

Já não ia vestida com farrapos como em Vauxhall, e nenhuma sujeira desfigurava sua tez, mas aqueles escuros

olhos resultavam inconfundíveis. Aquele queixo obstinado e quadrado, que mostrava uma profunda fenda,

como se os deuses tivessem apoiado ali um dedo. O pequeno nariz reto sobre aqueles lábios tremendamente

grossos e sedosos, muito grandes para seu rosto em forma de coração. Não possuía uma beleza convencional...

Suas feições resultavam muito desiguais, muito assimétricos. Mesmo assim, Colin encontrou seu insólito

aspecto irresistível, cativante, de uma forma que o deixou estupefacto. Entretanto, o que mais o desconcertou,

ainda mais que seu intento de roubá-lo, foi a forma em que o olhou.

Não esperava encontrar-se cara a cara com uma mulher, mas não era possível confundir com um moço à suja

marota a quem sujeitava. A série de emoções que reflectiu o rosto da moça enquanto ele a agarrava pelos

braços foi rápida e fugaz, embora inconfundível. Primeiro sobressalto. Embora ele a tinha surpreendido

tirando o relógio de ouro, só pôde fazê-lo graças a suas próprias habilidades nesse terreno. A jovem era muito

mão direita, e resultava claro que não estava acostumada a ser surpreendida.

O sobressalto deu passo a um medo inconfundível: a moça acreditava que ele ia fazer- lhe danco. Ambas as

reações eram compreensíveis. Mas logo piscou e o olhou fixamente durante uns segundos enquanto seus olhos

se alargavam com uma expressão de reconhecimento. E sussurrou as palavras «é você».

antes que pudesse interrogá-la, ela se libertou e pôs-se a correr como alma que leva o diabo. Ele a perseguiu,

mas a moça desapareceu como a fumaça entre a multidão. Seguiu procurando-a até que as franjas malva do

amanhecer pintaram o céu; aventurou-se a procurá-la inclusive pelos escuros e sujos becos e tugúrios do Saint

Giles, empurrado por razões que não entendia, para falar com ela.

O que significavam suas misteriosas palavras? Sabia que ele nunca a tinha visto antes; orgulhava-se de não

esquecer nunca uma cara, e seu semblante não era dos que se esquecem. Havia algo nela que o atraía, que

atirava dele de uma forma sem precedentes que não podia compreender. Enquanto a sujeitava durante aqueles

poucos segundos perturbadores, percebeu sua angústia e seu desespero. Ambas as emoções, junto com a fome

e a pobreza, desprendiam-se dela em feitas ondas. E logo aquele medo. Quase pôde cheirá-lo, e o coração se

encheu de compaixão. Roubava-o, e entretanto, de forma inexplicável, era ele quem desejava tranqüilizá-la, lhe

assegurar que não queria lhe fazer nenhum dano. E queria ajudá-la. Depois de perceber sua profunda angústia

e seu medo, desejou ter deixado que conseguisse o maldito relógio.

Seus dedos apertaram a taça de cristal esculpido. Colin apartou o olhar das chamas crepitantes para olhar o

líquido ambarino. Quantas vezes tinha pensado nela nos últimos quatro anos? mais das que podia contar.

Aqueles olhos o tinham obcecado, enquanto sua consciência o censurava por lhe negar algo que era para ele

uma bagatela fácil de substituir mas que para ela poderia ter suposto a diferença entre a sobrevivência e a

morte. Colin conhecia bem os diversos e terríveis destinos que aguardavam as mulheres que, como ela,

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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ganhavam a vida roubando, e o coração se encolhia cada vez que pensava nela, o que acontecia com muita

freqüência.

Quando mais pensava nela era pelas noites, acordado em sua cama, perguntando-se se seguiria com vida ou se

a teriam apanhado e enforcado. Ou se a teriam matado nas duras ruas de Londres, onde moravam ladrões e

carteiristas. Ou se se teria visto obrigada a entrar no pesadelo da prostituição. Perseguia-lhe a imagem dela

ferida ou algo pior, assim como o facto desconcertante mas inegável de que parecesse o conhecer. E ele não

tinha feito nada para ajudá-la. Tinha viajado a Londres três vezes desde aquela noite, e em cada ocasião passou

largas horas passeando pelo Vauxhall e as zonas mais sórdidas da cidade, umas vezes convertendo-se em um

objectivo fácil e outras se ocultando para observar furtivamente a multidão com a esperança de vê-la ou voltar

a ser sua vítima. Mas seus esforços tinham sido em vão.

Inclusive nesta última viagem, não tinha passado suas duas primeiras noites na cidade no Almack's, na ópera

nem em festas privadas em busca de sua futura esposa, a não ser percorrendo as ruas da cidade e vagando

pelas zonas pouco iluminadas do Vauxhall e Covent Garden no intento de localizá-la. Fracassou

estrepitosamente, e ambas as noites chegou a casa perturbado e entristecido pela terrível pobreza, o sofrimento

e a violência que tinha presenciado. A segunda noite evitou com muita dificuldade uma briga com um homem

gigantesco que deixou claro que não duvidaria em estripar Colin a fim de lhe tirar o dinheiro. Por fortuna, as

habilidades assassinas do gigante se viram muito reduzidas uma vez que Colin lhe tirou a faca. Quando

chegou a casa, compreendeu que sua busca era inútil e se rendeu por fim, acreditando que nunca voltaria a vê-

la.

Certamente, não esperava vê-la no salão de lady Malloran.

Não lhe cabia a menor duvida de que ela o tinha reconhecido, o que o enchia de uma fria satisfação, pois,

certamente, ele não a tinha esquecido. Não obstante, era evidente que a moça sabia ocultar suas emoções, um

rasgo que ele reconhecia com facilidade porque ele mesmo o tinha aperfeiçoado tempo atrás. Tinha visto a

piscada de pasmado reconhecimento em seus olhos, olhos que, graças à luz projectada pelas dúzias de velas

acesas, observou que eram do mesmo matiz que o chocolate fundido. A faísca de reconhecimento passou tão

depressa que foi quase imperceptível. Mas seus anos ao serviço da Coroa o haviam tornado muito observador

e lhe tinham proporcionado uma habilidade especial para ler os pensamentos da gente. Devia admitir que ela

recuperou em seguida, mas logo, ao igual ofez em Vauxhall, desapareceu entre a multidão. Ele a buscou, e

entretanto, como fizera quatro anos atrás, a jovem lhe escapou. Decidido a não perdê-la, saiu ao jardim,

sabendo que no final teria que sair da casa. E o tinha feito, através daquela janela.

Tinha-a visto pendurando do batente, e o coração deu um tombo enquanto confirmavam suas piores suspeita.

Estava claro que tramava algo, e estava claro que esse algo não era nada bom. Antes de que pudesse sequer

mover-se, a moça saltou ao chão. Para não delatar-se, Colin fingiu acreditar que ela tinha tropeçado.

E assim tinha começado o jogo entre eles.

Colin acomodou-se em seu assento e deu um comprido gole de conhaque. Admirava a forma em que tinha

recuperado seu aprumo e tinha seguido o jogo com ele. Era evidente que se sentia segura na crença de que não

a tinha reconhecido, e ele pensava deixar assim as coisas. Ao menos até que averiguasse o que tramava.

Olhou fixamente as chamas, desejando que seu vacilante núcleo vermelho e ouro pudesse lhe facilitar as

respostas que procurava. A aparição daquela mulher na festa dessa noite o intrigava e alarmava ao mesmo

tempo. Embora só estivesse em Londres há quatro dias, já tinha ouvido falar da célebre madame Larchmont e

de quão solicitados estavam seus serviços de tarot nas festas e em consultas privadas. Mas quantos dos

membros da alta sociedade, a cujos lares acudia como convidada, sabiam que quatro anos atrás madame

Larchmont roubava carteiras nas calçadas pouco iluminadas de Vauxhall?

—Apostaria a que não muitos —murmurou.

Assim, a questão era se a jovem tinha feito borrão e conta nova ou se seu trabalho de adivinhação era somente

um ardil para extorquir dinheiro aos enriquecidos convidados ou, pior ainda, roubar-lhes a carteira. Colin não

acreditou nem por um instante que de verdade pudesse dizer a sorte. Não acreditava que ninguém pudesse

predizer o futuro, com ou sem a ajuda de um baralho de cartas.

De todas formas, o tarot era um entretenimento, e aos profissionais do entretenimento se pagava por seus

serviços. Certamente, não seria ele quem regulasse a ela nem a ninguém a oportunidade ou o meio de ganhar a

vida honestamente. Entretanto, segundo sua experiência, a gente ocupada em actividades honradas não

estavam acostumados a sair das casas pelas janelas, e certamente, graças a seu trabalho para a Coroa, ele tinha

escapado de suficientes casa pelas janelas para sabê-lo. Em qualquer caso, estava decidido a averiguar se o

mero entretenimento era a única actividade que ocupava a madame Larchmont. Porque sabia muito bem que

aquela mulher tinha secredos. Como, por exemplo, onde vivia.

Suspeitou que não tinha dado sua verdadeira direção, uma suspeita que resultou ser acertada. Colin saiu da

sua carruagem no instante em que ela voltou a esquina do edifício de tijolo no que afirmava viver e a seguiu.

Embora era evidente que ela sabia orientar-se pelas ruas estreitas e serpenteantes, não ia atrás. A jovem

avançava depressa, e embora Colin tivesse que forçar a perna para não ficar muito atrasado, conseguiu não

perdê-la. Viu-a entrar em um edifício situado em uma zona da cidade cheia de comércios e pequenos

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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armazéns. O bairro não era nada elegante e muito distinto daquele no que tinha dito que vivia, mas não

deixava de ser respeitável. De todas as formas, uma mulher que mentia sobre o lugar em que vivia podia

mentir sobre qualquer outra coisa.

E ele pensava averiguar quais podiam ser essas outras coisas.

Dada a popularidade da jovem, sem dúvida tinha previsto assistir a mais festas nos dias sucessivos... festas às

que ele também estaria convidado e onde aproveitaria para procurar esposa. Seus caminhos se cruzariam com

frequência.

E, é obvio, faria uma tiragem no dia seguinte, em privado. Ali mesmo. Em sua casa. Onde a poderia observar

de perto, e à luz do dia, pela primeira vez.

Ao pensá-lo, assaltou-lhe um calor que nada tinha que ver com a proximidade da chaminé nem com o

conhaque que tinha tomado, e Colin franziu o cenho ante sua própria reação. A mesma reação que tinha

experimentado ao caminhar com ela pelo jardim dos Malloran, com a mão da jovem apoiada em seu próprio

braço e os ombros de ambos roçando-se. Logo, de novo, enquanto estava sentado frente a ela dentro da

carruagem. Era uma consciência quase dolorosa e acalorada que o fazia observar detalhes dela que teria

gostado não ver. Como as generosas curvas femininas ressaltadas por seu vestido de cor bronze. A forma em

que os raios de lua arrancavam brilhos de seus brilhantes cabelos escuros. As sardas que lhe cobriam o nariz. A

forma em que seus lábios recuperavam sua grossura depois de que os apertasse.

Seu delicioso aroma de laranjas doces. A fruta favorita dele.

Com um gemido, Colin fechou os olhos e inspirou como se queria captar sua fragrância. O delicado aroma da

jovem tinha atormentado seus sentidos durante toda a viagem em carruagem. Ao despedir-se, tinha sido

incapaz de resistir ao desejo de tocar sua pele com os lábios para ver se a jovem sabia tão deliciosa como

cheirava. Assim era. E, durante aquele breve beijo na pulso, Colin sentiu o pulsar rápido dela contra os lábios, a

única indicação de que não estava tão serena como parecia. Isso o agradou, porque detestava a idéia de ser o

único a sentir-se agitado. O único que lhe tinha impedido de ceder ao impulso entristecedor de voltar a tocar

sua pele com os lábios foi sua afirmação de ter marido, uma declaração que provocou nele uma desagradável

sensação, muito parecida com uma cãibra.

Que classe de homem era seu marido? Quanto tempo tinham de casados? Era um honrado comerciante ou um

ladrão? Conhecia as habilidades de ladra de carteira que tinha sua esposa? Ele também as possuía? Mais

pergunta para as que estava decidido a achar resposta. E precisava fazê-lo depressa porque a sensação de

morte iminente, que o assaltou pela primeira vez no mês anterior e que não o tinha abandonado após, se fazia

cada vez mais intensa, sobre tudo desde que estava em Londres.

Abriu os olhos, apurou a taça de conhaque e se levantou para se servir de outra. Enquanto vertia o líquido

ambarino, ficou olhando as chamas douradas e se fez a pergunta que o atormentava desde que o sonho

recorrente de sua própria morte tinha cansado sobre ele.

Quanto tempo ficava?

Exalou o ar, impaciente, passando-a mão pelo cabelo. Tinha tratado de convencer-se de que a sensação de

crescente perigo era produto de sua imaginação enlouquecida, ou simplesmente fruto do cansaço. Nada mais

que a melancolia que sempre o assaltava ao aproximar-se o aniversário da morte de sua mãe. Mas inclusive

depois de que passasse o triste dia, seguia sem poder livrar-se daquela sensação.

Então tinha começado o sonho ou, melhor dizendo, o pesadelo. Apanhado em um espaço escuro e estreito, com

o coração desbocado e os pulmões ardendo, sabendo com todo seu ser que o perigo estava perto. Morte

iminente. Despertando, suando frio, incapaz de voltar a dormir, com um nó na garganta pelo inexplicável

temor aos lugares fechados que sofria desde sua infância.

Tinha aprendido tempo atrás a escutar suas sensações e a confiar em seu instinto. Em realidade, durante seus

anos ao serviço da Coroa, seu instinto lhe tinha salvado a vida em mais de uma ocasião. Por isso não podia

ignorar a mensagem perturbadora que lhe sussurravam desde há um mês: algo mau lhe ía ocorrer . Algo que

não poderia evitar. Algo ao que provavelmente não sobreviveria. O sentimento se tornou mais pronunciado

desde sua chegada a Londres, e não se dissipou de modo algum por trás de seu enfrentamento com aquele

gigante da faca. Tinha conseguido escapar ao desastre naquele momento, mas seria igualmente afortunado a

próxima vez? Seu instinto lhe dizia que não, não o seria. E que o espreitavam mais perigos.

Tinha reflectido que talvez parte daquele profundo pressentimento se devesse a que ele tinha agora a mesma

idade que tinha sua mãe quando morreu, mas desprezou a idéia por considerá-la uma superstição. Não, ele

não era um homem supersticioso. Mas era um homem que escutava seu instinto.

A inegável sensação de sua própria mortalidade, do tempo que se esgotava, pesava muito sobre ele. Desde aí

sua premente necessidade de cumprir com seus deveres e obrigações, e imediatamente. Antes de que fosse

muito tarde. E o mais urgente desses deveres e obrigações era encontrar uma esposa e engendrar um herdeiro.

Seu sentido comum tratava de lhe dizer que se equivocava, que não lhe ocorreria nada e que viveria até

alcançar uma idade avançada. Certamente, essa era sua esperança. Mas não havia forma de negar aquela

sensação funesta da que não podia livrar-se, e não era um risco que estivesse disposto a assumir.

Sobre tudo porque, em caso que encontrasse uma morte prematura, Nathan herdaria o título e tudo o que o

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acompanhava. Mas como ele sabia, era o última coisa que seu irmãomais novo teria desejado, e portanto era

quão último Colin teria desejado para ele. Nathan sempre tinha evitado a pompa da alta sociedade,

prefiriendo centrar sua atenção e seu talento na medicina, e era um bom médico. Desejava o título tanto como

teria querido que lhe arrancassem as vísceras com uma colher oxidada.

Não, a responsabilidade de engendrar um herdeiro correspondia a Colin. Agora só desejava ter completo essa

obrigação sendo mais jovem. Antes que aquela sensação de urgência o agarrasse pelo pescoço. Quando ainda

havia tempo. É obvio, um mês atrás, acreditava ter todo o tempo do mundo...

Ao levantar os olhos seu olhar tropeçou com a escreveninha de cerejeira, e recordou o que Ellis lhe havia dito

sobre uma carta. Depois de apoiar a taça vazia sobre a mesa, cruzou a habitação e agarrou o papel cavalinho

dobrado, de cor marfim e selado com um pouco de lacre vermelho. Arqueou as sobrancelhas ao ver seu nome

escrito na cara externa com os inconfundíveis traços vigorosos do Nathan. Resultava assombroso que seu

irmão achasse tempo para escrever uma carta, levando somente sete meses casado e todo isso. Certamente, se

Colin tivesse a sorte de ter uma mulher como a muito bela Vitória, da que Nathan estava apaixonadamente

apaixonado, Deus sabia que não esbanjaria o tempo escrevendo cartas.

Depois de romper o selo de lacre, leu a breve nota:

Chegarei à cidade depois de amanhã, em lugar da semana que vem, com Vitória e vários amigos nas costas.

Iremos ficar alojados na casa do Wexhall, pois a minha mulher tem previsto ajudar o seu pai com os

preparativos de sua festa. Quando chegarmos vamos te fazer uma visita.

NATHAN

Assaltou-lhe o mesmo sentimento de culpa persistente que sempre albergava ao pensar em Nathan, mas o

separou de si para centrar-se em quão agradável seria voltar a ver seu irmão. Dobrou a nota e logo dirigiu sua

atenção ao pequeno prato azul e branco de porcelana de Sèvres que descansava em uma esquina do escritório.

Um sorriso curvou seus lábios à vista do trio de deliciosos mazapanes, cada um uma obra de arte em miniatura

modelada em perfeita imitação de uma fruta. Observou as variedades dessa noite: um morango, uma pêra Y...

Uma laranja.

Sua eleição não oferecia a menor duvida.

Esticou a mão, agarrou a apetitosa laranja e a levou à boca. Fechou os olhos e saboreou a doçura de fruta e

amêndoa que escorregava por sua língua, enquanto a imagem da misteriosa madame Larchmont lhe ocupava a

mente.

Aquela mulher era um enigma e atuava de forma pouco clara, mas Colin era especialista em desvendar,

mistérios e nunca tinha resistido a nenhum. Estava decidido a obter resposta a muitas de suas perguntas, até

antes que a jovem viesse no dia seguinte.

Que a mulher não só estivesse viva mas sim parecesse prosperar indicava que possuía inteligência e sorte em

abundância. Mas Colin jurou que esta vez tinha encontrado a fôrma de seu sapato. E, se se dedicava a alguma

classe de roubo, sua sorte estava a ponto de acabar.

Alex avançou depressa através de uma série de becos e logo subiu correndo os degraus gastos até o segundo

piso do edifício em que vivia. Depois de deitarar uma olhada ao escuro corredor para assegurar-se de que

estava sozinha, introduziu a chave e abriu em silêncio a porta de seu piso. Deslizou-se no interior e fechou a

porta detrás de si sem perder um momento. Logo se apoiou contra a madeira áspera e fechou os olhos. Sua

respiração agitada queimava os pulmões, e o coração pulsava desbocado, não só por sua pressa, mas também

pela inquietante sensação de que alguém a vigiava e a tinha seguido enquanto se dirigia a casa, após

abandonar a carruagem de lorde Sutton. Estava acostumada à presença de ladrões e rufiões, e sabia evitá-los.

Também sabia defender-se, se evitá-los era impossível. Seus dedos roçaram o vulto de sua saia, onde escondia

uma faca embainhada e metido na liga.

Mas o que tinha experimentado essa noite era distinto. A entristecedora sensação de que a vigiavam e lhe

seguiam os passos a tinha atormentado ao longo de todo o caminho até casa, produzindolhe calafrios. Uns

calafrios especialmente agudos depois da conversa que tinha surpreendido essa noite no estudio de lorde

Malloran. Quem a tinha em seu ponto de olhe, sabia permanecer ocultos, mas ela tinha vivido nas ruas dos

bairros mais pobres de Londres muito tempo para não saber quando a estavam observando.

—Encontra-te bem, Alex?

Abriu os olhos para ouvir a pergunta, formulada em voz baixa, e se encontrou com os olhos azuis da Emma,

cheios de preocupação.

Embora só tivesse dezessete anos, seis menos que Alex, Emma Bagwell era muito esperta e perspicaz graças a

seu conhecimento dos baixos recursos de Londres. encontraram-se fazia três anos e, juntas, tinham conseguido

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sobreviver e deixar para trás o lugar de que procediam.

Alex compreendeu que não só era inútil tratar de ocultar um segredo a sua tenaz amiga, mas sim além disso

precisava confiar-lhe os detalhes daquela perturbadora noite.

—Há algo que me inquieta, mas antes de contar isso interrompeu-se, indicando com a cabeça a cortina

desbotada de veludo azul que isolava uma parte da habitação—. Quantos temos esta noite?

Emma olhou a cortina.

—Oito.

Oito. A noite anterior foram seis, e a de antes, doze. Na terça-feira da semana anterior tinham feito espaço para

dezessete.

—Está Robbie?

Emma assentiu.

—foi o último em chegar, faz uma hora mais ou menos. Muito sujo e esgotado. Logo que pôde manter-se

acordado o tempo suficiente para jantar —explicou, com um brilho de cólera no olhar—. Estava mais que sujo,

Alex. Pegaram-no.

Alex se agarrou à capa com força.

—Como vai?

—Tem um olho inchado e o lábio arrebentado. Limpei-o, mas deveria jogar uma olhada. Perguntou por ti.

—De acordo —murmurou—. O farei agora, porque partirá antes que despertemos.

—É como um fantasma —conveio Emma, assentindo—. Todo o som assim. Acrescentarei mais água ao

hervidor e prepararei chá para as duas.

—Obrigado.

Alex cruzou a habitação e pendurou a capa no desmantelado armário que compartilhava com a Emma.

Inclusive com a roupa de ambas, havia espaço de sobras. Sabendo que Robbie e os outros estavam já

adormecidos, tomou uns minutos para tirar o vestido e logo, sem perder um momento, ficou sua singela

camisola de algodão. Atou-se o cinturão da bata e se dirigiu à cortina de veludo. Levava dois anos fazendo

aquilo, por isso sabia o que encontraria; mesmo assim, inspirou para preparar-se antes de afastar o pesado

tecido.

Aguardou um momento que sua vista se adaptasse à escuridão, e pouco a pouco se fizeram mais visíveis. Oito

deles essa noite, cada um envolto no único consolo que tinham conhecido jamais: uma manta. Seu olhar

percorreu suas formas adormecidas. Por muitas noites que os visse ali, cada noite lhe rompiam o coração.

Reconheceu ao Will e Kenneth, Dobbs, Johnny e Douglas. E ali, no rincão, jazia Mary, e junto a ela, Lilith.

Todos dormiam sobre os jergones que se guardavam enrolados no rincão, preparados para eles. Cada menino

parecia um pequeno anjo ferido. E isso eram para Alex, pois nenhum deles tinha mais de doze anos. Todos

estavam seguros durante umas horas no refúgio que seu pobre lar proporcionava, mas o amanhecer chegaria

rapidamente, e eles abandonariam aquele santuário para voltar para inferno que os aguardava nas ruas e becos

hostis onde passavam os dias.

Por último, seu olhar deu com o Robbie e, como lhe ocorria cada vez que o via, lhe encolheu o coração, sobre

tudo nesse instante que a débil luz do fogo que ardia devagar na habitação principal lhe iluminava o olho

machucado e o lábio inferior arrebentado. Todos aqueles meninos, e muitos mais como eles, órfãos ou

abandonados, vítimas da intensa pobreza, os maus entendimentos e umas condições de vida horríveis,

rompiam-lhe o coração, mas havia algo em Robbie que a comovia ainda mais. Talvez porque recordava a si

mesma na sua idade. Um molho de medo tremente envolto em capas de falsa fanfarronice.

Lágrimas de ira, frustração e profunda compaixão pugnaram por brotar de seus olhos. Pelo amor de Deus, logo

que tinha seis anos.

Uma mecha de seu cabelo claro, sujo de fuligem, caía-lhe sobre a frente, e os dedos do Alex desejavam apartar-

lhe Mas sabia que, se o tocava, o mais provável era que despertasse. Por necessidade, devido ao lugar e à forma

em que viviam, todos os meninos tinham um sonho ligeiro. Se dormiam muito profundamente, qualquer classe

de horror podia cair sobre eles. Alex seguia tendo um sonho ligeiro e nunca dormia muitas horas seguidas. Os

meninos dormiam melhor ali, sabendo que estavam seguros por umas horas. Por isso, embora Alex desejasse

aproximar-se, Robbie necessitava o sonho mais do que ela precisava tocá-lo e arriscar-se a assustá-lo.

Depois de um último olhar, deixou cair a cortina e se dirigiu para a zona da cozinha, onde Emma servia o chá

em grosas taças de louça. sentou-se no comprido banco de madeira, de repente fatigada e sem energias. O

aroma de laranjas e madalenas recém assadas flutuava na habitação.

—Obrigado por te ocupar do forno esta noite —disse com um sorriso cansado, em voz baixa para não

despertar os meninos.

—De nada —respondeu Emma, apresentando com um floreio uma bandeja em que havia uma só bolacha—. Te

guardei uma.

Ante aquele detalhe Alex lhe fez um nó na garganta. Emma conhecia sua debilidade pelos doces, uma

debilidade que ela mesma compartilhava. Esticou o braço, partiu a bolacha pela metade e deu a sua amiga o

pedaço maior.

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—Sinto te deixar a ti todas as tarefas.

—Não diga tolices —disse Emma, colocando uma taça fumegante diante de seu amiga—. Para mim é um

prazer, e é mais importante que madame Larchmont empregue suas habilidades para jogar as cartas às pessoas

rica e elegante. Graças ao dinheiro extra que está ganhando, poderemos nos mudar a um sítio maior, melhor e

mais seguro, e antes do que esperávamos. Então poderá começar a os ensinar.

Sim, tinha trabalhado muito para conseguir um sítio maior, melhor e mais seguro para ela mesma, Emma e os

meninos que confiavam nelas, que iam a elas em busca de amparo. Estava decidida a obtê-lo. Por fim tinha

podido albergar a esperança de obtê-lo com o recente êxito de sua identidade como madame Larchmont.

—Isso espero —disse—, mas já sabe quão inconstante pode ser a gente da alta sociedade, o logo que se

aborrece e o pouco que demora em passar ao seguinte entretenimento. Agora estou muito solicitada, mas não

me faço ilusões de que minha atual popularidade dure mais à frente do fim da temporada.

—Então, nos asseguremos de que te forra esta temporada —disse Emma, olhando-a por cima do bordo de sua

taça fumegante.

—Isso espero também... mas... bom, ambas sabemos que a carreira de madame Larchmont se acabaria se os

membros da alta sociedade que agora pedem a vozes seus serviços descobrissem seu passado.

O olhar da Emma se fez mais perspicaz.

—Diz isso como se houvesse algum motivo para pensar que poderiam fazê-lo.

Ela envolveu a taça com as mãos, absorvendo o calor com seus dedos, de repente frios.

—Emma, esta noite encontrei a um homem. É... ele.

Emma piscou duas vezes, confusa, mas logo os olhos se alargaram ao compreender.

—Ele? O homem que saía em suas cartas?

—Sim —assentiu.

—Está segura?

—Estou-o.

Emma não perguntou como sabia Alex que aquele era o homem que tinha desempenhado uma função tão

destacada em suas tiragens ao longo dos anos; não sentiu saudades, pois estava acostumada a sua «intuição»,

assim assentiu pensativa.

—Vá, demorou muito em chegar —disse—. Quem é?

—chama-se Colin Oliver —disse, negando-se a reconhecer o calafrio que a percorreu ao dizer seu nome em voz

alta—. Leva o título de visconde Sutton.

Emma ficou boquiaberta.

—Um visconde? —repetiu, sacudindo a cabeça—. Deves te ter equivocado de tipo. Suas cartas diziam que esse

homem teria uma função destacada em seu futuro, que te influiria muito. Como poderia referir-se isso a um

visconde?

Emma desenhou uma Ou com a boca e levou as pontas dos dedos aos lábios.

—OH! A menos que queira que seja... a menos que tenha pensado ser seu... querida.

Alex se sentiu acalorada de repente, o que atribuiu imediatamente ao vapor que desprendia o chá quente, e

afastou a taça.

—Não, claro que não —sussurrou.

—Então do que outra maneira poderia ter um homem assim uma função em seu futuro? Além disso, supõe-se

que o homem das cartas é alguém que já conheceu anos atrás —disse Emma, sacudindo a cabeça com decisão.

Um cacho de cor mogno se desprendeu da trança—. Não, não é ele, Alex.

—Sim, é-o. Eu... já o tinha visto uma vez. Roubei-o.

—Como pode estar segura de que é o mesmo tipo? Todos esses ricaços parecem iguais na escuridão. Sempre

bebidos e cheios de si mesmos. Primos, isso é o que são.

—O que eram —sublinhou essa Alex era nossa antiga profissão. E o recordo muito bem porque me

surpreendeu.

—Surpreendeu-te? —repetiu Emma em um sussurro incrédulo—. Mas nunca a surpreendiam! Foi a melhor!

—Embora agradeça sua valoração de minhas antigas aptidões, asseguro-te que me surpreendeu. Consegui

escapar e nunca voltei a vê-lo. Até esta noite.

Emma captou as repercussões imediatamente.

—Deus do céu! Reconheceu-te?

Incapaz de permanecer sentada, Alex se levantou e ficou a caminhar por diante da mesa.

—Não sei. Não acredito, mas...

Sacudiu a cabeça e logo contou a Emma todos os acontecimentos da noite, incluindo a conversação que tinha

ouvido e a nota que tinha deixado para lorde Malloran. Os únicos detalhes que omitiu foram as sensações que

lhe provocou lorde Sutton e a forma em que lhe beijou o pulso.

—Amanhã pela tarde lhe farei uma tiragem em privado, em sua casa. Ou, melhor dizendo, hoje.

Emma a olhou inquieta.

—Não sei o que me preocupa mais, Alex, que volte a ver esse visconde, coisa que em minha opinião é meter-se

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na boca do lobo, ou a conversação que ouviste. E se alguém averigua que está inteirada e que foste tu quem

escreveu a nota?

—Como poderia averiguá-lo ninguém? disfarcei minha letra deliberadamente. Ninguém perderá o tempo

tratando de descobrir quem escreveu a nota. Estarão muito ocupados tentando saber quem vai ser assassinado

na festa de lorde Wexhall e evitando que ocorra.

Apesar de suas palavras, Emma seguia inquieta.

—Espero que tenha razão.

Eu também, pensou Alex. Eu também.

Capítulo IV

Colin se encontrava na escuridão que lhe brindava um portal situado em uma estreita rua de paralelepípedos,

frente ao edifício até onde tinha seguido madame Larchmont a noite anterior. À luz do dia, o tijolo coberto de

fuligem parecia pouco atractivo, e ainda mais sinistro devido às nuvens cinzas que flutuavam descendo no céu

de cor acinzentada.

Pelas observações que fez a noite anterior depois que ela entrasse no edifício, as sombras que se moviam ao

outro lado da janela na terceira habitação do segundo piso indicavam que aquele era seu destino. Duas pessoas

tinham saído do edifício no último quarto de hora, mas até o momento não havia nem rasto de madame

Larchmont. Tirou o relógio de bolso e olhou a hora. Eram duas e meia. Seria possível que já tivesse partido

para ir a sua entrevista das três?

Uma jovem ruiva saiu do edifício, e Colin entreabriu as pálpebras. Não era sua presa. A moça, vestida com um

singelo vestido marrom, levava uma caixa plaina que lhe pendurava por debaixo da cintura, sujeita com umas

correias. Era a classe de recipiente que utilizavam as vendedoras de laranjas, embora pelo que Colin podia ver

o que levava não eram laranjas. Pareciam ser bolos ou madalenas.

Transcorreram outros dez minutos, que Colin passou esperando com paciência o momento oportuno. Acabava

de olhar de novo o relógio quando a viu sair do edifício. Embora um gorro de asa larga lhe protegesse os olhos

do sol, a moça resultava inconfundível. Levava uma bolsa que parecia uma mochila. Ao vê-la, Colin franziu o

cenho. Lhe entrecortou o fôlego, e seu coração executou uma estranha manobra. A jovem vacilou durante

vários segundos olhando a seu redor, e ele se afundou mais ainda na escuridão. Logo a moça ficou a caminhar

a bom passo, avançando em direção oposta à casa dele.

Ao igual à noite anterior, ela se movia com a segurança de alguém familiarizado com a zona. Ao cabo de uns

dez minutos, aproximou-se de um edifício médio desmantelado, justo na periferia dos baixos recursos. Quatro

cristaleiras, três deles tampadas, cobriam o piso inferiora. Um pôster manchado com uma jarra de cerveja mau

grafite que anunciava O Barril Quebrado marcava a quarta porta. A jovem entrou no botequim e saiu cinco

minutos depois, já sem mochila. antes de pôr-se a andar voltou a olhar a seu redor, e Colin se perguntou se o

faria normalmente ou se intuía sua presença. A causa podia ser simplesmente o pouco recomendável da zona,

pois Colin também sentia o peso de outros olhos sobre ele. depois de jogar por sua vez uma olhada em redor e

não detectou ninguém, seguiu-a durante vários minutos mais. Quando ficou claro que não voltava para sua

casa mas sim se dirigia ao Mayfair, Colin voltou sobre seus passos. Na esquina do edifício no que vivia a moça

se deteve um momento para esfregar a coxa dolorida.

Depois de comprovar que ninguém o observava, Colin entrou no edifício. Um aroma de couve e suor invadia o

ar enquanto subia em silencio pela escada. Vozes afogadas e o som do pranto de um menino flutuaram para

baixo. Quando chegou ao segundo piso, deteve-se na terceira porta e apoiou a orelha na fresta, atento se por

acaso ouvia vozes, enquanto seus dedos ágeis manipulavam a fechadura. Ao não ouvir nada, e convencido de

que a habitação estava vazia, abriu a porta e se deslizou em silencio no interior.

Apoiou-se de costas contra a porta e permaneceu imóvel durante vários segundos, observando os detalhes. A

habitação era maior do que esperava, embora pouco espaçosa, e estava muito limpa. Cheirou o ar e percebeu

os aromas agradáveis de laranjas e madalenas recém assadas. O chão de madeira estava coberto de tapetes

feitos com o que pareciam tiras trancadas de tecido. Havia um só roupeiro no rincão, flanqueado por duas

camas estreitas. Um gato de raias cinzas jazia acurrucado em um extremo da cama mais próxima à janela.

Havia uma mesita junto a cada cama, um banho de assento em um rincão e uma só penteadeira contra a

parede. Ao outro lado da habitação estava a zona da cozinha, com uma mesa e dois bancos. Uma cortina

desbotada de veludo azul isolava uma parte da habitação. Outra zona para dormir?

Colin se aproximou do roupeiro sem fazer ruído. Ao abrir a porta, seus sentidos se viram assaltados

imediatamente por um delicado aroma cítrico. De repente surgiu em sua mente a imagem de madame

Larchmont, avaliando-o com seus olhos marrom chocolate e a ponto de falar com aqueles lábios grossos. O

olhar do Colin se fixou em um familiar vestido de cor bronze. Alargou o braço e passou os dedos pela malha,

recordando como parecia brilhar contra a pele clara dela. antes de poder deter-se, inclinou-se para diante,

levou-se o tecido ao rosto e aspirou.

Laranjas. E algo mais, algo agradável que so lhe ocorria qualificar de fresco. Certamente eram os restos de seu

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sabão. Fechou os olhos e outra imagem dela se materializou em sua mente. A jovem saía do banho e uma

esteira de pompas de sabão serpenteava por sua silhueta húmida e brilhante. Em seguida se sentiu invadido

pelo calor e abriu os olhos. Gemeu enojado de si mesmo e deixou cair a malha como se queimasse.

Uma busca rápida pelo roupeiro revelou outro vestido verde escuro que parecia próprio de madame

Larchmont e um singelo vestido de dia marrom que mostrava os signos do passado do tempo, mas cuidado de

forma meticulosa. No outro extremo do roupeiro viu dois vestidos cinzas. Ao igual aos outros, estes eram

velhos embora bem remendados, mas eram ao menos dez centímetros mais curtos que os outros vestidos. Não

havia nem um só objecto masculino em alguma parte.

Enquanto assimilava essa interessante informação, dirigiu sua atenção às mesitas. Em ambas havia pratos

lascados com velas de sebo. Na mesita mais próxima à janela, um livro descansava junto à vela. Colin leu o

título: Orgulho e Preconceito. A outra mesita continha também um livro de aspecto similar aos blocos de papel

utilizados pelos estudantes. Agarrou-o e folheou as páginas cheias de letras e números copiados

cuidadosamente, embora com letra infantil. Depois de devolver o livro a seu lugar, jogou uma olhada ao gato,

que se tinha despertado e o obsequiava com um olhar feroz e receoso.

—Boa tarde —sussurrou Colin, dando um lento passo para o animal. Em um abrir e fechar de olhos, o gato se

meteu debaixo da cama.

Colin não desejava assustar ao animal e seguiu adiante, cruzando o tapete feito à mão para inspecionar a zona

da cozinha. Havia umas laranjas empilhadas em forma de pirâmide, e faltava a de cima. Um ligeiro som captou

sua atenção, e Colin voltou a cabeça para olhar a cortina de veludo azul. O gato? Com movimentos silenciosos

e precavidos se aproximou da cortina e a apartou com a velocidade do raio, para descobrir uma pequena zona

vazia salvo por uma pilha de jergones enrolados em um rincão.

E um menino que tentava escapar por uma trampilla aberta no chão.

Seus olhares se encontraram, e, por um instante, nos olhos do menino surgiu um brilho de puro terror. Colin

correu para diante e agarrou a porta antes de que se fechasse. Continuando, agarrou bruscamente ao guri pelo

pescoço da roupa.

—me solte, maldito bastardo! —exclamou uma voz em que vibrava a ofensa e um medo inconfundível. Uns

braços fracos metidos em um casaco muito sujo se agitavam furiosamente enquanto umas pernas magras

embainhadas em umas calças andrajosas e uns sapatos quebrados e cheios de buracos tratavam de golpear

algo—. me Solte ou te abro em canal, juro-lhe isso!

face às valentes palavras, Colin pôde ver que a criatura, que parecia ser um menino de uns cinco ou seis anos,

estava aterrada.

—Não faz falta que me abra em canal —disse Colin em tom suave, colocando ao menino de pé.

Este se esforçou para afastar-se dele, mas Colin o sujeitava com firmeza pelos ombros. O menino ficou quieto e

o olhou furioso com os olhos entreabertos. Ante aquela cara suja, a Colin lhe caiu a alma aos pés. Logo, ao ver

as contusões sob a sujeira, apertou a mandíbula. Demônios, alguém tinha golpeado a aquele menino.

—Quem é e o que faz aqui? —exigiu saber o menino—. Acreditae que deixarei que roube à senhorita Alex e à

senhorita Emmie, está muito equivocado.

Colin arrancou seu olhar da repugnante visão do cardeal que rodeava o olho da criatura e se encontrou

olhando o vulto redondo que havia no bolso do menino.

—Refere-te a lhes roubar uma laranja, como faz você?

O menino se ruborizou sob a sujeira e as contusões.

—Não roubo. Deixam-nas para mim. Além disso, só agarrei uma —disse o menino, olhando as mãos do Colin,

que o agarravam pelos braços. Em seus olhos escuros se desenhou um medo inegável e tragou saliva—. Eu

tenho permissão para estar aqui. Você não.

Aquela oscilação de medo comoveu ao Colin.

—Não vou te fazer dano —disse em tom suave.

—por que não o demonstra me tirando as mãos de cima? —disse o menino, com um desprezo que Colin não

pôde evitar admirar.

—Se o fizer, terá que responder umas quantas perguntas.

—por que deveria fazê-lo?

—Porque aqui há um xelim para ti se o fizer.

Os olhos do menino se alargaram um instante, antes de adotar uma expressão ardilosa. Seu olhar se deslizou

pela roupa do Colin, feita a medida.

—Um tipo como você pode pagar mais.

Colin o soltou com uma mão e se tirou do bolso do colete uma moeda de ouro. O menino abriu muito os olhos.

—Muito bem —acessou ele, sujeitando a moeda entre os dedos—. Um soberano por suas respostas.

—Só por respostas? Nada mais? —perguntou o guri, olhando a moeda.

A Colin se encolheu o estômago ante as horrendas implicações da pergunta suspicaz do menino.

—Só por respostas. Tem minha palavra.

Estava claro que a palavra de um homem significava pouco para aquela criatura.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Não deixarei que faça mal à senhorita Alex ou à senhorita Emmie.

—Não tenho nenhuma intenção de lhes fazer dano. Outra vez te dou minha palavra.

O menino reflectiu durante uns segundos. A seguir sacudiu a cabeça e estendeu sua mão imunda.

—Primeiro a moeda.

—Primeiro uma pergunta, como mostra de boa fé, e logo te darei a moeda.

O menino apertou os lábios e logo assentiu.

—De onde conhece a senhorita Alex?

—É minha amiga —respondeu, estendendo a mão outra vez—. Minha moeda.

Colin jogou para cima a peça de ouro. O menino a agarrou no ar e logo, como um raio, lançou-se para a porta.

Colin o olhou partir sem persegui-lo. Muito transtornado, aproximou-se devagar à porta, fechou-a e correu o

ferrolho, rechaçando as dúzias de perguntas que lhe bombardeavam a respeito da criatura e «a senhorita Alex

e a senhorita Emmie». Mais tarde. Já teria tempo de meditar mais tarde.

Retornou à habitação detrás da cortina de veludo. depois de levantar a trampilla, descendeu devagar por uma

tosca escada de madeira. Fazia frio, estava escuro e cheirava a humidade. Quando alcançou o extremo da

escada, teve que avançar a provas por um estreito corredor, guiado somente por uma débil luz procedente de

um buraco situado uns dez metros diante dele. Quando alcançou a luz, deu-se conta de que provinha de uma

porta que parecia tampada. Aproximou o olho à fresta e viu o que parecia ser um beco deserto. Tratou de abrir

a porta, mas fracassou. Estava claro que era uma entrada, o que significava que tinha que haver uma saída.

Mediu com cuidado a seu redor e ao cabo de uns minutos localizou uma parte de corda perto da parte superior

da porta. Ao atirar dele ouviu um chiado afogado, como se algo se estivesse levantando o outro lado da porta,

e observou que tinha entrado um pouco mais de luz no corredor, perto do chão. agachou-se e viu uma

abertura. Baixou um pouco a corda e a abertura ficou coberta. Era uma abertura do tamanho suficiente para

que passasse por ela uma criatura, mas não um homem.

Soltou a corda devagar, observando como o raio de luz exterior minguava até quase desaparecer, e a seguir

retornou pelo corredor e voltou a subir a escada. depois de espionar prudentemente através da trampilla para

assegurar-se de que ninguém tinha entrado no piso, saiu em seguida, e logo fez uso das habilidades que tão

úteis lhe resultaram em seus tempos de espião para fechar a porta do exterior. menos de um minuto depois,

saiu à rua e começou a caminhar a bom passo para o Hyde Park.

Sem deixar de caminhar, consultou seu relógio de bolso. Madame Larchmont tinha que chegar a casa dele a

essa mesma hora. Embora a breve olhada que tinha jogado à vida da jovem lhe tinha proporcionado a resposta

a algumas de suas perguntas, por outra parte tinha engendrado dúzias de dúvidas mais. Quem era esse

menino? Havia dito que a senhorita Alex era sua amiga. Vivia ali? À margem do próprio menino, não tinha

encontrado indício algum da presença de um menino, nem roupa nem brinquedos. Como tampouco tinha

encontrado indício algum da presença de um homem. Quem era aquela «senhorita Emmie» que tinha

mencionado o menino? Outra peça mais do misterioso quebra-cabeças que compunha madame Larchmont.

Chegou a casa vinte minutos depois e foi recebido pelo Ellis.

—Está aqui? —perguntou Colin.

—Sim, senhor. chegou às quatro em ponto. Tal como ordenou, pedi-lhe desculpas de sua parte por não estar

disponível em seguida e servi-lhe chá no salão. Espera-o ali.

—Obrigado.

Colin pôs-se a andar com grandes passadas, pelo corredor revestido de madeira enquanto arrumava os

punhos e a jaqueta deteve-se um momento na soleira do salão e, ao vê-la, ficou imóvel.

Estava de pé ante a lareira, olhando o retrato que pendurava sobre a chaminé de mármore branco. Um alegre

fogo esquentava a sala, dissipando o tenebroso cinza que entrava pelas janelas situadas nas costas da jovem.

Ao observar seu perfil, Colin se fixou na ligeira inclinação do nariz e no gracioso arco que formava seu pescoço

ao olhar para cima. Diferente da noite anterior, levava o cabelo sujeito em um singelo coque, com um par de

cachos soltos, brilhantes e escuros, que repousavam sobre seu ombro. Seu vestido de dia, de cor verde clara,

ressaltava a textura cremosa de sua pele, e cobriam suas mãos umas luvas de encaixe similares aos que levava a

véspera. Tudo nela tinha um aspecto suave e feminino, e os dedos do Colin se crisparam com o vivo desejo de

tocá-la para descobrir se era tão suave como parecia.

O olhar de Colin percorreu a silhueta dela e, embora o vestido fosse recatado, sua imaginação evocou umas

exuberantes curva femininas. A moça trocou de posição, inclinando a cabeça para a esquerda, e isso atraiu a

atenção dele mais acima. A jovem humedeceu os lábios com a língua, e o corpo do Colin se esticou com um

desejo inconfundível. Como se estivesse em transe, encontrou-se imitando a acção. Sua imaginação acesa ardia

com a imagem mental de sua própria língua roçando o grosso lábio inferior dela enquanto suas mãos

exploravam as exuberantes curva que insinuavam o vestido.

Uma pequena parte de objectividade voltou para a vida e o advertiu que semelhantes pensamentos a respeito

daquela mulher —uma mulher que no melhor dos casos era uma benjamima, e que provavelmente o seguia

sendo— eram de tudo inadequados, mas não havia forma de deter as imagens sensuais que o bombardeavam.

Justo então, ela se voltou e seus olhares se encontraram. Colin tratou de dissimular, embora ao ver que a jovem

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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abria um pouco os olhos supôs que devia ficar em sua expressão algum resto de seus pensamentos. Como em

cada ocasião em que seus olhares se uniam, sentiu-se ligeiramente desestabilizado, um fenômeno misterioso

que nem entendia nem gostava.

A expressão da moça se suavizou e, com ar imperturbável, inclinou a cabeça.

—Boa tarde, lorde Sutton.

Quando Colin foi abrir a boca para falar, observou com chateio que sua boca já estava aberta e que continha o

fôlego. Diabos. O efeito que aquela mulher tinha nele era simplesmente... impossível. Nunca tinha permitido

que suas paixões o escravizassem —ele as controlava a elas, e não ao reverso—, e não ia começar agora.

Apertou os lábios, adotou uma expressão de pesar e se aproximou dela.

—Madame Larchmont, desculpe-me por fazê-la esperar. Entretiveram-me sem que pudesse evitá-lo.

Deteve-se ante ela e se inclinou em um gesto formal, irracionalmente decepcionado ao ver que não lhe oferecia

a mão. —Como me ofereceram um ambiente tão agradável e um chá tão delicioso para entreter a espera, não

me queixarei, senhor respondeu a jovem com um sorriso—. Ao menos, não muito.

Colin jogou um olhar ao jogo de chá de prata colocado sobre a mesa de cerejeira situada diante do sofá, e

observou o vazio e os miolos diminutos que ficavam no prato.

— Aceita outra taça de chá? Mais pasta?

—Não posso recusar a oferta. As massas estavam deliciosas —respondeu, voltando a sorrir. Seus lábios grossos

e encarnados fascinavam Colin—. A verdade é que eu adoro doces.

Pelo amor de Deus, estava embevecido como se nunca tivesse visto uns lábios. Muito aborrecido consigo

mesmo, obrigou-se a olhá-la aos olhos, só para sentir-se distraído ao ver que sua íris estavam salpicadas de

matizes de um marrom mais claro, como chocolate orvalhado com canela. Vá. Ele sentia especial afeição pelo

chocolate orvalhado com canela.

esclareceu-se garganta.

—adora os doces... Isso é algo que temos em comum. Sente-se, por favor —rogou, assinalando o sofá.

A jovem voltou-se e passou junto a ele, deixando um aroma de laranjas a seu passo. A Colin quase lhe fez a

boca de água.

—Quais são seus favoritos? —perguntou ela enquanto se acomodava sobre a almofada de brocado.

—Meus favoritos?

—Doces. eu adoro os bolos cristalizados, e sinto debilidade pelo chocolate.

—Eu não diria que não nem a uma coisa nem a outra.

Nem a nada que te pudesse encantar..., acrescentou em sua mente.

Reprimindo um gemido envergonhado por seus caprichosos pensamentos, Colin se acomodou na poltrona de

couro situada frente a ela. Agora os separava mais de metro e meio e uma mesa. Excelente.

—Também sinto debilidade pelo mazapán.

A moça fechou os olhos e emitiu um som que só podia descrever-se como um ronronar.

—Mazapán —disse em tom suave e reverente.

Colin observou como seus lábios formavam a palavra e ficou paralisado, na necessidade de remover-se em seu

assento. Tinha idéia de quão excitada parecia? Seus olhos se abriram devagar e o olharam fixamente.

—Sim, é uma maravilha —murmurou com uma voz rouca que não serviu para dissipar o desconforto que

tinha lugar nas calças do Colin—. Sobre tudo com uma taça de chocolate.

—Estou de acordo. Resulta que esse é meu lanche favorito antes de me deitar.

A moça arqueou as sobrancelhas.

—De verdade? Não é conhaque ou Porto e um puro?

—Não, temo-me que para mim é chocolate e mazapán.

Ela sorriu.

—Que pouco elegante, senhor —opinou enquanto inclinava a cabeça para o serviço de chá—. O sirvo?

—Sim, obrigado.

Colin se apoiou no respaldo e a olhou servir com uma habilidade que não deixava adivinhar que tivesse

passado o tempo roubando carteiras em lugar de tomar lições de urbanidade. Parecia muito tranq uila e

relaxada, cômoda em sua presença, algo que o irritava mais do que teria gostado de reconhecer, pois ele tinha

que esforçar-se por manter uma aparência de calma. O certo era que, apesar de suas suspeitas a respeito das

motivações dela, não podia deixar de admirar sua aparente serenidade. Embora essa era uma característica

excelente, e muito necessária, para uma benjamima.

—Açúcar? —perguntou ela.

—Dois, por favor.

Depois de lhe passar a taça e o pires, agarrou as delicadas tenazes de prata.

— Pasteis?

Ele sorriu.

—É uma pergunta retórica?

A jovem devolveu-lhe o sorriso, revelando um par de covinhas pouco profundas a ambos os lados dos lábios.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Formavam um triângulo perfeito com a fenda do queixo, uma forma que Colin desejou ardentemente explorar.

—Não estava perguntando se queria um, senhor, mas sim quantos queria.

—Mmm. Ao que parece, cometi um engano estratégico ao revelar minha debilidade pelos doces.

—Um homem em sua situação saberá sem dúvida que revelar qualquer debilidade é sempre um engano

estratégico.

A moça colocou dois dos pastelitos cristalizados no prato e logo arqueou as sobrancelhas em um gesto de

interrogação.

—Tomarei três.

Alex acrescentou outro pastel ao prato e o passou. Observando-a com atenção, Colin roçou seus dedos de

forma deliberada ao aceitar o prato. Se a jovem experimentou o mesmo calafrio apaixonado durante o breve

contacto, não deu amostras disso.

—A que se refere ao dizer «um homem em sua situação»? —perguntou ele, rechaçando a absurda irritação que

a assaltava.

Alex demorou vários segundos em responder por que, face à barreira de suas luvas de encaixe, o roçar dos

dedos dele tinha minado sua concentração. Como podia afetá-la assim um simples contacto?

—A um cavalheiro com título em busca de esposa. Imagino que, se as senhoritas jovens da alta sociedade se

inteirassem de sua inclinação pelos doces, veria-se alagado de presentes de confeitaria.

—Vá! por que não me ocorreu? Acredito que publicarei um anúncio no Time proclamando meu amor por

todas as coisas doces.

Ela pôs-se a rir e se servi com destreza de mais um.

—Só um, madame Larchmont?

—Já tomei dois.

—Espero que isso não a impeça de seguir comendo.

—Cometeria um grave engano de protocolo se comesse mais que meu anfitrião.

O olhar do Colin deslizou até a fonte de prata sobre a bandeja do chá, em que ficava um trio de pasteis.

—Pois eu não penso sair desta sala até que essa bandeja esteja vazia. Espero que não seja tímida e me ajude a

terminar o que fica.

—Tenho muitos defeitos, senhor, mas lhe asseguro que o acanhamento não é um deles.

Um sorriso curvou devagar a atractiva boca dele, injectando calor em lugares secretos que a jovem não

desejava sentir quentes e levando-a a perguntar-se o que se sentiria ao ter essa bonita boca contra a sua.

—Uma informação fascinante, madame Larchmont, embora talvez confessá-lo seja um engano estratégico por

sua parte.

—Não foi uma confissão a não ser uma advertência, senhor. Assim lhe preparo para o momento em que

prescinda da conversação educada e passe ao tema do dinheiro que vai pagar-me por lhe deitar as cartas —

disse ela.

Colin arqueou as sobrancelhas.

—Pareceu-me preferível ser directa, dada nossa conversação de ontem à noite —acrescentou a jovem—. Eu não

gostaria que pensasse que digo uma coisa e quero dizer outra.

—Neste caso, não acredito que ninguém possa acusar a disso. Insiste a que lhe paguem antes de que preste

seus serviços?

—Sim. Segundo minha experiência, é o melhor. observei que se disser a alguém algo que não gosta de muito...

—Não deseja pagar.

—Exactamente.

—Tem planejado me dizer algo que eu não goste?

A jovem levantou o queixo.

—Eu não decido dizer nada a ninguém, lorde Sutton. Só transmito o que as cartas indicam.

Ele não fez nenhum comentário, se limitando a levar a taça aos lábios e tomar um sorvo de chá enquanto a

observava por cima do bordo. Alex se obrigou a sustentar-lhe o olhar. Parecia-lhe que estavam unidos em uma

silenciosa batalha de vontades que ela se negava a perder sendo primeira em afastar o olhar. Depois de apoiar

a taça no pires, Colin levantou-se e aproximou-se da mesa de mogno, junto à janela. Abriu a gaveta superior,

tirou uma bolsita de pele e deixou cair várias moedas na palma de sua mão. Depois de contar a importância

que queria, retirou outra bolsita mais pequena e meteu nela as moedas. A seguir devolveu a bolsita maior à

gaveta e retornou junto à jovem.

—Acredito que esta é a importância que acordamos —disse.

Ela agarrou a bolsa que lele estendia e logo deixou sua taça na mesa.

—Se não se importar, o contarei, só para me assegurar.

Colin voltou para seu assento e agarrou num de seus pasteis. Alex sentia o peso de seu olhar enquanto contava

rapidamente as moedas.

—Está tudo correto? —perguntou ele quando a jovem terminou.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Sim.

—Não é muito confiada.

Ela o olhou aos olhos.

—Não pretendia o ofender, lorde Sutton. Simplesmente penso que é melhor não deixar nada ao azar.

—Não me ofendi, o asseguro. Só fazia uma observação. O certo é que admiro sua prudência, em especial

tratando-se de dinheiro. Como sabe, por nossa querida cidade vagam muitíssimos ladrões.

—Sou consciente disso, por desgraça — disse a moça, com voz serena apesar dos batimentos acelerados do

coração.

Alex tratou de ler a expressão de Colin, mas seus rasgos não revelavam nada absolutamente. De novo, sentiu-

se como um camundongo entre as garras de um gato.

—Ah, sim? Espero que não tenha sido vítima de algum rufião.

—Recentemente, não, mas referia-me a que é impossível viver em Londres e não ser consciente da triste

situação de pobreza em que vivem tantos cidadãos. Por desgraça, a necessidade pode empurrar as boas

pessoas a fazer coisas más e desesperadas.

—Como por exemplo roubar.

—Sim.

Os olhos verdes do homem a olharam com fixidez.

—Mas algumas pessoas, madame Larchmont, são simplesmente más.

—Sim, sei.

Certamente, sabia muito bem. Com a intenção de trocar de tema, Alex indicou com o queixo o grande retrato

pendurado sobre a chaminé.

—Sua mãe?

Os olhos dele estavam fixos quadro, e Alex voltou-se para olhar a imagem de uma preciosa mulher com um

vestido cor marfim. Estava de pé num jardim cheio de flores de tons pastel, e uma brisa invisível agitava com

suavidade as saias e o brilhante cabelo escuro. Tinha nos lábios um suave sorriso, e em seus olhos verdes

brilhava uma expressão travessa. Quando Alex dirigiu sua atenção de novo para lorde Sutton, viu que um

músculo movia-se na mandíbula e que tragava saliva.

—Sim — disse ele em voz baixa—. É minha mãe.

—É muito bonita.

Da forma em que sempre tinha imaginado a sua própria mãe. Feliz. Sã. Bem vestida. Querida. Certamente,

querida por alguém que não fosse uma menina suja, faminta e assustada que não soube como cuidá-la quando

a enfermidade caiu sobre ela.

Ele apertou os lábios durante vários segundos e logo assentiu.

—Muito bonita... Sim, era-o. Também por dentro. Terminaram o retrato justo antes de morrer.

Em sua voz percebia-se uma funda pena e, quando olhou Alex, a jovem sentiu-se comovida ao ver a tristeza

em seus olhos.

—Sinto-o — disse ela sem saber o que responder, embora entendia de sobra a dor de perder uma mãe—. Era

jovem.

Colin franziu o cenho.

—Tinha a mesma idade que eu tenho agora.

—Tem os mesmos olhos.

O olhar do homem dirigiu de novo para o quadro.

—Sim. Também herdei seu amor pelos doces.

Produziu-se um longo silencio, e logo seus olhos adoptaram uma expressão ausente.

—Levava-nos a meu irmão e a mim à confeitaria Maximillian, no Bond Street — continuou—. Passávamos

muito tempo demonstrando um ar, muito sério e correcto. Mas assim que entrávamos na carruagem para

voltar para casa — acrescentou com um leve sorriso—, atacávamos os pacotes e comíamos e ríamos até que nos

doíam as costelas. Sua risada era mágica. Contagiosa...

Alex ficou imóvel, comovida pelo tom íntimo e melancólico do homem, que tinha pronunciado a última frase

como quem pensa em voz alta. Era evidente que tinha querido muito a sua mãe e que esta o tinha amado

também muito. A jovem sentiu uma pontada de inveja. Que bom seria ter lembranças de saídas felizes.

Invadiu-a uma dor estranha e perturbadora que não pôde qualificar. Lástima pela perda dele? Auto-compaixão

por sua própria perda? Como podia ter saudades de algo que nunca tinha conhecido?

—E seu pai? —perguntou ela.

Ele piscou como se despertasse e dirigiu de novo sua atenção para a jovem.

—Tal como mencionei ontem à noite, voltou a casar-se recentemente. Sua esposa é tia da esposa de meu irmão.

É uma lástima que lady Vitória, a mulher de meu irmão, não tenha uma irmã. Se a tivesse, casaria-me com ela

assim —disse, estalando os dedos— e não teria que perder tempo procurando uma noiva adequada.

—Acredito que mais valeria guardar para si a frase «perder tempo procurando uma noiva adequada». Até a

mais prática das mulheres aprecia um pouco de romantismo.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—E você considera-se prática?

—É obvio.

O olhar do homem cravada no seu deu-lhe a impressão de estar sentada muito perto do fogo.

—E, entretanto aprecia o romantismo.

—É obvio. Mas não falava de mim mesma lorde Sutton. Falava das senhoritas da alta sociedade entre as quais

procurará sua futura esposa.

—Assim ganhou seu afecto monsieur Larchmont? Com romantismo?

—Naturalmente - respondeu ela, agarrando sua taça de chá e observando-o por cima do bordo—. Com isso e

com sua natural reserva.

—Ah, é homem de poucas palavras.

—Muito poucas.

—É mais um homem de... acção.

—Isso o descreve à perfeição, sim.

—Não possui o hábito que, em sua opnião, os homens têm de dizer uma coisa e quererem dizer outra?

—Não. Quando diz «tenho fome» quer dizer «tenho fome».

— Vejo - respondeu lorde Sutton. Seu olhar deslizou até os lábios dela, onde permaneceu vários segundos.

Alex parou no acto de esticar a mão para agarrar um dos bolos de chá—. E, portanto suponho que quando diz

«tenho fome» se refere somente... e não a qualquer outra classe de fome que inspire sua esposa.

A moça sufocou de repente, consciente a seu pesar do misterioso atractivo de seu anfitrião. obrigou-se a

continuar esticando a mão para agarrar o bolinho e observou incômoda como seus movimentos resultavam

bruscos.

—Sim, dá gosto quão sincero é — respondeu enquanto forçava um sorriso—. Ele e eu somos muito parecidos.

—considera-se directa?

Absolutamente.

—Muito.

—Isso... reconfortante. Não há muita gente que o seja.

Antes que a jovem pudesse determinar se havia algum sentido oculto nas palavras dele, lorde Sutton esticou o

braço para agarrar outro bolo de chá e voltou a falar.

— Gosta de viver consigo aqui em Londres?

A moça franziu o cenho.

—Quem ele?

O homem inclinou a cabeça e a olhou com expressão de dúvida zombadora.

—O seu marido.

Pelo amor de Deus, o que acontecia?

—É obvio. Por que o pergunta? —disse com brutalidade, irritada consigo mesma por perder o fio da

conversação e com ele por persistir em suas perguntas.

Ele encolheu de ombros.

—Só me perguntava se sentia falta de seu país natal, a França.

—Ah! Às vezes. Entretanto, adaptou-se muito bem.

—Quanto tempo têm casados?

—Três anos. Quanto a suas cartas...

—Têm filhos?

—Não. Suas cartas...

—Não a acompanha às festas a que assiste?

Se esperava fazê-la reagir, a jovem não pensava dar-lhe esse gosto.

—Não, não gosta de multidões.

—Também é lançador de cartas?

—Não, me diga, lorde Sutton, quando tiver escolhido esposa, pensa ficar em Londres?

—Não. Qual é sua ocupação?

—a de quem?

—a de monsieur Larchmont.

A jovem apoiou a taça sobre a mesa e levantou um pouco o queixo.

—É caçador de ratos, senhor — declarou em tom desafiante.

Em realidade, a jovem desejava que ele fizesse algum comentário sobre tão humilde ocupação. Desse modo, ela

poderia irritar-se e assim sentir algo, o que fosse, distinto daquela consciência quase dolorosa da presença do

homem. Deixaria-o esmagado dizendo que, senão fosse pelos caçadores de ratos, os insectos invadiriam os

lares dos nobres arrogantes como ele. Mas lorde Sutton limitou-se a assentir, sem deixar de olhá-la aos olhos.

—Faz muito que é caçador de ratos?

—Desde que o conheço.

Maldição. Por que fazia tantas perguntas? Nenhum dos outros membros da nobreza mostrava aquela

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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curiosidade. E como tinha arrumado para que a conversação girasse outra vez em torno dela?

—faz-se tarde, lorde Sutton —disse em tom firme, decidida a recuperar, e conservar desta vez, as rédeas da

situação—. Mais valeria que começássemos a leitura de suas cartas porque tenho que partir logo.

—Tem outro compromisso esta noite?

—Sim.

—A festa de lady Newtrebble?

Ela assentiu, e nesse momento caiu na conta. De repente sentiu-se alarmada, mas em seguida a assaltou uma

quebra de onda de calor.

— Também assistirá?

—Sim. Devo seguir procurando a minha prometida, sabe? —respondeu ele com um sorriso malicioso e muito

atractivo—. Tenho a esperança de que as cartas possam me dizer de quem se trata.

Fosse quem fosse, Alex desejou sorte para resistir aquele homem de perigoso atractivo.

—Sim. Para acabar com toda essa perda de tempo. Então começamos?

—Certamente.

Capítulo V

Colin aproximou sua cadeira à mesa e logo afastou para um lado o serviço de chá; obrigou-se a concentrar-se

no assunto que os ocupava e não no delicado aroma de laranjas que acabava de perceber.

—Temos espaço suficiente aqui?

—Sim, é perfeito.

A moça abriu o cordão de sua bolsa de rede para cabelo e tirou um baralho envolto em uma peça de seda de

cor bronze.

—Quem a ensinou a jogar as cartas?

—Minha mãe —disse ela, olhando o baralho que tinha nas mãos.

—Vê-a freqüentemente?

—Não. Está morta.

Lorde Sutton percebeu a pena, a dor em suas bruscas palavras —uma pena e uma dor que conhecia muito

bem— e não pôde refrear a compreensão que brotou em seu interior.

—Sinto muito. Sei muito bem quanto dói essa perda.

—Estas cartas são tudo o que restou dela —murmurou a jovem.

Alex elevou os olhos, e seus olhares se encontraram. O homem conteve o fôlego. Para frustração dela, a

expressão da moça era impenetrável, mas algo em seus olhos, algo que parecia vulnerabilidade, chamou-lhe a

atenção. Lorde Sutton sentiu-se confuso.

O silêncio cresceu entre eles. Sentia ela aquela tensão densa e perturbadora, ou só a percebia ele? O olhar da

jovem posou em seus lábios. O homem notou o impacto daquele olhar como se fosse uma carícia. Para sua

grande irritação , teve de repente uma erecção, e teve que jogar mão de toda a sua concentração para não

remover-se no assento a fim de aliviar o incomodo.

Só fazia uns quantos anos que tinha abandonado a espionagem, mas era evidente que tinha perdido

faculdades, entre elas seu controle, e de forma inexplicável. Demônios, aquela mulher nem sequer possuía uma

beleza convencional. Tampouco era uma dama de sua própria classe. Além disso, tratava-se de uma

benjamima.

Era uma benjamima quatro anos atrás, irrompeu sua consciência. A gente pode mudart e efetivamente o faz.

Amaldiçoou em seu foro interno a sua irritante voz interior. Bem. Quatro anos atrás era uma benjamima. O

mais provável era que ainda fosse. Isso era o que supunha que devia descobrir, e não que a seu corpo

desmandado a simples visão e aroma resultavam-lhe irracional e intensamente excitantes.

Lorde Sutton apertou a mandíbula, e a jovem piscou várias vezes como voltasse para presente. Enquanto

deixava sobre a mesa com gesto rápido o baralho envolto em seda de cor bronze, falou em tom enérgico:

—Para que possa conectar melhor com as energias subtis e manter minha concentração, será preferível que nos

abstenhamos de mais conversação desnecessária até que sua tiragem tenha terminado. Sua função aqui é

perguntar. Enquanto baralho as cartas, quero que pense na pergunta que mais gostaria que respondesse.

O homem deu conta muito a seu pesar de que seguia contendo o fôlego e inspirou com força.

—De acordo —disse.

Na sala em silêncio só se ouvia o tic tac do relógio da chaminé e o crepitar do fogo. Colin observou como a

moça desembrulhava as cartas e dobrava com gesto cuidadoso a peça de seda de cor bronze. Sentiu pena que

não tirasse as luvas de encaixe, mas decidiu não perguntar nesse momento, pois sem dúvida ela julgaria sua

pergunta como «conversação desnecessária». Deus sabia que não desejava perturbar as «energias subtis».

A jovem fechou os olhos e respirou fundo e devagar várias vezes. O olhar de lorde Sutton baixou até deter-se

no delicado oco de seu pescoço, que ficava mais profundo com cada inalação. O peito feminino subia e baixava

devagar, e ele encontrou-se seguindo o ritmo, esperando que a pele cor nata situada em cima do corpo do

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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vestido se inchasse com a seguinte inspiração. Demônios, aquela mulher tinha um efeito muito estranho em

sua própria respiração.

Elevou os olhos e cravou o olhar em seus lábios entre-abertos. O homem apertou seus próprios lábios para

reprimir a espiral de desejo que serpenteava em seu interior com crescente intensidade. Por desgraça, seu

esforço fracassou por completo. Sobre tudo quando o assaltou o impulso entristecedor de seguir o perfil de sua

provocadora boca com os dedos. Logo com a língua...

Ela abriu os olhos e o olhou. Uma vez mais, o impacto daquele olhar claro de cor chocolate o golpeou como um

murro.

—Qual é sua pergunta, senhor?

Ele franziu o cenho.

—Pergunta?

—decidiu que deseja me perguntar?

Posso beijá-la? Tocá-la? Fazer-lhe amor...?

Lorde Sutton apertou a mandíbula. Demônios. Essa classe de pergunta, não. Alguma outra pergunta. Uma que

não implicasse os lábios dela, sua própria língua, corpos nus e fantasias ridículas e inapropriadas.

—Pois... desejo saber quem se converterá em minha prometida.

Sim. Uma pergunta perfeita. Concentre em outra mulher. Alguma que seja formosa, jovem, de bom ver, de

nobre berço, não uma benjamima.

Alex assentiu. Continuando, com gesto enérgico, mesclou as cartas e cortou.

—Corte uma vez —disse enquanto deixava o baralho sobre a mesa—, com a mão esquerda.

O homem decidiu perguntar mais tarde por que tinha que utilizar a mão esquerda. Quando ele terminou a

tarefa, a moça agarrou o baralho com a mão esquerda e começou a voltar cartas.

As cartas apareciam velhas e descoloridas, e representavam pessoas e coisas que ao Colin resultavam

desconhecidas. Ao terminar, a jovem contemplou a tiragem e ficou imóvel. Colin levantou os olhos. A moça

adoptou por um momento uma expressão estranha e logo franziu o cenho. O homem resistiu com muita

dificuldade o impulso de elevar a vista para o tecto. Estava claro que aquela mulher pretendia representar sua

comédia até o final e oferecer um espetáculo digno do dinheiro que tinha pago. Aliviado ante a possibilidade

de dedicar sua atenção às cartas, lorde Sutton se preparou para divertir-se.

—Ocorre algo? —perguntou tratando de falar com seriedade, ao ver que ela permanecia em silêncio.

—Pois... não —respondeu ela, antes de respirar devagar umas quantas Estas aqui representam seu passado —

explicou, assinalando um grupo de cartas—. Desfrutou de uma infância privilegiada e de uma estreita relação

com alguém mais jovem que você. Um irmão.

De novo Colin teve que reprimir-se para não olhar para o céu. Ele mesmo tinha contado que tinha um irmão...

—Mas apesar dessa estreita relação —seguiu—, sentia-se... sozinho. Afligido pela responsabilidade —

acrescentou, enquanto roçava as cartas com os dedos enluvados—. primeiro Responsabilidade para sua família

e seu título, mas logo para outra coisa. Algo que significava muito para sí mas que causou um doloroso

distanciamento com respeito a alguém a quem queria muito. Experimentou uma profunda dor e um grande

sentimento de culpa devido a esse distanciamento. Vejo traição e mentiras. Suas acções o envergonharam, e

ainda se sente culpado devido a essas acções.

Uma sensação incômoda invadiu Colin, como se de repente o lenço de pescoço apertasse muito. Obrigou-se a

permanecer impassível e a manter os dedos unidos e relaxados entre seus joelhos separados. A atenção dela

seguia centrada nas cartas, e suas mãos indicavam o seguinte grupo.

—Estas representam seu presente —sussurrou em tom sério—. Indicam uma forte agitação interior. Está muito

perturbado... preocupado por seu futuro. Estas preocupações pesam muito em sua mente. Seu espírito está em

guerra consigo mesmo, com sua mente dizendo uma coisa e seu instinto insistindo em outra. Terá que tomar

decisões importantes, e entretanto, embora se preocupa por escolher bem, também sente a necessidade de fazê-

lo com urgência, de tomar estas decisões com rapidez. Uma sensação de terror o rodeia, o empurrando a

actuar... talvez de uma forma que não deseje.

Ignorando o estranho formigamento que deslizava sobre sua pele, Colin permaneceu imóvel, observando-a

com atenção enquanto o olhar dela ía para o grupo final. A jovem franziu o cenho mais ainda e apertou os

lábios.

—Estas mostram seu futuro imediato —disse por último.

criou-se um silêncio entre eles, durante o qual a moça pareceu cada vez mais transtornada. Algo em sua atitude

provocou a Colin um calafrio. Pelo amor de Deus, o que ocorria?

—Dadas suas muito altas tarifas, espero que me diga qual é antes que me cobre um quarto de hora mais,

madame —apontou, introduzindo uma forçada nota de diversão em sua voz.

A jovem elevou o olhar, e Colin ficou em silencio ao ver sua expressão perturbada.

—As coisas que indicam as cartas... Não o desejo alarmar.

Ele fez um gesto com a mão.

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—Não tenha medo. Sou duro de cortar, o asseguro.

—Muito bem —respondeu ela, visivelmente incômoda—. Vejo perigo.

Colin assentiu com gesto alentador.

—A maioria dos homens considera o matrimônio uma ocupação perigosa. Que mais?

Ela sacudiu a cabeça.

—Este perigo não se relaciona com o matrimônio, ao menos não muito. É outra coisa. Algo que não está claro.

Há uma mulher...

—Mas sem dúvida isso é uma boa notícia. Minha futura mulher? adivinhou seu nome ou ao menos sua cor de

cabelo? É loira ou morena?

Alex sacudiu de novo a cabeça, olhando-o aos olhos.

—Não. Esta mulher não é o que parece. Deve tomar cuidado, com ela e com seu próprio entorno. As cartas

indicam com claridade traição, engano, enfermidade. —Sua voz converteu –se em um sussurro—. Morte.

O silêncio caiu sobre eles uma vez mais. A Colin invadiu um irritante desassossego que se negou a reconhecer.

E sua irritação devolveu-lhe o sentido comum.

—Bem feito —disse, assentindo em sinal de aprovação—. Devo dizer que é cê muito boa. Tem estilo de cigana

e sabe criar ambiente. Eu diria que umas predições tão sinistras poderiam escurecer alguma das festas

elegantes para que a contratam, mas suponho que não se pode ignorar o aspecto morboso da natureza

humana.

Uma cólera inconfundível cintilou nos olhos do Alex, antes que se retirasse e retorna-se há máscara que tão

bem levava. Era o primeiro espiono de verdadeira emoção que mostrava, e Colin ficou fascinado.

—está-se burlando de mim, senhor —disse ela com um espiono na voz da mesma cólera que Colin tinha

detectado em seus olhos.

—Simplesmente não tomo muito a sério um divertido passatempo. Não me há dito nada que não tenha podido

averiguar conversando com qualquer de minhas amizades, ou inclusive directamente comigo. Suas afirmações

são vagas e poderiam aplicar-se a qualquer pessoa, assim como a muitas situações. investigou, adornou-o um

pouco e interpretou seu papel de forma impecável. Aplaudo-a.

A jovem adoptou uma expressão glacial e levantou o queixo.

—Não conversei com ninguém sobre sí. Não investiguei nada nem adornei nada. Só interpretei o que as

próprias cartas me diziam.

—Não pretendia ofendê-la, madame. Não discuto seu talento para brindar um quarto de hora de diversão. Só

afirmo que não fazia falta «conectar com as energias subtis» para adivinhar que desfrutei de uma infância

privilegiada. Minha posição na sociedade já o indica. Também mencionei que tinha um irmão.

Colin apoiou-se no respaldo e a observou com olhar firme, reprimindo o impulso de a informar de que a

mulher que «não é o que parece» e da qual tinha de proteger-se estava sentada mesmo em frente dele.

—Quanto a suas demais afirmações, custaria-me muito nomear a uma pessoa que chegue à idade adulta sem

experimentar alguma forma de solidão, dor, culpa, mentiras e traição. Graças ao Time, tanto a senhora como o

resto dos londrinos sabem muito bem que penso muito em meu futuro. Meu dever para com meu título, é

procurar uma esposa para engendrar herdeiros, é essa a razão pela que estou aqui. Quanto à enfermidade e a

morte, por desgraça, com o tempo afectam a todos.

—Eu não falava de «com o tempo», mas sim do futuro imediato —disse ela com rigidez—. Não me divirto

fazendo predições sinistras, lorde Sutton. Eu gostaria de ter melhores notícias, mas tudo em sua tiragem aponta

à necessidade de ser prudente, estar em guarda e cuidar sua saúde. Agora. Espero que me faça caso e tome

cuidado.

—Tomo nota. Por sorte meu irmão é médico e poderá curar-me em caso de que caia vítima de uma enxaqueca

ou uma dor de estômago.

Pareceu que a jovem desejava replicar, mas não disse nada. limitou-se a assentir com a cabeça e logo envolveu

depressa suas cartas na peça de seda e voltou a as colocar em sua bolsa de rede para cabelo. A seguir ficou em

pé e o olhou com sua habitual expressão serena e impenetrável.

—Gostaria de voltar a jogar-lhe as cartas, senhor, se me permitir isso. Aqui, em sua casa, mas numa outra sala,

utilizando cartas distintas, para ver se sua tiragem é a mesma.

Colin levantou-se e cruzou os braços sobre o peito.

—E por que quer fazer isso?

Teve que reprimir-se para não acrescentar: «Além de me cobrar outra tarifa escandalosa».

—Porque quero assegurar-me de que a tiragem é correcta, ter a certeza de que não me equivoco e talvez

averiguar algo mais sobre o perigo que o espera.

—Eu preferiria concentrar-me em descobrir a identidade da mulher com a que estou destinado a casar —disse

ele com secura—, mas certamente consertaremos outra entrevista. O que acha amanhã às três? —acrescentou,

escolhendo deliberadamente a mesma hora que tinha sugerido em um princípio para a entrevista daquele dia.

—Sinto muito, mas já estou comprometida às três. Entretanto, estou disponível para as quatro.

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—Excelente. Aguardarei com impaciência. Como disse, sempre estou disposto a entreter-me com divertidos

passatempos.

Sem deixar de olhá-la nos olhos, Colin deu a volta à mesa para situar-se diante dela. Só os separava a distância

de um braço, e o homem não podia afastar a vista dela. A textura cremosa de sua pele parecia tão suave que

Colin teve que fechar os punhos para não esticar a mão e roçar a bochecha dela com os dedos.

O resplendor do fogo arrancava subtis reflexos do brilhante cabelo da jovem, e Colin desejou retirar as

travessas de seu pulcro coque e passar os dedos pelas lustrosas tranças.

Quando se deu conta, para seu pesar, de que voltava a conter o fôlego, inspirou com força. O subtil aroma de

laranjas enchia sua mente, misturado com algo mais que cheirava como o açúcar. Custou-lhe reprimir um

gemido. Demônios, como podia cheirar uma mulher como o açúcar? Imediatamente se imaginou inclinando-se

para roçar com a língua seu gracioso pescoço para comprovar se sabia tão doce como cheirava. Seu pulso se

acelerou ante a idéia. Embora doesse reconhecê-lo, estava claro que desejava a aquela mulher. E muito.

Entretanto, mais doía dar-se conta de que ela não parecia experimentar esse mesmo desejo. A moça o olhou

com a tranqüila expressão daqueles grandes olhos de cor chocolate. Como podia parecer tão serena quando ele

se sentia tão... pouco sereno?

Irritado consigo mesmo e decidido a equilibrar a situação, Colin tomou a mão dela e a levantou.

—Estou especialmente disposto a me entreter com qualquer passatempo que inclua a companhia de uma

mulher formosa.

Olhando-a aos olhos, beijou com suavidade as pontas de seus dedos enluvados e logo, como a noite anterior,

voltou a mão dela e apertou os lábios contra a pele clara e sedosa do interior do pulso.

A moça abriu muito os olhos, e seus lábios foram separados com uma rápida inspiração. Um rubor sedutor

cobriu suas bochechas. Alex baixou o olhar até o ponto em que a boca dele se apoiava contra sua pele

perfumada e humedeceu os lábios com a ponta da língua.

Colin sentiu que era invadido por uma satisfação sombria. Então... não era somente ele. Ela também sentia

aquele calor que crepitava entre eles. Agora a única pergunta que ficava era o que iam fazer.

Bateram na porta. Alex retirou a mão com um gemido, e Colin amaldiçoou em silêncio a interrupção. Diabos, a

jovem estava ruborizada e excitada, e apenas a tinha tocado.

—Entre —ordenou, sem deixar de olhá-la.

Sua própria voz soou-lhe áspera e esclareceu garganta enquanto abria a porta. Entrou Ellis levando uma

bandeja de prata. O serviçal, habitualmente impassível, tinha o cenho franzido.

—Acaba de chegar esta mensagem de lorde Wexhall. Seu mensageiro disse que era urgente e que esperaria

sua resposta.

Urgente? Durante seu serviço à Coroa, Colin prestava contas ao Wexhall e sabia que «urgente» não era uma

palavra que o homem utilizasse com ligeireza. Um calafrio percorreu suas costas. A chegada do Nathan e

Vitória estava prevista para o dia seguinte. Teria ocorrido algum acidente?

Com os nervos no estômago, rompeu o selo, desdobrou o grosso papel cavalinho e leu depressa a breve nota.

—O doutor Nathan e lady Vitória —disse Ellis—. Estão...?

—Estão bem, Ellis —disse Colin.

O homem deixou cair os ombros com o mesmo alívio que sentiu Colin ao saber que seu irmão e sua cunhada

não eram o objecto daquela missiva urgente.

Lorde Sutton devolveu sua atenção a madame Larchmont, cuja inescrutável máscara voltava a estar em seu

sítio.

—Por desgraça —disse Colin—, não se pode dizer o mesmo de lorde Malloran nem de um de seus lacaios, um

jovem chamado William Walters. Esta manhã foram encontrados mortos, no estudio de lorde Malloran.

Capítulo VI

Alex ficou pálida. Os joelhos tremaram e teve que agarrar o respaldo do sofá para sujeitar-se. Lorde Malloran,

o homem em cujo estudio tinha escutado casualmente um complô para assassinar alguém, o homem a quem

tinha escrito uma carta em que detalhava esse complô, morto? junto com seu lacaio? Surgiu em sua mente uma

imagem das costas de um homem alto e moreno, vestido com a librea dos Malloran, de adornos dourados.

Encolheu o estômago com a horripilante suspeita de que o lacaio morto fosse o mesmo homem que tinha visto.

A jovem ficou paralisada, gelada. Deus. Era possível que a nota que tinha deixado tivesse precipitado aquelea

trágica volta dos acontecimentos? levou a mão ao ventre em um vão intento de acalmar sua agitação interior.

Certamente, que a pessoa a quem escreveu a nota e também o homem que certamente a levou a escrevê-la

estivessem mortos não podia ser mera coincidência. Seu instinto de sobrevivência dizia a gritos que não o era.

Mas e a outra pessoa a que tinha ouvido no estudio? Estava claro que aquela pessoa não era lorde Malloran,

cuja voz profunda ressonava. Embora tivesse tentado dissimular sua voz, Alex duvidava que fosse capaz de

emitir aquele sussurro que tinha ouvido. Além disso, foi a voz do lacaio a que sugeriu que falassem no estudio

de lorde Malloran para maior intimidade. Não teria sido necessário fazer essa sugestão ao próprio lorde

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Malloran.

As perguntas assaltavam sua mente. O que tinha sido de sua nota? Tinha-a lido lorde Malloran? Em tal caso,

tinha-a queimado... ou seguia em seu estudio? Um calafrio percorreu as suas costas. Se a nota tinha algo que

ver com a morte dos homens...

O assassino procuraria a pessoa que tinha escrito a nota.

—encontra-se bem, madame Larchmont?

Sobressaltada, voltou-se para a profunda voz. O olhar perspicaz de lorde Sutton cravou-se nela.

—Pois... sim. A notícia deixou-me assombrada.

Sem afastar os olhos da jovem, lorde Sutton disse a seu mordomo.

—Ellis, diga ao mensageiro que lorde Wexhall pode esperar-me antes de uma hora.

—Sim, senhor.

O mordomo saiu da sala e fechou a porta sem fazer ruído.

O olhar de lorde Sutton a imobilizou, e Alex foi invadida pela familiar e odiosa sensação de ser um animal

apanhado. Demônios, tinha jurado não voltar nunca a sentir-se assim.

—Está muito pálida —murmurou Colin, aproximando-se dela—. Quer sentar-se?

A moça passou a língua pelos lábios ressecados e sacudiu a cabeça.

—Tenho que ir.

E o faria assim que seus joelhos deixassem de tremer.

Ele assentiu, sem deixar de olhá-la aos olhos.

—antes de partir, diga-me, falou com lorde Malloran ontem à noite?

Deus, estava tremendo.

—um pouco. Quando cheguei —respondeu ela, antes de voltar a passar a língua pelos lábios—. Como...

morreram?

—Não sei mas, dado que houve duas mortes, suponho que não foi por causas naturais. A nota que recebi

indica que pôde haver um roubo, já que o estudio estava revolto.

Alex agarrou sua bolsa e obrigou-se a mover-se.

—Uma tragédia —murmurou, caminhando depressa para a porta—. Se me desculpar, senhor, temo que devo

partir.

—É obvio —disse ele, adaptando-se a seu passo—. Farei que tragam minha carruagem para acompanhá-la a

casa.

Alex abriu a boca para protestar, mas Colin voltou a falar antes de que ela pudesse dizer uma palavra.

—Insisto.

Como não desejava prolongar sua saída discutindo, a moça assentiu.

—Muito bem, obrigado.

Cinco minutos depois estava hospedada na fofa e luxuosa carruagem. Sentada contra as suaves almofadas de

veludo cinza, Alex ocultou a cara entre as mãos.

Deus. O que tinha feito?

E o que ia fazer a seguir?

Aquela noite ao chegar à festa dos Newtrebble, Colin aceitou um conhaque de um lacaio que passava e logo

ficou a passear em torno do perímetro do salão cheio de gente. Em lugar de um ambiente apagado dadas as

mortes prematuras de lorde Malloran e William Walters, uma sensação de entusiasmo parecia flutuar no ar. A

festa estava em seu melhor momento, com lacaios levando bandejas de prata carregadas de bebidas e

aperitivos. Enquanto caminhava, Colin escutava os fragmentos de conversas que soavam a seu redor. As

mortes eram o principal tema de conversação, com especulações a respeito de como e por que tinham morrido,

e quem —ou o que— os tinha morto. Um ladrão? Conforme diziam, tinham revolto o estudio de sua senhoria.

Ou talvez uns canapés em mal estado? O último rumor era que os serventes dos Malloran afirmavam que se

achou sobre o escritório de sua senhoria uma fonte quase vazia de tartaletas de fruto do mar.

—minha mãe, eu tomei ontem à noite uma tartaleta de camarões-rosa! —exclamou uma mulher que sestava no

centro de um grupito de damas—. Cheirava um pouco passada, já me entendem, e logo tive muitas náuseas.

Vá, tenho sorte de não ter sofrido o mesmo destino horrível que Malloran e esse pobre jovem! Embora não

entendo como podia estar comendo tartaletas de camarões-rosa um lacaio...

A mulher sacudiu a cabeça.

—Criados! —disse outra dama com gesto de desprezo, enquanto o resto do grupo assentia para indicar que

conhecia as manias da classe inferior—. Uma se pergunta se serviu deliberadamente a Malloran comida em

mal estado para o roubar, mas se saiu mal quando caiu vítima de sua própria traição.

Colin seguiu caminhando e deslizou em um oco em sombras, situado detrás de uma grande palmeira. Sua

posição vantajosa oferecia uma boa visão da sala. Refugiado entre as sombras, moveu sua taça de conhaque e

olhou com o cenho franzido as profundidades de cor âmbar, que giravam com suavidade.

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Sua conversação prévia com lorde Wexhall, quem, apesar de ter-se retirado há pouco do seu serviço à Coroa,

tinha ido à casa dos Malloran a pedido do magistrado junto com este e o médico, ressonou na mente do Colin.

«Parece ser um roubo —havia dito lorde Wexhall—, porque ambos os homens tinham feridas na cabeça, o

atiçador da chaminé estava fora de seu suporte e a sala em desordem. Mas meu instinto... diz-me que Malloran

e Walters não morreram de golpes na cabeça. Ambos cheiravam ligeiramente a amêndoas amargas, como os

sedimentos da licoreira. E já sabe o que significa isso.»

Colin deu um bom gole no conhaque. Sim, sabia o que significava isso. Ácido prúsico. Malloran e Walters

tinham sido envenenados. Com uma substância utilizada com freqüência para matar roedores.

Pelos caçadores de ratos.

Seus dedos crisparam-se contra a taça de cristal esculpido e esquadrinhou a multidão, até que seu olhar ficou

cravada no outro extremo da sala. Seu estômago executou uma manobra estranha enquanto ficava sem fôlego.

Madame Larchmont, embelezada com o vestido de cor esmeralda que tinha visto em seu armário essa tarde,

achava-se sentada com as cartas estendidas ante si, falando com a matrona sentada frente a ela.

Alexandra... O nome dela atravessou sua mente em um sussurro, enquanto seu olhar muito ávida vagava sobre

a moça. A jovem levava o cabelo recolhido em um atractivo nó de estilo grego, entrelaçado com cintas

douradas e verdes, e brilhava sob a suave luz projectada pelas aranhas cheias de velas. Alex sorriu, atraindo a

atenção do Colin por um momento para sua boca sensual.

Tudo nela parecia inocente e franco. Só era o entretenimento da noite, e oferecia com alegria o espetáculo pelo

que lhe pagavam. Era evidente que tinha recuperado a compostura perdida umas horas atrás... ou não? Só por

um instante, seu olhar foi dirigido para um lado, como se observasse a multidão próxima, e franziu o cenho de

forma quase imperceptível. A verdade, a mudança em sua expressão foi tão fugaz que Colin perguntou se seria

produto de sua imaginação. Mas seu instinto dizia que não, e que sua aparência inocente e franca era somente

isso, uma aparência.

Porque não havia nada inocente e franco em encontrar mortos dois homens na sala por cuja janela a tinha visto

sair apenas umas horas atrás, homens que com toda probabilidade tinham sido assassinados com uma

substância a que a jovem tinha fácil acesso porque, segundo ela mesma admitia, seu marido era caçador de

ratos. Embora Colin albergasse sérias dúvidas quanto à veracidade dessa afirmação.

Tampouco havia nada inocente nem franco em seu próprio esquecimento de compartilhar essa informação com

o Wexhall e o magistrado.

Colin apoiou a cabeça contra a parede, deu um bom gole de conhaque e fechou os olhos, saboreando o ardor

que descia por seu peito e confiando em que chamuscasse o sentimento de culpa que o corroía. Demônios, o

que se passava? Nunca tinha evitado seu dever nem suas responsabilidades. Nem para sua família e seu título,

nem uma só vez durante seus anos de serviço à Coroa sob as ordens do Wexhall. Durante esse serviço cometeu

vários actos, um em particular, que derivaram mais tarde em um profundo exame de consciência, mas seu

dever estava claro e fez o que tinha que fazer. Deveria ter dito a Wexhall, por quem sentia o maior dos

respeitos, e ao magistrado o que sabia da escapada nocturna de madame Larchmont pela janela. Entretanto,

tinha permanecido em silêncio. E, diabos, não entendia por que.

Abriu os olhos e, como ocorria sempre que seu olhar a encontrava desde aquela primeira vez, quatro anos atrás

no Vauxhall, ficou sem fôlego. Isso o confundia, perturbava-o e o irritava muito. Demônios, além de ter sido

uma benjamima, tudo o que sabia dela indicava que seguia sendo uma intrigante. Ou pior. Certamente, uma

mentirosa. Não tinha sido sincera sobre o lugar em que vivia, e monsieur Larchmont, se é que existia fora de

sua imaginação, coisa que Colin duvidava muito depois de revistar seu apartamento, não residia com ela como

a jovem afirmava. Não, em lugar disso, ao que parecia vivia com alguém chamado «senhorita Emmie» e tinha

uma trampilla que conduzia a seu apartamentoo com a que estava familiarizado um maroto. Reservada,

misteriosa... certamente, era ambas as coisas. Entretanto, nenhum desses rasgos era ilegal. Mas o assassinato

sim o era.

De todas formas, apesar de suas suspeitas a respeito dos motivos e a sinceridade da jovem, não podia atribuir-

lhe o papel de assassina, de alguém capaz de envenenar dois homens. Mostrou-se muito afetada quando ele

anunciou o conteúdo da nota do Wexhall. Era comoção, sentimento de culpa ou umas habilidades

interpretativas muito aperfeiçoadas? Tinha acrescentado algo à licoreira, talvez por ordem ou a pedido de

outra pessoa, sem saber que se tratava de um veneno mortal?

Um som de desgosto saiu de seus lábios.escuta-te, idiota, disse-se. Procurando desculpas, agarrando-te a

explicações, inventando racionalizações para explicar o que viu com seus próprios olhos, a uma conhecida

benjamima saindo pela janela de lorde Malloran, que agora está morto.

Sacudiu a cabeça e franziu o cenho, sentindo-se mal. De verdade estava procurando desculpas para ela, ou

simplesmente tratava de não cometer o mesmo engano cometido com Nathan, um engano que esteve a ponto

de lhe custar a relação com seu irmão? Então, como agora, todas as provas apontavam em um sentido —para a

culpabilidade—, e quatro anos atrás aceitou as provas condenatórias sem duvidar, negando-se a escutar a seu

coração, que lhe sugeria que podia haver outra explicação. Agora seu coração fazia a mesma sugestão com

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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respeito a madame Larchmont, e esta vez resultava impossível não escutar.

Tempo. Necessitava tempo. Para averiguar mais sobre ela, sobre sua vida. Não havia dúvida de que tramava

algo, mas até que averiguasse o que era se sentia resistente a entregá-la às autoridades para que a

interrogassem. Seu sentido comum dizia que se estava comportando como um maldito idiota. Mas seu

instinto... esse maldito instinto... advertia-lhe que esperasse.

De algo sim estava seguro: estava mais decidido que nunca a descobrir os segredos de madame Larchmont.

Mas seu sentido da honra e sua ética se mostravam reticentes a ocultar informação ao Wexhall e ao

magistrado.

Três dias, acordou com sua consciência. concederia-se três dias para vigiá-la. Segui-la. Passar tempo com ela.

Averiguar tudo o que pudesse sobre ela. Com o objectivo de estabelecer com firmeza sua culpabilidade ou sua

inocência. Mas, fosse qual fosse o resultado, quando chegasse o quarto dia contaria tudo a Wexhall.

Embora sua consciência já não gritasse escandalizada, seguia olhando-o com fúria; mas Colin evitou pensar-lhe

duas vezes. Tinha tomado uma decisão e pensava continuar com ela. Agora era momento de actuar.

Depois de finalizer a taça de conhaque, saiu do oco disposto a dirigir-se para sua presa. Entretanto, antes que

pudesse dar um só passo, surgiu uma voz feminina justamente por detrás dele.

—Então está aqui, lorde Sutton!

Reprimindo sua irritação ante aquele atraso em seus planos, voltou-se para encontrar-se ante sua anfitriã, que

exibia sua ampla figura com um vestido azul marinho que não a favorecia muito, enquanto umas plumas de

pavão se desdobravam em abano em torno de sua cabeça em um complicado penteado . Se seu objectivo era

parecer um ave vestida de cetim, tinha-o conseguido de uma forma admirável, embora bastante aterradora.

—boa noite, lady Newtrebble —disse Colin enquanto se inclinava.

—Estive o procurando por toda parte. O que faz escondido aqui, entre as sombras?

—Não me escondo. Acabo de chegar. pensei em desfrutar de um pouco de seu excelente conhaque antes de

entrar em campo de batalha — esclareceu, mostrando a taça vazia.

—Bom, pois já está aqui e isso é o que importa. E certamente é boa idéia revivificar-se um pouco, tendo em

conta a tarefa que o espera. Diga-me , como vai a busca?

A dama aproximou-se um pouco mais, e Colin evitou por muito pouco cravar-se com as plumas.

—Busca?

Deu-lhe um golpecito no braço com o leque dobrado e riu.

—De sua prometida, tolo!

Prometida? Colin piscou. Tinha esquecido por completo.

—Esta noite há aqui ao menos duas dúzias de senhoritas apetecíveis, incluindo a minha própria sobrinha, lady

Gwendolyn —disse ela, pestanejando—. A apresentei ontem à noite na festa de lady Malloran.

Em sua mente se materializou a imagem de uma jovem preciosa que, durante sua breve conversação, não fez

mais que queixar-se de tudo, do tempo (muito caloroso) até os serventes de sua família (muito entremetidos),

passando pelos aperitivosque acabava de tomar (muito salgados). Toda essa beleza, desperdiçada em uma

pessoa tão desagradável e petulante.

—Ah, sim, lady Gwendolyn.

Colin não pôde conter do todo um calafrio de aversão.

Lady Newtrebble não deu conta.

—A temporada acaba de começar e já a declararam incomparável —disse, enquanto lhe tirava o braço com

gesto de proprietária—. Venha comigo —acrescentou, puxando por ele—. Temos muito que fazer.

Colin libertou-se com o pretexto de deixar sua taça vazia na bandeja de um lacaio que passava por ali. Logo

deu um passo para trás e arqueou as sobrancelhas.

—Fazer?

—Sim. Tenho que o apresentar à lançadora de cartas, madame Larchmont. Todo mundo está impaciente por

saber se predirá quem é sua futura esposa.

Os olhos da dama brilharam com inconfundível avidez. Colin quase pôde ouvir seus pensamentos: Será todo

um golpe de efeito, que lhe jogue as cartas precisamente em minha festa.

—depois disso —continuou lady Newtrebble—, minha sobrinha o acompanhará em uma ampla visita pela

galeria.

—Muito amável —murmurou Colin, com seu melhor sorriso—, mas nunca me ocorreria monopolizar seu

tempo. Se tentasse monopolizar a semelhante beleza, estou seguro de que a metade dos homens desta sala

desafiariam a um duelo com pistolas ao amanhecer.

—Mas...

—Quanto a essa tiragem de tarot... parece-me uma oferta fascinante. Eu gostaria de muito falar com essa

madame Larchmont, e não desejo afastá-la a sí de seus outros convidados. Se me desculpar...

Colin se inclinou ante ela e, sem esperar sua resposta, entrou no mar de convidados. De forma deliberada,

demorou mais de uma hora em atravessar a sala, detendo-se para conversar com amigos e conhecidos, muitos

dos quais aproveitaram a ocasião para lhe apresentar a uma filha, irmã ou sobrinha desejosa de casar-se, e

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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inclusive a uma tia em um dos casos. Durante todas as conversações e apresentações, Colin manteve uma

aparência atenta e cortês, conversando com desenvoltura e intercalando sorrisos ou gestos da cabeça conforme

requeria a conversação, mas não deixou de estar pendente de madame Larchmont. Soube cada vez que sorria,

o que tinha feito três vezes enquanto Colin falava com lady Miranda e outras duas enquanto conversava com

lady Margaret, ambas muito formosas e claramente interessadas nele. Soube cada vez que franzia o cenho, o

que tinha feito duas vezes enquanto escutava a lorde Paisler, cujas filhas, lady Penelope e lady Rachel, riam

como hienas e também estavam claramente interessadas nele. fixou-se em cada pessoa que se sentava a sua

mesa, que falava com ela. Só com fins de investigação, é obvio.

Paroua quando estava só a quatro metros de sua mesa, tinha chegado já à conclusão de que algo perturbava a

inescrutável lançadora de cartas. Cada vez que acreditava que não a observavam, seu olhar percorria as

pessoas que se achavam perto dela. Ao princípio Colin pensou que talvez o estivesse procurando a ele, mas

abandonou a idéia, reprovando-se sua presunção, quando deu conta de que seus olhares rápidos e furtivas só

abrangiam a zona que rodeava sua mesa, não a sala inteira. Além disso, sua postura mostrava que permanecia

muito alerta. Rígida. Tensa. Em várias ocasiões viu que se inclinava para diante de forma imperceptível, como

se tratasse de ouvir as conversações que soavam ao seu redor. Se não a tivesse vigiado com tanta atenção, não

teria detectado os matizes. Mas resultavam inegáveis, como o facto de que o nervosismo dela fosse muito...

interessante.

Estava escutando lady Whitemore e a sua atraente filha, lady Alicia, que estava em sua segunda temporada, as

quais pontificavam sobre as horripilantes mortes com um entusiasmo que a Colin resultava muito

desagradável, quando uma risada suave e rouca chamou sua atenção. Seus sentidos se estremeceram ao

reconhecer o som. Aquela risada pertencia a madame Larchmont. O olhar do Colin dirigiu-se para a mesa.

A jovem sorria com covinhas nas bochechas ao homem sentado frente a ela, que se inclinou para diante para

revelar algo que ninguém mais devia ouvir. O olhar do Colin observou suas largas costas, o bem que ficava a

jaqueta azul marinho e seu cabelo bem cortado. Lorde Sutton apertou a mandíbula. Quem demônios era?

Esticou um pouco o pescoço para espionar seu perfil. Fosse quem fosse, Colin não o reconhecia.

Devolveu sua atenção a madame Larchmont, que baixou os olhos com gesto recatado e voltou a rir ante o

evidente engenho do homem. As tripas se encolheram de uma forma que nem gostava nem desejava examinar

muito de perto. Quando a jovem elevou o olhar, seus olhos brilharam com inconfundível malícia. Disse algo

que fez rir a seu companheiro, e Colin amaldiçoou sua incapacidade para ler os lábios. Ela deveu notar o peso

de seu olhar, porque só então seus olhos trocaram de posição e tropeçaram com os dele.

Aqueles olhos perderam imediatamente seu toque de malícia, e a jovem lhe dedicou durante vários segundos

um largo olhar frio. Saudou-o com uma leve inclinação da cabeça e logo devolveu sua atenção ao homem, a

quem sorriu. Colin se sentiu invadido pela irritação e por outro sentimento, que era igual ao ciúmes, mas não

podia tratar-se disso.

—Não está de acordo, lorde Sutton...?

A voz imperiosa de lady Whitemore o arrancou de seu enfocamento e o forçou a devolver sua atenção a suas

companheiras, que o olhavam espectativamente. Demônios, tinha perdido o fio da conversa. Antes que

pudesse falar, lady Whitemore levou a olho o monóculo e o observou com atenção.

—Lorde Sutton, encontra-se bem? Tem má cara.

Colin compôs imediatamente sua expressão e exibiu um sorriso forçado.

—Estou bem. Diga-me, lady Whitemore, quem é o homem ao que estão jogando as cartas?

Lady Whitemore olhou para o cantoo e logo se aproximou mais a Colin para lhe falar em tom confidencial:

—É o senhor Logan Jennsen, o americano —esclareceu dama, enrugando o nariz—. Não o conhece?

—Não.

—Chegou a Inglaterra somente há seis meses, mas já deu com que falar.

—Como é isso?

—Nada na abundância —afirmou lady Whitemore, muito orgulhosa de sua função de informadora—, mas é

dinheiro novo, é obvio. Possui toda uma frota de navios e pretende comprar mais, além de montar algum outro

tipo de negócio. É muito brusco e tem muita falta de preparo, como todos esses arrivistas das colônias. A

ninguém caí muito bem, mas é tão rico que ninguém se atreve a o chamar atenção.

—É muito bonito —opinou lady Alicia em tom ansioso—, para ser alguém que se dedica ao comércio —

acrescentou a toda pressa ao ver o gesto de desaprovação de sua mãe.

—É certo que os comerciantes costumam ser muito pouco atractivos —replicou Colin em tom seco—. Ah,

parece que o senhor Jennsen terminou, e isso significa que chegou minha vez. Peço-lhes desculpas, senhoras.

Depois de uma breve inclinação, aproximou-se da mesa do tarot enquanto Jennsen se levantava. Colin apertou

a mandíbula ao ver que o homem levava aos lábios a mão enluvada de madame Larchmont e beijava os dedos

dela.

—Obrigado pela encantadora tiragem —ouviu que dizia Jennsen com um inconfundível acento americano—, e

pela encantadora companhia. Estou desejando voltar a vê-la amanhã, madame.

—E eu a você, senhor Jennsen.

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O homem afastou-se, e Colin surpreendeu-se olhando fixamente madame Larchmont. A jovem tinha os lábios

entreabiertos e durante vários segundos observou as costas do Jennsen com uma expressão extasiada que o pôs

doente. Logo se voltou para Colin. Como tinha ocorrido antes, imediatamente caiu sobre seus rasgos uma

máscara de fria indiferença. Colin sentiu um formigamento de irritação e jurou em silêncio apagar como fosse

aquela falta de interesse de seu olhar.

—boa noite, lorde Sutton.

—boa noite, madame Larchmont.

Sem esperar um convite, deslizou-se na cadeira situada frente a ela. E a olhou. Diabos, sentia-se sem fôlego. A

dourada luz das velas projectada pela aranha e a velita votiva que brilhava com um resplendor tênue dentro

de uma terrina de cristal esculpido em uma esquina da mesa se refletia nos escuros cabelos da jovem e

iluminava seus insólitos rasgos com um fascinante desdobramento de sombras oscilantes. Colin não detectou

nem rasto do nervosismo que vinha observando desde há uma hora. Não, a via muito serena Y... preciosa.

Sedutora e misteriosa. E tentadora de um modo que não gostava de nada.

O olhar do Colin vagou para baixo, detendo-se na boca da moça antes de continuar. Embora o decote do

vestido, de cor verde esmeralda, seguia sendo recatado em comparação com os que levavam quase todas as

demais mulheres da sala, era mais amplo que o do traje da noite anterior e mostrava uma pele cremosa e a

generosa curva de seus peitos. Colin apertou a mandíbula ante a espetacular visão, a mesma espetacular visão

que o bastardo do Jennsen acabava de desfrutar.

O homem tratou de a brindar com um sorriso, mas tinha os músculos faciais extranhamente rígidos e

franzidos. Como se tivesse mordido um limão.

—encontra-se bem, senhor? —perguntou a moça em tom indiferente—. Parece... tenso.

—Estou bem. Como foi a tiragem de Jennsen?

—Conhece senhor Jennsen?

—Não o conhece todo mundo? Está claro que a senhora sim.

—Apresentaram-nos em uma festa faz várias semanas. Assiste a muitos eventos sociais.

Várias semanas... Diabos, Jennsen levava todo esse tempo desfrutando de sua companhia.

—Não me parece que lhe tenha previsto acontecimentos sinistros como os que me disse hoje .

—Eu não comento a tiragem de um cliente com ninguém.

—Excelente. Não quereria que minhas possíveis prometidas se assustassem ante o escuro futuro que me há

predito . Verá Jennsen amanhã?

Demônios, não pretendia soltar aquilo, e muito menos em um tom que não soava tão despreocupado como

teria gostado.

—Tem o costume de escutar conversas alheias?

A verdade é que sim.

—A verdade é que não. Entretanto, não sou surdo.

—Não me parece que seja problema seu se vir ou não o senhor Jennsen amanhã, lorde Sutton.

—E não me parece que tenha que mostrar-se tão susceptível para responder a uma simples pergunta, madame

Larchmont.

A jovem franziu os lábios em um claro gesto de irritação, e o olhar do Colin se posou em sua boca.

—Muito bem, sim, tenho uma entrevista com ele manhã para uma tiragem privada.

Ele forçou um sorriso que não alcançou seus olhos e conseguiu não perguntar se era a primeira vez que tinha

uma entrevista assim com aquele homem.

—Já está. Tão difícil era? diga, ele é vítima das mesmas tarifas exageradas que me cobra ?

Em lugar de ofender-se ante sua brusca pergunta, a jovem pareceu divertida.

—Vamos, lorde Sutton, como vou responder a essa pergunta? Se disser que ele paga mais, irá se gabará do

trato que recebe, e portanto arrisco a desatar as iras do senhor Jennsen. Se disser que é o senhor quem paga

mais, arrisco-me a desatar suas iras. Como não me resulta atraente nenhuma das duas possibilidades, tenho

que negar-me a responder.

O coração de Colin realizou uma ridícula manobra ao ver o esboço de um sorriso nos lábios da jovem.

Aproximou um pouco mais a cadeira à dela e se viu recompensado com um leve aroma de laranjas.

—Se for ele quem paga mais, prometo não me gabar.

—Uma amável oferta; entretanto, tenho a política estrita de não comentar as tarifas de um cliente com ninguém

que não seja esse cliente.

—A política estrita —repetiu ele em voz baixa—. Tem muitas dessas?

—Políticas estritas? A verdade é que sim. Como por exemplo não perder o tempo com bate-papos ociosos em

minha mesa de jogar tarot.

—Excelente. Então, comecemos. Não deveria estar baralhando ou algo assim? —perguntou ele indicando as

cartas, que estavam estendidas sobre a mesa.

—Outra política estrita é que não baralho as cartas até que meu próximo cliente está sentado frente a mim.

Ele abriu os braços.

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—E sentado estou.

Todo rasto de diversão abandonou os olhos da moça. Inclinou-se um pouco para diante, e Colin fez o mesmo

enquanto inspirava fundo e devagar, desfrutando do delicado aroma de laranjas que provocava os seus

sentidos.

—Dado o resultado de nossa tiragem desta tarde —murmurou a jovem—, não acredito conveniente jogar-lhe

as cartas em um lugar tão público.

—Entendo. Prefere estar sozinha comigo.

—Sim. Não. Quero dizer que...

A jovem franziu o cenho.

—OH, que interessante, estão a ponto de jogar as cartas, a lorde Sutton —surgiu a inconfundível voz de lady

Newtrebble justamente ao lado de Colin. O homem voltou-se e elevou o olhar até ela. A dama agitou seu leque

com vigor, sacudindo as plumas de pavão. Sua cabeça parecia rodeada de asas em movimento—. Minha

sobrinha, lady Gwendolyn, e eu teremos muitíssimo interesse em ouvir as predições de madame a respeito de

sua futura esposa, senhor.

A mulher fez um gesto a madame Larchmont.

—Continue. Não se preocupe comigo.

—Vamos, lady Newtrebble, já conhece minha política estrita —disse a moça com um sorriso que a Colin

pareceu forçada—. Não posso jogar as cartas a lorde Sutton com a senhora aí de pé...

—Eu não tenho nada que objectar —disse Colin.

—Excelente —respondeu lady Newtrebble com um esplêndido sorriso—. Continue —ordenou a madame

Larchmont com o cenho franzido.

—antes de começar —disse Colin, sorrindo a sua anfitriã—, gostaria de um pouco mais do seu magnífico

conhaque. Poderia ocupar-se disso? Não começaremos sem sí —acrescentou em tom solene, ao ver que a dama

vacilava.

—Muito bem —disse lady Newtrebble, não muito agradada—. Malditos sejam! Onde se metem os lacaios

quando mais falta fazem?

Assim que se afastou, Colin inclinou-se para diante.

—Pagarei-lhe meia coroa por dizer que a mulher com a que vou casar tem o cabelo castanho.

Alex piscou.

—Como diz?

—De acordo, muito bem. Uma coroa. Merecerá a pena, para dar por acabadas as esperanças de lady

Newtrebble, de que escolha a sua loira sobrinha como prometida.

—Não gosta de sua sobrinha? Lady Gwendolyn é muito bonita.

—É certo. Entretanto, albergo uma intolerância extravagante por gente petulante e altiva que se queixa de

tudo, seja qual for a cor de seu cabelo.

—Entendo —respondeu a jovem com um leve sorriso, suficiente para o fazer saber que aquilo lhe fazia graça—

. Mas e se as cartas predisserem que em seu destino está casar-se com uma mulher loira? Estará eliminando a

todas as demais loiras, não só a lady Gwendolyn.

—Dada minha escassa crença no tarot, estou disposto a arriscar.

—De todos os modos, se as cartas indicassem uma mulher loira —insistiu a jovem com um suspiro, sacudindo

a cabeça—, isso me obrigaria a mentir.

—Quer dizer que jamais disse mentiras, madame Larchmont?

—Há-as dito ?

mais das que posso contar.

—Sim. E a senhora?

A jovem vacilou antes de responder.

—Eu não gosto de mentir.

—Muito admirável. A mim tampouco. Entretanto, as circunstâncias nos forçam às vezes a fazer coisas que nós

não gostamos.

—Parece que fala por experiência, senhor.

—Assim é. E sem dúvida não alcançou a idade de...

—Vinte e três anos.

—A idade de vinte e três anos sem fazer algo que não lhe tenha gostado de muito.

—Certamente, e esta conversação é um exemplo perfeito.

O brilho de diversão em seus olhos desmentia suas palavras.

Colin aproximou-se mais, encheu sua cabeça com o doce aroma cítrico e subiu sua oferta.

—Meio soberano.

A moça deu um profundo suspiro.

—Temo-me que as mentiras são... caras.

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—Mais caras que meio soberano?

—Pois sim. Sobre tudo as mentiras que têm muitas probabilidades de fazer perder a uma clienta enriquecida

como lady Newtrebble.

—tornou-se louca se acreditar que uma miserável reconhecida como lady Newtrebble se desprenderia de meio

soberano para que lhe jogassem as cartas.

Alex apenas sorriu em resposta.

—O que está fazendo tem um nome, madame Larchmont.

—Sim. chama-se «pagamento».

—Não. Chama-se «extorsão».

Por alguma absurda razão, aquela conversa —que o deveria ter aborrecido muito — o entusiasmava de forma

inexplicável, de um modo que não tinha experimentado em muito tempo. Colin deu por sua vez um suspiro.

—Muito bem, qual é seu preço por dizer uma mentirinha?

—Um soberano.

—dá-se conta de que isso é ridículo.

A jovem encolheu de ombros.

—A decisão é dela.

—Uma soma escandalosa para se cobrar a um amigo.

Ela levantou uma sobrancelha em um gesto eloquente.

—Não acredito que nossa breve relação possa descrever-se como amizade, senhor.

—Suponho que isso é certo. Uma circunstância a que eu gostaria de pôr remédio —respondeu ele, sem deixar

de olhá-la nos olhos.

—Nos três próximos segundos, concertezao —disse a moça com um sorriso.

Colin lhe devolveu, o sorriso.

—Sim, isso resultaria muito útil.

—A verdade é que não. Aos amigos cobro a mesma tarifa que aos simples conhecidos.

—Ah! Então, de nada serve conhecê-la.

—Temo-me que não —replicou ela, olhando por cima do ombro de Colin—. Aproxima-se lady Newtrebble

com seu conhaque, senhor.

—Muito bem —disse ele em tom de queixa—. Que seja um soberano... Mas só o pagarei se for convincente.

—De acordo. E não tema, senhor, sou muito boa no que faço.

—Sim, disso estou certo.

Entretanto, a questão segue sendo o que faz exactamente, pensou Colin.

Capítulo VII

Alex baralhou as cartas com gesto enérgico. Como se aquela noite não a tivesse já bastante alterado, tentando

detectar o áspero sussurro que tinha ouvido a noite anterior no estudio de lorde Malloran, agora se sentia

perturbada pela proximidade de lorde Sutton. A presença de lady Newtrebble, que andava dando voltas nas

proximidades, nervosa e espectante, não fazia mais, que não ser aumentar seu desconforto.

— Que pergunta gostaria de fazer, lorde Sutton? —perguntou sem deixar de baralhar as cartas.

—A que todo mundo tem em mente. Com quem vou casar- me?

Alex assentiu e deixou o baralho sobre a mesa.

—Corte uma vez com a mão esquerda.

—por que com a esquerda? —perguntou ele enquanto obedecia.

—Isso contribui para conferir ao baralho sua energia pessoal.

Sem dizer nada mais, a jovem voltou as cartas que prediriam o futuro imediato do Colin. E ficou sem fôlego.

Falsidade. Engano. Traição. Enfermidade. Perigo. Morte. As mesmas coisas que tinha visto durante a tiragem

dessa tarde. E a última carta, que representava a entidade em torno da qual giravam todas as demais,

indicava...

A uma mulher de cabelo castanho.

De ter sido capaz de fazê-lo, Alex se teria posto-se a rir ante a ironia. Ao menos não teria que mentir, porque

não via nenhuma loira em seu futuro. É obvio, a má notícia era que a mulher de cabelo castanho significaria

provavelmente a morte para ele.

—O que vê?

O primeiro impulso da moça foi dizer-lhe imediatamente, o avisar, mas dada a falta de intimidade pensou que

aquele não era o momento nem o lugar adequado. Sobre tudo porque seu cepticismo a respeito da veracidade

de sua tiragem significava que seria necessário o convencer. Mas devia fazê-lo porque, em vista daquela

tiragem, Alex não tinha dúvidas de que o aguardavam perigos.

Mais tarde. O diria mais tarde. Naquele momento tinha que ganhar aquele soberano que tanto necessitava.

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—Vejo uma mulher em seu futuro —disse.

Colin estendeu as mãos e sorriu.

—Bom, isso parece prometedor. Pode me dizer como se chama?

—Os espíritos, as cartas, não indicam um nome, mas...

A moça fez uma pausa para obter um efeito dramático.

—Mas o que? —interveio lady Newtrebble—. Quem é a garota?

—A considera formosa...

—claro que sim —disse lady Newtrebble em tom triunfante.

—Inteligente...

—É obvio —disse lady Newtrebble, indicando com a mão que continuasse—. Continue.

—Acredito que é para mim que estão predizendo o futuro, lady Newtrebble —disse lorde Sutton em tom seco.

—OH! Sim. Claro. Continue, madame Larchmont.

—E é morena —disse Alex—, com os olhos castanhos.

Caiu sobre o trio um silêncio ensurdecedor, quebrado pela voz raivosa de lady Newtrebble.

—Que disparate é esse? Ela não é assim. É loira e tem os olhos azuis.

Alex sacudiu a cabeça.

—Temo-me que as cartas indicam, com muita claridade e insistência, que a mulher destinada para lorde Sutton

é uma morena de olhos castanhos. Conhece alguém com essa descrição, senhor? —perguntou a moça.

—A metade das mulheres da Inglaterra respondem a essa descrição, como a metade das mulheres que assistem

a esta festa —disse Colin, antes de observá-la durante vários segundos—. Incluindo-a si, madame.

A jovem sentiu mariposas no estômago e, se as palavras e o fascinante olhar dele não a tivessem deixado sem

fala, teria posto-se a rir. Ela era a última mulher de todo o reino que estaria destinada a esse homem.

—Bem, espero que recorde que isto é somente uma diversão inofensiva, senhor —disse lady Newtrebble antes

que Alex pudesse pensar em uma resposta.

—Terei-o em conta em todo momento enquanto procuro a minha futura esposa morena e de olhos castanhos —

disse Colin em tom solene—. Tem a minha mais profunda gratidão, lady Newtrebble, por permitir que

madame Larchmont me tenha dado esta noticia durante sua festa. Estou certo de que, se o assunto se publicar

no Time, seu nome e esta deliciosa festa se mencionarão de forma destacada.

Lady Newtrebble piscou, e logo seus olhos se entreabriram com inconfundível avareza.

—O Time. Sim. Sem dúvida quererão saber tudo.

A dama desculpou-se, e Alex suspirou aliviada.

—Bem feito —disse lorde Sutton em voz baixa.

—Obrigado. Espero que minha interpretação tenha sido aceitável.

—Sim. Pagarei-lhe sua tarifa amanhã quando vier a minha casa para me jogar as cartas.

Colin se levantou mas, em lugar de partir, apoiou as mãos sobre a mesa e inclinou-se para ela.

—Posso acompanhá-la a sua casa depois da festa?

Falava em voz baixa e premente, e seus olhos verdes não revelavam seus pensamentos. A perspectiva de estar

a sós com ele, na intimidade de sua carruagem, sentados perto, na escuridão, provocou ao Alex um calafrio.

Um calafrio que desejou chamar apreensão, mas ao que só pôde dar o nome que tinha. Ilusão.

Devia negar-se, queria negar-se, e sem dúvida o teria feito se não tivesse que lhe dizer o que de verdade tinha

visto nas cartas. Alex aferrou-se a essa desculpa.

—Não é necessário... —disse, negando-se a parecer entusiasmada.

—Já sei que não é necessário, madame. Mas, como cavalheiro que sou, minha consciência não me permite

deixar que volte para casa em um carro de aluguer, e menos a uma hora tão avançada. Uma dama não deveria

sair sem um acompanhante adequado em uma cidade em que o delito é moeda corrente.

Uma dama. Alex conteve o som de desgosto que pugnava por sair de sua garganta, reprimindo-se para não

assinalar que ela não era nem seria nunca uma dama.

—É muito galante, senhor.

—E estou muito acostumado a conseguir o que quero.

A jovem arqueou uma sobrancelha.

—Coisa que me faz recusar só por esse motivo.

—Espero que vença essa tentação neste particular.

Algo em sua voz, em sua forma de dizer «tentação», em sua forma de olhá-la... fez que o coração de Alex

descompassa-se.

—É necessário vencer a tentação, senhor.

—Em alguns casos, sim.

—Não em todos?

Pelo amor de Deus, esse som ofegante era sua voz?

O olhar do Colin parou nos lábios dela, e a jovem ficou sem fôlego.

—Não, madame —disse ele, olhando-a de novo aos olhos—. Não em todos os casos. Permite-me acompanhá-la

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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a casa?

—Muito bem. Aceito sua oferta, porque há algo que quero comentar consigo —acrescentou, levada pelo

orgulho.

Colin sorriu.

—Espero que não seja uma subida de suas tarifas.

—Não, mas essa é uma excelente ideia.

—Não, de certeza que não o é. Entretanto, eu sim que tenho uma idéia que é excelente.

Colin permaneceu em silêncio uns momentos.

—E qual é essa excelente ideia? —apontou Alex, ao ver que ele não dizia nada.

Os lábios do Colin curvaram devagar e a olhou sonrrindo. A jovem resistiu com muita dificuldade ao impulso

de abanar-se com a mão enluvada. Deus, aquele homem era... contundente! E, ao que parece, sem tentá-lo

sequer. Pobre da mulher que tentasse resistir a ele se de verdade se esforçava por seduzi-la.

—Pensava que nunca o perguntaria, madame. Responderei a sua pergunta durante a viagem a casa.

—E o que supõe que vou fazer até então? murchar de curiosidade?

Colin inclinou-se para a jovem, que percebeu um agradável aroma de roupa recém lavada.

—Não. Tem que pensar em mim —disse em voz baixa—, e perguntar-se qual é minha excelente ideia.

Antes que Alex pudesse respirar, e muito menos formular uma resposta, Colin partiu para perder-se entre a

multidão.

Tem que pensar em mim.

A jovem exalou o ar devagar. Isso não seria nenhum problema. O certo era que, desde que o viu a noite

anterior na festa dos Malloran, tinha resultado quase impossível pensar em algo que não fosse ele.

Três horas depois, após jogar o tarot por última vez nessa noite, Alex seguia pensando em lorde Sutton, como

tinha feito enquanto jogava as cartas a mais de uma dúzia de convidados. E enquanto escutava com atenção

todas as vozes que flutuavam a seu redor, perguntando-se se voltaria a ouvir o áspero sussurro do estudio de

lorde Malloran, nada certa de desejar ouvir de novo essa voz. Porque, se a ouvia, o que faria então?

Desde que Colin se perdeu entre a multidão, Alex tinha-se obrigado a manter sua atenção centrada nas

pessoas que se sentavam frente a ela, sem permitir que seu olhar vagasse em busca dele. De todos os modos,

aquele homem ocupava cada canto de sua mente, coisa que em si já era bastante perturbadora. Mas ainda a

desestabilizava mais a forma em que o fazia, a desconcertante direcção de seus pensamentos.

Seu cabelo... parecia tão espesso e brilhante que gostava de tocá-lo. Que sensação produziria passar os dedos

entre aquelas escuras mechas sedosas?

E seus olhos. Tão verdes. Tão frustrantes e impenetráveis.

E entretanto tão atractivos quando brilhavam com uma nota de humor. Que aspecto teriam cheios de desejo?

Cheios de desejo por ela?

Um pensamento perigoso que Alex tinha afastado de sua mente incontáveis vezes.

Entretanto, logo que afastava a lembrança de seus olhos, encontrava-se pensando em seus largos ombros, na

forma fascinante em que enchia sua jaqueta e suas calças negras de etiqueta. Seus braços pareciam tão fortes...

O que se sentiria ao ser abraçada por eles?

E logo estava sua boca... aquela boca atractiva e masculina cujos lábios atraíam seu olhar como um festim a um

homem faminto. Que tacto teriam aqueles lábios sob as pontas de seus dedos? Suave? Firme? Ambos? Que

sensação daria o roçar de sua boca contra a dela? Que Deus a ajudasse. Queria sabê-lo. Com desespero. E muito

se temia que, se lhe oferecia a oportunidade de averiguá-lo, não seria capaz de resistir.

Todos seus impulsos e desejos, toda a curiosidade feminina que tinha reprimido com rigor até então pareciam

agora a ponto de estalar, como uma fruta muito amadurecida que rompesse sua pele. Pela primeira vez,

desejou libertar-se de seu título de madame, deixar-se arrastar por suas fantasias com o homem que as tinha

inspirado a partir do momento em que o viu no Vauxhall quatro anos atrás.

Um som de desgosto surgiu em sua garganta, e Alex apertou os lábios para contê-lo. Como devia conter

aqueles pensamentos tortuosos e ridículos, e aquelas perguntas inadequadas e impossíveis cujas respostas

jamais conheceria. Entretanto, enquanto seu sentido comum lhe dizia isso, imagens sensuais dele continuavam

bombardeando-a, o que a chateava muito. Não desejava albergar tais pensamentos a respeito de nenhum

homem, mas se o ia fazer , por que, por que tinha que ser com esse homem em particular, um homem ao qual

nunca poderia ter, não era adequado para ela de nenhuma forma concebível, nunca poderia tocar ou beijar?

Muito aborrecida consigo propria, recolheu suas cartas. O último consultante tinha abandonado a mesa fazia

vérios minutos, e ela ficou sentada ali como uma idiota, suspirando embevecida por um homem situado tão

acima de seu nível social que só dava para rir.

Depois de envolver suas cartas na peça de seda de cor bronze, baixou o braço por debaixo do comprido toalha

de damasco branco em busca de sua bolsa. Ao não encontrá-lo, inclinou-se mais e levantou o tecido para

espionar sob a mesa. Quando viu a bolsa fora de seu alcance, estirou-se ainda mais para o chão. Seus dedos

acabavam de roçar o cordão de veludo quando ouviu um áspero sussurro.

—Temo-me que isso é impossível —dizia.

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Alex ficou paralisada. O cabelo da nuca arrepiou-se todo, e um calafrio percorreu suas costas. Reconhecia essa

voz. Jamais a esqueceria. levantou-se em seguida com o coração desbocado. Um grupo de pessoas passava

junto à mesa, certamente para o vestíbulo, para partir. Eram quatro homens e duas mulheres, todos membros

conhecidos da alta sociedade. Enquanto passavam, fixou-se em outro grupo formado por três homens, situado

a uns três metros. E em um trio de mulheres perto deles. De novo, todos eram respeitáveis membros da

aristocracia. Nas proximidades havia também dois lacaios que recolhiam as taças vazias dos convidados que

partiam. Alex escutou com atenção, mas nenhuma das vozes era o áspero sussurro. Quem tinha falado, fosse

quem fosse, estava agora em silêncio ou tinha recuperado uma voz normal.

De que grupo procedia a voz? Não estava certa de o querer saber. Aquela pessoa planejava matar a alguém na

próxima semana, e com toda probabilidade era responsável pela morte de lorde Malloran e de seu lacaio,

certamente devido à nota que ela tinha escrito . Alex não desejava converter-se em um cadáver. Mas a única

forma de deter aquilo era averiguar quem era o assassino. Antes que alguém mais morresse. Quer dizer, ela.

Embora fosse invadia peloo pânico, tinha que averiguar quem tinha falado. ficou em pé e colocou as cartas em

sua bolsa a toda pressa. Logo se voltou para afastar-se da mesa. E tropeçou contra algo sólido. Algo sólido que

cheirava a roupa limpa com um pingo de sândalo. Algo que a agarrou pelos braços e ficou a falar.

—Se chocar comigo vai converter-se em um costume, tenho que dizer que prefiro a intimidade do jardim a um

salão cheio de gente.

O coração do Alex pulsou com força e, para seu horror, em lugar de afastar-se ou ao menos ficar imóvel,

aproximou o nariz do peitilho de lorde Sutton e voltou a respirar seu aroma. Por espaço de vários segundos,

sentiu-se segura, pela primeira vez em sua vida. Como se estivesse envolta em uns braços fortes e protectores.

Uma idéia descabelada que se separou de sua mente imediatamente.

Enjoada pela combinação do aroma de Colin e o calor das mãos masculinas que desciam por seus braços, teve

que obrigar seus pés a dar um passo atrás. Quando o fez, seus olhares encontraram-se. O homem seguia

agarrando-a nos braços, e a Alex resultava difícil respirar enquanto continuavam olhando-se. Então ele franziu

o cenho.

—O que acontece? —perguntou.

—Pois... nada.

Colin se aproximou enquanto seus dedos a apertavam com mais força.

—Algo acontece. Está pálida e tremente.

Alex notou o peso de um olhar que não era o dele, e de novo se arrepiou o cbelo da nuca. A jovem observou as

pessoas situada perto da mesa, mas ninguém a olhava.

Colin também olhou a seu redor, percorrendo com a vista o grupo próximo antes de voltar os olhos para ela.

—Incomodou-a alguém?

A jovem percebeu com claridade a gélida ameaça sob suas palavras serenas, e por um instante desatinado

experimentou uma emoção feminina desconhecida. Lorde Sutton parecia disposto a brigar com qualquer que

se atrevesse a lhe dizer a ela algo desafortunado. Como se pretendesse a proteger de qualquer dano...

Um impulso de irritação contra si mesma interrompeu o ridículo pensamento. Ele não faria semelhante coisa.

Por que ia arriscar se sequer a enrugar a jaqueta por ela? E, embora assim fosse, ela não necessitava que

ninguém a protegesse nem brigasse por ela. Tinha ído muito bem só durante todos aqueles anos. sentiu-se

ainda mais irritada por permitir que sua angústia se notasse tanto. Recuperando seu autocontrol, Alex levantou

o queixo e deu um passo atrás. Os dedos do Colin separaram-se de seus braços, mas seus olhos perspicazes não

abandonaram os seus nem um momento.

—Ninguém me disse nada, senhor. Mas, embora assim fosse, não vejo por que teria que se preocupar.

—Não?

—Não. Sou muito capaz de me defender se a ocasião o requerer. Se estiver pálida, é apenas porque me sinto

cansada. Resulta-me exaustivo jogar as cartas tantas vezes em uma só sessão.

—É fatigante comunicar com os espíritos?

A jovem ignorou seu tom seco.

—O certo é que sim.

—Então, vamos a levar a casa, é obvio.

menos de cinco minutos depois, Alex estava sentada frente a Colin dentro de sua luxuosa carruagem. As

grossas almofadas de veludo a acolhiam com deliciosa suavidade, e fechou seus olhos enquanto suspirava

agradada.

—Melhor que um carro de aluguer? —disse a profunda voz dele, divertida.

Alex abriu os olhos de repente. Colin estava reclinado no assento em frente, olhando-a das sombras. Sua boca

esboçava um meio sorriso.

—um pouco —disse ela, no mesmo tom ligeiro que ele tinha utilizado.

Embora a moça, severmante, recordasse que aqueles tempos de luxo eram passageiros, estava decidida a

desfrutar de seus poucos momentos de comodidade.

Entretanto, era difícil sentir-se cômoda de todo com o perturbador olhar de lorde Sutton pousado nela, para

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não mencionar a fatalidade predita pela tiragem dele e a possível ameaça para si mesma do assassino de voz

áspera.

O silêncio prolongava-se entre eles. Sentia ele a mesma corrente subterrânea de tensão? Alex precisava o

advertir do que tinha visto em suas cartas, mas Colin parecia preocupado. Agitado. A jovem decidiu romper o

gelo antes de colaçar o tema que ocupava sua mente.

—Como foi esta noite?

Em lugar de responder com uma resposta qualquer, Colin pareceu considerar seriamente a pergunta.

—foi uma noite pesada e pouco memorável. E a sua?

A moça sentiu a tentação de dizer o mesmo mas, embora a noite se tinha feito pesada, para ela sim tinha sido

memorável, e toda a culpa era dele. Bom, dele e de ter tido muito perto, só há uns momentos alguém que sem

dúvida desejava mandá-la ao outro bairro.

—Para mim a noite foi... interessante —disse.

—Como é isso?

—Eu gosto de conhecer pessoas, averiguar coisas delas através das cartas.

—Invejo-a. Talvez devesse dedicar-me a jogar as cartas. Temo que não me resulta nada interessante evitar a

mães casamenteiras ou tratar de conversar com suas filhas bobas e insossas.

Colin inclinou-se para diante, e Alex ficou sem fôlego ante sua repentina proximidade, menos de um metro

separava seu rosto do dela, uma distância que parecia muito escassa e ao mesmo tempo excessiva.

Com os cotovelos apoiados sobre suas pernas separadas, o homem entrelaçou as mãos e a olhou com olhos nos

que brilhava um pingo de malícia.

—Embora agradeça sua convincente afirmação (que, por certo, me levou uma fortuna) de que a mulher

destinada para mim tem o cabelo escuro, teria preferido algo um pouco mais concreto. Algo, o que fosse, que

me evitasse o aborrecimento de falar do tempo com outra manada de moças soltando risadas. É que nenhuma

pode manter uma conversa remotamente inteligente? —disse, sacudindo a cabeça.

—Certamente ficam nervosas em sua presença, senhor.

—Nervosas?

—Suponho que entenderá que a uma moça e inexperiente a intimide um homem como o senhor.

Colin arqueou uma sobrancelha.

—A verdade é que não. E o que é, para ser exacta, um homem como eu?

—Não quer me entender, senhor. Sua posição na sociedade basta por si só para deixar mudas a muitas pessoas,

quanto mais uma moça. Sobre tudo se vai acompanhada de uma mãe casamenteira e que deseja causar-lhe boa

impressão.

—Não parece que a intimide, nem que fique muda em minha presença. Já que me levou muito dinheiro esta

noite.

—Mas eu não sou uma jovem inexperiente empenhada em causar-lhe boa impressão, senhor.

—A verdade, do ponto de vista de meus recursos, que diminuem a toda velocidade, é uma lástima.

Colin inclinou a cabeça e pareceu observar as mãos enluvadas de Alex, que sentiu o impulso das ocultar por

baixo das dobras de seu vestido. Logo, o homem levantou os olhos e a imobilizou com um olhar cheio de

seriedade.

—Então um homem como eu é alguém com um título nobiliário?

—Sim.

—Entendo. E isso é tudo? Nada mais?

Colin esperava sua resposta com todos os músculos tensos, dizendo-se que não o importava nada o que ela

opinasse. Que, se ela somente o via como um título nobiliário e nada mais, dava-lhe absolutamente igual.

Um brilho de malícia aninhou nos olhos do Alex.

—Está procurando que lhe façam elogios, e de forma descarada.

Sim? Demônios, não sabia. Não tinha costume de fazer isso mas, claro, nunca se havia sentido tão perturbado

em presença de uma mulher.

—Não procuro que me façam elogios —disse, depois de reflectir—, a não ser simplesmente saber ao que se

refere. É obvio, se resultar que me faça elogios, pois melhor.

—E se resultar que não pretendo o elogiar —

—De todos os modos eu gostaria de sabê-lo. É obvio, isso poderia diminuir suas possibilidades de me tirar

outro soberano a breve prazo.

A jovem esboçou um sorriso.

—Nesse caso, referia um homem com seu porte distinto, sua inteligência imponente, sua boa aparência.

Colin arqueou as sobrancelhas.

—Só boa?

—É obvio, quis dizer sua imponente aparência.

—Acreditava que era minha inteligência que lhe parecia imponente.

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—Ao igual a sua aparência.

—Faz dois segundos, minha aparência resultava somente boa.

A moça sorriu.

—Mas de uma forma imponente.

O olhar do Colin desceu até os lábios curvados da jovem, e de repente pareceu que não havia ar na carruagem.

O desejo de tocá-la que levava espreitando-o toda a noite ameaçou o dominar. Colin uniu as mãos para conter-

se porque suspeitava que, se cedia, um só contacto não seria suficiente.

Lorde Sutton decidiu que seu melhor recurso era trocar de tema.

— Disse que aceitava minha oferta de acompanhá-la a sua casa porque desejava comentar algo comigo.

A diversão desapareceu dos olhos da moça, e Colin a sentiu falta dela imediatamente, embora devia alegrar-se

de seu desaparecimento pois lhe resultava muito atractiva e tentadora. Mas, diabos, Alex não era menos

atractiva nem tentadora sem ela. Talvez se lhe jogasse um saco sobre a cabeça... mas não, ainda poderia ver

suas voluptuosas curvas. Um saco de corpo inteiro... isso necessitava. Para a cobrir dos pés à cabeça. E se

resultava que o saco ocultava seu sedutor aroma de laranjas, melhor ainda.

—Desejava comentar sua tiragem.

Aquelas palavras o arrancaram de seu pensamento.

—Ah, sim? Qual? a desta tarde, que me levou uma pequena fortuna, ou a de esta noite, que me levou uma

fortuna maior, ou a de manhã, que temo acabe me custando uma fortuna maior ainda?

—a de esta noite. devido à presença de lady Newtrebble, não lhe disse tudo o que vi —explicou Alex, enquanto

seus dedos enluvados mexiam nas dobras de seu vestido—. Temo que as cartas revelam as mesmas coisas

preocupantes que vi esta tarde, senhor. A falsidade, a traição e o engano. A enfermidade, o perigo e a morte —

acabou, em um sussurro.

—Entendo.

Colin a observou durante uns segundos. Embora a expressão deo Alex não fosse reveladora, sua atitude era de

sincera preocupação. Um calafrio de desgosto percorreu as costas do homem. Sua intuição levava um tempo

lhe dizendo que enfrentava às mesmas coisas que a jovem tinha visto nas cartas. Podia haver alguma verdade

naquilo, ou era simplesmente um truque de salão e uma coincidência?

Colin sacudiu a cabeça. Demônios, estava deixando-se levar pela imaginação. Aquela mulher era preparada, e

ele tinha feito mal em a subestimar. Se lhe predizia um futuro de cor rosa, suas sessões chegariam a seu fim. Ao

predizer coisas terríveis, sem dúvida esperava mantê-lo interessado, o suficiente para continuar pagando suas

escandalosas tarifas.

—Dado que estamos de acordo em que as mulheres dizem uma coisa e querem dizer outra, devo interpretar

que «falsidade, traição e engano» significa em realidade que vou receber grandes somas de dinheiro e

encontrar à mulher de meus sonhos?

—Isto não é assunto de brincadeira, senhor.

—Não leve a mal, madame. Não desejo insultá-la mas, tal como lhe disse desde o começo, não acredito muito

no tarot.

Alex se inclinou para diante com o cenho franzido.

—Deve ser cauteloso, prudente...

—Sempre o sou, assim que lhe rogo que não se angustie mais por mim. Agora, me diga, fez o que lhe sugeri?

—Sugerido?

—Sim. Disse-lhe que pensasse em mim.

A jovem ficou perplexa.

—E que se perguntasse qual era minha excelente ideia —acrescentou Colin em voz baixa.Alex piscou e

levantou o queixo.

—Sinto muito, mas estava tão ocupada com as tiragens que não pensei nisso.

Colin sacudiu a cabeça.

—Lástima, porque esperava tentá-la. Mas está claro que não é uma mulher que caia na tentação.

—Pois não, não o sou. Certamente que não.

O homem alargou a mão até o canto às escuras de seu assento e tirou um embrulhito envolto em uma peça de

tecido.

—Uma virtude admirável, madame. Aplaudo sua determinação. Entretanto, eu não sou tão duro de cortar.

Colin desembrulhou o pacote.

—O que é? —perguntou ela, aproximando-se com os olhos muito abertos.

—Pastelinhos. Levam por dentro capas de bolacha de chocolate e nata de framboesa. Logo, banham cada peça

em chocolate e põem em cima um toque de cremoso glacê.

—OH... vá!

Sua rosada língua apareceu um instante para humedecer seus lábios, e Colin ficou paralisado.

—Como chegaram esses deliciosos pasteis há sua carruagem? —quis saber a moça.

—Preparou-os minha cozinheira. furtei estes quatro e os escondi na carruagem para os poder comer no

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caminho de volta a casa. Minha excelente ideia era desfrutá-los com alguém que compartilhasse minha

debilidade pelos doces —disse, antes de exalar o ar com força—. Por desgraça, como não pensou nisso, está

claro que não lhe interessa.

—OH! Mas...

—Além disso, não é uma mulher que caia na tentação —disse, alargando o braço e agitando o pacote diante de

seus narizes—. Lástima.

Alex aspirou pelas fossas nasais e fechou os olhos um instante. Seus lábios se entreabriram, atraindo atenção

de Colin para sua boca sensual. Logo a jovem esclareceu a garganta.

—Senhor, acredito que acordamos que não é necessário vencer a tentação em todos os casos.

—A verdade, embora recordo haver dito isso, não me parece que coincidisse comigo.

—Certamente, minha intenção era essa, sobre tudo no que respeita aos bolos com glacê —disse ela, olhando os

doces—. Apetecíveis bolos com glacê, de aspecto delicioso e doce aroma. Acredito que sua idéia de desfrutá-los

com alguém que compartilhe sua debilidade pelos doces é mais que excelente. A verdade, sinto a tentação de a

qualificar de genial.

Colin sorriu.

—Então, sim consegui tentá-la.

—Temo-me que me derrubei como um castelo de naipes de tarot.

—Minha querida madame Larchmont, com estes bolos, até eu teria podido predizer esse resultado.

O homem agarrou um dos doces e o estendeu. Quando Alex esticou a mão, Colin afastou a sua e sacudiu a

cabeça.

—Manchará as luvas —disse—. Permita.

Lorde Sutton estendeu a mão e sustentou o bocado diante dos lábios da jovem.

Ela o olhou surpreendida, e Colin percebeu sua luta interna entre o decoro e o desejo do doce. Finalmente,

inclinou-se para diante e o mordeu com delicadeza.

Os lábios do Alex roçaram as pontas dos dedos masculinos, e um intenso calor subiu pelo braço do Colin. Mas

aquele calor pareceu ar fresco comparado com o ardor que a moça acendeu ao fechar os olhos devagar e emitir

um suave gemido de prazer. Paralisado, Colin observou o lento movimento dos lábios da jovem enquanto

saboreava a parte do bolo e como ao terminar passava a ponta da língua pelos lábios para apanhar o sabor que

pudesse ficar. O corpo inteiro do Colin se esticou, e teve que apertar seus próprios lábios para reprimir um

gemido.

Alex deu um longo suspiro que soou como um sensual sussurro. Então seus olhos abriram, e a moça o olhou

com uma expressão vidrosa através das pálpebras entreabridas.

—Oooh, vá! —murmurou—. foi... estupendo.

Demônios. Estupendo era uma descrição muito pobre. Com os lábios separados e húmidos, e as pálpebras

cansadas, parecia excitada e mais deliciosa que qualquer doce que tivesse visto jamais. E, Por Deus, queria

prová-la mais do que nunca tinha desejado doce algum.

Colin não sabia quanto tempo tinha sentado ali, olhando-a boquiaberto, mas por fim a jovem piscou e falou:

—Está-me olhando fixamente, senhor.

Ele teve que tragar saliva duas vezes para localizar sua voz.

—Não, estou... admirando —respondeu sem apartar o olhar do Alex, enquanto se movia para sentar-se junto a

ela—. Para sí —disse elevando a metade restante até os lábios da jovem.

—Não o quer?

Que Deus o ajudasse; nesse momento toda a existência do Colin girava em torno do verbo «querer».

—Quero que o coma —disse em um áspero sussurro que apenas reconheceu.

O homem tocou sua boca com o pedaço de bolo, e ela separou os lábios. Depois de deslizar devagar o bocado

em sua boca, Colin retirou a mão, arrastando a ponta do dedo indicador por cima do lábio inferior da jovem e

deixando atrás uma brilhante capa de chocolate fundido.

As pupilas de Alex flamejaram, e a moça apertou os lábios, apanhando a ponta de seu dedo. A erótica visão e a

impressionante sensação dos lábios femininos rodeando a ponta de seu dedo imobilizou Colin. Sentiu-se

invadido pelo calor, e seu coração pulsou com força, bombeando fogo para todas suas terminações nervosas.

Seu dedo se libertou devagar, e Colin contemplou cada matiz da expressão dela enquanto comia a oferta,

excitando-se mais e mais com cada segundo que passava. Diabos, desde quando resultava tão sensual, desde

quando tinha tanta carga sexual, ver alguém a comer?

Alex fechou os olhos e mastigou devagar. Ao tragar, emitiu um suave grunhido de prazer. Logo passou a

língua devagar pelo lábio inferior, apagando a fina capa de chocolate que Colin tinha deixado nele.

A seguir abriu os olhos.

—foi maravilhoso.

—Para mim também —disse Colin.

Sua voz soou como se tivese tragado um punhado de cascalho.

—Mas não comeu nenhum.

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—Preferiria provar o seu.

Colin inclinou a cabeça e roçou os lábios da jovem com os seus. Alex inspirou com força e logo ficou imóvel.

—Que doce! —murmurou ele, voltando a tocar seus lábios—. É delicioso.

Mais. Tenho que ter mais, disse-se,

Tomou a cara do Alex entre as mãos e beijou cada canto de sua boca. Continuando, passou a língua pelo grosso

lábio inferior da moça. Os lábios femininos se separaram com um suave som ofegante, e Colin o aproveitou

imediatamente, colocando a boca sobre a dela. E se perdeu imediatamente.

Alguma mulher tinha um sabor tão voluptuoso, tão quente e delicioso? Não... só aquela. Aquela mulher cuja

lembrança o tinha açoitado durante quatro anos. Aquela mulher que nunca esperou voltar a ver e tocar fora de

seus sonhos. O coração do Colin sempre soube que aquela mulher teria aquele sabor. Um sabor perfeito.

Com um gemido, deslizou uma mão entre seus suaves cabelos e a outra em torno de sua cintura, apertando-a

contra si enquanto sua língua explorava a aveludada doçura de sua boca. Um desejo premente o alagou,

afligindo-o com uma necessidade que se multiplicou quando a jovem esfregou sua língua contra a dele,

primeiro com gesto vacilante e logo com uma receptividade que eliminou outra capa do controle do Colin, que

se desvanecia a toda velocidade.

Demônios, queria devorá-la. Invadiu-o um desespero abrasador, distinta de tudo o que tinha experimentado

em sua vida, forçando-o a reprimir o impulso irrefreável de levantar-lhe as saias sem mais cerimônias e

enterrar-se dentro dela; uma reacção humilhante e confusa, porque sempre tinha dominado suas acções e

reacções. Além disso, considerava-se um homem de certa finura. Entretanto, com um só beijo a jovem o tinha

despojado de seu controle, deixando-o quase tremente, ardendo com um desejo e uma luxúria desconhecidos

para ele que não estava certo de poder conter durante muito tempo.

Não obstante, não podia deter-se... ainda. Não enquanto seus dedos seguissem explorando a seda de seu

cabelo. Não enquanto a pele da jovem emanasse aquele cativante aroma de laranjas. Não enquanto sua boca

tentadora encaixasse com tanta perfeição contra a sua.

Mais perto... Diabos, necessitava-a mais perto. Naquele momento. Sem interromper o beijo, a tomou em braços

e a depositou sobre seus joelhos. Um profundo gemido vibrou na garganta do Colin quando as curvas da moça

se hospedaram contra ele, com o quadril pressionando contra sua erecção. Abriu as pernas com a esperança de

aliviar a palpitante dor, mas o movimento só serviu para o inflamar mais.

Desapareceu todo conceito do tempo e do espaço, deixando a seu passo só ardente desejo e desesperada

necessidade. Sem pensar, arrancou-lhe as travessasdo cabelo e as deixou cair com descuido no chão da

carruagem. Passou os dedos através das largas meadas de seda, liberando o leve aroma de laranjas quando as

mechas caíram sobre as costas e os ombros da moça para as envolver em uma nuvem sedosa de fragrantes

cachos.

Alex gemeu e trocou de posição. Seu quadril deslizou contra a tensa erecção de Colin, e outro gemido se elevou

na garganta deste. Diabos. Parecia-lhe estar desmontando-se, a um ritmo frenético que cobrava impulso com

cada segundo que acontecia.

Uma vozinha razoável abriu passo através da névoa de desejo que o devorava, advertindo que fosse com

calma, que pusesse fim aquela loucura, mas ele afastou a advertência de sua mente e baixou uma mão pelas

costas de Alex até chegar a suas nádegas, apertando-a com maior firmeza contra ele, enquanto com a outra

mão explorava a pele acetinada de seu pescoço. Seus dedos roçaram o delicado declive e logo descenderam

para explorar a redondez de seus seios no ponto em que se encontravam com o tecido do vestido. Suave... Ela

era incrivelmente suave. E, demônios, ele estava tão incrivelmente duro, e a desejava tanto...

A carruagem se deteve com uma sacudida, o arrancando da nuvem sensual que enchia sua mente. Colin

levantou devagar a cabeça, olhou-a e conteve um gemido. A moça tinha os olhos fechados, e de seus lábios

separados, húmidos e inchados pelo beijo, saía o ar entre ofegos. Com o cabelo em desordem por culpa de suas

mãos impacientes, parecia descontrolada, excitada e mais desejável que qualquer mulher que jamais tivesse

visto . O olhar de Colin desceu um pouco mais e ficou cravada na visão de sua própria mão apoiada no peito

dela. Abriu os dedos devagar, cativado pelo escura e áspera que resultava sua pele contra a pálida delicadeza

da de Alex. O coração da jovem pulsava forte e frenético contra sua palma, a um ritmo que coincidia com o seu.

O olhar do Colin vagueou de novo até seu rosto, percorrendo todos aqueles rasgos imperfeitos que resultavam

tão... perfeitos. Incapaz de refrear-se, deixou que seus dedos trementes seguissem o mesmo caminho que seu

olhar, roçando o queixo, as suaves bochechas e a breve pendente do nariz, para acabar desenhando a atractiva

forma da boca. As pálpebras de Alex se abriram, e Colin se encontrou olhando-a nos olhos aturdidos.

O desejo o arpoou com força, junto a outro sentimento que parecia possesividad. Algo que sussurrava em sua

mente «esta mulher é minha». Alex levantou a mão que tinha apoiada no peito dele e devagar, com gesto

vacilante, passou as pontas dos dedos pela frente, afastando uma mecha de cabelo. Ante aquele singelo gesto,

combinado com o olhar de assombro que brilhava em seus olhos, o coração do Colin deu um tombo.

Tomou sua mão e deu um breve beijo na palma enluvada.

—chegamos.

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Alex piscou várias vezes e logo, como se tivessem arrojado um jarro de água fria, endireitou-se de repente

enquanto o pânico enchia seus olhos.

—minha mãe! Eu... OH, o que fiz?

A jovem separou-se dele e levou as mãos aos cabelos, que lhe caíam sobre os ombros. Começou a procurar suas

travessas com gesto frenético, e Colin a agarrou pelas mãos.

— Acalma-te —disse com suavidade—. Vou ajudar a procurar as travessass .

Mas, antes de que pudesse fazê-lo, ela afastou as mãos como se queimassem e agarrou sua bolsa.

—Tenho que ir —disse, esticando o braço para abrir a porta.

—Espera —disse Colin, agarrando-lhe a mão.

Alex voltou-se para ele com os olhos cheios de angústia e uma inconfundível expressão de irritação. Colin não

soube se aquela irritação se dirigia para si mesma, para ele ou para ambos.

—Que espere? A que devo esperar, senhor? A poder me envergonhar ainda mais?

—Nada foi feito para te envergonhares.

Um som de amargura cruzou seus lábios.

—Não o tenho feito? Não o temos feito ambos?

—Não vejo por que.

Alex levantou o queixo.

—tem o costume de beijar apaixonadamente a mulheres casadas?

—Não. Nunca beijei uma mulher casada.

Seu olhar explorou a dela, desejando com todas suas forças que lhe dissesse que seguia sem tê-lo feito.

— tem o costume de beijar apaixonadamente a outros homens? —acrescentou, já que a moça permanecia em

silêncio.

Alex o olhou desolada, e logo seu olhar se endureceu.

—Não. Eu... nunca o tinho feito. Não sei o que me passou. Só sei que não voltará a acontecer, não pode voltar a

acontecer. Peço-lhe minhas mais sinceras desculpas. Penso esquecer que ocorreu e sugiro que faça o mesmo.

Sem mais, a moça abriu de um puxão a porta da carruagem e saiu como alma que leva o diabo. Como a noite

anterior, Colin esperou que voltasse a esquina e logo abandonou a carruagem. Deu instruções a seu chofer para

que voltasse para casa e a seguiu pelas ruas escuras. Seu rosto reflectia a dor que sentia na coxa ao seguir o

ritmo rápido dela. Depois de assegurar-se de que chegava a seu edifício, permaneceu entre as sombras,

observando a janela do terceiro apartamento do segundo piso. Ao cabo de menos de um minuto viu o

resplendor de uma vela e soube que estava sã e salva.

Ficou ali vários minutos mais e, quando se dispunha a partir, intuiu que o observavam. Colin tirou a faca da

bota. Apalpando a folha, percorreu a zona com o olhar, mas não viu nada fora do comum. A sensação

desapareceu e seu instinto disse que quem o contemplava em silêncio, fosse quem fosse, foi-se. Sem deixar de

apalpar a folha, com os sentidos afiados, dirigiu-se depressa a sua casa.

Chegou a sua mansão sem novidade, e logo que fechou a porta nas suas costas apoiou-se contra a porta de

carvalho e esfregou a coxa dolorida enquanto as palavras da moça ressonavam em seus ouvidos: «Penso

esquecer que ocorreu e sugiro que faça o mesmo... não voltará a acontecer, não pode voltar a acontecer».

Ele não era um lançador de cartas, mas sabia que a jovem se equivocava. Ela não esqueceria aquele beijo, nem

ele tão pouco. Demônios, agora sabia o que se sentia ao ser alcançado por um raio. O sabor e o contacto dela

estavam gravados de forma permanente em sua mente, ao igual a sua resposta para ele. E, por imprudente que

pudesse resultar, sem dúvida voltaria a ocorrer.

Já se encarregaria ele disso.

Capítulo VIII

Morenas da Inglaterra, alegrem-se! Na festa de lorde e lady Newtrebble, a popular e sempre acertada madame

Larchmont jogou as cartas a certo visconde que procura esposa, e a tarotista predisse que a mulher destinada

para esse bom partido que é lorde Sutton será uma beleza de cabelo escuro. Uma terrível decepção para as

belezas loiras desta temporada, mas está claro que terão que pôr seus olhos em outra parte. Agora fica uma

pergunta no ar: Quem é essa dama morena com a qual se casará lorde Sutton?

DA PÁGINA DE SOCIEDADE DO LONDON TIME.

A jovem caminhava devagar para ele. O ruído de suas pegadas ficava amortecido pela groasa carpete

Axminster de seu quarto, e seus quadris oscilavam com um ritmo sinuoso que acelerava a respiração dele e o

paralisava. A expressão da moça já não era impassível, e sua intenção resultava inconfundível. Uns olhos

escuros da cor do chocolate fundido brilhavam com uma luz maliciosamente sensual, e uma meia sorriso de

sereia curvava as comissuras de seus grossos lábios. Sua fina camisa de cor aguamarina, flutuava ao redor dela

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como uma coluna de seda de delicado brilho, debruada com encaixe marfim, que a cada passo oferecia

indiscretas visões das curvas voluptuosas que se encontravam por baixo. O cabelo caía sobre os ombros e

pelas costas até a cintura como uma brilhante cascata de espessos e brilhantes cachos escuros.

A moça parou quando os separava uma distância inferior à longitude de um braço. Esticou as mãos e as apoiou

no peito nu dele, arrancando-lhe um suave gemido de prazer.

—Alexandra...

Colin tratou de alcançá-la, mas parecia que tinha um peso em cima e não podia mover-se. Com um sedutor

sorriso, a jovem ficou nas pontas dos pés, levantou o rosto Y...

Lambeu-lhe a bochecha.

Frustrado, tentou mover-se uma vez mais, desesperado por tocá-la e beijá-la, mas umas mãos invisíveis

imobilizavam seus ombros. O recompensou com outro húmido beigo na bochecha. Estava claro que

necessitava umas quantas lições sobre a arte de beijar. Colin tinha toda a cara molhada e, Por Deus, também

pegajosa...

Com um gemido, abriu os olhos, e encontrou-se olhando um negro focinho fofo e uns olhos de cor marrom

escura muito abertas.

—Que demônios...?

Suas palavras se viram interrompidas pelo golpe de uma grande língua canina húmida contra seu queixo.

—Maldita seja!

Colin fez uma careta de asco e tratou de levantar o braço para secar a cara, mas o peso do monstruoso cão

colocado sobre seu peito o imobilizava. Umas patas do tamanho de bandejas cravavam seus ombros na cama.

De repente caiu na conta e entreabriu as pálpebras. A seguir moveu a cabeça sobre o travesseiro para evitar

outro entusiasta beijo canino. Em troca, arrojaram-lhe uma chuva quente de fôlego canino, seguido de um

profundo e áspero latido.

—C. B. —murmurou, dedicando um olhar zangado ao enorme mastim do Nathan—. Como raios chegaste

aqui?

—entrou comigo —soou a voz profunda e familiar do Nathan, perto da janela—. Por acaso não te deste conta,

está exultante de alegria por te ver.

Colin voltou a cabeça —a única parte de seu corpo que podia mover— e piscou ante a brilhante luz do sol que

entrava em torrentes pela janela.

A quebra de onda inicial de felicidade ao ver seu irmão ficou muito restringida pela carga que lhe esmagava os

pulmões e o cravava ao colchão.

—Se por acaso não te deste conta —resmungou entre dentes—, esta besta pesa pelo menos 50 kilos.

Suas palavras se viram recompensadas com outro golpe de língua canina contra o pescoço. Colin voltou a

dedicar ao C. B. um olhar de cólera.

—Para!

C. B. o olhou com gesto de recriminação e logo pareceu sorria para ele.

—um pouco mais de 50 kilos — disse Nathan.

Outro beijo canino molhou o queixo do Colin.

—Que o diabo o leve! Para!

Com um forte empurrão, conseguiu sair de debaixo do peso esmagador do cão e sentar-se. A seguir transferiu

sua cólera para o irmão.

—Seu fôlego não cheira precisamente a flores, sabe? O que lhe dás de comer?

—Seu último lanche foi essa bota —disse Nathan, indicando o quarto de vestir com um gesto da cabeça.

Colin seguiu o olhar de seu irmão e apertou a mandíbula ao ver o couro destroçado.

—Essas eram meu par favorito.

—Não te preocupes, só mordiscou uma delas.

—Que merda de sorte!

—Como recordas, C. B. significa «Come Botas».

—Não é provável que o esqueça, vendo a lembrança que deixou a última vez em minhas botas novas.

Nathan separou-se do batente da janela, onde tinha os quadris apoiados, e aproximou-se da cama.

—Já estava na hora de acordares. Disse-te em minha carta que tinha previsto chegar hoje e estou à meia hora à

tua espera.

—Não te ocorreu esperar no salão?

—minha mãe, tinha esquecido o resmungão que te pões quando acabas de despertar!

—Não sou resmungão. É que estou... surpreso. E coberto de baba de cão que cheira a bota —disse enquanto

passava os dedos pelo cabelo—. Que horas são?

—Quase duas. Pergunto-me o que estavas fazendo ontem à noite para ficares tão esgotado —disse Nathan

com um sorriso—. Não está contente de me ver?

Colin tratou de manter um ar carrancudo, mas não o conseguiu de todo.

—Sim, fico contente. Simplesmente teria estado mais contente de te ver dentro de uma hora, quando estivesse

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acordado, com a mente limpa e vestido.

Depois de agarrar o robe de seda dos pés da cama —evitando por pouco outro golpe da língua do C. B. —

vestiu-o, atou o cordão e se levantou.

— Estou feliz, por te ver irmão.

Nathan estreitou sua mão, e durante uns segundos Colin olhou seu irmão nos olhos enquanto o invadia uma

emoção que não se continha. Apesar de seus interesses diferentes, tinham crescido muito unidos, um vínculo

que se tornou ainda mais forte quando assumiram o perigoso dever de espiar os franceses para a Coroa. Ou

que se tinha feito mais forte até que Colin cometeu um terrível engano e esteve a ponto de perder Nathan.

O mesmo sentimento de culpa e remorso que experimentava Colin cada vez que pensava nisso o assaltou de

novo, seguido primeiro de um impulso de gratidão, pois Nathan o tinha perdoado, que acreditasse que tinha

traído a seu país, e a seguir da vergonha que seguia sentindo porque Nathan nunca duvidou dele, nem sequer

quando teve boas razões para o fazer. Não, diferente dele, quando sua honra ficou em dúvida, a confiança do

Nathan nele foi absoluta. Inquebrável. Incondicional.

Colin sempre se considerou um homem inteligente. Um homem de honra, íntegro e leal. Mas aquela noite

horrível quatro anos atrás, a noite em que lhe dispararam, foram postas a prova essas qualidades das que tanto

se orgulhava, e fracassou em todas elas. Nove meses atrás, Nathan retornou a Cornualles, pela primeira vez

desde aquela noite, dando a Colin a oportunidade de reparar a quebra na relação. Embora Colin tenha

desculpado seu erro e ambos tenham resolvidoam suas desavenças, uma parte dele continuava sentindo que

não tinha feito o suficiente, que não merecia o perdão de seu irmão. Uma coisa era certa: não tinha intenção de

repetir jamais aquele engano.

Ambos se moveram de uma vez para abraçar-se e dar umas palmadas nas costas. Colin piscou varia vezes para

limpar seus olhos da inexplicável humidade que se reunia ali. Pelo amor de Deus, tinha que informar a Ellis de

que seu dormitório precisava ventilar-se. Demônios, apenas podia tragar com tudo aquele pó na garganta.

Quando se separaram, Colin observou seu irmão —que parecia igualmente afectado pelo pó— durante vários

segundos. Logo esclareceu garganta e, em um intento de aliviar o ar cheio de emoção, sorriu.

—Qualquer um diria que sentiste a minha falta .

Num abrir e fechar de olhos retornou a velha camaradagem entre eles, como se só tivessem transcorrido sete

minutos e não sete meses da última vez que se viram.

Nathan encolheu de ombros.

—Pode ser que um pouco.

—Vejo-te feliz —disse Colin.

—Sou-o, e toda a culpa é de Vitória.

—É evidente que te sintes bem com a vida de casado.

Os olhos do Nathan mostraram uma expressão que Colin só pôde qualificar de embevecida. Sentiu uma mescla

de felicidade e inveja para com seu irmão que lhe produziu um nó no estômago.

—Muito bem —conveio Nathan, enquanto dedicava a Colin um olhar de avaliação que fez que este se sentisse

como um dos pacientes de seu irmão—. Em troca, tu pareces... cansado.

—Vá, obrigado —disse em tom seco—. Talvez porque dormia a sono solto faz somente meio minuto.

Um aroma familiar chamou sua atenção, e Colin farejou o ar enquanto seu estômago rugia em resposta. Olhou

a mesa ovalada de cerejeira situada junto à janela, onde tinha estado Nathan, e observou a taça e o prato de

porcelana.

—Trouxe-te uma taça de chocolate e um prato de bolachas —disse Nathan, seguindo seu olhar.

Colin aproximou-se da mesa e olhou o interior da taça, que só continha os sedimentos de uma bebida escura, e

logo a meia dúzia de miolos que salpicavam o prato azul marinho de porcelana do Sèvres. Diabos. Algumas

coisas nunca trocavam entre irmãos.

—Isso vejo. Daria-te obrigado se tivesses conseguido guardar um pouco.

—Terias podido o ter todo se estivesses acordado —disse Nathan com um sorriso nada arrependida, antes de

agarrar entre os dedos um dos pequenos miolos e meter-lhe na boca—. Não esqueças esse famoso refrão que

nos ensinou a cozinheira quando eramos meninos: Ovelha que dorme bocado que perde.

—Assim parece —murmurou Colin em tom sombrio—. Isso faz-me esperar com ilusão a próxima vez que

durmas uma sesta. Sugiro-te que durmas com um olho aberto.

Nathan murmurou algo que não soou muito adulador.

—Como não davas sinais de despertar, e o chocolate estava esfriando, senti-me na obrigação de me assegurar

que o duro trabalho da cozinheira não caísse em saco quebrado —disse—. Já sabe quão responsável sou.

—Sim, para ti tudo são obrigações.

—E, é obvio, não se pode desfrutar como é devido do chocolate sem molhar bolachas, que, por certo, acabavam

de sair do forno. —Nathan passou a mão pelo estômago—. Estavam deliciosas de verdade. Queria uardar a

última para ti, mas te alegrarás ao saber que a dei ao C. B.

—E por que deveria alegrar-me saber isso?

—Porque as bolachas foram o que impediram dele mordiscar sua outra bota.

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—Excelente, porque uma só bota sem mordiscar me resulta muito útil. Como é que não te ocorreu dar-lhe a

bolacha antes que comesse a primeira bota?

—Estava ocupado.

—Ah, sim? O que fazia, além de beber meu chocolate e de comer minhas bolachas?

—escutar-te —disse Nathan sorrindo—. Quem é Alexandra?

Colin se esticou por dentro, mas depois de uns anos de prática não lhe resultava difícil manter uma expressão

impassível.

—Não tenho nem idéia.

E era certo. Em realidade não sabia quem era. Ainda.

Nathan arqueou uma sobrancelha.

—com certeza que sim, porque te inspirou um gemido muito luxurioso. Alexaaandraaa —sussurrou com voz

de falsete, piscando e levando-as mãos ao peito em um gesto dramático.

Deus, de verdade que acreditou sentir falta de aquele irmão mais novo tão irritante?

—Estou certo de que só estava roncando —disse em tom glacial—, ou talvez o ruído procedesse de teu cão, que

estava destroçando minha bota.

C. B. soprou da cama, sobre cuja colcha se achava reclinado em toda sua enorme gloria canina. Lambendo-se,

olhou a Colin nos olhos, e este teve que reprimir um sorriso. Logo suspirou. Aquele cão era um perigo para os

sapatos, Mas não se podia negar que era um encanto. Embora nunca o reconheceria ante Nathan. Nem pensar.

Se o fizesse, encaixaria-lhe uma dúzia de cachorrinhos mordedores de botas.

—Não, foste tu —insistiu Nathan—. Pode ser que não roncasses, mas certamente estavas morto para o mundo.

Foste para a cama tarde?

— Certo é que sim.

—Pou causa de Alexandra?

Uma imagem dela excitada e recém beijada atravessou sua mente, deixando um rasto de calor em sí.

—Não sei de que falas —disse enquanto se aproximava a grandes passadas do seu lavabo para eliminar a

saudação do C. B. e escapar aos dotes de observação do Nathan—. Onde está Vitória? —perguntou, agarrando

a toalha do toalheiro de latão e olhando a porta com intenção—. Seguro que sua esposa sente falta de sua

companhia, e também a de seu cão.

—Absolutamente —disse Nathan em tom despreocupado, ignorando a indirecta—. Vitória foi às compras a

Bond Street com seu pai a reboque, enquanto dão brilho a sua casa em preparação da festa que vai organizar.

Tal como mencionava em minha nota, Vitória tem previsto te ajudar, fazer de anfitriã. A estas horas devem ter

visitado todas e cada uma das chapelarias e joalherias do Bond Street —acrescentou, estremecendo-se com uma

careta—. Melhor ele que eu. Inclusive ver como roncas é preferível a ir de loja em loja. E agora que por fim

estás acordado, ardo em desejos de averiguar o que precipitou esse repentino desejo de ter esposa, uma busca,

por certo, em que Vitória está decidida a ajudar.

Colin encolheu de ombros.

—Eu não o chamaria repentino. Levo toda a vida sabendo que é minha obrigação casar e engendrar a um

herdeiro. Pensava que te alegraria mais que ninguém de que por fim me ponha mãos à obra.

—E assim é. Já é hora de que ditas sentar a cabeça e engendrar a esses herdeiros que garantam que o merdoso

título não recaia sobre mim em caso de que estires a pata antes de tempo.

Sim, e por desgraça diz o meu instinto que é isso que irá se passar, pensou Colin. Nathan brincava, é obvio,

mas sem querer tinha posto o dedo na chaga, algo para o que possuía muita habilidade. Colin considerou por

um instante a possibilidade de justificar-se com o Nathan, mas descartou a idéia porque não pareceu que era

um bom momento. Embora tinha toda a intenção de comentar suas preocupações com o Nathan —que

compreenderia melhor que ninguém a necessidade de escutar à intuição—, aquele não era o momento nem o

lugar, sobre tudo porque tinha dormido muito e agora tinha pressa.

—Suponho que sinto curiosidade por saber o que te empurrou por fim a mover o traseiro —disse Nathan—.

por que agora?

—E por que não?

—Respondes uma pergunta com outra pergunta.

—Um de teus próprios hábitos aborrecidos, se mal recordas.

—Além disso, trata de mudar de tema. Assim voltarei a perguntar isso por agora? —Nathan o olhou aos

olhos—. Está bem?

Colin passou uma mão pelo cabelo com gesto impaciente.

—Estou perfeitamente. Minha decisão foi impulsionada em parte por ti.

—Por mim?

—Sim. Por ti e por nosso pai, ambos desfrutando da felicidade marital. Isso tem feito que me desse conta de

que vou sendo mais velho e já é hora de cumprir com o meu dever.

—Entendo. Então escolheste já a tua prometida?

—Impossível. Cheguei a Londres faz só uns dias.

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—Tempo mais que suficiente para reduzir ao menos a lista de candidatas a um número manejável. Alguma

dama em particular que destaque em tua mente?

Outra imagem de olhos de cor chocolate e brilhante cabelo escuro surgiu em sua mente.

—Há várias possíveis candidatas —disse em tom vago—. De noite terei mais oportunidades, porque assistirei à

festa de lorde e lady Ralstrom.

—Vitória e eu também.

—Deve estar desejando-o, não é assim? —perguntou Colin em tom irônico, sabendo o muito que Nathan

detestava os actos sociais.

—Em condições normais preferiria que uns patos me matassem às dentadas, mas reconheço que estou

desejando ver como escolhes as candidatas.

—Falando de patos, como estão os teus?

—Muito contentes, obrigado por perguntar.

—Não estarão aqui, verdade?

Nathan adoptou um ar inocente, algo que imediatamente despertou as suspeitas do Colin.

—Claro que não —respondeu em tom ofendido.

—Graças a Deus.

— Alegro-me de que não o tenham ouvido dizer isso. Querem-lhe muito, sabe? É seu tio.

—Eu não sou tio desses patos. Nem de sua cabra comedora de botões, nem do porco ou cordeiro ou outros

insectos que tenha adquirido da última vez que te vi. Engendra um menino, e ficarei feliz de adoptar o título

de tio.

—Estamos nisso.

—Sim, imagino —disse, com um suspiro exagerado—. Sabes?, se não te tivesses casado com lady Vitória, teria

podido fazê-lo eu e economizar toda esta infernal caça de noivas.

Nathan fez uma careta.

—Eu agrado-lhe mais. Pensa que sou muito preparado e insuperablemente bonito.

—A pobre moça deve ter levado uma vida muito isolada, e está claro que necessita óculos. Mas, de todos os

modos, é encantadora. Ao menos podia ter uma irmã.

—Acredito que há uma prima longínqua no Yorkshire que não é muito mais velha e tem quase todos os dentes.

Queres ser apresentado?

—Há sebes espinhosas dois pisos mais abaixo, justamente debaixo dessa janela que tens atráss. Queres ser

apresentado?

Nathan pôs-se a rir e deu-lhe uma palmada no ombro.

—Não tenha medo, seu irmão está aqui. Tomarei como uma missão pessoal a obrigação de te ajudar a

encontrar a noiva perfeita.

—Que o Senhor me proteja.

—Não é necessário pedir ajuda do céu enquanto eu esteja aqui. Não te preocupes, tenho muita experiência

nestes assuntos.

—De verdade? Não recordo que procurasses esposa quando apareceu Vitória.

—E entretanto a encontrei. Vês o bom que sou?

—Não poderia encontrar seu próprio traseiro com ambas as mãos e com a vantagem de um mapa detalhado.

Eu encontrarei a minha própria esposa, muito obrigado.

Nathan assentiu devagar antes de dar um passo atrás e cruzar os braços.

—Como é evidente que não desejas falar da procura da tua prometida nem da misteriosa Alexandra que

afirmas não conhecer, por que não me dizes o que te preocupa?

Demônios, estava perdendo faculdades se resultava tão fácil adivinhar seus pensamentos. dirigiu-se ao

armário e tirou de um puxão uma camisa limpa.

—Incomoda-me ter dormido muito mais do que tinha previsto, e agora chego tarde a uma entrevista.

—Não te preocupes. Estou certo de que apenas eu, que te conheço tão bem, adivinharia que te inquieta algo. O

que é?

Colin voltou-se, e seus olhares se encontraram. Os de Nathan cheios de inconfundível preocupação.

—Deixa que te ajude —disse Nathan em voz baixa.

Colin sentiu-se afligido pelo sentimento de culpa. Aquela oferta tão simples chegava ao seu coração. Nathan

oferecia livremente o que ele negou quatro anos atrás, quer dizer, ajuda sem perguntas. Porque acreditava nele.

Resultava irônico e humilhante, porque Colin não lhe fez uma oferta similar quatro anos atrás.

—Agradeço a oferta —disse, antes de esclarecer a garganta para libetar sua voz do seu estranho timbre

áspero—. E queria comentar uma coisa contigo...

—Parece-me que vem um «mas».

—Mas... por desgraça tenho uma entrevista para a qual tenho que me preparar já.

—por que não jantas connosco esta noite?

—De acordo; entretanto, preferiria não comentar isto em casa de Wexhall. Vem tomar o pequeno almoço

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amanhã e contarei tudo.

Nathan o observou durante vários segundos mais antes de voltar a falar.

—O que te preocupa tem algo que ver com a morte do Malloran e de seu lacaio?

A verdade, espero que não, pensou Colin.

—Contou-te isso Wexhall?

—Sim, mas embora não o tivesse feito é o principal tema de conversa vá aonde vá. Inquietam-lhe essas mortes?

—Parecem-me... surpreendentes. Espero saber mais quando falarmos amanhã. Então contarei tudo.

Embora fosse evidente que Nathan desejava fazer mais pergunta, limitou-se a assentir.

—Muito bem. Tomaremos o pequeno almoço amanhã juntos. Procura estar acordado.

—Procura guardar para mim umas poucas bolachas e um pouco de chocolate. Enquanto isso, veremo-nos esta

noite no jantar.

—De acordo.

Nathan assobiou para chamar o C. B., que tinha ouvido a palavra «bolacha» e, acreditando que havia uma

guloseima em seu futuro imediato, saltou da cama para trotar atrás de seu amo. Assim que porta fechou atrás

deles, Colin vestiu-se a toda pressa. Tinha que averiguar muito mais sobre madame Alexandra Larchmont e

não dispunha de muito tempo para fazê-lo antes que ela chegasse. O coração acelerou ao pensar em voltar a

vê-la. Voltar a tocá-la.

Voltar a beijá-la.

Mas, antes de que isso acontecesse, tinham que falar. Certamente, ela tinha que explicar algumas coisas. E

Colin faria que não partisse dali, naquele dia, até tê-lo feito.

Sentada no salão ricamente decorado de Logan Jennsen, Alex observou as cartas estendidas sobre a mesa e

levantou o olhar para tropeçar com seus intensos olhos escuros, que a contemplavam com uma expressão

inconfundível. Diferente do olhar Colin, não havia nada misterioso nem inescrutável naquele homem. O desejo

brilhava nele com toda claridade.

—Que futuro indicam minhas cartas, madame? —perguntou, inclinando-se para diante.

A jovem inspirou fundo e percebeu o agradável aroma de seu sabão de barbear.

—Continúo vendo um desejo de revidarrepresálias, uma profunda necessidade de terminar com injustiças

cometidas contra sí. Uma necessidade de demonstrar seu valor. De demonstrar às pessoas, a uma pessoa de

seu passado em particular, que é uma força com a que terá que contar. Vejo mais riqueza em seu futuro, mas

também muita dor. E profunda solidão.

—Entendo. Diga-me, acredita que há uma oportunidade de que possa mudar meu futuro, de fazer algo que

evite essa profunda solidão que me predisse?

—Estou certa de que, se quiser companhia, só tem que dizê-lo e estará rodeado de gente.

—É certo, mas estou mais interessado na qualidade que na quantidade. Por exemplo, prefiro passar o tempo

com uma mulher que me interesse que com uma dúzia que me aborreçam. Você interessa-me, madame —disse

em voz baixa, olhando-a aos olhos.

Antes de que ela pudesse responder, o homem esticou o braço e roçou-lhe a bochecha com a ponta de um

dedo. Seu contcato era quente e doce e, embora inesperado, nada desagradável.

—Senhor Jennsen...

—Logan.

—Sinto-me muito adulada —disse a jovem com sinceridade—. Mas...

—Nada de mas —disse ele, sacudindo a cabeça—. Só quero que saiba que a encontro... reconfortante. Muito

mais que essas pérolas da alta sociedade que me rodeiam. Não se dá importância. Provenho de um berço muito

pobre e me sinto muito mais atraído por alguém como a senhora, que não olha por cima do ombro nem recebe

tudo de mãos de um mordomo.

—Apenas me conhece.

—E você apenas me conhece , algo que eu adoraria rectificar.

—Algumas dessas pérolas da alta sociedade são muito agradáveis.

O homem se encolheu de ombros.

—Talvez, mas eu continuo querendo conhecê-la melhor.

—Logan —disse a moça em voz baixa—, estou casada.

Ele entreabriu as pálpebras.

—De verdade? Tenho certa experiência com as mulheres, e não tem aspecto de mulher casada.

O coração do Alex deu um tombo enquanto a jovem lutava por manter-se impassível.

—Como diz?

O homem inclinou-se para diante, imobilizando-a com seu poderoso olhar.

—Acredito que utiliza «madame» para aumentar sua credibilidade ao jogar as cartas, e porque lhe proporciona

uma liberdade que não teria como mulher solteira, entre elas a de vir a minha casa sem companhia, assim

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como uma barreira entre sí e os admiradores não desejados. Admiro seu engenho. É justamente o que eu faria

em sua situação.

Alex, perplexa, conseguiu sustentar-lhe o olhar enquanto procurava a melhor forma de responder a sua

acusação. Entretanto, antes que pudesse decidir, o homem continuou falando.

—Também suspeito que não esteja casada porque não posso imaginar que um homem tenha a sorte de ser seu

marido e, entretanto permita que outro homem a leve a casa ao terminar as festas às que assiste. Se fosse

minha, pode estar segura de que a acompanharia a casa eu mesmo e não deixaria a tarefa em mãos de lorde

Sutton nem de ninguém mais.

A moça sentiu mariposas no estômago para ouvir que aquele homem mencionava a lorde Sutton, uma reacção

que ocultou arqueando uma sobrancelha.

—É possível que nem todos os homens sejam tão possessivos como o senhor.

—Quando se trata de sua mulher, todos os homens são possessivos. É obvio, sempre que a relação não seja

insatisfatória ou infeliz. Então, madame está certo? Permita que lhe assegure que, se confirmar minhas

suspeitas, não o contarei a ninguém.

Uma parte de si a advertiu que reconhecer a verdade era muito pouco sensato, que uma vez que contava um

segredo deixava de ser um segredo. Além disso, contar-lhe só serviria para lhe alimentar esperanças. E ela não

queria isso.

Ou sim?

As atenções de um homem riquíssimo, muito bonito e inteligente, sussurrou sua voz interior, incrédula. Está

louca? Que mulher não quereria a atenção de um homem assim?

Entretanto, como podia arriscar-se?

—Tenha em conta — disse ele, ao ver que a jovem seguia duvidando. —que lhe permitirei decidir até onde

chega nossa relação. E não esqueça que eu não tenho nem um grande desejo de seguir sendo solteiro nem um

título arrogante que deva proteger de qualquer que não pertença aos degraus mais altos da sociedade inglesa

— acrescentou, tomando a da mão—. Como mínimo, eu gostaria de oferecer minha amizade e contar com a sua

em troca.

Uma imagem de lorde Sutton surgiu em sua mente... um homem que jamais poderia ser dela. Logan Jennsen

não só era muito atractivo, mas sim estava disponível. E talvez fosse justamente o que necessitava para ajudá-la

a esquecer lorde Sutton.

—Não sei o que dizer. Sinto-me... intrigada.

O homem sorriu abertamente.

—E espero que tentada.

Incapaz de negá-lo, Alex assentiu. Logo chegou a um compromisso com sua consciência.

—Estou-o. O suficiente para reconhecer que não me ocorre ninguém que possa pôr objecções a minha amizade

consigo.

Ele sorriu agradado.

—Não reconhece que não está casada, mas mesmo assim é a melhor noticia que ouvi em muito tempo —

respondeu com olhar cálido, antes de lhe beijar as pontas dos dedos—. A amizade é um excelente ponto de

partida.

Ao chegar a casa depois de seu extraordinário encontro com o Logan, Alex fechou a porta, e logo, com o

coração desbocado, espionou pela janela para a rua. Não podia evitar a sensação de que alguém a observava,

embora nada parecia ir mal.

A jovem afastou-se da janela, tirou a capa e o gorro, e a seguir começou a caminhar de um lado a outro. Queria

concentrar-se no Logan, em homem que a queria e era livre de fazê-lo, mas sua mente obstinada não deixava

de se voltar para lorde Sutton e ao extraordinário beijo que tinham compartilhado.

Nada em sua experiência a tinha preparado para ele nem para aquele beijo perturbador. Tudo o que sabia

sobre que acontecia entre mulheres e homens tinha observado nas ruas de Londres. Entrevistas secretas em

becos, caracterizadas por grunhidos animalescos e sons ásperos, mãos inquietas e linguagem grosseira. Era

impossível escapar aquelas visões e sons, que haviam imprimido nela a certeza de que, apesar da sua

curiosidade natural e aos desejos sussurrados de seu próprio corpo, o acto em si - e tudo o que conduzia a ele—

não era nada em que queria participar.

Mas aqueles breves e intensos minutos em seus braços a tinham deixado aturdida e encantada, embora

confusa. O que sentiu em nada se parecia com os actos procazes realizados a toda pressa que tinha

presenciado. Com aquele único beijo, o homem tinha aberto portas que Alex não sabia que estivessem

fechadas. A jovem tinha saboreado e tocado. E agora queria mais.

Por que, se devia albergar tais sentimentos, tais desejos, não podiam dirigir-se para alguém que não

pertencesse a uma classe social tão superior à dela que o situasse por completo fora de seu alcance? Alguém

que não procurasse esposa, uma dama elegante de impecável berço. Uma mulher que nunca poderia ser ela.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Por sua própria paz de espírito devia evitar vê-lo, manter-se afastada dele, não aproximar-se de uma tentação

que não estava certa de poder resistir. Concentrar-se em outra pessoa, como Logan Jennsen. Mas como fazê-lo,

se lorde Sutton ocupava toda sua mente?

Por desgraça, evitá-lo era impossível, ao menos de momento. Alex não podia renunciar aos ganhos que lhe

proporcionaria seu trabalho nas festas às que sem dúvida assistiria ele enquanto procurava a sua esposa.

Necessitava muito o dinheiro. Emma e ela tinham planos para o Robbie e todos outros meninos, cujas vistas

eram tão miseráveis como foi a dela. Queria e precisava ajudá-los, e não podia atirar pela amurada tudo o que

tinha conseguido à base de trabalho, tudo o que por fim estava a seu alcance, porque se havia encaprichado

por um homem que ao cabo de uma semana não recordaria seu nome.

É obvio, Logan Jennsen era um homem rico...

Desfez a idéia antes que tomasse forma. Demônios, perseguir um homem por seu dinheiro não era melhor que

roubar, e ela já não era uma benjamima. E tão pouco estava há venda. Alex não duvidava que, se obtinha

recursos de Logan para sua causa, o homem esperaria um pagamento, de uma classe que ela não estava

disposta a dar. Não, ganharia seu dinheiro jogando às cartas e conservaria sua alma e sua dignidade no

processo.

Mas pelo que se referia a lorde Sutton... estava também a questão do perigo que tinha visto em suas cartas.

Não podia dar-lhe as costas sem determinar se estava certa. Se a tiragem desse dia não indicava o perigo e

traição que tinha visto, evitaria mais tentações e não programaria mais tiradas privadas com ele, por mais

dinheiro que se oferecesse a pagar. Mas, as atiradas eram as mesmas, devia tratar de ajudá-lo; tentar averiguar

quem o ameaçava, onde e quando. Se não o fazia, não poderia viver consigo mesma.

Com um pouco de sorte, a tiragem desse dia não mostraria nada que não fosse um brilhante e radiante futuro,

com uma esposa encantadora e um montão de meninos. Então poderia afastar-se e esquecer que o tinha

conhecido. Voltar a dedicar suas energias a construir um futuro para os anjos perdidos e destroçados das ruas

sórdidas de Londres. Deixar que lorde Sutton a beijasse tinha sido um engano, um desvario. Não voltaria a

pensar nisso, e certamente não se repetiria.

Cheia de determinação, consultou a hora. Ao ver que eram mais das duas, despachou-se. Antes de sair a

vender suas laranjas, Emma já tinha enchido a mochila que Alex devia entregar. Depois de calçar as luvas, Alex

dispunha-se a agarrar a mochila quando ouviu o familiar chiado afogado da portinhola que se abria. Cruzou o

quarto, afastou a cortina e viu como Robbie entrava no quarto. A jovem ficou aliviada. O menino não tinha

dormido ali a noite anterior e, embora não ficesse todas as noites, mesmo assim estava preocupada.

Depois de fechar a portinhola, o menino a olhou com seriedade.

—Olá, senhorita Alex — disse.

Alex viu que o lábio inferior tremia. Logo, o menino cruzou o quarto correndo e deitou-lhe os braços à cintura,

enterrando o rosto em sua saia.

Ela o abraçou com força e a seguir se agachou para poder olhá-lo nos olhos.

—Estás bem, Robbie? —perguntou enquanto seu olhar percorria o corpo do menino, temerosa de ouvir sua

resposta.

Seus hematomas tinham adquirido um apagado tom verde amarelado, e Alex não viu amostras de outros

novos. Graças a Deus.

O menino limpou o nariz com a manga e assentiu.

—Estão bem a senhorita Emmie e a senhorita Alex?

—claro que sim. Só estávamos preocupadas contigo —respondeu ela, afastando-lhe uma mecha de cabelo da

frente e o brindando com um sorriso que confiou em que ocultasse a dor que o menino sempre lhe inspirava—.

Ontem à noite sentimos a tua falta de, Robbie.

—Tratei de vir, mas não pude.

Alex apertou a mandíbula. Sabia o que isso significava. Seu pai não estava bastante bêbado para desmaiar e

não precaver-se da ausência do menino.

Este baixou a cabeça e arrastou contra o chão a ponta de seu sapato sujo e desgastado.

—Não pude vir até agora para ver se estavam bem — disse enquanto levantava a cabeça—. Jura que está bem?

—Juro-o. E a senhorita Emmie, também. por que não o íamos estar ?

—Por causa do homem que estava aqui, quando vim ontem. Neste mesmo quarto, senhorita Alex. Apanhei-o

quando vim buscar uma laranja. Disse-lhe que o mataria se lhes fazia dano —rematou com expressão feroz.

A jovem ficou paralisada.

—Um homem? Aqui? O que queria?

—Perguntou por si. Deu-me um xelim, mas não se preocupe, fui mais esperto que ele e não lhe disse nada.

—Que te deu um xelim? Isso é muito dinheiro — disse ela em tom ligeiro, tratando de dissimular seu alarme.

Deus. Tinha descoberto o assassino de lorde Malloran que era ela a autora da nota e a tinha encontrado?—.

Reconheceu esse homem?

Robbie negou com a cabeça.

—Era um tipo elegante. Rico. Tratou de me dar menos, mas eu sabia que podia pagar mais.

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O menino meteu a mão no bolso e tirou um paquetito envolto em uma peça de tecido sujo, que lhe estendeu.

—Comprei-me um pão-doce e guardei a metade para a senhorita Emmie e para sí. Para agradecer por... —

Robbie voltou a arrastar a ponta do sapato—. Bom, já sabe. Sei que gosta dos doces.

A Alex lhe fez um nó na garganta. O orgulho na voz do menino era inconfundível. Dado que se recusava seu

presente — um presente que agora podia permitir-se—, o menino se sentiria desolado, a jovem aceitou o

pacote com gesto solene; compreendia a necessidade que ele tinha de mostrar gratidão.

—Obrigado, Robbie. Este é o melhor presente que jamais recebi . A senhorita Emmie e eu o comeremos com o

chá.

Alex deixou com cuidado o valioso pacote e logo apoiou as mãos sobre os magros ombros do menino.

—me diga algo mais desse homem. Que aspecto tinha?

Robbie enrugou a cara para refletir.

—O tipo ia bem vestido e era moreno. Era alto e corpulento — disse, abrindo os braços—, mas não gordo, né?

Só... grande. Forte. Agarrou-me pelo pescoço da roupa.

A jovem se sentiu invadida pela raiva.

—Fez-te mal?

— Que nada. Tirei-o de cima. Dava medo, mas não tanto como meu pai. Tratou de me impressionar com os

olhos, mas não o deixei... O tipo tinha os olhos muito verdes. Nunca os vi tão verdes.

Alex ficou de pedra. Olhos verdes? A moça entendeu quem era e encolerizou-se. Sentia-se como uma bule a

ponto de cuspir vapor. Não albergava dúvidas quanto à identidade daquele tipo rico de olhos verdes. Não era

de estranhar que sentisse que alguém a vigiava! Ele a tinha seguido e logo tinha invadido sua casa. Sua

intimidade. Seu santuário. O santuário dos meninos. A jovem dava voltas a cabeça só em pensar nas

repercussões.

—Viu-me entrar pela portinhola, senhorita Alex — disse Robbie com uma vozita chorosa. Apesar de tudo o

que tinha vivido aquele menino, Alex jamais o tinha visto chorar, mas agora parecia a ponto de fazê-lo - O

sinto. Eu não queria...

A jovem interrompeu suas palavras apoiando um dedo em seus lábios tremulos com gesto carinhoso.

—Não tem por que senti-lo, Robbie. Graças a sua descrição, estou certa de quem é o homem.

—É um... homem mau?

Alex forçou um sorriso.

—Não, assim não se preocupe. Eu me encarregarei de tudo, prometo-lhe isso.

Colin observava o edifício de Alex da mesma soleira em sombras no que se situará no dia anterior. Quando por

fim apareceu sua presa, levava uma mochila que parecia idêntica à do dia anterior.

Seguiu-a até o mesmo edifício da véspera, onde entrou no Barril Quebrado. Saiu pouco depois sem a mochila e

pôs-se a andar em direcção ao Mayfair, certamente para a casa dele para ir a sua entrevista.

—Qual é o plano? —sussurrou uma voz justamente por detrás dele.

Colin voltou-se sobressaltado e encontrou-se com o Nathan.

—Complicações! —exclamou—. De onde saíste?

Nathan arqueou uma sobrancelha.

—Do útero de nossa mãe, igual a ti. Necessita que te explique de onde vêm os meninos?

Maldito seja!, exclamou Colin para sí. Como tinha podido esquecer quão pesado podia ser Nathan, e ao

mesmo tempo quão ligeiro podia resultar ao mover-se? Mesmo assim, perturbava-lhe que Nathan o tivesse

podido surpreender com tanta facilidade. Isso não lhe augurava muito êxito.

—O que fazes aqui?

—A mesma pergunta ía fazer-te eu.

—Se tivesse querido que soubesses, teria-te dito.

—Está claro que não o ias fazer, e por isso me vi obrigado a tomar o assunto em minhas próprias mãos e te

seguir.

—Parece que não perdi minhas faculdades para as operações clandestinas. A ti, em troca, se vê que tens um

pouco falto de prática.

Colin não se incomodou em responder. Não sabia com certeza se estava mais zangado consigo mesmo por não

detectar a presença do Nathan, ou com este por sua intromissão.

—Já falaremos disso logo. Vai-te a casa.

—Sim, é obvio que falaremos logo. Quanto a ir a casa, acredita que vou partir, equivoca-te, assim conta-me o

plano. Quem era essa mulher e por que a segue?

Demônios, por que não pôde ser filho único? Colin compreendeu que não conseguiria livrar-se de seu irmão.

—Logo. Agora mesmo, não tenho tempo. Quero averiguar o que tem feito nesse edifício. Não espero que volte

mais, já que está aqui, pode fazer algo. Fique aqui vigiando e, se vir que se aproxima faça-me um sinal.

—De acordo.

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Colin aproximou-se do edifício e observou o exterior sujo, a fachada com uns quantos tijolos de menos. As três

lojas abandonadas pareciam desertas, mas suspeitou que a vida transbordava depois dos ásperos tablones que

obstruíam as entradas.

Abriu a deteriorada porta de madeira do Barril Quebrado e penetrou no interior do botequim, pouco

iluminado. Assaltou-o o aroma azedo de cerveja rançosa e corpos sujos. Deteve-se para não mais cruzar a

soleira e olhou em seu redor os bancos curvados e as mesas desgastadas. Do outro extremo do local, dois

homens curvados sobre umas jarras o olharam com os olhos entreabertos, sem dúvida avaliando as

possibilidades de lhe tirar a carteira. Com o olhar cravado naqueles dois, Colin agachou-se devagar e tirou da

bota parte da faca que tinha escondido, de forma que a brilhante folha de prata fosse bem visível. Os homens

intercambiaram um olhar, encolheram os ombros e voltaram para suas bebidas.

Satisfeito, aproximou-se do balcão, depois do qual estava um gigante calvo que limpava a apagada superfície

de madeira com um trapo de aspecto sujo. O homem dedicou-lhe um olhar desconfiado.

—Cerveja? —perguntou o gigante.

—Informação.

—Não sei nada.

Colin meteu a mão no bolso e depositou um soberano de ouro sobre a barra.

—Pode ser que saiba algo — murmurou o taberneiro, encolhendo seus robustos ombros.

Colin apoiou um cotovelo no bordo da barra e aproximou-se mais, com aparência para falar de forma

confidencial, embora e enquanto isso seu olhar percorria a zona situada por trás da barra. Havia uma mochila

num canto.

—A mulher que acaba de estar aqui... o que lhe deu?

O homem entreabriu as pálpebras. Apoiou os enormes punhos sobre a barra e se inclinou para diante até que

seu nariz, que se tinha quebrado ao menos uma vez, esteve a ponto de tocar ao do Colin.

—Não sei nada.

Logo se tornou para trás e dedicou a Colin um olhar glacial destinado a fulminá-lo.

Sem deixar de olhar os olhos cor de lama do homem, Colin indicou com a cabeça o canto por trás da barra.

—Essa mochila me diz outra coisa.

—Quem demônios é, e por que quer sabê-lo?

—Sou um... amigo que se preocupa com ela.

—Sim? Pois me preocupa que um metediço como você pergunte por ela e se meta onde não o chamam.

Colin deixou outra moeda de ouro sobre a barra.

—por que veio? O que há nessa mochila?

O homem agarrou as duas moedas, esticou o braço e voltou a deslizá-las no bolso de Colin.

—Seu dinheiro não serve aqui, mas deixa que te dê um conselho grátis. te afaste dela. Se me inteirar de que a

incomodou, terá que ver-se com o Jack Wallace —disse, antes de golpear a palma da mão com o punho—. E

não lhe resultará uma experiência agradável.

Colin levantou uma sobrancelha.

— E que é dela?

O gigante entreabriu as pálpebras.

—Só precisa saber que não é tua. Agora vai-te — disse, indicando a porta com a cabeça—. antes que esqueça

minhas maneiras elegantes e te jogue uma patada nesse teu elegante traseiro.

—Muito bem — respondeu Colin, caminhando para a porta e abrindo-a. Entretanto, antes de cruzar a soleira

voltou-se e olhou ao gigante aos olhos—. Como meu dinheiro não serve aqui, cheguei à conclusão de que tão

pouco o faria meu relógio, assim tornei a tirar-lho felicito-lhe, senhor Wallace. Para ter as mãos tão grandes,

sua técnica é muito boa.

Wallace o olhou surpreso e levou a mão ao bolso do avental. Sem mais, Colin saiu do botequim e pôs-se a

andar para o Mayfair. Só tinha dado meia dúzia de passos quando Nathan se situou junto a ele.

—averiguas-te o que desejavas saber? —perguntou seu irmão.

—Não.

— Senti-me aliviado ao ver que o taberneiro não decidia fazer contigo umas peças. Inclusive entre os dois, não

estou certo de que tivéssemos podido com ele.

—supunha-se que esperavas no outro lado da rua.

—Não, supunha-se que ia vigiar. É culpa minha que enquanto cumpria com meu dever tenha visto esse

taberneiro gigantesco?

Colin ia responder a Nathan, mas este prosseguia com seu falatório.

—E, falando do que se supunha, que foste tu fazer , disse que me contaria o que demônios se está passando.

—E o farei. Amanhã.

Colin fez uma careta de dor e esfregou a coxa com a mão sem deixar de caminhar. Voltou a olhar Nathan e

observou que seu irmão o contemplava com a mandíbula tensa. Deixou de esfregar perna imediatamente,

amaldiçoando seu descuido.

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—Não se passa nada. Tenho agujetas.

Nathan o olhou, e Colin leu o sentimento de culpa e o remorso nos olhos de seu irmão.

—Estou bem, Nathan. E se voltares a te desculpar por algo que não foi tua culpa, juro-te que te atiro ao

Támesis.

—Foi por minha culpa que levou um disparo, assim desculparei-me tantas vezes quantas me dê vontade.

—Foi somente culpa minha, assim nego-me a escutar mais desculpa desnecessárias.

—Suponho que simplesmente teremos que nos pôr de acordo para estar em desacordo. E, quanto a isso de

me atirar ao Tamisa, custaria-te muitíssimo, tendo em conta que corro mais que tu.

Uma gargalhada de alívio surgiu na garganta de Colin, que tossiu para dissimulá-la, agradecido que o

momento incômodo tivesse passado.

—Pode ser que corra mais, mas sou mais preparado.

—Isso é discutível mas, embora fosses um merdas de um gênio, eu certamente não sou tão bobo para acabar

no Tamisa.

— Ficarás com cara de parvo quando repetires essas palavras enquanto jorras água do rio. Mas não tenho

tempo de continuarr discutindo o assunto, porque tenho de ir a uma entrevista para a qual já estou atrasado.

Albergo a esperança de que essa entrevista me ajude a ter mais coisas para te contar amanhã.

—Entendo. Bom, então acredito que me separarei de ti na esquina, porque tenho assuntos próprios que tratar.

Vemo-nos ao jantar? Às oito?

—Sim.

Quando chegaram à esquina, Colin seguiu em linha reta, para casa, enquanto Nathan girava à direita. Fora da

vista de seu irmão, Colin esfregou a perna, amaldiçoando a dor que o impedia de mover-se tão depressa como

teria desejado.

Madame Larchmont o esperava, e isso estava bem, porque as perguntas não deixavam de acumular-se. O que

tinha dado ao Wallace? por que o homem não tinha aceitado o suborno? O que tinha ela para inspirar

semelhante lealdade? Conseguiria suas respostas. E quando as tivesse, pensava averiguar se o beijo que

compartilharam era iguamente magnífico da segunda vez.

Capítulo IX

Assim que o mordomo de lorde Sutton fechou a porta do elegante salão deixando Alex a sós, a jovem

aproximou-se a toda pressa da secretária situada junto à janela. Não sabia com certeza de quanto tempo

dispunha antes que lorde Sutton —ou, como agora preferia pensar nele, o tipo rico de olhos verdes— chegasse

para a sua entrevista, e pretendia aproveitar cada minuto.

Com um esforço, reprimiu a ira que borbulhava tão perto da superfície e repassou depressa a pilha de

correspondência bem colocada em uma bandeja de prata apoiada na esquina da brilhante superfície de mogno.

Meia dúzia de convites para festas, uma nota de seu irmão, outra de lorde Wexhall, vários convites mais, a

última com uma só linha que dizia «Estou desejando voltar a o ver». Estava assinada só com a letra «M» Y...

levou-se o papel ao nariz... perfumada com água de rosas.

Invadiu-a uma sensação desagradável que não quis examinar muito de perto; não desejava reconhecer sua

semelhança com o ciúmes. Logo franziu o cenho muito irritada. Demônios, o que lhe importava se tinha

entrevistas com aquela mulher chamada «M» ou com uma dúzia de mulheres? Não lhe importava nada.

Mesmo assim, a idéia do Colin tocando outra mulher, beijando outra mulher... Alex fechou os olhos com força

para apagar a lembrança apaixonada dele tocando-a, beijando-a, mas o esforço fracassou por completo. O qual

resultava ridículo e muito humilhante. Estava zangada com ele. Furiosa. Vamos que se tentava voltar a beijá-la

por-lhe-ia os dois olhos negros.

Devia ter sabido antes do beijo o que tinha feito, de que forma tinha invadido seu lar e sua intimidade, sem

dúvida não teria permitido tomar-se tantas liberdades.

Ou sim?

Pelo amor de Deus, queria e precisava acreditar que não o teria feito. Mas não o saber a assustava, quase tanto

como sua descontrolada reacção ante aquele homem e o fogo que despertou no seu corpo. Abriu os olhos,

apertou os lábios e agarrou-se à sua ira, uma emoção muito mais segura que as demais sensações

perturbadoras que ele provocava. Pensava ater-se a essa ira ao jogar-lhe em cara seu engano.

Forçou-se a concentrar-se na tarefa que tinha entre mãos, voltou a colocar a correspondência em seu lugar e

abriu a gaveta superior. Viu imediatamente a bolsita de pele com que Colin a tinha pago no dia anterior.

Levantou a bolsa, sopesando-a na palma da mão e escutando o tinido das moedas.

A julgar pelo peso havia ali uma pequena fortuna, e a jovem sentiu nos dedos o formigamento da tentação.

Não há muito tempo atrás teria deslizado a bolsita para seu bolso. Certamente, depois do que lorde Sutton lhe

tinha feito não merecia menos. Mas Alex já não era essa pessoa nem queria voltar a sê-lo. Depois de apertar a

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bolsita pela última vez, colocou-a de novo em seu lugar e logo revistou a toda pressa outros gavetas, que não

continham nada de interesse.

Até que chegou à gaveta inferior, que estava fechada. Sem esperar um momento deixou-se cair de joelhos,

arrancou as luvas, tirou um gancho do coque e colocou mãos à obra. O tic tac do relógio da chaminé era o

único som enquanto se concentrava na sua tarefa. A fechadura demorou menos de um minuto em começar a

ceder, e um sorriso de satisfação curvou seus lábios. Só um movimento mais...

—Pode ser que isto a ajude — disse uma voz profunda, justamente por detrás.

Alex voltou-se com um grito afogado. Lorde Sutton estava apoiado contra a parede com os tornozelos

cruzados, olhando-a com sua habitual expressão impenetrável. Uma chave de prata suspensa de uma fita

negra pendurava de sua mão estendida.

Diabos. Como se tinha arrumado para a surpreender desse modo? Devia mover-se como a fumaça. E, Deus do

céu, certamente também arrumava para ter um aspecto imponente enquanto o fazia. A jaqueta azul marinho, o

colete cor prata e as calças nata, que tinha metidas em umas botas negras brilhantes como um espelho,

adaptavam-se a suas formas masculinas na perfeição.

Alex o olhou de cima abaixo, detendo-se no bem que lhe assentavam as calças justas. Como estava de joelhos,

os olhos ficavam à altura da virilha, uma visão fascinante que captou seu interesse de uma forma que sem

dúvida deveria havê-la horrorizado. E sem dúvida o faria, assim que pudesse afastar o olhar.

Uma quebra de onda de calor invadiu Alex, que levou a mão de forma involuntária até ao quadril, para apoiar-

se no ponto exacto em que a carne dura dele se apertou contra ela a noite anterior.

—Está-me olhando, madame, e seu olhar me distrai muito.

Assaltou-a outra quebra de onda de calor, esta vez carregada de uma aguda mortificação. Alex levantou o

olhar de repente. Os olhos verdes dele pareceram queimá-la e a arrancaram de seu humilhante estupor.

A jovem ficou em pé de um salto, apoiou as mãos nos quadris e dedicou-lhe um olhar furioso.

—Quase me mata do susto. Tem o costume de aproximar-se silenciosamente das pessoas, senhor?

Colin levantou um pouco uma sobrancelha.

—Certamente, terá que reconhecer que tem audácia. Acredito que uma pergunta mais pertinente, madame, é:

Tem o costume de forçar a fechadura das gavetas alheias?

—Você poderia dar aulas de audácia, senhor. Minha presença ante sua secretária não é nada que não que

mereça, tendo em conta que forçou a fechadura para entrar em meu apartamento.

Alex esperava que o negasse, mas Colin inclinou a cabeça.

—É evidente que eu tive mais êxito — disse, movendo a chave—. Dado que sua habilidade é tão escassa, rogo-

lhe que me permita lhe oferecer isto.

Escassa? Que arrogância! Nunca se tinha posto em dúvida sua habilidade; entretanto, Alex não podia negar o

irritante e humilhante facto de que era a segunda vez que lorde Sutton a apanhava com as mãos na massa. A

jovem não sabia se estava mais irritada consigo mesma ou com ele.

—Se tivesse demorado um ou dois minutos mais —disse em seu melhor tom de desprezo, sem dignar-se a

jogar uma olhada à chave—, saberia de sobra que merdas e traz entre mãos. Não gostaria de ir um de seus

clubes durante um momento?

—Acredito que não. Por certo, acabe com essa linguagem, madame. Tenho que dizer que não é próprio de uma

dama.

—Não se equivoque, senhor. Nunca disse que era uma dama. Por outro lado, o senhor sim é um cavalheiro,

embora me pergunte onde e por que ia adquirir um cavalheiro a habilidade de forçar fechaduras.

—É evidente que tive melhor professor que a senhora. O que procurava exactamente? Dinheiro? Se for assim,

teria preferido que mo pedisse . Ou já agarrou as moedas que, como sabe por sua visita de ontem, estão na

gaveta de cima? —perguntou ele com voz fria.

Alex se sentiu humilhada.

—Não agarrei seu dinheiro. Não sou uma benjamima.

Já não o sou, pensou.

Colin não pareceu nada convencido.

—Então o que procurava?

— E o que procurava quando penetrou em minha casa?

Aquele homem horrível nem sequer tinha a decência de parecer envergonhado.

—Informação.

—Sobre o que?

—Sobre si.

—por que não me perguntou?

—Não acreditava que fosse responder com franqueza.

Alex arqueou as sobrancelhas.

—É uma possibilidade... se perguntar por temas que não são assunto dele.

—Irritante, mas compreensível. Por isso encarreguei-me de averiguar o que queria saber. Gostaria de ouvir o

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que descobri?

—Sei o que descobriu.

Na mente de Alex surgiu a imagem da cara do Rebbie com o lábio inferior tremulo e a ira da jovem aumentou.

Aproximou-se mais dele e ficaram a par.

—Sabe quanto assustou esse menino, um menino que vive cada dia com medo, um menino cujo único refúgio

foi invadido por si?

Um músculo moveu-se na mandíbula de Colin.

—Não queria assustá-lo.

—Mas o fez. Tem idéia do dano que causou?

A raiva de Alex transbordou, e de repente não pôde ficar quieta. Começou a caminhar por diante dele com

passos bruscos.

—Robbie não tem nenhum outro sitio seguro —acrescentou—. Nenhum deles o tem. Se tiver medo de vir a

meu apartamento... Seu pai o obriga a roubar para ganhar o sustento. Se não levar suficiente dinheiro a casa,

bate-lhe. Esse menino passa os dias lutando por sobreviver e rezando para que pelas noites seu pai beba o

suficiente para desmaiar. Essas são as noites em que vem a minha casa. Para descansar. Para comer. Para curar-

se. Para sentir-se seguro. E é o único momento em que de verdade se sente seguro. Ver um estranho em meu

apartamento, a alguém que conforme acredita o poderia ferir a ele ou a mim... poderia fazer com que deixasse

de vir. Se o conta a outros, possivelmente também deixem de vir .

—A outros? Quantos há?

Alex tomou ar.

—mais dos que posso ajudar. Eu sou tudo o que têm, junto com a Emma, uma amiga vive comigo. Depositam

em nós a pouca confiança que possuem. E nenhum deles merece mais medo em sua vida, nem que violem seu

único lugar seguro. Não tinha direito...

Colin esticouo braço e lhe pôs os dedos nos lábios, interrompendo suas palavras.

—Sinto muito. Não sabia. Se o soubesse...

—Faria exactamente o mesmo —disse Alex em tom acusador, afastando-se de sua mão.

—Sim.

—por que?

—Queria saber mais sobre si.

—Outra vez tenho que lhe perguntar por que.

Colin a observou durante vários segundos.

—Está procurando que lhe façam elogios? —perguntou.

A Alex escapou-lhe um som de incredulidade.

—Que me façam elogios? É um mistério para mim como chegou a semelhante conclusão. Mas, para responder

a sua pergunta, não. Agora lhe peço que responda à minha. Por que ia estar interessado em averiguar mais

sobre mim?

—E se lhe dissesse que é porque a encontro... fascinante?

—Diria que tem que haver outra razão.

O olhar do Colin percorreu seu rosto com uma intensidade que a impressionou.

—Pergunto-me se é assim modesta ou se de verdade carece de vaidade.

—Não tenho nada do que me envaidecer, senhor, como pode apreciar qualquer que tenha olhos na cara;

portanto, exijo-lhe que ponha fim já a este disparate e me diga a verdade.

—Muito bem. Mais vale que nos sentemos —sugeriu Colin, indicando o sofá situado diante da chaminé.

—Prefiro estar de pé.

—Como queira. —Colin apoiou os ombros contra a parede e cruzou os braços; sua postura despreocupada

contrastava por completo com a tensão que o dominava—. Queria saber mais de si por várias razões, uma das

quais era a grande curiosidade que me produziu seu original método para sair da casa de lorde Malloran.

Colin captou a leve piscada de Alex, que lhe teria escapado senão a estivesse a observar com tanta atenção, e

muito a seu pesar sentiu-se invadido pela admiração. Não havia dúvida de que era muito boa. Em realidade,

teria sido uma espiã estupenda.

—Não sei muito bem a que se refere —disse.

—Refiro a sua saída pela janela do estudio de sua senhoria, algo um tanto insólito, sobre tudo tendo em conta a

distância até o chão. Estou certo de que poderá entender que minha curiosidade não fez a não ser aumentar

quando soube que foi nessa sala onde encontraram mortos Malloran e seu lacaio só umas horas depois de sua

saída.

Produziu-se entre eles um silêncio carregado de tensão.

—Não irá acreditar que tenho algo que ver com sua morte —disse Alex por fim.

—Por que não ia pensar isso? No melhor dos casos, suas acções são muito suspeitas.

—Se me acreditasse culpado de assassinato, teria-me denunciado às autoridades.

—O que lhe faz pensar que não o tenho feito?

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Ali estava... Uma piscada inconfundível. Mas não era devido a um sentimento de culpa. Não, parecia medo...

Um medo compreensível se pensava em como passava o tempo em Vauxhall. Os cárceres de Londres tinham

fama de ser desagradáveis. A jovem levantou um pouco o queixo.

—Ninguém me interrogou.

—É evidente que não se precaveu de que isso é justamente o que eu estou fazendo.

Alex pareceu perplexa e logo emitiu um som de incredulidade.

—Não tem autoridade para fazê-lo.

—Não, mas a vi sair por essa janela. Muito interessante, sobre tudo porque Malloran e a seu lacaio os

encontraram mortos, por envenenamento pouco depois.

A jovem abriu os olhos com uma surpresa muito autêntica para ser fingida.

—P... mas acreditava que os tinham morto a golpes. Todos os rumores diziam...

—Sim, golpearam-nos, mas depois de envenená-los. Ao que parecer, para que os assassinatos parecessem um

roubo. acredita-se que o veneno utilizado foi o ácido prúsico, o qual também resulta interessante.

A moça franziu o cenho, sinceramente confusa.

—O que é o ácido prúsico?

—Uma pergunta estranha vindo da esposa de um caçador de ratos, pois o ácido prúsico está acostumado a ser

utilizado pelos homens do grêmio de seu marido para matar a esses bichos.

Alex ficou paralisada e logo foi ficando palida pouco a pouco.

—Uma coincidência bastante condenatória, sobre tudo porque me mentiu sobre o lugar em que vivia —disse

ele em voz baixa—. Mas quando revistei sua casa, não só não encontrei nem rasto de veneno. Tão pouco

encontrei rasto de um marido.

De repente Colin separou-se da parede e aproximou-se de Alex, que retrocedeu com um grito afogado. A

jovem só pôde dar um passo porque seus quadris toparam contra a secretária. Separava-os uma distância

inferior à longitude de um braço. Colin podia ver as bolinhas cor canela em seus olhos e as douradas sardas

que lhe cobriam o nariz. E a piscada de apreensão em seus olhos.

—assim, por que não me diz, madame Larchmont, por que não deveria acreditar que envenenou a lorde

Malloran e a seu lacaio? Dê-me uma razão para não informar imediatamente de minhas suspeitas o

magistrado.

Alex humedeceu os lábios.

—por que não o fez já?

Por que face ao que vi, face ao que sei sobre si, meu instinto assegura-me que há outra explicação, disse Colin.

—Antes queria ouvir sua explicação. Por desgraça, minha experiência ensinou-me que as coisas nem sempre

são o que parecem ser.

A jovem baixou o olhar e o fixou na mão de Colin — que reparou irritado, estava esfregando a coxa dolorida

sem dar-se conta. Parou imediatamente, e Alex voltou a elevar o olhar.

—Escuto-a, madame —disse ele, ignorando as perguntas que se ocultavam naquelas profundidades de cor

marrom chocolate.

Alex olhou-o nos olhos, observou sua expressão implacável soube que não tinha sentido não lhe contar a

verdade sobre o que tinha ouvido, embora não era necessário dizer-lhe que foi sua própria presença inesperada

o que precipitou sua fuga prematura do salão e sua busca de refúgio no estudio de lorde Malloran.

A moça respirou fundo e começou.

—Estava fatigada depois de tantas tiradas e fui em busca de um refúgio tranquilo com a esperança de

encontrar um momento de repouso.

A seguir relatou com calma sua chegada ao estudio, a conversa que ouviu e a nota que deixou para lorde

Malloran.

—Temia ser descoberta no corredor — concluiu— e decidi que a janela era a opção mais segura para sair. Por

desgraça, não sabia que rondava pelos arredores.

—Não rondava; encontrava-me ali —replicou Colin com o cenho franzido—. Está certa de que uma das

pessoas que ouviu era o defunto lacaio do Malloran?

—Sim. Não vi a outra pessoa, mas reconheceria essa voz... Ontem à noite voltei a ouvi-la —acrescentou, depois

de debatê-lo um instante consigo mesma.

Colin a olhou com mais atenção.

—Quando? Onde?

—Na festa dos Newtrebble. Justamente antes que terminasse, enquanto me inclinava para agarrar minha bolsa.

—Viu quem tinha falado?

—Não. Havia muitas pessoas para saber quem era. Pus-me a escutar, mas não voltei a ouvir a voz.

Colin a olhou aos olhos.

—Por isso estava tão pálida.

Alex o brindou com meio sorriso.

—Levei toda a noite escutando, mas em realidade não esperava ouvi-la porque era um sussurro, não a

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verdadeira voz de alguém. Temo-me que ao ouvi-la levei um susto.

—Recorda quem viu?

—É obvio. Anotei os nomes assim que cheguei a casa para não me esquecer. —Alex fechou os olhos para

visualizar os grupos—. Passavam junto a mim lorde e lady Barnes, lorde Carver, o senhor Jennsen, lorde e lady

Ralstrom e sua filha, lady Margaret. achavam-se perto lorde e lady Whitemore, sua filha lady Alicia, a parente

longínqua de lady Malloran, lady Miranda, lorde Mallory e lorde Surringham. Também havia dois lacaios nas

proximidades.

Colin agarrou uma folha de papel da secretária. Em continuação, humedeceu a pluma no tinteiro. Alex viu

como escrevia depressa os nomes que ela acabava de recitar. Suas mãos eram fortes mas elegantes. Aquelas

mãos a haviam tornado do meio doida, fazia só umas horas, com uma assombrosa combinação de suave força e

apaixonada impaciência. Alex desejava sentir de novo aquelas mãos, com uma necessidade que a confundia e

assustava.

—Tem boa memória, e é muito observadora —disse ele, deixando a pluma e situando-se de novo diante dela.

Alex piscou para separar de sua mente a idéia de suas mãos acariciando-a.

—Recordar as pessoas e observá-las... é meu costume.

Colin olhou-a aos olhos.

—O que há na mochila que leva ao Barril Quebrado todos os dia? —perguntou em voz baixa.

A pergunta deixou sem fôlego a jovem, que fechou os punhos em um intento de controlar sua raiva.

—Também me seguiu até ali. Suponho que não deveria ficar surpreendida.

—Suponho que não. O que leva ali?

—por que não o perguntou ao taberneiro?

—O Fiz. O senhor Wallace não me quis dizer apesar da minha oferta de um bom suborno. Não a cansarei com

os detalhes, mas suas seguintes palavras incluíam diversas ameaças de dano físico em caso a incomodasse.

—Jack é muito... leal.

—cheguei sozinho a essa conclusão —disse, antes de observá-la durante escassos segundos—. O que é ele para

sí?

—Um amigo.

—Nada mais?

Alex considerou a possibilidade de mentir, de dizer-lhe que Jack era mais que isso, a fim de levantar uma

barreira entre eles que lhe fazia muita falta. Entretanto, negou com a cabeça.

—Nada mais.

—O que há na mochila?

—Não é assunto seu.

—Estou de acordo, mas pergunto de todos os modos. —disse olhando-a nos olhos—. Diga-me por favor —

acrescentou brandamente.

Aquelas duas últimas palavras, pronunciadas em voz baixa, combinadas com esses olhos verdes que a

olhavam com tanta seriedade, conspiraram para apagar a ira de Alex. Onde tinha ido aparar?

—Embora o diga, não acreditará —disse ela, tratando de ressuscitar a ira e levantando o queixo.

Colin permaneceu em silêncio, e ela teve que admirá-lo a contra gosto por não lhe oferecer falsas garantias.

—Bolachas e madalenas de laranja —murmurou Alex por fim. Ao ver que ele não dizia nada, expirou com

força e seguiu falando—. Minha amiga Emma e eu assamos bolachas e Madalenas cada dia. Ela vende-as, junto

com as laranjas, perto do Covent Garden e Drury Lane. Jack compra um saco cada dia para dar aos meninos

que mendigam comida perto do Barril Quebrado. Eles têm algo que comer e em troca não o roubam.

Colin assentiu devagar.

—Entendo. Por isso sempre cheira a laranjas.

—Para fazer as bolachas e madalenas, utilizamos todas as laranjas que Emma não vendeu nesse dia. Também

destilamos água com aroma de laranja a partir das cascas. Eu adoro o aroma.

—É... inesquecível. Obrigado por responder às minha pergunta.

Significava isso que acreditava? antes que ela pudesse decidi-lo, Colin voltou a falar.

—Agora eu gostaria de saber algo a respeito desse personagem de ficção que chama monsieur Larchmont.

Alex suspirou. Era evidente que não tinha sentido seguir dando rodeios.

—Eu não gosto de mentir...

—Por isso apostaria algo que seu gato caçador de ratos se chama Monsieur... Uma forma muito engenhosa de

aplacar sua consciência.

Caramba, aquele homem era muito esperto. Alex não sabia se estava mais impressionada ou irritada.

— Inventar um marido proporciona-me umas liberdades e uma segurança que de outro modo não teria —

disse, dobrando os dedos sobre o bordo da secretária —. Não preciso temer por minha reputação como temeria

uma mulher solteira e sempre tenho uma desculpa para recusar insinuações indesejadas. Dá-me certo grau de

segurança que a gente saiba que há um marido protector que me espera em casa. E, é obvio, o título de

«madame» acrescenta uma agradável mística à minha atividade de lançadora de cartas.

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—Certamente que sim. Mas e se decidisse casar-se de verdade?

—O certo é que não pensei no assunto porque não tenho desejos de me casar. Em meu trabalho deposito meu

tempo e meus esforços, meu coração e minha paixão.

—refere-se a jogar as cartas?

—Não, essa é somente uma maneira de ganhar dinheiro para financiar minha paixão.

—Que é proporcionar um refúgio seguro para meninos como Robbie.

Alex levantou o queixo.

—Em efeito. Se tivesse um marido de verdade, estaria legalmente obrigada a responder ante ele, a o obedecer.

Todo aquilo que tanto me custou conseguir seria propriedade dela, e isso não nos beneficiaria de modo algum

nem a mim nem a minha causa. Como o engano não prejudica a ninguém, rogaria-lhe que não revelasse meu

verdadeiro estado civil.

—Seu segredo está seguro. Entretanto, deveria ter denunciado em seguida ante o magistrado o que ouviu no

estudio de lorde Malloran.

Alex não podia dizer-lhe que sua anterior existência, de delinquente a tinha impedido de o fazer.

—Há algumas pessoas que olham com receio a forma que tenho de ganhar a vida, acreditando que, no melhor

dos casos, que é apenas uma representação. Olhariam-me mais como uma suspeita que como uma

testemunha.

—Conhece lorde Wexhall?

—Não muito, embora mo tenham apresentado. Contratou-me para jogar as cartas em sua próxima festa.

—Eu o conheço muito bem e posso dizer que merece toda minha confiança. Eu gostaria que lhe contasse o que

me contou .

—Assim o poderá dizer ao magistrado —disse Alex, incapaz de apagar a amargura de sua voz— e o

magistrado poderá me acusar de assassinato, de um crime que você acredita que cometi.

Colin a agarrou pelos braços. Inclusive através da lã do vestido, o contacto do homem acendeu faíscas. A

jovem tentou dar um passo atrás, mas com os quadris já apertados contra a secretária estava apanhada. Ele

cravou os olhos nos sua em busca de algo, mas Alex sustentou o olhar.

—Acredito em tudo o que me contou —disse Colin por fim—. Não ponho em dúvida sua versão.

Invadiu-a uma sensação insólita, algo que não podia nomear, uma espécie de redemoinho de alívio, gratidão e

surpresa. Esteve a ponto de perguntar por que razão acreditava, mas conteve-se.

—Pois... me alegro.

—Parece surpreendida.

—Suponho que o estou.

Colin voltou a olhá-la aos olhos.

—Não está acostumada a que suas palavras sejam aceitas como a verdade.

Não era uma pergunta, e a jovem teve uma estranha sensação.

—É normal em minha profissão —disse, falando com uma despreocupação que estava muito longe de sentir—.

Algumas pessoas acreditam o que digo; outras pensam que me limito a inventar as coisas para as entreter.

Colin assentiu.

—Compreendo — disse—, mas terá que o dizer a orde Wexhall. O assassinato será cometido em sua casa a

semana que vem, e ele tem os recursos necessários para tomar as precauções necessárias para o impedir. —

Colin a sujeitou com mais força—. Deve dar-se conta de que, por ouvir esse plano, também está em perigo.

—Por desgraça, considerei essa possibilidade.

—Eu diria que é mais que uma possibilidade. Necessita amparo.

—Sou muito capaz de cuidar de mim mesma.

—Em circunstâncias normais, estou certo que sim. Entretanto, estas não são circunstâncias normais. Observou

algo insólito? Alguém disse ou fez algo que tenha-lhe parecido ameaçador?

Os polegares de Colin roçaram suas mangas, produzindo um calafrio nos braços. Um calafrio que a distraía

muito. Além disso, estava tão perto... o bastante perto para perceber a textura de sua pele bem barbeada. Alex

humedeceu os lábios, de repente ressecados.

—Pareceu-me que alguém me vigiava e seguia, tanto depois da festa dos Malloran como da festa dos

Newtrebble, mas resulta que era o senhor. Ontem experimentei a mesma sensação enquanto vinha para aqui, e

também hoje. Além disso, não ocorreu nada insólito.

Colin franziu o cenho.

—Enquanto vinha para aqui? Desde seu apartamento, ou do Barril Quebrado?

Alex reflectiu durante vários segundos.

—Desde meu apartamento os dois dias. Do botequim, só hoje.

Ele franziu o cenho mais ainda.

—Está certa?

—Sim. Tive a intensa sensação de que me vigiavam.

Alex estremeceu ao recordar essa sensação de ter os olhos de alguém em cima e tentou dissimular seu

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desconforto com um leve sorriso.

— Se tivesse olhado com mais com atenção, deduzo que o teria visto vagueando por trás de uma árvore

próxima.

—Não, hoje não a segui até aqui, o que significa que, se estiver certa, tem-no feito outra pessoa.

Capítulo X

Colin olhou nos olhos de cor marrom chocolate e ficou comovido. Tinha querido saber se continuava sendo

uma ladra, e uma parte dele desejavam em segredo que fosse, pois em tal caso poderia a retirar da cabeça com

facilidade e convencer-se de que o que sentia por ela era uma atracção irracional.

Mas aquela faceta de si mesma que tinha revelado, aquela pessoa que consagrava seu tempo, seus ganhos e seu

coração a ajudar os meninos... Aquela pessoa tinha honra e integridade. Era leal e valente. Eram rasgos que

Colin admirava muito e que o atraíam. De um mero interesse físico podia afastar-se. Mas uma atracção que

implicava a algo mais que seu corpo, que lhe tocava o coração e a mente... Não sabia muito bem como a tirar da

cabeça ou convencer-se de que não lhe convinha.

Só lhe ocorria ceder ao seu desejo de saber mais.

Saber tudo. Desentupir cada capa fascinante de sua personalidade e descobrir com exactidão quem era e como

tinha chegado a ser essa mulher que tanto o cativava. Sua eloqüência, as maneiras educados com que se

comportava... Como e onde tinha aprendido tais coisas?

Seguia sendo uma ladra? Agora seu instinto dizia-lhe que não. Suas suspeitas de que sua actividade de

lançadora de cartas fosse simplesmente uma coberta para roubar as pessoas enriquecida em cujos lares

levavam a cabo suas tiragens resultavam infundadas, sobre tudo porque não tinha ouvido que tivessem

roubado nada.

Estava muito disposto a pôr em dúvida tudo o que ela dissesse, mas não podia.

—Necessita amparo —disse, obrigando-se a concentrar-se em seus olhos e a não olhar sua boca, que desejava

saborear e explorar—. Temos que pensar na melhor forma de lho dar.

—Não sou uma dama protegida da sociedade, senhor. Levo muito tempo cuidando de mim mesma.

Na mente de Colin surgiu a imagem dela aquela noite no Vauxhall, seu rosto sujo, o aroma de angústia e

desespero que emanava enquanto agarrava seu relógio de bolso, e sentiu-se muito penalizado.

—E é evidente que o tem feito muito bem —disse, com voz áspera por uma emoção que era uma mescla de

compaixão e de outra coisa que temeu examinar com muita atenção—. Entretanto, agora enfrentamos alguém

que provavelmente matou já duas pessoas, de uma forma muito audaz, e planeja matar a alguém na festa de

lorde Wexhall. Não deveríamos ignorar sua sensação de que a seguiam. E deve ter em conta que qualquer

perigo dirigido contra si poderia afectar o seu lar e as pessoas que trata de proteger.

Alex abriu muito os olhos para ouvir suas palavras e logo os entreabriu decidida.

—Não permitirei que nada prejudique a esses meninos nem a Emma.

—Então acredito que o melhor é que os avise e se mantenha afastada deles até que passe a festa do Wexhall e

resolva isto.

A jovem moveu as mãos em um gesto de impotência.

—É um bom plano, mas não tenho aonde ir. Eu não posso me permitir...

—Pode ficar aqui, comigo.

Suas palavras ficaram flutuando no ar, e Alex ficou imóvel sob suas mãos, que seguiam agarrando-a nos

braços. A voz interior de Colin o advertiu para soltá-la, mas ele ignorou o aviso e em lugar disso escutou a sua

premente necessidade de tocá-la.

Demônios, Colin desejou que ela não tivesse tanta habilidade para ocultar seus sentimentos. A expressão da

jovem não revelava nada.

—Embora agradeça sua oferta —disse por fim—, apresentaria problemas para ambos. Se me instalasse em sua

casa, todo mundo diria é obvio que sou sua amante. Sem dúvida, os membros da alta sociedade que agora

recorrem a meus serviços se escandalizariam e já não quereriam me contratar. Temo-me que sua oferta, embora

talvez me assegure a segurança física, signifique para mim a morte econômica e social. E logo está o assunto de

sua prometida.

—Mi... Prometida? —repetiu ele, desconcertado. Tinha perdido todo o fio de seus pensamentos ao ouvir a

palavra «amante».

—Sim, sua prometida. A mulher que veio a procurar Londres. A mulher com a que vai casar e retornar ao

Cornualles —esclareceu.

—Ah, sim. O que tem que ver?

Alex suspirou exasperada.

—Embora uma solução como a que me propõe não resultasse desastrosa para mim, que acreditem que vive

abertamente com sua amante, não o vai ajudar na procura de uma esposa.

Procurar esposa... Isso fazia. Mas só pôde pensar em que Alex havia tornado a pronunciar aquela palavra que

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destruía seus pensamentos. «Amante.» Colin recordou o sonho em que ela se aproximava vestida com uma

atrevida camisola, com olhos brilhantes e cheios de intenções sensuais. Como o faria uma amante. Em sua

mente surgiu a imagem dela nua, excitada, esperando-o em sua cama. Desejando-o.

De repente tomou consciência do perto que estavam, do calor dos braços dela, do subtil e doce aroma de

laranjas que provocava seus sentidos. Colin sacudiu a cabeça e franziu o cenho, espantado ante a facilidade que

tinha aquela mulher para fazê-lo perder a concentração.

Depois de decidir que era melhor pôr certa distância entre eles, ao menos até que conclui-se sua conversa,

soltou-a e aproximou-se da janela. Os raios douradas do sol da tarde penetravam através dos vidros, incitando-

o a sair ao exterior.

Ali devia estar. Cruzando Hyde Park a cavalo, conversando com senhoritas de impecável berço que, aquelas

horas, visitariam o parque com seus pais ou uma senhora de companhia, aproveitando o bom tempo para

conhecer gente. Por desgraça, ele não tinha desejo algum de conversar com nenhuma daquelas senhoritas. A

única mulher com a que sentia desejos de falar estava nas suas costas, a três metros de distância.

Mas ao menos agora que não a olhava, que não a tocava, que não absorvia seu aroma, seus pensamentos

voltavam a seu rumo. Depois de um momento de reflexão, voltou-se para ela. E, como sempre ocorria quando

a olhava, ficou sem respiração, como se tivesse atravessado a sala a correr.

—cheguei a uma solução —disse, reprimindo-se para não aproximar-se dela—. Ficará na casa de lorde

Wexhall, que está muito perto. Assim estará segura e, como meu irmão e sua esposa também se hospedam lá

neste momento, não haverá problemas de decoro.

O rosto do Alex reflectiu uma grande confusão.

—por que ia aceder lorde Wexhall?

—Porque somos muito amigos.

—Mas, se estiver em perigo, poderia pôr em uma situação difícil a todas as pessoas que vivem em sua casa.

—Se estiver em perigo, não há na Inglaterra uma casa mais segura que a do Wexhall. Ele e seu pessoal estão

bem treinados nesses assuntos. Como meu irmão e eu mesmo.

Alex arqueou as sobrancelhas.

—Treinados nesses assuntos? Três cavalheiros? Sonha como se todos vocês fossem espiões ou algum disparate

semelhante.

—É que fomos espiões, e a guardaremos. Acredite, está em boas mãos.

A máscara inescrutável da jovem desapareceu, e lhe olhou incrédula.

—Brinca.

—Não brinco. Perguntava-me como um cavalheiro sabe algo sobre forçar fechaduras, e essa é a resposta. Em

realidade, lorde Wexhall foi meu primeiro professor nessa arte. Enquanto se aloje em sua casa, talvez queira

lhe pedir uma ou duas indicações.

A moça cruzou os braços e o olhou com receio.

—Lorde Wexhall? Esse homem amável e avoado? Agora estou certa de que brinca.

—Não. Até que se retirou faz vários anos, estava ao serviço da Coroa. Tanto meu irmão como eu prestávamos

contas a ele.

—Seu irmão o médico.

—Que também é um perito descodificador e está retirado. É o único irmão que tenho.

—Está-me dizendo que é um espião.

—Que era espião. Eu também me retirei do serviço ativo faz quatro anos.

—por quê?

—por que era espião, ou por que me retirei?

—As duas coisas.

—Wexhall me propôs colocar um de seus espiões na propriedade que minha família possui no Cornualles,

devido a sua situação estratégica com França. Eu aceitei seu plano, com a condição de que eu fosse o espião.

Conhecendo o gosto de meu irmão pelas adivinhações, códigos e demais, também o recomendei a ele.

Alex parecia confusa.

—Mas por que ia implicar-se um homem como você em uma actividade tão perigosa?

—Esta é a segunda vez que diz «um homem como eu». A que se refere exactamente?

Colin apertou a mandíbula, irritado consigo mesmo por deixar que a pergunta atravessasse seus lábios, sobre

tudo quando sabia muito bem a que se referia. Referia-se a...

—Um cavalheiro com título, é obvio —disse.

Um cavalheiro com título, é obvio, repetiu Colin para sí, reprimindo o som de desgosto que surgiu em sua

garganta. Bem, certamente não podia negar a precisão de suas palavras: isso era ele. Por desgraça, para a

maioria das pessoas não era nada mais. Só um título. Fazia muito tempo que se acreditava imune à dor que

tinha experimentado quando jovem se precaveu desse facto, mas, dada a inegável dor que sentiu ao ouvir

aquelas palavras, devia reconhecer que estava enganado a esse respeito. Ela o via como outros.

Afastando sua ridícula desilusão, inspirou fundo e retornou com a mente ao jovem insatisfeito que era oito

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anos atrás.

—Enquanto crescia, toda minha existência girava em torno de meus deveres para com meu título e minhas

propriedades. Quando fiz vinte e um anos, meu pai já me tinha ensinado tudo o que tinha que saber.

Desfrutava de muito trabalhando, mas a meu pai gostava, ou melhor dizendo, necessitava, encher seus dias

solitários administrando as propriedades ele mesmo. Eu não tinha coragem para lhe pedir que fizesse menos

para me permitir fazer mais e lhe negar assim o que necessitava. Assim não fazia nada que não pudesse fazer

um administrador. Sentia-me... Inquieto. Desnecessário. Vazio. E sobre tudo inútil. Nathan tinha sua profissão

de médico, mas eu não tinha nada à margem das habituais ocupações de um cavalheiro de campo, que, embora

resultassem agradáveis, não tinham muito uso nem valor.

Colin fez uma pausa, recordando seu crescente descontentamento.

—Nunca esquecerei o dia em que por fim me fartei de não ser nada mais que um cavalheiro com título, como

me há descrito com tanto acerto. Nathan contou a meu pai e a mim que tinha salvado a vida de um homem

aquela manhã. Escutei suas palavras, ouvi o orgulho em sua voz e me dava conta de que nunca tinha feito

nada do que pudesse estar tão orgulhoso. Certamente, nada tão importante como salvar a vida de alguém.

A lembrança o invadiu; aqueles sentimentos de insatisfação resultavam tão nítidos como se os tivesse

albergado no dia anterior.

—Então soube que queria ou, melhor dizendo, precisava demonstrar a mim mesmo que era mais que um

título, mas não estava certo do que fazer. Considerei a possibilidade de comprar um cargo no exército, mas

então apareceu Wexhall, que queria utilizar a propriedade para a espionagem, e vi uma oportunidade. Ao

princípio duvidava de minha capacidade como espião, mas o convenci de que me desse a oportunidade de

demonstrar que estava à altura da tarefa. Resultou que sim, e que além disso possuo um talento especial para

forçar fechaduras e penetrar em lugares nos que não deveria estar. Todo isso é muito prático para um espião.

—Sim, imagino que deve sê-lo. Gostava de espiar?

Colin refletiu.

—Sim —disse—. Eu gostava de servir a meu país, fazer algo importante, ser útil. Eu adorava a provocação.

Não acrescentou que houve várias missões, uma em particular, que não gostou absolutamente, que tinham

deixado nele profundas marcas físicas e mentais.

—Ao olhar para trás —acrescentou—, tenho que dizer que foi a época mais feliz de minha vida.

—por que se retirou?

Apertou a coxa com a palma da mão e decidiu contar-lhe a versão singela.

—Feriram-me.

—Como?

— Com um disparo.

O olhar do Alex posou um instante na coxa do Colin.

—Dói? —perguntou em voz baixa.

Colin encolheu de ombros e cruzou os braços.

—Às vezes —respondeu, esboçando um sorriso—. Sobre tudo quando me vejo obrigado a correr pelos becos

de Londres em perseguição de lançadoras de cartas.

Alex indicou com um gesto da cabeça a gaveta fechada.

—Poderia forçar essa fechadura?

—É obvio, e em muito menos tempo de que demorou em ver-se apanhada com as mãos na massa. O qual é

compreensível, pois, naturalmente, não tem experiência em forçar fechaduras.

Colin riu para si ao ver o olhar ofendido da jovem. Era evidente que essa afirmação a irritava e que devia fazer

um grande esforço para não corrigi-lo, pois em realidade, antes de fazer notar sua presença, Colin tinha

observado que estava a ponto de abrir a gaveta, e teria demorado menos de um minuto em acessar a ela.

Impressionante. Ocorreu uma vez mais que seria uma espiã estupenda.

—Está disposto A fazer-ME uma demonstração? —perguntou ela.

Em sinal de resposta, entregou-lhe a chave.

—por que não se assegura de que está bem fechado. Não quereria levar vantagem.

—Encantada —disse Alex com um sorriso não muito sincero.

Quando acabou, ficou em pé e entregou a chave, que Colin deslizou no bolso do colete.

Entretanto, em lugar de ajoelhar-se diante da secretária, aproximou-se mais dela. Alarmada, Alex retrocedeu e

se deteve ao bater contra a secretária . Colin aproximou-se ainda mais.

—O que...o que faz?—perguntou ela com uma voz ofegante.

A Colin entrou a vontade de fazer algo para que ofegasse ainda mais.

Olhando-a nos olhos, Colin esticou o braço e, com destreza, tirou-lhe um gancho do cabelo. Com um sorriso,

sustentou em alto sua presa.

—Não posso forçar uma fechadura só com minha boa aparência.

Alex o olhou de ponta a ponta, detendo-se em sua boca de uma forma que esticou todos os músculos do Colin.

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—Suponho que não —disse Alex com a mesma voz ofegante—. Que fazia quando não havia uma mulher nas

proximidades a quem pudesse tirar um gancho?

Demônio fazia falta um esforço hercúleo para não esticar o braço e tocá-la. Em lugar disso, piscou-lhe o olho.

—Sempre levo as minhas.

Colin deixou-se cair sobre um joelho, fez ranger os nódulos e logo esfregou as mãos. Para acabar, olhou-a.

— Pronta?

—Já o estava —respondeu ela com secura.

Sem mais, Colin introduziu com delicadeza o gancho na fechadura, moveu-a duas vezes e logo a tirou.

—Voilà!

—Não seja ridículo. Essa gaveta não está aberta...

Alex abriu devagar a gaveta. Teve que apertar a mandíbula para não abrir a boca ante sua destreza e

habilidade. Viu o que parecia uma brilhante caixa negra mas, antes que pudesse ver mais, Colin fechou a

gaveta, introduziu sua chave e o fechou. Continuando, em um único e flexível movimento, ficou em pé e

guardou a chave no bolso.

O homem esticouo braço e voltou a colocar-lhe o gancho no cabelo com suavidade.

—Não só forçava fechaduras —disse em voz baixa—, também era um perito ladrão de carteira.

A proximidade de Colin, o suave contacto de suas mãos em seus próprios cabelos e o leve aroma limpo que

emanava conspiraram para deixá-la sem fala. Alex esclareceu garganta.

—Ladrão de carteira? Era bom?

Colin afastou as mãos de seus cabelos, deu um passo atrás e sorriu.

—Acredito que o facto de que precise perguntá-lo demonstra que o era. E ainda o sou. Parece-me que isto é seu

—respondeu, estendendo a mão.

Alex ficou boquiaberta ao ver o pacote envolto em seda cor bronze que Colin tinha na palma da mão. Levou a

mão ao profundo bolso de seu vestido no que guardava suas cartas. O bolso estava vazio. Deus, era muito

bom. E ela entendia disso. Teria sido um ladrão estupendo.

—Impressionante —disse a jovem, incapaz de dissimular sua admiração—. Estou assombrada.

—Obrigado. É apenas uma de minhas numerosas capacidades.

A malícia brilhava nos olhos do Colin, fazendo-o ainda mais atractivo.

Céus, Alex não duvidou nem por um instante que possuía dúzias de capacidades mais. E estava claro que

entre elas se incluía a de beijar uma mulher até deixá-la sem fôlego, ansiosa, desesperada e acesa...

—Impressionada e assombrada —disse ele, a tirando de seus pensamentos descontrolados—. Acredito que

está... «impresiobrada».

Alex não pôde evitar sorrir.

—Suponho que sim.

—Entretanto, certo que diz isso a todos os ladrões de carteira cavalheiros com título que conhece.

Incapaz de resistir a suas brincadeiras, Alex imitou sua atitude alegre, baixando o olhar e olhando-o logo

através das pestanas.

—minha mãe! Tem descoberto meu maior segredo.

—De verdade?

Antes que pudesse dar uma resposta despreocupada, Colin esticou a mão e roçou-lhe a bochecha com as

pontas dos dedos, roubando-lhe o pouco fôlego que ainda não lhe tinha tirado. Uma paixão inconfundível

surgiu em seus olhos, fundindo todo rasto de diversão.

—Suspeito que tenha outros segredos —disse Colin em voz baixa, passando-lhe os dedos devagar pelo queixo.

O sentido comum do Alex exigia que se separasse dele, daquele contacto que parecia despertar fogo sob a pele.

Mas a mulher que havia nela, sabia tudo sobre a sobrevivência e entretanto tão pouco sobre a vida e tinha

permanecido rigorosamente encerrada, até que ele abriu a porta com seu beijo, negava-se a mover-se, incapaz

de reprimir sua incontrolável curiosidade e desejo de saber o que faria ele a seguir.

Com o coração desbocado, Alex humedeceu os lábios.

—Todo mundo tem segredos, senhor. Inclusive você —disse.

Uma expressão desolada e atormentada surgiu nos olhos do Colin, mas desapareceu tão rápido que Alex

duvidou se a tinha imaginado.

—Não posso discordar sobre isso —respondeu, enquanto seus dedos se moviam em torno do lóbulo da orelha

da jovem—, embora sim dircordo com algo que disse antes.

—O que é?

—Que não tem nada do que envaidecer-se —respondeu, enquanto lhe passava a gema do polegar pelos lábios,

inflamando-a até os dedos dos pés—. É preciosa.

Alex soltou uma gargalhada de assombro.

—E você é tolo.

Colin sorriu.

—Também sou muito mais amável que você.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Tenho um espelho. Preciosa? Não sou nada disso.

—Pode ser que tenha um espelho, mas não se vê com claridade. —Colin inclinou-lhe primeiro cabeça para a

esquerda e depois para a direita, como se a avaliasse e sopesasse a questão— O certo é que tem razão. Não é

preciosa. É deliciosa.

Essa descrição resultava ainda mais ridícula, mas seus hábeis dedos faziam que se sentisse deliciosa enquanto

continuavam com sua deliciosa exploração, descendo por seu pescoço. Deus, era quase impossível não fechar

os olhos e deixar-se acariciar, como fazia seu gato, Monsieur, quando lhe fazia mimos. Nunca imaginou que o

contacto de um homem pudesse ser tão suave. Tão inequivocamente encantador e ao mesmo tempo

tão…emocionante.

—bebeu? —sentiu-se impulsionada a perguntar.

—Não. Não faz falta. Você me embriaga.

Tomou o rosto com uma mão e roçou-lhe a bochecha com o polegar, enquanto com o outro braço rodeava-lhe a

cintura para aproximá-la ainda mais para si.

Seu contacto e a intensidade de seu olhar a fizeram tremer. Alex fundia-se de dentro para fora. Seus seios

roçavam o peito dele e, face às capas de roupa que separavam a pele dos dois, a jovem conteve o fôlego ante o

intenso contacto. Os olhos do Colin pareceram obscurecer-se e, embora sua vida tivesse dependido disso, Alex

não teria podido afastar o olhar. Me beije. Por favor, me beije..., pensou.

As palavras ressonaram em sua mente, exigindo ser pronunciadas. Sua espera era tão intensa que se

assemelhava à dor. Justo quando não acreditou poder agüentá-lo um instante mais, Colin inclinou a cabeça e

apertou seus lábios contra a pele sensível situada por detrás da orelha.

Os olhos de Alex fecharam ante a sensação excitante e deliciosa do corpo dele tocando do seu do peito a um

joelho. Enquanto sua voz interior a advertia que se detivesse, que se afastasse, suas mãos ascenderam pouco a

pouco e agarraram seus largos ombros.

—Não tem idéia de quanto me alegrei ao descobrir que não estava casada —sussurrou Colin contra seu

pescoço, com voz aveludada e sedutora, enquanto seu quente fôlego produzia-lhe calafrios de paixão.

—Esteve muito mal da sua parte entrar em minha casa. Eu... estou... muito zangada consigo.

Por desgraça, o suspiro de prazer que escapou não correspondia absolutamente às suas palavras.

—Então terei que procurar caír nas suas graças novamente.

Certamente, era todo um professor. A sensação de seus lábios explorando com gesto pausado a zona em que se

uniam o pescoço e o ombro de Alex fazia que lhe tremessem os joelhos. Entretanto, embora não tivesse visto a

falta de provas da presença de um marido em sua casa —continuou—, teria sabido de todos os modos que não

estava casada.

—Como? —perguntou Alex em um suspiro ofegante, enquanto Colin lhe beijava a garganta.

Ele endireitou-se, e a jovem sentiu falta dos seus lábios contra sua própria pele. Alex abriu os olhos, e o coração

deu-lhe um tombo quando viu o fogo que ardia em seu olhar.

—Ontem à noite, na carruagem —disse Colin, passando-lhe a ponta de um dedo pelos lábios—. Seu beijo. Era

muito inexperiente para estar casada.

Toda a paixão que sentia apagou, com tanta eficácia como se lhe tivessem jogado em cima um jarro de água

fria. Alex não podia recordar a última vez que se ruborizou, mas as fogueiras de mortificação que queimavam

suas bochechas eram inconfundíveis. A jovem tratou de escapar-se, mas ele a abraçou com mais força,

sujeitando-a com uma facilidade que só serviu para aumentar sua humilhação.

—Não se envergonhe —disse Colin, tocando sua bochecha em chamas—. O disse como um elogio.

—Elogio? —repetiu ela como um desaforo - preciosa, logo deliciosa e agora isto? Quantas mentiras mais me

dirá esta tarde?

—Não menti. Pode ser que não pense que é deliciosa, mas eu sim. Desde a primeira vez que a vi não pude

esquecer seu rosto. Quanto a sua forma de me beijar... Pareceu-me fascinante, tentadora e muito excitante.

Estou certo de que se deu conta. Ou não foi assim?

Alex compensava de sobra sua falta de experiência pessoal, com o que tinha presenciado e ouvido nos becos de

Londres.

—Pode ser que seja inexperiente, mas não ignoro o funcionamento do corpo humano —disse, elevando um

pouco o queixo—. Me dava conta.

E isso a tinha entusiasmado de uma forma que nunca esperou.

—Além disso, aprende rápido. Pensei muito em si. Pensou em mim? —perguntou Colin, olhando-a aos olhos.

Onde estava o frio olhar desdenhoso que sempre utilizava para tirar de cima a qualquer homem que a olhasse?

Onde estava sua ira e sua decisão de evitar aquela tentação capaz de debilitar seus joelhos? Não tinham

nenhuma opção sob seu feitiço. Evaporavam-se sob o fogo de seus belos olhos verdes, olhos que ela tinha

jurado pôr negros se ele tentava beijá-la de novo. Em troca, ardia em desejos de voltar a viver a magia de um

beijo dele.

Que tinha pensado nele? Só tinha preenchido cada nesga de sua mente. Uma mentira flutuava em seus lábios

mas, em vista da sinceridade de Colin, negou-se a ser pronunciada.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Sim.

—Da mesma forma em que eu pensei em si, espero.

Com um esforço, Alex se sobrepôs e arqueou uma sobrancelha.

—Não estou certa. Tinha pensado em bater-me com uma frigideira de ferro?

Colin esboçou um sorriso e sacudiu a cabeça, enquanto suas mãos lhe acariciavam as costas estreitando-a

contra si.

—Não. Pensava em tocá-la —respondeu, antes de inclinar-se para ela e roçar os lábios do Alex com os seus—.

Em beijá-la —sussurrou contra sua boca—. Pensava no cálida, doce e deliciosa que sabe. No muito que quero

voltar a saboreá-la.

O coração de Alex pulsou com força para ouvir suas palavras, pronunciadas naquele áspero sussurro. Colin

passou-lhe a língua pelo lábio inferior, e os lábios da moça se abriram com um suspiro. Mas em lugar de beijá-

la, levantou a cabeça. Agarrando seu rosto entre as mãos, olhou-a nos olhos, estudando-a como se fosse um

enigma por resolver.

—Foram seus pensamentos parecidos com meus? —perguntou Colin em voz baixa.

Do momento em que acendeu minha imaginação e minhas fantasias faz quatro anos em Vauxhall, pensou

Alex. Não teria podido negar-lhe a verdade de tê-lo pensado.

—Sim.

—Graças a Deus.

Suas palavras ressonaram nos lábios da jovem. Em continuidade, Colin inclinou a boca sobre a dela e a beijou

com a mesma mágica perfeição que a noite anterior.

Mas este beijo era... Mais beijo. Mais profundo. Mais abrasador. Mais intenso e exigente. Mais apaixonado e

urgente. Mais delicioso. Sua língua penetrou na boca dela, e a jovem imitou todos seus gestos, empregou todos

os matizes que lhe ensinou a noite anterior, ansiosa de aprender mais e não deixar que sua ignorância a

envergonhasse.

Rodeando-lhe o pescoço com os braços, Alex explorou com a língua o sedoso calor da sua boca. Um gemido

surgiu da garganta de Colin e, sem interromper o beijo, moveu-se para ficar apoiado contra a secretária.

Separou as pernas e a atraiu entre suas coxas, pressionando sua erecção contra ela. A jovem sentiu-se invadida

pelo calor, e um latejar palpitou entre suas pernas.

Rodeada por seus fortes braços, sentiu-se completamente envolvida por ele. Segura. Quente. Protegida. Uma

intensa sensação, distinta de tudo o que tinha experimentado em sua vida. Uma sensação por que ansiava

mais. O corpo de Colin emanava calor, e a jovem aspirou seu aroma limpo e masculino. Ofegante, Alex

apertou-se contra ele, sentindo sacudidas de prazer.

Com um gemido, ele separou ainda mais as pernas e apoiou uma mão aberta na parte inferior das costas,

estreitando-a mais contra si enquanto adiantava a outra mão para a passar sobre seu peito. A jovem ofegou

contra sua boca e Colin interrompeu o beijo para percorrer-lhe o pescoço com os lábios. Alex deitou a cabeça

para trás, rendida, agarrou-se a seus ombros, tratando de absorver a chuva de sensações prazenteiras, que a

bombardeavam rapidamente. Seus mamilos esticaram e a jovem arqueou as costas, apertando seu peito

ofegante contra a palma da mão do Colin.

—Laranjas —sussurrou ele contra a base de sua garganta—. Deliciosas.

E logo, enquanto lhe acariciava os peitos, voltou a beijá-la com um beijo comprido, lento e profundo que a

deixou sem fôlego. A moça notava pesado, húmido e ofegante o lugar secreto entre suas coxas, que pulsava ao

compasso do movimento da língua dele em sua boca. Uma deliciosa frouxidão a invadiu, e a jovem fundiu-se

contra ele. As mãos do Alex fizeram-se mais audazes, percorrendo o amplo peito dele, acariciando seus fortes

ombros e enredando-se em seu denso e sedoso cabelo.

A moça perdeu toda noção do tempo e do espaço, e pela primeira vez em sua vida deixou imporem-se os

sentidos. Tudo se desvaneceu salvo a necessidade cada vez mais desesperada para experimentar mais sua

força. Saborear mais seu delicioso sabor. Tocar mais sua pele cálida e firme. Alex apertou-se contra Colin

enquanto seu corpo tremulo ansiava e necessitava mais, sabendo que só ele podia apagar aquele inferno que

tinha aceso em seu interior.

Algo frio tocou-lhe a perna mas, antes que pudesse entender o que era, a mão cálida do Colin subiu devagar

por sua coxa, separada de sua pele só pela fina capa de sua roupa interior, uma sensação que a emocionou a fez

estremecer. A mão ascendeu mais ainda para desenhar lentos círculos sobre as nádegas da moça, e Alex

gemeu, desejando o contacto embriagador. Como podia uma carícia tão lenta acelerar assim o pulso?

Um insistente ruído penetrou a névoa de desejo que a envolvia, e ele deve também ter ouvido porque levantou

a cabeça. Aturdida, Alex abriu os olhos. Seus olhares se encontraram, e a jovem ficou sem fôlego ao ver o

desejo abrasador que ardia nos olhos dele. Os golpes soaram de novo e Alex despertou sobressaltada...

—A porta.

A voz de Colin soou grave e áspera, e pareceu enormemente aborrecido perante a interrupção.

A realidade retornou de repente e Alex lançou um grito afogado» afastando-se vários passos de Colin com

gesto vacilante. A jovem levou as mãos às bochechas acesas.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Meu Deus!

O que tinha feito? Imediatamente, sua voz interior respondeu «desfrutas-te mais nestes poucos minutos que

em toda sua vida».

—Não se preocupe. Ninguém entrará. O que se passa, Ellis? —perguntou em voz alta, sem afastar o olhar dela.

—O doutor Nathan está aqui, senhor —disse a voz afogada do mordomo através da porta—. Está em casa

senhor?

Antes que pudesse responder, ouviu-se do outro lado da porta outra voz, muito masculina e divertida.

—Claro que está em casa, Ellis. Minhas saudações, querido irmão. Trago presentes e espero-te no teu estudio.

Não demore muito, ou comerei todo o mazapán sem ti.

Lorde Sutton murmurou algo que soou suspeitosamente como «maldito e punheteiro intrometido ». O olhar

glacial que dirigiu à porta pretendia sem dúvida fulminar a superfície de carvalho. O certo é que parecia tão

aborrecido que Alex teve que apertar os lábios para dissimular seu repentino regozijo. Mas não teve êxito,

porque Colin a olhou com as pálpebras entreabertas.

—Estás a rir-te?

—Eu? Claro que não —disse Alex, com gesto altivo.

—Porque se estivesses rindo...

O olhar aceso do Colin a abrasou.

—O que faria?

A pergunta ofegante saiu antes que a jovem, assustada, pudesse detê-la.

—Uma pergunta interessante. Terei que reflectir, porque fazes com que queira fazer muitas coisas.

Colin a agarrou pela mão. Quando seus quentes dedos envolveram os dela, a jovem recordou sobressaltada

que não levava as luvas. Então baixou o olhar e viu que os dedos da luva sobressaíam por baixo da secretária.

A vergonha a invadiu mas, antes que pudesse afastar a mão, Colin a tinha agarrado e tinha apertado os lábios

contra sua palma. Uma de sua palmas calosas e danificadas, que sempre tinha bem cuidado para ocultar da

vista dos membros ricos da alta sociedade.

Colin baixou sua mão e logo passou devagar o polegar pelo ponto que acabava de beijar. Outra onda de

vergonha a assaltou enquanto ele olhava aquela mão, sabendo que veria os cortes, as velhas cicatrizes e as

queimaduras causadas por anos de duro trabalho. Alex tratou de retirar a mão com suavidade, mas ele não a

deixou fazê-lo.

—Trabalha duro —disse, passando o dedo por cima de um calo.

—Alguns temos que fazê-lo.

Assim que as palavras saíram de sua boca, a jovem desejou não as ter pronunciado. Mas Colin não parecia

ofendido. Ao contrário, assentiu gravemente.

—Tem razão —disse, voltando a levantar a mão da moça e apertando-a contra sua própria bochecha—. Eu

gosto da sensação de sua pele sobre a minha, o tacto de suas mãos... Sem as luvas.

Um tremor subiu pelo braço de Alex do ponto em que sua palma descansava sobre o rosto bem barbeado.

—Minhas mãos não são... Bonitas.

—Tens razão. Como tu, são deliciosas —disse o homem com um sorriso—. Já te disse que te encontro deliciosa?

Deus, sua mente insistia para que pusesse fim a aquela brincadeira coquete. Mas era impossível quando seu

coração, que pulsava frenético, negava-se a obedecer.

—Não nos últimos cinco minutos.

—Um terrível descuido que penso corrigir assim que tire o meu irmão de cima.

Colin soltou sua mão e, depois de avaliar rapidamente seu aspecto, esticou a mão para lhe arrumar um pouco o

corpo e a saia do vestido. Logo separou-lhe da frente um cacho solto.

—Perfeita —murmurou.

Depois de passar os dedos por seu próprio cabelo, onde as mãos dela tinham feito estragos, Colin ajeitou a

jaqueta e ofereceu-lhe o braço.

—Vamos?

Alex piscou.

—Vamos aonde?

—A meu estudio, onde nos espera meu irmão.

— Concerteza que deseja ver-te em privado.

—Como nos interrompeu em um momento muito inoportuno, não me interessam muito seus desejos. Disse

que queria me jogar as cartas em uma sala distinta, e meu estudio cumpre essas condições —replicou,

esboçando um sorriso—. E estou certo de poder convencer a Nathan de que também lhe faça uma tiragem

privada. Uma tiragem pela qual cobrará um preço exagerado. Ja, ja, ja.

Alex sorriu.

—Essa é uma risada muito malvada, senhor.

Ele entrelaçou os dedos com os dela, um gesto assombroso que lhe resultou quente e muito íntimo.

—Colin —disse ele.

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Seu nome ressonou na mente dela.

—Colin —repetiu a jovem em voz baixa, saboreando o sabor de seu nome em sua própria língua—. Eu me

chamo...

—Alexandra.

—Como sabes?

—O perguntei a lady Malloran. Tenho um livro sobre as origens dos nomes que consultei depois da festa.

Alexandra é de origem grega, e significa «protectora da humanidade». Tendo em conta a causa a que te

dedicas, parece ser que lhe puseram um nome adequado.

—O que significa Colin?

—Não tenho nem idéia mas, se tivesse que adivinhá-lo, diria que significa «homem que quer voltar a beijar

Alexandra»

Alex ficou imóvel. Certamente, desejava que o fizesse, e muito. Mas isso a perturbava e assustava. Sabia aonde

conduziria outro beijo; a um caminho pelo que seria uma insensatez viajar. Sobre tudo com um homem que,

dadas suas posições divergentes na vida, nunca poderia oferecer-lhe mais que um queda.

Sua falta de controle e a forma em que tinha abandonado sua determinação faziam que se sentisse confusa e

irritada. Em condições normais era muito equilibrada e disciplinada. Entretanto, um momento em companhia

desse homem parecia roubar-lhe seu sentido comum. Bom, pois não haveria mais beijos. Não cometeria o

mesmo engano duas vezes. Já cometeste esse engano duas vezes, recordou-lhe sua voz interior.

Muito bem. Não cometeria o mesmo engano três vezes.

Colin inclinou-se para diante com a clara intenção de beijá-la, e a jovem forçou seus pés a afastarem-se,

libertando sua mão da dele.

—Seu irmão nos espera.

Ele assentiu devagar, olhando-a com seriedade.

—Sim. Este não é o momento nem o lugar.

—A verdade é que não há nenhum momento nem lugar adequado, senhor.

—Colin. E o que queres dizer com isso?

—Um só beijo foi uma coisa, mas repeti-lo hoje foi...

Maravilhoso. Incrível. Inesquecível, disse-se a si mesma.

—... Pouco sensato. Voltar a fazê-lo seria uma verdadeira temeridade.

—por quê?

Porque com só dois beijos tem feito que queira coisas que não deveria querer. Coisas que não posso ter,

pensou.

—Sem dúvida não te faz falta perguntá-lo.

—Não, não me faz falta —disse ele em voz baixa—. Sinto a profunda atracção que há entre nós. A questão é o

que vamos fazer a respeito.

—Nada —disse ela em seguida.

—Não acredito que isso vá ser uma opção.

—Simplesmente o ignoraremos.

—Tão pouco acredito que isso vá ser uma opção.

O silêncio se instalou entre eles, e a jovem sentiu-e muito inquieta sob seu olhar sereno e firme.

—Sugiro que ambos pensemos no assunto —disse por fim— para que possamos chegar a uma solução.

Enquanto isso, vejamos o que quer meu irmão e o informaremos de tua situação. Como te alojarás no Wexhall,

é importante que Nathan saiba tudo para que possa estar alerta.

Não confiava em sua própria voz, assim Alex limitou-se a assentir e aceitou apoiar-se em seu braço para sair da

sala.

Não tinha sentido pensar no assunto, porque a única opção seria que continuassem com sua relação e no final

se convertessem em amantes.

E ela não ia fazer isso, não podia fazê-lo. O risco para sua reputação, para não mencionar seu coração, era

muito grande. Não, não consideraria a possibilidade de converter-se em sua amante.

Mentirosa, riu-se sua voz interior.

Com um enorme esforço, conseguiu ignorá-la.

Quase.

Capítulo XI

O que primeiro Colin viu ao entrar em seu estudio foi Nathan apoltronado em sua matizada poltrona

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predilecta, apoiando as botas, não muito limpas, em seu puf de pele preferido, e metendo na boca uma parte de

mazapán de laranja, seu favorito. Em segundo o que viu foi C.B., enroscado sobre o que era seu tapete turco

preferido em frente à chaminé, profundamente adormecido e com uma de suas enormes patas descansando

sobre o que parecia ser uma de suas botas favoritas.

Apertou as têmporas com as gemas dos dedos com a intenção de frear o começo de uma tremenda enxaqueca.

Ao ver Alexandra, os olhos do Nathan se iluminaram, ficou em pé de um salto e esfregou as mãos com a clara

intenção de desprender-se dos restos de açúcar dos doces favoritos do Colin.

—É essa minha bota? —perguntou Colin assinalando com o queixo o adormecido C. B.

—Sim, mas é a mesma de antes, assim pensei que não te importaria.

—Que maravilha —replicou Colin, e dirigindo-se a Alexandra disse—: Madame Larchmont, meu irmão, o

doutor Nathan Oliver e seu cão, Come Botas C. B. Nathan, permite-me que te apresente a madame Larchmont,

a famosa adivinha.

Nathan fez uma cerimoniosa reverência e Colin deu conta que seu irmão percorria com atento olhar e

avidamente o rosto da Alexandra.

—É um prazer, madame Larchmont.

Alexandra, que havia tornado a pôr as luvas antes de sair do salão, estendeu-lhe a mão coberta com a renda e

Colin estremeceu desejoso de a despojar do objecto e acariciar-lhe os dedos.

—O mesmo digo, doutor Oliver.

—Nunca tinha conhecido a uma adivinha.

—E eu nunca tinha visto um cão tão grande —disse ela com um sorriso, indicando o tapete frente à chaminé—.

É muito bonito.

—Obrigado.

—É um perigo —murmurou Colin olhando sua bota destroçada.

—Mas um perigo simpático —disse Nathan. Olhou-os a ambos, alternativamente e depois seus olhos brilharam

com um brilho de curiosidade—. Não será seu nome de baptismo Alexandra?

Maldito seja. Colin lançou a seu irmão um olhar fulminante que Nathan ignorou alegremente.

—por quê? Sim, assim é.

—Já o supunha —disse Nathan com um sorriso—. Ouvi falar de si...

—Lê o Times —interrompeu Colin, lançando a Nathan um olhar feroz e fulminante—. Da primeira à última

página, de maneira obsessiva. —E sem dar ao Nathan a oportunidade de refutar suas palavras, continuou

rapidamente—. Para falar a verdade, Nathan, alegro-me que estejas aqui...

—Sim, é evidente.

—... Porque há algo importante do que temos que falar —continuou e fez um gesto indicando ao grupo de

poltronas que havia junto à chaminé—. Sentemo-nos, pedirei o chá.

Deu a volta para a Alexandra e ao vê-la ali, no meio do halo dourado de luz que produzia o reflexo do sol

através das janelas, deu-se conta por que Nathan tinha adivinhado seu nome. Embora não havia nada nem em

sua vestimenta nem em sua atitude que indicasse que tinham compartilhado um apaixonado beijo, a alguém

tão observador como Nathan não podia escapar o rosado rubor de excitação que ainda coloria suas bochechas.

Ou o rosa mais escuro de seus lábios recém beijados. Maldita seja, só olhá-la já não podia pensar em outra

coisa que em atrai-la para ele, rodeá-la com seus braços Y...

Sacudiu a cabeça, para limpar a erótica imagem da Alexandra entrelaçando seu corpo com o seu, na cama, nua,

excitada, estendendo seus braços para ele...

Mais tarde. Poderia pensar nisso mais tarde. Quando seu excessivamente observador irmão se fosse. Esclareceu

a garganta e disse a Alexandra:

—Preferes chocolate em lugar de chá?

Seus olhares se encontraram e teve que apertar literalmente as mãos para não as estender e tocá-la.

—Pois um chocolate estaria muito bem —disse ela brandamente.

—Sim, um chocolate estaria muito bem —repetiu Nathan—. E algumas bolachas caseiras. Um sortido extra de

bolachas visto que, infelizmente, ficaste-te sem mazapanes.

Enquanto Nathan e Alexandra se instalavam perto da chaminé, Colin chamou pela campainha e depois de

explicar a Ellis o que queriam, sentou-se junto a eles. Deu-se conta de que Nathan tinha escolhido sentar-se

estrategicamente na cadeira justamente em frente do sofá onde se sentou Alexandra, um lugar onde podia

estudar abertamente seu rosto e suas reações. Certamente, era o lugar que teria ocupado Colin se fosse o seu

extremamente curioso irmão.

Sentou-se junto a Alexandra no sofá e, depois, sem nenhum preâmbulo, disse:

—Tenho minhas razões para acreditar que madame Larchmont está em perigo. —Logo dirigiu-se para ela e

acrescentou—: Por favor, explique-lhe o que me explicou .

Alexandra respirou fundo e depois explicou o Nathan como tinha escutado aquela conversa por acaso e como

tinha ouvido a mesma voz na festa em casa dos Newtrebble. Nathan escutou atentamente sem dizer nada.

Quando Alexandra terminou, Colin explicou o que sabia das mortes de lorde Malloran e de seu lacaio.

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No final de seu relato, Nathan, com o cenho franzido, disse:

—Pergunto-me se a futura suposta vítima da festa do Wexhall pode ser o mesmo Wexhall.

Colin inclinou-se para diante.

—Tem alguma razão para acreditar que está em perigo?

—Hoje mesmo me explicou que a semana passada o atacaram ao sair de seu clube. Defendeu-se e seu agressor

acabou fugindo. Pensou que o incidente não era mais que um assalto casual.

—Mas pode ser que fosse algo mais —murmurou Colin—. Viu quem era?

—Não. Estava escuro e o homem ia coberto com uma espécie de máscara.

Colin assentiu lentamente e reclinou-se de novo na poltrona.

—A morte do Wexhall, sem dúvida, «daria lugar a uma investigação». E estou certo de que ao longo dos anos

tem feito inimigos.

Tirou um bocado de papel do bolso de seu colete.

—Estes são os nomes das pessoas que na outra noite estavam perto de madame quando reconheceu a voz.

Nathan desdobrou o papel e estudou os nomes com o cenho franzido.

—Com a excepção dos serventes e do senhor Jennsen, que ouvi que é muito rico, todos são respeitados

membros da nobreza.

—Suponho que é possível —disse Alexandra franzindo por sua vez o cenho— que alguém tivesse tempo de

abandonar rapidamente o salão antes que eu levantasse a vista depois de recolher minha bolsa por debaixo da

mesa. Infelizmente, ao reconhecer a voz, assustei-me e fiquei aturdida vários segundos.

—Possivelmente — disse Colin. Fechou os olhos brevemente para visualizar o salão dos Newtrebble—. Havia

um espaço perto de onde estava situada sua mesa. Também havia um grupo de palmeiras onde facilmente se

poderia ter escondido alguém.

—Então esta lista não serve para nada —disse Alexandra, e sua voz se tingiu de frustração.

—Absolutamente —disse Colin—. O facto de que pudesse haver alguém mais é uma mera probabilidade. O

que sabemos com segurança é que estas pessoas estavam ali. —Voltou sua atenção para Nathan—. Agradeceria

que mostrasses esta lista a Wexhall. Pode ser que saiba algo sobre alguma destas pessoas que nós não sabemos.

Advirta também de que o ataque da semana passada poderia não ter sido um incidente casual.

—De acordo —disse Nathan guardando o papel no bolso.

—Madame Larchmont deve receber amparo enquanto tentamos descobrir quem está atrás do assunto e nos

asseguramos de quem é o objectivo. Acredito que o lugar mais seguro para ela é a mansão Wexhall na cidade.

—Sim, estou de acordo —disse Nathan assentindo lentamente.

—Bem. Vitória pode fazer um convite formal a madame Larchmont para que fique ali até à festa. Sua visita

pode-se justificar com alguma historia sobre a necessidade de preparar a casa para a chegada dos espíritos ou

algo parecido. Contigo, Wexhall e os seus na mansão e comigo na rua escoltando-a onde vá, estará a salvo.

Asseguraremo-nos de que algum de nós esteja sempre perto dela durante as veladas programadas até à festa

de Wexhall, No caso de reconhecer de novo a voz.

Nathan assentiu e olhou Alexandra.

—Está disposta a juntar-se ao plano?

—Sim, sempre que lorde Wexhall esteja por sua vez disposto.

—Não se preocupe por isso —disse Colin. Dirigiu-se a Nathan—: depois de nossa sessão, acompanharei

madame Larchmont a sua casa para que possa recolher o que necessitar e, enquanto isso, tu retornas a casa de

Wexhall para o informar do que está acontecendo e faz os preparativos necessários para sua chegada.

Nesse momento bateram na porta.

—Adiante —disse Colin.

Ellis entrou levando uma bandeja de prata que colocou em uma mesa baixa rectangular de madeira de cerejeira

situada diante do sofá. O ar se encheu do delicioso aroma de chocolate quente e bolachas recém feitas. Colin

deu as graças a Ellis indicando que podia retirar-se, e dirigindo-se a Alexandra, disse-lhe:

—Servirá o chocolate enquanto preparo os pratos?

—É obvio.

Enquanto estavam ocupados servindo, Nathan perguntou:

—O que queria dizer com o de «depois de nossa sessão»?

—Sessão de cartas. Convenci a madame Larchmont para que te faça uma leitura privada. Visto que seus

serviços estão muito solicitados, a sessão não se pode mudar, mas merece até o último cêntimo.

—Tem-te feito ler as cartas?

—Assim é. Duas vezes. E me lerá isso de novo hoje.

Colin reconheceu muito bem o brilho malicioso nos olhos do Nathan.

—Não posso deixar de me maravilhar ante seu repentino interesse por temas de natureza espiritual —disse

Nathan.

Seu olhar dirigiu-se a Alexandra.

—me diga, madame, foi capaz de ver seus escuros e profundos segredos?

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Não tenho nenhum segredo nem profundo nem escuro —disse Colin com mais agressividade da que

pretendia.

—Ora. Nem sempre foi tão decente, dissimulado e insípido como o vê agora, madame.

Colin separou de sua mente as lembranças cansativos que o ameaçavam, olhou a Alexandra e lançou um

exagerado suspiro.

—Vê o que tive que suportar durante toda minha vida.

Alexandra ocultou sem dissimulações um sorriso.

—A que se refere? —perguntou a Nathan.

—Estava acostumado a usar o corrimão como escorrega.

—Que surpreendente, milord —disse ela olhando de soslaio a Colin e apertando os lábios.

—E roubava a roupa ao encarregado dos estábulos cada quarta-feira quando o homem se banhava no lago.

—Como se tu não me tivesses ajudado —protestou Colin brandamente. Acrescentou outra bolacha ao prato de

Alexandra e sorriu—. Além disso, não lhe roubávamos a roupa, simplesmente a recolocávamos.

—Quando éramos crianças, este supostamente destacado par do reino —disse Nathan com um fingido ar de

ofendido desdém, assinalando a Colin— estava acostumado a atirar-me ao lago.

—Só quando o merecia —assinalou Colin.

— Tenho certeza que não o merecia todos os dias.

—Isso é o que tu acreditas.

—Deixou de o fazer quando comecei atirar-lhe ovos —disse Nathan a Alexandra com ar de satisfação.

Inclinou-se para ela e sussurrou a modo de confidência—: Tenho uma pontaria endiabradamente boa.

—Aqueles ovos magoavam-me — comentou Colin esfregando involuntariamente a nuca onde o tinha

golpeado seu irmão mais de uma vez.

—Quanto podia chegar a doer o impacto de um ovo? —perguntou Alexandra divertida enquanto estendia a

Colin e a Nathan suas taças de chocolate.

—Nem o pode imaginar. E que porcaria, sobre tudo quando secava. —Fez uma careta e Alexandra riu—. Mas

me vinguei —disse sorrindo—. Fabriquei um lote especial de ovos: fiz um pequeno buraco na casca, esvaziei-

os e em seu lugar coloquei moedas.

—Minhas moedas —interveio Nathan—. As que me tinha roubado.

—Se meu irmão tivesse sido mais inteligente ao as esconder, eu não as teria encontrado —disse, ignorando

Nathan—. Coloquei-me em mira e acabou por me lançar todo seu dinheiro. Foi a última vez que me atirou

ovos.

—Muito esperto —disse Alexandra.

—Sou um tipo muito esperto.

Maldita seja, seus formosos olhos sorrindo tão perto o faziam entrar em transe. Colin recuperou a compostura

e estendeu a Alex seu prato e depois a Nathan o seu.

—por que me colocou só uma bolacha? —perguntou Nathan, observando os pratos de Colin e da Alexandra,

cada um deles com quatro bolachas.

—Porque tiveste a ousadia de comer todos meus mazapanes. Há países em que se declararam guerras por

menos que isso.

Nathan lançou-lhe um olhar furioso.

—Só por isso, tenho vontades de não te dar o presente que te trouxe.

— Certo. Porque te conhecendo e sabendo sua afeição por aceitar todo tipo de animais em sua casa,

certamente seu presente tem que ver com latidos, miados, grasnidos ou mugidos de algum tipo.

A expressão do Nathan tornou-se inocente, muito inocente, levantando imediatamente as suspeitas do Colin.

Mas antes que pudesse continuar a perguntar a seu irmão, Nathan voltou sua atenção a Alexandra.

— diga-me, madame, tem irmãos?

—Lamento dizer que não.

—Considere-se afortunada. Irmãs?

—Não, mas vivo com minha melhor amiga, Emma, que para mim é como uma irmã.

—E é Emma também uma adivinha?

—Não, é vendedora de laranjas —respondeu Alexandra, levantando o queixo um pouco à espera de desprezo

ante a modesta ocupação de seu amiga, mas no que respeitava a esse tema, Colin não temia pela reacção do

Nathan.

Tal como esperava, Nathan assentiu com um gesto de aprovação e disse:

—A minha mulher gosta muito de laranjas. Poderia conseguir que sua amiga viesse à mansão Wexhall para

que pudesse comprar algumas?

Alexandra vacilou e embora tentasse ocultá-la, Colin percebeu sua surpresa.

—Será um prazer.

—Estupendo. E agora, me digam, o que terei que fazer para poder ter uma sessão de cartas? Estou fascinado.

—Primeiro deve pagar a tarifa adiantado —disse Colin, desfrutando enormemente e dando de maneira

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ostentosa uma grande dentada à bolacha. Depois de tragar, prosseguiu—: Acto seguido faz uma pergunta a

madame Larchmont. Ela jogará as cartas e dirá um montão de coisas interessantes sobre ti. Esta temporada é o

que causa furor.

—Estou preparado para começar —disse Nathan, olhando seu prato vazio com o cenho franzido—. Posto que

so tivesse uma bolacha...

Quando Alexandra e Colin acabaram o chocolate e as bolachas, este chamou o Ellis para que retirasse a bandeja

de prata. Alexandra tirou do bolso um pacote de seda.

—Dada sua amabilidade de ocupar-se de minha segurança, doutor Oliver, não posso cobrar por sua sessão.

—É obvio que pode —insistiu Colin.

Dobrou a quantidade que lhe tinha cobrado, acrescentou um pouco mais e lançou a cifra a Nathan.

—A pagar adiantado — recordou.

Nathan abriu os olhos de par em par ante uma soma tão exagerada, mas obedientemente tirou o dinheiro do

bolso do colete sem dizer uma palavra e o deu a Alexandra, quem, um pouco envergonhada, o guardou.

Colin se apoltronó em sua cadeira, feliz e satisfeito por que alguém tivesse pago mais que ele e esperou.

Em lugar de baralhar as cartas, Alexandra o olhou, arqueou as sobrancelhas e disse:

—O doutor Oliver pagou por uma sessão privada, milord.

Nathan fez um sinal com a mão.

—Não tenho nenhum inconveniente em que fique. —E sorrindo abertamente acrescentou—: Sobre tudo porque

tenho toda a intenção de ficar na tua.

Alexandra inclinou a cabeça.

—Muito bem. —Depois de baralhar as cartas, disse—: Direi algo de seu passado, presente e futuro. Que deseja

saber?

Nathan meditou uns segundos.

—Quantos filhos teremos minha mulher e eu? —perguntou.

Ela assentiu e depois de fazer um corte no baralho e repartir as cartas, estudou-as durante um comprido

minuto com expressão séria.

—As cartas que representam seu passado mostram que seguiu o caminho que tinha escolhido durante muito

tempo, mas faz uns anos teve lugar um acontecimento que mudou sua vida. Algo que feriu aqueles que amava

e que fez com que... Perdesse o norte. Obrigou-o a voltar a começar. Vejo distanciamento daqueles que queria.

Foi uma época muito solitária para si. Mas finalmente encontrou o caminho de volta a casa.

Colin notou um nó no estômago ante tão acertadas palavras, e Nathan lançou –lhe um rápido olhar. Estava

claro naquele olhar que seu irmão, erroneamente, acreditava que tinha falado a Alexandra de seu passado.

—Continue —disse Nathan.

—Em seu passado recente, vejo uma enorme felicidade e uma enorme dor ao mesmo tempo. Está claro que a

felicidade obedece ao amor; ama e é correspondido. A dor obedece à perda, a perda de um filho. —Alexandra

levantou a vista e olhou a Nathan—. Seu filho.

A tensão que torturava Colin logo desapareceu e apenas pôde abafar um bufo ante afirmação tão ridícula.

Nathan não tinha filhos e sentiu que todo ele suspirava aliviado. Por um momento, quase tinha acreditado

naquelas tolices e, além disso, começou-se a zangar pelo tom sombrio que estava adquirindo a sessão. Maldita

seja, supunha-se que era um entretenimento. Não podia inventar-se coisas que fossem menos... mórbidas?

Mas ao olhar Nathan, ficou petrificado. O rosto de seu irmão tinha empalidecido visivelmente e estava olhando

intensamente a Alexandra, apertando as mãos com tanta força que podiam adivinhá-los brancos ossos dos

nódulos sob a pele.

—Siga —disse Nathan, com a voz áspera, quase rasgada.

—Seu presente está ocupado por seu matrimônio e está cheio de amor. Felicidade. E a perspectiva da

paternidade. Está enormemente preocupado pela delicada condição de sua esposa —disse, e assinalou o último

montão de cartas—, mas seu futuro indica que tudo irá bem. Não tem nada que temer. —Sorriu-lhe—. Quer

ouvir minha predição sobre se o bebê será menino ou menina?

Nathan tragou e logo assentiu.

—Uma menina. A que seguirão três filhos mais. De modo que, para responder a sua pergunta, as cartas dizem

que terá quatro filhos.

Agarrou as cartas da mesa, voltou-se para o Colin e lhe perguntou:

—Está preparado, senhor?

Mas o olhar de Colin estava centrada em seu irmão, quem, ao outro lado da mesa, remexia o cabelo com os

dedos e passava as mãos pela cara que tinha perdido toda sua cor. Os olhos do Nathan encontraram com os do

Colin e o olhar que viu neles o deixou gelado. antes que Colin pudesse lhe perguntar, Nathan assentiu

devagar.

—É certo —disse com voz suave e grave—. Vitória teve um aborto faz quatro meses. A semana passada

pudemos confirmar que está grávida de novo.

—Não... não tinha nem idéia —disse Colin olhando-o fixamente—. Sinto muito a perda que ambos sofreram.

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—Obrigado. Como não havíamos dito ainda a ninguém que estávamos esperando um bebê, pensamos que não

tinha nenhum sentido informar sobre o aborto. Tínhamos planejado dizer a todos da nova gravidez quando

estivesse mais avançada. —Logo se dirigiu a Alexandra—: Suas habilidades são... formidáveis, madame —

disse com um olhar muito sério.

—Obrigado, mas eu simplesmente interpreto o que as cartas dizem.

—Habilidosa e modesta, uma combinação formidável —disse Nathan sorrindo.

A Colin assaltou um inquietante descobrimento. Se tinha acertado com tanta precisão na leitura das cartas do

Nathan, então as graves predições que tinha feito sobre ele podiam ser também acertadas. Certamente, eram

um reflexo dos escuros pressentimentos que o tinham estado consumindo nas últimas semanas.

Obrigou-se a centrar seus pensamentos de novo na conversa e dirigindo-se a Nathan, estendeu-lhe a mão.

—Aceita minhas felicitações tanto para ti como para Vitória por sua próxima paternidade.

Nathan estreitou fortemente a mão de seu irmão entre as suas. E em um breve instante, Colin leu nos olhos do

Nathan tanto alegria como medo.

—Obrigado. Agradecia que mantivesse a notícia em segredo por agora..., tio Colin.

A Colin formou-lhe um nó de emoção na garganta e forçou uma tosse para fazê-lo desaparecer. Oxalá essa

terrível e pesada tristeza que sentia que rodeava seu futuro se evaporasse e pudesse ver nascer o filho do

Nathan. E possivelmente a seu próprio filho.

Como se tivesse lido seus pensamentos, seu irmão disse:

—eu adoraria que me devolvesse o favor e me fizesse também tio.

—Para isso estou aqui. Para encontrar uma prometida e fazer que isso ocorra.

antes que seja muito tarde, pensou.

—Possivelmente madame Larchmont possa te dizer quem será sua futura noiva.

—Tenho-lhe feito essa pergunta em particular durante minhas duas sessões anteriores, mas até agora só pôde

adivinhar que a dama aparentemente tem o cabelo escuro.

—Se recordar, milord —disse ela—, disse que sua prometida era uma mulher morena só a pedido seu e em

benefício de lady Newtrebble. Não vi nada nas cartas sobre sua futura esposa.

—Bom, possivelmente a leitura de hoje nos revele tudo. Estou preparado assim que o esteja, madame.

Em lugar de agarrar suas cartas, Alex o olhou fixamente.

—Dada a natureza de minhas predições anteriores, possivelmente seria melhor se reprogramássemos nossa

entrevista.

—Agradeço sua discrição —disse Colin negando com a cabeça—, mas prefiro que esteja Nathan aqui.

—Houve algum problema em suas sessões anteriores? —perguntou Nathan agudizando o olhar.

—Temo-me que não estavam cheias de brilhantes predições sobre meu futuro. Esperamos melhores resultados

esta vez. —E dirigindo-se a Alexandra disse—: Comecemos.

—Como deseje, senhor.

Procurou em outro bolso e tirou um novo baralho de cartas, menor. Depois de baralhar e cortar, repartiu-as

lentamente e as estendeu seguindo um processo diferente ao que tinha utilizado em anteriores ocasiões.

Depois de estudar as cartas atentamente, olhou Colin com uns olhos cheios de preocupação.

—Lamento-o mas vejo as mesmas coisas que em nossas duas sessões prévias: a morte e a traição têm uma

presença ainda mais forte que antes, tanto em seu passado como em seu futuro. Parece ser que a traição em seu

passado está relacionado com a do futuro.

Alexandra voltou a olhar as cartas e franziu o cenho com mais intensidade.

—A luta interior que vi antes é agora mais profunda. Está sentindo uma enorme confusão e um grande

conflito, mas há também uma crescente sensação de urgência, o temor de que há coisas que não poderá levar a

cabo, responsabilidades não cumpridas.

A exactidão de suas palavras fez que os músculos do Colin ficassem em tensão e sentiu todo seu corpo

estremecer-se. A intensidade de sua voz e de seus olhos o mantinha hipnotizado.

—E o que há da mulher de cabelo escuro que tinha visto, madame? —perguntou.

Alexandra duvidou e logo assinalou as cartas.

—Ainda está aí, mais perto de si que antes. De facto, é sua posição o que mais me preocupa.

—O que quer dizer?

Elevou a vista e seus olhares se encontraram. Vacilou e mostrou-se claramente alarmada.

—Sua carta —disse finalmente— permanece no centro do perigo e do engano, e é a única que se situa entre sua

carta e a carta da morte. O que significa que ou o salvará O...

—Matará-me? —sugeriu Colin mantendo um tom frívolo.

Mas a expressão da Alexandra permaneceu completamente séria.

—Sim.

—E o que tem com minha futura esposa?

—Como nas sessões anteriores, sinto muito, mas não vejo nenhuma referência a ela, milord.

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Colin percorreu com seu olhar o rosto da Alexandra, detendo-se em seus olhos sérios e em seus carnudos

lábios, em seus compridos e brilhantes cachos que caíam em espiral até lhe chegarem à altura dos ombros.

Eram cachos largos e brilhantes de escuro cabelo, e Colin soube de repente e com uma segurança esmagadora

fora de toda dúvida.

Ela era a mulher de escuro cabelo.

Capítulo XII

Alex olhou a Colin através do amplo espaço de sua luxuosa carruagem e, pela décima segunda vez desde que

tinham saído de sua casa, perguntou-se no que estava pensando. Tinha estado preocupado desde que lhe leu

as cartas e silencioso durante o trajecto em direção ao apartamento onde ela se alojava.

Estava pensando ele, ao igual a ela, no beijo que deram? No que teria acontecido senão tivessem sido

interrompidos? Desejava desesperadamente acreditar que teria recuperado a prudência, que teria emerso do

mundo

sensual no que se perdeu sem a necessidade da chamada à porta, mas não tinha sentido alimentar uma mentira

tão óbvia.

Aquela surpreendentemente deliciosa sensação da mão dele sob sua saia, o calor da palma de sua mão tocando

as nádegas... nunca poderia ter imaginado algo tão excitante. Só pensá-lo despertava aquele insistente latejar

entre suas pernas.

Os pensamentos de Alex se viram interrompidos quando chegaram ao edifício em que vivia. Colin e seu criado

a acompanharam acima. Enquanto guardava seus exíguas pertences em uma mala de couro gasto, chegou

Emma. depois de uma rápida apresentação, explicou o plano a sua amiga, cujos olhos azuis lançavam

alternativamente olhares de desconfiança a lorde Sutton e olhares de pura admiração ao alto e arrumado jovem

criado.

—Tenho que a deixar —disse Alexandra a Emma, retorcendo as mãos—, mas se trouxesse aqui o perigo, a ti,

aos meninos, nunca me poderia perdoar isso —

Emma agarrou-lhe as mãos e as apertou brandamente para impedir que Alexandra as seguisse movendo com

nervosismo.

—Não se preocupe com nada, Alex, eu me ocuparei dos meninos e da comida. O mais importante é que esteja a

salvo. —E lançando um olhar carrancudo a Colin acrescentou—: a salvo de tudo.

—Minha intenção é mantê-la a salvo, senhorita Bagwell —disse Colin com uma inclinação de cabeça.

—Estou certa disso. —Emma levantou o queixo—. Simplesmente me pergunto se é essa sua única intenção.

Alex deu um coice surpreendida ante as insinuações inequívocas de seu amiga e seu tom furioso. Antes que

pudesse dizer uma palavra, Colin falou:

—Não sofrerá nenhum dano, senhorita Bagwell.

—Procure que assim seja —disse Emma duramente—. Por parte de ninguém, incluído o senhor.

—Emma... —disse Alex.

—Protegerei-a com minha vida —disse Colin devagar, olhando Emma fixamente—, e agradeço suas palavras.

Admiro a sinceridade. Alexandra é afortunada por ter uma amiga tão leal e firme.

—Eu sou a afortunada por tê-la a ela —disse Emma, entreabrindo os olhos—. Não há ninguém melhor que ela

e não quero que lhe façam mal, de nenhum modo.

—Então estamos totalmente de acordo.

Fez-se um incômodo silêncio. Alex olhou a Colin, um aristocrata atractivo, rico e culto, de porte e linhagem

impecáveis, vestido com as melhores roupas, alí, em seu humilde casa, de pé sobre o grosseiro chão de madeira

coberto por um tapete feito à mão que ela mesma tinha confeccionado com recortes de tecido. Notou que lhe

subia pela garganta uma risada seca e amarga ante tão incongruente cena, o aviso mordaz e penetrante de

quem e o que era ela. E de quem e o que era ele.

E como essas duas realidades nunca foram ou poderiam, de modo algum, convergir.

Esclareceu a garganta e disse ao Colin:

—Já tenho tudo na mala, mas eu gostaria de dispor de uns minutos a sós com a Emma, por favor.

—Esperarei-a no carro —disse ele assentindo.

O criado tomou a mala e o seguiu para fora do quarto.

No momento em que a porta se fechou atrás deles, Emma deixou escapar um comprido suspiro e começou a

abanar-se com a mão.

—Maldita seja, acredito que vou ter um sufoco. Não é o homem mais atraente que viu em sua vida?

Sem poder conter-se, Alex deixou escapar um suspiro como o da Emma e com muita dificuldade conseguiu

evitar abanar-se com a mão.

—Sim —corroborou desejando fervientemente não fazê-lo—. É o homem mais bonito que já vi.

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—Só me olhando fiquei sem respiração. Deixou-me petrificada, sem fala.

—Sim, sei exactamente a que te referes. Mas me pareceste tão franca como sempre.

—OH, é obvio, falando com o tipo elegante esse sim, mas não com ele. —E pronunciou a última palavra com

uma veneração que Alex nunca lhe tinha ouvido nunca antes—. E falando desse tipo elegante... —Emma se

calou de repente e abriu os olhos de par em par—. O que?Era ele de quem estava falando agora mesmo?

Alex, confundida, piscou. Estava claro que Emma e ela tinham tido um diálogo de tolos e, como não tinha

sentido algum negar a afirmação da Emma, assentiu.

—Mas seu criado é realmente atraente —acrescentou, embora, Deus Santo, apenas se tinha fixado nele.

Alex notou como a cortina que servia para dividir o quarto se movia ligeiramente e, ao dar a volta, pôde ver

por um instante uma cara suja que se escondia de novo por trás da cortina.

—Vem aqui, Robbie —disse.

Uns segundos mais tarde, o menino saiu arrastando os pés. deteve-se frente a Alex e disse rapidamente:

—Esse era o tipo do que lhe falei, que esteve aqui antes.

—Sim, e falei com ele disso. Não voltará a vir sem convite. Imagino que ouviste tudo, verdade?

Assentiu e levantou a vista olhando-a com uns olhos que reflectiam que estava receoso e claramente ofendido.

—Deveria me haver dito que estava em perigo, senhorita Alex. Eu a teria protegido.

A Alex encolheu-lhe o coração, agachou-se e pôs as mãos sobre os magros ombros do pequeno.

—Sei. E faria um estupendo trabalho. Mas não posso me arriscar a que alguém te faça mal a ti, a Emma ou a

outros. Necessito que vigie os outros e a Emma também. Poderá fazer isso por mim?

Franziu o cenho, assentiu sacudindo a cabeça e logo disse em tom acusador:

—ia partir sem me dizer adeus.

—Robbie, não vou partir. Simplesmente vou estar em outra parte de Londres por um tempo.

—O sítio onde vive o tipo esse rico —disse com a voz cheia de amargura e o queixo tremente—. Se acostumará

à boa vida e se esquecerá de nós.

Meu Deus, esse menino lançava os dardos directamente ao coração. Alex tomou sua pequena e suja cara entre

as mãos e disse:

—Nunca poderia me esquecer de ti, nem da Emma, nem de outros. Penso em vós constantemente. Sempre

estão aqui... —ficou a mão no coração—. dentro de mim. São parte de mim. Só estarei fora uns dias. Quando

voltar, tomaremos um prato inteiro de bolachas, só tu, eu e Emma, e te contarei tudo o que se passou.

—Prometido?

—Prometido.

Robbie, respirou fundo e aparatosamente, e depois lançou-se nos braços de Alex rodeando-lhe o pescoço com

seus bracinhos. Alex abraçou-o com força, saboreando a sensação pois não era um menino pródigo em

amostras de carinho. Em seguida afastou-se e ela deixou.

—Agora toma a laranja e a sai —disse - puxando-lhe brandamente o queixo.

O menino correu até á mesa onde havia um montão extra de laranjas e agarrou a de em cima de todas. Depois

foi caminhando até a porta, abriu-a e partiu após deitar uma última olhada por cima do ombro e fazer uma

saudação de despedida.

Quando a porta se fechou, Alex e Emma intercambiaram um olhar.

—Cuidarei dele, Alex.

—Sei.

—E falando do tal lorde Sutton... esteve aqui hoje?

—Sim.

—Assim sabe que não está casada. —O olhar da Emma estava carregada de preocupação—. Vi como te olhava,

Alex. Como se fosses um saboroso pedaço de pão e ele um homem morto de fome.

Deveria haver-se sentido consternada e, entretanto, seu coração deu um salto de emoção.

—Sabe que um homem como ele se limitaria a tomar e te abandonar, o mais provável com seu filho no ventre.

—Um homem como ele?

—Um tipo elegante —disse Emma depois de um bufo de exasperação—. Seu prazer é primeiro. Toma atenção

às minhas palavras, está acostumado a obter o que quer, sem lhe importar o que possa acontecer aos outros, e

quer-te a ti.

—Estou de acordo contigo em que muita gente da alta sociedade é assim, mas ele tem algo mais. Muito mais —

disse Alex suspirando muito fundo e perguntou—: O que acontece digo-te é que eu também o quero a ele?

Emma franziu o cenho considerando a possibilidade com Caridade.

—Sabe que te romperá o coração —disse finalmente.

—Sim.

—Bom, então suponho que deve decidir se merece a pena a dor que padecerás quando te lançar ao lixo como

se fosses as sobras do dia anterior. Porque sabes que isso é o que fará.

—Sim, sei —disse Emma assentindo e fazendo uma careta de dor ante a idéia.

—Em meu caso, eu estaria aterrorizada ante um tipo elegante como esse. Esses ricaços são tipos estranhos. Mas

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se, seu criado me fizesse um sinal com o dedo, seria incapaz de resistir, ou não quereria. E posto que trabalha

em uma casa elegante, não tenhas a menor duvida de que também me lançaria ao lixo como se fosse as sobras

de ontem, e, só o estou supondo, acredito que mereceria a pena que me rompesse o coração. —Emma apertou a

mão de Alex—. Faz o que acreditas que é melhor para ti. Sabes que eu te quererei aconteça o que acontecer e

que quando se tiver ido, ajudarei-te a te recuperar.

Alex sentiu que um estremecimento de feroz e poderoso amor lhe percorria o corpo e abraçou Emma.

—Obrigado. Agora o que queria te dizer...

Rapidamente deu a Emma a direcção da casa do Wexhall e lhe explicou o desejo do doutor Oliver de comprar

laranjas para sua esposa.

—Vem amanhã, se trouxer a mochila para o Jack, eu a entregarei.

—Ali estarei, com montões de laranjas e não te preocupe pelo Jack. Posso me ocupar de sua entrega até que

volte para casa.

Alex começou a caminhar de um lado a outro; não podia estar quieta.

—Mas te deixo com toda a cozinha, os meninos, e o que passará com suas lições de escritura e de leitura?

—Tudo estará aqui quando voltar. Do único que tem que preocupar-se é de sua segurança. —E com os olhos

brilhantes acrescentou—: E possivelmente do modo de conseguir que me encontre com o criado de seu tipo

elegante.

Apesar de suas preocupações, Alex sorriu.

—Verei o que posso fazer.

Duas horas mais tarde, Alex estava na mansão Wexhall, em um quarto no que nunca teria imaginado que

dormiria. A bela esposa do doutor Oliver, tão elegante como impressionante, lady Vitória, tinha-a

acompanhado até alí, fazia um quarto de hora e antes de partir tinha dito a Alex que o jantar se servia às oito.

Mas desde que Alex ficou sozinha, quão único tinha podido fazer era olhar boquiaberta em seu redor. Lady

Vitória se referiu ao quarto «o quarto do jardim», e com razão. A combinação da cor verde, acentuada por um

grosso tapete de cor da erva debruado por folhas entrelaçadas com flores de cores, fazia que Alex se sentisse

como se estivesse em meio de um florido prado.

Caminhou devagar pelo perímetro do quarto e passou as gemas dos dedos pelas paredes de sedosa textura e

de uma cor verde mais pálida que o tapete, admirando o conjunto de quadros de flores com molduras

douradas. Na mesinha de cabeçeira havia uma jarra de cristal com um extravagante ramo de rosas de cor rosa

pálido que enchiam o ar de um delicado aroma floral.

Posou o olhar no formoso leito e seus pés a levaram para ele, como se estivesse em transe. A cama parecia tão

grande e tão incrivelmente suave e tentadora como uma nuvem de cetim verde. Não pôde evitar deslizar a

mão pela bonita colcha e pelos travesseiros com trabalhadas borlas. Deu-se conta de que estava olhando por

cima de seu ombro, sem poder afastar a sensação de que em qualquer momento alguém ia entrar bruscamente

no quarto e ordenar que partisse desse dormitório de sonho.

Sentou-se cuidadosamente no bordo do colchão e deu um saltito a modo de prova. Ante a deliciosa sensação,

não pôde evitar que de seus lábios escapasse uma rápida gargalhada de júbilo e assombro. Jogou um olhar de

novo para assegurar-se de que não ia ser expulsa, e estendeu-se, com cuidado, para não enrugar a colcha.

Ao afundar-se na suavidade, fechou os olhos e deixou escapar um comprido suspiro de prazer. Com toda

certeza, assim deviam ser as esponjosas nuvens. Nunca em sua vida tinha descansado sobrealgo tão cômodo.

Quantas vezes tinha sonhado dormir em uma cama assim, em um quarto assim? mais das que podia contar:

cada uma das desventuradas noites que tinha passado acurrucada em portais ou escondendo-se detrás de

montões de lixo, sofrendo a chuva ou o frio ou o opressivo calor, embora, para falar a verdade, realmente

sempre tinha desejado a chegada do verão para livrar-se desse frio que continuamente parecia ter metido nos

ossos. Algumas vezes tinha dormido a coberto, mas aqueles quartos sempre eram lugares escuros, sujos e

fedorentos onde se apinhavam outros como ela. Nunca esqueceria o dia em que tinha roubado suficiente

dinheiro para permitir um tecto sólido, embora com goteiras, sobre sua cabeça.

Alex se deu conta de que era melhor que se levantasse antes de que acabasse decidindo que não queria voltar a

fazê-lo, assim deixou a confortável cama e dirigiu-se para as janelas que ocupavam a parede posterior, através

dos quais entravam inclinados os dourados raios do sol. Para sua delícia, viu que as janelas se abriam para um

terraço. Saiu e, uma vez fora, sorriu quando o ar alvoroçou o cabelo. inclinou-se a olhar o pequeno jardim

rodeado de um muro de pedra e de elevados sebes perfeitamente cortados, incapaz de acreditar que era uma

autêntica convidada, um hóspede, e não alguém que cobrava para entreter aos assistentes das festas.

Que Deus a ajudasse, não estava certa de se estava emocionada ou intimidada. Durante as horas que duravam

as noitadas de sociedade nas quais trabalhava, era capaz, fazendo um esforço, de não ficar embevecida ante o

luxo que a rodeava. Mas aquilo... ser uma convidada naquele elegante lar onde todo mundo atuava com as

mais impecáveis maneiras… Seria ela capaz de comportar-se sem fazer ridículo? Não revelaria seu vergonhoso

passado? depois de tantos anos observando e escutando cuidadosamente os mais ricos, absorvendo seu estilo

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de conversar e suas maneiras como uma esponja, havia-se sentido suficientemente segura para adoptar a

personalidade de madame Larchmont e explorar seu talento como leitora de cartas. Tinha a determinação de

deixar de roubar, de encaminhar a sua vida de modo a deixar de agarrar as coisas que pertenciam a outros.

Podia ser queos ricos que roubava não merecessem todas as coisas bonitas e todo seu dinheiro, mas ela os

roubava e isso a convertia em tão pouco merecedora dos objectos como qualquer.

Mas apesar de seus obtidas dotes para a interpretação e do facto de que já não roubava, não era um deles. Não

era uma dama e nunca o seria. E então, aí em meio de toda aquela elegância, sentiu-se tão deslocada como

tinha estado Colin pouco antes na casa dela. A estadia naquela distinta mansão com seus serviçais e sua grande

quantidade de comida e suas elegantes posses era meramente temporária, e devia o recordar.

Do mesmo modo que devia recordar que deixar que a relação pessoal com o Colin seguisse em frente só teria

como resultado seu sofrimento. Embora voltar a beijá-lo era incrivelmente apetecível, era uma tentação a que

tinha que resistir. Não havia lugar para isso em sua vida e devia esquecer aquela atracção impossível que

sentia para ele. Para estar tranqüila. Uma relação amorosa com ele punha em perigo sua reputação e por

conseguinte tudo pelo que tinha lutado com tanto afinco. Não merecia a pena correr esse risco por umas horas

de prazer.

Uma vez teve tomado esta resolução, Alexandra voltou dentro e acabou de explorar o quarto. Descobriu com

vergonha que seus modestos trajes estavam já pendurados no armário, algo que sem dúvida se teria

encarregado alguma criada. Passou de sentir-se envergonhada a sentir-se intimidada: uma criada cuidando

dela! Quando o dissesse a Emma...

Negando com a cabeça, dirigiu-se a uma pequena secretária de estilo feminino que havia em uma esquina e

sentou-se cuidadosamente na delicada cadeira. depois de uma breve vacilação, tirou as cartas do bolso de seu

traje e olhou o baralho envolto em seda, dividida entre seu desejo de ler a si mesmo as cartas e a confusão que

lhe produzia fazê-lo.

Nunca antes tinha tido medo de lê-las , mas naquele momento tinha pavor a ver algo que não queria ver. Mas

devia sabê-lo...

Tomou ar com energia, abriu o pacote de seda e depois de baralhar e cortar, deu a volta às cartas lentamente.

Quando acabou, olhou fixamente. Depois, começou a tremer.

Tudo estava ali... Suas cartas eram quase idênticas às que tinham saído a Colin. Mostravam traição, engano,

morte e todo isso girava ao redor do homem de cabelo escuro, o mesmo homem de cabelo escuro que tinha

destacado de maneira proeminente em suas cartas durante anos. E no centro de tudo, uma mulher de cabelo

escuro.

O facto de que suas cartas se parecessem tanto às do Colin não podia ser uma mera coincidência. Mas as duas

perguntas que aquele fenômeno lhe sugeriam faziam que seu coração palpitasse ao lento e duro compasso do

terror. Era possível que o horror que rodeava a Colin significasse que ele era a pretendida vítima da festa de

lorde Wexhall?

E era possível que fosse ela a mulher de escuro cabelo?

Depois de deixar Alexandra na mansão Wexhall em mãos da hábil Vitória, Colin chegou a sua casa e dirigiu-se

ao salão, onde fez uma visita a seu contrabando secreto de mazapanes. Escolheu um que parecia uma perfeita

miniatura de laranja e depois sentou-se com o prêmio em sua poltrona preferida. Estava a ponto de dar a

primeira dentada quando bateram na porta.

—Adiante, Ellis —disse quase sem poder dissimular sua irritação.

A porta se abriu e entrou Ellis.

—O doutor Nathan está aqui, milord. Está o senhor em casa?

—Sim, está em casa? —ouviu-se a voz do Nathan justamente por detrás de Ellis.

O mordomo deu um coice.

—Estou em casa, Ellis, obrigado.

Nathan entrou e, dando grandes passadas, atravessou a sala e se sentou em frente dele. Estava a ponto de dizer

algo quando se deteve e farejou o ar.

—Cheiro a mazapán.

—Sim, estou certo disso.

Colin mostrou a laranja, levantou-a no ar e, deleitando-se, deu-lhe uma lenta dentada comendo metade.

—Tinha-me parecido entender que tinha acabado o último.

—Menti.

—Onde estão?

—Nem a mais atroz das torturas poderia tirar-me essa informação. diz, por que estás aqui de novo? Verei-te

dentro de uma hora no jantar.

—Por várias razões. Primeiro, encontraste o presente que te trouxe?

—Não, algo com que me sinto aliviado mas receoso. E o que queres dizer com o de «encontrado»? por que não

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me dás isso simplesmente e damos o tema por resolvido?

—Assim é mais divertido —disse Nathan com um meio sorriso na comissura dos lábios.

—Para ti, sim. Como saberei que encontrei» o presente?

—OH, confia em mim. Saberás.

—Infelizmente, isso é o que temo. O que outras razões tens para franquear de novo minha porta?

— Como antes tinha uma convidada, não tivemos oportunidade de ter a conversa privada que tinha-me me

trazido até aqui, e não quero arriscar a que nos interrompam em casa do Wexhall esta noite. É uma conversa

que pretendia ter contigo justamente depois que me falas-te dessa madame Larchmont.

Colin meteu a outra metade do mazapán na boca e tomou seu tempo mastigando-o, enquanto procurava não

reflectir expressão alguma no rosto. depois de engolir, perguntou:

—O que queres saber?

—Tudo.

—O que te faz pensar que há algo que contar?

—O facto de que a beijasse é um indício bastante evidente.

Maldito seja. Por que tinha que ser seu irmão tão diabolicamente observador?

—O que te faz pensar que a beijei?

— Visto que eu mesmo sei beijar de maneira excelente, segundo minha esposa, conheço o olhar de uma mulher

a que beijaram bem e o olhar de madame Larchmont o delatava completamente. Está claro que não me vais

facilitar nenhuma informação voluntariamente, assim que estou obrigado a perguntar. É viúva ou

simplesmente pretende estar casada?

—O que te faz pensar que não está casada?

—Conheço-te e sei que não é o tipo de homem que brincaria com a mulher de outro homem.

Maldito seja. Nathan sempre pensava o melhor dele; nunca duvidava de sua honra ou de sua integridade e isso

o intimidava.

—Obrigado pelo voto de confiança —disse com calma—. Deus sabe que é mais do que mereço.

—Se disser isso uma vez mais, juro-te que vou começar a te lançar ovos de novo —replicou Nathan com

suavidade— Assim, é viúva ou faz ver que está casada?

—Pretende estar casada.

—O pretendido marido permite-lhe estar a salvo, segura e com a liberdade que não teria se não estivesse

casada ou inclusive se fosse viúva. Está claro que é muito inteligente.

—Sim, é-o.

—E obviamente está apaixonada por ti. Um sentimento que, eu que te conheço muito bem, suspeito que é

recíproco.

Uma atadura, isso é o que teria que lhe pôr nos olhos a seu excessivamente observador irmão. Uma maldita

atadura.

—Não posso negar que a encontro atractiva.

—Parece-me que é algo mais complicado e isso não casa bem com teus planos de procurar esposa.

—Não.

—Assim, queres contar tudo sobre ela ou preferes começar explicando as razões que há por trás de sua

repentina decisão de contrair matrimônio?

—Pensava que tínhamos acordado manter esta conversa amanhã durante o café da manhã.

—Assim é, mas já que agora desfrutamos de um momento de intimidade, tenhamo-la agora.

Seus sentimentos com respeito a Alexandra eram tão conflitivos que optou por atrasar a conversação sobre ela

o mais tempo possível. Inclinando-se para diante e apoiando os cotovelos sobre os joelhos, contou- tudo ao

Nathan: seus recorrentes pesadelos nos que se encontrava apanhado em um espaço escuro e estreito sabendo

que a morte estava perto; a crescente sensação de fatalidade, de que o tempo se acabava; a certeza instintiva e

inexplicável de que algo mau ia ocorrer lhe.

—E o que se passa com esses sentimentos agora que está em Londres? —perguntou-lhe Nathan quando teve

terminado sua explicação e depois de o escutar atentamente.

—São mais fortes, mas isso poderia dever-se simplesmente às visitas que tenho feito a zonas pouco seguras

enquanto seguia madame Larchmont.

Colin passou as mãos pelo rosto.

—Espero que tudo isto seja simplesmente um transtorno porque agora tenho os mesmos anos que tinha nossa

mãe quando morreu.

—E pensas que teu destino é também morrer jovem?

—É algo no que nunca me tinha parado a pensar, mas desde que começaram os pesadelos e caí na conta de que

tinha a mesma idade, por ridículo que pareça, não pude mais tirar a idéia da cabeça.

—Eu não acredito que seja ridículo —replicou Nathan—. É um transtorno que vi em alguns pacientes. O medo

à morte começa a manifestar-se quando se aproxima da idade em que morreu algum progenitor, algum irmão

ou algum ser querido e, infelizmente, não desaparece de todo até que chega o seguinte aniversário. —E

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continuou—: Em teu caso, entretanto, conhecendo teu agudo instinto, inclino-me a pensar que tua intuição a

respeito de um iminente perigo é acertada. A questão é, que tipo de perigo te espera? Perigo físico real? Ou um

pouco mais benigno?

—Como?

—Dado que está procurando esposa —disse Nathan encolhendo os ombros— possivelmente o perigo que corre

é que te rompam o coração.

—Extremamente improvável, já que não tenho planejado casar por amor.

—Sendo como sou alguém a quem a recente imersão no amor o agarrou totalmente por surpresa, sinto a

necessidade de te advertir que, no referente ao coração, os planos, invariavelmente, torcem-se.

As palavras do Nathan causaram a Colin uma inquietação que se negava a analisar em profundidade e,

incapaz de seguir sentado, levantou-se e começou a passear ao longo do tapete frente ao fogo.

—Os pesadelos giram ao redor de um perigo físico, e sobre esse perigo me adverte meu instinto.

—É isso também o que indicava sua sessão de cartas hoje e, por isso pude entender, também suas duas sessões

anteriores.

Colin franziu o cenho.

—Sim, devo admitir que anteriormente não tinha concedido credibilidade às predições de madame Larchmont,

mas está claro que o que disse de ti resultou ser certo.

—Inquietante e certo. Explicaste algo a ela dos acontecimentos de há quatro anos?

—Não, nada.

—O que simplesmente faz com que o que me disse seja mais inquietante.

—Embora esteja totalmente perdido na hora de explicar ou de entender o talento que possui, não posso seguir

desprezando suas predições, especialmente quando reflectem de maneira tão certeira minha própria sensação

de perigo...

A voz do Colin se foi apagando e ficou quieto ao lhe assaltar um pensamento. Olhou a Nathan.

—Pergunto-me... —começou a dizer.

—O que? —inquiriu Nathan.

—Wexhall tinha sofrido um ataque, assim pensamos que ele era a suposta vítima. Mas consideremos que eu

notei o perigo e que a inquietante e certeira madame Larchmont fez essa mesma predição. Acrescentemos a

isso que ouviu um plano no que uma pessoa de certo estatuto, tal como se poderia descrever um lorde, vai ser

assassinado. E esse crime vai ter lugar em casa do homem ao que eu estava acostumado a informar, em uma

festa a que eu tenho programado assistir. Além disso, estou relacionado com todos os nomes da lista de

pessoas que estavam perto de madame Larchmont quando ouviu essa voz a passada noite. Pode ser todo isso

mera coincidência?

—Não acredito muito nas coincidências —disse Nathan incorporando-se na cadeira.

—Eu tampouco.

—Estás pensando que poderias ser o objectivo na festa do Wexhall?

—Penso que é possível, sim. E tu?

—Tendo em conta todas essas coincidências, acredito que é uma hipótese que não devemos descartar

alegremente. Mas por que ia querer alguém te ver morto?

— Pensa no que te aconteceu faz somente nove meses, e acredito que não deverias fazer essa pergunta.

Olhou fixamente seu irmão e viu o brilho em seus olhos ao compreender que tinha razão.

—Pensa que algo ou alguém de teu passado retornou para te atormentar.

—O tipo de actividades que desempenhei para a Coroa podem ter feito que alguém não me tenha em grande

consideração —disse Colin.

—Tens alguma teoria?

—Ainda não, logo terei oportunidade de pensar nisso.

—Alguma razão pela que algum dos nomes da lista, que me mostras-te te queira ver morto?

—Não estou certo. Qual foi a reacção de Wexhall quando viu lista, Nathan?

—Ainda não o fiz. Wexhall estava fora.

Colin cruzou a sala e dirigiu-se á secretária de onde agarrou a parte de papel cor marfim onde tinha escrito os

nomes que Alexandra lhe tinha ditado. Passou o olhar pela lista.

— Nestes últimos anos ganhei ao Barnes às cartas —disse—, recusei educadamente uma proposta amorosa da

mulher de Carver, tive uma aventura com a filha viúva do Mallory, e tomei uma decisão negativa com respeito

à aquisição de um quadro do Surringham. Fui com o Ralstrom e Whitemore às corridas faz dois anos e os

deixei em branco. Mais recentemente, arruinei as expectativas de lady Whitemore de que me case com sua

filha, lady Alicia. Tanto lady Miranda como lady Margaret parecem ter interesse em mim e estão encantadas

comigo. Respeito ao Jennsen, acabam-me de o apresentar.

—Nada disso parece muito ameaçador.

—Não, não o parece. Seguirei pensando nisso e possivelmente me ocorra algo mais. E pode ser que Wexhall

seja capaz de lançar um pouco de luz.

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— Podes ter a certeza —disse Nathan assentindo— que se tu fores realmente o alvo, Wexhall e eu faremos tudo

o que esteja em nossas mãos para nos assegurarmos de que não sofras qualquer mal.

—Obrigado. Nem madame Larchmont.

—Sim. —O olhar do Nathan tornou-se interrogativa—. Estás preparado para me falar dela?

—O que é exactamente que queres saber?

—Tudo. Ou pelo menos tudo o que estejas disposto a me contar. Como se conheceram?

—Apresentaram-nos na noite dos Malloran —disse Colin depois de duvidar um instante.

Era absolutamente certo, mas ao mesmo tempo era um engano e se sentiu mal por mentir a seu irmão.

—O que me surpreende ainda mais —disse Nathan arqueando as sobrancelhas—. A conheces apenas há uns

dias, mas está claro que te importa.

—E isso diz um homem que declarou-se a uma mulher que tinha conhecido apenas uma semana antes.

—Falso. Como sabes muito bem, tinha conhecido a Vitória anos antes aqui em Londres.

—Sim, em uma ocasião. Mas demorou três anos para a voltares a ver. —passou os dedos pelo cabelo ao dar-se

conta das coincidências entre sua situação e a do Nathan—. E queres saber mais, eu conheci madame

Larchmont nessa mesma viagem a Londres, mas não voltei a vê-la até á noite dos Malloran.

—Acreditava que tinhas dito que os acabavam de apresentar.

—Assim é. Não nos apresentaram faz quatro anos.

—Ah. Simplesmente a admirou de longe?

—Um pouco parecido.

—Então, aquele viajem a Londres foi realmente definitiva para ambos. Onde a viu?

Colin apoiou as mãos no suporte da chaminé e apertou o frio mármore branco, olhando fixamente as brasas

que brilhavam intensamente.

—Wauxhall —respondeu.

depois de um comprido silencio, Nathan perguntou:

—Estava jogando as cartas?

Colin seguiu olhando fixamente o fogo e finalmente deu a volta e olhou Nathan.

—Não, apanhei-a quando me tentava roubar.

sentiu-se súbitamente esgotado e sentou-se apoiando os cotovelos nos joelhos separados. Deu uma palmada

com as mãos.

—Apanhei-a com as mãos na massa, mas só porque a habilidade do furto era-me muito familiar -. Era boa e

esteve a ponto de me deixar sem o relógio de ouro do avô. Foi bastante chocante vê-la no salão dos Malloran.

—Reconheceu-a?

—Vividamente.

Colin explicou a Nathan como lhe tinha parecido que ela o reconhecia, como a tinha procurado, e suas

primeiras suspeitas quando a viu pela primeira vez na noite nos Malloran, como tinha simulado não

reconhecê-la e o que tinha descoberto ao ir investigar o seu apartamento.

—Imagino que esses meninos a que ajuda —concluiu— levam o mesmo tipo de vida que ela teve em menina.

—Falou-te da sua infância?

—Não, e nunca lhe perguntei. Ainda. Mas não tenho nenhuma dúvida de que foi dura.

Notou um nó no estômago. Sentiu lástima e raiva por ela, pelos horrores que teve que enfrentar.

— Acreditas que o seu trabalho de adivinha é um mero estratagema para ter acesso aos lares dos ricos? —

perguntou Nathan acentuando suas palavras.

—Não —disse Colin sem vacilar—. Admito que ao princípio pensei nessa possibilidade, mas não o acredito de

uma mulher que ajuda esses meninos.

—Seria-lhes de muita mais ajuda utilizando as lucros ilícitamente sustraídas em todas essas noites elegantes.

—Certo, mas, de todos os modos, não acredito.

—Esses meninos que se supõe que está ajudando também poderiam roubar para ela, e tu poderias ser a vítima

de uma montagem perfeitamente tramada para ganhar sua compaixão.

—É possível, mas de novo, não acredito. Meu instinto me diz que é sincera e que já não é uma ladra.

Nathan o estudou bastante no momento, e Colin quase podia ouvir o torvelinho que provocava as voltas que

dava a cabeça de seu irmão.

—Não é que não respeite enormemente teu instinto —disse Nathan finalmente em voz baixa—, mas dado que

apenas a conheces, vejo-me obrigado a te perguntar: estás dando a tua confiança a esta mulher porque

genuinamente a merece ou por algum inapropriado sentimento de culpa?

Não queria tirar falsas conclusões mas ao ver que Colin permanecia em silêncio, Nathan continuou:

—Por favor, diz-me que não estás simplesmente empenhado em confiar nela, aconteça o que acontecer, para

remediar o que tu interpretas como um engano em seu passado.

—Fui injusto contigo.

—Isso terminou, é água passada.

—Sei.

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—Então, deixa-o estar. Eu o tenho feito. Acreditava que os dois o tínhamos deixado atrás.

—Temo-lo feito. Mas não quero cometer o mesmo engano outra vez. Apesar de que não sei tudo sobre ela,

sobre seu passado, minha opção é acreditar em sua história, acreditar que trocou que vida. Tudo me indica que

é sincera.

Nathan permaneceu calado durante vários minutos e depois finalmente assentiu.

—Respeitarei tua decisão.

—Obrigado.

—E reza para que não te custe a vida.

Capítulo XIII

Alex estava sentada na replecta mesa de jantar de lorde Wexhall, sob um tecto cor azul céu adornado com

gordinhos cupidos flutuando entre nuvens com penugens. sentia-se como estivesse jantando no céu. O ar

estava impregnado do saboroso aroma de deliciosa comida, e estava rodeada de serventes e do murmúrio da

educada conversação dos comensais. Colocou a mão debaixo da mesa e beliscou a sua coxa com força,

apertando os lábios para conter o grito de dor. Sim, tudo era real: o cristal cintilante e a prata reluzente; o

elaborado jogo de porcelana sobre a mesa de madeira escura a que tinham tirado tanto brilho que parecia

reluzir como o cristal; o centro de flores frescas que caía pelo lateral de um vaso de pé retangular de cristal; o

aroma a cera das dúzias de velas que banhavam a sala com o suave resplendor de sua luz dourada...

E a comida... Alexandra nunca tinha visto tal variedade e quantidade juntas. Só havia cinco pessoas mas

certamente havia suficiente comida para uma dúzia, ou possivelmente para duas dúzias de comensais. Teve

que fazer provisão de toda sua força de vontade para não agarrar fatias de presunto e de queijo e fatias de pão

e as envolver em seu guardanapo para levar às escondidas a Emma, ao Robbie e a outros. Todos os suculentos

pratos —a sopa, as ervilhas à nata, o faisão, o presunto, as cenouras guisadas— os serviam criados vestidos

com libré e com luvas de branco antigo. E cada prato ia acompanhado de um vinho delicioso que nunca antes

tinha provado.

Mas em lugar de relaxar-se e desfrutar do luxo, sentia-se tensa e com os nervos à flor de pele. Falou muito

pouco, concentrada como estava em utilizar adequadamente cada um dos talheres que lady Vitória, sentada

frente a ela, utilizava. Felizmente, pôde livrar-se de participar da conversa, já que lorde Wexhall estava

comunicativo e falador e entreteve aos comensais com divertidas anedotas de seus dias de espião. Depois, o

doutor Oliver explicou alguns contratempos de sua colecção de animais de granja. Não ajudou à concentração

de Alexandra, infelizmente, que «ele» estivesse sentado justamente do outro lado da mesa, junto a lady Vitória.

Nunca em sua vida tinha tido uma consciência tão penetrante e dolorosa da presença de outra pessoa.

Por mais que o tentava, não podia evitar que seu olhar procurasse Colin. Cada vez que acabava de estudar as

mãos de lady Vitória para assegurar-se de que estava utilizando o talher apropriado e de maneira correta, suas

pupilas errantes desviavam-se para ele e, invariavelmente, descobria que ele tinha o olhar posto nela, o que o

fazia perder ainda mais a compostura.

Seu aspecto era tão impressionante que resultava devastador. Levava um fraque em tom verde bosque que

intensificava a cor de seus olhos. Seu cabelo escuro brilhava à luz das velas e contrastava com sua camisa de

um branco níveo e seu colete prateado. Olhasse onde olhasse, seguia vendo-o com a extremidade do olho e

sentia seu olhar sobre ela. Inclusive quando se centrava no prato, descobria a si mesma levantando a vista e

olhando às escondidas, através de suas pestanas, como seus compridos e fortes dedos sujeitavam o copo de

cristal com vinhoa ou a baixela de prata.

Dentro dela ressonava o som de sua voz, o ruído surdo de sua risada, provocando-lhe diminutas descargas de

prazer que a cativavam e encantavam. Quando tirou o chapéu inclinada para diante, inclinando a cabeça em

sua direcção para ouvi-lo melhor, zangou-se consigo mesma. Que contrariedade! Era inadmissível que por

estar sentada em uma sala observando como aquele maldito homem respirava se sentisse tão imensamente

feliz.

Pelo amor de Deus, o que lhe tinha acontecido? Quando e como se tinha passado? Era como se a tivesse

enfeitiçado. Mas pelo menos ao centrar-se nele, podia evitar pensar no facto de que, apesar de levar seu melhor

traje de cor verde esmeralda, sentia-se deploravelmente torpe e terrivelmente pouco sofisticada naquele

magnífico ambiente. Uma coisa era desempenhar um papel e encaixar como uma adivinha entretida em meio

da multidão, e outra era compartilhar uma comida formal com um grupo reduzido e íntimo de aristocratas. No

dia seguinte inventaria uma desculpa para jantar em seu quarto e evitar-se esse desconforto.

—Madame Larchmont.

O som de seu nome a tirou de suas reflexões e piscando olhou através da mesa a lady Vitória, que a estava

observando com um curioso sorriso. De repente, sentiu o peso de quatro olhares posar-se sobre ela e notou que

lhe secava a garganta.

Tragou para recuperar a voz.

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—Lamento reconhecer que estava tão encantada com o jantar que perdi o fio da conversação —disse.

—Transmitirei seus cumprimentos à cozinheira —disse lady Vitória sorrindo —. Perguntava qual era sua

resposta à pergunta, visto que eu já dei a minha.

—Pergunta?

—Se pudesse descrever um lugar perfeito, como seria?

Alex não tinha que pensar. Tinha visualizado esse lugar de sonho em sua mente cada dia de sua vida desde

que era uma menina.

—O lugar perfeito para mim sempre é quente e seguro, iluminado pelos dourados raios do sol e infestado de

verdes prados onde crescem flores de várias cores. Está perto do mar e no ar respira-se uma brisa limpa e tinta

de aroma de sal. Está cheio de gente a quem quero e que me quer. É um lugar onde ninguém nunca sofre

alngum dano e onde todo mundo tem dinheiro, comida e roupa suficiente. —Por um momento pensou em não

pronunciar o último requisito mas finalmente decidiu fazê-lo e acrescentou—: E onde tenho um armário cheio

de tantos trajes formosos que cada dia demoro uma hora em decidir qual vestir.

Por um momento fez-se silêncio e Alex percebeu de novo o peso dos olhos de todos os pressente posando-se

sobre ela. Sentiu que ruborizava pensando em suas imprudentes palavras e dirigiu seu olhar a Colin, quem a

estava observando com uma expressão indecifrável.

Lady Vitória rompeu o silêncio dizendo:

—OH, certamente, sonha com um sítio perfeito.

—Não para mim —interveio o doutor Oliver—. Que demônios faria eu com um armário cheio de trajes?

— Dava-mos a mim —disse lady Vitória em um tom algo cortante—. É obvio, meu lugar perfeito tem um

montão de lojas.

—E o meu não tem nem uma só loja, nem sequer uma ópera —disse o doutor Oliver fazendo uma cômica

careta—. Não fez referência a animais de companhia, madame. Meu lugar perfeito inclui muitos animais.

—Uma omissão imperdoável —disse Alex sorrindo e obrigando-se a relaxar—. eu adoro os gatos e também os

cães.

—Meu lugar perfeito deveria incluir um brandy excelente, bons charotos e uma biblioteca onde houvesse bons

livros —disse lorde Wexhall e, dirigindo-se ao Colin, perguntou—: E o teu?

Colin levou o dedo ao queixo em atitude claramente reflexiva e depois, olhando directamente a Alex,

respondeu:

—Creston Manor, o lugar onde vivo no Cornualles, é virtualmente o lugar perfeito. Está o suficientemente

perto do mar para que o ar sempre tenha o aroma a sal e possa ouvir a música das ondas acariciando o

escarpado. Os jardins são maravilhas em flor e a terra está cheia de árvores, prados e riachos. —Em seus olhos

brilhou a malícia—. E é obvio, há um lago que está bastante frio a maior parte do ano, tal como Nathan pode

confirmar.

—E ovos, que quando se quebram são bastante asquerosos, como Colin pode confirmar —replicou Nathan.

—Sonha realmente como o lugar perfeito —disse Alex sem poder afastar o olhar do Colin.

Sentiu como se tudo o que havia na sala, coisas e pessoas, esfumaram-se e só ficassem eles dois.

—Não de todo —disse ele brandamente—. Acredito que há uma última coisa necessária para fazer que um

lugar, qualquer lugar, seja perfeito.

Não se deu conta de que estava contendo a respiração até que tentou falar.

—E qual é?

—A pessoa perfeita com quem compartilhá-lo. Estar sozinho é tão...

—Vazio? —acrescentou Alex.

—Sim —disse ele com um sorriso revoltoso nos lábios.

—Isto Põe-se que se coloque uma pergunta interessante —disse lady Vitória—. Que qualidades deveria possuir

essa pessoa perfeita para ter a honra de compartilhar nosso lugar perfeito?

—Vitória, é obvio, só tem que me olhar para conhecer a resposta a essa pergunta —disse o doutor Oliver com

exagerada satisfação fazendo que todos rissem—. E minha esposa é a pessoa perfeita para mim: é formosa,

inteligente e leal, e acredita que sou insuperavelmente brilhante.

Alex não pôde evitar dar-se conta do olhar que trocaram doutor Oliver e sua esposa, um olhar cheio de amor e

de inconfundível desejo, um olhar que lhe produziu um profundo desejo.

—Pois o que a mim respeita —disse lorde Wexhall—, a pessoa perfeita deveria ser aquela a que pudesse

ganhar nas cartas e que pudesse predizer os resultados das corridas de cavalos.

—Se tivessem que escolher só uma qualidade —interveio lady Vitória—, a qualidade que consideram mais

importante e mais admirável, qual seria? —dirigiu-se a seu marido—: A primeiro.

Nathan meditou durante uns segundos e depois disse:

—A lealdade. E tu?

—O valor.

—E a senhora, madame? —perguntou Colin.

—A compaixão —disse Alex suavemente—. E o senhor, milord?

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—A honestidade.

O coração deu-lhe um tombo. Que irônico resultava que de todas as qualidades que poderia ter escolhido

escolhesse aquela que ela tinha enterrado sob uma montanha de mentiras. Não é que importasse, é obvio.

Pensar que ela pudesse ser sua pessoa perfeita era completamente irrrsório e isso resultava muito deprimente.

Em seguida ao jantar terminar o grupo dirigiu-se ao salão, onde a conversa centrou-se nos assassinatos. Estava

claro que ou seu pai ou seu marido tinham informado lady Vitória sobre o que se estava passando já que

parecia estar muito a par da situação.

—Há algo interessante sobre um dos nomes da lista que me deu, Sutton —disse lorde Wexhall—. Whitemore...

Tinha sido um de meus melhores homens. A maior parte do seu trabalho o desenvolveu fora de Londres e se

retirou do serviço faz um par de anos. Uma pena, porque era excelente.

—por que se retirou? —perguntou Colin.

—Tinha estado trabalhando durante uma década e disse que já tinha visto e feito suficiente.

—Eu nunca lidei com ele —disse o doutor Oliver—. E tu, Colin?

—Nada relacionado com espionagem.

—É a única pessoa da lista que me chamou a atenção —disse lorde Wexhall—. Vou-me assegurar de o vigiar

amanhã na festa do Ralstrom.

Depois levantou-se e se desculpou alegando que se sentia fatigado.

Após a sua saída, lady Vitória perguntou:

— Alguém gostaria de jogar a algo? Ao julepe talvez?

antes que Alex pudesse explicar que não conhecia o jogo, Colin disse:

—De facto, tinha pensado em mostrar a madame Larchmont a galeria, se não tiverem nada que objectar.

sentiu-se avermelhar ante a inconfundível suspeita nos olhos azuis de lady Vitória, que foram de Alex ao

Colin. Igual a todo mundo, lady Vitória acreditava que Alex estava casada.

—Não tenho nada que objectar —disse lady Vitória, embora seus olhos pareceram perder algo de sua calidez—

. Isso me dará a oportunidade perfeita para ganhar ao meu marido ao blackgamon.

—Minha querida Vitória, anseio enormemente qualquer derrota que possa vir de tuas mãos.

Quando o casal se dirigiu para a mesa do blackgamon perto da janela, lorde Sutton estendeu sua mão.

—Vamos?

Alex se debatia dividida entre a necessidade de escapar da tensão que lhe causava pretender pertencer a essa

sociedade simulando conhecer elegantes jogos de salão e o temor de que estar de novo a sós com o Colin

resultaria em outro beijo.

Sentiu que aumentava sua impaciência. Por Deus! Era perfeitamente capaz de controlar-se. Se ele tentava beijá-

la, simplesmente o recusaria, com firmeza e de forma contundente. Com a decisão tomada, colocou a sua mão

enluvada sobre o braço de Colin. Notou imediatamente o calor formigando em seu braço, uma calidez que com

firmeza ignorou.

Colin tomou a mão de Alex e a acompanhou para fora da sala, conduzindo-a através de um corredor

escassamente iluminado. Andava a ritmo bastante rápido, e Alex virtualmente tinha que trotar para lhe seguir

o passo. Essa era com toda segurança a razão de que estivesse sem fôlego. Não tinha absolutamente nada que

ver com sua cercania.

—esteve calada esta noite —disse Colin.

—Sim, suponho que sim. Estava preocupada.

—por que?

Alex respirou muito fundo e depois lhe explicou sua teoria de que possivelmente fosse ele a pessoa que estava

em perigo. Quando terminou, Colin lhe disse:

—Acredito que pode ter razão. De facto, Nathan e eu estivemos discutindo essa possibilidade antes.

Meu Deus, não sabia se poderia resistir se acontecia algo com ele.

—Espero que tome cuidado.

—Terei-o.

—Também queria lhe dizer que acredito que alguém estava-me vigiando hoje.

—Quando? Onde? —perguntou Colin olhando-a com o cenho franzido.

—Esta manhã quando voltava para casa da minha entrevista com o senhor Jennsen.

—Ah, de sua sessão privada —disse Colin esticando a mandíbula.

—Sim. Não vi ninguém mas senti uma presença.

—por que não me disse isso antes?

—Varreu-se da cabeça, e não era nada, de verdade, só uma sensação que tive quando descia do seu carro.

—Acompanhou-a a casa? —Sua voz soou dura.

—Sim.

—Assim, Jennsen sabe onde vive?

—Não exactamente, o condutor deixou-me uns quarteirões mais atrás.

—Não quero que volte a sair sem que a acompanhem. É muito perigoso. Nathan ou eu mesmo a

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acompanharemos aonde tenha que ir.

— Visto que não tenho nenhuma vontade de me colocar em perigo, aceito-o.

Colin tinha declarado que a honestidade era a qualidade que mais respeitava em uma pessoa, assim Alex

decidiu ser um pouco mais honesta.

—Estava calada também porque me sentia um pouco coibida, e terrivelmente deslocada.

—Supu-lo, e essa é uma das razões pelas que pensei que desejaria escapar à galeria.

—Não quero dizer que não tenha estado gosto... —disse ruborizando-se envergonhada.

—Sei. Mas qualquer um que não esteja acostumado, a ser um convidado em uma casa como esta, se sentiria

deslocado. Eu só posso assegurar que encaixava deliciosamente.

Seguiram passeando e Alex tentou desesperadamente encontrar em seu cérebro algo que dizer que não fosse

«me beije».

—Seu irmão e lady Vitória estão muito apaixonados.

—Sim, Nathan merece cada momento da felicidade que encontrou. De facto, sinto inveja.

—Do que?

—De como ela o olha, de como se ilumina igual a uma vela acesa cada vez que ele entra na sala. Só posso

imaginar que deve ser uma sensação embriagadora ter a alguém que te quer tanto e querer tanto a alguém.

—Suponho que sim, mas estou certa de que é algo que já experimentou.

—por que o diz?

—Sem dúvida, o olham com olhos de adoração com muita freqüência.

—Não, que eu saiba. Rogo-lhe que me diga quem me olharia desse modo.

—Aventuraria-me a responder que qualquer mulher com algum sangue nas veias.

Colin olhou-a com olhos divertidos.

—Faria-o? E por que?

—dá-se conta, claro está, de que parece que está descaradamente suplicando por cumprimentos.

Dobraram uma esquina e entraram em um corredor ainda menos iluminado em cujas paredes, em ambos os

lados, penduravam grandes quadros. Alex deteve-se frente à primeira tela, inclinou-se e entreabriu os olhos.

—A luz não é muito boa. É bastante difícil...

Alexandra interrompeu suas palavras e teve que agarrar ar de maneira repentina quando Colin a acariciou com

os lábios por cima de seu pulso, justo onde terminava a luva de renda. Depois, introduziu um de seus longos

dedos através do objecto e acariciou-lhe a palma da mão. Alex sentiu o calor percorrer todo seu corpo ante a

sensual intimidade do gesto. E em só um instante, sua firme e contundente resolução se esfumou.

—É bastante difícil...? —continuou ele.

Teve que tragar para poder falar. Respirar.

—Ver —respondeu.

E teve que morder o lábio para conter o gemido de prazer que lhe provocava a lenta e hipnótica carícia do

dedo do Colin.

Ele retirou o dedo da luva e tocou a suave boca do Alex. Depois deu um passo aproximando-se dela e sentiu

que a tensão que o tinha estado constrangendo toda a noite começava lentamente a dissipar-se agora que

finalmente estava com ela a sós. Os olhos de Alexandra aumentaram ligeiramente e deu um passo para trás.

Seus ombros golpearam a parede entre dois dos quadros dos antepassados do Wexhall e sufocou um grito.

Perfeito, tal como Colin desejava tê-la, apanhada e sem fôlego.

Apoiando as palmas de suas mãos contra a parede a cada um dos lados da cabeça dela, inclinou-se para seu

rosto e disse brandamente:

—Parece-me que eu gostaria muito de ouvir um cumprimento teu, Alexandra.

—Estou certa disso —respondeu ela levantando o queixo—. Entretanto, supõe-se que deve me apresentar aos

antepassados do Wexhall.

—Muito bem. —E mantendo o olhar em Alexandra, assinalou com a cabeça a sua esquerda—. Esse cavalheiro é

o irmão de... —Moveu a cabeça à direita e acrescentou—: Esse outro cavalheiro. Provavelmente. O tipo

gorducho do retrato por detrás de mim é seu tio, provavelmente.

—Para ser alguém que se ofereceu a mostrar-me a galeria, se vê notavelmente desinformado.

—Ah, mas não disse que os homens poucas vezes dizem o que pensam?

Alexandra humedeceu os lábios e Colin esteve a ponto de gemer. Maldita seja, nunca antes em toda sua vida

tinha desejado tanto beijar uma mulher.

—Está dizendo que quando me perguntou se queria dar uma volta pela galeria...?

—Queria dizer algo totalmente diferente.

—Já vejo. E como declarou seu desejo de receber cumprimentos, devo interpretar que «desejaria dar uma volta

pela galeria» significa realmente «quero que me façam elogios»?

—Não, significa «quero sentir suas mãos sobre mim».

Afastando-se da parede, agarrou uma das mãos de Alex muito devagar, dedo a dedo, tirou-lhe a luva. Depois,

guardou a peça de renda no colete e apertou a palma da mão dela, agora nua, contra sua bochecha.

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Alexandra explorou com seus dedos lentamente seu queixo e, se pudesse , Colin se teria rido de sua rápida e

potente reacção perante a suave carícia. Não era capaz de explicar a ferocidade com a que desejava esse tacto

dela, mas, sem dúvida, era inegável. depois de guardar a outra luva no bolso, tomou ambas as mãos e as

apertou contra seu peito.

—Se pretende beijar-me...

—Não há nenhum «se» sobre minhas intenções de te beijar, Alexandra. estive desejando tocar-te e beijar-te

desde que cheguei esta noite. Acreditei que o jantar não acabaria nunca.

—Devo advertir que se me decompuser o penteado ou o traje, seu irmão e sua cunhada de certeza que se dão

conta.

—Sem dúvida alguma.

Colin nem se incomodou em explicar que como tinha a intenção de assegurar-se que fosse uma mulher bem

beijada, só olhando-a, seu irmão e sua cunhada poderiam ver que tinham feito algo mais na galeria que olhar

retratos.

—Não quero que tenham uma pobre opinião de mim.

—por que a iriam ter?

—Acreditam que estou casada.

—Meu irmão sabe que não o está.

—O que disse?

—Dado que sabe que as mulheres casadas não são de meu gosto, adivinhou-o. Só confirmei o que ele tinha

deduzido correctamente. E no que diz respeito a Vitória, é muito discreta, assim sugiro que o contes. Mas se te

faz te sentir melhor e em pró do decoro... —Voltou a pôr as palmas das mãos contra a parede a cada lado da

cabeça da Alexandra e inclinou-se até quase a tocar com os lábios—. Assim, só te tocarei com a boca.

E acto seguinte posou seus lábios nos dela e sentiu que afundava em um escuro abismo de prazer e desejo no

qual só ela existia. Alexandra agarrou-o pela jaqueta, aproximando-o, e Colin teve que apertar os punhos

contra a parede para manter sua promessa. Os lábios de Alexandra abriram e ele entrou a explorar sua boca de

cetim. Todo ele se sentiu invadido de um desejo ardente e selvagem e aproximou-se ainda mais, empurrando-a

contra a parede com a metade inferior do corpo. Notou, sob as calças, a sacudida brusca de uma erecção e

esfregou devagar contra a suavidade dela, enquanto em sua garganta vibrava um suave gemido. Alexandra

rodeou-lhe o pescoço com os braços e ficou nas pontas dos pés apertando-se ainda mais contra ele, ondulando

os quadris de um modo que fez, com que o controle que já ia perdendo a passos largos, se desfizesse com uma

rapidez vertiginosa.

Colin separou os lábios de Alex e afundou o rosto na cálida curva de seu pescoço, respirando

entrecortadamente a revigorante fragrância de sua pele. Era absurdo o que obtinha aquela mulher com um só

beijo. Levantou a cabeça e comprovou com serena satisfação que ela parecia tão excitada, maravilhada e

aturdida como ele. Pelo menos, essa fera paixão se via correspondida.

Alexandra abriu os olhos e por um breve e tentador instante colocou a gema de um de seus dedos sobre os

lábios de Colin, acompanhando a suave carícia com um olhar adormecido. Colin sentiu como lhe espremessem

o coração.

Alexandra estava acostumada a esconder muito bem seus sentimentos, mas naquele momento seus olhos

reflectiam tudo o que sentia: surpresa, excitação, curiosidade, espera, vulnerabilidade, incerteza, confusão,

desejo. Colin os reconheceu porque eram um espelho exacto de seus próprios sentimentos. Entretanto, a

vulnerabilidade, a incerteza e a confusão nas mulheres eram territórios novos para ele.

Como era possível que um simples beijo se tornou tão... complicado?

Todo seu corpo vibrou com o irresistível desejo de beijá-la de novo, mas antes que pudesse fazê-lo Alexandra

abriu os olhos de par em par presa do pânico e lançou uma exclamação de clara recriminação para si mesmo.

Afastou-o e, agachando-se, passou sob seu braço.

—Devo ir —disse com voz tensa e deu a volta disposta a partir.

Colin a agarrou por braço detendo-a.

—Alexandra, espera...

Ela voltou-se e olhou Colin com olhos cheios de angústia.

—Por favor, deixe-me partir —sussurrou—. Não quero... Não posso... —Lançou um profundo e tremulo

suspiro—. Desejo retirar-me.

Seu olhar refletia tanta tristeza e vulnerabilidade que Colin esteve a ponto de desmoronar-se.

—Sim, deixe ir, agora que ainda posso —repetiu pondo sua mão sobre a de Colin—. Por favor, Colin.

Soltá-la era a última coisa no mundo que desejava fazer, mas não podia negar-se, assim muito devagar afastou

sua mão do braço de Alexandra que, no mesmo instante em que se viu livre, afastou-se a toda pressa.

Quando desapareceu de sua vista, Colin apoiou os ombros contra a parede e deitou a cabeça para trás. Sentia-

se mais só, como nunca antes se havia sentido. Tirou uma das luvas de Alexandra do bolso e levantou a peça

de renda à altura de seu rosto. Fechou os olhos, respirou a deliciosa fragrância e pronunciou a única palavra

que ocupava seu pensamento:

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—Alexandra —murmurou deixando escapar um gemido.

Maldita seja, por que não existia um elixir mágico que a apagasse de sua mente de um golpe? Algo que o

fizesse esquecer quanto a desejava, apagar a lembrança da perfeição com a que encaixava entre seus braços,

que fizesse desaparecer o sabor dela de sua boca ou eliminasse essa voraz necessidade de fazer-lhe amor e essa

poderosa ânsia que sentia de falar e rir com ela sozinho tendo-a na mesma casa.

Nunca em sua vida tinha experimentado uns sentimentos tão confusos por uma mulher, nem sequer nas

ocasiões nas que se havia sentido profundamente atraído por alguma ou nas que tinha chegado a compartilhar

seu leito. Aqueles encontros tinham sido prazenteiros, ligeiros, mas sempre, sem excepção, tinha-os esquecido

de maneira imediata.

Embora não havia dúvida de que sentia um enorme prazer na companhia de Alexandra, não havia nada ligeiro

em seus sentimentos. Não, isto era... intenso, vivido, como se tudo a seu redor tivesse uma definição mais forte,

as cores fossem mais brilhantes e reluzentes, fazendo que sua vida anterior parecesse ter sido somente em tons

cinzas. E quanto à possibilidade de a esquecer de maneira imediata...

De seus lábios escapou um áspero grunhido. No fundo de sua alma, sabia que não poderia esquecê-la nem que

vivesse até o século seguinte. Seguia o obcecando como o tinha feito durante os últimos quatro anos, muito

antes que tivesse conhecido seu nome, e muito menos o sabor dos seus beijos ou a sensação de seus braços a o

rodear.

A presença de Alexandra o estava impedindo de cumprir com o objectivo por que tinha ido a Londres, mas

resultava impossível procurar uma prometida quando, o único que podia fazer era pensar nela, uma mulher

que, dado a responsabilidade de seu título, não podia ser sua esposa.

Mas poderia convertê-la em seu amante, sussurrou-lhe uma voz interior.

Sua consciência, sua honra e sua integridade protestaram imediatamente ante a idéia de uma aventura

adúltera. Não desonraria os votos matrimoniais uma vez pronunciados.

Mas ainda não era casado, recordou-lhe astutamente sua voz interior.

Abriu os olhos e ergueu a cabeça, olhando fixamente a luva de renda que sustentava na mão. Não, ainda não

estava casado, nem sequer estava comprometido. Podia convertê-la em sua amante até então. Seriam discretos

e se asseguraria de que ficava bem cuidada, tanto Alex como a causa que ela tanto apreciava. Depois... diriam-

se adeus.

Seu coração acelerou ante a expectativa. Estava convencido. Nesse momento, o único que tinha que fazer era

convencê-la.

Capítulo XIV

Alex estava estendida sobre a magnífica cama de seu elegante quarto, uma cama suave, cômoda, cálida,

luxuosa e em que, entretanto, não conseguia conciliar o sono apesar de desejá-lo com todas suas forças. Tinha

tentado durante horas deixar a mente em branco, mas não havia forma de obtê-lo com a presença de Colin

enchendo cada canto de sua mente.

Fechou os olhos mas não conseguiu esquivar o bombardeio de lembranças sensuais: Colin aprisionando-a

contra a parede da galeria, cercando-a com o calor de seu corpo, invadindo seus sentidos com esse aroma

masculino, agachando a cabeça...

Recordou vivamente o delicioso sabor de seu beijo, a deliciosa sensação de seu corpo apertando o seu. Só tinha

sido necessária uma carícia de Colin para a despojar de todas suas sensatas resoluções, uma só carícia para que

desejasse mais, para que desejasse tudo.

Alex deixou escapar um gemido de frustração e, com um gesto de impaciência, afastou os lençóis e se

incorporou na cama. Depois levantou-se e começou a percorrer a habitação uma e outra vez, até que finalmente

parou frente à chaminé e ficou olhando fixamente as cinzas resplandecentes da lareira. Lançou um suspiro e

contemplou as brasas e seu brilho. Deu-se conta de que ela se sentia igual aquelas brasas meio apagadas...

quente, espectante, pronta. Só fazia falta um sopro de ar para que voltasse, como elas, a arder.

Alexandra sabia o que ocorria entre os homens e as mulheres na escuridão porque o tinha ouvido, tinha sido

testemunha disso numa infinidade de ocasiões, tantas que nem as recordava. E também sabia o quanto se

chegava a falar dessas coisas, mas pelo que tinha visto, resultava-lhe muito pouco excitante. De facto, todo o

processo em si tinha-lhe resultado sempre algo asqueroso, algo a evitar.

Até ao beijo de Colin. O contacto com ele tinha transformado seu desprezo para com o acto carnal, em um

desejo que não podia sufocar, um desejo que queria explorar, desesperadamente e com ele.

Mas se atreveria?

A pergunta retumbou em sua mente e teve que ralentizar o passo. Se ela se oferecesse... ele aceitaria?

Provavelmente. Os homens não estavam acostumados a recusar esses oferecimentos, verdade? Especialmente

se sabiam que não podia haver segundas intenções nem consequências. Ela não era uma dama de sociedade

empenhada em conseguir uma proposta de matrimônio. E especialmente ele sabia que a aventura só duraria o

curto período de tempo que permanecesse em Londres. Ela não esperaria nada dele excepto a promessa de

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que tomaria as precauções necessárias para evitar que concebessem um filho. Pela reacção de seu corpo

quando se beijaram, estava claro que fisicamente, não se mostraria resistente à idéia. E sem dúvida, um homem

de sua posição e que tinha vivido durante anos como espião, estaria familiarizado com a discrição.

Atreveria-se?

Sim, sussurrou-lhe uma voz interior, essa voz feminina interior que tinha sufocado à força durante todos

aqueles anos e que agora pedia para ser escutada.

Não, interveio seu sentido comum, recordando que mal conhecia aquele homem e que enquanto ele não

arriscava nada, ela arriscava muito.

Mas então seu coração se fez ouvir e insistiu em que, apesar que tinha passado muito pouco tempo realmente

em sua companhia, graças às cartas, tinha conhecido aquele homem de cabelo escuro e olhos verdes muito

antes de vê-lo pela primeira vez em Vauxhall. Aquele homem era, sem dúvida alguma, Colin, e tinha vivido

em sua imaginação, em seu coração e em sua alma durante anos. Ele era o homem que sempre tinha desejado,

e esta era sua oportunidade, sua única oportunidade, de ter uma pequena parte dele durante um curto espaço

de tempo.

Atreveria-se?

Fechou os olhos e respirou fundo. Sim... Sim, atreveria-se.

Ofereceria-se a ele e, com um pouco de sorte, seria sua durante um curto e mágico tempo.

No instante em que tomou a decisão, sentiu que a invadia um tremendo alívio. Tinha reflectido e a decisão

estava tomada. Quão único precisava fazer era actuar de acordo com ela e assim o faria assim que voltasse a

vê-lo, algo que ocorreria no dia seguinte.

Dirigiu o olhar ao relógio que havia sobre o suporte da chaminé e deu-se conta de que era quase a uma da

madrugada.

Já era o dia seguinte.

Toda ela vibrou de espera e rodeou o corpo com os braços. Sem poder estar quieta, dirigiu-se à janela e olhou o

jardim.

A lua cheia iluminava o pequeno jardim com seu etéreo brilho prateado. A eterna névoa londrina cobria o chão

e se elevava da erva como dedos vaporosos e fantasmagóricos. No meio do jardim erguia-se uma majestosa

árvore. Enquanto o contemplava, pareceu-lhe que junto ao tronco da árvore uma sombra se movia.

Alex fixou o olhar e uns segundos mais tarde o coração deu um tombo ao descobrir que a sombra

correspondia a uma pessoa. Antes que pudesse decidir como dar o alarme naquele lar desconhecido, a sombra

separou da árvore e moveu-se sigilosamente para as sebes que rodeavam o perímetro do jardim. A sombra

movia-se com uma claudicação familiar.

Conteve o fôlego e por um instante, antes que as sombras o tragassem de novo, viu-o claramente. Que

demônios estava fazendo Colin lá fora?

Apertou o peito com as mãos notando o súbito e frenético batimento de seu coração. Era possível que os

pensamentos de Colin fossem iguais aos seus e tivesse ido ali com a intenção de convertê-la em sua amante?

Não sabia, mas negava-se a ter que esperar um momento mais para o averiguar.

Colin estava sob a escura sombra que projectava a mansão Wexhall. Da sua vantajosa posição podia controlar

toda a zona do jardim, e até esse momento sua vigilância não tinha detectado nada fora do normal. Notava a

profunda e intensa dor que estava acostumado a sentir na perna quando estava fatigado, mas sabia que

embora retornasse a sua casa e fosse para a cama, não conciliaria o sono. De facto, essa era a razão pela qual

estava ali, vigiando a zona. Assim que fechou os olhos, o único que viu foi Alexandra, seus formosos olhos

marrons, seus suaves e carnudos lábios, seu provocador sorriso.

Sua imaginação disparou, projectando em sua mente imagens eróticas, imagens dela, exuberante e excitada,

nua em sua cama, debaixo dele, em cima dele, ele dentro dela. Com um gemido de frustração, levantou-se da

cama. Tinha estado dando voltas, olhando o fogo, pensando na possibilidade de ler um livro. Depois tinha

comido dois mazapanes acompanhados de um forte gole de brandy, esperando que fosse uma ajuda para

passar o tempo que faltava até voltar a vê-la.

Mas por mais que olhasse o relógio sobre o suporte da chaminé, as horas não avançavam. Não havia nada que

pudesse apagar a de sua mente. E maldita seja, não havia maneira de aliviar a erecção que lhe tinham

provocado os sensuais pensamentos que tinha tido com ela. Visto que estava claro que o sono não chegava,

decidiu que pelo menos podia ser útil vigiando ao redor da mansão Wexhall para assegurar-se que Alex

estava a salvo. Em seu interior sabia que a vigilância também significava estar mais perto do objecto de seus

desejos, mas tinha exigido a sua voz interior que estivesse em silêncio.

Ali, envolto nas sombras, voltou a esquadrinhar o jardim. Tudo estava em perfeita calma, um silêncio só

alterado pelo rangido das folhas que movia a suave brisa que também balançava a névoa baixa que cobria o

chão.

Passou as mãos pelo cabelo, fechou os olhos e massageou as têmporas. Deveria ir a casa e beber brandy até

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conciliar o sono. Assim poderia sonhar com ela até o momento de voltar a vê-la e então faria a proposta, e oxalá

ela não a recusasse.

—Olá, Colin.

Por todos os diabos! Ao ouvir essas palavras, pronunciadas em um sussurro, abriu os olhos de repente e

adiantou uma perna. Com o coração acelerado, de maneira instintiva, baixou a mão , preparando-se para o

combate, agarrou o punho da faca que levava na bota. Depois olhou petrificado.

Alexandra estava a uns poucos centímetros dele e, do queixo aos pés, levava o corpo coberto por um simples

robe branco que cobria o que parecia ser uma também simples camisola branca. Levava o cabelo escuro

recolhido em uma grossa a trança que contrastava com seu pálido traje. A trança chegava à altura dos quadris e

terminava adornada com um laço de cetim.

—vais devolver-me a saudação ou pretendes apunhalar-me? —perguntou ela em um tom suave e divertido.

Sem poder dizer uma palavra, Colin deixou a faca e ficou em pé devagar para dar tempo a seu coração de

recuperar o ritmo normal. Maldita seja, não sabia se estava aborrecido ou impressionado, como se tinha

arranjado Alex para aproximar-se dele tão sigilosamente e apanhá-lo de todo despreparado. Se o assassino

estivesse nas imediações, sem dúvida, estaria morto. Estava claro que tinha perdido aptidões desde seu retiro.

Inclusive na escuridão podia ver como os lábios de Alexandra moviam-se com nervosismo.

— Alegro-me que não tenhas optado por me apunhalar.

—O que estás fazendo aqui? —perguntou depois de esclarecer a garganta para poder falar.

—Na noite dos Newtrebble disse-me que ias converter em um costume o de me encontrar contigo, preferia a

intimidade do jardim. Simplesmente tomei a palavra.

A mente de Colin ficou em suspense. Uma ardente luxúria o tomou ao ver Alexandra ali de pé, vestida

unicamente com a roupa para dormir, umas vestes que, embora eram extremamente virginais, insinuavam

também as deliciosas curvas que escondiam. Possuído pelo desejo, durante uns segundos só pôde olhá-la

fixamente, tentando recordar como respirar.

—Vi-te da janela do meu quarto —continuou ela—. Mas vendo que te localizei e que claramente te surpreendi,

penso que possivelmente tuas habilidades como espião não são precisamente... formidáveis.

O tom divertido de sua voz tirou Colin de seu estupor e se sentiu zangado. Cruzou os braços e entreabriu os

olhos.

—Asseguro-te que não é o caso.

—Se o dizes...

—Sim, e diz-me, por que estás aqui?

—Como disse, vi-te da janela e queria saber... —Interrompeu suas palavras e olhou o chão.

—Saber o que?

Lançou um suspiro o suficientemente alto para que Colin o ouvisse, depois levantou a vista e o olhou aos olhos

dizendo:

—Se estás aqui por mim.

Houve algo na expressão da Alexandra que encheu Colin de excitação e de tranquilidade ao mesmo tempo.

—Assim é —disse muito devagar, olhando-a com atenção—. Estava vigiando os arredores, para me assegurar

de que estás a salvo.

—Já vejo.

Nem sua expressão nem sua voz deram nenhuma indicação a Colin do que ela estava pensando. Maldita seja,

por que tinha que ser tão exasperadamente indecifrável?

— Aborreceu-te? —perguntou.

—Não —disse Alex negando com a cabeça—. Não, me... decepciona.

—por que?

—Porque confiava em que tivesse vindo para ver-me —disse lançando de novo um profundo suspiro.

Ante aquelas palavras, Colin sentiu que seu corpo acendia, que todas as restías de medo e de aborrecimento se

apagavam e que só ficava ela. Estendeu as mãos e, ao agarrar suavemente os braços dela, notou que toda ela

estava tremendo.

—E se dissesse que tinha vindo te ver? —perguntou-lhe.

— Tuas palavras seriam bem recebidas —sussurrou Alex.

Imediatamente, apóss ter pronunciado aquelas palavras, Colin a tinha entre seus braços, apertada contra seu

sólido corpo. Suas bocas juntaram-se num beijo selvagem, feroz, exigente, que a desfez por dentro e a deixou

sem fôlego, um beijo que indicava que as palavras dela também eram bem recebidas por Colin.

A espera mesclou com o alívio e a euforia, e Alexandra rodeou o pescoço de Colin com seus braços, forçando-o

a aproximar-se mais, separando seus lábios para deleitar-se com a erótica fricção de suas línguas. Colin

acariciou as suas costas e ela recebeu o calor de suas mãos através da fina roupa, da camisola com que tinha

salto de cama. Notou um delicioso calafrio a percorrer a sua coluna que se fez mais agudo quando Colin

tomou as nádegas com suas mãos e a atraiu para ele com paixão. Sentiu a potente força da sua erecção, que

apertou o seu ventre, provocando uma tremenda e deliciosa sensação palpitante.

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E então, com tanta rapidez como a que tinha tomado contra seu corpo e a tinha beijado até deixá-la sem fôlego,

agarrou-a pelos braços e afastou-a. Felizmente, não a soltou de todo, porque se o tivesse feito teria caído chão e

teria desmaiado a seus pés.

Abriu os olhos com dificuldade e viu o brilho nos de Colin; sentiu como a respiração dele era tão errática como

a sua própria.

—Sabes que te desejo —disse ele ao cabo de uns segundos em tom áspero.

Alexandra humedeceu os lábios e replicou:

—Ao que só posso dizer «graças a Deus».

A ferréa expressão de Colin suavizou um pouco e aproximou-a para ele suavemente, sujeitando-a pela cintura

com um de seus fortes braços. Depois, acariciou-lhe a bochecha com dedos tremulos.

—Sim —murmurou—. Graças a Deus.

—Tenho algo que te pedir —disse ela, apoiando suas mãos no peito de Colin e notando nelas o veloz

tamborilar de seu coração.

—Só tens que formular tua petição.

Ficou calada, repassando as palavras dele em sua mente. «Só tens que formular tua petição.» Nunca ninguém

lhe disse nada assim.

—Não queres saber o que quero, antes de me fazeres a promessa de mo dareseres —Diamantes, perolas.

—Não.

—E o queacontece se pedir algo extravagante?

—Como o que?

—Diamantes, pérolas.

—É isso o que queres de mim, Alexandra, diamantes e pérolas? —perguntou-lhe devagar, com um olhar tão

intenso que Alexandra soube que não estava brincando.

A sua mente acudiram duas idéias simultâneas. Alguém que era a imagem ela mesma, levando um decotado e

elegante traje de noite, com um colar de pérolas cor nata ao redor do pescoço e pendurando de seus lóbulos

dois pendentes de diamantes.

A outra era o cálculo do que essas jóias valeriam, um dinheiro que sem dúvida poderia financiá-la a ela e a sua

causa durante anos. E isso so em troca do que, acreditava intuir, estava-lhe entregando Colin nesse momento.

Sua confiança.

Notou um nó de emoção na garganta. Pela expressão de Colin estava claro que se lhe pedia jóias, ele as daria.

Aquele atractivo homem, ao entregar-lhe sua confiança, converteria-se em uma mais de suas vítimas. E quando

o descobrisse, a atracção e a admiração que pudesse sentir para ela nesses momentos desapareceriam.

Entretanto, embora o tempo que pudessem compartilhar em Londres fosse breve, Alexandra não queria pagar

esse preço.

—Não, Colin. Não quero diamantes nem pérolas.

Colin não disse nada durante vários segundos. limitou-se a passar as gemas de seus dedos por suas feições ,

como se queria memorizá-los, acompanhando com o olhar seus gestos. Alexandra desejava fervorosamente

saber o que estava pensando. Finalmente, disse:

—Obrigado.

—por que?

—Por ser a única mulher que conheço capaz de pronunciar essa frase. É... extraordinária.

—Justamente o contrário, sou do mais vulgar —disse, mas pensou: Muito mais do que acreditas.

—Não, é extraordinária, em todos os sentidos, inclusive em alguns que nem sequer conheces. —E passou a

gema de seu dedo polegar pelo lábio da Alexandra—. Visto que não desejas nem diamantes nem pérolas, diz o

que quer.

—Está relacionado com nosso... acordo. Necessito que me assegures que só o saberemos nós. Aceitam a

madame Larchmont como uma mulher casada, e não posso arriscar a que minha reputação se veja manchada

por uma aventura.

—Tens minha palavra de que te protegerei, de todas as maneiras.

—Obrigado. Tampouco eu gostaria... —vacilou.

Sabia que uma gravidez seria desastroso para ela, mas por um louco momento reteve a imagem dela mesma

levando o filho de Colin.

—Ficar grávida?

—Sim.

—Tomarei precauções para evitá-lo.

—E nossas relações terminarão quando tiver escolhido esposa —disse Alex com firmeza—. Não poderia

manter uma relação deste tipo com o futuro marido de outra mulher.

—Eu tampouco humilharia a minha esposa com uma aventura adúltera —disse Colin afastando a Alexandra

um cacho que lhe caía pela bochecha—. Mas até então, será minha.

Um estremecimento de fêmea lhe percorreu todo o seu corpo ante aquele tom de serena posse.

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—Sim —disse—. E tu meu.

—Sim, sou teu.

Seu coração se deteve o ouvir seu consentimento. A mera idéia de que aquele homem podia ser seu de algum

modo, durante algum tempo... Era uma oportunidade com a que tinha sonhado mas que nunca se atreveu a

esperar, e tinha toda a intenção de desfrutar de cada minuto que passassem juntos.

—São essas suas únicas petições, Alexandra?

Meu Deus, so de ouvir como pronunciava seu nome, deliciosos calafrios percorriam todo o seu corpo.

—Só uma mais —sussurrou—. Quero que apagues este fogo que acendeste dentro de mim.

Colin apoiou sua testa contra a da Alexandra.

—Eu quero o mesmo, mas este não é o momento nem o lugar, e se voltar a te beijar... —Levantou a cabeça e

dirigiu o olhar para sua boca.

Alexandra abriu seus lábios involuntariamente.

—Se me voltares a beijar...?

—Como tem um efeito desastroso sobre meu autocontrol, muito me temo que terminaria por te tomar contra a

parede.

Meu Deus.

— O dizes omo se fosse algo mau.

—Não é mau, mas resulta inconveniente, quando nos encontramos sem cama junto a uma mulher que merece

uma,pelo menos a primeira vez que fizer amor. —inclinou-se e apoiou brandamente seus lábios nos dela—.

Deixa que tente que a tua primeira vez seja perfeita.

—Parece-me bastante perfeita agora, excepto pelo meu pulso que está gravemente alterado.

Colin esboçou um maliciosa e rápido sorriso.

—Bem. Ódeio pensar que é só o meu que está alterado. —Soltou-a e logo a agarrou pela mão—. Vem comigo.

E a conduziu ao redor da casa até a entrada de serviço. Ali, tirou uma pequena peça de metal do bolso e

inclinou sobre a fechadura. Em menos de um minuto, a porta abriu sem ruído algum.

—É muito bom —sussurrou.

A ladra que tinha sido sentiu admiração e uma indubitável pontada de inveja.

—Estou certo de te ter dito que sou bom em muitas coisas. Esta casa é quase idêntica à minha. Segue este

corredor até chegar à escada, sobe ao segundo andar, gira à direita, segue em frente pelo corredor que

encontras e chegaráa ao teu quarto.

—Sozinha? —disse Alexandra totalmente desiludida.

—Sim.

—Mas o que passa com... nós?

—Minhadoce Alexandra, tal como te disse, este não é o momento nem o lugar. Esse «nós» será muito em breve,

prometo-o. E agora diz-me, como sais-te da casa?

—Pelas janelas que dão para o terraço.

—Assegurarei-me de que ficam fechados com chave.

Colin inclinou a cabeça, e Alexandra levantou seu rosto mas em lugar de lhe dar o beijo que ela aguardava

ansiosamente, depositou um rápido beijo na ponta do nariz.

— Vaí rapido, e quando fechares a porta, gira a chave por dentro. Verei-te muito em breve.

Alexandra entrou na soleira perplexa, confundida, irritada e frustrada.

—um pouco de calma fica bem aos dois —disse uma divertida voz na escuridão.

Mas quando deu a volta disposta a assassinar Colin com o olhar, descobriu que já tinha fechado.

Olhou a porta de madeira totalmente aniquilada. Alguma vez tinha acreditado que ia propor-se a um homem

e quando o fazia, o que acontecia? Ele a mandava sozinha para o quarto. Possivelmente Colin não tinha

querido tomá-la contra a parede mas, por favor, esse era o modo que se fazia no seu ambiente. Pode ser que

não a desejasse tanto como proclamava.

—Que homem tão irritante —murmurou entre dentes.

abriu-se caminho cuidadosamente através da escura e silenciosa casa, seguindo as indicações que lhe tinha

dado Colin para chegar a seu quarto e, com cada passo, crescia sua frustração. Sentia o corpo impaciente e

ardente e suas dobras mais íntimas intumescidas. E agora o único que a esperava eram longas horas de insônia

até vê-lo de novo. Ficaria louca.

Quando chegou ao pé da escada, subiu, girou à direita e tomou o corredor. Devia estar tão perdida em seu

aborrecimento, que teve que chegar ao final do corredor para dar-se conta, que de certeza tinha passado pelo

seu quarto. Franzindo o cenho, deu a volta, e quando percorreu com o olhar o canto onde se encontrava, que

estava às escuras, descobriu que aquele corredor não lhe resultava nada familiar. Aquela mesa em forma de

meia lua com um buquê de flores não tinha estado antes nesse sítio, nem tampouco o recarregado espelho

ovalado que pendurava na parede de em frente.

Maldito seja. Aquele homem não só era um tortura para sua paz de espírito, mas também não tinha nenhum

sentido da orientação.

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Apertando os dentes, retrocedeu sobre seus passos com cuidado e, uma vez chegou à escada, dirigiu-se para o

vestíbulo para poder orientar-se. Quando esteve sobre os ladrilhos de mármore da entrada, certificou-se da

direcção que devia tornar e foi para o seu quarto. Quando chegou, estava absolutamente irritada. Abriu a porta

e a fechou silenciosamente detrás de si, contendo o desejo de dar uma portada. Tinha percorrido metade do

quarto, quando parou, como se tivesse ido contra uma parede de cristal. E olhou aniquilada.

Colin tinha tirado a jaqueta e o colete e estava de pé junto a sua cama, com os ombros apoiados

despreocupadamente contra a madeira profusamente esculpida do dossel, os braços cruzados alegremente e os

olhos brilhando com esse ardor inconfundível que incendiava cada uma das células de seu corpo.

—Pois bem —disse ele brandamente—, isto é o que eu chamaria o momento e lugar mais apropriados.

Capítulo XV

Colin não pôde conter uma momentânea presunção, ao ver que tinha deixado Alexandra totalmente sem fala.

Oxalá sempre pudesse resultar tão fácil ler seus pensamentos como naquele momento.

—Como entraste aqui? —perguntou ela olhando-o como se não estivesse de todo convencida de que era real.

—Através das janelas que dão para o terraço e que a senhorita deixou por fechar —respondeu Colin.

Separando-se do dossel, aproximou-se lentamente dela, detendo-se quando so os separavam uns centímetros.

Esteve a ponto de deixar-se dominar pela urgência de tomá-la em seus braços e devorá-la. Era realmente

desconcertante aquele voraz apetite que lhe inspirava. Tinha conhecido o desejo, mas aquela... aquela

selvagem, temerária e primitiva necessidade de empurrá-la contra a parede mais próxima ou tombá-la sobre a

cadeira mais próxima e simplesmente desfrutar dela era totalmente nova. De algum modo, em presença de

Alex, Colin se via sem as maneiras cavalheirescas que tinham definido sua vida até então. Sem fazer nada, o

fazia sentir-se inusitadamente fora de controle, algo que nenhuma outra mulher tinha conseguido. Maldita

seja, nem sequer ainda a tinha tocado e já não podia esperar mais.

Simulando uma calma que estava longe de sentir, esticou a mão e entrelaçou seus dedos com os dela de forma

suave.

Não se surpreendeu minimamente quando sentiu o corpo acender-se com aquele ligeiro contacto.

—Deixar as janelas sem fechar é do mais imprudente murmurou, enquanto riscava círculos nas palmas das

mãos de Alex com os dedos polegares—. Há homens muito maus rondando na escuridão.

Ela pareceu recompor-se.

— Tu incluído?

Colin levantou as mãos e acariciou-lhe o dorso dos dedos com um beijo.

—De facto, fiquei feliz que as janelas não estivessem fechadas com chave, já que isso me permitiu ganhar um

par de minutos fundamentais, se queria chegar antes que ti.

—Assim, por isso me deu indicações errôneas para chegar ao meu quarto —disse Alexandra com um olhar que

dava a entender que tinha entendido tudo.

—Declaro-me culpado do delito. Queria te preparar uma pequena surpresa. Tal como disse, estou acostumado

a obter o que quero —disse Colin avançando para Alexandra até que só ficava o espaço de um suspiro entre

seus corpos.

—Parece que me estás a desafiar —disse Alex suavemente e com o olhar escurecido, algo que agradou a Colin.

—Possivelmente, mas não deveria ser assim, visto que ambos queremos o mesmo.

Baixou a cabeça e tomou seu lóbulo entre os dentes.

—Acredito que está tentando que me desvaneça —disse Alexandra com um suspiro carregado de prazer.

—Estou-o conseguindo?

—Absolutamente.

—Excelente.

Colin beijou a suave pele de detrás de suas orelhas e quando sua mente se encheu do delicado, delicioso e doce

aroma a laranjas, lançou um gemido e perguntou quem estava fazendo desvanecer-se a quem.

—Mencionou algo a respeito de preparar uma surpresa —perguntou ela—. O que é?

—Está impaciente?

Alexandra afastou-se e o olhou.

—Sim —disse em um tom de voz que só podia descrever-se como vaporoso—. Agora mesmo estou muito

impaciente, e normalmente não o sou. Para ser sincera, este estado tão pouco habitual é inteiramente culpa tua,

e quero saber o que vais fazer a respeito, agora mesmo.

Colin a soltou e começou a desatar-lhe o cordão do robe. Depois de separar o fino algodão, deslizou o mesmo

por seus braços e este caiu ao chão com um suave zumbido.

—Pretendo —disse mantendo os olhos fixos nos dela, e começando lentamente a desabotoar a larga fila de

botões, que fechava a camisola pela parte da frente — que esteja ainda mais impaciente.

—Não estou certa de que isso seja possível.

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—Oh, sim o é —afirmou Colin e desabotoou o último diminuto botão da camisola mas sem tirar-lha — Bom,

mas não é suficiente. Quero mais, quero que estejas mais impaciente, mais quente.

Assim, com a roupa aberta até a cintura, introduziu um de seus dedos pela abertura e tocou ligeiramente a

suave fenda de seu pescoço.

—Quero que estejas impaciente —sussurrou, enquanto muito devagar fazia descer a gema do dedo por sua

muito suave pele, entre seus seios, mais abaixo, até rodear com suavidade seu umbigo—. E quente.

Alexandra entreabriu os olhos e balançou-se levemente sobre os pés.

—Mas já estou assim, sinto como se fosse estalar.

—Bem, mas não é suficiente. Quero mais, quero que estejas mais impaciente, mais quente.

Colin não podia aguentar um segundo mais sem vê-la em sua plenitude, assim tomou a camisola com as mãos

e a retirou devagar, revelando a seus olhos o corpo da Alexandra centímetro a centímetro, fazendo descer a

peça por seus braços até que esta caiu ao chão junto ao espaldar dae cama.

Alexandra elevava-se em meio de suas roupas de noite como uma preciosa flor nocturna, sua pálida pele

banhada pela luz chapeada da lua que entrava pelas janelas e pelo brilho dourado das últimas brasas da

chaminé. Devagar, Colin seguiu com o olhar suas formas e teve que apertar os punhos para não espremê-la

contra ele como um moço arrebatado em sua primeira noite.

Contemplou seus seios firmes e plenos em cuja cúspide despontavam uns pequenos mamilos rosáceos que

pareciam chamar as suas mãos e lábios. A estreiteza da cintura dava passo à sinuosa curva dos quadris, e Colin

deteve seu olhar no triângulo de escuros cachos que coroava o vértice das coxas antes de seguir descendo a

vista pelas pernas bem formadas e os magros tornozelos.

—arriscando-me a resultar redundante —disse em um tom de suave aspereza—, é deliciosa.

E esticando a mão desfez o laço que sujeitava a trança de Alex e passou os dedos pelas sedosas mechas,

separando os lustrosos fios que se derramaram sobre suas mãos emanando um delicado aroma cítrico. Levou

uns cachos ao rosto, respirando-os profundamente, e gemeu.

—Meu Deus. Seu aroma é tão incrivelmente delicioso...

—Obrigado.

Ao notar o ligeiro tremor de sua voz, perguntou-lhe:

—Estás nervosa?

—um pouco, sim —disse ela depois de uma breve vacilação.

—Eu também.

—por que? —perguntou ela surpreendida—. Sem dúvida tens experiência nestes assuntos.

—Sim, mas tu não, e eu nunca fiz amor com uma virgem. Intimida-me um pouco, sobre tudo porque fazes que

queira te fazer coisas... de forma que me fariam esquecer que devo ir devagar.

Alexandra apoiou suas mãos sobre o peito de Colin e ele soube que estava notando o forte e rápido batimento

de seu coração.

—É verdade que sou virgem, mas não sou uma dama tímida e delicada, uma moça de porcelana que teve uma

vida fácil, Colin. Sou perfeitamente consciente do que se vai passar entre nós. E eu quero tudo.

Colin envolveu seu pulso com uma mecha do cheiroso cabelo de Alex.

—Como sabes o que acontecerá connosco?

—Vi... coisas.

—Que tipo de coisas?

—Homens que se desafogavam com mulheres, mulheres ajoelhadas agradando aos homens.

Pela mente de Colin passou a imagem de Alex ajoelhada, com aqueles carnudos lábios ao redor de sua erecção.

Notou que o sangue lhe golpeava as virilhas e que seu membro inchava contra as calças, que de repente

resultavam estreitas.

—Sempre perguntei a que obedecia tanto animação —disse Alex levantando o queixo levemente— quando os

trâmites em si sempre me pareceram bem furtivos e, bom, rápidos. Consegui evitar minha curiosidade, mas

contigo já não posso. O que me fazes sentir... tem que ser explorado.

Colin afastou a mão deixando cair a sedosa cortina de cabelo até a cintura de Alex.

—Não tenho nenhuma intenção de acelerar os... trâmites, Alexandra. E certamente animo-te a explorar, do

modo que deseje.

—Um convite que não posso aproveitar, muito me temo —disse lhe lançando um olhar de cima abaixo—. Pelo

menos, no que a mim respeita, posto que tu não estás aí parado com todas tuas... partes ao ar.

Colin conteve a gargalhada que lhe provocou seu tom contrariado e se limitou a sorrir.

—Estarias mais cômoda se minhas... partes estivessem também ao ar?

—Certamente o consideraria mais justo. Ao fim e ao cabo, eu também quero que estejas tão impaciente como

eu.

Colin pensou que se Alexandra tivesse idéia de quanto impaciente estava, de como se achava ao ponto de

perder por completo o controle — sem sequer tê-la tocado ou que ela o tivesse tocado — estaria algo mais que

«um pouco» nervosa.

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—Posso-te assegurar que não tens que preocupar-te por isso. De todos os modos... —Estendeu seus braços—.

Estou à tua disposição.

Nos olhos do Alex houve um brilho de interesse e incerteza.

—Não estou certa por onde começar exactamente.

—Minha gravata seria provavelmente um bom começo.

Alexandra dirigiu o olhar ao complicado nó da gravata, deu um passo à frente emergindo do montão de roupa

que jazia a seus pés, e começou a desfazê-lo. Tendo-a alí diante, sem outra coisa em cima que o gesto de seu

cenho franzido, Colin ficou sem respiração. Tentou não tocá-la, e o conseguiu, mas só durante três segundos

exactos. Depois, incapaz de deter-se, puxou-a pela cintura.

De repente, deu-se conta de que por fim estava tocando sua pele e teve que fechar os olhos. Essa noite, a

mulher que tinha habitado seus sonhos durante tanto tempo seria dele. Abriu os olhos e a olhou, sem deter

seus dedos que acariciavam com doçura a flexível cintura e subiam e desciam pela suavidade de suas costas.

—Assim não me ajudas a concentrar —disse ela olhando-o.

—Ah. —E apanhando seus seios com as palmas da mão disse—: Assim está melhor?

Alex deu um salto ante o brilho de prazer que aquela carícia lhe tinha provocado e agarrou a camisa de Colin.

Baixou a vista e observou como ele mexia em seus mamilos com seus longos dedos. Até que teve que fechar os

olhos.

—Melhor? —perguntou ele.

Estava perguntando algo? Esperava que respondesse?

—Não... não estou certa. Possivelmente poderias voltar a o fazer.

A suave risada afogada de Colin encheu de calidez sua pele e em um instante soube que as mãos daquele

homem eram mágicas. Toda ela acendeu com o roçar de seus dedos contra seus seios. Depois, ele inclinou-se e

com a língua riscou o contorno de seu peito. Alexandra teve que afogar um grito que se transformou em um

comprido gemido, quando Colin rodeou um de seus mamilos com a língua, fazendo círculos, tomando-o erecto

dentro de sua cálida boca, brincando de forma mágica ao mesmo tempo com o mamilo de seu outro seio.

Alexandra deixou cair a cabeça lánguidamente para trás e arqueou-se para a frente, pedindo mais. Cada vez

que os lábios do Colin se moviam embriagadoramente, sentia um profundo calor em seu interior. Notava

húmidas e intumescidas as dobras entre suas pernas e esfregou as coxas, mas o movimento não a aliviou o

mínimo. Nem tampouco Colin, que voltou sua atenção ao outro peito e tomou as nádegas com as mãos.

Alexandra o agarrou pelos ombros, deixando-se levar por aquela maré de sensações, desejosa de afundar-se

ainda mais naquele abismo de prazer e lutando ao mesmo tempo por escapar dele, para poder continuar

despindo Colin. Nunca em sua vida se havia sentido tão viva, tão consciente dela mesma e de seu corpo, e tão

ansiosa por aprender e experimentar.

—Delicioso —murmurou Colin junto a seu peito—. Terrivelmente delicioso.

Antes que Alex pudesse recuperar o fôlego, Colin inclinou-se para posar os lábios no centro de seu torso,

beijando e lambendo sua pele, rodeando seu umbigo, introduzindo a língua nele. Todo o corpo de Alexandra

era um delicioso calafrio e de sua garganta escapou um vibrante gemido de prazer.

— Olha para mim — sussurrou Colin com voz rasgada.

Fazendo um esforço, Alex levantou a cabeça e abriu os olhos. Ele ajoelhou em frente dela, com os lábios a uns

milímetros de seu abdômen. Em seus olhos escuros e ardentes, podia-se adivinhar um potente e profundo

desejo capaz de lhe cortar a respiração.

—Separa as pernas para mim, Alexandra.

Sem palavras, com o coração desbocado, ela obedeceu.

—Dizes que viste mulheres ajoelhadas frente aos homens. Viste alguma vez um homem dar prazer assim a

uma mulher?

Ela negou com a cabeça, e perdeu totalmente a capacidade para emitir palavra alguma, quando ele introduziu

a mão entre suas coxas e acariciou brandamente suas delicadas terminações nervosas, a um ritmo lento, a um

ritmo enloquecedor que resultava... tão... incrível. Ela tinha se tocado, na escuridão, nas noites em que seu

corpo tinha gritado pedindo... algo. Mas embora tocar-se tinha sido prazenteiro, nunca se tinha sentido deste

modo.

Colin passeava prazerosamente sua outra mão por detrás das coxas de Alex, ao redor de suas nádegas,

seguindo a linha que as separava, provocando afogados gritos.

—Quero te ver. —E sua voz soava como veludo estragado—. Toda.

Colin afastou os dedos e Alex esteve a ponto de lançar um gemido de protesto, mas antes que chegasse a seus

lábios, com um suave movimento, a tomou em seus braços e a levou até o leito. Com o olhar fixo nela, sentou-a

no bordo do colchão e lhe separou as pernas com mãos ansiosas, ajoelhando-se entre suas coxas e colocando-

lhe as pernas sobre seus ombros. Os olhos de Colin ardiam com tal desejo que varreram o acanhamento de

Alexandra, desfizeram seu pudor, deixando só a curiosidade e o doloroso desejo. Apoiada sobre os cotovelos,

viu como Colin dirigia o olhar a sua exposta intimidade e gemia.

—Preciosa —disse, separando-a mais com os dedos e medindo-a com suaves e perfeitas carícias—. Tão

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húmida, tão sedosa e quente.

Tomou suas nádegas com as mãos e depois se inclinou. Alex afogou um gemido quando notou pela primeira

vez o tacto incrível da boca dele contra sua intumescida carne. A inesperada sensação da sua língua

acariciando-a e a visão de seu cabelo negro submerso entre suas coxas abertas era a imagem mais erótica e

excitante que jamais tinha visto. Com um comprido gemido de prazer, deixou-se cair sobre o colchão e torceu a

colcha, desfrutando daquela sensação, que fazia com que seu sangue ardesse.

Só existia ele. Seus lábios, sua língua, seus dedos eram implacáveis, e tal como ele tinha querido sua

impaciência cresceu ainda mais. Sem vergonha alguma, arqueou as costas empurrando-se contra sua boca, com

todos os músculos em tensão. O prazer percorria todo seu corpo, crescente e tumultuoso na parte baixa de seu

ventre, apertando-a, levando-a, empurrando-a para algo que não conseguia alcançar. Até que Colin fez algo...

algo mágico concentrando sua boca em um lugar deliciosamente sensível...

Apertando os punhos contra a colcha, Alex arqueou as costas e separou ainda mais as pernas. Durante vários

segundos e sem fôlego, soube que estava ao bordo de um precipício e então sentiu que se elevava por cima dele

e um jorro de prazer banhou seu corpo de espasmos até que, com muita rapidez, as intensas sacudidas se

apagaram, para dar passo a um suave e formigante fluxo que a deixou lânguida e sem forças.

Notou que ele se movia e abriu os olhos para ver como percorria seu corpo com suaves beijos e, depois de um

último beijo no pescoço, apoiou a parte baixa de seu corpo sobre ela e, aguentando seu peso com os antebraços,

olhou-a. Quando seus olhares se cruzaram, Alexandra emudeceu ante o ardor em seus olhos.

—Alexandra —murmurou Colin.

Pronunciou essa simples palavra com uma paixão tão potente que lhe cortou a respiração. Alex levantou o

braço que jazia lânguido e posou a mão em sua bochecha.

—Colin.

Sentiu um calafrio quente por todo o corpo ao notar a pressão de Colin, totalmente vestido e erecto, contra sua

suave pele nua. Sem desviar o olhar de seus olhos, Colin voltou a cabeça e beijou-lhe a mão.

—Estás bem? —perguntou roçando-lhe os dedos com seu quente fôlego.

—Estou... — Apagou-se a voz. Não podia descrever esse delicioso estado de frouxidão—. Sem fôlego. Sem

palavras.

Nos lábios de Colin formou-se um sorriso malicioso.

—Sem fôlego e sem palavras. Suponho que isso faz que esteja... sem «alienabras».

—Sempre que estou perto de ti —disse ela afastando uma grossa mecha de seu sedoso cabelo do braço dele.

—Sempre que estou perto de ti —repetiu ele e inclinando-se a beijou com um beijo suave, profundo, luxurioso,

íntimo, um beijo que sabia a ele, a ela, a paixão, um beijo que reavivou em Alex a chama que Colin acabava de

apagar.

Quando deixaram de beijar-se, ela o olhou nos olhos desejando ler sua expressão inescrutável.

—Agora já sei a que se deve toda a animação —disse brandamente—. Não tinha nem idéia de que pudesse

sentir-me... assim.

—O prazer foi meu.

—Asseguro-te que também foi meu. Agora sei o que é derreter-se... derreter-se de impaciência.

—Ah, impaciente, assim que me saí com a minha.

—Sim, e agora quero me sair eu com a minha.

—Impaciente, exigente, duas qualidades deliciosas em uma mulher nua. E respeito a seus desejos, já te disse

antes que só tens que pedir.

Ela arqueou debaixo dele, apertando seu ventre firmemente contra a dura crista de sua erecção.

—Quero que esteja impaciente.

—Asseguro-te que isso está feito.

—Mais impaciente, e nu. Tinha começado com tua gravata quando me distraíste subtilmente.

—Assim actuamos os espiões, com tácticas subtis. De todos os modos, estou mais que encantado de cumprir

com tua petição.

Beijou-a brandamente nos lábios e depois ficou em pé e a ajudou a fazer o mesmo.

—Quero te dar prazer —disse Alexandra, deitando uma olhada à óbvia protuberância sob suas calças—, mas

não estou certa do que tenho que fazer.

—Não há nenhuma possibilidade de que não me dares prazer, e em relação ao que tens que fazer, ajudarei-te.

—E tomando suas mãos as levou a peito—. Tire a minha camisa.

Alexandra arqueou as sobrancelhas e perguntou:

—Promete-me que estarás quieto e não me distrairás de novo?

—Não —disse tomando-lhe o peito com as mãos imediatamente.

—Bom, pelo menos é honesto —replicou ela rindo.

Tomou o rosto entre as mãos e a olhou com uns olhos súbitamente sérios.

—Sim, sou-o. Devido à natureza de meu anterior trabalho, nem sempre o fui. Mas contigo...

Alexandra apertou as gemas de seus dedos contra os lábios dele para fazê-lo calar. Visto que ela tinha sido

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pouco honesta no passado, atormentava-lhe ouvir declarações de sinceridade de sua parte. Por um louco

instante pensou na possibilidade de lhe contar seu sórdido passado mas imediatamente afastou a idéia de sua

mente. O seu tempo juntos ia ser efêmero. Não tinha sentido cortá-lo ainda mais com confissões que, ao cabo

de muito pouco tempo, não iriam ter importância.

Afastando-se de seus braços, Alexandra moveu a cabeça com um sinal negativo.

—Quero que estejas quieto. De acordo?

—Estou de acordo em tentá-lo. —E seus verdes olhos brilharam.

Alexandra arqueou uma sobrancelha.

—Se não o estiveres, acredito que mereces saber que corro muito rápido.

—Eu sou mais rápido —replicou ele esboçando um lento sorriso com seus formosos lábios.

—Duvido-o.

—Também estou vestido. Os lugares aos que poderis correr em teu estado actual —disse, e seu olhar percorreu

perezosamente todo seu corpo nu, inflamando-se de novo— são mais bem limitados.

—Não vais estar vestido por muito tempo —disse ela aproximando-se de novo dele e ocupando-se de sua

gravata.

Colin permaneceu totalmente quieto, tentando atenuar sua ardente ansiedade, mas era terrivelmente difícil

tendo-a só a um passo, com o cabelo revolto por suas mãos, os lábios inchados e húmidos por seus beijos, a

pele brilhando depois do clímax, e os aveludados mamilos erectos pelo efeito de sua boca. A fragrância que

emitia, a doces laranjas mesclada com o almíscar feminino, enchia o espaço que os separava e teve que apertar

os dentes para amortecer o desejo de beijá-la. Ela não queria que se movesse, e não ousaria fazê-lo, menos

ainda quando estava tão ao ponto de perder o controle.

Depois do que pareceu uma eternidade, Alex acabou de desfazer o nó da gravata e Colin tomou nota

mentalmente para fazer um nó muito menos complicado a próxima vez. Depois, Alexandra tirou devagar a

larga peça de linho do pescoço mas, em lugar de deixá-la cair no chão, lançou-lhe um olhar malicioso e a

colocou ao redor do seu pescoço, como uma jibóia.

Colin olhou a longa peça branca e, imediatamente, sua imaginação e disparou e viu Alexandra em sua cama,

nua, com os pulsos atados...

Mas teve que deter sua imaginação quando lhe extraiu a camisa fora das calças e o suave tecido deslizou por

cima de sua ansiosa erecção. Todo seu membro estremeceu e teve que afogar um grito. Desabotoou-lhe a

camisa, abrindo-a e deixando o peito a descoberto. Colin tinha os ombros em tensão e se viu forçado a relaxá-

los para que ela pudesse deslizar a peça de roupa por seus braços. Esperava que se limitasse a deixar cair a

camisa ao chão mas a apertou contra seu peito e afundou o rosto no tecido.

—Ainda tem o calor de teu corpo —sussurrou. Fechou os olhos e tomou ar com força, deixando-o escapar

depois em um comprido suspiro—. Leva teu aroma. Nunca pensei que um homem pudesse cheirar tão

maravilhosamente.

Vendo como abraçava sua roupa, sentiu uma quebra de onda de ternura e paixão que o obrigou a apertar os

punhos. E Alexandra o surpreendeu de novo ao vesti-la.

—O que opinas? —perguntou-lhe dando a volta com um sorriso brincalhão nos lábios.

Colin contemplou a estreita linha de pele pálida que deixava entrever a roupa, deteve a vista na fenda do seu

umbigo e continuou depois para baixo até à encantadora sombra de seus escuros cachos entre as coxas. As

mangas da camisa cobriam as mãos de Alexandra e as pontas enrugados da camisa chegavam até à metade das

sua coxas. O pulso de Colin, já enloquecido, acelerou ainda mais ao contemplá-la assim, tremendamente

erótica, com o cabelo desordenado caindo sobre os ombros e vestindo suas roupas masculinas.

Teve que esclarecer a garganta para poder falar.

—Acredito que te assenta melhor a ti que a mim.

Alex lançou-lhe um sorriso e, enrolando as mangas da camisa, olhou-o fixamente e disse:

—Acredito que ficavas bem com ela, mas devo dizer que está melhor sem ela.

—Obrigado... —respondeu Colin e ao contacto das mãos dela sobre seu peito, emudeceu.

Alex desceu com as mãos por seu corpo e ele fechou os olhos e deitou a cabeça para trás, decidido a manter o

controle e a saborear cada uma de suas carícias. Mas os dedos de Alexandra faziam que todos seus músculos se

contraíssem e aquelas carícias, ao princípio indecisas, fizeram-se mais audazes. Colin lançou um grito de

prazer.

— GostaS disto? —perguntou ela esfregando os dedos contra seus mamilos.

—Aaah... Não estou certo. Fá-lo outra vez —respondeu Colin e notou o fôlego de sua risada contra o centro de

seu peito antes de apertar os lábios contra sua pele.

Levantou a cabeça e viu como beijava todo o seu torso, o acariciando ao mesmo tempo os ombros e os braços.

Um tremor percorreu seu corpo quando Alexandra se aventurou a passar a língua por seu mamilo, um tremor

que soube, por seu feminino sorriso, que ela havia sentido.

Maldita seja, apenas o havia tocado e estava tremendo. Como ia sobreviver a doce tortura que o esperava?

Ela passou a língua por seu mamilo de novo.

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—Gostei quando fizeste isto em mim . Tu gostas?

—Sim, se tu gostares de algo, há muitas possibilidades de que também eu goste.

—Já vejo —disse Alex, e passou um só dedo por sua pele justamente por cima do cinturão que prendia as suas

calças.

Colin conteve a respiração.

—É muito... masculino —disse passando as mãos pelo abdômen até chegar aos ombros—. Muito musculoso e

forte.

—Neste momento estás pondo à prova minha fortaleza, podes ter certeza.

—Bem. E onde esta a tua paciência?

—Em tensão.

—Como posso esticá-la mais? —Alexandra sorriu.

— Beija-me.

Sem vacilação, colocou as mãos em redor do pescoço e o fez baixar a cabeça. Deixou-lhe tomar a iniciativa e

gemeu quando lhemeteu a língua pelo lábio inferior. Alex ficou nas pontas dos pés, apertando-se contra seu

corpo e a cabeça do Colin deu voltas. Ao contacto de sua cálida pele contra seu peito nu, seus duros mamilos

apertando-se contra ele, sua língua invadindo sua boca, esqueceu de forma instantânea que não devia mover-

se. Colocou as mãos pela camisa que agora ela vestia, e as desceu pelas costas até tomar as nádegas. Um

segundo mais tarde, Alexandra já não estava junto a ele.

—Prometes-te que terias as mãos quietas —disse a uns passos de distância, apontando-lhe com o dedo.

—Prometi tentá-lo, e o tenho feito, mas é impossível resistir.

—vais ter que ficar com as mãos quietas —disse entreabrindo os olhos e com um brilho malicioso—. E eu

acredito que poderei te ajudar.

—Não consigo pensar em nada que possas fazer que consiga que tenha menos vontade de te tocar.

—Posso.

E com o olhar fixo nele, Alex tirou lentamente a gravata do pescoço.

—Põe as mãos nas costas —disse.

Colin arqueou as sobrancelhas e notou como aumentava sua erecção.

—Tens realmente a intenção de me atar?

—Sim.

—Acredita, isso não fará que tenha menos vontade de te tocar.

—Mas fará que tenha menos possibilidades de o fazer.

— Acreditas nisso crie?

—Sou muito boa a fazer nós.

—E eu sou muito bom a os desfazer.

Os olhos da Alexandra brilharam com claro desafio.

—Queres que comprovemos quem é melhor...? A não ser que tenhas medo.

Mantendo-lhe o olhar, Colin pôs as mãos nas costas devagar.

—Justamente o contrário. Tenho uma enorme curiosidade. De todos os modos, em favor do jogo honesto,

considero que é justo que te advirta que uma vez que me tenha libertado, não vou fazer nenhum esforço por

não te tocar. Tocarei-te como e onde deseje.

—Parece-me justo. De todos os modos, acredito que já tocas-te em todas as minhas partes.

—Minha doce Alexandra, não comecei absolutamente a te tocar tal como pretendo fazê-lo.

Ante suas suaves palavras, Alex o olhou com os olhos cheios de interesse e o desejo do Colin se avivou. Podia

não ter experiência, mas era ousada, e nada covarde. Havia dito a verdade quando tinha afirmado que não era

tímida. Tinha planejado seduzi-la e, pelo contrário, tinha sido ele o seduzido. Nunca antes uma mulher tinha

cativado sua mente e seu corpo desse modo.

Colin colocou as mãos nas costas e Alexandra ficou detrás dele. Quando terminou, disse:

—Isto deverá manter-te bem preso.

Colin moveu os pulsos para comprovar os nós.

—Parece um bom trabalho. —Olhou-a por cima do ombro—. Não há dúvida de que me tens virtualmente a tua

mercê.

—Não estou certa de ter ouvido nunca uma afirmação tão provocadora, replicou Alexandra, e apoiando as

mãos em seus ombros, baixou-as lentamente por suas costas. Aproximou-se e apertou os lábios contra sua pele.

Colin agarrou ar e apertou os dentes para conter-se e não esfregar as mãos atadas contra o ventre da

Alexandra.

—Acredito que está tentando tornar-me louco —grunhiu.

—Funciona?

—Terrivelmente bem.

Alex acariciou lenta e brandamente as costas e os braços enquanto com seus lábios beijava-lhe a coluna. Colin

fechou os olhos aspirando a suave exploração, rezando para manter o controle e não ejacular em suas malditas

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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calças.

Alexandra deu lentamente a volta até ficar frente a ele e Colin viu como deslizava os dedos por seu peito.

Quando alcançou as calças, ficou totalmente quieto, estranhamente despreocupasdo.

Fechou os olhos e gemeu ao primeiro contacto dos dedos do Alex sobre seu membro ereto.

—Outra vez —disse bruscamente.

Ela assim o fez, percorrendo a longitude de seu membro devagar e tomando-o depois na palma da mão. Colin

sentiu que ardia. Maldita seja, queria que continuasse a o tocar, imediatamente. Levantou a vista e seus olhares

se encontraram.

— Desabotoa-me as calças, Alexandra.

Alexandra começou a lhe desabotoar as calças e Colin apertou a mandíbula para manter-se quieto. Ao fim,

depois do que pareceu uma eternidade, ficou livre. A espera ante sua carícia era dolorosa de tão intensa, e

quando ela percorreu a longitude de seu membro com o dorso de seus dedos, tomou ar bruscamente e fechou

os olhos de repente.

—Tenho-te feito mal? —perguntou Alex.

—Não, Deus, não, não pares.

Ela o acariciou de novo, esta vez com mais segurança, e depois de tomar ar profunda e tremulamente, Colin

abriu os olhos e olhou para baixo, para ver as mãos da Alexandra deslizando sobre ele, acariciando-o,

tomando-o. Todo ele ardia, e seus músculos estavam tensos e trementes esforçando-se para não empurrar.

—Está tão duro... —disse Alex.

—Nem o imaginas —grunhiu ele.

—E tão quente...

Certamente, porque sentia que estava a ponto de estalar. Com a gema do dedo, Alex traçou um círculo na

inchada ponta de sua erecção.

—Não pode imaginar quão incrível resulta isto —murmurou Colin com uma voz grave que nem ele mesmo

pôde reconhecer.

Alex rodeou o membro com os dedos e esticou brandamente, fazendo que suas virilhas se esticassem. Emergiu

uma gota perlada e Alexandra humedeceu com ela a ponta de seu pênis. Colin já não pôde aguentar-se mais e

empurrou movendo os quadris para diante.

—Está impaciente? —sussurrou ela.

—Mais que isso —piscou os olhos Colin.

E fazendo uns movimentos de alguém muito bem treinado, libertou os pulsos e a tomou em seus braços.

Alexandra lançou uma exclamação de surpresa que Colin afogou com um beijo. Pondo-lhe a mão sobre o

cabelo, imobilizou-lhe a cabeça para beijá-la com uma anseia e desejo reprimidos que o estavam rasgando por

dentro. Com a mão livre tomou a coxa de Alex e a levantou apoiando-a sobre seu quadril, abrindo-a para suas

carícias.

Acariciou suas nádegas com a palma da mão aberta e roçou brandamente com os dedos, desde atrás, suas

dobras femininas e os sentiu sedosos,h úmidos, inchados. Graças a Deus, porque não acreditava que pudesse

aguentar muito mais.

Colin queria excitá-la com premeditada lentidão, ralentizar o ritmo veloz de seu coração, mas ela se retorcia

contra ele, esfregava o ventre contra sua erecção, acariciava-lhe a pele e conseguia tudo menos acalmá-lo.

Sabendo que estava a ponto de perder a batalha, agarrou-a em seus braços e a conduziu à cama, deixando-a

cair sobre a colcha delicadamente. A camisa abriu e também suas pernas e Colin, durante vários segundos,

ficou de pé hipnotizado ante a visão do Alex nua, ruborizada, excitada, brilhante, húmida, para ele. A mulher a

que tinha esperado durante anos.

Negou-se a esperar um instante mais.

Colin não se deteve nem para acabar de despir-se. acomodou-se entre as pernas abertas dela e, apoiando-se em

seus fortes braços, roçou os cachos e as sedosas dobras do Alex com a ponta de sua erecção. Olhou-a aos olhos

e entrou lentamente nela, embriagado pelo recebimento de sua carne húmida e aveludada, detendo-se quando

alcançou a barreira de sua virgindade.

—Não quero te fazer dano —conseguiu dizer.

—Serei eu que te faça mal se parares agora.

Teria arrojado uma gargalhada se tivesse podido, mas o único que era capaz naquele momento era de

continuar empurrando, e assim entrou em Alexandra profundamente e emitiu um gemido. Por todos os

diabos! Ela estava tão húmida e apertada e ele tão duro e ao limite... Apertou os punhos e fez um esforço por

ficar quieto, por não se deixar levar pela desesperada necessidade de tomá-la com longos, profundos e duros

empurrões.

Ela o estava olhando com os olhos muito abertos, cheios de surpresa e indecisão.

—Estás bem? —perguntou-lhe ele.

Ela assentiu devagar, logo com mais convicção.

—Sim, e tu?

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Estou morrendo, pensou Colin.

—Sim, estou bem.

—Sinto-me... cheia. Todos os homens receberam uma... bênção como a tua.

Deus. Estava tremendo, mal podia pensar, quase nem respirar, e ela esperava que respondesse?

—Não sei, agora mesmo, apostaria que sou o homem com a maior das bênções de toda a Inglaterra. E também

o mais... impaciente.

—Excelente, porque quero experimentar tudo. Há mais, verdade?

—Sim, há mais —ofegou Colin.

E incapaz de permanecer quieto nem um instante mais, muito devagar saiu quase até o final, para afundar-se

de novo em seu húmido calor, seu corpo apertando-o como um punho de seda. Continuou com aquelas

penetrações longas, lentas e profundas e viu como a vacilação da Alexandra dava passo a um desejo que a fez

agarrá-lo pelos ombros, contorcer-se debaixo dele, primeiro descompasadamente, e depois acompanhando-o

em cada movimento . A respiração de Colin tornou-se rude e entrecortada, e sentiu arder seus pulmões com

cada nova baforada de ar. Invadido pelo anseia, acelerou seus movimentos e então Alexandra fechou os olhos,

apertou-lhe os ombros, arqueou as costas, e de seus lábios abertos escapou um leve grito. Colin empurrou

profundamente até cravar-se em seu interior. Depois se deteve e a contemplou sentindo seu clímax rodear,

apertar, aprisionar seu membro. E no instante em que o corpo da Alexandra começou a extenuar-se, saiu dela,

abraçou-a e apertou sua erecção entre seus corpos suarentos. Colin afundou seu rosto na cálida e perfumada

curva do pescoço de Alex e se deixou ir, lançando um gemido gutural.

Quando deixou de tremer, levantou a cabeça e viu Alexandra olhando-o com uma expressão aturdida e

perplexa. Suspeitava que era a mesma expressão que teria ele. Moveu-se para passar para o outro lado e não

esmagá-la, mas ela apertou os braços ao redor de seus ombros e negou com a cabeça.

—Não vás —sussurrou.

Invadiu-o uma cálida ternura, algo que nunca havia sentido antes, e acariciou-lhe delicadamente a bochecha.

—Não estou indo. Simplesmente não te quero esmagar.

—Não esmagas. Teu corpo sobre o meu, tua pele contra a minha, teu peso... tudo é maravilhoso. Sempre tenho

frio e agora, bom, nunca em minha vida me tinha sentido tão deliciosamente quente.

«Sempre tenho frio.» Por sua mente passou a imagem de Alex paralizada de frio, faminta, suja, desesperada, e

entristeceu-lhe o coração. Não estava certo do que dizer; ficou sem palavras. O único que podia fazer era olhá-

la fixamente e perguntar-se... como uma mulher sem experiência sexual podia ter conseguido agradá-lo mais

que qualquer outra anteriormente. E alterar seu coração também, como nunca antes ninguém o tinha feito.

antes de que pudesse falar, ela disse:

—Não acreditas que não dei conta de que foste capaz de desfazer os nós. Atei-te muito bem. Como o

conseguiste?

—Trata-se de um simples truque que aprendi durante minha época de espião.

—Estou impressionada.

—Sou um tipo impressionante —disse ele com um sorriso.

Alexandra lançou um comprido e prazenteiro suspiro.

—Não serei eu quem te contradiga.

Colin percorreu seu rosto com o olhar, detendo-se em um escuro cacho que cobria sua bochecha. Olhou aquela

mecha sedosa e logo tomou entre seus dedos. Segundo a sessão de cartas, o perigo que o espreitava estava

relacionado com uma mulher de cabelo escuro, e de repente se deu conta de que a forma em que o fazia sentir

aquela mulher de cabelo escuro podia lhe resultar perigoso. Não do modo em que seu instinto o tinha

advertido, mas sim de uma maneira que suspeitava podia ser igualmente fatal.

Porque podia facilmente fazer perigar seu coração.

Capítulo XVI

Alex despertou lentamente e piscou ao notar os raios brilhantes de sol que entravam pelas janelas. Sol? Que

horas eram?

Incorporou-se na cama apoiando-se sobre um de seus braços. Ao notar a suavidade entre suas pernas,

estremeceu. Voltou o olhar entrecerrado pelo sono para o relógio situado em cima da chaminé. Abriu os olhos

de par em par. Nove? Nunca tinha dormido até tão tarde! Nunca dormia mais de umas poucas horas seguidas.

As lembranças a invadiram de repente e baixou a cabeça para o travesseiro vazio junto dela. Ainda se podia

notar a forma que tinha deixado o peso de Colin. Fechou os olhos e respirou profundamente: o travesseiro

ainda conservava seu aroma.

Notou como um quente rubor percorria todo seu corpo e, com um suspiro, tombou-se, abraçando o travesseiro

vazio. O suave tecido acariciou seus sensíveis mamilos, e fechou os olhos recordando vivamente a incrível

sensação das mãos e a boca do Colin acariciando seus seios. Um bombardeio de imagens sensuais a invadiu,

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mas não fez esforço algum por afastá-los mas sim desfrutou em cada um deles: a imagem de Colin limpando a

evidência de seu acto de amor; tirando-lhe roupa que ainda vestia; explorando seu corpo com uma delicada

paixão que a deixava sem fôlego; lhe ensinando como tocar nele, o que lhe dava prazer e o excitava, e depois

encontrando múltiplos modos de agradar e excitá-la a ela; animando sua curiosidade, impedindo que se

sentisse de modo algum envergonhada ou inibida; e depois fazendo-lhe amor de novo, com tanta intensidade

que acabou desfalecendo em seus braços, lânguida, saciada, deliciosamente desfeita.

O recordava por último era haver-se acurrucado contra ele apoiando a cabeça em seu ombro, a mão em seu

peito absorvendo o batimento do coração acelerado de seu coração, com a perna cruzando seu corpo e ele

posando seus lábios contra sua têmpora e murmurando seu nome. Nunca antes em sua vida se havia sentido

tão a salvo, tão cálida e segura.

Certamente, agora entendia o porquê de tanto animação sobre o tema, conhecia esse desejo maravilhoso e

terrível que precisava ser satisfeito, entendia por que homens e mulheres se metiam em becos escuros para

descarregar seus luxuriosos impulsos.

Face à impressão negativa, que lhe causavam aqueles encontros furtivos nos becos, não tinha havido nada

sórdido no que tinha compartilhado com o Colin. Tinha sido tudo o que ela sabia que ia ser: terno, paciente,

formoso. E por razões que não podia entender, estava claro que ele a desejava. Um homem que podia ter a

qualquer mulher que quisesse, por que diabos ia querer a ela?

Não te quereria, nem por um instante, se soubesse o que foi realmente, o que foste, como viveste, disse-se.

Para sua surpresa e mortificação, humedeceram-lhe os olhos. Que diabos se estava passando? Ela nunca

chorava. Certamente, não o tinha feito desde que era uma menina, desde dia em que tinha sujeito a mão de sua

mãe e tinha visto expirar a única pessoa que tinha no mundo.

Secou-se as lágrimas com impaciência, pôs o travesseiro a um lado com decisão e se levantou. Não havia razão

alguma para sentir-se tão extranhamente emotiva. Simplesmente não estava acostumada à intimidade que

tinham compartilhado e que de maneira imprevisível tinha afectado seu coração. Isso explicava aquelas

sensações e aqueles sentimentos novos que nesses momentos a faziam vulnerável e volúvel. Devia mantê-los

controlados para evitar que a semente que muito temia, já se tinha plantado em seu coração, crescesse.

Cruzou o quarto e dirigiu-se para o conjunto de vasos de porcelana que havia em uma esquina, deteve-se

diante do espelho de pé e olhou fixamente à mulher nua que se reflectia nele. Tinha os olhos muito abertos, o

cabelo solto e alvoroçado, a pele reluzente e os lábios inflamados pelos beijos. Para ela, era evidente que em

seus olhos existia um brilho de conhecimento carnal que não tinham tido antes. Notaria-o alguém? Emma, sem

dúvida, mas esperava que só porque era seu amiga e a conhecia muito bem.

Estudou seu reflexo durante vários minutos, tentando ver o que Colin via, a razão pela que, a tinha escolhido a

ela, mas não podia averiguá-lo. Não podia ser por sua formosura porque simplesmente não era formosa. Suas

feições eram irregulares e não havia comparação entre ela e as impressionantes e elegantes jovens que

frequentavam a temporada. Entretanto, ele tinha declarado que era deliciosa. Era possível que Colin

necessitasse óculos?

Mostrou-se extraordinariamente encantado por seu corpo, mas, em sua opinião, seu corpo não diferia em

modo algum do de qualquer outra mulher, excepto por uns centímetros de altura de mais, em comparação com

a altura que naqueles tempos se considerava adequada para as jovens. Podia ser que se comportasse do mesmo

modo com todas seus amantes.

Esfregou os olhos e moveu a cabeça tentando separar de sua mente a imagem do Colin beijando, tocando,

fazendo amor a outra mulher. Logo o estaria fazendo, e com outra mulher que não só seria sua amante mas

também sua esposa, uma mulher que ela nunca poderia chegar a ser.

Assim simplesmente devia concentrar-se em desfrutar de do breve tempo que íam compartilhar, em recordar

quão magicamente a tinha feito sentir-se, quão segura e cálida se sentou entre seus braços. E depois, deixaria-o

partir.

Abriu os olhos, ergueu as costas e dirigiu-se para a bacia. Ao aproximar-se, viu um pequeno pedaço de papel

perto de um suporte de livro de madeira. Acelerou o passo e ficou olhando fixamente o papel e o pequeno

objecto que havia junto a ele. Esticou a sua mão tremula, agarrou a nota, desdobrou o papel e leu a breve

mensagem:

Uma noite deliciosa com uma mulher deliciosa merece um presente delicioso. Desfruta da surpresa que

esperavas tão deliciosamente impaciente. Até mais tarde...

Agarrou o único mazapán que havia junto à nota, que parecia uma perfeita laranja em miniatura. O coração

deu um tombo e depois se afundou em um poço de emoções de que duvidava pudesse resgatá-lo nunca. «Até

mais tarde...»

Que Deus tivesse piedade dela, não podia esperar.

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Colin percorria a sala de lorde Wexhall esperando impacientemente que aparecesse seu irmão.

— Pequeno presente —murmurou, olhando ao vulto de pelo negro que dormia em seus braços.

Maldito seja. Deveria ter sabido que Nathan faria algo assim, obrigá-lo a que acolhesse um dos animais de sua

propriedade, dizendo que era um presente. Pois não estava disposto. Se dava a mínima opção a seu irmão,

sempre rodeado de animais, logo não só viveria com um cão, mas também com gatos, cabras, porcos, patos e

vacas, e Deus sabia que outra classe de animais. O cachorrinho moveu em seu sono, suas brandas orelhas e

Colin suspirou.

É obvio, Nathan não lhe tinha oferecido simplesmente um cachorrinho. Tinha-lhe oferecido um cachorrinho

absolutamente adorável e irresistível, dos que enternecem o coração. Mas devia resistir, porque se não o fazia,

sabia que àquele inocente e doce cão, o seguiria um inacabável desfile de animais de granja. Assim, assim que

aparecesse Nathan, simularia total indiferença e poria ao cachorrinho nas mãos de quem o tinha entregue. A

lata do irmão. Quão único podia dizer em favor do presente de Nathan, era que tinha obtido a impossível

missão de que seus pensamentos se ocupassem de algo, que não fosse Alexandra.

Alexandra. Sua imagem iluminou sua mente e teve que parar imediatamente. Alexandra, nua e saciada, com os

lábios abertos e os olhos carregados de frouxidão sexual, esticando os braços para ele. Alexandra, adormecida,

seu flexível corpo acurrucado contra ele. Tinha-a abraçado com força, aspirando o aroma de seu cabelo, sua

pele, beijando-lhe brandamente nas têmporas, revivendo cada momento de sua paixão até os ter gravados

indelevelmente em sua mente.

Normalmente, depois da paixão, estava acostumado a partir. Preferia marcar distâncias com suas amantes.

Mas a sensação de ter a Alexandra adormecida entre seus braços tinha banhado todo seu ser com uma paz que

nunca antes tinha experimentado. Partiu quando as primeiras luzes do amanhecer apareceram no céu da noite,

e então teve que fazer um esforço para ir-se. Só tinham passado quatro horas desde que tinha deixado o leito

de Alex, e parecia que tinham sido quatro décadas.

—Bom dia, Colin.

A alegre voz de Nathan o tirou de sua cisma. Deu a volta e viu seu irmão dirigindo-se para ele. O olhar de

Nathan desviou para o cachorrinho e seu rosto se iluminou com um sorriso.

—Ah! Vejo que finalmente descobris-te teu presente. Dei-o ao Ellis, que me assegurou que cuidaria dele até

deixá-lo em tuas mãos.

— Num momento em que não tivesse perto, para não poder te devolver o bicho.

O sorriso do Nathan não mostrava nenhum arrependimento.

—Precisamente. A coordenação é uma arte, como o é o emparelhamento. Bastou-me um olhar a esse

cachorrinho, para saber que seu destino estava contigo.

—Não ousaria te privar da companhia deste animal. Assim que tu devolvo .

Mas, maldito seja, inclusive pronunciando as palavras, seus braços seguiam embalando ao cão adormecido.

—Tolices. Um homem que prevê perigo em sua vida, deve ter um bom cão de guarda.

—Pode ser, mas não acredito que consideres que este é o cão para essa tarefa. Pelo que vi, so se dedicou a

lamber e aporrinhar. De facto, quão único este animal sabe fazer é dormir, comer, morder botas, fazer pipí nas

flores e ladrar de um modo ensurdecedor, precisamente, quando a gente está tentando dormir.

—Isso descreve a qualquer cachorrinho, e essa é a razão pela que são tão incrivelmente adoráveis. Tentam

compensar essas características não tão agradáveis que descreves-te.

—São essas características não tão agradáveis, as que me têm feito não comprar um cachorrinho.

—Têm-te feito não comprá-lo, mas não tre têm feito não desejá-lo.

—Não desejo...

—claro que sim. Simplesmente és muito teimoso para admiti-lo. Olha com que perfeição Narcisista se adapta a

teus braços.

Colin piscou e olhou ao teto.

—Narcisista? Deus santo. Que nome é esse para um cachorrinho macho?

—É obvio, estaremos encantados, de que o salve de uma vida condenada à vergonha e o rebatize. Estou certo

de que te agradecerá isso.

—Tens sorte de que não te mordesse o braço por lhe colocares semelhante nome. Mas é tu é que terás que

rebatizá-lo, porque eu não o quero.

—por que não?

—Porque te conheço e sei que se o fizer, outras criaturas com nomes tipo Casulo de Rosa, Lilás, Hortênsia,

Lírio e Crisântemo o seguirão, e minha casa parecerá uma granja.

Nathan fcolocou a mão sobre o coração.

—Tem minha palavra de que nenhum animal com o nome de Casulo de Rosa, Lilás, Hortênsia, Lírio ou

Crisântemo virá depois deste.

Colin franziu o cenho: conhecia sobejamente os truques de Nathan.

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—Nem Gardênia, Delfinio nem nada parecido.

—De acordo. De facto, dei de presente Narcisista não só para te proteger.

—Excelente, já que muito temo que não servirá...

—Mas também para te conseguir uma noiva.

Colin olhou perplexo seu irmão.

—Perdão?

—Noiva —repetiu Nathan, marcando cada sílaba devagar como se falasse com um menino pequeno—. Leva

Narcisista a dar um longo passeio pelo Hyde Park e, acredita, não há nada como um cachorrinho brincalhão

para chamar a atenção das mulheres. Podes reduzir tua busca de prometida recusando, qualquer dama que

não se sinta imediatamente cativada pelo teu adorável cachorrinho, já que indicará que não tem coração e não

merecerá nem tua admiração, nem evidentemente converter-se em tua esposa e levar o título de viscondessa do

Sutton. —E estendendo as mãos e sorrindo acrescentou—: Vês que útil sou?

—Acredito que útil não é a palavra que utilizaria agora mesmo para te descrever —murmurou Colin.

Noiva. Viscondessa do Sutton. As palavras foram como uma sacudida e o recordaram que apenas tinha

dedicado um momento à verdadeira razão pela qual, tinha ido a Londres. Todos seus planos de encontrar

esposa tinham se dissolvido como açúcar em chocolate quente, no momento em que tinha visto Alexandra.

Como se pensar nela tivesse sido um conjuro, apareceu na soleira da porta por trás de Peters, o impecável

mordomo de lorde Wexhall, que esclareceu garganta e anunciou:

—Madame Larchmont.

Depois afastou-se, Alexandra ficou sozinha na ombreira da porta, como um quadro. Ia vestida com um simples

e austero traje marrom e levava o cabelo recolhido em um coque na nuca. Mas mesmo assim cortou~-lhe a

respiração. Quando seus olhares se cruzaram, Colin não surpreendeu que seus pulmões deixassem de

funcionar durante vários segundos. Teria jurado que nesse simples olhar entre eles, circulou algo íntimo e

quente. O fluxo de lembranças sensuais era tão potente que o transbordou, alagando-o de calor e luxúria e

necessidade, um desejo quase insuportável de atravessar a sala, tomá-la entre seus braços e passar o resto do

dia mostrando-lhe exactamente quanto tinha sentido falta dela.

Sentir falta. Era absolutamente ridículo, que pudesse sentir a sua falta após uma ausência tão curta, mas não

podia negar que assim era. Era como se, desde que a tinha deixado, tivesse estado sob uma nuvem e então, ao

aparecer de novo, tivesse saído o sol, dando calor, o enchendo de energia. E de um profundo desejo de tocá-la,

beijá-la, estar perto dela.

—bom dia, cavalheiros —disse Alex entrando na sala.

—bom dia —murmurou ele, sabendo mas sem lhe importar que seu agudo irmão daria conta de como a

devorava com o olhar.

—bom dia, madame —disse Nathan—. Espero que tenha dormido bem.

—Assim é, obrigado —disse ela—. Acabo de ver lady Vitória na sala do café da manhã, e perguntava se ia

reunir-se com ela.

—Um convite que nunca recusaria —disse Nathan sorrindo —. Se me desculparem...

Começou a cruzar a sala mas, antes de chegar à porta, o olhar de Alexandra posou no vulto que tinha Colin

entre os braços e abriu os olhos de par em par.

—OH, Meu Deus —disse com um sorriso nos lábios, uns lábios que ainda tinham a marca de seus beijos—.

Que cachorrinho tão adorável!

Colin ouviu a risada afogada de Nathan já na porta e quando o olhou, seu irmão disse-lhe, apenas movendo os

lábios « eu disse-te», e depois, saudando com a mão, saiu e fechou delicadamente a porta atrás dele.

Alexandra parou frente a ele, com o olhar posto no desgraçadamente baptizado Narcisista, que continuava

dormido.

—Quem é este? —perguntou passando o dedo por o pelo quase negro do cachorrinho.

Colin demorou vários segundos em responder pois a cercania dela tinha o deixado com a mente em branco. E

além de não levar postas suas habituais luvas de renda. A visão de sua mão nua, produziu nele mais ardor do

que o devido. Sua pele desprendia um fresco aroma de sabão e laranjas, e olhou fixamente seus dedos,

recordando como tinham acariciado sua pele, como tinham percorrido seu cabelo e tinham abraçado seu

membro.

Em lugar de responder a sua pergunta, disse-lhe brandamente:

—Não tens as tuas luvas.

Ela levantou a vista do cachorrinho e Colin ficou petrificado ante o impacto de seus olhos e do ligeiro rubor

que coloriu suas bochechas.

—Disses-te que gostavas das minhas mãos.

Colin deu-se conta de que sentia uma satisfação desmesurada pelo evidente desejo do Alex de agradá-lo.

—Assim é —disse ele, e agarrando-a com o braço que tinha livre por detrás da cintura, aproximou-a para ele—.

E eu também gosto dos teus lábios.

Baixou a cabeça e a beijou, com a intenção de que o contacto fosse ligeiro e breve. Mas no instante em que suas

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bocas se tocaram, ela abriu os lábios e, com um gemido de desejo, Colin apertou-a contra ele e se deixou levar

pelo anseia desse profundo e íntimo beijo que levava desejando durante horas.

Nesse momento o pobre Narcisista moveu-se e lançou vários latidos. Alexandra afastou-se e Colin deixou

escapar um grunhido. Ambos olharam o cachorrinho. Os olhos do animal estavam alerta e sua língua rosa

procurava algo que lamber.

—Faz-nos saber que não gosta que o ignorem —disse Alexandra rindo-se, enquanto o cachorrinho começava a

lamber seus dedos.

—Que delícia —resmungou Colin.

Tentou lançar um olhar de ira à bola de pelo em movimento que tinha interrompido seu beijo, mas resultou

difícil mostrar-se severo quando a mulher e o cão pareciam tão encantados um com o outro.

— Gostaria de o agarrar?

—OH, sim —disse Alex esticando os braços.

Colin estendeu-lhe o vulto e olhou como Alexandra, com os braços estendidos, agarrava cachorrinho que se

movia extasiado.

—É tão doce... —exclamou. E acurrucó o cãozinho contra seu peito.

Quando afundou o rosto no pelo suave e negro do animal e o beijou delicadamente na cabeça, o cachorrinho

acalmou e deixou escapar o que parecia um suspiro de satisfação.

O maldito cão era esperto, decidiu Colin.

E também muito afortunado.

—É absolutamente maravilhoso —disse Alexandra, olhando Colin e sorrindo-lhe —. É teu?

—Sim —disse Colin sem vacilar—. É o presente que meu irmão mencionou. Nathan sempre me obsequia com

algo que necessita alimento e cuidados, assim não me surpreendeu. De facto, deveria me sentir aliviado por

não ter recebido um bando de gansos ou um rebanho de vacas como presente.

—Tem nome?

Olhou ao pequeno animal, acurrucado nos braços da Alexandra, com sua cabecita perfeitamente encaixada na

generosa curva de seus seios e disse:

—Lucky. Seu nome é Lucky. Afortunado...

—Um nome muito bonito... Lucky.

—E muito apropriado, dado que está perto de ti. —Deu um passo para ela e incapaz de não tocá-la, passou os

dedos por sua suave bochecha—. Como te encontras esta manhã?

—um pouco... durida, mas de um modo delicioso.

—Delicioso... —murmurou ele, inclinando-se e acariciando-lhe o pescoço com os lábios, isso descreve

perfeitamente a noite passada .

—Também estou muito descansada, para minha surpresa. Normalmente não durmo até tão tarde. É um

travesseiro muito cômoda.

Colin seguiu deslizando as mãos para baixo, desenhando sua clavícula e conteve a vontade de lhe dizer, que o

simples feito de tê-la abraçado enquanto dormia tinha dado tanta alegria e satisfação como fazer-lhe amor.

—Encontras-te a tua surpresa?

—Sim, obrigado. Estava delicioso. O trouxes-te de casa?

—Não, o agarrei do Nathan caminho de teu quarto. Sabia que teria provisões ocultas de doces. Conheço seus

esconderijos secretos.

—Conseguis-te agarra-lo no espaço de tempo que demorei para chegar ao meu quarto?

—Assim é.

—Minha mãe, sim que tens talento. Em mais de um sentido.

—Obrigado —disse Colin e deslizou ainda mais abaixo seus dedos até tomar seu seio. Alexandra afogou um

grito—. Estarias interessada em outra demonstração de meu talento? —perguntou ele acariciando com o dedo

polegar seu mamilo e notando como se endurecia por debaixo do tecido do traje.

—O que... idéia tens?

Como resposta, Colin afastou-se e tirou delicadamente o cachorrinho dos seu braços, deixando-o no tapete que

havia em frente à chaminé, onde o animal lançou um gemido e depois se acurrucó formando um novelo e ficou

adormecido. Colin atravessou a sala e fechou a porta com chave. O ruído da fechadura ressonou no meio do

repentino e tenso silêncio.

Deu-se a volta e dirigiu-se devagar para ela, desfrutando ao ver como seus olhos se abriam de par em par.

Quando chegou junto Alex, não se deteve, mas sim a tomou em seus braços, levantou-a do chão e seguiu

avançando.

—O que estás fazendo? —sussurrou ela rodeando o pescoço dele com os braços.

—Demonstrando o que ocupa meus pensamentos agora mesmo.

—Aqui? Agora?

Alcançou a parede e a apertou contra a madeira de mogno que a recubría.

—Aqui mesmo —sussurrou junto a seu pescoço, respirando sua deliciosa fragrância enquanto que com suas

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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mãos levantava-lhe as saias—. Agora mesmo.

—Mas e lorde Wexhall?

—Passará o dia fora.

—E teu irmão e lady Vitória?

—São enormemente lentos a comer.

—E se hoje não o são?

—Por isso fechei a porta com chave.

—Mas saberão o que estamos fazendo.

Entretanto, ao mesmo tempo que protestava, agarrou-lhe o cabelo e atraiu sua boca até seus lábios.

—Só se não nos damos pressa. Até que ponto está dolorida? —perguntou Colin, dando rápidos beijos nos

lábios de Alex enquanto falava.

—Não tão dolorida como desesperada.

—Graças a Deus.

Levantou-lhe as saias até a cintura e colocou a coxa da Alexandra sobre seu quadril, abrindo-a para acariciá-la

com os dedos.

Alexandra deixou escapar um agudo suspiro quando Colin introduziu a mão em seu interior, um som que

coincidiu com o gemido dele ao acariciar as sedosas dobras.

—Já estás húmida —ofegou contra sua boca.

Alexandra esfregou a mão contra sua erecção.

—E tu já estás duro.

—Constantemente. —E devagar introduziu profundamente um dos dedos em seu apertado calor—. E é

somente culpa tua. Temo que vai converter-se em um embaraçoso problema.

— Podes considerar que estou mais que disposta a colaborar.

—Uma oferta que não tenho nenhuma intenção de recusar.

E tirando a mão de seu corpo, desabotoou-se as calças tão rápida como lhe permitiram seus nervosos dedos.

Uma débil voz interior o avisou de que não estava mostrando a mais mínima delicadeza, mas um desejo feroz

e escuro apagou essa voz. Queria-a, necessitava-a, precisava estar dentro dela. Nesse momento.

No momento em que se libertou, tomou-a pelas nádegas e a levantou.

— Agarra-me com as tuas pernas —disse com uma voz que não logo que reconheceu—. E aguenta.

Uns segundos mais tarde, entrou em seu calor húmido e já não simulou controle algum. Tomou-a com longas,

duras e profundas sacudidas, apertando os dentes para conter sua imparavel necessidade de chegar ao clímax,

observando cada matiz do rosto acalorado da Alexandra, seus lábios abertos, seus olhos fechados, seus dedos

lhe apertando os ombros, até que gritou, arqueando as costas e notou como as paredes de seu interior se

convulsionavam ao redor de seu membro. No instante em que notou que ela se relaxava, saiu e apertou

fortemente a erecção contra o ventre dela, refugiou o rosto contra a cálida e fragrante curva de seu pescoço e o

orgasmo o percorreu como um relâmpago.

Quando cessou de tremer, levantou a vista e ela abriu os olhos. Durante vários segundos olharam-se fixamente.

Colin queria dizer algo, algo insustancial e engenhoso, mas já não estava a seu alcance. Aquela mulher não só o

havia destituído do seu controle, mas ao que parece também lhe tinha roubado o juízo. Assim disse a única

palavra que se sentia capaz de pronunciar:

—Alexandra.

Então inclinou-se e a beijou, introduzindo-se devagar na calidez aveludada de sua boca, saboreando-a,

desfrutando da erótica fricção de suas línguas, do aroma de sua pele quente e da paixão que tinham

compartilhado. O coração e pulsava com força contra as costelas e deixaram de beijar-se tão devagar como

tinham começado.

—Certamente, é um homem com talento —sussurrou ela, com a cabeça apoiada contra a parede.

—E tu és uma mulher deliciosa. Não te tenho feito mal, verdade?

—Céus, não. Embora ontem à noite foi lento e delicado e maravilhoso, não posso negar que há algo

extraordinariamente doce nesta aproximação mais brusca e rápida.

—Tomo nota obedientemente.

Na boca de Alexandra se formou um malicioso sorriso.

—Ardo em impaciência por ver qual vai ser tua próxima demonstração.

—Vendo o efeito que exerce sobre mim, vais o averiguarar muito em breve.

Baixou-a delicadamente, e quando Alexandra voltou a ter os pés sobre o chão, tirou um lenço do bolso.

—Deverias ir ao teu quarto para te arranjares antes de saírmos — disse limpando com cuidado a evidência de

sua paixão.

—Saírmos?

—Sim, estou aqui para te acompanhar nas tarefas que tenhas que fazer.

—Ah —replicou ela levantou as sobrancelhas com cepticismo—. E eu que pensava que estavas aqui para te

aproveitares de mim.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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Colin riu.

—E agora que já o fiz, podemos começar com tuas tarefas. E minhas.

—Quais são as tuas?

—Bom, em primeiro lugar, parece que tenho um cão para passear.

Capítulo XVII

Alex estava passeando pelo Hyde Park, e como no dia anterior durante o jantar, beliscou a perna

disimuladamente, bem forte. De novo a dor demonstrou que não estava em um sonho.

Entretanto, como podia ser real que ela, Alexandra Larchmont, um rato de rua e ex-ladra de Saint Giles

estivesse dando um passeio por Hyde Park, acompanhada por um visconde, um homem que não só era

atractivo, inteligente e rico, mas também seu amante?

Apertou os dedos ao redor do braço de Colin e notou que o duro músculo, que havia debaixo de seu elegante

casaco de cor azul escuro, era definitivamente real. Voltou a cabeça e o olhou deixando escapar um suspiro de

prazer.

Através das folhas dos olmos que se elevavam com o passar do passeio, filtravam-se os raios brilhantes do sol,

fazendo reluzir o negro cabelo de Colin e salpicando suas feicções de pontos dourados. Podia ser que em

algum lugar do planeta existisse um homem mais formoso, mas não conseguia imaginar como o podia ser.

Entretanto, não eram simplesmente suas bonitos feições o que a atraía com tanta força. Possuía cada uma das

qualidades que ela tinha sonhado que teria quando o viu pela primeira vez em Vauxhall. Era inteligente e

divertido, amável e paciente, sensual e excitante, e ao lhe entregar sua confiança, tinha-lhe concedido um

presente mais valioso que jóias ou o dinheiro.

Sua confiança. Sentiu a pontada da culpa, sabendo que não lhe teria dado um prêmio tão prezado se tivesse

conhecido seu passado, se se tivesse recordado do seu encontro no Vauxhall. Mas era um presente que queria

ter e se negava a perder. Ele confiava nela, e não lhe tinha dado motivos para arrepender-se.

Colin deveu notar o peso de seus olhos porque voltou a cabeça. O brilho quente e inquisidor de seu olhar a

encheu de calor, e esteve tentada de voltar a beliscar-se para convencer-se de que realmente estava ali, com ele,

e de que ele a estava olhando com ardor e intimidade.

—Está pensando o mesmo que eu? —perguntou-lhe em voz baixa, inclinando-se para ela e fazendo que seus

ombros se tocassem.

—Não sei. —Alexandra duvidou entre admitir ou não a verdade e depois disse—: Estava tentando me

convencer de que este passeio com meu atractivo visconde, meu amante, não era somente produto de minha

imaginação.

—Mmm. Definitivamente, não é o que eu estava pensando.

—Ah? Por onde foram seus pensamentos?

—Estava pensando quanto faltava para que pudéssemos partir deste maldito parque e poder assim despir a

minha deliciosa adivinha, minha amante, e lhe fazer amor de novo.

O calor a invadiu e quase deu um tropeção.

—Não acredito que Lucky ficasse muito contente que cortássemos seu passeio.

Assinalou com a cabeça o entusiasmado cachorrinho, que ia correndo a toda velocidade todo o longe que a

correia lhe permitia e se parava a farejar cada fibra de erva.

—Pode ser que não, mas aposto a que não demorarei para levá-lo em braços porque deve estar ficando sem

energia. —E assinalando com o queixo o casal que conversava uns passos mais adiante, disse—: Não acredito

que meu criado fique muito bem tampouco que cortemos seu passeio. John parece bastante cativado por sua

amiga Emma.

—Acredito que o sentimento é mútuo —disse Alexandra, brincando com a correia de sua carteira—. foi muito

generoso por sua parte comprar toda a caixa de laranjas da Emma. Nunca as vende tão rapidamente.

—Fi-lo encantado, sobre tudo porque agora desenvolvi uma especial afeição por esta fruta. Além disso, vi

como se olhavam John e ela, e fazendo possível que Emma venha connosco não só podem conhecer-se, mas

sim sua companhia serve-te de pau de cabeleira.

—Necessito um pau de cabeleira?

—Certamente. De outro modo, deixaria-me levar pela tentação de te arrastar detrás de uma árvore e a tomar a

plena luz do dia.

— Meu Deus... —disse ela sem fôlego ante as imagens que aquelas palavras disparavam em sua imaginação—.

E isso seria terrível.

—E muito provável se não deixares de me olhar desse modo.

—De que modo?

—No modo que todo homem anseia ser olhado pela mulher que deseja. És... valente. Especialmente olhando-

me com esses olhos grandes e formosos. Suponho que a maioria dos homens diriam que são de cor topázio.

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Mas para mim seus olhos têm a cor de chocolate quente desfeito polvilhado com canela.

—Como reconheces-te tua debilidade pelos doces, sinto-me adulada. Especialmente porque prefiro o chocolate

ao topázio.

Colin riu brandamente e, depois, discretamente passou o braço pela parte exterior de seu peito.

—Sabia que eras extraordinária mas o facto de que penses algo assim e além disso o expressas em voz alta te

faz realmente incrível. Extraordinária e incrível... Suponho que isso te converte em «incredinaria»...

Detiveram-se enquanto Lucky examinava uma aparentemente fascinante parte de erva, e Alexandra, colocando

a mão a modo de viseira, sorriu-lhe.

—Eu gosto de como cria novas palavras. Sempre o tens feito?

—Não, é a primeira pessoa que conheço que me inspira a fazê-lo.

Alexandra esteve tentada acreditar que estava brincando, mas o olhar de seus olhos e o tom de sua voz lhe

deixaram claro que falava a sério. Invadiu-a um prazenteiro entusiasmo.

—Sinto-me adulada.

—E especial, o que te converte em...?

—«Halacial»? —sugeriu ela dando-se conta de que a palavra descrevia perfeitamente seus pensamentos e suas

emoções, como gotas de chuva pulverizadas por ventos vaporosos.

Colin riu, um som profundo e vivo que poderia ter escutado durante horas.

—«Halacial» —repetiu, sorrindo-lhe com os olhos.

Lucky ladrou e ambos olharam para baixo, à pequena bola de pelo negro que dava cambalhotas e movia a

cauda indicando que estava preparado para continuar com o passeio. Quando começaram a caminhar de novo,

Colin comentou:

—Pensava dizer isto antes, mas distraído por teus encantos o esqueci. Quando parti de casa de Wexhall ontem

de noite, ou mais concretamente, a primeira hora desta manhã, vi o Robbie.

— O Robbie? Onde? —perguntou Alexandra com o cenho franzido.

—Escondido detrás de uns arbustos do jardim do Wexhall. Disse-me que te estava procurando.

—Não deveria fazer isso —disse Alexandra e notou como a preocupação lhe produzia um nó no estômago.

—Isso precisamente disse ao menino. Assegurei-lhe que te estávamos cuidando bem e que estava

perfeitamente a salvo. E também que te preocuparias por ele se suspeitasses que estava rondando por aí.

—Obrigado. Falarei com a Emma e me assegurarei de que lhe diga que estou bem e que estarei em casa logo,

para mantê-lo afastado.

—O menino te quer.

Um nó de emoção subiu-lhe pela garganta.

—Eu também o quero, e falando de amor... —Assinalou com a cabeça a Emma e ao John, que estavam bastante

mais adiante, passeando lentamente com as cabeças muito juntas.

—Parece que estão combinando de maravilha —disse Colin.

—Não posso dizer que me surpreenda. A última vez que joguei as cartas a Emma, predisse que ia conhecer um

jovem loiro e alto muito atraente.

—E o que te dizem a ti as cartas? Predisseram que ías conhecer um homem de porte distinto, inteligência

superior e atractivo aceitável?

Alexandra recordou a última vez que jogou as cartas para si, e o perigo que tinha visto, mas não quis

assombrar a tarde e disse em tom ligeiro:

—Sim, mas poderia não seres tu, já que não vi que esse homem tivesse debilidade pelos doces.

—Bem ao contrário, estou certo de que era eu. Tenho tantas debilidades que esta se perderia entre todas as

demais.

—Outras debilidades além dos doces? Quais?

—Contarei isso, mas tem um preço.

—Quanto?

—O preço não tem nada que ver com dinheiro —disse Colin com um brilho malicioso e cheio de ardor nos

olhos.

—E se recuso a proposta?

—Então arrisca a não descobrir nunca quão sensual pode chegar a ser um jogo de bilhar.

—Bilhar? —repetiu Alexandra, intrigada—. Sensual?

Colin pôs sua mão sobre a que ela tinha agarrar-lhe o braço e Alexandra notou como lhe subia o calor pelo

corpo. Quando Colin acariciou com os dedos a curva exterior de seu peito, conteve a respiração.

—Depende da pessoa com a que estejas jogando.

Continuou com sua lenta carícia e Alexandra sentiu-se arder incapaz de pensar. Fez ver que reflectia e depois

exalou um exagerado suspiro de conformidade.

—Muito bem, aceito seus términos, apesar de que os considero péssimos.

—Tomo nota. Para falar a verdade, estas debilidades são de natureza bem mais recente. Parece ser que tenho

debilidade pelas laranjas —disse Colin enquanto seu dedo acariciava o mamilo de Alexandra, fazendo que o

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coração desta desbocasse.

—Ah, sim?

—Sim. —deteve-se sob a sombra de um olmo e se voltou para olhá-la. Apenas os separavam uns centímetros,

uma distância tentadoramente curta e que podia ultrapassar-se com um só passo à frente—. E pelos grandes

olhos cor marrom chocolate e pelo cabelo negro e brilhante —continuou brandamente—, e a cútis lisa salpicada

unicamente por umas poucas sardas justo aqui... —Levantou a mão e acariciou com os dedos sua bochecha,

deixando-a sem fôlego. Depois, baixou a vista até sua boca e seus olhos se iluminaram de paixão—. E os lábios

carnudos.

Meu Deus, esperava que não tivesse intenção de beijá-la alí mesmo, em pleno dia, onde todo mundo pudesse

vê-los. Tremeu por dentro, e embora uma voz interior a advertisse que devia dar um passo atrás, não pôde

mover-se.

—Tu —sussurrou detendo os dedos em sua bochecha—. Tenho uma profunda debilidade por ti, Alexandra.

—E eu por ti.

As palavras escaparam antes de que as pudesse deter, mas expressavam um sentimento tão óbvio que não

tinha muito sentido tentar negá-lo.

Colin se inclinou e o coração da Alexandra pulsou com uma intensidade que deveria havê-la horrorizado mas

que em lugar disso a emocionou. Deitou um rápido olhar em redor e viu que não havia ninguém perto. Mesmo

assim, a voz da razão lhe dizia ao ouvido que se arriscava muito permitindo essas liberdades em público.

Afastou a razão a um lado e ficou esperando seu beijo.

Um latido penetrante atravessou a névoa que a rodeava e Colin se tornou para trás com uma expressão entre

preocupada e envergonhada.

—Parece ser que Lucky é um pau de cabeleira apropriado e está claro que necessita uma, porque eu quase

perdi a cabeça.

Ofereceu-lhe o braço e Alexandra o tomou. Assim agarrados, continuaram seu tranquilo passeio.

Depois de dar uns passos acompanhados unicamente pelo gorjeio dos pássaros, Alexandra não pôde conter-se

e disse:

—Essa tua debilidade por mim realmente me desconcerta.

—Quem está agora suplicando elogios? —perguntou Colin em tom zombador.

—Não é isso, de verdade.

—Então permita te dizer que é extraordinária, e sua beleza é insuperável.

—Necessitas uns óculos.

Colin negou com a cabeça.

—Tua beleza é muito mais complexa e engloba muito mais que os meros atributos físicos. Tem que ver com tua

essência, tua alma, a extraordinária pessoa que é.

A culpa esbofeteou totalmente a Alexandra.

—Não sou o modelo de virtudes que acredita, Colin. Fiz coisas de... das que não estou orgulhosa.

—Atreveria-me a dizer que não há quem não as tenha feito. Deus sabe que eu tenho feito um montão de coisas

das que não estou orgulhoso. Mas, apesar delas, as deixaste atrás e te converteste em alguém a quem admirar.

Isso é em si mesmo extraordinário.

Alexandra o olhou e viu que ele a observava com uma expressão indecifrável. Notou que ficava sem fala. As

palavras do Colin, a forma em que as pronunciava... parecia como se conhecesse seu passado de pouca

reputação.

—A que te refere? —perguntou cuidadosamente.

—Adivinho que viveste algumas dificuldades em tua infância. A experiência me ensinou que as dificuldades

destroem as pessoas ou as infundem de uma determinação poderosa. Para mim, está claro que triunfaste por

cima das adversidades e queres ajudar a outros, como é o caso do Robbie. Isso diz muito de ti.

Alexandra se sentiu incômoda ante a misteriosa precisão de suas palavras.

—O que te faz pensar que sofri dificuldades?

Estava claro que seu tom não era tão neutro como ela tinha pretendido, porque Colin respondeu:

—Não pretendia te ofender, Alexandra. Tenho o costume de estudar as pessoas, temo-me que é próprio dos

espiões, e se trata simplesmente de uma conclusão a que cheguei me apoiando em minhas observações. Se

estou equivocado, desculpa.

—Em que observações apoias tuas conclusão?

Colin vacilou um instante.

—Em diferentes coisas —disse por fim—. Tuas mãos são as de alguém acostumado ao trabalho duro. O facto

de que estejas tão empenhada em ajudar os meninos como Robbie, cujas vidas estão cheias de dificuldades,

sugere-me que se deve a que tua infância não foi precisamente idílica. Quando mencionas-te que tua mãe tinha

morrido, deu-me a impressão de que eras muito jovem quando ocorreu.

A imagem de sua mãe, pálida e doente, tentando sorrir, iluminou sua mente.

—Tinha oito anos.

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—Está claro que significava muito para ti.

Alexandra franziu o cenho.

—Como sabes? Apenas falei por alto dela.

—O olhar em teus olhos quando fizeste referência ela fala por si só. É um olhar que conheço bem.

—Porque também perdeste a tua mãe —disse Alexandra assentindo com a cabeça de modo pormenorizado.

—Sim. O que aconteceu depois que ela morreu?

Alexandra sentiu que era invadida por uma avalanche de lembranças dolorosas, e embora não tinha nenhum

desejo de mostrar essa parte de sua vida, de repente sentiu que queria contar-lhe algo a respeito de seu

passado, ao menos algo para mostrar que dizia a verdade ao afirmar que era vulgar.

—Fui viver com minha tia —disse—, a irmã de meu pai. Não gostava muito da minha mãe, a que tinha

etiquetado como «suja cigana» assim, que não ficou muito contente de carregar comigo.

—E teu pai?

—Era um marinho e tinha morrido em alto mar quando eu era um bebé. Não o recordo absolutamente.

—Sinto muito. —De novo pôs a mão com a que sustentava a correia do Lucky sobre a sua e apertou-lhe os

dedos—. Está claro que tua tia te proporcionou uma educação.

Alexandra deixou escapar uma risada amarga.

—Não. Tinha um único filho varão, Gerald, dois anos mais velho que eu, a quem sim deu uma educação. Eu

aprendi escutando detrás das portas e escondida sob os arbustos que havia junto à janela da sala onde Gerald

recebia aulas do tutor. —Lançou um fundo suspiro e decidiu que não era necessário acrescentar que a tinham

colocado para fora da casa de sua tia quando tinha doze anos por ter deixado um olho arroxeado a seu primo

quando tentou colocar-lhe a mão sob a saia—. Não fui muito feliz lá.

Como tampouco foi nas frias, escuras e aterradoras ruas de Londres onde se refugiou, depois que sua tia atira-

se na rua como quem deita fora as sobras do dia anterior. Ali tinha sido onde e quando tinha começado sua

verdadeira educação.

—O que demonstra que és uma dessas pessoas, às que a adversidade as faz crescer, em lugar das afundar. O

que foi da tua tia?

—Não tenho nem idéia, se tiver que ser sincera, Colin. Não tornei a vê-la nem ou sei dela desde que parti de

sua casa. Tampouco me importa. Por isso o que a mim respeita, está morta. E frequentemente desejo que assim

seja. —Levantou a vista, arqueando as sobrancelhas, para olhar a Colin—. Em que classe de pessoa me

converte isso?

—Humana, como o resto de nós.

Alexandra decidiu que já tinha aprofundado mais do que desejava em seu doloroso passado, e perguntou:

—Que tipo de coisas tens feito das que não estás orgulhoso?

Colin a olhou desejando continuar interrogando-a mas dando-se conta claramente de que ela não ia responder

a mais pergunta. Tinha esperado que confiasse nele e lhe confessasse sua antiga profissão, mas entendeu por

que não o fazia. Entretanto, se ele confiava nela, possivelmente ela faria o mesmo. Ou talvez nunca mais o

olharia com aquela admiração nos olhos.

Mantendo um tom e uma expressão totalmente ambíguos, perguntou-lhe:

—De verdade queres sabê-lo? Pode serb que não gostes do que vais ouvir.

—Não há nada que possas dizer que me faça pensar mal de ti.

—Uma declaração da qual possivelmente te vais arrepender.

—Não. —Alex lhe buscou o olhar—. Conheço a vergonha e o arrependimento e os enganos suficientemente

bem para não julgar a outros. Mas se preferires não me falares isso também o entenderei.

Suas palavras e a cálida compaixão em seus olhos embargaram Colin de emoção e a sua voz falhou. Enfurecia-

lhe que Alexandra tivesse experimentado vergonha e dor, mas ao mesmo tempo o enchia de compaixão e lhe

produzia uma irrefreável necessidade de dizer a sua desumana tia o que pensava do trato que tinha

dispensado a sua sobrinha órfã. A compreensão que mostrou Alexandra ao não o pressionar a expor cada

detalhe de sua vida, fizeram-lhe ter ainda mais vontade, de lhe contar o nunca tinha compartilhado com

ninguém .

—Quero que saiba.

E depois de tomar ar muito fundo, contou-lhe tudo sobre a noite em que lhe dispararam, como tinha traído a

seu irmão, o distanciamento posterior e a culpa que ainda sentia. Ela escutou em silêncio, com a frente

franzida, concentrada.

Quando ele terminou, disse:

— Reconciliaram-se

—Tenho a sorte de que me perdoou.

—Mas teu irmão tem que sentir-se sem dúvida culpado já que te dispararam.

—Algo que foi inteiramente culpa minha. Nathan nunca me tinha dado razão alguma para desconfiar dele,

mas eu o fiz.

—Por que?

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—Passei inumeráveis horas me perguntando o mesmo. E envergonha-me reconhecer que em parte estava

ciumento. Invejava-o. Ele não tinha as responsabilidades que eu tinha, era livre de um modo que eu não

poderia sê-lo nunca. —Colin moveu a cabeça e franziu o cenho—. Não quero que pareça que não me importam

as obrigações de meu título ou que não me as tomo a sério. Porque não é assim. Sei que um grande número de

pessoas vivem de nossas terras, e essa é uma responsabilidade que nunca poria em perigo ou comprometeria.

Mas não posso negar que houve ocasiões, especialmente quando era mais jovem, em que teria desejado ser o

irmão mais novo. —Lançou a Alexandra o mesmo olhar desafiante que lhe tinha arrojado anteriormente—. Em

que classe de homem me converte isso?

—Humano, como o resto de nós.

Os lábios do Colin se arquearam formando um pequeno sorriso.

—Pagas-me com a mesma moeda.

Duvidou se continuar ou não, e finalmente decidiu pôr todas as cartas sobre a mesa.

—Mas tenho feito outras coisas, coisas que nunca contei a ninguém.

Colin deu conta de que devia ter um aspecto tão sombrio como o tom de sua voz porque Alexandra apertou-

lhe o braço brandamente.

—Não tem que me contar isso Colin.

Mas de repente queria fazê-lo. Não acabava de entender do todo as razões; provavelmente porque não queria

que houvesse segredos entre eles.

—Durante meus anos como espião, vivi uma mentira —começou—. Nem sequer meu próprio pai sabia que

trabalhava para a Coroa.

—Acredito que o secretismo deve perdoar-se em casos assim.

Colin diminuiu o passo, depois parou, olhou-a fixamente e pronunciou as palavras que nunca antes tinha

pronunciado:

—Matei a um homem.

Durante vários segundos se fez o silêncio entre eles. Depois, ela disse:

—Estou certa de que tinhas uma boa razão para fazê-lo.

Sua calma atitude ante sua confissão deixaram paralisado Colin, embora, ao mesmo tempo, não o

surpreendesse. Aquela mulher, sua Alexandra, única, não era das que se deprimia e pedia auxílio.

Sua Alexandra. Como um batimento do coração, as inquietantes palavras retumbaram em sua mente,

enchendo o de uma sensação que não podia nomear e que deixou a um lado para examinar mais tarde.

—Era um traidor a Inglaterra.

—Então merecia morrer. Pensa em quantas vidas foram salvas,detendo-o.

—Faço-o, mas... —As imagens que tinha guardado sob chave com tanta determinação, apareceram através da

névoa e invadiram sua mente—. Descobri a traição de Richard acidentalmente enquanto estávamos juntos em

uma missão para a Coroa. De facto, se não tivesse sido por um descuido dele, nunca o teria sabido.

Considerava-o um amigo, um colega, um homem fiel a Inglaterra.

Toda a fúria da traição que tinha sentido no passado voltou com força e Colin teve que esfregar os olhos. Mas

isso só serve para dar a oportunidade a sua mente de fazer mais vividas as imagens do passado: Richard

agarrando sua navalha, ele mais rápido que Richard, o afiado metal afundando-se na pele de maneira

escandalosamente lenta, o sangue quente do Richard gotejando e cobrindo suas mãos, a vida apagando-se nos

olhos do homem que um dia tinha considerado seu amigo.

—Colin.

Abriu os olhos. Ela estava de pé frente a ele com os olhos cheios de preocupação e de uma ferrea determinação.

Esticou as mãos e tomou as suas.

—Fizes-te o que tinhas que fazer.

—Sei —disse Colin assentindo—. No fundo, sei. Mas há outra parte de mim que não pode esquecer que tirei a

vida a um homem, por mais que o merecesse. Deixei viúva a sua esposa.

—Ficou viúva pelas decisões que tomou seu marido.

—Racionalmente, sei. Mas às vezes, inclusive quando sabes que fez o que tinha que fazer, o que era necessário

para sobreviver, mesmo assim há uma pequena parte de ti que rejeita essas acções, uma pequena parte de tua

alma que perdes e que não podes recuperar. —Buscou-lhe o olhar—. É difícil de explicar.

—O... entendo —sussurrou Alexandra tragando saliva e apertando sua mão.

—Algo me dizia que o entenderias —disse Colin docemente—. Por isso contei-te.

—Dizes que ninguém sabe. Não se fez pública sua traição?

—Não, para economizar a sua esposa a vergonha de sua traição, todo mundo acredita que morreu como um

herói.

—Teu irmão não sabe?

Negou com a cabeça.

—A única pessoa que conhece as circunstâncias reais que rodearam a morte do Richard, além de eu mesmo, é

lorde Wexhall. E agora tu.

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—Tens minha palavra de que não trairei tua confiança.

—Sei —disse ele, levantando a mão de Alexandra e depositando os lábios sobre seus dedos.

Durante uns segundos, pareceu como se Alex fosse dizer algo, mas permaneceu em silêncio e juntos

continuaram seu passeio.

Algum dia, disse a Colin uma voz interior, dirá-me algum dia.

Possivelmente Mas para que? Inclusive se ambos saíam da festa do Wexhall ilesos, ele não podia ficar em

Londres indefinidamente. Devia voltar para o Cornualles.

Com uma esposa.

Uma mulher que devia escolher muito em breve, uma mulher que provavelmente poderia encontrar essa

mesma noite, na noite de Ralstrom se fizesse um esforço para isso.

Uma mulher que não era Alexandra.

Capítulo XVIII

Alex estava sentada junto à mesa onde jogava as cartas no abarrotado e muito elegante salão de lorde e lady

Ralstrom, justamente debaixo da balconada a que aparecia a galeria do primeiro andar da mansão. Enquanto

jogava as cartas, ia escutando as vozes a seu redor, com a esperança de reconhecer esse rouco suspiro que tinha

ouvido no estudio de lorde Malloran. Mas até esse momento não tinha ouvido nenhum som parecido. Sua

situação permitia uma excelente vista do salão, assim passava muito tempo olhando os convidados.

Infelizmente, não gostava do que tinha visto.

Cada vez que levantava a vista, Colin, que se tinha situado perto dela junto a um grupo de vasos com

palmeiras, fazia com que ela por acaso ouvisse a sua voz, cada vez falando com uma mulher diferente, cada

uma mais formosa que a anterior e todas elas embelezadas com muito caros trajes de noite na última moda,

com o cabelo, o pescoço e os pulsos adornados com brilhantes pedras preciosas. Embora não estava

suficientemente perto para ouvir a conversação que mantinham, tinha ouvido de vez em quando a risada do

Colin. Cada vez que tinha dirigido o olhar para ele, tinha-o visto sistematicamente sorrindo a alguma filha

casadoira de algum aristocrata rico, que olhava a Colin com brilho, em algumas ocasiões de sedução, nos olhos.

E quem podia culpar alguma mulher de fazê-lo? Sua beleza morena, sua figura forte e atlética vestida com um

traje elegante de noite e uma camisa de um branco níveo o faziam, sem dúvida alguma, o homem mais atraente

do salão. Inclusive sem o benefício de sua elevada posição social, teria atraído mais atenção feminina que a

média. Com sua riqueza, seu título e o facto publicamente conhecido de estar procurando activamente esposa,

parecia como se, igual a colibris aguardando seu turno para saborear o néctar, todas as mulheres no salão

rondassem a seu redor.

E maldita seja, a Alexandra teria gostado das atirar a todas elas ao chão. Justo nesse momento estava falando

com a encantadora lady Margaret. Como se não bastasse comsua beleza, aproximou-se lady Miranda, a prima

de lady Malloran. Observando as duas formosas mulheres, uma delas uma loira delicada e pálida e a outra

uma exuberante morena, perguntou-se se alguma delas seria a que tinha escrito a nota com fragrância de rosas

assinada com um simples M, que tinha visto na sala de Colin. Essa M que estava desejando voltar a vê-lo. Bom,

as duas mulheres o estavam voltando a ver nesse momento, e o olhavam com essa calculada premeditação com

a que um gato observaria a um camundongo lubrificado com nata.

Lady Miranda sorriu e depois estendeu a mão. Alex, sumida em um inevitável ciúme pessimista, contemplou

como Colin levantava a mão da mulher —uma mão que ela sabia que seria branca como os lírios e perfeita e

sem as durezas ou as marcas do duro trabalho—. E a levava a boca para acariciar seus dedos com os lábios.

Embora o gesto era absolutamente respeitável e Colin soltou a mão de forma imediata, Alex teve que fazer um

esforço para não levantar-se da cadeira e não lançar-se brandindo um lenço na mão para apagar o rasto da boca

do Colin nessa maldita mão perfeita e a sensação dessa mão dos lábios dele.

Meu Deus, as coisas não íam bem. Nenhuma dessas mulheres tinha feito nada mal. Todas tinham todo o

direito do mundo a falar e a flertar com ele. Igual a ele com elas. Era ela a que tinha que recordar que Colin não

lhe pertencia, que nunca poderia pertencer-lhe, excepto do modo mais superficial e passageiro. Devagar,

tomou uma larga baforada de ar e apertou os lábios, fechando os olhos para apagar a dolorosa visão: duas

mulheres formosas que tinham tudo para poder conseguir o que Alex queria e nunca poderia ter.

A Colin.

Não tinha nenhum direito sobre ele. Sua mente e seu sentido comum assim o diziam. Mas, Deus, notava o

coração pesado, como se o tivessem atravessado. E ele nem sequer tinha escolhido ainda uma esposa. Se Alex

sofria já tanto, então como ia poder suportá-lo quando Colin lhe dissesse que tinha escolhido a mulher com a

que ia passar o resto de seus dias, a que ia fazer amor, a que ia gerar seus filhos? Como ia poder suportá-lo

quando lhe dissesse adeus?

—Tenho a sorte de encontrá-la livre para uma sessão, madame?

Alex abriu os olhos de repente para ouvir a voz profunda que fazia a pergunta e se encontrou frente a Logan

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Jennsen. Em seus lábios havia um sorriso indolente e um brilho malicioso iluminava seu olhar.

Alexandra se sentiu aliviada ao encontrar-se com uma cara conhecida e poder assim concentrar-se em alguém

diferente. Sorriu-lhe.

—Sim, estou livre para uma sessão, Logan, assim por favor, sente-se.

—Obrigado.

Logan se acomodou na cadeira que havia frente a ela e, para seu consolo, deu-se conta de que seu tamanho e

sua largura tapavam totalmente a visão do salão. Excelente. Olhos que não vêem, coração que não sente. Ou

pelo menos isso queria pensar.

—Nenhuma delas pode comparar-se contigo —disse Logan.

—Desculpa?

—Lady Miranda e lady Margaret. Pelo meos o que a mim diz respeito, a teu lado passariam totalmente

desapercebidas.

Alexandra não pôde evitar rir.

—Falas como um verdadeiro amigo, mas é um mentiroso espantoso.

—Para falar a verdade, sou um mentiroso compulsivo, mas nesta ocasião, digo a verdade. —Percorreu-a com o

olhar—. Está encantadora esta noite.

—Obrigado. Tu também.

—Esta é a melhor conversa que tive em toda a noite —disse sorrindo.

Alexandra sorriu-lhe também e agarrou suas cartas.

—Eu também. E agora diz-me, qual é a pergunta que quererias que respondesse?

—Estaria encantado de ouvir algo que queiras me contar —disse abrindo as mãos—. Especialmente se forem

boas notícias.

—O que considerarias boas notícias?

—Que certa dama me encontre tão fascinante como eu a encontro a ela.

Ao ver o olhar de advertência nos olhos do Alex, Logan levantou as mãos com um gesto que indicava que se

rendia.

—Tu perguntaste.

—E o que te parece se te digo que está destinado a comprar outra frota de navios?

Logan lhe lançou um atractivo sorriso e que marcaram as covinhas das bochechas.

—Certamente, não o consideraria más notícias. É isso o que me tem o destino reservado?

Fazendo um esforço para não esticar o pescoço e olhar por cima do ombro do Logan, Alex começou a rir.

—vamos ver o que predizem as cartas.

Colin fingia interesse pelo que lhe estava dizendo lady Margaret, assentindo educadamente, mas estava-lhe

resultando um grande esforço. Maldito seja, esse americano, Jennsen, estava sentado ante a mesa da

Alexandra. Que demônios estava fazendo? Já lhe tinha jogado as cartas na festa dos Newtrebble e tinha tido

uma sessão privada, o que significava que o que lhe atraía era a adivinha e não as cartas. Se esse bastardo dizia

ou fazia algo negativo, encontraria-se atirado em cima dos sebes do jardim, cabeça abaixo.

É obvio, havia-se sentido do mesmo modo com os outros homens, onze em total —e não é que estivesse

contando-os—, que tinham visitado a mesa de adivinha da Alexandra aquela noite. Ela tinha sorrido a todos e

ele tinha tido que apertar os dentes, dolorosamente consciente da presença dela enquanto só pela metade

escutava as mulheres às que deveria ter estado prestando atenção.

Maldita seja. Isso... fosse o que fosse o que tinha feito ela com ele, quaisquer fosse o feitiço que lhe tinha

deitado, não lhe fazia nenhum bem. Como se supunha que ia poder concentrar-se em encontrar uma esposa se

a única mulher em que conseguia pensar era nela? Embora lançava um comentário por aqui, um sorriso por lá

e assentia todo o momento, sua atenção estava centrada completamente nela. Mas agora aquele enorme caipira

do Jennsen estava tapando a vista, e maldito seja, era possível que aquele bastardo estivesse beijando-lhe a

mão?

Todo ele se sentiu estremecer por um repentino e puro ataque de ciúmes e apertou os dedos ao redor da

cristalina taça de champanha.

—Se as damas me desculparem... —disse a lady Margaret e a lady Miranda, procurando educadamente que

não notassem a impaciência em seu tom.

Depois das saudar com uma reverência, deu a volta e começou a abrir passo entre a multidão com o olhar fixo

na Alexandra, deixando de lado seu ciúmes e concentrando-se de novo em sua segurança. Qualquer dos

homens que tinha visitado sua mesa aquela noite podia ser o assassino da voz rouca. Incluído Jennsen.

Não tinha dado mais de meia dúzia de passos quando lhe cortou o passo sua cunhada.

—Ao fim, uma oportunidade de falar contigo, Colin —disse Vitória com o olhar iluminado por... algo, algo que

ele estava muito distraído para tentar decifrar—. estiveste rodeado de gente toda a noite.

—Vitória —murmurou, olhando por cima dela e dando-se conta com amargura de que Alexandra e Jennsen

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estavam rindo.

—Posso te roubar um momento? —perguntou Vitória.

Desejava gritar que não e seguir seu caminho mas se opôs o sentido comum. Estava claro que não era culpa de

Vitória que ele se sentisse tão endiabradamente irritado e frustrado. Voltando a atenção a sua cunhada, fez um

esforço por sorrir.

—É obvio.

—Podemos sair do salão para ter um pouco de intimidade?

—É necessário? —perguntou-lhe Colin em voz baixa inclinando-se para ela—. Não quero estar fora em caso

que Alexandra volte a ouvir a voz.

—Nathan a está vigiando —disse assinalando a seu marido que tinha uma visão completa da mesa da

Alexandra—. Conhece o sinal. Só te reterei um momento.

Colin olhou a Nathan, que lhe fez um gesto perceptível só para ele.

—Muito bem —disse, não muito disposto mas sabendo que não podia dizer que não sem resultar grosseiro.

Dirigiram-se para as varandas que os conduziam para fora. O céu parecia um manto aveludado com diamantes

incrustados e nele brilhava a lua como uma pérola reluzente, banhando com sua luz chapeada os ladrilhos da

terraço. Uma brisa cálida, aromatizada pela delicada fragrância das flores nocturnas, movia as folhas. Colin

parou junto a uns suportes de vasos de discos perfeitamente cortados e, voltando-se para Vitória, perguntou-

lhe:

—Do que desejavas me falar?

—De tua busca de esposa.

—O que se passa com isso?

—Perguntava-me como ia, se progredia.

Não progride, pensou.

—Bem.

Algo brilhou nos olhos de Vitória. Dúvidas? Não estava certo, mas, francamente, não lhe importava.

—Já vejo. Bem no sentido de que estou conhecendo dúzias de mulheres fascinantes e interessantes, às que

encontro atractivas, ou no sentido de que não poderia te dizer o nome de nenhuma das mulheres com as que

falei esta noite, porque meu pensamento está em outra parte?

Maldição... Um grupo de cavalheiros parou junto às janelas tapando-lhe a visão da Alexandra.

—Bem como... bem.

—Ah, esplêndido. Tomaste alguma decisão?

—Decisão?

—Já sabe, descartar umas quantas, decidir se alguma tem potencial, esse tipo de coisas.

O grupo de cavalheiros se ampliou, tapando ainda mais a vista. Não podiam esses tipos beber o Porto ou

fumar charutos em outro sítio?

—Mmm. Não.

—Isso temia, e é por isso pelo que estou disposta a te oferecer minha ajuda.

Maldita seja, quanto tempo íam estar esses homens aí parados?

—Ajuda? Para que?

—Para procurar esposa — disse Vitória em tom exasperado, mas lenta e claramente.

Colin fez um esforço para dissimular sua própria exasperação e obrigou-se a olhar a sua cunhada.

—O que acontece com esse tema?

Vitória observou-o durante vários segundos, com um olhar desconcertantemente tranqüila, com expressão

indecifrável. Mas por que todas as mulheres deviam ser tão frustrantemente difíceis de entender?

Finalmente, Vitória esclareceu a garganta.

—Estava disposta a oferecer minha ajuda para procurar esposa, mas parece que não é necessário.

—Não, não o é. —Algo em seu tom e em seus olhos disparou o alarme em Colin—. por que não o é?

—Porque, parece que já tens feito a tua eleição.

Com a extremidade do olho, viu que o grupo de cavalheiros se movia e jogou uma olhada ao salão.

—Isso tenho feito?

—Claramente — respondeu Vitória. Vacilou e logo disse com calma—: falei com o Nathan e sei que não está

casada.

—Quem?

Maldição, outro grupo de cavalheiros tapava de novo o salão.

—Tua eleição.

De novo voltou sua atenção a Vitória quem, por alguma razão, estava falando da forma mais enigmática.

—O que acontece com ela? —perguntou-lhe.

—Que não está casada.

Apertou as têmporas com os dedos.

—Claro que, quem quer que seja, não está casada. Não posso escolher a uma mulher que já está casada.

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Como um rebanho de lentas vacas ao fim o grupo ficou em movimento, limpando a vista. E ficou petrificado.

Alexandra e Jennsen estavam de pé junto à mesa e ela estava lhe agarrando o braço e sorrindo. O rosto do

Jennsen reflectia a inconfundível expressão de um homem, que gostava muito o que estava vendo, um homem

que desejava o que estava vendo. O americano se inclinou a dizer algo a Alexandra, e depois se perderam

juntos entre a gente. Todo ele era uma mescla de raiva, preocupação e ciúmes. Por sua segurança, supunha-se

que Alex não devia abandonar o salão. A onde demônios ia?

—Perdoa-me— disse a Vitória e, sem esperar resposta, atravessou o terraço e voltou a entrar no salão.

Colin passou a vista pelo salão e os viu junto ao ponche. Com a mandíbula em tensão dirigiu-se para lá, e

quase caí sobre Nathan, que apareceu como por arte de magia em meio de seu caminho.

—Ela está bem — disse Nathan em um sussurro, bloqueando-lhe o passo—. Tu, em troca, parece que

necessitas um brandy. —E estendeu uma taça de cristal.

—O que preciso —disse Colin entre dentes e ignorando a bebida que lhe ofereciam— é saber que demônios

acredita que está fazendo.

—É óbvio o que está fazendo. Está tomando um copo de ponche.

—Com esse maldito americano que, pelo pouco que sabemos, poderia ser a pessoa que estamos procurando.

—E por isso Wexhall está junto a ela, preparado para intervir se ele tenta a levar a sós. Está perfeitamente a

salvo. Quem me preocupa és tu.

As palavras do Nathan atravessaram o medo, a raiva e o ciúmes que o envolviam e passou as mãos pelo rosto.

—Estou bem.

—Não, não estás. Está zangado com o Jennsen, por olhá-la como se estivesse morrendo de sede e ela fosse uma

bebida refrescante. Não te culpo. Eu me sentiria igual a ti se estivesse em tua situação e provavelmente lhe teria

esmurrado a cara faz tempo. Faria-o se cometesse o engano de olhar Vitória desse modo.

Colin tomou ar e sentiu um tremendo cargo de consciência.

—Vitória... Deixei-a sozinha na terraço.

—Soube encontrar o caminho de volta. É bastante independente. Está falando com lady Margaret e lady

Miranda, as duas outras damas às que abandonaste bruscamente.

Nathan estendeu-lhe o copo de brandy, e Colin deu um bom sorvo notando o calor da bebida descendo pela

garganta.

—Ambas são formosas —disse Nathan.

—Suponho.

—Tu gostas de alguma das duas?

Nem por iss, pensou.

—É agradável falar com elas —disse.

—Ah, sim? Do que estavam falando?

Não tinha a mais remota idéia. E pela expressão pouco inocente de Nathan, soube que seu irmão tinha claro

que não se inteirou de nada.

—Do tempo.

Provavelmente.

—Ah, sim, um tema fascinante. Mas referia a se alguma delas, gostavas como candidata ao matrimônio.

Antes de responder, Colin tomou outro sorvo do potente licor em um intento fracassado, de encher o vazio que

lhe tinha produzido a idéia, de casar-se com qualquer delas.

—De um ponto de vista prático, qualquer das duas funcionaria.

—E de um ponto de vista não prático?

Invadiu-o um profundo desânimo.

—Agora mesmo, a idéia de passar o resto de minha vida com qualquer delas resulta... —Sua voz interior disse

«deprimente», mas ele acrescentou—: Difícil de imaginar.

—E por que acreditas que se passa isso?

—Porque neste momento —disse Colin irritado— tenho outras coisas na cabeça. A festa do Wexhall é na

semana próxima e esperemos que quando tiver passado, tenhamos podido resolver todos os interrogantes

deste mistério; assim poderei me concentrar na busca de esposa.

—Acreditas que estarás mais capacitado para escolher um desses diamantes de sociedade depois da festa do

Wexhall?

—Sim, é obvio.

Nathan murmurou algo que soou suspeitosamente parecido a «estúpido idiota» e depois deu uma palmada no

ombro a seu irmão.

—Desejo-te sorte. De verdade. Mas sendo como sou alguém que muito recentemente passou, por exactamente

o mesmo ao que te vais enfrentar, só posso te oferecer minha mais profunda compaixão e meus melhores

desejos de que se resolva tão bem como se resolveu para mim.

—De que demônios está falando?

—Da batalha.

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—Que batalha? —Entre sua mente e seu coração. —Não sei a que te refere. Nathan lhe apertou o ombro. —

Saberás. Boa sorte.

Alex estava sentada a sós junto a sua mesa de adivinha, desfrutando da breve pausa. Dirigiu seu olhar para

Colin e viu que de novo estava em companhia de uma formosa jovem. Parecia estar escutando-a, mas

justamente nesse momento desviou o olhar para ela. Seus olhares se cruzaram e Alex notou o impacto de seus

olhos por todo o corpo. Tentou olhar para outro lado, mas não pôde.

Entretanto, estava claro que Colin não estava sofrendo como ela, porque de repente desviou o olhar para cima,

por cima de sua cabeça. Franziu o cenho e entreabriu os olhos, para abri-los de repente. Voltou a vista para ela

e, equilibrando-se para diante, começou a mover as mãos como se tentasse afastar algo.

—Alexandra! —gritou correndo para ela—. Move-te! Move-te!

Assustada, ficou de pé e deu a volta à mesa. Um instante mais tarde, uma enorme urna de pedra se estatelou

contra a cadeira onde tinha estado sentada segundos antes. A cadeira quebrou com o peso e a urna partiu-se

levantando uma nuvem de pó.

Imóvel pela impressão, ficou olhando o desastre enquanto a gente gritava a seu redor.

—Alexandra —disse Colin em voz baixa e tensa. Tomou pelos ombros e a moveu com delicadeza—. Estás

bem?

—Estou... bem. Obrigado. —Afastou o olhar da cadeira e a urna partida para olhá-lo—. O que se passou?

—A urna caíu do balcão da galeria.

O doutor Oliver abriu passo entre a multidão e chegou até eles. Passou o olhar pelo corpo de Alex.

—Está ferida?

—Não.

Os joelhos se dobraram ao dar-se conta de repente, do que teria ocorrido se a tivesse golpeado aquela urna...

Fechou os olhos e notou como os dedos do Colin agarravam-lhe o braço. A gente se amontoava a seu redor e o

tom de suas vozes subia.

—Madame Larchmont não está ferida —disse Colin dirigindo-se aos convidados.

Alexandra abriu os olhos e encontrou com o olhar do Colin, com seus olhos verdes.

—Salvaste-me a vida —sussurrou.

Antes de que pudesse responder, apareceu lorde Relstrom. Contemplou os destroços através de seu monóculo

e disse:

—Incrível. Está claro que moveram a urna para limpá-la e depois não a colocaram adequadamente. Receba

minhas mais sentidas desculpas, madame Larchmont, e não lhe caiba dúvida de que encontrarei ao

responsável por este terrível descuido.

—Obrigado, milord —disse Alex depois de tragar saliva.

—Há algum lugar tranqüilo onde possa recuperar do susto? —perguntou Colin a lorde Relstrom em voz baixa.

—É obvio. Sigam-me.

Alguns minutos mais tarde, refugiada no estudio privado de lorde Relstrom e sob os atentos olhares de lady

Vitória, do doutor Oliver e de Colin, Alex dava sorvos a um copo de brandy.

—Não acredito que fosse um acidente —disse Colin assim que lorde Relstrom teve saído da sala.

—Meu pai foi ao balcão imediatamente —disse lady Vitória—. Se alguém empurrou essa urna, encontrará-o.

Colin foi até o aparador e se serviu uma generosa taça de brandy que bebeu de um gole. Notou o calor da

bebida descendo pela garganta e rezou para que servisse para relaxar a tensão que o estava tomando.

Fechou os olhos, mas a imagem daquela urna caíndo justamente em cima da cabeça da Alexandra o

angustiava.

Via-se de novo, testemunha de como ia cair sobre ela, e consciente de não poder alcançá-la a tempo.

Possivelmente algum dia pudesse recuperar do espantoso terror desse momento, mas não aquela noite.

Invadiu-o uma fúria que nunca antes tinha conhecido. Quem quer que tivesse tentado fazer-lhe mal, pagaria.

Asseguraria-se de que assim fosse.

Bateram na porta e o criado de lorde Ralstrom fez entrar lorde Wexhall.

—E bem? —perguntou Colin sem preâmbulos.

—O balcão estava vazio —explicou Wexhall—, mas dado quão escuro estava, alguém poderia ter empurrado a

urna sem ser visto e logo escapulir-se por alguma das portas ou pela escada de atrás.

Colin contemplou a Alexandra. Estava pálida mas parecia tranquila. Obrigou-se a manter uma distância física

entre eles desde que tinham entrado na sala, para não deixar-se levar pelo impulso de tomá-la em seus braços e

impedir que partisse nunca mais. É o que estava desejando fazer, assim necessitava uma tarefa com a que

distrair-se.

—Como Alexandra não está ferida —disse—, eu gostaria de investigar o balcão eu mesmo. Já lhes direi se

descobrir algo.

Depois de percorrer o balcão durante trinta minutos e não encontrar nada, Colin baixou de novo e ao entrar no

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salão, onde a festa tinha recuperado todo seu esplendor, notou os olhos de alguém nas costas. Deu a volta e se

encontrou frente a frente com o Logan Jennsen.

—De verdade está bem? —perguntou-lhe Jennsen.

—Sim —disse Colin apertando os punhos.

O americano arqueou as sobrancelhas notando o tom cortante do Colin.

—Eu gostaria de vê-la. Sabe onde está?

—Sei, mas como lhe disse, está bem. Não há nenhuma necessidade de que vá vê-la.

Por uns momentos, fez-se um silêncio tenso. Depois, Jennsen disse em tom calmo:

—Peo que ouvi, vai voltar para Cornualles muito em breve, com uma dessas elegantes damas de sociedade

como esposa. Sou um homem paciente, e Alexandra bem merece a espera. —Lançou ao Colin um frio sorriso—

. Felizmente para ela e para mim, eu não sou escravo de um desses sublime títulos ingleses. Boa noite, Sutton.

Colin o viu partir, sabendo que, desgraçadamente, Jennsen tinha toda a razão do mundo.

Alex esforçou-se em sorrir e deu as boa noite a lorde Wexhall, a lady Vitória e ao doutor Oliver no vestíbulo da

casa do Wexhall e depois subiu a escada para seu quarto notando a pesadez de suas pernas, eternamente

agradecida de que a noite , tivesse finalmente chegado ao fim. Uma vez Colin voltou de sua infrutífera busca

ao estudio, tinha partido. Entre o acidente e todas as horas anteriores vendo-o rodeado de todas aquelas

mulheres formosas paquerando com ele, Alex tinha tido o bastante. Se tivesse tido que suportar ver uma só

mulher mais deixando cair as pestanas enquanto o olhava, haveria...

Lançou um profundo suspiro. Não teria feito nada.

Porque não havia nada que fazer. So engolir sua pena e sorrir e pretender que não se importava, que o facto de

que logo outra mulher possuiria o homem ao que ela desejava para si de forma tão estúpida e desesperada não

lhe doía tanto, que mal podia respirar.

Aumentava seu pesar saber que logo sua aventura teria terminado. Havia dito que acabaria quando ele se

decidisse por uma jovem como esposa. Tinha eleito aquela noite a mulher com a que comprometer-se?

Excepto pelos momentos imediatamente posteriores ao acidente, tinha-a estado evitando toda a noite, não se

tinha aproximado da mesa onde ela jogava as cartas, não lhe tinha dirigido a palavra. Ela o tinha estado

procurando com o olhar em tantas ocasiões que tinha perdido a conta, mas pelo que tinha visto, embora ele

tinha estado perto para garantir sua segurança, não tinha olhado em sua direcção. Inclusive quando partiu da

festa com os Wexhall, tinha-a saudado com um gesto formal, um educado boa noite, a alegria de que não

tivesse sofrido ferida alguma, e sua expressão inescrutável. Não tinha feito gesto algum para lhe beijar a mão

nem sequer para tocá-la, e por mais que queria convencer-se do contrário, seu frio distanciamento, doía

muitíssimo.

Onde estava o homem que a tinha desejado tão furiosamente aquela mesma manhã, que tinha sido incapaz de

não tocá-la, cujos olhos tinham ardido em desejo de possui-la? Não havia sinal desse homem aquela noite. Em

seu lugar, encontrou-se com um estranho distante que não a tinha olhado com o mínimo desejo. De facto, fazia

falta uma urna que quase a esmaga para que mostrasse emoção alguma.

Alex caminhou lentamente pelo corredor, sentindo um nó de tristeza no estômago. Estava claro que, embora

Colin estava preocupado por ela, já se tinha cansado. Ao vê-la no mesmo salão com todas aquelas brilhantes

jóias de sociedade, se deu conta de que ela era somente uma áspera imitação e, ao comparar, Alexandra tinha

saído claramente perdendo.

Recordou as advertências da Emma: «Sabes que um homem como ele somente tomará e logo ... atirará como

quem atira as sobras do dia anterior. Sabes que te romperá o coração».

Sim, sabia. Sabia que sua aventura, seu conto de fadas, ia acabar. Simplesmente não tinha pensado que

acabaria tão logo, nem que seu desprezo resultaria tão doloroso. Não tinha pensado em que ia ter que

continuar vendo-o quando tomassem caminhos diferentes. Uma coisa era que, por decoro, simulassem em uma

noite que não havia nada entre eles. Outra coisa muito distinta era pretender que não sentia nada porque sua

relação era já... nada. A idéia de manter a farsa de que tudo ia bem diante de sua família na casa do Wexhall a

fez estremecer de horror.

Maldita seja. Queria ir a casa, a sua casa, onde tudo era familiar, onde tinha uma missão, onde a necessitavam.

Faltava uma semana para a festa do Wexhall. Uma vez tivesse concluído, tinha a intenção de voltar para sítio

ao que pertencia.

Entrou em seu quarto e se apoiou na madeira. Fechou os olhos e deixou escapar um suspiro de cansaço.

—Gira a chave.

Alexandra deu um coice e abriu os olhos de repente ante a petição de uma voz suave e profunda que provinha

de um canto sem luz. Embora não podia vê-lo, reconheceu a voz do Colin e um tremor percorreu seu corpo.

Com o coração acelerado e o olhar mergulhando na escuridão, procurou com as mãos a chave que pendurava

da fechadura e, ao notar o metal entre seus dedos, girou o pulso. O som da fechadura reverteu em todo o

quarto. E nesse momento a chave que tinha mantido fechado seu coração se abriu deixando escapar uma

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corrente de emoções que a envolveram, umas emoções que já não podia negar.

Amava-o.

Completamente. Irrevogavelmente. E sem esperança alguma.

As palavras «Te amo» apareceram a seus lábios, mas fechou a boca para as silenciar. Pronunciar inúteis

palavras de amor a um homem com o que não tinha futuro não serviria mais que para humilhá-la e para fazer

que ambos se sentissem incômodos.

—Vaí diante do fogo.

A ordem rouca procedia de perto do armário, mas não podia distinguir sua silhueta em meio da profunda

escuridão. Estacionou seus recém descobertos sentimentos de amor e caminhou para a chaminé lentamente

com passo tremente. As pequenas chamas que ardiam no lareira, esquentaram as costas quando se deteve, um

calor desnecessário porque de repente notava como se o fogo percorresse suas veias.

Amontoaram-se as perguntas, mas tinha a garganta muito ressecada para as pronunciar. Olhou para o canto

mais afastado do quarto e viu como da escuridão surgia uma figura. Colin veio para ela, devagar, como um

predador cercando a sua presa e parou a uma curta distância da Alexandra.

Ela percorreu seu corpo com o olhar, sua camisa branca aberta no pescoço, suas calças ajustadas que

abraçavam suas longas e fortes pernas e que tinha metido em umas botas negras baixas. Seu aspecto era

obscuro, delicioso, e um pouco perigoso. Alex levantou a vista, olhou-o nos olhos e ficou imóvel. Essa fria

indiferença de antes, tinha sido substituída por um cintilante apetite que deixava claro por que estava ali.

Desejava-a.

Foi tal seu alívio que quase cambaleou. Ergueu os joelhos notando que todos seus sentidos voltavam para a

vida. Humedeceu os lábios com a língua e se deu conta de que Colin seguia seu movimento com o olhar, seus

olhos como duas brasas ardentes...

—Colin...

Ele levou um dedo aos lábios.

—Chist. Não fale —sussurrou—. Não te movas.

Alexandra conteve suas palavras e viu como Colin se dirigia à penteadeira que havia junto ao armário. Voltou

com uma cadeira sem braços, de alto respaldo estofado, e a colocou cuidadosamente a um metro mais ou

menos frente a ela. Com o olhar ardente e sereno sobre ela, sentou-se em uma postura relaxada e cômoda, o

que contrastava com a tensão que Alexandra sentia que emanava de seu corpo. Estendeu as pernas, ficou as

mãos nas coxas e Alexandra, com só um fugaz olhar, pôde ver claramente sua erecção contra suas ajustados

calças.

—Tira o vestido.

Aquela suave petição fez que voltasse a olhá-lo aos olhos. Tinha a cabeça apoiada no respaldo de moaré verde

pálido da cadeira, e com os olhos entreabertos a olhava de forma penetrante.

Alexandra sentiu um potente calor que descia por seu ventre. Olhava-a de um modo... como se estivesse

faminto e tivesse a intenção de convertê-la a ela em sua próxima comida. Sentiu como se humedecia. Levantou

as mãos e notou que tremiam. Começou a desabotoar o vestido. Queria dar-se pressa, mas se esforçou para que

seus movimentos fossem deliberadamente lentos, enquanto a expressão intensa e encantada de Colin a enchia

de uma nova e crescente excitação.

Quando desabotoou todos os botões, deixou cair a peça de roupa até seus quadris e daí a empurrou até que

ficou rodeando seus tornozelos. Sabia que, iluminada pelo fogo, Colin poderia ver claramente o contorno de

seu corpo através da fina combinação.

—Muito bonito —murmurou—. Continua.

Notou todo seu corpo estremecer-se, um estremecimento que, graças a ele, reconheceu como excitação. Com o

mesmo ritmo lento, deslizou a combinação por seu corpo e a deixou cair junto ao vestido, e ficou simplesmente

com a roupa interior, as meias e os sapatos calçados. Seus mamilos se endureceram, desejando ansiosamente a

boca e as mãos do Colin. Alexandra arqueou as costas aproximando seu corpo para ele.

—Precioso —disse seu rouco murmúrio. Com o olhar indicou sua roupa interior—. Continua.

Tomando pequenas baforadas de ar para acalmar seu coração desbocado, Alex inclinou para desatar os laços

de seus joelhos e depois deslizou a peça de algodão por suas pernas. Aí de pé frente ao olhar de Colin

repassando suas formas, sentiu como o pulso forte e pesado de seu coração golpeava todo seu corpo, sua

cabeça, seu ventre, entre suas pernas.

— Afasta-te da roupa.

Os joelhos tremeram quando fez o movimento de levantar as pernas para deixar a roupa atrás. Colin a

percorreu com o olhar e Alex perguntou se sua seguinte petição seria que tirasse as meias e os sapatos. —

Deliciosa. Solta o cabelo.

Levantou os braços e tirou os ganchos do coque, os deixando cair sobre o montão de roupa. Quando tirou o

último gancho, moveu a cabeça de um lado a outro e a juba caiu por todas as costas, lhe cobrindo o princípio

de seus quadris nus, produzindo um doce calafrio.

— Toque o peito.

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O calor a percorreu inteira e suas bochechas ruborizaram entre a vergonha e a excitação.

—Não sinta vergonha, Alexandra —disse Colin com um suspiro áspero—. Comigo não.

Tomando ar com força, Alex levantou as mãos e tomou seus seios sentindo seu peso sobre elas.

—Como os sente?

Alex teve que tragar saliva para poder falar.

—Suaves, doloridos.

—Bem. Agora acaricia-os. Como gostaria que o fizesse eu.

Alex passou as mãos pelos sensíveis mamilos e os rodeou com seus dedos. Sentiu que o desejo a apertava por

dentro e esticava as dobras intumescidas e húmidos entre suas pernas.

—Não pares — sussurrou Colin.

Ela obedeceu, jogando com seus seios, esticando seus mamilos, desfrutando-se no fogo que iluminava o olhar

do Colin, um fogo que diluía a vacilação que ainda podia sentir. Abriu os lábios para tomar rápidas baforadas

de ar. Nunca se havia sentido tão perversa, tão lasciva.

—Desliza tuas mãos para baixo.

O ardente desejo nos olhos de Colin e o desejo fervente de sua voz despojaram a Alexandra da pouca inibição

que lhe restava e, estendendo os dedos, subiu-os até a altura de seus ombros e deslizou as palmas de suas mãos

lentamente por seu torso, parando-se quando chegou aos cachos entre suas coxas.

—Mais abaixo.

Baixou as mãos até as deter na parte alta de suas coxas.

—Separa as pernas.

Com o coração desbocado, fez o que Colin pedia, sabendo qual seria sua seguinte petição.

—Toca-tre.

Quase sem atrever-se a respirar, deslizou uma mão entre suas coxas. Gemeu brandamente quando acariciou

com os dedos a essência de sua carne, deliciosamente sensível.

—Como te sentes?

—Humida, quente —disse Alexandra humedecendo os lábios secos. Depositou o olhar no pomposo vulto que

mostrava Colin entre suas pernas estendidas—. Impaciente.

Colin lançou uma espécie de grunhido e moveu os quadris para diante em um lento empurrão. O interior da

Alexandra contraiu como resposta.

—Vazia —sussurrou.

Colin apertou os dentes para frear sua própria impaciência que arranhava cada um de seus nervos. Seus

músculos estavam tensos por um ávido e áspero desejo. obrigou-se a não tocá-la, a esperar, sabendo que no

instante em que a tocasse, seu tenso controle se dissolveria. Aquela visão dela, nua, excitada, banhada pelo

ouro da luz do fogo, com o cabelo solto como uma nuvem de cachos, tocando-se, tinham-no levado aos limites

de sua resistência.

Vem aqui — disse ele com uma voz que não reconhecia.

Os olhos da Alexandra iluminaram-se maliciosamente e negou devagar com a cabeça.

—Não.

Pondo as mãos em seus quadris, indicou-lhe o peito com o queixo e disse:

—Tira a camisa.

Colin sentiu que sua garganta emitia uma risada rouca de admiração, ao mesmo tempo que o calor o abrasava

ante sua doce petição. Sem tirar a vista de cima, desabotoou lentamente a camisa e tirou a peça das calças para

abrir. Depois, deslizou-a por seus ombros e a lançou ao chão.

—Maravilhoso —sussurrou Alexandra—. Essa fina linha de cabelo escuro que percorre teu abdômen é...

fascinante.

Queria agradecer mas se ficou sem voz. O olhar de Alexandra percorreu o torso até deter-se na entrepierna, e

pelos olhos do Colin passou a imagem de seus lábios percorrendo o mesmo caminho.

—Tira as botas.

inclinou-se obedecendo-a e, depois de deixar as botas junto à camisa, voltou a incorporar-se. Apertou

firmemente os talões contra o suave tapete para impedir de saltar e abraçá-la.

—Há alguma parte de teu corpo que não seja formosa? —perguntou Alex brandamente.

Antes de que lhe pudesse responder lhe perguntando o mesmo, ela levantou a vista e lhe disse:

— Abre as calças.

Com mãos trementes, Colin desabotoou as duas filas de botões laterais, libetando seu membro erecto que se

elevou para seu ventre. Sentiu o olhar penetrante e ardente de Alexandra como uma carícia. Notou como se

inchava seu membro e teve que agarrar-se à cadeira para não perder a batalha pelo controle de seu corpo.

—Magnífico —disse Alex com olhos brilhante—. Tira isso.

Olhando-a, levantou os quadris e tirou a ajustada peça de roupa. Teve que fazer um enorme esforço para ir

devagar e quando terminou, respirava pesadamente. Voltou a acomodar-se na cadeira adotando de novo sua

postura lânguida e indolente, uma postura que ocultava completamente a tensa espera que o possuía e o fogo

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que lambia seu corpo.

—Separa as pernas. Bem separadas.

Colin o fez; então Alex o olhou nos olhos.

—Toca-te. Como gostarias que eu o fizesse.

Tomando pequenas baforadas de ar, tomou a base de seu membro com dois dedos e os deslizou para cima.

Quando alcançou a ponta, acariciou-a com pequenos e delicados círculos, para depois percorrê-lo para baixo

de novo.

—Como te sentes? —sussurrou com o olhar posto nas delicadas carícias dos dedos do Colin.

—Duro. Quente. Impaciente. —As palavras saíram ofegantes—. Seco.

Alex o olhou nos olhos e naquele olhar transmitiram algo, um pouco mais profundo que a mera intimidade e o

desejo algo que ele não podia nomear, porque nunca antes o havia sentido.

Sem uma palavra, Alex se moveu para ele e se deteve quando virtualmente roçava a cadeira com suas pernas.

—Seco? —murmurou—. Possivelmente possa ajudar.

Ajoelhou-se e delicadamente afastou a mão de Colin. Inclinando-se, passou a língua por seu membro.

O coração de Colin, que tinha ficado em suspense, voltou para a vida, lhe golpeando com força as costelas,

enquanto ele ofegava por um pouco de ar. Olhou para baixo e em um momento de ardente luxúria viu a língua

de Alexandra girar ao redor da ponta de seu pênis, capturando a gota perlada de seus fluidos, lambendo-o com

um húmido roçar.

Colin deixou cair a cabeça contra o respaldo da cadeira e um comprido gemido saiu de sua garganta. Passou

seus dedos pelo cabelo da Alexandra, transfigurado pela erótica visão e sensação dos húmidos lábios dela

fechando-se a seu redor. Era o cúmulo da intimidade física, mas de algum modo, naquele momento, não lhe

parecia suficiente.

—Alexandra... —Apertou as mãos contra seu cabelo e levantou-lhe a cabeça delicadamente—. Vem aqui.

Os olhos da Alexandra mostraram vacilação.

—Não te dei prazer?

—Sim, Meu Deus, sim —conseguiu dizer Colin enquanto a guiava para que ficasse de pé, abrisse as pernas e se

montasse escarranchado sobre ele.

Não sabia como explicar-lhe a necessidade que tinha sentido de sentir sua pele contra a dele, de tocá-la

profundamente, com todo seu corpo, assim disse simplesmente:

—Mas quero te sentir toda.

Quando Alexandra se posou sobre ele, tirou-a dos quadris e introduziu a ponta de seu membro em seu sexo.

Seus lábios se abriram e, agarrando-o nos ombros, Alex deslizou sobre ele, uma penetração ardente, húmida,

que arrancou a Colin um esmigalhado gemido. Quando esteve dentro até o fundo, perdeu o último vestígio de

controle. Tomou a cabeça com uma mão e envolveu a boca do Alex com a sua, enquanto com a outra mão

acariciava seus peitos.

Mas mesmo assim não era suficiente. Empurrou para cima, com todos os músculos em tensão, golpeando com

sua língua o interior da deliciosa boca de Alexandra, em uníssono com as investidas de seu corpo. Ela retorcia

contra ele, e toda a existência de Colin ficou reduzida à união de seus corpos. Seu membro inchou e

rapidamente —não sabia se muito rápido ou não o suficientemente rápido— notou como Alex se fechava a seu

redor. Separando suas bocas, afastou-se para absorver a visão dela jogando o corpo para trás, afundando os

dedos em seus ombros, o som de seu comprido gemido ao alcançar o clímax. E quando seus espasmos se

diluíram, Colin saiu com rapidez em um esforço que quase o mata. Sua respiração se entrecortou e a abraçou

fortemente, mantendo-a junto a ele, seus corações unidos, enquanto se deixava levar pelo orgasmo.

Seu coração não tinha recuperado ainda o pulso normal quando ela se removeu e levantou a cabeça. Colin

abriu os olhos e a viu, ruborizada, com o cabelo revolto, os lábios húmidos e separados, um olhar de saciada

satisfação em seus olhos cansados.

Algo se removeu em seu interior, algo que lhe dizia que embora no momento podia ser suficiente, nunca nada

seria bastante com aquela mulher.

Capítulo XIX

Alexandra olhou através da janela de seu quarto na mansão Wexhall e suspirou. O céu cinza e pesado reflectia

perfeitamente seu estado de ânimo e aquele redemoinho de nuvens negras casava com o tumulto de emoções

que a embargava.

Apoiou a frente contra o frio cristal e observou melancolicamente o jardim. Era a última noite que ia passar

naquela casa, assim que contemplava por última vez. Faltava apenas uma hora para que começasse a festa de

lorde Wexhall e, passasse o que passasse aquela noite, tinha a intenção de cumprir a promessa que tinha feito a

si mesma e retornar ao lugar ao que pertencia no dia seguinte.

Era possível que só levasse uma semana ali? deu a volta e passou o olhar pelo luxo que a rodeava. Era

aterradora a facilidade com a que se acostumou a todo aquilo: à serena elegância; às suntuosas comidas; aos

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banhos quentes sem limite; a enorme, cálida e cômoda cama; a ter todas suas necessidades cobertas; a sua

incipiente amizade com lady Vitória quem, apesar de sua nobre posição social, não era nada pretensiosa, a não

ser amável e, aos olhos do Alex, a personificação do que uma dama devia ser.

Embora ainda de forma súbita e com bastante frequência se sentia incômoda, consciente de que não pertencia a

esse estrato social, não podia negar que tinha desfrutado da comodidade de que se ocupassem de suas

necessidades. Pela primeira vez em sua vida, tinha tido alguém que a cuidasse.

Mas não podia permitir-se esquecer de onde vinha, o lugar a que estava destinada a retornar. Aquele breve

período ali, viver essa vida, não era outra coisa que um sonho mágico e delicado, um sonho de frágil cristal,

um presente que devia apreciar e recordar com carinho, mas que não podia confundir com a realidade. Como o

tempo compartilhado com Colin.

Colin...

Fechou os olhos. Meu Deus, como ia dizer adeus? Só idéia a encheu de uma dor profunda e dilaceradora.

Proibiu-se pensar nisso durante aquela semana. Em lugar disso, tinha saboreado cada minuto que tinham

passado juntos, guardando as lembranças de cada prezado dia e de cada nova experiência como um avaro

tesoureiro. Negava-se a ouvir os ponteiros de relógio, do relógio que ressonavam no mais profundo de sua

mente indicando o tempo que faltava para que aquele apaixonante conto de fadas tivesse seu fim. E então,

ambos seguiriam com suas vidas, umas vidas que por pertencer a classes diferentes e ter divergentes

ocupações não voltariam a cruzar-se.

À medida que a semana tinha ido avançando, seu amor por ele tinha ido crescendo espantosamente e, ao

mesmo tempo, crescia a desolação que a aguardava no horizonte. Tinha assistido a três noites mais como

madame Larchmont, mas apesar de ter estado muito atenta, não havia tornado a ouvir aquela voz rouca.

Ninguém se tinha aproximado nem dela nem a Colin de forma suspeita, e não tinha havido mais acidentes.

Entretanto, as festas tinham sido uma tortura, tentando simular que não se dava conta do enxame de belas e

jovens jóias que brilhavam ao redor do homem a que amava, uma das quais tinha que escolher como esposa.

Tinha visto Logan nas três noites, e em cada uma delas a tinha acompanhado a dar uma volta pelo salão e ao

aparador onde se serviam as bebidas. Estava claro que Colin não gostava do tipo e esticava a mandíbula cada

vez que o via ou mencionavam seu nome. Mas, ela sim gostava de Logan. Era inteligente, perversamente

engenhoso, sua companhia a agradava e seus cuidados a adulavam. De facto, podia entender por que resultava

muito tentador a tantas outras mulheres, e se Colin não lhe tivesse roubado já o coração, suspeitava que Logan

Jennsen poderia tê-la conquistado.

Sem mais informação nem pistas sobre a conversa que tinha escutado no estudio de Malloran, todo o mistério

parecia ter acontecido em outra vida, a outra pessoa. A semana tinha passado voando, entre passeios pelo

parque com o Colin e Lucky, acompanhados a uma discreta distância por Emma e John, quem, claramente,

desfrutavam de estarem juntos, comidas compartilhadas, longas conversações e apaixonantes encontros

íntimos.

Para sua felicidade e surpresa, Colin não parecia nunca cansar-se de tocá-la, de lhe sorrir, de rir com ela. E o

que lhe tinha ensinado! Como jogar a black gamon, especialmente a versão em que o perdedor deve fazer

amor com o vencedor. Em sua opinião, isso a convertia a ela na vencedora, mas não tinha intenção alguma de

pôr objecções. Também lhe tinha ensinado uma simples, mas escandalosa, melodia em seu piano forte, uma

lição ainda mais agradável quando Alex sugeriu que enfeitassem a letra da canção com um estribilho subido de

tom.

Mas sua lição favorita tinha tido lugar na sala de bilhar, onde Colin lhe ensinou o jogo, e a ainda mais

interessante versão de «como fazer amor inclinada sobre uma mesa de bilhar».

Colin tinha visitado seu quarto cada noite, mimando-a em cada ocasião com um doce mazapán e bolos

gelados, antes de saciar seus apetites sensuais. Em ocasiões tinham feito amor lenta e delicadamente, e outras o

tinham feito com pressa, selvagem e furiosamente. Era um amante generoso, excitante e ao que gostava de

experimentar, animando-a e inspirando-a a que ela fizesse o mesmo.

Em sua mente apareceu a imagem da noite anterior: Colin tinha levado uma terrina com nata lustrada que

tinha roubado da cozinha. Decorou todo seu corpo nu com aplicações do doce e, acto seguido, saboreou a

delícia que tinha criado, para desfrute dos dois. Depois, tinha-lhe devolvido o prazenteiro favor. De facto, a

noite tinha sido o fecho perfeito para um dia perfeito...

Fechou os olhos e desfrutou do caleidoscópio de imagens da saída do dia anterior, deixando que invadissem

sua mente. Colin chegou logo pela manhã com uma cesta cheia de laranjas que se parecia muito a da Emma e

anunciou que tinha uma surpresa. Então apareceu Emma acompanhada de um assustado Robbie que levava a

um também surpreso Lucky a rastos. Todos juntos empreenderam uma viagem de três horas em sua elegante

carruagem sem que Colin indicasse qual era seu destino. Finalmente chegaram a uma formosa e majestosa casa

que se levantava em meio de um verde prado.

A propriedade se chamava Willow Pond, e Colin explicou que a tinha adquirido fazia vários anos mas que

apenas a usava. Desde que estava em Londres ainda não a tinha visitado e tinha pensado que Alexandra

desfrutaria de um dia fora da cidade com seus amigos. O facto de que Colin soubesse e compreendesse quanto

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sentia falta da Emma e do Robbie e que, apesar da amabilidade de todo o mundo, ela se sentia desajustada na

mansão de Wexhall chegou-lhe ao coração.

O tempo tinha sido magnífico e, depois de dar uma volta pela casa e pelos jardins, tinham almoçado

acompanhados por John, o criado, sob a sombra de um imenso salgueiro junto a um pequeno lago no confim

da propriedade.

Antes de subir à carruagem para voltar para Londres, Alex tinha dado a volta para contemplar a formosa casa

e os jardins e comentou que não podia imaginar ter algo tão bonito e não dar uso, não tirar proveito algum.

Colin franziu o cenho e observou a casa durante um comprido minuto. Depois assentiu em sinal de aprovação.

De todos os dias que tinham compartilhado, aquele tinha sido o melhor, e o recordaria durante o resto de sua

vida.

Mas tinha despertado aquela manhã sabendo que aquele período mágico estava a ponto de terminar, e por

toda parte a assediaram as dolorosas e indesejadas imagens que tinha conseguido evitar durante aqueles dias:

a imagem de Colin sorrindo a sua nova esposa, rindo-se com ela, a obsequiando com doces, fazendo amor,

levando-a a picnics privados em sua casa de campo.

Abriu os olhos e se voltou para olhar fixamente a cama... a cama que tinha compartilhado com ele. E se sentiu

vazia. Possivelmente teria sido melhor não ter experimentado nunca os prazeres nem as maravilhas que tinha

compartilhado com ele, pois não se pode sentir falta do que não se conhece. Certamente teria sido mais

inteligente. Mas aqueles pensamentos eram inúteis, e devia os afastar de sua mente e concentrar-se na noite

que a esperava.

Todos, Colin, Nathan, lorde Wexhall e ela, estavam preparados e decididos a encontrar o assassino aquela

mesma noite e evitar que ninguém sofresse dano algum. E no dia seguinte, ela partiria.

E a dor não teria feito mais que começar.

Com todos os músculos de seu rosto contraídos em uma expressão indiferente para ocultar a tensão que o

torturava, Colin dava lentamente voltas a sua taça de brandy, passeando o olhar pelos convidados cada vez

mais escassos que ficavam no salão de baile de Wexhall. Eram quase duas da madrugada e a festa estava a

ponto de terminar. Alexandra não tinha reconhecido a voz e não tinha ocorrido nada mal. Era possível que o

assassino tivesse trocado seus planos, que os tivesse abandonado? Ou possivelmente os havia adiado? Seu

instinto dizia que o assassino não tinha renunciado a seu plano, embora rezava para que assim fosse.

Maldito seja, queria que acabasse tudo de uma vez, queria conhecer a identidade do assassino, evitar futuros

crímes, e que se fizesse justiça para que todos pudessem recuperar sua vida normal.

Sua vida normal... Uma desagradável sensação o fez estremecer. Recuperar sua vida normal significava

encontrar uma esposa, uma tarefa que se foi tornando menos apetecível conforme passavam os dias da última

semana. Deitando um olhar às jovens elegantemente vestidas que ficavam no salão de baile, Colin se viu

obrigado a enfrentar o facto de que nenhuma delas, fosse qual fosse sua formosura ou sua riqueza, sua

educação ou seu meio familiar, atraía-o de maneira significativa. A maioria delas eram em realidade

encantadoras e qualquer delas seria uma esposa aceitável, mas nenhuma, passasse o tempo que passasse

conversando com elas, despertava o interesse que Alexandra produzia nele com só um olhar.

Alexandra, dirigiu seu olhar para o canto onde ela estava jogando as cartas. Passar a semana com ela tinha

sido... incrível. Tinham sido os dias mais felizes de sua vida, e pensar em seu fim o enchia de uma dor que não

podia nomear. Embora ainda tivesse os pesadelos e o sentimento funesto que o tinha obrigado a ir a Londres,

quando estava com ela, toda a escuridão se dissipava.

—A festa está a ponto de terminar e até agora não aconteceu nada — disse-lhe Nathan tirando-o de repente de

seu sonho.

—Deixa de farejar em meu redor —exclamou Colin irritado.

—Pois começa a prestar atenção —disse Nathan arqueando as sobrancelhas—. Sobre tudo porque a noite ainda

não terminou e podes ser tu quem está em perigo.

—Não se passará nada —disse com séria determinação.

Entretanto, seu instinto seguia avisando-o com um zumbido desagradável, como tinha ocorrido durante toda a

noite.

—Não, se posso evitá-lo —disse Nathan.

—Onde está Wexhall?

—No vestíbulo, despedindo-se dos convidados. Vitória está com ele, e dois de seus homens de confiança.

Permaneceram de pé em silêncio vendo como os convidados íam partindo desocupando o salão.

—Lady Margaret deixa a mesa das cartas —disse Nathan depois de vários minutos—. Perguntome se lhe

augouraram seu próximo casamento.

—Está prometida? —perguntou Colin com surpresa mas sem muito interesse.

—Ainda não. O vai estar?

—Como demônios queres que saiba?

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—Saberia se a tivesses pedido em casamento.

—E por que ia fazer algo assim?

—Possivelmente porque anunciaste que estás procurando esposa, e ela parece ter todas as qualidades que um

homem de tua posição pode necessitar. Ou trocaste de opinião sobre o casamento?

O rosto do Colin obscureceu.

—Não, não mudei de opinião. Devo... me casar e faz tempo que devia ter completo com minha obrigação.

—Estou de acordo.

—Isso diz o homem que herdaria o título caso de que eu morresse sem descendência.

—Totalmente de acordo. O dia que abandones teu celibato e comeces a trabalhar para trazer um herdeiro, meu

suspiro de alívio se ouvirá por toda a Inglaterra.

Ficaram calados. Ao cabo de uns minutos, Alexandra reuniu com eles e Colin teve que apertar os punhos

contra seu corpo para não abraçá-la.

—Parece ser que nosso assassino mudou de opinião —disse em voz baixa.

—É possível —murmurou Colin, sentindo-se mais depravado ao tê-la junto a ele—. Especialmente porque sabe

pela nota que deixou em casa do Malloran que tinham ouvido seus planos. Mas suspeito que o plano será

adiado, não abandonado.

—Desgraçadamente, eu estou de acordo —disse Nathan—. E o que é pior, agora não podemos saber o que

planejaram.

Acompanharam os últimos convidados fora do salão e ao cabo de um quarto de hora, quando a porta se fechou

depois do último deles, estavam junto a Wexhall e Vitória, todos de pé no vestíbulo, intercambiando olhares

que eram uma mescla de alívio e inquietação.

—Muito pouco emocionante —murmurou Wexhall.

—Sim —disse Colin—, mas não acredito que a história tenha terminado. A próxima grande festa é depois de

amanhã na mansão de lorde Whitemore. Devemos nos manter alerta.

Notou que Alexandra ficava tensa para ouvir suas palavras, mas antes de que pudesse lhe perguntar algo,

Vitória agarrou o braço a Nathan e disse:

—Se me desculparem, eu gostaria de me retirar.

Colin olhou sua cunhada e notou que estava muito pálida.

—Não te encontras bem? —perguntou-lhe Nathan agarrando-a pelos braços, com a voz cheia de preocupação.

—Só estou muito cansada —disse ela fazendo um débil esforço.

Sem uma só palavra, Nathan a tomou em seus braços. Vitória deixou escapar um gemido de queixa mas depois

se limitou a rodear o pescoço de seu marido com os braços e deixar que a levasse escada acima.

—Seguiremos discutindo nossos planos amanhã pela manhã —disse Nathan olhando por cima do ombro.

—Acredito que eu também vou retirar-me —disse Wexhall esclarecendo a garganta—. foi uma noite exaustiva,

e já não estou tão em forma como antes. —Olhou o copo de brandy de Colin e acrescentou—: Poderá se retirar

também quando tiver terminado a taça?

—Poderei.

—Fica com o Sutton tomando algo? —perguntou a Alexandra—. Ou a acompanho até seu quarto?

—Uma taça será agradável —disse ela.

Wexhall indicou o corredor com a mão.

—A chaminé de meu estudio está acesa. Desfrutem.

Assim que Wexhall desapareceu escada acima, Colin ofereceu o braço a Alexandra.

—Vamos?

Alexandra agarrou o braço do Colin com sua mão enluvada. Tinham passado cinco horas e dezenove minutos

da última vez que a tinha tocado (não é que as estivesse contando) e já lhe parecia muito. As onze horas e vinte

e sete minutos que tinham passado da última vez que a tinha beijado pareciam uma vida inteira. Mas ia pôr-

lhe fim assim que chegassem ao estudio, assim como às vinte e dois horas e quatro minutos que tinham

transcorrido da última vez que lhe tinha feito amor.

Quando fechou a porta do estudio e rodou a chave, Colin deixou a bebida e tomou Alexandra em seus braços,

beijando-a com todo o desejo reprimido, a frustração e a inquietação que tinha oculto durante toda a noite. E

tudo desapareceu excepto ela, seu tacto entre seus braços, sua delicada fragrância, seus lábios acesos, a seda

cálida de sua boca, a curva aveludada de sua língua contra a dele, aquela indescritível maneira de sentir-se

junto a ela.

Desesperado por tocá-la, baixou as mãos, tomando seus quadris, tentando apalpar uma parte de sua pele de

bronze. Mas antes de que pudesse fazê-lo, ela empurrou as mãos contra seu peito, interrompendo seu beijo e

afastando-se dele. Quando se aproximou, Alex tornou para trás e moveu com gesto negativo a cabeça.

—Não vim aqui contigo para isto.

Algo em sua voz encheu a Colin de inquietação. Adotando uma atitude relaxada, dirigiu-se ao aparador de

bebidas.

—É verdade. Querias uma taça.

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—Não quero beber nada. vim a falar contigo.

—Muito bem —disse Colin aproximando-se do sofá de couro que havia junto ao tapete aos pés da chaminé e

percebendo a tensão da Alexandra—. Nos sentamos?

—Prefiro ficar de pé.

A inquietação de Colin aumentou. Maldita seja, tinha ouvido algo essa noite? Tinha visto algo? Tinha-a

insultado alguém?

—De acordo. —moveu-se para ela mas notou que Alexandra necessitava distância, assim, ficou detrás do

tapete—. Do que queres falar?

—De nós.

Colin levantou as sobrancelhas surpreso pela resposta.

—O que se passa connosco?

—Quero dizer-te quanto desfrutei de nosso tempo juntos. Foi mágico, maravilhoso. foste maravilhoso.

Um sentimento estranho e terrível apoderou-se de Colin e notou um nó no estômago.

—Obrigado. Eu também desfrutei de nosso tempo juntos, Alexandra.

—Quero que saibas que te desejo toda a felicidade do mundo.

—Eu também a ti. —Lançou uma risada que não resultou tão despreocupada como tinha pretendido—.

Falando de felicidade, pensei que amanhã gostarias de ir ao Bond Street. Poderíamos...

—Não.

Colin quis ignorar a funesta intuição que já o embargava, mas não pôde.

—Possivelmente queres fazer alguma outra coisa?

—Irei pela manhã, Colin.

—Irás? —disse Colin, e um calafrio o percorreu da cabeça aos pés.

—Sim, já é hora de que volte para minha casa, a minha vida.

—Não estou absolutamente de acordo. Poderias estar ainda em perigo.

—Possivelmente sim ou possivelmente não. Não posso interromper minha vida mais tempo por algo que pode

ser que não aconteça nunca.

Colin sentiu como se o tivesse esbofeteado.

—É isso, o que foi o tempo que passaste comigo, uma interrupção?

—Não, claro que não, mas já é hora que volte para minha casa, e fazer face às minhas responsabilidades. Como

também é hora de que tu faças às tuas.

—Manter-te a salvo durante esta passada semana foi minha responsabilidade.

—E o tens feito muito bem. Agradeço isso. Mas tens outras responsabilidades.

—Como quais?

—O casamento.

A palavra ressonou na mente do Colin como se fossem sinos de morte, provocando nele uma sensação

parecida com o pânico. Esclareceu a garganta.

—Se insistes em voltar para sua casa... —disse.

—Insisto.

—Então enviarei minha carruagem amanhã pela tarde para te recolher e podemos...

—Não, Colin. Está claro que não me expressei com claridade. Não há mais «nós». Nosso tempo juntos

terminou. Não vim a esta sala para organizar nosso próximo encontro. Estou aqui para me despedir.

Sentiu como se o coração parasse. Nem pensar em lhe dar espaço. Ultrapassou a distância que os separava com

grande rapidez, e a tomou em seus braços.

—Não.

E a palavra lhe saiu mais dura do que tinha pretendido, mas aquela voz fria, aquela indiferença em seus olhos

o enfureciam, e, maldita seja, faziam-lhe mal.

—Sim. Acordamos que nossa história terminaria depois da festa de lorde Wexhall —disse Alex.

—De facto, acordamos que não terminaria até que escolhesse uma esposa, e ainda não o tenho feito.

—Só porque estiveste ocupado em evitar que o assassino de lorde Malloran voltasse a actuar. Agora que a festa

de lorde Wexhall já chegou e passou, é hora de que te dediques a isso. —Olhou por um momento o chão e logo

o olhou aos olhos—. Nossa história também impediu de escolheres uma esposa. Colin, eu entendo que tens que

cumprir com teu dever. Os dois sabíamos que nosso acordo era temporário.

Colin deslizou suas mãos pelos braços da Alexandra e entrelaçou seus dedos com os seus.

—Mas não tem que terminar esta noite.

—Sim, tem que ser assim. —Afastou suas mãos—. Desejo e necessito que assim seja.

A expressão da Alexandra era neutra, mas Colin notou a debilidade de seu tom.

—por que?

—Estou-me tornando muito cômoda —disse Alexandra depois de uma breve vacilação—. Estou-me

acostumando muito a luxos que nunca terei. Estou começando a depender muito de alguém cuja presencia em

minha vida é só temporária. Temo que se continuar com nossa relação mais tempo, arrisco-me a ficar sem uma

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parte de mim mesma que não desejo perder. Terminar agora é o melhor para os dois.

Colin apertou a mandíbula para evitar dizer algo estúpido, como suplicar que ficasse. Em sua cabeça sabia que

ela tinha razão. Mas em seu coração... maldita seja, quanta dor.

Alexandra procurou seu olhar.

—Entendes? —perguntou-lhe docemente.

—Deixaste muito pouca margem para que possa te interpretar mal.

Ao ver o evidente alívio da Alexandra, sua dor aumentou um pouco mais.

—Bem —continuou ela—. Quero que saibas... —Fez uma pausa e pela primeira vez desde que tinham entrado

na sala, Colin pôde ver um pouco de ternura em seus olhos—. Tens que saber que não me arrependo de

nenhum dos momentos que passamos juntos, que espero que tua vida seja uma maravilhosa e feliz aventura, e

que te sentirei falta em... —Sua voz converteu-se em um sussurro—... cada dia de minha vida.

Antes que Colin pudesse pensar, mover-se, reagir, deu-lhe um ligeiro beijo no queixo e atravessou a sala.

Mudo, viu como partia e fechava cuidadosamente a porta detrás dela sem voltar o olhar.

Olhou a porta, petrificado, absolutamente destroçado. Levou as mãos ao peito, ao lugar onde pulsava seu

coração, um coração onde notou uma profunda e sangrenta ferida.

Se tivesse sido capaz de mover-se, teria ído por detrás dela, assim possivelmente era melhor ficar petrificado.

Porque sabia que se ia detrás dela era para lhe suplicar que reconsiderasse sua decisão e, dada sua óbvia

determinação, o gesto só conseguiria incomodá-los aos dois.

Tão rápido como Alexandra tinha entrado, tinha saído de sua vida e ele era livre para a reatar.

Mas antes de fazê-lo, tinha que averiguar no que consistia isso.

Capítulo XX

Uma hora depois de deixar Colin no estudio, Alex passeava acima e abaixo por seu quarto com a firme

determinação de não chorar. Sentia-se exausta tanto física como mentalmente, mas era simplesmente incapaz

de deitar-se a sós na cama que tinha compartilhado com ele.

Colin. Só de pensar no seu nome sentia dor. Doeria sempre tanto? apagaria-se alguma vez esse penetrante

desejo, essa profunda saudade, essa terrível dor? meu Deus, esperava que sim. Porque era inimaginável ter que

viver com esse terrivel sofrimento durante o resto de sua vida.

Afastou-a de seus desencorajadores pensamentos, um ruído perto das janelas

que davam para o terraço, e deu a volta rapidamente. Uns segundos mais tarde voltou a ouvi-lo. Era como

estivessem atirando pedras contra os vidros. O coração deu um tombo. Colin?

Correu para as janelas e olhou para fora com cautela. Os vidros estavam banhados por uma suave garoa e a lua

iluminava as fantasmagóricas colunas de névoa que ondulavam sobre o solo prateado. Não viu ninguém.

Possivelmente tinha ouvido mal...

Algo bateu no vidro, justamente em frente de seu nariz e Alexandra abafou um sobressalto. Assegurou-se que

sua pequena e afiada navalha estava escondida, na sua bota de cano longo, e abriu a porta para investigar da

varanda. Deitou um rápido olhar, por cima da cornija de pedra, e ficou gelada ao ver emergir uma figura

familiar de entre as sombras.

—Senhorita Alex — sussurrou Robbie vindo para ela—. Preciso falar consigo, agora mesmo.

—O que está fazendo aqui? —sussurrou Alex.

—O direi quando descer até aqui. Depressa!

Felizmente, Alex não se despiu depois da festa, e se apressou a sair de seu quarto. Assim que pisou nos

ladrilhos da terraço, Robbie materializou-se sainda da escuridão, e a agarrou pela mão.

—Por aqui —sussurrou puxando por ela—. Depressa, senhorita Alex, está ferido.

Deu um tropeção e o coração deu um tombo.

—Ferido? Quem?

—O tipo. Venha!

Robbie começou a correr e Alexandra levantou as saias e o seguiu atemorizada e com o coração encolhido. Em

sua mente apareceu a imagem do Colin ferido, e correu mais depressa. Quando chegaram ao canto mais

afastado do jardim, Robbie assinalou o barraco do jardineiro.

—Está aí detrás. Não sei se respira ou não.

Pôs ao Robbie por detrás dela e tirou a navalha da bota. Deu a volta ao barraco e ficou gelada. Apesar da

escuridão, não havia dúvida de quem era o homem, curvado sobre a erva e o coração subiu-lhe à garganta.

Ajoelhou-se junto a ele e apertou os dedos contra seu pescoço. Através das gemas, notou o débil pulso e

respirou aliviada. Estava vivo. Mas por quanto tempo? Qual era a gravidade de suas feridas?

—Lorde Wexhall —murmurou dando-lhe toques no rosto—. Pode me ouvir?

Lorde Wexhall não se moveu e Alexandra passou suas mãos delicadamente pelo corpo do homem em busca de

feridas.

—O que passou? —perguntou ao Robbie bruscamente em um sussurro.

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Jacquie D’Alessandro Um Romance Impossivel

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—Eu tinha-me escondido no jardim, como tenho feito varia vezes estes dias, vigiando-a embora me disse que

não o fizesse, e ouvi um ruído. Com muito cuidado fui ver o que era, e vi uma sombra com uma capa fugir

daqui. Quando olhei, vi a este tipo. Não sabia o que fazer assim fui a procurá-la. Está morto?

—Não.

—É um amigo ou é mau?

—Um amigo.

Os dedos da Alexandra notaram um inchaço tremendo na parte posterior da cabeça, um inchaço quente,

húmido. Sangue. ficou de pé de um salto, agarrou Robbie pela mão e correu para a casa.

—Não o vai ajudar?

—Sim, vou procurar o doutor. Está aí dentro.

—Não sou necessário para isso.

—Não te vou deixar aqui fora sozinho.

Entrou na casa e correu com o Robbie para o vestíbulo. Pôs as mãos sobre seus ombros e disse:

—Vou acima a procurar o doutor. Ficas aqui.

Robbie assentiu com a cabeça mas não a estava olhando. Em lugar disso, observava boquiaberto o esplendor

que o rodeava com um olhar onde se mesclavam a surpresa e a premeditação, um olhar que Alexandra

conhecia muito bem. Sacudiu-lhe os ombros e acrescentou:

—Não roube nada.

Viu a decepção nos olhos de Robbie, mas o moço assentiu.

Correu escada acima e pelo corredor, e se deteve frente ao quarto que compartilhavam Nathan e lady Vitória.

Chamou freneticamente à porta e, ao cabo de uns segundos, apareceu Nathan que ainda não tinha ído à cama e

vestia suas calças de traje e sua camisa branca.

No mesmo instante em que a viu, no seu rosto aflorou a tensão.

—O que aconteceu?

—atacaram a lorde Wexhall. Tem uma ferida na cabeça. Está no jardim, inconsciente.

—Está vivo?

Alexandra assentiu.

—Espere aqui.

Meteu-se no quarto e se ouviu um murmúrio de vozes. Voltou com uma carteira de couro negro e uma

lanterna.

—Leve-me até ele —disse secamente.

Recolheram Robbie no vestíbulo, e correram através da casa e do pátio, enquanto Alexandra contava o que o

menino tinha explicado.

—Disse a Vitória que desperte os serviçais e mande dois criados connosco —disse Nathan quando Alexandra

acabou sua explicação.

Uns segundos mais tarde chegaram ao barraco e Alex viu como Nathan se ajoelhava junto à figura estendida.

Voltou-se para Robbie, e ficou de cócoras a sua altura.

—Diz-me algo mais da figura com capa que viu —perguntou a Robbie olhando-o nos olhos, que tinha

totalmente abertos. Sua voz estava carregada de medo e de impaciência—. Reconheceu esta pessoa?

Robbie negou com a cabeça.

—Só vi uma capa grande e negra movendo-se na névoa. Correu para as cavalariças e logo se foi nessa direcção

—disse assinalando para a esquerda.

O coração da Alexandra parou.

A mansão de Colin estava para a esquerda.

Soltou Robbie e dirigiu-se para Nathan.

—A pessoa que atacou a lorde Wexhall fugiu em direcção à casa de Colin. Pode ser que esteja em perigo. Vou

com ele.

—Wexhall precisa cuidados imediatamente. Não o posso deixar aqui. Os criados chegarão a qualquer

momento —disse Nathan muito tenso.

—Não posso esperar.

—Não pode ir sozinha.

—Não pode deter-me. Já chegamos muito tarde. Tenho uma navalha e não me dá medo utilizá-la. Mande os

criados quando chegarem. —Olhou a Robbie—. O doutor Oliver necessitará ajuda. Fica aqui com ele e faz o

que te diga.

Sem esperar resposta, correu para os estábulos e dirigiu-se para casa de Colin.

E rezou para que não fosse muito tarde.

Colin estava apoltronado em sua sobrecarregada poltrona frente à chaminé de seu estudio privado, com uma

taça de brandy vazia na mão, olhando fixamente as chamas. Desgraçadamente, as línguas de fogo não

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pareciam conter a resposta às perguntas às que dava voltas sua mente: Como era possível fazer tanto dano e

fazê-lo mostrando-se tão diabolicamente indiferente ao mesmo tempo?

Acabava por não saber o que o tinha ferido mais, se as palavras de Alexandra ou o frio desapego com o que as

tinha pronunciado. Maldita seja, como podia dizer adeus e partir assim, com tanta calma? Como se não

tivessem compartilhado mais que um aperto de mãos. Em outras circunstâncias teria admirado sua

compostura desapaixonada; Deus sabia que era uma conduta que ele mesmo exercia com grande mestria. Mas

para ele nada que tivesse que ver com a Alexandra era cometido, ou superficial, ou desapaixonado, ou sereno.

Não o tinha sido desde a primeira vez que pôs os olhos nela. Entretanto, ela o tinha rejeitado a ele e à

intimidade que tinham compartilhado, sem pestanejar.

Tinha que fazer os acertos econômicos necessários: uma quantia de dinheiro suficiente não só para ela mas

também para os meninos que ajudava. Certamente, se o bastardo do Jennsen se sai com a sua, Alexandra não

necessitará nenhum apoio econômico por minha parte, disse-se.

Sua parte racional o recordou que devia estar contente, quase agradecido, de que o rico americano se ocupasse

dela, que pudesse e fosse ocupar se dela. Mas não o estava. A só idéia, de que aquele bastardo a tocasse,

beijasse, e a amasse, fazia que a raiva nublasse a sua vista. Não, seus sentimentos para com Jennsen eram o

oposto à alegria e à gratidão. Como tampouco, eram esses os sentimentos para com a Alexandra, por ter

terminado com sua aventura.

É obvio, tinha-lhe economizado a incômoda tarefa de fazê-lo ele. O problema era que ele não estava nem

remotamente preparado para romper com ela, e isso não fazia mais que acrescentar frustração e confusão a sua

dor. Deveria ter estado disposto a que cada um seguisse seu caminho. A responsabilidade de encontrar uma

esposa, pesava como uma bigorna e não podia negar que Alexandra tinha razão: sua aventura o tinha distraído

de suas obrigações. Com muita mais profundidade do que ela suspeitava. Porque não podia pensar em outra

mulher que não fosse ela. Porque não queria a nenhuma outra. Porque...

Amava-a.

A verdade daquele sentimento o golpeou como um bofetão. ficou de pé deixando escorregar de seus murchos

dedos a taça vazia de brandy. Não só a desejava. Não só a admirava. Amava-a. Amava tudo o que era, sua

inteligência, seu engenho, sua compaixão e sua fortaleza, seu aspecto, a fragrância a laranjas de sua pele, seu

sorriso, sua risada, a forma em que o tocava, como o fazia sentir-se. Bom, à excepção daquela noite em que o

tinha feito sentir-se muito mal, mas salvo esse momento, ela o tinha preenchido de uma sensação de profunda

e serena felicidade, algo diferente de tudo o que havia sentido .

Incapaz de ficar quieto, começou a percorrer a sala. Havia muitas coisas a ter em conta, e uma delas, a mais

importante, era o amava ela a ele? Colin parou e mexeu no cabelo. Não sabia, mas por Deus que estava

decidido a averiguá-lo. E quando soubesse...

Seus pensamentos foram interrompidos por um insistente repicar. Franzindo o cenho, saiu para o corredor e

deu conta de que alguém estava batendo na porta principal com a aldraba de metal. Quem podia estar

chamando a aquelas horas? Nathan? Wexhall? Alexandra?

Ellis tinha-se retirado há um momento, assim foi para a porta, agachando-se com rapidez para tocar sua bota e

assegurar-se de que sua faca estava onde devia estar, se por acaso o visitante não tinha intenções amistosas.

Antes de girar a chave, olhou através das amplas janelas de vidro que flanqueavam a porta e sentiu-se surpreso

e confuso ao reconhecer a pessoa que estava fora. Abriu a porta.

—Lady Miranda.

Sua surpresa se transformou em preocupação quando a luz pálida das velas do vestíbulo iluminou a soleira.

Lady Miranda levava o cabelo revolto, seus olhos estavam muito abertos e sua bochecha estava manchada pelo

que parecia restos de terra. Puxou-a pelo braço e a fez entrar, fechando a porta com chave depois.

—Está bem?

—Pois não —disse lady Miranda com voz agitada. Tremeu visivelmente e agarrou o braço do Colin com

lágrimas nos olhos—. Bandidos... à volta da esquina. assaltaram minha carruagem... Me... Tiraram-me a bolsa e

as jóias. O condutor correu detrás deles e eu... eu tinha medo de esperar sozinha na carruagem. —O lábio

inferior tremeu—. Sinto o incomodar tão tarde...

—Está ferida?

Negou com a cabeça e seu cabelo negro solto caiu sobre a capa negra.

—Não, só... aturdida. —Olhou a seu redor—. Os serviçais já se retiraram?

—Sim. —Ajudando-a a caminhar, Colin a levou para seu estudio—. Deixe que a ajude a ficar cômoda. Depois

irei ver sua carruagem e alertarei às autoridades.

—Obrigado, milorde. —Olhou-a e seu lábio inferior se transformou em um indício de sorriso—. Me alegro

tanto de que estivesse em casa e acordado...

Entraram no estudio e Colin a conduziu directamente ao canto frente à chaminé, onde se sentou com um

suspiro de agradecimento. O olhar de Colin se fixou na mancha da bochecha e à luz do fogo pôde ver que era

sangue.

—Quantos ladrões eram? —perguntou tirando o lenço do bolso.

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—Dois.

—E que aspecto tinham?

—Feios, sujos... —De novo o tremor se apoderou dela—. Horríveis.

Agachando-se junto a ela, Colin estendeu o lenço e assinalou-lhe a bochecha.

—Tem um pouco de sangue. Se me permitir...

—Sim...

Delicadamente limpou a mancha.

—Bateram-lhe?

—Sim —disse lady Miranda assentindo e rodeando-se com os braços—. antes de me agarrarem a bolsa.

—Servirei-lhe um brandy —disse Colin levantando-se—. A ajudará acalmar os nervos.

Deu a volta e se dirigiu ao aparador, com o cenho franzido. Seu instinto lhe dizia que algo não enquadrava.

Serviu o brandy, repassando lentamente o que tinha ocorrido desde que abriu a porta. Franziu ainda mais

profundamente o cenho. Ela dizia que lhe tinham batido e havia sangre em sua bochecha... Mas não havia

nenhum corte ou marca em sua pele.

De repente deu conta e deu a volta. Mas era muito tarde. Lady Miranda lhe apontava o peito com uma pistola.

Colin calculou rapidamente a distância que havia entre eles. Muita para lhe agarrar a arma. Dirigiu o olhar à

porta. Tinha-a fechado com chave.

—As mãos na cabeça — ordenou com voz tensa e em um sussurro.

—Se dispara —disse Colin indicando a pistola—, o ruído despertará a toda a casa. Agarrarão-na antes que

chegue ao vestíbulo.

—Ambos sabemos que sairia daqui antes que alguém pudesse me alcançar. E o primeiro que faria é acabar com

sua amante, madame Larchmont. Depois com seu irmão e lady Vitória. —Sorriu agradada—. Já matei Wexhall,

assim poderia me ocupar do resto do lar. —Seu sorriso desapareceu—. As mãos na cabeça. Agora.

Colin sentiu tensão e angústia, mas se obrigou a permanecer com calma e a não pensar nas espantosas imagens

que as palavras de lady Miranda, provocaram em sua mente. Tinha sobrevivido a situações muito piores que

aquela. Só tinha que esperar o momento adequado, esperar a oportunidade de desarmá-la.

Levantou os braços devagar e disse em tom aborrecido:

—Tem intenção de me dizer a que se deve tudo isto?

—OH, sim. —Fez um sinal com a cabeça—. Mova-se para o centro da sala. Devagarinho e sem tretas.

Colin fez o que lady Miranda pedia, e ela se moveu ao mesmo tempo que ele, mantendo a distância que os

separava. Quando ele parou, ela foi ao aparador onde estavam as bebidas. Sem baixar a pistola, tirou um

pequeno frasco do bolso e verteu os pós que continha no brandy que Colin lhe tinha servido. Depois de

guardar o frasco de novo no bolso, levantou a taça de cristal e remexeu o licor de cor âmbar.

—Ácido prúsico, suponho —murmurou Colin assinalando a bebida.

Ela assentiu.

—Sua bebida preferida, mas não a de Malloran nem a de seu criado, Walters.

—Walters teria terminado mal de todos os modos —disse encolhendo os ombros—. Malloran simplesmente se

meteu no meio. Depois de sua festa, acompanhei-o ao estudio onde encontrou uma nota. —Seus lábios se

moveram formando uma espécie de sorriso—. Levei um tempo averiguar quem tinha escrito essa estúpida

missiva, mas no final o consegui.

Colin sentiu que o terror percorria-lhe a espinha dorsal, mas manteve uma expressão e um tom completamente

impassíveis.

—Quem a escreveu? —perguntou.

—Madame Larchmont, como bem sabe. Resultou ser uma incômoda complicação.

—Assim tentou matá-la com a urna.

—Sim. Desgraçadamente, tem uma sorte endiabrada.

—por que Wexhall? por que eu?

—Você matou meu marido —disse com os olhos cheios de ódio.

As palavras, pronunciadas com um sussurro rouco, que soube era a voz que Alexandra devia ter reconhecido,

pairaram no ar tenso que os separava, e sua mente calibrou com rapidez o que implicavam. Só tinha morto um

homem. Mas ela não podia sabê-lo. E ele tinha que alterá-la.

—Matei muitos homens —disse encolhendo os ombros—. Quem era seu marido?

—Richard Davenport —disse lady Miranda com o rosto escurecido.

—Ah, o covarde traidor.

—Era fiel a França —disse ela com o rosto enfurecido.

—Precisamente isso o convertia em um traidor. —Repassou-a com o olhar de um modo deliberadamente

insultante—. O nome de sua esposa não era Miranda, nem era de origem nobre. Quem é você?

—Sophie, sua esposa de origem francesa —disse a mulher erguendo o queixo.

—Já vejo. Assim que essa era a razão pela mudança sua lealdade. Seu acento inglês é impecável.

—Obrigado. Sou boa com os acentos e trabalhei muito para aperfeiçoá-lo.

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—E a verdadeira lady Miranda?

—Reside no campo, nos arredores do Newcastle.

Chegou-lhe um débil ruído. Eram cristais quebrados? Tossiu para ocultar o som mas ela não pareceu dar-se

conta e continuou:

—Lady Malloran não via lady Miranda desde que eram meninas, assim ficou encantada de dar a bem vinda a

sua quase esquecida parente que vinha de tão longe para passar a temporada em Londres. Cumpriria minha

missão antes que alguém descobrisse que era uma impostora.

—E sua missão era...?

—Matar o homem que tinha assassinado a meu marido e ao que o ordenou fazê-lo.

—Richard morreu faz cinco anos. por que esperou tanto?

—Quando me inteirei de que Richard tinha morrido —disse Sophie depois de uma ligeira piscada—, adoeci de

dor. Perdi o bebê que esperava e demorei muitos meses em me recuperar. Tive muito tempo para reflectir.

Richard me tinha contado tudo sobre seu trabalho para a Coroa, sobre o Wexhall e sobre ti e a missão que

tinham atribuída a ambos. Quando morreu, soube que foi você o responsável e que ías morrer por me ter

tirado tudo o que tinha, a meu marido e a meu filho. —Sua voz tremeu de ódio—. Uma vez que me recuperei,

necessitava um cuidadoso plano que levou seu tempo. —Inclinou a cabeça e acrescentou—: E aqui estamos.

—Não acreditará que sairá desta viva.

—Justamente o contrário. Estou convencida de que assim será. Quem suspeitaria que a doce lady Miranda

pudesse cometer actos tão malvados? E inclusive se o fizessem, Wexhall já não se encontra entre nós e você está

a ponto de morrer. Madame Larchmont estará morta pela manhã. Depois, lady Miranda simplesmente

desaparecerá e voltará a aparecer Sophie.

Agitou uma vez mais a taça e a colocou sobre a mesa. Deu um passo atrás e assinalou o licor com a cabeça.

—Obrigado, mas não tenho sede.

—Se não beber isso, dispararei. O veneno é um modo muito menos doloroso de morrer.

—Ah, vejo que está preocupada com meu bem-estar.

Acabava de falar quando ouviu um ruído muito débil e muito familiar e seu coração parou. Era o som de uma

fechadura abrir-se. Nathan? Ou algum dos homens do Wexhall?

Rezou para que não fosse seu irmão a não ser um destes últimos o que se estava metendo naquela confusão. E

esperava que, fosse quem fosse, viesse armado.

Com o olhar fixo em Sophie, moveu-se devagar para a porta, formando um ângulo com a intenção de obrigar a

mulher a dar as costas à porta, se queria manter a pistola apontando ao seu peito. Tal como tinha esperado, ela

moveu-se e justamente nesse momento a porta por detrás dela se abriu devagar uns centímetros.

—Importaria-se de tomar também uma taça? —perguntou assinalando o aparador—. Estaria encantado de

compartilhá-la consigo.

—Beba, disse-se em um tom que não admitia réplica—. Não faça movimentos bruscos.

Colin abriu a boca para responder mas não chegou a pronunciar palavra alguma. Porque não era Nathan nem

nenhum dos bem treinados homens de Wexhall quem tinha entrado na sala. Era Robbie.

Com o coração desbocado de absoluto terror, Alex agachou-se no terraço que dava ao estudio do Colin, dando

obrigado pelo amparo que ofereciam as amplas cortinas que tapavam as janelas e rezando para que a lua

continuasse escondida por detrás das nuvens. Enquanto se esforçava por ouvir a conversa entre lady Miranda

e Colin, com cuidado introduziu um dos ganchos de seu cabelo na fechadura e sentiu uma serena satisfação

quando conseguiu abri-la. A seus ouvidos, o imperceptível som da fechadura ao ceder pareceu um estalo, e

dirigiu o olhar a lady Miranda que estava se movendo e infelizmente tinha uma estupenda visão das janelas.

Mas não importava, a fechadura da porta estava aberta e Alex tinha o elemento surpresa de sua parte. O único

que precisava era uma distracção, entre Colin e ela conseguiriam desarmá-la. Baixou a mão e agarrou a

navalha de sua bota tocando o quente metal.

—Beba isso, ouviu a dura voz de lady Miranda através dos vidros—. Não faça movimentos bruscos.

Baixa as mãos, ordenou Alex mentalmente a Colin. Isso... um pouco mais...

Agarrou o puxador da porta, pronta para saltar, quando um movimento chamou sua atenção e notou que o

sangue lhe gelava.

Robbie entrou sigilosamente na sala, com sua pequena mão metida no bolso e seus dedos, sem dúvida, ao

redor de algum tipo de arma caseira. Lady Miranda notou algo porque dirigiu a vista para o menino sem

deixar de apontar em nenhum momento a Colin.

—Que este miudo morra depois que o mate depende inteiramente de si, lorde Sutton —ouviu dizer Alex—.

Diga que saque a mão do bolso e que se mova onde possa vê-lo.

—Não deixarei que faça mal ao menino —ouviu que respondia Colin rapidamente.

—Então diga-lho agora.

Alex deu a volta ao trinco e abriu um pouco a porta.

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—Faz o que diz, Robbie —ouviu que dizia Colin com calma.

Viu como Robbie tirava a mão do bolso e avançava. Cortou-lhe a respiração quando viu que se situava

directamente entre lady Miranda e Colin.

—Põe-te por detrás de mim, Robbie —disse Colin com decisão—. Agora.

Robbie duvidou por um instante, e depois correu detrás de Colin.

—Não pode protegê-lo —disse lady Miranda com sorriso sarcástico.

—Com meu último halo de vida —sentenciou Colin com um tom de voz que Alex nunca lhe tinha ouvido —.

Robbie —disse trocando a voz a um tom mais amável mas firme—, se lady Miranda disparar, corre o mais

rápido que possas. Não pares. Simplesmente corre.

Robbie assentiu golpeando com sua testa a parte posterior da coxa de Colin.

Alex dirigiu seu olhar para lady Miranda, que parecia estar bastante nervosa.

—Bebe o brandy —ordenou.

Alex viu como Colin agarrava lentamente a taça e soube que era agora ou nunca. Tomando ar e rezando para

que não fosse pela última vez, entrou na sala.

Capítulo XXI

Os dedos de Colin acabavam de fechar em redor da taça de brandy, quando se abriram as janelas e Alex, como

um anjo vingador carregado de fúria, com o olhar selvagem e bramindo uma navalha, entrou através delas

lançando um uivo. Uma distracção era o único que necessitava. Agachou-se, tirou sua navalha com uma mão e

com a outra atirou Robbie ao chão.

— Fique aí — disse-lhe.

Nesse mesmo momento, Sophie voltou-se para Alex com o rosto convertido em uma máscara de gélida

surpresa. Como se tudo transcorresse em câmara lenta, Colin viu como sua mão dirigia a pistola para Alex.

Com um ligeiro movimento de pulso lançou sua navalha, e esta atravessou a negra capa de lady Miranda

afundando-se em seu peito até o punho.

Ao mesmo tempo, soou um disparo. Por um momento, ninguém se moveu. A imagem ficou gravada na mente

de Colin. Depois a pistola deslizou dos dedos do Sophie, caindo sobre o tapete com um golpe seco. Seguiu-a o

corpo de Sophie.

Colin ficou em pé de um salto e correu parando um só instante para comprovar que Sophie estava morta.

—Alexandra...

Ela voltou-se para ele e o coração do Colin deu um tombo.

O sangue formou uma rápida mancha que se estendeu pela parte dianteira de seu vestido. Quando chegou até

ela, os joelhos de Alex dobraram e, tomando-a em seus braços, tombou-a delicadamente no chão.

—Senhorita Alex! —gritou Robbie. Caiu de joelhos junto a Colin—. Está... está...?

—Está viva —disse Colin, contendo o pânico que ameaçava ultrapassá-lo.

— Vaí a casa dos Wexhall. Traz o doutor Nathan Oliven diz que dispararam sobre Alexandra. —Olhou nos

olhos do aterrorizado moço—. Vaí rapido, Robbie.

O menino saiu disparado. Colin introduziu os dedos sob a gaze empapada em sangue do vestido de Alexandra

e o rasgou. O sangue saiu aos borbotões de uma ferida irregular e o coração deu-lhe um tombo. Colin soltou os

fechos da camisa e atirou a peça formando uma bola de tecido que apertou contra a ferida.

—Alexandra —disse com a voz turvada ao pronunciar seu nome—. Querida, podes ouvir-me?

Ela continuava inerte, com a cara branca como a cera.

—Ellis! —gritou Colin.

Estava convencido que os criados chegariam de seguida;o disparo devia tê-los despertado. Uns segundos mais

tarde ouviu passos rápidos, levantou a vista e viu Ellis na soleira da porta. Levava o robe mal fechado e

deixava a descoberto uma longa camisa de noite.

— Disparam nela — disse Colin, dirigindo a vista para a Alexandra—. Nathan está em caminho. Ferve água,

trás ataduras, qualquer coisa que acredites que faça falta.

—Sim, milord.

Quando ouviu afastar os passos de Ellis, Colin inclinou-se e pôs seus lábios junto ao ouvido de Alexandra.

Notava o aroma metálico do sangue no nariz e fechou os olhos imaginando que cheirava sua deliciosa

fragrância a laranjas.

—Não permito que morras —sussurrou com fúria—. Ouve-me? O proíbo categoricamente. Sabes o

acostumado que estou a sair-me com a minha. É obvio que sabes. Adoras dizer o aborrecido que resulto.

Colin se incorporou um pouco, repassando o rosto do Alex em busca de algum sinal de consciência, mas não

encontrou nenhum. Sentiu-se tomado por um medo insalubre e paralisante

. Tomou a mão da Alexandra com a sua, notou a sensação de sua palma nua e endurecida.

—Bom, a ver que o incomodo te parece isto. —O nó que tinha na garganta apenas o deixava falar—. Quero que

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abras os olhos, quero que sorrias, quero te alimentar com bolos e mazapán, quero comprar um montão de

vestidos que encham uma sala inteira, quero fazer realidade todos seus sonhos, quero te dizer quanto significas

para mim... quanto te amo... —quebrou-lhe a voz—. Por favor, deixa que faça todas estas coisas, Alexandra. —

Seu olhar se desviou para sua camisa, que agora estava empapada de sangue, e o terror o invadiu —.Por

favor...

Ouviu vozes e passos rápidos no corredor e levantou a vista. Nathan, com o semblante grave e levando sua

mala negra de médico, atravessou a toda pressa a sala seguido de Robbie, que continuava com os olhos

totalmente abertos e sem fôlego.

—Sangra por uma ferida na parte alta do braço — explicou gravemente Colin—. Ellis vai trazer água quente e

ataduras.

Nathan assentiu, e ajoelhou junto a Colin.

—Tenho ataduras em minha mala. Vaí buscá-las

Colin levantou-se e agarrou as ataduras que Nathan tinha pedido. Viu como seu irmão retirava o vulto da

camisa empapada em sangue e um nó contraiu-lhe o estômago.

—Vai .. morrer? — Apenas podia pronunciar essas palavras.

Depois de um exame muito rápido, Nathan disse:

—Vou fazer tudo o que está em minha mão para me assegurar que não morra. É uma ferida superficial, má,

mas poderia ter sido muito pior.

Pressionou uma atadura de linho limpa contra a ferida e dirigiu o olhar para o Sophie.

—Está morta —disse Colin—. Contarei isso tudo mais tarde. —Apertou os punhos—. Matou Wexhall.

—Não, não o matou. Está vivo. Partiu uma costela quando caiu e terá uma terrível dor de cabeça durante

vários dias. O bom é que tem a cabeça dura como uma pedra. —Nathan trocou com calma a vendagem

empapada em sangue por um limpo e acrescentou—: Tem que chamar o juiz.

—Não a vou deixar.

Ellis apareceu carregado de ligaduras seguido por John, que levava dois baldes de água quente. Quando

deixaram as coisas junto a Nathan, Colin deu instruções a John de ir procurar o juiz.

Virou-se e viu o Robbie de pé num canto, observando o que acontecia com olhos aterrados. Maldição, sabia

exactamente como se sentia o guri. Dirigiu-se para ele e Robbie afastou a vista de Alexandra para fixá-la em

Colin.

—Ficará bem a senhorita Alex? —perguntou o menino com voz tremula.

—Nathan é o melhor médico que conheço —disse Colin agachando-se frente a ele e olhando-o aos olhos—. E é

meu irmão.

—Há um montão de sangue —disse Robbie tragando saliva.

—Sei. Mas de certeza que tem muita mais —disse Colin; ao menos isso esperava. — Foste muito valente esta

noite, Robbie.

O menino fungou o nariz e logo o limpou com o dorso da mão.

—Tentava ajudar a senhorita Alex —disse, tremendo-lhe o lábio—, mas o único que consegui é que

disparassem contra ela.

—Isso não é verdade —disse Colin negando com a cabeça—. Trouxeste o doutor a uma velocidade assombrosa

e ao estares aqui salvaste a minha vida. Agradeço isso e estou em dívida contigo.

Estendeu a mão devagar.

Robbie estudou a mão estendida durante vários segundos e depois limpou a palma de sua suja mão em suas

também sujas calças, e estendeu o braço. A mão do menino era tão pequena... Colin sentiu que se formava um

nó na garganta. O efeito do vacilante tacto daquele moço era mais forte que a ameaça de uma faca contra suas

costas.

—Nunca tinha estreitado a mão a um tipo elegante como o senhor —murmurou Robbie.

—E eu nunca tinha estreitado a mão de um jovem herói como tu —disse Colin depois de esclarecer a garganta

para desfazer a tensão.

Robbie soltou a mão e a meteu no bolso.

—Isto é seu —disse estendendo o punho—. Não o roubei. Só o agarrei para usá-lo como arma se o necessitava.

Abriu a mão e na palma suja apareceu um sólido ovo de cristal que estava acostumado a estar sobre uma mesa

do vestíbulo.

Colin sorriu e teve vontade de passar a mão pela cabeça, mas pensou que era muito cedo para semelhante

familiaridade.

—Muito esperto —disse agarrando o ovo.

—Quebrei a sua elegante janela —murmurou—. Não podia abrir a porta da entrada. —Assinalou com o

polegar a porta que dava ao corredor—. Essa outra foi mais fácil.

—Foi uma sorte para ambos que a tenhas aberto. Não te preocupe pelo vidros, Robbie. Isso pode arranjar-se

facilmente. —Seu olhar se voltou para a Alexandra—. Partindo-o, salvaste algo muito mais importante e que

não pode substituir-se.

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Capítulo XXII

Dois dias depois da memorável festa de lorde Wexhall, Alexandra estava sentada frente a Colin em sua

elegante carruagem, tentando animar-se. Colin tinha estado actuando de maneira muito estranha desde a

manhã anterior, quando Alexandra despertou por fim, com uma dor ardente no ombro, e com o rosto pálido e

escurecido de Colin observando-a. Rapidamente se tinha recordado do que tinha acontecido, e Colin assegurou

que Robbie se encontrava bem e explicou tudo o que se tinha passado. Quando terminou, Alexandra olhou a

seu redor e, dando-se conta de que estava no quarto de convidados da mansão Wexhall, perguntou-lhe:

—Como voltei para aqui?

—Eu trouxe-te. Nathan queria te ter perto para te vigiar e dada tu... situação, pensei que era melhor que não

passasse a noite em minha casa.

—Claro —murmurou ela—.

Tentou não sentir-se ferida mas fracassou ostentosamente. Era ridículo. Sua aventura tinha terminado e, uma

vez resolvidos os assassinatos, não havia nada mais que falar entre eles. E entretanto, sua ausência lhe fazia

dano. Nathan, lady Vitória, lorde Wexhall, inclusive Robbie e Emma a tinham visitado —mais de uma vez—

mas Colin não. Quando Nathan estava trocando a ligadura, Alexandra tinha perguntado por ele procurando

não mostrar interesse, e o médico tinha-lhe respondido vagamente:

—Está ocupado.

Claro, nesse momento em que já não tinha nenhuma ameaça nem nenhuma amante que o distraísse, com toda

certeza se pôs mãos à obra para procurar esposa. E desse modo tinha que ser, recordou-lhe sua consciência.

Devia ser assim. Mas isso não fazia sua aguda dor mais suportável.

Logan Jennsen tinha-lhe levado pessoalmente, um magnífico ramo de rosas vermelhas esse mesmo dia pela

manhã. Não se tinha ficado muito tempo, mas, antes de partir, tinha-lhe dito:

—É óbvio que há algo entre Sutton e tu. Mas quero que saibas que minha amizade é incondicional. E que eu

também sou uma opção.

Suas palavras a tinham emocionado, mas Logan estava equivocado. Não havia opção. Porque Colin não o era.

Logan sim, estava claro. E era um bom homem...

Mas depois, às quatro da tarde, tinham-lhe entregue o buquê de flores maior que jamais tinha visto, junto com

uma nota escrita em uma caligrafia grossa e masculina: «Há algo que eu gostaria de te mostrar esta noite, se

gostares de uma pequena excursão. Se for assim, ver-te-ei ás oito. Colin».

Alexandra sabia que tinha que dizer que não, mas simplesmente não pôde. Não quando desejava tão

ferverosamente passar uma noite mais com ele. Colin tinha chegado pontualmente às oito e embora o ombro

doesse, a dor era suportável, e não só estava morta de vontade de sair da casa, mas sim sentia também uma

tremenda curiosidade por saber o que queria lhe mostrar. Entretanto, depois de fazer alguns formais

comentários sobre sua saúde e sobre o tempo, Colin tinha sumido no silêncio mais absoluto e olhava através

dos vidros do carro com uma expressão inescrutável.

Uns minutos mais tarde, a carruagem parou, e quando Alex olhou pelo guichê, cortou-se a respiração.

—Vauxhall? —murmurou.

Colin separou da janela e voltou a olhá-la. Tinha os olhos muito sérios mas não havia forma de adivinhar neles

seus pensamentos.

—Queria te mostrar quão formosos estão os jardins de noite nesta época do ano, com seus faróis e os casulos

em flor. Como fazia uma noite tão estupenda, pensei que gostarias de dar um passeio.

— Eu adoraria dar um passeio.

Um pouco parecido ao alívio iluminou os olhos de Colin. Ajudou Alexandra a levantar-se, com grande decoro,

sem permitir que suas mãos se tocassem mais que uma milésima de segundo, algo que por ridículo e irracional

que fosse fez que Alexandra se sentisse decepcionada. Depois, com um gesto cortês, ofereceu-lhe o braço.

Alexandra tomou com a mão e entraram no formoso jardim.

Nas taças das altas árvores cintilavam centenas de lanternas, que iluminavam a escuridão só rota pelo reflexo

da lua e davam à paisagem um aspecto de bosque encantado. Havia grupos de gente passeando pelas avenidas

do parque, casais, famílias, todos rindo e conversando, muitos deles dirigindo-se já para barracos de comida

famosas por seu presunto finamente talhado e seus esplêndidos vinhos.

Caminharam em silencio pela grande avenida, a cujos lados se levantavam as impressionantes árvores

iluminadas. A mente de Alex se transladou a todas aquelas noites que tinha passado ali, estudando a ricos

cavalheiros, decidindo qual deles resultaria a vítima mais fácil. Estava tão perdida em seus pensamentos que

não se deu conta de que se dirigiram para um caminho muito menos transitado, até que Colin disse

brandamente:

—Esta foi sempre minha zona favorita dos jardins.

Alexandra voltou de repente para a realidade e, ao olhar a seu redor, sentiu um calafrio. Era o lugar exacto

onde o tinha visto pela primeira vez.

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—Também a minha —disse sem pensar.

Colin parou e deu a volta para olhá-la.

—Se este canto fosse sempre quente e seguro, iluminado pelos dourados raios de sol e infestado de verdes

prados onde crescem flores de cores, seria seu lugar perfeito.

Uma cálida sensação de surpresa e prazer a embargou.

—Lembras-te do que disse.

Colin tomou a mão delicadamente e um comichão quente percorreu o braço da Alexandra.

—Minha doce Alexandra, lembro as primeiras palavras que me disses-te. E também as últimas. E todas as que

disses-te entretanto.

—Quais foram minhas primeiras palavras? —perguntou-lhe ela.

—Não te lembras? —replicou-lhe Colin olhando-a aos olhos.

És tu, pensou.

—Não tenho tão boa memória como tu — disse Alex.

—Então provavelmente não recordarás as primeiras palavras que te disse.

Tenho muito carinho a este relógio, recordou para si.

—Tu sim?

—Sim —disse Colin e soltou-lhe as mãos.

Alexandra imediatamente sentiu falta de seu calor. Mas em lugar de seguir passeando, Colin tirou seu relógio

do bolso do colete. Inclusive ali, naquele caminho tenuemente iluminado, o elegante ouro brilhava na palma de

sua mão.

—Tenho muito carinho a este relógio —disse brandamente.

Alexandra levantou de repente a vista para os olhos do Colin. E súbitamente compreendeu. Começaram-lhe a

tremer os joelhos e literalmente sentiu que seu rosto perdia toda a cor.

—Sabes —disse, com a voz tremula e convertida em um suspiro—. Sabes. Soubeste-o sempre.

—Sim, do momento em que te vi na festa de lady Malloran. —Olhou-a aos olhos profundamente—. E está claro

que tu também o soubeste.

Alexandra sentiu que a invadia uma terrível vergonha e que suas bochechas avermelhavam. Assentiu em

silêncio e logo lhe escapou uma risada desoladora.

—Não posso acreditar que te lembrasse de mim, que me reconhecesse.

—Nunca te esqueci —disse Colin com um olhar e um tom sérios—. Teus olhos, tua cara, tuas palavras, a forma

em que me olhas-te. Passei horas aquela noite procurando por ti. E todas as noites que estive em Londres.

Inclusive quando vim esta última vez, passei as duas primeiras noites na cidade, aqui, em Vauxhall,

percorrendo estes caminhos, procurando por ti, a uma mulher da que nem sequer sabia o nome.

—Por que? por que o fizes-te? —disse Alexandra olhando-o completamente surpreendida.

Colin passou-lhe o dedo pela bochecha.

—Voltas-te aqui alguma vez para me procurar?

—Mais vezes das que possa chegar a contar —disse ela dando-se conta de que não tinha nenhum sentido

ocultar a verdade.

—Então sabes por que te procurei. Pelas mesmas razões pelas que tu . Queria voltar a ver-te, queria saber o que

tinha sido de ti, mas sobre tudo queria te dar isto. —E tomando a mão, pô-lhe o relógio na palma aberta.

Alexandra deu um salto ante o tacto do relógio de ouro, e depois olhou a Colin e negou com a cabeça.

—Não posso aceitar .

—Sim, podes. —Fechou-lhe o punho ao redor do ouro, ainda quente pelo tacto de Colin—. Quero que o tenhas.

No mesmo momento em que o agarrei, arrependi-me.

—Eu o tirei de ti —disse Alex afogando uma risada de surpresa.

—E deveria ter deixado que ficasses com ele. Necessitava-o muito mais que eu. Por favor, aceita-o agora, como

prova de minha mais alta estima e admiração.

—Estima? Admiração? Por uma ladra? —disse Alexandra em tom irônico.

—Estima e admiração pelas batalhas que tiveste que lutar e que ganhaste, visto que já não és uma ladra. És...

extraordinária.

—Não o sou absolutamente.

—O facto de que estejamos aqui, quatro anos mais tarde, e que tenhas chegado tão longe de onde estavas então

prova que o és —disse Colin tomando-lhe o queixo—. Não minimizes o teu sucesso, Alexandra, nem a

fortaleza e integridade que são necessárias para o alcançar. Fizes-te tanto por ti e pelos meninos que ajudas que

me ajoelho ante ti. E estou orgulhoso de te ter conhecido.

As palavras do Colin a deixaram docemente aturdida. Mas o que lhe oferecia...

—Colin, este relógio... é muito. Não posso...

—Alexandra, aceita este presente. —Sustentou-lhe o olhar—. Por favor.

—Não... não sei o que dizer.

—Obrigado? —disse ele com um meio sorriso.

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—Obrigado. Guardarei-o como um tesouro.

—Agrada-me. E agora, podes satisfazer minha curiosidade?

—Sim, posso.

—Aquela noite, olhas-te para mim como se já me conhecesses. E disse «és tu». O que querias dizer?

Alexandra apertou o relógio dentro do punho fechado.

—Durante anos —disse—, quando me jogava as cartas, aparecia de maneira predominante um homem

atraente, de cabelo escuro e olhos verdes. Quando te vi aquela noite, de algum modo, soube que eras esse

homem.

—E o que quer dizer com que aparecia de maneira predominante?

—Porque ia desempenhar um papel importante em meu futuro. —Alexandra lhe sorriu fracamente—. Parece

ser que, uma vez mais, as cartas tinham razão.

—Isso espero, certamente.

—Como a leitura das cartas teve lugar no passado —disse Alex negando com a cabeça—, nosso futuro já

ocorreu. Já demonstraram que tinham razão.

—Ah. —Colin inspirou profundamente e logo franziu o cenho—. Há algo que devo te dizer.

—O que é?

—Já decidi quem será minha esposa.

Ao ouvir suas palavras pronunciadas calmamente, a noite e a íntima emoção que estavam compartilhando

perderam toda sua cor, e todo se tingiu de uma cor cinza sombria. Alexandra sabia que aquele dia chegaria, e

pensava que estaria pronta para isso, mas nada a tinha preparado para esse duro golpe. A desolação e a pena,

muito mais profundas das que tinha experimentado nas ruas de Londres, apertaram-lhe o coração.

—Já vejo.

—Não, não acredito —disse ele procurando-a com o olhar e negando com a cabeça. Tomou as mãos entre as

suas—. Sabia que me importavas, mas não me dava conta de quanto até que pôs fim a nossa aventura. E esta

manhã, quando despertei depois de passar uma noite infernal e solitária sem ti, te desejando cada minuto que

estava ali , curvado a sós, dei-me conta de que vou querer-te cada noite, que inclusive se pudesse passar cada

minuto de minha vida junto a ti, mesmo assim não seria suficiente. Mas quero tentá-lo.

Tudo em Alexandra, sua respiração, seu coração, seu sangue, ficou paralisado.

—O que estás dizendo?

—Que passei os últimos quatro anos pensando em ti, perguntando o que teria sido de ti. E não desejo

continuar a o fazer. Quero-o saber de primeira mão, cada dia. Estou loucamente e ridiculamente apaixonado

por ti.

E ante o incrível assombro de Alexandra, fincou um joelho no chão e disse:

—Alexandra, queres casar comigo?

Colin a olhou com o coração tresloucado, como se tivesse deslocado através de todo a Inglaterra, com o

cascalho do chão do Vauxhall cravando-se no joelho e esperou. Maldita seja, Alexandra o estava olhando como

se lhe tivesse brotado um terceiro olho. Isso era bom sinal? Não parecia especialmente prometedor, mas não

sabia. Nunca antes tinha feito uma proposta de casamento.

Finalmente e esclarecendo a garganta, Alex perguntou:

— Estás bebado?

Certamente, não era a resposta que esperava.

—Nem uma gota.

Alexandra guardou o relógio no bolso e tirou suas mãos delicadamente.

—Por favor, põe-te de pé.

Quando se levantou, Alexandra apertou-lhe as mãos e Colin deu-se conta de que tinha lágrimas nos olhos.

—Estou comovida e surpreendida por teu oferecimento, mas não podes nem remotamente pensar em casar em

uma mulher como eu.

—Uma mulher como tu?

—por que estás sendo deliberadamente obtuso? —disse Alexandra exasperada—. Sabe o que fui.

—Sim, e sei o que és agora, amável, carinhosa, compassiva, cálida, engenhosa e inteligente. Tudo o que sempre

sonhei.

—Podes ter qualquer mulher que queiras —disse Alex movendo a cabeça negativamente.

—Isso tinha pensado sempre. Mas parece ser que a que eu quero, não me quer.

—Isto não tem nada que ver com o que eu quero, trata-se do que não posso ter.

—Entretanto, eu ofereço-me a ti, com meu título e todas minhas posses.

—Não quero teu título nem tuas posses —disse ela horrorizada e empalidecendo.

—É uma frase, que aposto que nenhuma outra mulher na Inglaterra me diria, a não ser que alguém estivesse

apontando-lhe com uma arma na cabeça. O facto de que o digas e além disso, tal como sei, pensas, só faz que te

ame ainda mais.

—Mas... o que acontece com a tua responsabilidade para com o título?

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—Minha responsabilidade é me casar e trazer para o mundo um herdeiro, uma obrigação que tomo muito a

sério e a que pretendo honrar. Contigo.

—Colin, estás feito para outra, para uma mulher de nobre berço que proceda da mesma classe social que tu.

—Em outro tempo da minha vida teria estado de acordo contigo; entretanto, agora já não. Pode ser que

consideres que és inferior a essas mulheres, mas eu não. Tua riqueza é de outro tipo, de um tipo que o dinheiro

não pode comprar. Carácter, integridade, lealdade, valentia. Estava feito para ti, Alexandra. Tu és o meu

destino.

—Colin —disse ela após permanecer calada uns segundos—. Vivi de forma egoísta durante muito tempo,

apropriando-me de coisas que não me pertenciam.

—Para sobreviver.

—Embora isso seja certo, o que fiz não deixa de ser egoísta. Não posso voltar a ser assim, a pensar só em mim.

Tua vida está em Cornualles, a minha está aqui. Tenho responsabilidades, com a Emma, com o Robbie, com os

outros meninos. Comprometi-me com eles, comigo mesma. Não posso abandonar sem mais tudo isso.

Colin levantou as mãos de Alex e as pôs no peito.

—Pensei em tudo isso e acredito que há uma solução. Pensei que poderíamos passar meio ano em Cornualles e

meio ano aqui. Poderíamos utilizar Willow Pond como um lugar para acolher os meninos que queiras ajudar,

os tirar de Londres e lhes ensinar algumas coisas práticas, como trabalhar nos estábulos, cozinhar, esse tipo de

coisas; prepará-los para levar uma vida produtiva. E durante os meses que estejamos em Cornualles, onde

poderás desfrutar do mar, Emma poderia tomar conta de Willow Pond.

—Farias isso? —perguntou Emma absolutamente boquiaberta.

—Faria o que fosse por ti. —Colin apoiou sua testa contra a de Alex—. Durante anos senti-me inútil e

desnecessário. Tu e tua causa fazem com que me sinta útil. Tenho os recursos para te ajudar. Quero ajudar.

Deixa que o faça.

Alexandra foi atrás com os olhos cheios de esperança, confusão, emoção.

—Mas como será com tua família? Com teu pai? Ficará destroçado quando souber que não escolheste a filha de

algum aristocrata como esposa.

—Nathan e Vitória deram já sua bênção, e Vitória prometeu que te ajudará com os temas sociais. No que

respeita a meu pai, estou certo de que chegará a te querer, mas inclusive se isso não acontecer, não muda nada.

Casarei-me contigo ou não me casarei. Já não tenho pesadelos e já não sinto esse perigo que se abatia sobre

mim, que foi o que me fez vir a Londres em busca de uma esposa. E quero sentir-me assim. É a ti que quero . Só

a ti. —E procurando-lhe o olhar, comentou-lhe—: Recordas de quando falamos de nossa «pessoa perfeita»?

—Sim.

—Tu és a minha pessoa perfeita. Existe alguma esperança de que eu possa ser a tua?

—Sempre o foste —sussurrou Alexandra com lábios tremulos.

Colin soltou as mãos de Alexandra e agarrou seu rosto, esse rosto intrigante que o tinha cativado desde a

primeira vez que a viu.

—Amas-me, Alexandra?

—Estou loucamente, ridiculamente apaixonada por ti —disse ela com os olhos cheios de lágrimas.

—Graças a Deus —disse Colin fechando brevemente os olhos. Voltou-os a abrir e em sua boca apareceu um

sorriso—. Assim estás «loucamente» apaixonada por mim.

—Estou-o —disse Alex rindo.

—E casarás comigo?

—Sim —disse com um fio de voz, e logo riu de novo—. Sim!

Por fim Colin tinha ouvido as únicas palavras que vinha esperando a última meia hora. Abraçou-a e a beijou

com um beijo longo, lento e profundo, cheio de todo o selvagem amor e paixão que o possuía. Quando

levantou a cabeça, olhou dentro daqueles olhos cor marrom chocolate que brilhavam de amor e felicidade.

— diz — sussurrou contra os lábios—, o que prediz madame Larchmont para nosso futuro?

—Amor, felicidade, filhos, mazapanes e muitos doces.

—Fabuloso. eu adoro os doces. Alguma referência à sala de bilhar?

—Para falar a verdade —disse Alex com uma risada que enchia seu rosto de calidez— sim, doces na sala de

bilhar.

—Isso são, sem dúvida, muito boas notícias.

—De facto, eu as definiria como «maravibles», de maravilhosas e incríveis.

Rindo, Colin a abraçou contra ele e a levantou no ar.

—Minha doce Alexandra, eu não o teria definido melhor.

Fim

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