isoladas de gestantes chagÂsicas - arca.fiocruz.br s.g... · tropismo tissular e às lesões...

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Rev. Pai. Trop. — 2): 3, 301-310,1973 ESTUDO EXPERIMENTAL DE AMOSTRAS DO TRYPANOSO- MA CRUZI ISOLADAS DE GESTANTES CHAGÂSICAS * SÔNIA G. ANDRADE ** ACHILÉA L. BITTENCOURT ** ROZÁLIA M. FIGUEIRA*** MAHIA LUIZA CARVALHO*** RESUMO O estudo de diferentes amostras do Trypanosoma crnzi, isoladas de cinco pacientes gestantes chagásicas não mostrou diferenças nas características das mesmas, quer quando provinham de casos em que houve transmissão da infecção ao feto, quer de casos em que não houve transmissão congénita da doença. As diferentes amostras foram caracterizadas do ponto de vis- ta biológico, morfológico e hístopato- lógico. Como se trata de um estudo feito em um número reduzido de casos, não se pode concluir sobre a impor- tância de diferenças de cepas na transmissão congénita da doença de Chagas. Verificou-se, entretanto, que todas as amostras pertenciam a um mesmo padrão o qual foi considerado como facilmente transmissível, levan- do-se em conta que, de cinco pacien- tes das quais as amostras foram iso- ladas, houve transmissão congénita da infecção em duas. O presente estudo poderá servir de base para estudos comparativos pos- teriores utilizando cepas do T. trazi isoladas de áreas em que a incidência de transmissão congénita da infecção é considerada baixa ou inexistente. INTRODUÇÃO A transmissão congénita da doença de Chagas no ser huma- no foi confirmada desde os es- tudos de Dao(9). Nota-se, entre- tanto, que não há uma concordân- cia entre os diversos autores que têm estudado o problema em di- ferentes áreas geográficas, quan- to à incidência desta transmissão, que parece ser maior em algumas áreas que em outras. Assim, em algumas séries de casos em que foi pesquisada a transmissão con- génita da infecção chagásica, esta não foi constatada < 3 - 13 ' 14 - 17 >, en- quanto em outras (4> 5> 7- 8> 10> n> foi assinalada uma significativa incidência de transmissão. Saben- do-se que o Trypanosoma cruzi pode determinar lesões histopa- tológicas diferentes de acordo com a cepa W, poder-se-ia supor que este fator também tivesse im- portância na determinação da passagem transplacentáría do pa- rasito para o feto e, portanto, nas diferenças de transmissão. Com a finalidade de investigar este as- • A A parte experimental deite trabalho foi reall»dk com o auxilio do Conselho Nacional de Peiqului - (TX. 13.320} . •• Prcfeiicrei Aumentei da unlvirildade Federal da Bahia •** BlologlitM di FundicKo Qonealu Monli.

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Rev. Pai. Trop. — 2): 3, 301-310,1973

ESTUDO EXPERIMENTAL DE AMOSTRAS DO TRYPANOSO-MA CRUZI ISOLADAS DE GESTANTES CHAGÂSICAS * „

SÔNIA G. ANDRADE ** ACHILÉA L. BITTENCOURT ** ROZÁLIA M.FIGUEIRA*** MAHIA LUIZA CARVALHO***

RESUMO

O estudo de diferentes amostras doTrypanosoma crnzi, isoladas de cincopacientes gestantes chagásicas nãomostrou diferenças nas característicasdas mesmas, quer quando provinhamde casos em que houve transmissãoda infecção ao feto, quer de casos emque não houve transmissão congénitada doença. As diferentes amostrasforam caracterizadas do ponto de vis-ta biológico, morfológico e hístopato-lógico. Como se trata de um estudofeito em um número reduzido de casos,não se pode concluir sobre a impor-tância de diferenças de cepas natransmissão congénita da doença deChagas. Verificou-se, entretanto, quetodas as amostras pertenciam a ummesmo padrão o qual foi consideradocomo facilmente transmissível, levan-do-se em conta que, de cinco pacien-tes das quais as amostras foram iso-ladas, houve transmissão congénita dainfecção em duas.

O presente estudo poderá servir debase para estudos comparativos pos-teriores utilizando cepas do T. traziisoladas de áreas em que a incidênciade transmissão congénita da infecçãoé considerada baixa ou inexistente.

INTRODUÇÃO

A transmissão congénita dadoença de Chagas no ser huma-no já foi confirmada desde os es-tudos de Dao(9). Nota-se, entre-tanto, que não há uma concordân-cia entre os diversos autores quetêm estudado o problema em di-ferentes áreas geográficas, quan-to à incidência desta transmissão,que parece ser maior em algumasáreas que em outras. Assim, emalgumas séries de casos em quefoi pesquisada a transmissão con-génita da infecção chagásica, estanão foi constatada <3-13 '14-17>, en-quanto em outras (4> 5> 7- 8> 10> n>foi assinalada uma significativaincidência de transmissão. Saben-do-se que o Trypanosoma cruzipode determinar lesões histopa-tológicas diferentes de acordocom a cepa W, poder-se-ia suporque este fator também tivesse im-portância na determinação dapassagem transplacentáría do pa-rasito para o feto e, portanto, nasdiferenças de transmissão. Coma finalidade de investigar este as-

• AA parte experimental deite trabalho foi reall»dk com o auxilio do Conselho Nacionalde Peiqului - (TX. 13.320} .

•• Prcfeiicrei Aumentei da unlvirildade Federal da Bahia•** BlologlitM di FundicKo Qonealu Monli.

302 Rev. Pat. Trop. — (2): 3 — Julho/Setembro, 1973

pecto, resolvemos fazer um estu-do de amostras parasitárias pro-venientes de gestantes chagásicas,a fim de verificar se havia dife-renças nas características entreamostras isoladas de casos emque Jiouve ^transmissão dat doen-ça ao íeto -e de díâsós em qtíe is-ta transmissão ríão' se deu.

As amostras estudadas foramisoladas a partir de triatomídeosutilizados para o xenodiaghósticodas gestantes, sendo que o estu-do e a caracterização destasamostras foi feito sem o conhe-cimento prévio de quais os casosem que houve transmissão, utili-zando técnicas já descritas em"trabalho - anterior <2>. O xeno-"diàgnóstico das pacientes era fei-to nó dia a"ò parto, precedendo omesmo. '

MATERIAL E MÉTODOS

l - Amostras parasitárias —'fórarn isoladas a partir de tria-tomídeos utilizados para xeno-diagnóstico de 5 pacientes ges-tantes chagásicas, constituindo 5grupos experimentais. O conteú-do do intestino posterior dos tria-tomídeos (Rhodnius prolixus) eradiluido em salina e a suspensãoobtida era inoculada em camun-dongos recém-nascidos, por viaintra-peritoneal. A. partir destaprimeira inoculação, foram feitaspassagens sucessivas em camun-dongos recém-nascidos (peso: 4

•ft-5 g) ou adultos jovens (10 a 12g)'. 'As amostras parasitárias fo-ram estudadas detalhadamente

"na 10a, 20a e 30a passagens, afim de se conseguir estabilidadede suas características. O estudodestas amostras constou de: 1)Estudo da parasitemia, feito dia-

riamente, pela contagem dos trí-pomastigotas no sangue periféri-co, entre lâmina e lamínula, em50 campos microscópicos (400x);2) Estudo morfológico dos para-sitos no sangue p^rifériciD' emesfregaços _ corados pelo MayGrunwaíd-Giemsa- com contagemde formas largas! e delgadas è. ve-rificação da percentagem destasformas durante o curso da infec-ção; 3) Estudo histopatológicofeito em animais sacrificados emdiferentes fases da infecção- cujosórgãos foram fixados-em formola 10% e incluídos em parafina eas secções coradas pela hemato-xilina e eosina.• • 2 — Grupos experimentais —em n°. de. cinco- correspondendoa cada uma das amostras parasi-tárias isoladas das gestantes cha-gásicas- através do xenodíagnós-tico (Tabela I). As pacienteseram provenientes do RecôncavoBaiano e vinham sendo acompa-nhadas por um de nós (A.B.)na Maternidade Tsylla Balbino(Salvador - Bahia). Por ocasiãodo parto, foram estudadas as pla-centas e os recém-nascidos bem[como os nati e os neo-mortos, deacordo com rotina já estabeleci-da (7). Foram os seguintes os gru-pos experimentais estudados:

Grupo I — Camundongos ino-culados com a amostra parasitá-ria isolada da paciente A. P., 23anos, natural de Mata de SãoJoão - Bahia, sem queixas, comreaçao de Machado Guerreiro:Reagente no título de 4, 14. Nãoapresentava sinais clínicos decardiopatia-. Teve - 4 -gestações(das quais 2 foram, abortamentoe um parto prematuro). Na pre-sente gestação, o feto era mace-rado, pesando 750g; foi autopsia-

T A B E L A l

ESTUDOS DE AMOSTRAS DO T. CRUZI ISOLADAS DE GESTANTES CHAGÁSlCAS

JJJPfJI f :| DADOS REFERENTES ÀSD, AC " li GESTANTESKIA3

«rapos • ; IdadeEs»ar. (Ano*)

1 23

II

III

IV

-

33

40

29

30

ReaçõoM. G.

Reag^U

Não Reag.

Não Reag.

Reag. 3,63

Alterações *Cardíacas

N3o

H i pé r fone seDesdobre mento

P2

S S Foco AHiperfooese

A2

Não

Reog. 3,0 ; N5o

1 l 1

GestaçõesAnteriores

2 Abort.1 Premat.1 a Termo

4 a termocom

1 neomor.

1 a termo3 abort.4 premat.

3 abort.2 premat.2 natimor.1 neomorto

DADOS REFERENTES AOS FETOS

Peso(G)

750

1.800

1 350

1.600

i7 a termo ;

ram «W

Condifões

Macurodo

Prematuro

Neomwto

MaceradoHidrópico

Hidrópico

DiagnósticoAuf-ópisd

Sífilis

Congénito

Membrana

Hialina

InfecçãoChaga s iça

InfecçãoChogásica

PLACENTA

Plac-=ntite

Sifilltica

Alterações

SemAlterações

P lacentite

Chaga s iça

P lacentite

Chogásica

Transmissãoda doença de

Chagas

Não

Não

.i

Não

Sim

Sim

há csttvto ekaucMdiDCfAfico deMas pnãrnte».

304 Rev. Pat. Trop. — (2): 3 — Julho/Setembro, 1973

do e o diagnóstico anatomopato-lógico foi de sífilis congénita. Oexame da placenta revelou pla-centite sifilítica. Não houve trans-missão congénita da infecção cha-gásica.

Grupo II — Camundongos ino-culados com amostra parasitáriaisolada da paciente V.M., 33anos, natural de São Félix -Bahia, sem queixas clínicas, comreação de Machado Guerreiro:não reagente. Ao exame clínicodo aparelho circulatório apresen-tava hiperfonese e desdobramen-to de P2. Teve 4 gestações todasa termo, com um neo-morto. Nagestação atual, o parto foi pre-maturo. O recém-nascido pesoul. 800 g e o xenodiagnóstico domesmo foi negativo. A placenta,não mostrou evidências de ínfec-Ção chagásica. Não houve trans-missão da infecção chagásica aofeto.

Grupo in — Camundongosinoculados com amostra parasi-tária proveniente da paciente V.S., 40 anos- natural de Cachoei-ra-Bahia- apresentando edema demembros inferiores. Reação deMachado Guerreiro não reagente.Ao exame do aparelho circulató-rio apresentava sopro sistólicoem ejeção no foco aórtico e hi-perfonese de A2. Teve 8 gesta-ções sendo: l parto a termo, 3abortamentos, 4 prematuros (3neo-mortos). Na presente gesta-ção, recém-nascido de 1350 g,que viveu apenas 5 horas. A au-tópsia revelou como causa demortis, insuficiência respiratóriadevido à membrana hialina nospulmões, não havendo evidênciasde infecção chagásica. O exameda placenta não mostrou altera-ções inflamatórias nem presença

de parasitos. Não houve trans-missão congénita da infecção cha-gásica .

Grupo IV — Camundongosinoculados com amostra parasi-tária isolada da paciente L.S.,29 anos, natural de Nazaré-Bahia, sem queixas clínicas, comreação de Machado Guerreiroreagente, no título de 3,63. Nãoapresentou alterações ao exameclínico do aparelho circulatório.Teve 8 gestações com 3 aborta-mentos, 2 partos prematuros, 2natimortos e um neo-morto. Napresente gestação teve feto ma-cerado, hidrópico, pesando 1.600g. O exame anátomo-patológicomostrou processo inflamatórioem coração, pele e músculo es-quelético, tendo-se identificadoformas amastigotas do T. cruzino interior das fibras musculares.Placenta com lesões de placenti-te chagásica e presença de for-mas amastigotas do parasito. Tra-ta-se de um caso em que houvetransmissão congénita da doençade Chagas.

Grupo V — Camundongosinoculados com amostras parasi-tária isolada da paciente E.F.,30 anos, natural de Maragogipe-Bahia, sem queixas clínicas, comreação de Machado Guerreiroreagente, no título de 3,0. Nãoapresentava alterações ao exameclínico. Teve 7 gestações, todasa termo, com dois natimortos.Presente gestação: feto macera-do, de 5 meses, pesando 500 g,hidrópico. com processo inflama-tório crónico no miocardio. peiee músculo esquelético, não tendosido, entretanto identificados pa-rasitos nos tecidos. Placenta comlesões características da placen-tite chagásica e presença de for-

Sonia G, Andrade & cola. — Estudo Experimental do TrypanuNoma... 305

mas amastigotas do T. cruzi. Es-te é um caso em que houve trans-missão congénita da infecçãochagásica.

RESULTADOS

1 — Estudo histopatológico —As 5 amostras parasitárias deter-minaram no animal experimentalum quadro histopatológico seme-lhante, variando apenas a inten-sidade de parasitismo de um gru-po para outro. Foram observa-dos os seguintes aspectos geraisos quais foram comuns às 5amostras: a) ausência de parasi-tismo de células do Sistema Retí-culo-Endoterial em todo o cursoda infecção; b) parasitismo tissu-lar moderado ou discreto, comaparecimento inicial em coração(14°. dia) e, mais tardiamente, emmúsculo esquelético (2*?. dia); c)processo inflamatório predomi-nante em miocardio que é discre-to até o 14°. dia de infecção e seacentua entre o 25°. e o 30° diasde infecção, presente mesmoquando são escassos os parasitosnos tecidos (Figs. l e 2); lesõesdiscretas, focais, irregulares, emmúsculo esquelético e intestino.

2 — Estudo da parasitemia —Observou-se em todos os gruposum mesmo padrão de parasite-mia, isto é, elevação lenta e pro-gressiva do número de parasitosno sangue periférico, com piquesirregulares entre 12.° e o 20a.dias de inoculação, variando, en-tretanto, os níveis atingidos comas diferentes amostras como mos-tra a Fig. 3. Em 3 amostras(Grupos III, IV, V), os níveis pa-rasitemicos sempre se conserva-ram baixos, nas diversas passa-

gens, enquanto que nas amostrascorrespondentes aos Grupos I eII os piques parasitemicos atingi-ram níveis mais elevados.

3 — Estado morfológico «—Em todos os grupos observou-sepredominância do número de for-mas largas no sangue periféricodurante todo o curso da infecção.

4 — índices de mortalidade —A mortalidade nos diversos gru-pos variou paralelamente com osíndices de parasitemia, sendo de50% até 20 dias de inoculação,nos grupos I e II e nula, no mes-mo período para os grupos III,IV e VI.

CONCLUSÕES

a) as amostras parasitárias,nos 5 grupos estudados, se com-portaram de maneira quanto aotropismo tissular e às lesões his-topatológicas, que determinaramno animal experimental, obser-vando-se, em todos, nítido mio-cardiotropismo e processo demiocardite de intensidade variá-vel; b) do ponto de vista da mor-fologia das formas tripomastigo-tas no sangue periférico, o qua-dro também foi idêntico em to-dos os grupos; c) houve diferen-ças nos índices de mortalidade enas curvas de parasiíemia o quefoi atribuído a uma maior ou me-nor virulência da amostra para-sitária; os grupos com níveis pa-rasitemicos mais elevados corres-pondiam a um parasitismo tissu-lar mais acentuado. Ao que pa-rece, as 5 amostras têm um pa-drão de comportamento seme-lhante, variando apenas na suavirulência.

306 Rev. Pat. Trop. — (2): 3 — Julho/Setembro, 1973

FIO. l — Infiltrarão linfucitári;1 sub-cpicardica e Intersticial da aurícula, n? iiusência deparasites (Grupo í - 30.O dia de infecção) (400X).

FIO. 2 — Foco de destruição de fibra parasitada no ventrículo com infiltração linfo-bistio-citária. (Grupo II - 25o. dia de infecção) (400X).

Soniii (i Aiiili:nlc ,V tuls, r.stmlo HxpcrinientiJ il»> l lypítumoinn. . . 307

l ;.w,\::n t.

70-

66

60-

54

G H U P O .ET

GRUPOJU

Dias

FIG. 3 — Parasitemias obtidas em eamuntlnngos recem-nascidos inoculados com diferentesamostras (grupos II e I I I ) , a primeira cursando com níveis parasitemicos médios u a se-

gunda com níveis baixos, mostrando entretanto padrões semelhantes.

COMENTÁRIOS

No estudo da transmissão con-génita da doença de Chagas, umdos aspectos que chamam a aten-ção é a irregularidade desta trans-missão. Em nosso meio (Salva-dor-Bahla), Bittencourt17' teve aoportunidade de verificar em 95chagásicas que tiveram parto pre-maturo, uma i n c i d ê n c i a de10,5% de transmissão da doen-ça e em 48 chagásicas que tive-ram abortamento(8), a incidênciade transmissão foi de 6.2"% . NoChile, Howard^10 comprovou vá-

rios casos de transmissão cop1!1-nita, numa frequência de um cha-gásico para cada duzentos pre-maturos . Outros autores, estu-dando séries de pacientes gestan-tes chagásicas, não puderam com-provar a transmissão, como Re-zende et ai f17', Oliveira < I 4 >, Pas-sos Í i 5 ) , Rassi et ai (16) e Barcelos(3). Além disto, em uma mesmagestante, a transmissão podeocorrer em uma gestação e nãoocorrer em outra (6). Devem, pois,existir fatores ainda não bem co-nhecidos que condicionam atransmissão do parasito através

308 Rev. Pat. Trop. — (2): 3 — Julho/Setembro, 1973 Sônia O. Andrade A coli. — Eitudo BxperímtnUl do Trypinoioma,.. JOf

da placenta. Naturalmente, inú-meras variáveis devem ser consi-deradas para a discussão desteproblema e um dos pontos que,nos parece, deve ser investigadoé a influência da cepa do Trypa-nosoma cnizi; isolando o parasi-to de 5 gestantes chagásicas, pro-curou-se verificar se as mesmaseram portadoras de diferentescepas do T. cruzi. desde que, emduas delas foi comprovada a pre-sença de placentite chagásica-com transmissão ao feto da in-fecção, enquanto em três não seconstataram alterações placentá-rias ou infecção do recém-nasci-do. A finalidade principal seriaa de, isoladas cepas diferentesdestas pacientes, iniciar um es-tudo experimental em que estascepas fossem inoculadas em ani-mais, a fim de se estudar a trans-missão congénita experimental,por diferentes cepas. Entretanto,as amostras parasitárias tiveramcomportamento idêntico no quediz respeito ao curso da infec-ção, ao parasitismo tissular e àmorfologia, caracteres estes que,estudados em conjunto, nos pa-recem suficientes para a identifi-cação de cepas do T cruzi(2).Apesar de se constituírem apa-rentemente em uma mesma cepa,mostraram diferenças de virulên-cia, o que pode ocorrer comqualquer cepa de acordo com di-versas variáveis, comportando-seem dois grupos com virulênciamuito atenuada, e que correspon-deram justamente aos casos emque houve transmissão congéni-ta. É de se assinalar que as lesõesfetais nestes dois casos foram dis-cretas, localizadas em músculo ecoração, com baixo parasitismotissular, em um deles com rarís-

simas formas amastigotas na pla-centa, lesões estas superponiveisàs observadas no animal experi-mental em que o processo infla-matório crónico do miocardioocorria por vezes mesmo na au-sência de parasites ou com para-sitismo discreto. Isto indica quea transmissão não depende tam-bém de um problema de virulên-cia da amostra parasitária. Em-bora as amostras aqui estudadastenham sido de certa maneira se-lecionadas, desde que foram es-colhidas as pacientes que tinhamxenodiagnóstico positivo, a ob-servação de que, de cinco gestan-tes estudadas, houve transmissãoem duas, nos parece um indíciode alta chance de transmissãocongénita em nosso meio, confir-mando as observações prévias deBittencourt <5>, em contraposiçãoà baixa incidência observada emoutros meios <3' 14' 15). Parece-nos, assim, que a cepa ora em es-tudo presente nas cinco mulheresé facilmente transmissível ao fe-to, embora esta transmissão te-nha sido diferente de um casopara outro, o que não é de se es-tranhar quando se sabe que emuma mesma mulher, a possibili-dade de transmissão da infecçãoao feto varia de uma gestação pa-ra outra <6). No rápido resumoda história obstétrica das pacien-tes, pode-se ver que, em quasetodas, havia alta incidência deabortamentos e de partos prema-turos, podendo-se supor que emgestações anteriores, a doença deChagas de que são portadoras ti-vesse contribuído para esta his-tória obstétrica, desde que atransmissão congénita do T. cruzitem sido considerada como im-portante fator de abortamento e

de prematuridade <7'8>. O fato deas diversas amostras do T. cruziisoladas terem um comportamen-to idêntico em relação às suascaracterísticas morfobiológicas,acrescido ao fato de se tratar deuma amostra muito pequena, nãonos permitiu concluir acerca daimportância de diferentes cepasna transmissãç congénita dadoença de Chagas. Vale, entre-tanto, o registro de que a cepapresente nas mulheres em estudo,é facilmente transmissível e istopoderá servir para estudos com-parativos posteriores com cepasisoladas em áreas em que a inci-dência da transmissão congénitaé baixa, permitindo, assim, umamelhor avaliação do papel da ce-pa do T. cruzi na transmissãocongénita da doença de Chagas.

SUMMARY

EXPERIMENTAL STUDY OF SAM-PLES OF TRYPANOSOMA CRUZI

ISOLATED FROM PREGNANTWOMEN WITH CHAGAS' DISEASE

Samples of Trypanosoma cruziisolated from five pregnant womenliving in the same endemic área werestudied. The behaviour in the expe-rimental animal, morphological as-pects of the blood — forms and his-topathological lesions in mice wereconsidered. Although in two of thewomen, congenital transmission of theinfection to the foetus hás beenobserved, we could not observe dif-ferences between the strains of T.cruzi isolated from those cases andthe strains isolated from the cases inwhich no congenital transmissionocurred. The five samples of T, bru-zi seem to belong to the same strainpattern. The number of cases herestudied was not suffícient for anyconclusions about the ínfluence ofdifferent strains of T. cruzi on con-genital transmission of the infection.However we think that the present

itudy could be uaeful as « comparatl-vê basls for the research on the strainsof T. cnizi isolated ífrcuv differentáreas where congenital tranuntiilonof Chagas discase is Va^ pf evenabsent. ' ' . " .

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