Instrumentos de Percusso na Msica Sacra

Ozeas C. Moura

Como sabemos, a msica , hoje, assunto complexo, e facilmente se cai num ou noutro extremo. Essa

complexidade se deve grandemente ao fato de a msica fazer parte da cultura dos povos, sendo usada tanto em

ocasies festivas seculares quanto no mbito religioso. Mas nos cumpre perguntar: O que vale para um

ambiente secular seria tambm apropriado para uma ocasio de culto? A Bblia tem parmetros que podem

responder a essa pergunta e nortear a escolha da msica a ser usada no momento do culto, quando Deus

adorado.

Devido ao emprego cada vez maior de instrumentos de percusso nos cultos evanglicos e catlicos,

poderamos perguntar: Quo apropriados so esses instrumentos na msica sacra? Seria apenas questo de

gosto ou uma questo bblico-teolgica?

Na msica secular

Analisemos, primeiramente, a msica fora do ambiente do templo, ou seja, msica secular, de entretenimento

ou de celebrao por algum evento. Nesse tipo de msica, praticamente todo tipo de instrumentos era usado,

inclusive a dana. Um exemplo o de Davi, em sua primeira tentativa de trazer a arca para Jerusalm. Em I

Crnicas 13:8, mencionado que esse rei conduziu o cortejo "com todo o seu empenho; em cnticos, com

harpas, com alades, com tamboris, com cmbalos e com trombetas". E II Samuel 6:14 informa que "Davi

danava com todas as suas foras diante do Senhor". Essa dana nada tinha que ver com a dana moderna, nem

era sensual, mas consistia em pulos de alegria (tipo da dana que ocorreu quando o filho prdigo voltou (cf.

Lucas 15:25), e na ocasio em que os guerreiros egpcios se afogaram no mar Vermelho e Miri conduziu um

grupo de mulheres com "danas e tamborins" (ver xodo 15:20).

Na msica secular ou de entretenimento, usavam-se instrumentos de percusso, como o tamborim, s vezes

traduzido por "adufe" (no hebraico, toph - pequeno tambor de mo, ou pandeiro), usado para acompanhar,

ritmadamente, a msica e a dana, nas festividades e cortejos [1] (Gnesis 3:27; xodo 15:20; Juzes 11:34; I

Samuel 10:5; 18:6; II Samuel 6:5; Salmos 149:3; 150:4, etc.).

Na msica sacra

Em se tratando de msica sacra, apresentada no culto em louvor a Deus, v-se que tambores e tamborins (o

mesmo que adufes) ficaram de fora da msica sacra, apresentada no templo, uma vez que estavam associados

ao culto pago e por fazerem parte da msica secular, de comemorao ou entretenimento [2]. Eles foram

proibidos no templo, mas admitidos fora dele em festividades e encontros sociais. Isso indica que no eram

maus em si mesmos, mas no eram tocados no templo justamente por sua associao com o entretenimento

secular.

A ausncia de instrumentos de percusso vista na msica sacra instituda pelo rei Davi, a qual era composta

de msica vocal (cantores) (I Crnicas 15:16, 19-22), instrumentos de cordas, como alades e harpas (15:16,

20, 21) e instrumentos de sopro, como trombetas (15:24). A exceo fica por conta dos "cmbalos"

(metsiltayim) (15:16, 19) - dois pequenos pratos, usados pelo lder da msica para marcar o fim de uma estrofe,

e no para ritmar a msica. O vocbulo Selah (pausa?), que aparece em muitos Salmos, pode indicar o

momento em que eram tocados os cmbalos [3].

A mesma preocupao em se deixar de fora tambores e tamborins pode ser vista no restabelecimento do culto a

Deus, empreendido pelo rei Ezequias: "Tambm estabeleceu os levitas na Casa do Senhor com cmbalos,

alades e harpas, segundo mandado de Davi e de Gade, o vidente do rei, e do profeta Nat; porque este

mandado veio do Senhor, por intermdio de Seus profetas" (II Crnicas 29:25, itlicos acrescentados). Esse texto nos mostra que a proibio de instrumentos de percusso, como tambores e tamborins, na msica sacra,

no surgiu da cabea de nenhum msico humano, mas do prprio Deus. O mesmo procedimento foi adotado no

tempo de Esdras e Neemias (ver Esdras 3:10 e Neemias 12:27,36).

Versos bblicos e uso de tamborins

Os defensores do uso de bateria na igreja geralmente citam a Bblia em apoio as suas idias. Mas ser que tais

versos apiam o emprego de instrumentos de percusso na igreja? Vejamos os principais:

1. Miri e outras mulheres danando com tamborins (xodo 15:20).

Como j foi mencionado, tamborins eram permitidos na msica secular israelita, usados em ocasies de alegria

e entretenimento. Miri e as demais mulheres no estavam fazendo um culto, mas cantando e danando de

alegria pela morte dos guerreiros egpcios, afogados no mar Vermelho.

2. Uso de tamborins por um grupo de profetas em Gibe-Eloim (I Samuel 10:5)

Esse texto indica que tamborins eram usados na msica sacra antes das diretrizes institudas pelo rei Davi (ver

outro exemplo no Salmo 68:24,25). A partir dessas diretrizes, tamborins no so mais permitidos nem

mencionados na msica sacra israelita, por causa de sua associao com ritos pagos.

3. A meno aos tamborins na primeira tentativa de Davi em levar a arca para Jerusalm (I Crnicas 13:8).

Nessa ocasio, no se tratava de um culto a Deus, mas se celebrava o transporte da arca para Jerusalm. Era

uma ocasio de alegria, celebrada com danas (pulos de contentamento) e msicas de uma banda instrumental,

que inclua tamborins.

4. Teria Deus preparado tamborins e pfaros para Lcifer? (Ezequiel 28:13).

"A obra dos teus tambores e dos teus pfaros estava em ti; no dia em que foste criado, foram preparados"

(Ezequiel 28:13, na verso Almeida Revista e Corrigida).

Ezequiel 28:13, na verso bblica Almeida Revista e Atualizada, diz que Deus preparou os "engastes" e

"ornamentos" para Lcifer. A palavra "engaste", no hebraico "toph" e tanto pode se referir a "tambor de mo",

"pandeiro", quanto a "garra ou guarnio de metal que segura uma pedra preciosa". J "ornamentos" traduo

da palavra hebraica "nqeb", que tambm tem dois significados: "pfaro/flauta", mas tambm "cavidade", na

qual se fixa uma pedra preciosa.

Gramaticalmente, as duas palavras acima podem se referir tanto a instrumentos musicais quanto a obra de

joalheria. Com duas possibilidades de traduo, seria melhor traduzi-las luz do contexto, que no o de

instrumentos musicais, mas de enfeites com ouro e pedras preciosas (conforme os versos 13, 14, 16 indicam). A

verso Almeida Revista e Atualizada fez bem em traduzi-las como "engastes" e "ornamentos".

5. Meno a "adufes" (tamborins) nos Salmos 149 (v.3) e 150 (v.4).

verdade que tamborins (ou adufes) so mencionados nesses Salmos. Mas, seria sua meno um indicativo de

que devam ser usados na msica sacra no culto divino? Deve-se notar que esses dois Salmos no constituem um

manual indicador dos tipos de instrumentos que devem ou no fazer parte da msica sacra. A finalidade deles

pode ser sintetizada com o ultimo verso do salmo 150: "Todo ser que respira louve ao Senhor." Ou seja, tudo e

todos devem louvar o Criador. Se os encararmos como um manual, ento a msica sacra deveria ser

apresentada nos "leitos" (149:5), com os msicos portando "espadas de dois gumes" (v. 6) e louvando ao

Senhor "no firmamento" (150:1), lugar ao qual s os anjos tm acesso e de onde podem louvar o Criador.

Concluso

Algumas lies podem ser tiradas do que foi exposto acima:

1. A partir das orientaes divinas, dadas ao rei Davi, instrumentos de percusso (com exceo para os

cmbalos) foram proibidos na msica sacra do templo, devido associao deles com o culto pago.

2. A msica sacra era precipuamente vocal, sendo acompanhada por instrumentos de cordas e de sopro (por

exemplo, trombetas). Os instrumentos deveriam apenas acompanhar a msica cantada e no encobri-la.

3. A ausncia de instrumentos de percusso e danas na msica do templo indica uma distino entre a msica

secular e a empregada no servio da casa de Deus. No havia msica ritmada, pois o templo no era um clube

ou um lugar de entretenimento social, mas um lugar de culto [4].

4. A msica na igreja deve ser diferente da msica secular, porque a igreja, como o antigo templo, a casa de

Deus e no um lugar de entretenimento. Instrumentos de percusso estimulam fisicamente e so inapropriados

para a msica na igreja hoje, como o foram para a msica do templo no antigo Israel [5].

A propsito, a Sra. Ellen White teve uma viso sobre a condio do povo de Deus nos dias finais, e seria

benfico nossa vida espiritual levar em considerao essa advertncia da mensageira do Senhor:

"As coisas que descrevestes como ocorrendo em Indiana, o Senhor revelou-me que haviam de ocorrer

imediatamente antes da terminao da graa. Demonstrar-se- tudo quanto estranho. Haver gritos com

tambores, msica e dana. Os sentidos dos seres racionais ficaro to confundidos que no se pode confiar

neles quanto a decises retas. E isto ser chamado operao do Esprito Santo. O Esprito Santo nunca Se revela

por tais mtodos, em tal confuso e rudo. Isso uma inveno de Satans para encobrir seus engenhosos

mtodos para anular o efeito da pura, sincera, elevadora, enobrecedora e santificadora verdade para este tempo.

Teria sido melhor no misturar a adorao ao Senhor com msica do que usar instrumentos musicais para fazer

a obra que seria introduzida em nossas reunies campais, como me foi apresentada em janeiro ltimo. A

verdade para este tempo no necessita disso para conseguir a converso de pessoas.

Uma balbrdia de barulho fere os sentidos e perverte aquilo que, se devidamente dirigido, seria uma beno.

As foras dos agentes satnicos misturam-se com o alarido e barulho, para provocar um carnaval, e isso

chamado de ao do Esprito Santo. [...]

"Nenhuma animao deve ser dada a tal espcie de culto. A mesma espcie de influncia se introduziu depois

da passagem do tempo em 1844. Fizeram-se as mesmas espcies de representaes. Os homens ficaram

exaltados, e eram movidos por um poder que pensavam ser o poder de Deus. [...]

"No entrarei em toda a triste histria; e demasiado. Mas em janeiro ultimo o Senhor mostrou-me que seriam

introduzidos em nossas reunies campais teorias e mtodos errneos, e que a histria do passado se repetiria.

Senti-me grandemente aflita. Fui instruda a dizer que, nessas demonstraes, acham-se presentes demnios em

forma de homens, trabalhando com todo o engenho que Satans pode empregar para tornar a verdade

desagradvel as pessoas sensatas; que o inimigo estava procurando arranjar as coisas de maneira que as

reunies campais, que tem sido o meio de levar a verdade da terceira mensagem anglica perante as multides,

venham a perder sua fora e influncia.

"A mensagem do terceiro anjo deve ser dada em linhas direitas. Importa que seja conservada isenta de todo

trao das vulgares, infelizes invenes das teorias humanas, preparadas pelo pai da mentira, e disfaradas, como

a serpente brilhante empregada por Satans como meio de enganar a nossos primeiros pais. Assim busca

Satans por seu selo sobre a obra que Deus quer que se destaque em pureza.

"O Esprito Santo nada tem que ver com tal confuso de rudo e multido de sons como me foram apresentadas

em janeiro ltimo. Satans opera entre a algazarra e a confuso de tal msica, a qual, devidamente dirigida,

seria um louvor e glria para Deus. Ele torna seu efeito qual venenoso aguilho da serpente.

"Essas coisas que aconteceram no passado ho de ocorrer no futuro.Satans far da msica um lao pela

maneira por que dirigida. Deus convida Seu povo, que tem a luz diante de si na Palavra e nos Testemunhos, a

ler e considerar, e dar ouvidos. Instrues claras e definidas tm sido dadas a fim de todos entenderem. Mas a

comicho do desejo de dar origem a algo de novo d em resultado doutrinas estranhas, e destri largamente a influncia dos que seriam uma fora para o bem, caso mantivessem firme o princpio de sua confiana na

verdade que o Senhor lhes dera." (Mensagens Escolhidas, v.2, p. 36-38, itlicos acrescentados).

Referncias

1. Champlin, R. N.O Novo Testamento Interpretado, v. 7. So Paulo: Candeia, 2000, p. 4835. (voltar)

2. Bacchiocchi, Samuele, ed.The Christian & Rock Music, Berrien Springs: Biblical Perspectives, 2000, p. 207.

(Nota dos editores do Msica Sacra e Adorao: Este livro foi traduzido com a autorizao expressa do autor

pode ser encontrado em portugus clicando no nome acima.) (voltar)

3. lbid. (voltar)

4. Idem, p. 208. (voltar)

5. Idem, p.208, 2009. (voltar)

Ozeas C. Moura doutor em Teologia Bblica. Trabalha como editor na Casa Publicadora Brasileira, em

Tatu, SP.

Fonte: Revista Adventista, Dezembro de 2009, pp. 14-16