instituto millenium brasil econômico 6_2_2012

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As diferenças entre brasileiros e paraguaios na região fronteiri- ça do Alto Paraná não se limi- tam apenas à disputa por posse de terras pelos agricultores lo- cais — os chamados brasiguaios e carperos. Os interesses e re- cursos financeiros originados com o uso da água nas proximi- dades do lago da usina hidrelé- trica de Itaipu também podem servir de retrato da disparidade social e econômica existente en- tre os dois países. O motivo pa- ra isso é o pagamento de royal- ties aos municípios da região devido à inundação de suas ter- ras com a construção de Itaipu. Um exemplo é a pequena ci- dade de Entre Rios do Oeste, no Paraná. Localizada às margens do lago formado pela hidrelétri- ca, ela recebe em royalties atual- mente US$ 200 mil, em média, por mës. Esses recursos repre- sentam 30% do orçamento anual do município, segundo o prefeito da cidade, Elcio Zim- mermann. Em janeiro, as com- pensações ao município de pou- co mais de 3 mil habitantes fo- ram de R$ 404 mil, segundo da- dos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). No ano passado, o valor total che- gou a R$ 4,4 milhões. Ultrapas- sando as margens paraguaias, porém, a situação é outra. Segundo o prefeito, uma cida- de no país vizinho também afeta- da pela inundação binacional re- ceberia em royalties, por mês, um valor bem inferior: cerca de US$ 33 mil. A proximidade geo- gráfica, contudo, não significa conhecimento do modo como o dinheiro é recebido e aproveita- do por paraguaios, ou de even- tuais problemas de divisão na lei. No Brasil, todos os municí- pios com direito a receber os “royalties da água” devem sepa- rar estes recursos apenas para in- vestimentos em obras de infraes- trutura e serviços públicos. Fun- dada em 1993, Entre Rios já per- deu 40% de sua área por causa das margens de Itaipu. Quem disse que Minas não tem Mar? O Lago de Furnas — o “Mar de Minas” — , que abran- ge 34 municípios, tem volume de água sete vezes maior do que o da Baía de Guanabara, no Rio. E, além dos atrativos natu- rais, um grande potencial de ge- ração de riquezas a partir da ex- ploração desses recursos hídri- cos. Em 2011, os repasses feitos por Furnas apresentaram alta de 2,65%, somando R$ 183,01 milhões, contra R$ 178,2 mi- lhões de 2010. Segundo o dire- tor financeiro de Furnas Cen- trais Elétricas, Victor Albano, essa alta se deve ao aumento na Tarifa Atualizada de Referên- cia (TAR), que é regulamentada pela Agência Nacional de Ener- gia Elétrica (Aneel) e não pelo volume de energia produzido, controlado pelo Operador Na- cional do Sistema (ONS). “Em 2010, a TAR estava em R$ 64,69 por megawatt hora ge- rada. Já em 2011, esse valor pas- sou para R$ 68,34, o que explica o resultado”, diz. Aproximadamente 139 mu- nicípios são atendidos por Furnas, que não fiscaliza co- mo as cidades utilizam esses recursos. O desempenho de Rosa Weber, em sua estreia como ministra do Supremo Tribunal Federal (STF), lança expectativas sobre o papel de decisão que a novata possa carregar sob os ombros nos próximos julgamentos. Rosa consagrou-se, na sema- na passada, como a fiel da balan- ça do Supremo ao dar o voto que manteve a independência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) para investigar magistra- dos. A posição da estreante ga- nhou peso maior por ser pratica- mente desconhecida da maioria dos demais ministros. A timidez, a cautela e a inex- periência, características co- muns a qualquer novato, deram o tom do desempenho de Rosa. A juíza gaúcha acompanhou atentamente todos os argumen- tos lançados por cada um dos co- legas e evitou intervir nos mo- mentos mais acalorados do de- bate. A reserva da magistrada acabou por deixá-la com a res- ponsabilidade de proferir o vo- to de Minerva. A avaliação de colegas da Corte é de que a inex- periência da ministra deva alte- rar bastante a estratégia de defe- sas de teses e da própria dinâmi- ca dos debates do Supremo. Rosa Weber chegou a ser al- vo de uma certa “catimba” do Ministro Marco Aurélio Mello, relator da liminar que limitou o poder do CNJ. Ele questionou com mais clareza se a nova mi- nistra concordava com a forma- lização de um motivo para que o CNJ requeresse a investigação de um magistrado suspeito por negligência de um Tribunal Re- gional — ponto que dividiu os votos da Corte. Rosa chegou a ti- tubear. Só mostrou objetivida- de após a intervenção de Gil- mar Mendes, um dos mais expe- rientes magistrados da casa. Para um dos ministros da Corte, a pouca experiência de Rosa Weber, ainda que ela te- nha 35 anos de magistratura, faz com que precise de tempo para se adaptar ao funciona- mento do Supremo. Rosa é egressa da Justiça do trabalho. “Trata-se de uma área específica do direito e que não abraça todas as demandas que o cargo de ministro do Supremo requer. Para se consolidar na Corte, é preciso tempo”, acredi- ta o colega de Supremo. Especialistas, porém, elo- giam a conduta da ministra em seu voto. “Ela mostrou firmeza, traz sangue novo e alento para outras questões polêmicas que o Supremo votará”, diz Ivette Se- nise, presidente do Instituto dos Advogados de São Paulo. Para Alexandre Coutinho Pa- gliarini, especialista em direito constitucional do Instituto Mil- lenium, embora Rosa não fosse a mais indicada para manter a cota feminina na Corte, após a aposentadoria de Ellen Gracie, sua primeira participação foi po- sitiva. “Todos os Ministros esta- vam nervosos. A diferença é que, por ser estreante, ela não conseguiu disfarçar.” Nas margens de Itaipu, duas realidades Investimentos têm de ser feitos em desenvolvimento “Mar de Minas”gera R$ 183 milhões em compensações Dorivan Marinho/Folhapress Novata, Rosa Weber vira elemento surpresa do STF Aeroportos terão leilão simultâneo hoje Os recursos financeiros pelas atividades de Furnas chegam a 139 municípios De acordo com a Lei dos Royal- ties brasileira, a distribuição da compensação financeira é feita da seguinte forma: 45% aos Es- tados, 45% aos municípios e 10% para órgãos federais (Agên- cia Nacional da Água, Ministé- rio do Meio Ambiente, Ministé- rio de Minas e Energia, e Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Do percentual de 45%, desti- nados a atender aos municí- pios, 85% do valor repassado é distribuído proporcionalmente aos municípios lindeiros, ou se- ja, os diretamente atingidos pe- lo reservatório da usina. Os 15% restantes são distribuídos entre municípios indiretamente atin- gidos por reservatórios a mon- tante da usina. Os recursos têm de ser obrigatoriamente investi- dos no desenvolvimento social — é proibida sua utilização para pagamento de folha ou custeio administrativo. No entanto, a le- gislação não deixa claro quais áreas devem receber prioritaria- mente estes recursos. R.O. Dado Galdieri/Bloomberg A cidade de Entre Rios do Oeste, no Paraná, tem 30% de seu orçamento anual baseado em receitas dos royalties Egressa da Justiça trabalhista, magistrada precisará de tempo para se adaptar ao ritmo e às discussões polêmicas do Supremo Apesar de receberem a mesma compensação pelas atividades de Itaipu, Brasil e Paraguai diferenciam-se na hora de utilizar o dinheiro Inexperiência da ministra, voto de Minerva em favor do CNJ, altera dinâmica da Corte O leilão acontece na sede da BM&FBovespa. A operação vai definir as empresas responsáveis pela exploração dos aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília. Os vencedores serão os grupos que apresentarem as maiores propostas de preço para a concessão. Os valores mínimos foram fixados em R$ 3,4 bilhões para Guarulhos; R$ 1,5 bilhão para Viracopos; e R$ 582 milhões para Brasília. O leilão será simultâneo e cada consórcio só poderá ser vencedor em um aeroporto. ABr Rafael Abrantes [email protected] Cristina Ribeiro de Carvalho [email protected] Ruy Barata Neto, de Brasília, e Luciano Feltrin [email protected] DESTINO DOS RECURSOS Colegas de Corte ainda não tiveram tempo para conhecer opiniões de Rosa Weber Segunda-feira, 6 de fevereiro, 2012 Brasil Econômico 9

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As diferenças entre brasileirose paraguaios na região fronteiri-ça do Alto Paraná não se limi-tam apenas à disputa por possede terras pelos agricultores lo-cais — os chamados brasiguaiose carperos. Os interesses e re-cursos financeiros originadoscom o uso da água nas proximi-dades do lago da usina hidrelé-trica de Itaipu também podemservir de retrato da disparidadesocial e econômica existente en-tre os dois países. O motivo pa-ra isso é o pagamento de royal-ties aos municípios da regiãodevido à inundação de suas ter-ras com a construção de Itaipu.

Um exemplo é a pequena ci-dade de Entre Rios do Oeste, noParaná. Localizada às margensdo lago formado pela hidrelétri-ca, ela recebe em royalties atual-mente US$ 200 mil, em média,por mës. Esses recursos repre-sentam 30% do orçamentoanual do município, segundo oprefeito da cidade, Elcio Zim-mermann. Em janeiro, as com-pensações ao município de pou-co mais de 3 mil habitantes fo-ram de R$ 404 mil, segundo da-dos da Agência Nacional deEnergia Elétrica (Aneel). Noano passado, o valor total che-gou a R$ 4,4 milhões. Ultrapas-sando as margens paraguaias,porém, a situação é outra.

Segundo o prefeito, uma cida-de no país vizinho também afeta-

da pela inundação binacional re-ceberia em royalties, por mês,um valor bem inferior: cerca deUS$ 33 mil. A proximidade geo-gráfica, contudo, não significaconhecimento do modo como odinheiro é recebido e aproveita-do por paraguaios, ou de even-tuais problemas de divisão nalei. No Brasil, todos os municí-pios com direito a receber os“royalties da água” devem sepa-rar estes recursos apenas para in-vestimentos em obras de infraes-trutura e serviços públicos. Fun-dada em 1993, Entre Rios já per-deu 40% de sua área por causadas margens de Itaipu. ■

Quem disse que Minas não temMar? O Lago de Furnas — o“Mar de Minas” — , que abran-ge 34 municípios, tem volumede água sete vezes maior doque o da Baía de Guanabara, noRio. E, além dos atrativos natu-

rais, um grande potencial de ge-ração de riquezas a partir da ex-ploração desses recursos hídri-cos. Em 2011, os repasses feitospor Furnas apresentaram altade 2,65%, somando R$ 183,01milhões, contra R$ 178,2 mi-lhões de 2010. Segundo o dire-tor financeiro de Furnas Cen-trais Elétricas, Victor Albano,essa alta se deve ao aumento naTarifa Atualizada de Referên-cia (TAR), que é regulamentadapela Agência Nacional de Ener-

gia Elétrica (Aneel) e não pelovolume de energia produzido,controlado pelo Operador Na-cional do Sistema (ONS).

“Em 2010, a TAR estava emR$ 64,69 por megawatt hora ge-rada. Já em 2011, esse valor pas-sou para R$ 68,34, o que explicao resultado”, diz.

Aproximadamente 139 mu-nicípios são atendidos porFurnas, que não fiscaliza co-mo as cidades utilizam essesrecursos. ■

O desempenho de Rosa Weber,em sua estreia como ministrado Supremo Tribunal Federal(STF), lança expectativas sobreo papel de decisão que a novatapossa carregar sob os ombrosnos próximos julgamentos.

Rosa consagrou-se, na sema-na passada, como a fiel da balan-ça do Supremo ao dar o votoque manteve a independênciado Conselho Nacional de Justiça(CNJ) para investigar magistra-dos. A posição da estreante ga-nhou peso maior por ser pratica-mente desconhecida da maioriados demais ministros.

A timidez, a cautela e a inex-periência, características co-muns a qualquer novato, deramo tom do desempenho de Rosa.A juíza gaúcha acompanhouatentamente todos os argumen-tos lançados por cada um dos co-legas e evitou intervir nos mo-mentos mais acalorados do de-bate. A reserva da magistradaacabou por deixá-la com a res-ponsabilidade de proferir o vo-to de Minerva. A avaliação decolegas da Corte é de que a inex-periência da ministra deva alte-rar bastante a estratégia de defe-sas de teses e da própria dinâmi-ca dos debates do Supremo.

Rosa Weber chegou a ser al-vo de uma certa “catimba” doMinistro Marco Aurélio Mello,relator da liminar que limitou opoder do CNJ. Ele questionoucom mais clareza se a nova mi-nistra concordava com a forma-lização de um motivo para queo CNJ requeresse a investigaçãode um magistrado suspeito pornegligência de um Tribunal Re-gional — ponto que dividiu osvotos da Corte. Rosa chegou a ti-

tubear. Só mostrou objetivida-de após a intervenção de Gil-mar Mendes, um dos mais expe-rientes magistrados da casa.

Para um dos ministros daCorte, a pouca experiência deRosa Weber, ainda que ela te-nha 35 anos de magistratura,faz com que precise de tempopara se adaptar ao funciona-mento do Supremo.

Rosa é egressa da Justiça dotrabalho. “Trata-se de uma áreaespecífica do direito e que nãoabraça todas as demandas que ocargo de ministro do Supremorequer. Para se consolidar naCorte, é preciso tempo”, acredi-ta o colega de Supremo.

Especialistas, porém, elo-giam a conduta da ministra emseu voto. “Ela mostrou firmeza,traz sangue novo e alento paraoutras questões polêmicas que oSupremo votará”, diz Ivette Se-nise, presidente do Institutodos Advogados de São Paulo.

Para Alexandre Coutinho Pa-gliarini, especialista em direitoconstitucional do Instituto Mil-lenium, embora Rosa não fossea mais indicada para manter acota feminina na Corte, após aaposentadoria de Ellen Gracie,sua primeira participação foi po-sitiva. “Todos os Ministros esta-vam nervosos. A diferença éque, por ser estreante, ela nãoconseguiu disfarçar.” ■

Nas margens deItaipu, duas realidades

Investimentos têm de serfeitos em desenvolvimento

“Mar de Minas”gera R$ 183milhões em compensações

Dorivan Marinho/Folhapress

Novata, Rosa Weber viraelemento surpresa do STF

Aeroportos terão leilão simultâneo hoje

Os recursos financeiros

pelas atividades de Furnas

chegam a 139 municípios

De acordo com a Lei dos Royal-ties brasileira, a distribuição dacompensação financeira é feitada seguinte forma: 45% aos Es-tados, 45% aos municípios e10% para órgãos federais (Agên-cia Nacional da Água, Ministé-rio do Meio Ambiente, Ministé-rio de Minas e Energia, e FundoNacional de DesenvolvimentoCientífico e Tecnológico).

Do percentual de 45%, desti-nados a atender aos municí-pios, 85% do valor repassado édistribuído proporcionalmente

aos municípios lindeiros, ou se-ja, os diretamente atingidos pe-lo reservatório da usina. Os 15%restantes são distribuídos entremunicípios indiretamente atin-gidos por reservatórios a mon-tante da usina. Os recursos têmde ser obrigatoriamente investi-dos no desenvolvimento social— é proibida sua utilização parapagamento de folha ou custeioadministrativo. No entanto, a le-gislação não deixa claro quaisáreas devem receber prioritaria-mente estes recursos. ■ R.O.

Dado Galdieri/Bloomberg

A cidade de EntreRios do Oeste,no Paraná, tem 30%de seu orçamentoanual baseado emreceitas dos royalties

Egressa daJustiça trabalhista,magistrada precisaráde tempo para seadaptar ao ritmo e àsdiscussões polêmicasdo Supremo

Apesar de receberemamesma compensação pelas atividadesde Itaipu, Brasil e Paraguai diferenciam-se na hora de utilizar o dinheiro

Inexperiência daministra, voto deMinervaem favor do CNJ, altera dinâmica da Corte

O leilão acontece na sede da BM&FBovespa. A operação vai definir asempresas responsáveis pela exploração dos aeroportos de Guarulhos,Viracopos e Brasília. Os vencedores serão os grupos que apresentaremas maiores propostas de preço para a concessão. Os valores mínimosforam fixados em R$ 3,4 bilhões para Guarulhos; R$ 1,5 bilhão paraViracopos; e R$ 582 milhões para Brasília. O leilão será simultâneoe cada consórcio só poderá ser vencedor em um aeroporto. ABr

Rafael Abrantes

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Ruy Barata Neto, de Brasília,

e Luciano Feltrin

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Segunda-feira, 6 de fevereiro, 2012 Brasil Econômico 9