inscrições rúnicas (sm 50) em uma burseryd, século xii ... · revista heathen brasil • • 53...
TRANSCRIPT
Na edição anterior da revista Heathen
Brasil foi-me sugerido fazer algo como que
uma sessão exclusiva para falar sobre uma
runa a cada número. Apesar de agradecer
a sugestão, sou obrigado a declinar, mas
não por desconsideração, e sim pelo papel
que as runas têm na minha prática.
No lugar disso, vamos bem brevemente
analisar uma forma reconstruída de usar
as runas, baseadas no uso que os antigos
pagãos davam para elas. Mas, por que
isso?
O uso atual das runas
A maioria das pessoas que entra no
paganismo associa runas com leitura de
futuro, com previsões, e veja, lá pelos
meados de 2011 quando eu estava no
começo do meu contato e não conhecia
muitas coisas em muitos detalhes, eu
escrevi um poema épico chamado Nauta
Umbrarum, onde um mago tirava runas e
dizia o futuro. Eu mesmo tirei runas para
mim várias vezes, e eu posso dizer que isso
funciona, mas, para mim, funcionar não é
medida de satisfação.
Então, se você tira runas para ler o futuro,
tudo bem. Este texto não é uma apologia
contra o seu uso das runas, ele apenas
mostra que existem outras formas de uso
delas.
A atual forma que a maioria dos pagãos
no Brasil (e possivelmente no mundo) usa
runas é baseada em última instância na
forma que Johannes Bureus, um sueco do
século XVII propôs em seu livro Adalruna
rediviva, de 1605. Bureus foi um típico
expoente do sincretismo platônico da
renascença: ele combinou o estudo de
esoterismo prático (mágica, amuletos,
astrologia e alquimia) com um interesse
em teosofia, Kabbalah, hermetismo e
chilaísmo. Sua contribuição mais original
foi tentar encontrar e descrever uma
Kabbalah nórdica baseada em runas, a
qual incluía tópicos alquímicos.
Isso inspirou o arianista Guido von List na
criação de suas “runas armanen”, às quais
ele alega terem sido reveladas a ele através
de divinações. Segundo von List elas
seriam baseadas nos 18 encantamentos
de Óðinn descritos no Hávamál.
As runas armanen influenciaram várias
esotéricos até que nos anos 80 Ralph Blum,
baseado no sistema de divinação “I Ching”
chinês, criou o sistema de leitura de runas
baseada em pecinhas individuais, no que
foi logo recebido calorosamente por Diana
Paxson e Edred Thorsson (conhecidão
como Estevão Flores, no Brasil), que foram
mais adiante associando métodos do
Tarô com a leitura de runas. Desde então
dezenas de livros sobre leituras de runas
foram publicados, e o assunto se tornou
praticamente um dogma, com as runas
sendo vistas como uma forma de oráculo,
e essa sendo sua função primária entre os
nórdicos e germânicos em geral.
O que a história diz
Do alfabeto fenício (usado entre cerca de
1500 e 150 anos antes da Era Comum),
surge o alfabeto grego, e deste suas
variantes como os alfabetos latino, copta,
gótico cirílico e rúnico. Todos esses
alfabetos, graças à cadeia de relações
comerciais e culturais, se influenciaram
mutuamente e carregam várias
semelhanças. Compare-se por exemplo as
letras usadas para representar o som /a/,
/b/ e /k/ entre todos eles e se verá pouca
As runas são antigas ferramentas criadas originalmente para a escrita cotidiana, embora poucas pessoas fossem capaz de lê-las em tribos não-letradas como as germânicas. Com o crescimento do Heathenry, é útil voltar a se perguntar: e como as runas eram utilizadas?
Inscrições Rúnicas (Sm 50) em uma
fonte batismal sueca da igreja de
Burseryd, século XII. Historiska
Museet, Estocolmo. Fonte: Wikimedia
Commons.
50 • Revista Heathen Brasil • www.asatrueliberdade.com
RUNAS: UMA ABORDAGEMRECONSTRUCIONISTA
ou quase nenhuma variação em sua
forma. O primeiro alfabeto rúnico, mesmo
que tenha sido ensinado aos germânicos
por *Wōdanaz (nome proto-germânico de
Óðinn) teve a forma de suas letras feitas
dentro de um paradigma cultural indo-
europeu (confira a tabela).
A raiz “run-” nos idiomas germânico está
bastante associado ao sentido “sussurro,
mistério, segredo, conselho”, mas não é
o único sentido. A palavra para runas
também estaria associada a “sulco”, ligado
ao ato de como elas eram gravadas:
entalhadas, principalmente em madeira
ou pedra. A palavra para “letra” em
alemão até hoje é Buchstabe, fazendo
alusão literal à escrita entalhada em
gravetos.
Tácito, na Germania (século I) diz que
Auspicia sortesque ut qui maxime
observant: sortium consuetudo
simplex. Virgam frugiferae arbori
decisam in surculos amputant eosque
notis quibusdam discretos super
candidam vestem temere ac fortuito
spargunt.
“São os que mais observam tiragem
de sorte e oráculos. O modo de tirar
a sorte é simples. Cortam uma vara de
árvore frutífera e dividem-na em partes,
marcando-as com símbolos, e as jogam
de maneira completamente aleatória por
sobre uma alva toalha”.
Todavia, associar as notæ à runas é um
exercício de fé bem grande. A obra
Germania de Tácito é datada de cerca do
ano 98 da Era Comum (EC); mas a inscrição
rúnica mais antiga que se tem registros é
o Pente de Vimose, na Dinamarca, datado
de cerca de 160 EC, o qual carrega a
inscrição harja (harja, “pente”). O próprio
surgimento das runas na verdade também
é datado entre o século I e II da Era
Comum, e isso faz todo sentido se formos
considerar que os primeiros contatos entre
germânicos e latinos que temos registro
se dar na metade final do primeiro século
antes da Era Comum, como retratado por
César em sua obra De Bello Gallico.
Nesse período inicial, as runas
estavam geograficamente confinadas
principalmente na região próxima do Mar
Báltico, e existem, daí em diante registros
arqueológicos o suficiente para provar
que as runas possuíam um uso profano
ou cotidiano tão comum quanto um com
propósitos religiosos. Com o passar do
tempo, os registros que chegaram até
nós provam que elas eram usadas para
muitas funções não diferente das letras do
nosso alfabeto hoje em dia. Muitas pedras
com runas gravadas são uma espécie de
“placas informativas” primitivas, embora o
tipo de informação que fornecessem não
fosse a velocidade máxima permitida, mas
talvez, resumidamente, a história de um
morto honrado, uma placa funerária, ou
coisas similares.
Antigo Fuþark
Essa é a forma mais antiga de escrita
desenvolvida e usada pelos povos
germânicos. É teorizado que tenha
sido a forma de escrita da maioria das
tribos germânicas, entre os séculos II e
VIII, tendo sido substituído no final do
século VIII na Escandinávia pelos Novos
Fuþark, e pelos anglos, saxões e frísios
continentais pelo Fuþorc, o qual foi
levado também para a Inglaterra.
Nos alfabetos mais novos, o nome
dos caracteres também equivale ao
primeiro fonema da palavra, à primeira
letra, se assim preferirem. Esse processo
é chamado de acrofonia, e não é um
fenômeno exclusivo dos germânicos.
Grego, alfabeto glagolítico, círilico
Pente de Vimose Fonte: Wikimedia Commons.
Revista Heathen Brasil • www.asatrueliberdade.com • 51
52 • Revista Heathen Brasil • www.asatrueliberdade.com
antigo, copta, Ogham, antiga escrita irlandesa entre outros todos
utilizavam esse mesmo sistema de nomear as letras a partir de
seus sons.
O alfabeto latino parece ter sido uma das poucas exceções a essa
regra, adotando os próprios fonemas como forma de designar as
letras; embora comumente ainda hoje nós falemos “A de amor”, “B
de baixinho”, “C de chocolate”, ou o alfabeto internacional NATO,
que em vez de falar “A, B, C, D, etc” usa “Alfa, Bravo, Charlie, Delta,
Echo, Foxtrot, Golf, Hotel, India, Juliett, Kilo, Lima, Mike, November,
Oscar, Papa, Quebec, Romeo, Sierra, Tango, Uniform, Victor,
Whiskey, X-ray, Yankee, Zulu” quando quer se referir às letras, para
agilizar a comunicação, e é muito utilizada por policiais, militares,
e guardas de trânsito, para
evitar confusão, quando, por
exemplo, soletram placas de
veículos.
Entretanto, o Antigo Fuþark
não foi usado pelos víkingr,
os piratas do norte europeu
que fascinam tantas pessoas.
Alguns praticantes modernos
ainda assim enfatizam que
magicamente o Antigo
Fuþark teria algo como
que propriedades mágicas
superiores, e que o alfabeto
da Era Viking, o Novo Fuþark
não possuiria as mesmas
capacidade. Mas, tudo o que
se sabe sobre os nomes do
Antigo Fuþark é reconstruído
através de técnicas linguísticas.
Não existem poemas rúnicos
sobre o Antigo Fuþark, e seus
nomes são inferidos através
de comparação dos alfabetos
rúnicos posteriores, como
os Novos Fuþark e o Fuþorc
anglo-saxão.
Por exemplo: a runa f no
Antigo Fuþark tem seu nome
inferido a partir das que lhe
correspondem nas variantes mais novas, retratadas nos poemas
rúnicos:
f no Novo Fuþark: “Fé” (gado)
f no Fuþorc: “Feoh” (gado)
A partir dessas duas então é possível inferir que
→ f Antigo Fuþark: “*Fehu” (gado)
(O asterisco indica que a palavra não foi atestada, mas reconstruída).
Isso funciona até bem com outros exemplos:
r: Novo Fuþark “reið” (“montaria”), Fuþorc “rād” (“montaria”) →
Antigo Fuþark “*raiđō” (“vagão, carroça, transporte, montaria”).
g: Novo Fuþark “gjǫf” (“presente”), Fuþorc “ġyfu” (“presente”) →
Antigo Fuþark “*ǥeƀō” (“presente”).
h: Novo Fuþark “hagall” (“granizo”), Fuþorc “hæġl” (“granizo”) →
Antigo Fuþark “*hagalaz” (“granizo”).
A mesma regra vale para i (“*īsaz”, “gelo”), t (“*tīwaz”, “deus Týr”), b
(“ƀerkaną”, “bétula”, “árvores da família Betulaceae”), m (“*mann-?”,
“homem”), l (“*laǥuz”, “água, lago”).
Só que nem todas as runas
caem fácil nessa maneira de
reconstruir seus nomes. Muitas
delas não fazem parte do Novo
Fuþark, como w, q, o, d, já
que este só tem 16 runas.
Isso atrapalha o trabalho de
reconstrução, uma vez que
o nome das runas no Fuþorc
pode simplesmente não ser
o que foi usado no Antigo
Fuþark. Se os significados de
todos os nomes das runas do
Novo Fuþark fossem iguais
ao do Fuþorc anglo-saxão,
isso não seria um problema,
todavia...
Outras runas não possuem
o mesmo significado para
seus nomes nos alfabetos
posteriores, que é o caso
de u, que no Novo Fuþark é
chamada de “úr”, “ferro” ou
“chuva, mas no Fuþorc seu
nome “ūr” significa “auroque”. x
(Novo Fuþark “þurs”, “gigante”,
Fuþorc “þorn”, espinho), a
(Novo Fuþark “Ass, Oss”, “deus”,
Fuþorc “ōs”, “deus”, “boca”), c
(Novo Fuþark “kaunan”, “úlcera”,
Fuþorc “cēn”, “tocha”), entre
várias outras que se encaixam nessa mesma regra. O problema
é que como os significados dos nomes derivam basicamente de
duas fontes, a probabilidade de cada uma delas estar errada é
de pelo menos 50%, se houvessem mais alfabetos rúnicos para
reconstruir os nomes, poderíamos inferir com mais certeza, uma
vez que o nome que apareça de maneira mais recorrente indica
que provavelmente é o nome mais arcaico, e seria o equivalente
no Antigo Fuþark. Ou seja, muitas das runas, graças a isso
possuem mais de uma forma reconstruída, sem se saber qual
Poema Rúnico em Inglês Antigo. Fonte: Wikimedia Commons.
Revista Heathen Brasil • www.asatrueliberdade.com • 53
delas é mais correta, como é o caso de
x e s entre outras.
Além disso runas como z e p têm
seus nomes inferidos apenas por
conjectura, o que torna ainda mais
difícil qualquer certeza as utilizando. A
lição que temos aqui é: o que sabemos
atualmente das runas não seria
possível sem um esforço conjunto
de arqueologia, história e linguística.
Embora as funções das runas do
Antigo Fuþark sejam comumente
associadas a algo similar ao Tarô, esse
uso seria impossível sem incontáveis
horas de trabalho acadêmico. E esse
trabalho, como tudo que é acadêmico,
tem seus limites. Em alguns pontos
as conjecturas estão provavelmente corretas, em outras muito
possivelmente, em outras não há segurança e em outros casos é
simples tiro no escuro, a partir de pouquíssimos dados disponíveis.
Particularmente, eu creio que isso não seja uma grande dificuldade
para aqueles que usam as runas como oráculos. Basta-se apenas
convencionar os significados dos objetos que estão sendo usados.
Essa convenção pode ser feita de maneira bastante intuitiva e
subjetiva (que é o caso da leitura
com ossos, canto de pássaros,
geomancia, etc.). Em outros casos,
existe uma parte subjetiva, mas
outra marcada previamente pelos
usuários, o que é o caso do Tarô
e das runas, no uso moderno que
lhes é dado. Nesse caso, o oráculo
pode funcionar sem maiores
problemas, apesar da completa
falta de evidências de uso de runas para tais propósitos entre os
antigos heathens germânicos.
Todavia, para aqueles que desenvolvem atividades utilizando os
significados individuais das runas com outros propósitos, para
algumas pessoas, essa margem de erro é simplesmente absurda.
Enquanto alguns podem a aceitar sob o argumento da fé, para
outros as coisas são um tanto mais complicadas. Principalmente
porque: se você tem fé que a runa p chamava-se *perþō, a partir
de um palpite acadêmico sobre isso, porque muitas pessoas
têm dificuldade de aceitar que as runas não são mágicas em si
mesmas, como sugere a academia, e que dependem do poder
(mæġen) que seu utilizador aplica nelas? Por que têm tanta
dificuldade de aceitar outras evidências acadêmicas?
Magia com runas
Dizer que as runas não possuem magia em si mesmas não
quer dizer que elas não possam ser utilizadas magicamente.
Como disse anteriormente, esse post não visa criticar a prática
de nenhum pagão nórdico, ásatrúar ou heathen na atualidade.
Apenas oferecer mais informações.
O heathen Xander Folmer, baseado na obra de Mindy MacLeod
e Bernard Mees Runic Amulets and Magic Objects, agrupa as
inscrições em runas sobre artefatos em cinco principais categorias.
Elas serviram de base para o agrupamento posterior que fizemos:
Sequência de runas: runas
repetidas, com propósitos muitas
vezes não claros;
Nomeação: Por exemplo: “Eu sou
chamado [nome], e fiz [objeto]”;
Encantamentos: palavras mágicas
como *alu, *laukaR, *lina, *auja,
ou *laþu;
Símbolos como triskelia, suásticas
e símbolos associados ao divino;
Descrição de itens: “Esse é o chifre [nome]”, “Este [objeto] pertence
à [nome do dono]”.
O que é importante destacar no começo:
As runas não são ideogramas. As runas não são como caracteres
chineses e ideogramas, e é impossível se comunicar usando
as runas como ideogramas. Aparecem pouquíssimas exceções
a isso, como a inscrição “ek uilta kusa may þ(a) er fahst er i=
=þ=haiminum”, em Storhedder III (192), na Noruega, que significa
“Eu gostaria de escolher a garota que é mais bonita no mundo
(haiminum)”, mas com a adição da runa “þ” no que parece ter
sido um ato de vandalismo, ou brincadeira, passa a significar
“Eu gostaria de escolher a garota que é mais bonita no reino dos
gigantes (thurs + haiminum)”. Todavia, isso é exceção, um idioma
que se use de escrita ideográfica precisa de centenas ou milhares
de símbolos para conseguir transmitir ideias, enquanto o maior
Elmo dourado de Gallehus, Nele lê-se “Eu, Hlewagastiz (de) Holtijaz fiz o chifre”. Fonte: Wikimedia Commons.
Inscrição na fivela do cinto de Pforzen. Nela lê-se o seguinte encantamento: “Aigil e Ailrun procuram por um alce”. Fonte:
Wikimedia Commons.
54 • Revista Heathen Brasil • www.asatrueliberdade.com
Fuþark que temos não chega a 3 dezenas.
Logo, seu uso principal é a partir do seu valor fonético, o que em
vez de nos dar algumas (poucas) combinações seguras, sendo a
maior parte delas intuitiva, nos fornece uma gama quase infinita
de significados. O idioma usado para se escrever com o Antigo
Fuþark é uma gama de dialetos que hoje chamam-se de proto-
germânico, ou germânico-comum (Proto-Germanic, Common
Germanic). É um idioma
bem complicado de
se encontrar materiais,
e, principalmente,
é reconstruído e
altamente hipotético,
para fins de fala. Ele é
útil para pesquisas
etimológicas, mas não
estou tão confiante para
o uso mágico. Por isso,
pessoalmente, prefiro:
ou usar o Novo Fuþark
e escrever em nórdico
antigo, ou usar o Fuþorc e
escrever em inglês antigo,
idioma dos anglo-saxões.
Alguns podem achar isso
complicado demais. Eu particularmente não falo nenhum idioma
antigo; busco então palavras ou sentenças simples que possam
indicar aquilo que quero. Por exemplo, escrever a palavra vitória
em runas “sigr” ciky e gravar isso em um objeto, na forma de
uma ligação de runas (bindrune) e carregar em um cinto, por
exemplo. Uma regra importante é que duas runas não se repetem
ao serem escritas em seguida, seja na mesma palavra ou em
palavras diferentes. Não posso entrar nas minúcias da escrita com
runas aqui, mas é possível encontrar materiais em inglês ou na
asatrueliberdade.com/runas.
Particularmente fiz bons experimentos usando o inglês escrito
em runas anglo-saxãs, o Fuþorc. O alfabeto comporta todos
os sons do idioma moderno, o que facilita a transcrição. Não
experimentei usar o português para escrever em Antigo Fuþark,
mas eu realmente desaconselharia isso, e sugeriria o uso de
palavras simples e expressões básicas no Novo Fuþark, que não
exigem conhecimento profundo de gramática do nórdico antigo.
Uma coisa importante aqui é: as runas traduzem sons, e não letras.
Ou seja, você escreve em runas como você pronuncia, não como
está na grafia.
Boa parte da magia das runas está em poder lê-las, gravar o
encantamento nelas, e assim fazer com que esse encantamento
permaneça ali. Ele é ativado através da mæġen de quem o criou, e
então torna-se portador de algum poder que poderíamos chamar
de “mágico”, em termos vulgares. O segredo é a parte final. O
segredo das runas não estava em seus nomes, segundo vejo. Mas
na capacidade de gravar frases, em uma sociedade pouco letrada,
que não poderiam ser decifradas. Escrever em runas era mais ou
menos como criar mensagens cifradas, hoje. A grande diferença
de nossa época para os
tempos antigos é que
poucas pessoas sabiam
ler e escrever.
Sobre as palavras
mágicas, como *alu,
*erilaz e *laukaR,
infelizmente o espaço
aqui é curto, e essa
discussão terá de ficar
para outra hora, não por
ser menos importante,
mas por exigir um grande
número de detalhes.
Para finalizar, gostaria
de dizer que essa não é
a única ou mais correta
forma de se utilizar as
runas na atualidade. A magia rúnica durante muitos séculos
esteve envolvida com Kabballah, esoterismo, alquimia, etc. Não
que isso seja intrinsecamente ruim, mas hoje, diferente de séculos
atrás, possuímos vários gigabytes de informação sobre a cultura
germânica, e as runas nesse contexto. Para aqueles que quiserem,
a magia do passado, mais próxima daquilo que era feita por
nórdicos e germânicos, pode ser reconstruída de forma bastante
usual, e independente de sistemas alheios. Infelizmente, ela exige
ainda um conhecimento de inglês, uma vez que não há materiais
em língua portuguesa sobre o assunto.
Para aqueles que praticam divinação rúnica e qualquer outra
forma, também fiquem tranquilos, todos respeitam as práticas
alheias. Apenas é importante divulgar informações quando se
acha, e mostrar que existe sim um conhecimento dos antigos, e
que isso não é ruim, e a magia não precisa ser feita simplesmente
em cima da maneira esotérica usual. A magia rúnica reconstruída
é uma poderosa ferramenta, viva, e que, a despeito de ter sido
redescoberta pela academia, exige um lado prático que jamais
pode ser feito apenas com estudos: ela é para ser experimentada
e vivida.
SEAXDĒOR ⨁
Detalhe de uma fíbula de prata (DR EM85;123) (um broche antigo) encontrado em Værløse, Zealand, Dinamarca, data do terceiro século de nossa era. Nela lê-se
“alugod”, seguido de uma suástica. Fonte: Wikimedia Commons.