informativo do levante!

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Vivemos um cenário no qual diversos âmbi- tos da vida social entraram em crise já há algum tem- po, e convergem no que pode ser chamado de uma crise sistêmica do capitalismo. Crise econômica, cri- se ambiental, crise alimentária, crise de legitimidade na política burguesa... todos são ângulos diferentes através dos quais se pode observar elementos con- cretos dessa crise. E todos afetam nossas vidas di- retamente. Em contextos de crise profunda, abre-se espaço para a disputa de hegemonia na sociedade, para a disputa entre projetos políticos, e o risco de saídas à direita é sempre muito grande. Entretanto, a atuação da juventude organizada em diversos lu- gares do mundo vem mostrando que a disputa está em aberto e que, articulando sujeitos e causas, é pos- sível buscar saídas à esquerda para a crise sistêmica atual. Os protestos sociais na Grécia, Espanha, Portugal e Inglaterra, que levaram milhões de pes- soas às ruas e as praças ao longo de vários meses, são encabeçados por uma juventude que, cada vez mais, afirma sua rejeição à falta de esperanças e de expectativas. Sua rejeição à eternização de um presente incerto e materialmente insustentável. Na Tunísia e no Egito, governos historicamente anti- democráticos e peças fundamentais na manutenção dos interesses capitalistas na região foram derruba- dos por movimentos em grande parte encabeçados pela juventude, sedenta de liberdade e de perspec- tivas de futuro nestes países. O caso da Líbia e de diversos outros países do norte africano e oriente médio também traz protestos de juventude extrema- mente importantes. Todos esses processos seguem em aberto e em disputa, e seus caminhos ainda não estão determinados. De qualquer forma, existe um levante mundial da juventude, que está cansada de viver sem perspectivas. Na América Latina, o exemplo da luta chilena é paradigmático. Com a educação em grande me- dida privatizada, a luta no país andino não é apenas pela diminuição das taxas do ensino, mas sim uma luta que disputa a própria concepção de educação em voga no país. A luta por uma educação crítica e emancipadora, que substitua a simples formação de profissionais extremamente especializados e di- recionados diretamente para as necessidades do mercado de trabalho, é uma luta que deve ganhar dimensões no mínimo continentais. Estudantes e trabalhadores chilenos estão juntos nessa luta já há mais de 3 meses, e devem contar com todo nosso apoio. Neste sentido, a luta dos estudantes brasilei- ros, ocupando mais de 20 reitorias no último período, para garantir condições de permanência na Universi- dade, de ensino, pesquisa e extensão com qualidade e socialmente referenciados, aponta uma tendência que pode aumentar, dependendo da nossa capaci- dade de mobilização. O processo de reforma pelo qual está pas- sando nosso sistema educacional, com o paulatino desmonte do caráter público das universidades, a transferência de recursos públicos para a iniciativa privada, a expansão sem recursos, a formação cada vez mais tecnicista e aligeirada, funciona para read- equar o sistema educacional às características do sistema capitalista internacional e brasileiro. Neste contexto, no papel que a universidade pública, que produz cerca de 90% das pesquisas, passa a cumprir nos marcos da expansão do capitalismo que o gov- erno Dilma aponta na próxima década é importantís- simo, seja por questões relacionadas à descoberta e exploração do Pré-Sal ou pelos negócios que en- volvem a realização da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. É um sistema educacional que se adéqua, cada vez mais, para as tarefas que nos foram impostas pelo capital internacional e pelo projeto neoliberal, que vem desde o governo de FHC mas que com Lula e Dilma ganha cores mais “de- senvolvimentistas”, que vem sendo implementado no país há mais de 10 anos. O que se coloca agora diante de nós é, por- tanto, um cenário de disputa por uma concepção de educação. A construção, com diversos coletivos, movimentos sociais, entidades e partidos políticos, do plebiscito pelos 10% do PIB para a educação pública não deve ser encarada simplesmente como uma tentativa de resposta ao congresso nacional. É muito mais do que isso. É uma disputa acerca da con- cepção de educação e do projeto de país pelo qual lutamos. Uma educação que não reflita as diferen- ças de classe, que não reproduza essas diferenças e que contribua para acentuar os processos de luta pela construção de outra forma de sociedade. Uma educação que não sirva simplesmente aos ditames do mercado, às demandas que nos são impostas por esse projeto de país que consegue, ao mesmo tem- po, ser subserviente e opressor, inovador nos seus métodos e discursos, mas velho nas suas práticas e nos interesses aos quais se submete. OCUPAR AS REITORIAS E AS PRAÇAS Informativo Nacional - Outubro 2011 Foto: Luiz Nabuco

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10% do PIB para educação publica já

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Page 1: Informativo do Levante!

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Vivemos um cenário no qual diversos âmbi-tos da vida social entraram em crise já há algum tem-po, e convergem no que pode ser chamado de uma crise sistêmica do capitalismo. Crise econômica, cri-se ambiental, crise alimentária, crise de legitimidade na política burguesa... todos são ângulos diferentes através dos quais se pode observar elementos con-cretos dessa crise. E todos afetam nossas vidas di-retamente. Em contextos de crise profunda, abre-se espaço para a disputa de hegemonia na sociedade, para a disputa entre projetos políticos, e o risco de saídas à direita é sempre muito grande. Entretanto, a atuação da juventude organizada em diversos lu-gares do mundo vem mostrando que a disputa está em aberto e que, articulando sujeitos e causas, é pos-sível buscar saídas à esquerda para a crise sistêmica atual. Os protestos sociais na Grécia, Espanha, Portugal e Inglaterra, que levaram milhões de pes-soas às ruas e as praças ao longo de vários meses, são encabeçados por uma juventude que, cada vez mais, afirma sua rejeição à falta de esperanças e de expectativas. Sua rejeição à eternização de um presente incerto e materialmente insustentável. Na Tunísia e no Egito, governos historicamente anti-democráticos e peças fundamentais na manutenção dos interesses capitalistas na região foram derruba-dos por movimentos em grande parte encabeçados pela juventude, sedenta de liberdade e de perspec-tivas de futuro nestes países. O caso da Líbia e de diversos outros países do norte africano e oriente médio também traz protestos de juventude extrema-mente importantes. Todos esses processos seguem

em aberto e em disputa, e seus caminhos ainda não estão determinados. De qualquer forma, existe um levante mundial da juventude, que está cansada de viver sem perspectivas. Na América Latina, o exemplo da luta chilena é paradigmático. Com a educação em grande me-dida privatizada, a luta no país andino não é apenas pela diminuição das taxas do ensino, mas sim uma luta que disputa a própria concepção de educação em voga no país. A luta por uma educação crítica e emancipadora, que substitua a simples formação de profissionais extremamente especializados e di-recionados diretamente para as necessidades do mercado de trabalho, é uma luta que deve ganhar dimensões no mínimo continentais. Estudantes e trabalhadores chilenos estão juntos nessa luta já há mais de 3 meses, e devem contar com todo nosso apoio. Neste sentido, a luta dos estudantes brasilei-ros, ocupando mais de 20 reitorias no último período, para garantir condições de permanência na Universi-dade, de ensino, pesquisa e extensão com qualidade e socialmente referenciados, aponta uma tendência que pode aumentar, dependendo da nossa capaci-dade de mobilização. O processo de reforma pelo qual está pas-sando nosso sistema educacional, com o paulatino desmonte do caráter público das universidades, a transferência de recursos públicos para a iniciativa privada, a expansão sem recursos, a formação cada vez mais tecnicista e aligeirada, funciona para read-equar o sistema educacional às características do sistema capitalista internacional e brasileiro. Neste contexto, no papel que a universidade pública, que

produz cerca de 90% das pesquisas, passa a cumprir nos marcos da expansão do capitalismo que o gov-erno Dilma aponta na próxima década é importantís-simo, seja por questões relacionadas à descoberta e exploração do Pré-Sal ou pelos negócios que en-volvem a realização da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. É um sistema educacional que se adéqua, cada vez mais, para as tarefas que nos foram impostas pelo capital internacional e pelo projeto neoliberal, que vem desde o governo de FHC mas que com Lula e Dilma ganha cores mais “de-senvolvimentistas”, que vem sendo implementado no país há mais de 10 anos. O que se coloca agora diante de nós é, por-tanto, um cenário de disputa por uma concepção de educação. A construção, com diversos coletivos, movimentos sociais, entidades e partidos políticos, do plebiscito pelos 10% do PIB para a educação pública não deve ser encarada simplesmente como uma tentativa de resposta ao congresso nacional. É muito mais do que isso. É uma disputa acerca da con-cepção de educação e do projeto de país pelo qual lutamos. Uma educação que não reflita as diferen-ças de classe, que não reproduza essas diferenças e que contribua para acentuar os processos de luta pela construção de outra forma de sociedade. Uma educação que não sirva simplesmente aos ditames do mercado, às demandas que nos são impostas por esse projeto de país que consegue, ao mesmo tem-po, ser subserviente e opressor, inovador nos seus métodos e discursos, mas velho nas suas práticas e nos interesses aos quais se submete.

OCUPAR AS REITORIAS E AS PRAÇASInformativo Nacional - Outubro 2011

Foto: Luiz Nabuco

Page 2: Informativo do Levante!

DIA DE LUTA CONTRA AS PRIVATIZAÇÕES

3 DE OUTUBRO58 ANOS DA PETROBRÁSQUEM VAI COMER O BOLO?

O Brasil pode se tornar um dos prin-cipais produtores mundiais de petróleo, haja vista as últimas descobertas de reservas desta riqueza - reservas que se encontram abaixo da camada de sal, o dito pré-sal. Tal descober-ta pode resolver os problemas de falta de re-cursos, que os governos insistem em apontar como causadores do caos existente na Saúde ou dos parcos recursos destinados à edu-cação. Mas pra onde esse dinheiro tem ido? Vários movimentos sociais estão con-struindo a Campanha “O Petróleo Tem Que Ser Nosso!”, em clara alusão à histórica cam-panha encabeçada pela UNE na década de 1940, “O Petróleo é Nosso!”. Passado mais

de meio século, estamos novamente diante do dilema: fazer das riquezas naturais do Brasil fontes de recursos para nosso povo ou fazer delas fontes de recursos para as empresas es-trangeiras. Os governos Lula e Dilma continuam a vender nossas riquezas sem nenhum pu-dor, praticando leilões dos poços de petróleo através da Agência Nacional de Petróleo (ANP). Muito da riqueza do Pré-Sal, apregoa-da pelo governo como o início de uma “rev-olução” no país já está leiloada. Precisamos ir além de quantos por cento do fundo social vão pra o quê. O que queremos é uma Petrobras 100% pública para que o povo possa decidir

o que fazer com o petróleo e seus recursos, inclusive decidir se queremos tirá-lo da terra, afinal o petróleo é um recurso muito poluente. Nós, do Coletivo Levante, participamos ativamente de uma campanha que defende 100% do petróleo para o povo brasileiro e pela retomada do monopólio estatal pela Petrobrás. Por isso estamos presente nesse ato de an-iversário dos 58 anos da Petrobrás, junto com a campanha e com os movimentos sociais que exigem o fim das privatizações e a destinação social dos royalties.

A defesa por outro modelo para a educação brasileira passa pelo resgate de uma bandeira histórica do movimento educacional: 10% do PIB pra Educação Pública. Essa foi a defesa do Projeto da Sociedade Brasileira - PSB, em 1997, reduzida para 7% do PIB pelo Congresso Nacional e enfim vetada pelo então presidente Fernando Henrique. O veto foi mantido pelo governo Lula e agora, retoma à pauta na elabo-ração do PNE 2011-2020. A proposta da Conferencia Nacional de Educação, defendida pelo governo Dilma ponta 7% do PIB como meta para 2020, muito abaixo do que já apontava como necessário, 14 anos atrás os movimentos sociais, na defesa de 10% do PIB. É preciso diferenciar algumas características da universidade do período de FHC onde as medidas de contenção da inflação eram mais duras e a economia vivia um cenário de pouca expansão, do período dos governos de Lula e Dilma, onde a economia passa por período de crescimento. No entanto, a edu-cação como mercadoria, possibilidade de ganhos pelos seus investidores é dominante nos dois períodos. Seja pela escolha das universidades privadas como eixo do ensino superior no Brasil ou na presença de capitais privados nas universidades públicas através das fundações de direito privado. Por outro lado, há clara diferença no papel que a universidade pública, que produz cerca de 90% das pesquisas, passa a cumprir nos marcos da expansão do capitalismo que o governo Dilma aponta na próxima década, seja pela descoberta e exploração do Pré-Sal ou pelos negócios que envolvem a reali-zação da Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016. Vale ainda ressaltar as indústrias que se instalaram e estão para se instalar no país. O desenvolvimento de novas tecnologias para a produção capitalista é essencial para a manuten-ção de seus lucros e garantir a expansão. Já que no Brasil as pesquisas se concentram nas universidades públicas essas tem de cumprir seu papel para a expansão que se pretende. Os investimentos milhonários na construção de parques tecnológicos, em algumas universidades, como a UFRGS e UFRJ, evidenciam esse processo. Há uma mudança na centralidade da pesquisa produzida pela universidade, em função da expansão econômica esperado na economia brasileira. A privatização “por dentro” cresce nas universidades na medida em que o governo continua com a política de corte de gastos das áreas sociais, incluindo as universidades. O corte nos concursos previstos para professores e abertura de vagas para professores substitutos, no primeiro semestre de 2011, revelam

o modelo que se reserva a maior parte do ensino nas universidades. Porém a pesquisa passa, cada vez mais, a ser financiada pelo capital privado. Em junho de 2007, enquanto olhávamos apenas a precarização que seria promovida pelo REUNI, o governo aprovou a lei 11.487 que cria isenção de impostos de até 250% do valor investido para empresas que apoiarem pesquisas. Em suma, a luta por uma Universidade pública, gratuita e de qualidade não pode abrir mão de se perguntar Para Quem? A crítica ao modelo atual de universidade não pode se dar apenas nos marcos da luta pela qualidade do ensino. A bandeira dos 10% do PIB pra educação vai de encontro a prioridade que o Orçamento da União reserva ao pagamento da dívida do Estado (cerca de 45% do Orçamento) e, consequentemente aos lucros do setor financeiro. Porém, essa bandeira tem limites claros quando pensamos uma Universidade voltada para os interesses dos trabalhadores e oprimidos da nossa sociedade. Nesse sentido, a crítica a universidade atual deve ser acompanhada de uma crítica ao desenvolvimento planejado pelo governo Dilma que aprofunda o caráter privado e mercadológico da universidade. A defesa dos 10% do PIB para a educação é a luta pela redemocratização da universidade. Não a toa, vem sendo construído por iniciativa do movi-mento estudantil, sindicados e movimentos sociais um plebiscito nacional em defesa de 10% do PIB para a educação pública. É preciso retomar a defesa do caráter público, da autonomia financeira e pedagógica, do tripé ensino-pesquisa-extensão, da produção de conhecimento vinculada à um projeto de classe, à ampliação do acesso e da qualidade no ensino.