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Este livro foi escrito exclusivamente como fonte de informação. A informação contida neste livro não deve, sob qualquer pretexto, ser considerada um subs- tituto para o aconselhamento de um profissional de saúde, que deve ser consul- tado antes do início de qualquer dieta, exercícios ou outro programa de saúde. A presente edição segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. [email protected] www.marcador.pt facebook.com/marcadoreditora © 2015 Direitos reservados para Marcador Editora uma empresa Editorial Presença Estrada das Palmeiras, 59 Queluz de Baixo 2730-132 Barcarena Foodist: Using Real Food and Real Science to Lose Weight Without Dieting. Copyright © 2013 by Darya Pino Rose. Todos os direitos reservados Publicado por acordo com HarperOne, uma marca da HarperCollins Publishers. Título original: Foodist: Using Real Food and Real Science to Lose Weight Without Dieting Título: Foodist: Comer bem viver melhor Autora: Darya Pino Rose Tradução: Melissa Lyra Revisão: Silvina de Sousa Paginação: Tânia Marques Capa: Bruno Rodrigues/ Marcador Editora Impressão e acabamento: Multitipo – Artes Gráficas, Lda. ISBN: 978-989-754-057-8 Depósito legal: 374132/14 1.ª edição: janeiro de 2015

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Este livro foi escrito exclusivamente como fonte de informação. A informação contida neste livro não deve, sob qualquer pretexto, ser considerada um subs-tituto para o aconselhamento de um profissional de saúde, que deve ser consul-tado antes do início de qualquer dieta, exercícios ou outro programa de saúde.

A presente edição segue a grafia do novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa.

[email protected]/marcadoreditora

© 2015Direitos reservados para Marcador Editorauma empresa Editorial PresençaEstrada das Palmeiras, 59Queluz de Baixo2730-132 Barcarena

Foodist: Using Real Food and Real Science to Lose Weight Without Dieting.Copyright © 2013 by Darya Pino Rose. Todos os direitos reservadosPublicado por acordo com HarperOne, uma marca da HarperCollins Publishers.

Título original: Foodist: Using Real Food and Real Science to Lose Weight Without DietingTítulo: Foodist: Comer bem viver melhorAutora: Darya Pino RoseTradução: Melissa LyraRevisão: Silvina de SousaPaginação: Tânia MarquesCapa: Bruno Rodrigues/ Marcador EditoraImpressão e acabamento: Multitipo – Artes Gráficas, Lda. ISBN: 978-989-754-057-8Depósito legal: 374132/141.ª edição: janeiro de 2015

Índice

Parte I: estIlo de saúde

UM: «dieta» é um palavrão de cinco letras 13 O que este livro é e o que não é 13 DOIS: o mito da força de vontade 25 Você não falha com as dietas, elas é que falham consigo 25 TRêS: estilo de saúde 39 Uma maneira mais delicada e suave de perder peso e manter a perda 39 QUATRO: Coma comida 57 Porque não precisa de um doutoramento para tomar decisões alimentares inteligentes 57

Parte II: Começar

CINCO: Conheça a sua comida 91 Duas semanas de monitorização, porque você merece 91 SEIS: Ir às compras e cozinhar 111 Um curso rápido para se tornar um ninja na cozinha 111

SETE: Zen e a arte de comer de forma consciente 139 OITO: a maneira como se mexe 161 Dez mil passos e levantar ferro 161 NOVE: recalibragem, resolução de problemas e manutenção 171

PARTE III: O FooDiSt NO DIA A DIA

DEz: lar, delicioso lar 191 O seu maior aliado no controlo do peso 191 ONzE: o escritório: Marmitas e rufias 223 DOzE: restaurantes: o bom, o mau e o vilão 241 TREzE: Como conquistar amigos e influenciar a família 255 CATORzE: sobre comida e valores 275

Agradecimentos 283

Notas 285

Parte I

Estilo dE saúdE

«Somos o que fazemos repetidamente. A excelência é, portanto, não um ato, mas um hábito.»

Aristóteles

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«diEta» é um palavrão dE cinco lEtras

o quE EstE livro é E o quE não é

«Estive de dieta durante duas semanas e tudo o que perdi foram duas semanas»Totie Fields, comediante

«Não gosto de coisas que não prestam.» Beavis e Butthead

«A vida, em si, é a verdadeira patuscada.» Julia Child

As pessoas que fazem dieta são uma raça engraçada e, sob muitos critérios, podiam ser classificadas como doidas. Participar de bom grado em sofrimento autoinfligido? Feito. Restringir categorias

inteiras de alimentos nutritivos, perfeitamente comestíveis e saborosos? Feito. Fazer o mesmo vezes sem conta e esperar resultados diferentes? Feito. Junte a isto algumas tatuagens faciais e camisas de força e estamos prontos para o manicómio.

Por mais incrível que pareça, há muitos poucos de nós que não perten-cem à tribo dos que fazem dietas. Fazer dietas, especialmente de forma crónica (estar sempre a saltar entre várias dietas, filosofias alimentares e, aham, dimensões corporais) é um passatempo popular do século XXI. Uma combinação de pedir o menu XL com padrões de beleza irrealistas obrigou a maioria de nós a questionar a forma como comemos e a nossa aparência física, e a indústria das dietas está mais do que feliz por nos oferecer milhares de soluções de perda de peso todos os anos. Deus os abençoe.

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Diria que é uma pena que os comprimidos, os programas e os DVD gratuitos não tenham funcionado lá grande coisa, mas agora, que sou uma foodist,* vejo o falhanço da indústria das dietas em fazer-nos mais magros ou saudáveis como uma das pedradas no charco mais sortudas da nossa geração. Imagine se tivesse resultado. Quão horrível seria se, para nos sentirmos e parecermos fantásticos, tivéssemos de nos privar das comidas que adoramos pelo resto da vida, evitando bolos de aniversário e restaurantes com estrelas Michelin, só para gostarmos de nos ver ao espelho? A sério, que se lixe isso. Não é necessário, mesmo se tivésse-mos a força de vontade suficiente para o conseguir (e provavelmente não temos). Há uma maneira melhor, e a única coisa que é preciso é pensar em comida, saúde e perda de peso não como uma pessoa de dieta, mas como um foodist.

Se no passado já experimentou algum programa de perda de peso, pro-vavelmente sabe, por experiência própria, que as pessoas de dieta quase nunca ingerem comida. Claro, comem proteínas, gordura, hidratos de carbono (embora tentem não o fazer), calorias, cálcio e ómega 3, mas, para elas, a comida é apenas um veículo para ingerir nutrientes essenciais e não a derradeira razão para comer. Sei isto porque estive de dieta de forma crónica durante a maior parte da minha vida, e durante mais de duas décadas experimentei quase todas as estratégias de perda de peso que existem.

A minha incursão pelas dietas começou sem querer. Numa manhã so-larenga, no sexto ano, entrei na cozinha e vi a minha mãe a fazer o que pa-recia um batido. Pensando ter ganhado a lotaria dos pequenos-almoços, perguntei, entusiasmada, o que era aquilo. Ela explicou-me que era, de facto, um batido de chocolate, mas que fazia parte de uma nova dieta que supostamente a ajudaria a perder peso. A minha interpretação de criança de onze anos: podemos beber batidos de chocolate ao pequeno-almoço sem engordar. A minha mãe concordou em partilhá-los comigo, e o pequeno- -almoço nunca mais foi o mesmo.

Nos anos seguintes, fui dos batidos SlimFast todas as manhãs a uma dieta quase livre de gordura (lembram-se dos anos 90?). Quando entrei na faculdade, só comia carne, ovos e queijo fresco magro, de acordo com o Dr. Atkins. Daí, passei para a Dieta de South Beach e comecei a correr maratonas para queimar as calorias extras. Por outras palavras, tornei-me o exemplo perfeito do que Michael Pollan, autor de o Dilema do omní-voro e herói da comida verdadeira, descreve habilmente como o nosso

* Termo usado pela autora para designar os apaixonados por comida verdadeira, sazonal. (N. da t.)

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«distúrbio alimentar nacional.»1 Abracei cada nova dieta como se esta tivesse o dom de resolver todos os meus problemas, seguindo todas as regras ridículas sem questões nem exceções.)

Olhando para trás, a parte mais interessante não é ter tentado todas essas dietas (claramente não estava sozinha nos meus esforços), mas o ter sido boa nisso. No liceu, era muito magra (ou seja, «bem-sucedida») no meu regime pobre em gorduras – era bailarina e, definitivamente, assim o parecia. Quando parei de dançar e recuperei algum peso, não tive di-ficuldades em deixar o pão, o arroz e a batata, isto durante muitos anos, enquanto voltava ao tamanho 32 com a dieta Atkins. Acordava de bom grado todos os dias às cinco da manhã para duas horas de exercícios fí-sicos, e cronometrava corridas de três horas todos os domingos para o treino de maratona, durante os primeiros anos de faculdade. Embora o sucesso fosse passageiro, a pouca força de vontade nunca foi o motivo. O problema não estava em mim. O problema é que se o privar de energia, nutrientes e prazer não é a forma mais eficaz de se atingir – quanto menos de manter – o corpo que se deseja, também não é a forma como queremos viver a vida.

As pessoas que fazem dieta de forma crónica acreditam que o suces-so vem do sacrifício. Se ao menos conseguíssemos privar-nos um pouco mais, punir o nosso corpo com mais dureza, então, teríamos uma apa-rência estupenda e, claro, seríamos felizes. Mas, como uma pessoa que se torturou a si própria de todas as formas imagináveis, posso garantir-lhe que esse caminho não leva à felicidade. Porquê? Porque transforma a vida numa luta constante. Nunca vencemos na realidade se estivermos de die-ta. Quando nos privamos constantemente, a felicidade está sempre fora de alcance. Por isso, mesmo que se identifique firmemente com a melhor e mais eficaz dieta restritiva, porque deve ser esse o seu objetivo? Não de-via a vida ser mais do que estar sempre a negar-se as coisas de que gosta? Agora está a pensar como um foodist.

Por mais simples e lógico que soe, sei, por experiência, que acabar com a privação é difícil para quem faz dietas de forma crónica. «Não há ganho sem dor» é algo fundamental à nossa psique – não merecemos sofrer por sermos tão gordos? A maioria tem sido vítima de um círculo vicioso con-voluto através do qual somos recompensados pelos nossos sacrifícios com perdas de peso temporárias (mas muitas vezes acentuadas) no começo de cada nova dieta. Isto cria a ilusão de sucesso. Mas tem de se perguntar: o sucesso verdadeiro não devia ser definido por uma perda de peso duradoura – e não temporária?

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Os nutricionistas e médicos também não têm sido de grande ajuda. Quase todos os especialistas em perda de peso dizem-nos que temos de comer menos e mexer-nos mais, com a implicação óbvia de que precisa-mos de fazer dieta (estar em privação) e exercício (sofrer no ginásio) para atingirmos os nossos objetivos. Não podemos quebrar a primeira lei da termodinâmica – é ciência! Mas esta linha de pensamento negligencia as razões pelas quais temos tendência para comer demasiado e não nos dá as ferramentas de que precisamos para aplicar, de facto, a simples equação «comer menos, mexer-se mais, perder peso» que defendem. Também implica que o falhanço nasce de uma falta de força de vontade (porque não está a comer menos, como devia?), e não de um plano que falha em reconhecer as nuances da psique humana. Quantas pessoas conhece que comem apenas pelo combustível? Todos os magros, certo? Nem pensar. Claro, às vezes, comemos porque temos fome. Mas os alimentos especí-ficos que escolhemos, e como os comemos, são largamente influenciados pelos nossos hábitos e ambiente. Por outras palavras, não é o conceito de comer menos para perder peso que está errado, mas a ideia de que po-demos perder peso e mantê-lo sem levar em consideração as razões pelas quais fazemos as nossas escolhas.

As minhas experiências convenceram-me de que a força de vontade não era a peça em falta na equação. Afinal, seguia todas as regras, mas manter o peso era uma luta constante. Na altura, não sabia o que fal-tava, no entanto, tinha a certeza de que os seres humanos nem sempre tiveram este problema e que alguma coisa no atual paradigma de perda de peso devia estar errada. Só no segundo ano da faculdade percebi que já tinha formação suficiente em biologia para ir diretamente à literatura científica em busca de respostas. Antes, apoiara-me em livros de dieta e artigos de revistas para andar às apalpadelas através de diferentes estra-tégias para perda de peso. Agora, com o conhecimento e a experiência em laboratório para ler e entender a ciência, queria ver os dados por mim mesma.

Não será uma surpresa saber que, mesmo neste estágio, fiz a minha pesquisa de forma totalmente errada. Da perspetiva de quem faz dietas de forma crónica, procurava a dieta perfeita, esperando em parte que alguma versão pobre em hidratos de carbono fosse a resposta (afinal, esta foi a mais fácil). Por isso, no começo, as minhas descobertas foram muito frustrantes. A primeira coisa que aprendi foi que, na sua maioria, as dietas não funcionam em perdas de peso a longo prazo. Na verdade, entrar nalgum tipo de dieta para perda de peso é um indicador significativo de

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ganho de peso.2 Duh. Dito isso, é possível perder peso, pelo menos duran-te algum tempo, em qualquer dieta. Comparadas com as dietas pobres em gorduras, no início, as pobres em hidratos de carbono tendem a ter um efeito mais acentuado na perda de peso, mas este costuma ser recu-perado ao fim de um ano. Cinco por cento da população mantém, de facto, o peso, mas o método que usam não parece importar. Estas pessoas conseguiram, de alguma forma, integrar hábitos mais saudáveis e fazer mudanças permanentes no seu estilo de vida.

E as pessoas que são naturalmente magras ou nunca engordam – o que comem? Mais uma vez, os dados mostram que a proporção de macro-nutrientes (hidratos de carbono, gordura e proteína) tem pouco impacto na questão de a pessoa ou a população se ver acima do peso. As pessoas podem dar-se bem com dietas pobres em gordura, ricas em gordura, po-bre em hidratos de carbono e pobres em proteínas. Como Michael Pollan explica no seu livro Saber Comer, o indicador mais consistente do ganho de peso e problemas de saúde é a quantidade de comida processada que se ingere.3 Seja pobre em gordura ou em hidratos de carbono, os alimen-tos processados industrialmente podem prejudicar mais do que ajudar no controlo de peso.

Todavia, o que come é apenas uma parte da equação. Como come e até porque come também têm impacto significativo na saúde e no peso cor-poral a longo prazo. Hábitos como uma boa mastigação e comer devagar são mais comuns entre pessoas com o peso normal do que em indivíduos com excesso do peso. As culturas que encorajam a comida pelo prazer (por exemplo, os franceses) e pela saúde (por exemplo, os habitantes de Okinawa) têm uma incidência mais baixa de obesidade do que ou-tras sociedades industrializadas. Quer dizer, a ciência diz-nos que é mais importante focalizarmo-nos nos hábitos e nos padrões gerais de uma alimentação saudável do que em hidratos de carbono e proteínas. Mais ainda, a psicologia e a cultura alimentar podem ser tão cruciais como o tipo de alimentos que come para obter sucesso a longo prazo.

Quando percebi pela primeira vez as implicações da ciência, hesitei. Afinal, tinha de tentar ser saudável, em vez de magra? Tinha de largar as barras de proteínas? Devia tomar o pequeno-almoço? E o mais estranho de todos: devia parar de fazer dieta? Não via como alguma dessas coisas podia ajudar-me em algo, senão a ganhar peso. Mas confiei mais na ciên-cia do que nas revistas Cosmopolitan e Shape e decidi tentar. Pensei que, se não resultasse depois de algumas semanas, podia regressar à sopa de repolho e toranjas e recuperar a linha. Respirei fundo, parei de contar as

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calorias e comecei a comer comida – verdadeira. E, pela primeira vez na vida, perdi peso sem esforço.

As primeiras alterações que fiz foram muito simples: adicionei um pequeno-almoço regular, cereais intactos e integrais (esclarecerei a dife-rença em breve) e produtos hortícolas frescos comprados diretamente no mercado de produtores. Também incluí mais leguminosas, como feijão e lentilhas. Deixei de beber refrigerantes dietéticos e de comer barras energéticas e outros produtos de dieta artificialmente ricos em proteí-na e fibra. Também reduzi os exercícios aeróbicos para trinta minutos (de sessenta ou mais) e concentrei-me mais em treino de força e pesos livres. Não só perdi peso ao incorporar estas mudanças, como as minhas proporções e formas se transformaram naquilo por que sempre lutara: um corpo mais elegante e tonificado, em vez de musculado com zonas problemáticas (não se preocupem, rapazes, por terem mais testosterona, tornar-se foodist também pode ajudá-los a criar músculos).

Também perdi os desejos por doces e comidas pesadas com que me debati toda a vida. Mesmo nas várias dietas pobres em hidratos de car-bono que experimentei, ansiava por muffins integrais e chocolate. Desde que comecei a comer comida de verdade, os desejos de açúcar deixaram de me assombrar e desfruto de sobremesas sempre que me apetece, o que acontece menos vezes. Gerir o tamanho das porções é bem mais fácil. As refeições satisfazem-me e tenho fome às horas certas. O stresse e a ansiedade que sentia quanto à comida e ao meu peso desapareceram por completo, mas isso nem sequer é a melhor parte da história. Mais uma coisa aconteceu quando estabeleci esse compromisso experimental em concentrar-me na saúde em vez de na perda de peso. Depois de anos a lutar com a comida, por vezes odiando-a, descobri que a amava. Mu-dei-me recentemente de Berkeley para São Francisco, e alguns amigos apresentaram-me ao mundo da gastronomia daqui. Até então, julgava que sabia o que era comida saborosa, mas não estava de todo preparada para a experiência que tive durante a minha primeira refeição verdadei-ramente espetacular. Em São Francisco, os ingredientes brilham. Sim, os chefes são inovadores e brilhantes, mas o que diferencia esta comida de tudo o que provei no passado é a ideia simples de que comida excelente começa com ingredientes excelentes. São Francisco abriu-me os olhos para as possibilidades do mundo da culinária e, por incrível que pareça, baseia-se nos mesmos princípios que me libertaram da tirania da dieta.

Antes presumira, como a maioria, que a comida saudável sabia mal, ou pelo menos pior do que qualquer coisa que as pessoas aceitassem

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comer. Claro, quando lhe dizem que as bolachas de arroz e as barras proteicas são «saudáveis», então isso é verdade. Até é verdade para os espinafres congelados moles e tomates rosados farinhentos que na minha infância passavam por «legumes». Mas, tal como a deliciosa comida de São Francisco, a comida mais saudável é feita com ingredientes de alta qualidade, no pico da estação, cultivados por pessoas apaixonadas pelo que produzem. Sempre pensei que uma cenoura fosse uma cenoura e um frango fosse um frango, mas não podia estar mais distante da verdade.

O clima e a qualidade do solo são os maiores determinantes do va-lor nutricional dos produtos agrícolas (incluindo os animais que se ali-mentam das plantas). Também são o fator mais importante no sabor da comida. No verão, um tomate da sua horta sabe muito melhor do que qualquer tomate de supermercado em janeiro, e as mesmas regras da sa-zonalidade aplicam-se aos brócolos e até à carne. Se parar para pensar, faz todo o sentido. Em última análise, não é a qualidade de qualquer pro-duto determinada pela matéria-prima? O mais incrível é que este facto transforma a comida saudável de algo pouco atrativo em algo delicioso. Felizmente, para mim e para o meu orçamento de estudante, conseguia encontrar os mesmos ingredientes usados pelos restaurantes finos de São Francisco nos mercados de produtores por uma fração do preço. Quando descobri isso, foi-me impossível voltar à comida medíocre.

É difícil quantificar o impacto de amar a comida, em vez de a comba-ter. Comer saudável torna-se uma alegria; por isso, a perda de peso vem naturalmente. Os amigos olham para as suas refeições com inveja, em vez de pena. Os seus objetivos passam a ser projetos divertidos, em vez de um fardo. A nível psicológico, um dos aspetos mais importantes da vida – a comida que ingere três vezes por dia e as refeições que partilha com a família – sofre uma volta de 180 graus e passa de stressante e difí-cil a alegre e delicioso. A forma antiga de fazer dieta e o sofrimento que traz parecem, de repente, desnecessários.

Os foodists não fazem dieta. As dietas de perda de peso modernas são planos alimentares temporários que destacam nutrientes individuais e res-trições, em vez de comida verdadeira e hábitos a longo prazo. Os foodists, em contraste, concentram-se em alimentos verdadeiros, de alta quali-dade, para melhorar a qualidade de vida. Entendemos que a aparência física e os sentimentos em relação ao próprio corpo são importantes, mas a verdadeira felicidade também vem de uma saúde excelente, uma vida social que o satisfaça, experiências culturais enriquecedoras e prazer físi-co. Não me interprete mal, o meu objetivo é ajudá-lo a perder peso. Mas

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quero certificar-me de que o sucesso é permanente e que não sofre com o processo. As dietas de perda de peso populares sacrificam todos os outros aspetos da vida e da felicidade em nome da perda de peso rápida. Mas os foodists sabem que ser mais magro não resolve todos os seus problemas, e se negligenciar o resto da vida em detrimento desse princípio, o peso encontrará o caminho de volta. Enquanto foodist, quero mais do que um corpo perfeito; quero uma vida fabulosa.

Por estas razões, a minha filosofia sobre comida não tem nada que ver com gordura, hidratos de carbono ou calorias. Abordo a comida e a saú-de com apenas uma crença inabalável: a de que a vida deve ser fabulosa. O que come deve sempre contribuir para, e não afastar, a sua qualidade de vida. Deve aparentar e sentir-se no seu melhor não apenas enquanto se obriga a passar fome durante semanas ou meses, mas no tempo que lhe apetecer tentar. A sua comida deve ter um sabor delicioso, seja ou não saudável, e nunca deve sentir-se culpado pelo que escolhe.

Comer Bem, Viver Melhor é um manual de treino para fazer da comi-da verdadeira, portanto, da perda de peso verdadeira e duradoura, uma parte permanente da sua vida. Saber o que comer não é o mais difícil na perda de peso. Há pessoas magras e saudáveis ao longo de todo o espetro dietético, e a maioria já sabe que brócolos é melhor do que cheesecake. O que é difícil é navegar num mundo que nos afasta constantemente da melhor comida e da melhor saúde. O desafio é fazer, de facto, o que sabemos estar certo.

Este livro ensiná-lo-á a ultrapassar os obstáculos diários e hábitos arraigados que impedem os seus objetivos. Já que todos enfrentamos dificuldades diferentes, vai também ajudá-lo a moldar as suas estratégias ao seu estilo de vida e às suas preferências, certificando-se de que o per-curso que escolhe resultará a longo prazo. Vai aprender o básico, tanto da nutrição quanto da psicologia, para entender não só o que comer, mas também como, onde, porque e como escolher alimentos que otimizam a sua saúde e felicidade. O nosso objetivo não é apenas a perda de peso. Queremos ter a certeza de que o esforço que investe agora o leva aonde quer, mas, mais importante ainda, que o ajuda a ficar lá.

Este livro divide-se em três partes. Na Parte I, procuro convencê-lo, de uma vez por todas, de que tanta dieta é uma missão inútil que, a longo prazo, trará mais danos do que benefícios. No entanto, esta não é uma má notícia, porque lhe apresento de seguida uma alternativa mais eficaz (e bem mais agradável): criar hábitos compensadores. Os hábitos tornam a alimentação saudável ainda mais fácil do que comer mal, já

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que são comportamentos automáticos que não exigem força de vontade. Inerentes a esta abordagem são a alegria e o prazer, já que é impossível ganhar novos hábitos sem uma recompensa associada. Se a comida sau-dável não for divertida, não resultará.

Concentrar-se em comida verdadeira, em vez de nos alimentos dieté-ticos extremamente processados, é o segredo para tornar a comida saudá-vel. A minha receita para fazer a couve-flor saber tão bem quanto batatas fritas (página 217) convenceu centenas de céticos de que os legumes não só têm sabor como podem ser incrivelmente deliciosos. Haverá sempre desculpas para consumir alimentos pouco saudáveis (e estes jamais são proibidos), mas, enquanto foodist, vai ter o mesmo número de razões deliciosas para comer alimentos verdadeiros e saudáveis. Não só deixam as suas papilas gustativas felizes, como, ao contrário das comidas proces-sadas, fá-lo-ão sentir-se maravilhoso e caber nas suas roupas. Para pessoas que fazem ou não dieta, é uma verdadeira mudança de rumo.

No entanto, por mais simples que pareça, comer comida verdadeira nem sempre é fácil. Depois de escrever vários livros e centenas de pági-nas sobre o que significa comer de forma saudável, Michael Pollan ainda recebe perguntas de leitores a exigir mais pormenores sobre como o fa-zer. Quando lhe perguntei a razão pela qual as pessoas continuam a ter dificuldades, ele ofereceu-me dois motivos. «A mensagem “coma comi-da verdadeira” é abafada por 30 milhões de euros em mensagens de pu-blicidade da indústria alimentícia. Pense no supermercado: a secção dos frescos é silenciosa, enquanto o corredor dos cereais é cheio de avisos. A mensagem perde-se», disse-me Pollan. Crescemos a aprender a ter atenção a nutrientes, e não a alimentos, e, no processo, os humildes pro-dutos integrais foram quase eliminados dos nossos hábitos alimentares.

Um segundo problema é que comer comida verdadeira exige um con-junto de qualidades que poucos de nós possuem. O resultado é que en-contrar, preparar e até mesmo identificar comida verdadeira pode ser di-fícil. «A comida verdadeira não é tão conveniente como as outras coisas que foram concebidas para serem de fácil uso, isto para não mencionar quão viciantes devem ser e o longo prazo de validade», diz Pollan. «Isto dá uma grande desvantagem à comida verdadeira.»

A Parte II ataca estes problemas de frente ao dar-lhe um plano para começar. Isto inclui analisar a sua própria dieta a fim de entender em que hábitos deve concentrar esforços para ter o maior impacto possível na saúde e no peso corporal. Estes diferem de pessoa para pessoa, e guiá-lo- -ei pelo processo de identificar e modificar os hábitos da maneira

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que for melhor para o seu estilo de vida. A Parte II ensina-o a equipar a cozinha e os ambientes de trabalho e de casa, para que nunca lhe faltem opções saudáveis e deliciosas. Esta secção também vai além das escolhas alimentares, realçando os hábitos periféricos, mas igualmente impor-tantes, que têm impacto na sua saúde e no seu peso, incluindo o comer devagar e conscientemente e o ser-se ativo, em vez de sedentário.

Por último, a Parte II contém uma secção de resolução de problemas e explora as diferenças fundamentais entre um foodist e uma pessoa que faz dietas de forma crónica: o controlo de peso a longo prazo. Há arte e ciência em ser-se foodist, e isso inclui ter uma compreensão íntima do que é necessário para a vida ser sensacional e também de se adap-tar às mudanças inevitáveis. Manter o peso exige experiências pessoais contínuas à medida que moldamos e adaptamos os nossos hábitos mais profundos às exigências da vida, que estão sempre a mudar. A Parte II ensina-lhe estas capacidades e também oferece um plano de calibragem para o caso de se ver estagnado durante o caminho.

A Parte III guia-o através das dificuldades do dia a dia, mostrando- -lhe como tomar as melhores decisões alimentares em casa, em restau-rantes e em viagem. Inclui dicas para educar uma família de esquisi-tos a comer e de como desviar subtilmente a atenção das suas escolhas saudáveis em situações em que o comportamento virtuoso não é bem- -vindo. Isto pode ser tão simples quanto mudar a linguagem que usa para descrever e pensar em comida (por exemplo, couve é «saborosa», não «saudável») ou reduzir a iluminação para que você e o seu parceiro comam mais devagar. Truques como estes são inestimáveis, porque cada um deles remove uma barreira que o impede de atingir os seus objetivos e coloca-o no caminho do sucesso a longo prazo. Este livro acaba num tom filosófico, explicando porque é a comida importante e porque será mais feliz e bem-sucedido se se importar com a sua.

Se pegou neste livro, há uma boa hipótese de esta não ser a primeira vez que teve a esperança de que um novo plano alimentar o ajudasse a perder peso. Todavia, se nunca experimentou nenhuma dieta no passado, Comer Bem, Viver Melhor pode ajudá-lo a atingir os seus objetivos. Vou dar-lhe as ferramentas de que precisa para gerir todos os aspetos da sua saúde a longo prazo. Não criará apenas hábitos melhores no dia a dia, também apreciará a comida mais do que julgava possível.

A comida não deve ser um sacrifício. Deve enriquecer a vida ao sa-tisfazer o palato, ao torná-lo saudável e em boa forma e ao aproximá- -lo da família, dos amigos e da comunidade.

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COMER BEM, VIVER MELHOR

Durante a maior parte da existência humana, foi esse o caso, mas nos últimos cem anos – mais coisa, menos coisa – mudámos para ver a comida mais como um meio para atingir objetivos em vez de um fim em si pró-prio. Tratámos a comida como uma ferramenta para a perda de peso, uma fonte de nutrientes, uma indulgência pecaminosa ou uma desculpa para procrastinar mais do que algo que vale por si próprio. Escrevi Comer Bem, Viver Melhor para nos fazer voltar a ver a comida verdadeira como algo essencial à felicidade, como algo que torna a vida fantástica.

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o mito da força dE vontadE

você não falha com as diEtas, Elas é quE falham consigo

«É difícil, caros concidadãos, discutir com a barriga, pois esta não tem ouvidos.»Cato, o Ancião

«Prometer não fazer qualquer coisa é a forma mais certa que existe de fazer com que uma pessoa faça exatamente o que prometeu não fazer.»

Mark Twain

Sei o quanto pode ser difícil, para quem está sempre de dieta, parar de procurar uma solução rápida, mesmo quando a nossa consciên-cia nos diz que as dietas restritivas apenas ajudam a manter a perda

de peso por pouco tempo. Ainda é incrivelmente tentador vestir o fato de super-herói com o grande A de Autocontrolo no peito. Já conseguiu domar a fome no passado e perdeu mais de dez quilos. Porque não o fazer mais uma vez durante alguns meses? Quando chegar ao objetivo, pode começar com esta coisa da comida saudável para a fase de manutenção.

Sei que é tentador. Mas espero que este capítulo o convença de que a crença de que pode tornar-se magro apenas pela força de vontade lhe traz mais danos do que benefícios, e só faz com que perca tempo que poderia aplicar no desenvolvimento dos hábitos necessários aos seus objetivos e ficar lá. As dietas restritivas e os exercícios excessivos não o levam ao que pretende mais rapidamente. Na verdade, fazem o oposto, afastam-no tanto física quanto mentalmente de uma saúde melhor e da felicidade.

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A FRAQUEzA DA FORçA DE VONTADE Levará uma força de vontade mais forte a uma perda de peso maior e

duradoura? Vamos tratar desta questão diretamente, porque a resposta ajudar-no-á a encontrar um caminho melhor. A minha própria história sugere que há mais coisas a influenciar a perda de peso além da for-ça de vontade, já que foi apenas quando parei de tentar comer menos que o meu peso baixou facilmente. Mas a ciência mostra que mesmo os «sucessos»* que tive com as dietas de restrição não são típicos.

O autocontrolo sempre foi algo fácil para mim, mas não é para a maioria das pessoas, especialmente quando se trata de comida. No ex-celente livro A Força de Vontade; Como Aumentar o seu Autocontrolo, Roy Baumeister e John Tierney argumentam que os seres humanos podem invocar atos de vontade incrível em certas circunstâncias,1 mas admitem que fazer dietas é um caso especial. Baumeister chama-lhe o «Paradoxo Oprah», que recebeu o nome da famosa apresentadora de televisão, e um dos seres humanos mais bem-sucedidos do planeta: Oprah Winfrey. «Mesmo pessoas com um autocontrolo excelente podem ter dificuldade em controlar o seu peso consistentemente.»2

Apesar das capacidades óbvias e recursos ilimitados de Oprah Win-frey, a sua luta com o peso tem sido notoriamente difícil. Qualquer pes-soa que tenha repetidamente tentado e falhado em manter uma perda de peso significativa identifica-se com a luta de Oprah. Se está acostu-mado ao sucesso noutras áreas da vida, esta dose de realidade é parti-cularmente difícil de se engolir. Somos seres excelentes em tantas áreas – porque não conseguimos simplesmente respirar fundo e controlar o peso? Na verdade, a pesquisa de Baumeister mostra que os indivíduos com mais força de vontade costumam ter mais sucesso na escola, nas empresas e na vida pessoal do que aqueles que têm menos autocontrolo, mas a diferença é muito menos pronunciada no controlo do peso cor-poral, pelo menos a longo prazo. Apesar de a força de vontade ajudar as pessoas a manter-se firmes na dieta, perdendo, assim, mais peso tempo-rariamente, ao longo da sua vida, estas pesam ligeiramente menos do que as que têm pouca.

Uma das razões é que a força de vontade depende do açúcar no san-gue.3 Como um músculo, esta tem capacidade limitada e, quando exer-citada exaustivamente, pode esgotar-se. Também como um músculo, o combustível primário que o cérebro usa para exercer a força de vontade

* Uso aspas com a palavra «sucesso» sempre que me refiro a dietas, porque não acho que estar infeliz deva contar como «sucesso». Mas o sucesso das dietas costuma ser definido pela perda de peso, e não da felicidade, e isso eu consegui definitivamente.

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é o nível de glicose no sangue. Por isso, quando a glicose no sangue está baixa (por exemplo, se está faminto, o que, quanto à alimentação em dieta, é basicamente o tempo todo), a sua força de vontade está mais fraca do que nunca, e a única maneira de consertar isso é comendo. Pode imaginar o problema que isto causa ao tomar decisões. Juntar exercício físico à equação – algo que quem faz dieta usa para queimar intencio-nalmente mais calorias (isto é, usar mais glicose do sangue) – só torna a situação mais problemática.

Baumeister e Tierney chamam-lhe uma «pescadinha de rabo na boca nutricional»: quanto menos come e mais se exercita, menor é a proba-bilidade de tomar boas decisões a longo prazo e manter a perda de peso. O problema da glicose no sangue também dificulta a vida de quem já tem problemas metabólicos. Se está acima do peso ou tem um historial de maus hábitos alimentares, então há uma grande possibilidade de já ter ou estar a desenvolver síndrome metabólica. Síndrome metabólica é uma série de problemas de saúde advindos de um mau controlo nos níveis de glicose do sangue, o que leva a um risco mais elevado de doen-ças cardíacas, AVC e diabetes tipo 2. Os principais sintomas são um au-mento na gordura corporal abdominal e resistência à insulina. Quando as pessoas perdem resistência à insulina, têm dificuldade em manter um nível estável de açúcar no sangue e ficam sujeitas a grandes variações dos níveis de glicose no sangue em resposta à ingestão de comida. Como a força de vontade é sensível a estas mudanças, a síndrome metabólica di-ficulta ainda mais a manutenção da força de vontade e o controlo do que se come ao longo do dia.

Para agravar a situação, a fome e o exercício físico não são as únicas formas de esgotar a força de vontade. A pesquisa de Baumeister e outros cientistas mostraram que só temos uma provisão de força de vontade para tudo o que fazemos, e qualquer tarefa que exija autocontrolo vai esvaziar a sua determinação em dificuldades que não parecem ter nada que ver com comida. Por exemplo, se passar uma boa parte da tarde a conter-se para não decapitar um cliente particularmente desagradável, é provável que ceda à tentação de mandar vir a sua piza preferida, em vez de parar no Whole Foods* para comprar legumes biológicos e peixe para o jantar, como tinha planeado. Uma noite mal dormida é outro fator que diminui a força de vontade, ao esgotar as reservas de glicose no sangue, e pessoas com privações de sono têm maior probabilidade de serem im-pulsivas e tomarem más decisões do que as que gozaram de descanso.

* Cadeia de lojas de comida saudável americana, inexistente em Portugal. (N. da t.)

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Mulheres com TPM, como é de se esperar, também estão esgotadas no departamento de autocontrolo, bem como a maioria dos pais de crianças pequenas.

A comida e o ato de comer são, muitas vezes, os primeiros luga-res onde caímos quando a nossa força de vontade está enfraquecida. Tendemos a pôr as nossas responsabilidades familiares e profissionais à frente da saúde pessoal ao priorizar as ações diárias, por isso, quan-do os nossos recursos mentais estão sobrecarregados, as escolhas ali-mentares parecem um sacrifício trivial. Uma razão para isto é que as consequências não são visíveis de imediato; acumulam-se ao longo das semanas, dos meses e dos anos – demasiado devagar para notarmos no dia a dia. Outra razão pela qual cedemos a tentações de comida mais prontamente do que a outros desejos é que, inconscientemente, os nossos cérebros desejam o efeito da glicose, e sabemos que uma mão-cheia de bolachas ou um pacote de batatas é a maneira mais fácil de fazer com que tal aconteça. Assim, a menos que esteja confiante em que nunca vai ter de acordar um pouco mais cedo do que preferiria, ou que precisará de se controlar em qualquer outra parte da sua vida, provavelmente não deve contar com a força de vontade para levar a cabo os seus objetivos de dieta a longo prazo.

FAzER DIETA AGRAVA A SITUAçãO As razões biológicas que usei para explicar porque não se deve confiar

na força de vontade para controlar o peso já são suficientemente depri-mentes. Mas, para quem faz dieta de forma crónica, a história é ainda mais triste. Embora todos nós estejamos sujeitos a lapsos de força de vontade como resultado de um esgotamento do açúcar no sangue, quem faz dieta integra um grupo especial cujos objetivos restritivos os torna mais vulneráveis às tentações culinárias do que as pessoas que não fazem dieta. Ou seja, fazer dieta agrava tudo.

Ao contrário de quem come normalmente, quem faz dieta tem um orçamento diário de calorias (ou hidratos de carbono, ou gordura – escolha o seu veneno) abaixo do qual são virtuosos e acima do qual falham (pelo menos por aquele dia). O problema é que este limite autoimposto dá lugar a um fenómeno a que os cientistas se referem como alimentação contrarregulatória, também conhecido como o efeito «que se lixe». Os pesquisadores mostraram que, uma vez que uma pessoa de dieta ultrapassa o orçamento de calorias que estabeleceu para si própria, rotula o dia como um fracasso e justifica qualquer

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exagero adicional com um «Que se lixe. Já lixei o dia. Mais vale di-vertir-me». O problema é que, uma vez chegadas a este ponto, as pessoas de dieta deixam de prestar atenção e comem muito mais do que aquelas que não estão de dieta na mesma situação. Ainda mais perigoso é o facto de que, embora as pessoas de dieta saibam que não cumpriram o objetivo do dia, a maioria não faz a menor ideia de quanta comida consumiu durante esse lapso. Não percebem que estes episódios podem deitar a perder dias, até mesmo semanas, de alimen-tação restritiva, acabando por ganhar peso, em vez de perder.

A razão pela qual as pessoas de dieta têm tendência para este com-portamento é a de que a alimentação restritiva nos ensina a ignorar os sinais internos de saciedade, os sinais biológicos que nos dizem se es-tamos famintos ou cheios. Por exemplo, se tiver fome, mas a dieta que segue diz que não pode comer nas próximas duas horas, vai obrigar-se a ignorar a barriga a dar horas e seguir em frente. Isto não só esvazia a sua força de vontade, podendo levar a que quebre a dieta algumas horas depois; como também ensina o seu cérebro a não ouvir o corpo. É uma faca de dois gumes, porque não o treina só a ignorar a fome. Não prestar atenção aos sinais de saciedade também significa que não saberá dizer quando está cheio, o que pode fazer com que coma mais do que o corpo de facto deseja.

Sem as dicas orientadoras internas, as pessoas de dieta dependem bastante de sinais exteriores para saber quando começar e quando parar de comer. Apoiar-se em sinais externos quanto à alimentação significa que é bem provável que coma só porque a comida está dispo-nível e termine tudo no prato, independentemente da sua fome. Tam-bém é bem provável que coma até esvaziar o pacote de batatas fritas, ou o episódio de Breaking Bad terminar, ou até que seja fisicamente impossível empurrar mais um bocado de comida pela garganta abaixo sem explodir. Não preciso de dizer que este tipo de comportamento não é uma receita aconselhável para uma perda de peso bem-sucedida.

Ignorar os sinais de saciedade interna tem outras implicações. Hoje em dia, com a sobrecarga de informação e a desintegração das culturas alimentares que historicamente ditavam quando, onde e quanta co-mida é apropriado ingerir, somos bombardeados com sinais que nos levam a querer consumir mais e com maior frequência. As embala-gens foram transformadas em recipientes facilmente transportáveis, destinados a serem consumidos em viagem. Aumentar o menu e os buffets é considerado um bom negócio, e não voracidade sem limites.

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Os anúncios televisivos encorajam-nos a adotar uma «quarta refeição», na esperança de que não reparemos nas centenas de calorias extras por dia. Petiscar à secretária ou frente ao televisor não é apenas normal – é esperado. É difícil navegar neste ambiente sem engordar significativamente, mes-mo para pessoas que não fazem dieta. Mas, para pessoas de dieta, com dificuldade em saber quando têm fome e quando estão cheias, todos estes convites representam um nível extra de dificuldade.

Resistir aos apelos de «coma agora» e ao «coma mais» durante todo o dia cria mais oportunidades para a nossa força de vontade fraquejar e aumentar a possibilidade de exagerarmos na comida. Mais ainda, mes-mo que pudéssemos depender dos sinais de saciedade interiores, já que estamos de dieta, o mais provável é que o nosso corpo andasse a dizer- -nos que estamos, de facto, com fome, e que as pipocas parecem uma excelente ideia naquele momento. Quando todas as escolhas se tornam difíceis, a força de vontade está constantemente a esvaziar-se, mesmo na-quelas em que as pessoas que não fazem dieta não pensariam duas vezes. Como resultado, o fazer dieta torna a perda de peso ainda mais difícil.

SE TEM, NãO USE Por esta altura, deve estar a pensar se a perda de peso é, sequer, pos-

sível. Se precisamos de comer menos para perder peso, mas comer me-nos torna a dieta impossível, como, em nome dos skinny jeans, devemos livrar-nos dos quilos extras?

A resposta pode, ao princípio, parecer contraintuitiva. Já que a força de vontade não é confiável para nos ajudar a tomar as decisões alimen-tares corretas, a melhor hipótese é não a usar. Pelo menos não o tempo todo, como tentam fazer as pessoas de dieta. Baumeister e Tierney ex-plicam: «Dissemos que a força de vontade é a maior força de um ser humano, mas a melhor estratégia é não nos apoiarmos nela para todas as situações. Poupem-na para emergências.»4 Esta foi a conclusão a que chegaram depois de Baumeister e outros terem completado um estudo que combinava os resultados de muitas experiências (uma meta-análise) que mediam a força de vontade. A descoberta surpreendente foi a de que as pessoas com as maiores capacidades de autocontrolo pareciam ser as que menos o usavam. Em vez disso, concentravam-se em estabelecer comportamentos ou hábitos automáticos, reduzindo, em última análise, a necessidade do autocontrolo que lhes consumia energias.5