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HUMOR, QUADRINHOS, GAMES E FANZINES | PARAÍBA | OUT/2011 | Nº 1 CAPA EXPEDIENTE SUMÁRIO

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Revista Imaginário

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  • HUMOR, QUADRINHOS, GAMES E FANZINES | PARABA | OUT/2011 | N 1

    CAPA EXPEDIENTESUMRIO

  • MARCA DE FANTASIAAv. Maria Elizabeth, 87/40758045-180 Joo Pessoa, [email protected]

    A editora Marca de Fantasia uma atividade doGrupo Artesanal - CNPJ 09193756/0001-79e um projeto do Namid - Ncelo de Artes Miditicasdo Programa de Ps-Graduao em Comunicao da UFPB

    Conselho EditorialHenrique Magalhes UFPB

    Elydio dos Santos Neto UFPB Alberto Pessoa UFPBMarcos Nicolau UFPB

    Marcelo Bolshaw UFRNGazy Andraus UNIMESP

    IMAGINRIO! uma publicao do Grupo de Pesquisa em Humor, Quadrinhos e Games (GPHQG) do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da Universidade Federal da Paraba. - ISSN 2237-6933

    EditorHenrique Magalhes

    Projeto grfico e editorao eletrnicaAlex de Souza

    Ilustrao da capaPaloma Diniz

    CAPA EXPEDIENTESUMRIO

  • SUMRIO

    Editorial - Henrique Magalhes

    p. 4

    Das formas de narrar o cotidiano nos fanzines

    punk (1980-1990) - Alessandro Wilson Gonalves Reinaldo

    Fernandes p. 5

    Projeto Mamute: um estudo de caso de

    ensino de histria em quadrinhos como ao

    voluntria em escola pblica - Alberto Ricardo

    Pessoap. 24

    Dos zines aos biograficzines: narrativas visuais no processo de formao continuada de docentes-pesquisadores - Gazy Andraus e Elydio dos Santos Netop. 47

    Dante no Inferno - Marcelo Bolshaw Gomesp. 58

    Resenha - Killoffer: Quando Tem que Ser, Quando Tem que Acontecer - Paloma Dinizp. 74

    Entrevista - Mastrotti - Elydio dos Santos Netop. 83

    CAPA EXPEDIENTESUMRIO

  • Imaginrio! - n 1 4CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    EDITORIAL - IMAGEM EM FOCO

    comum encontrar-se na atualidade a Histria em Quadrinhos como elemento motivador da leitura, sendo adotada nos programas curriculares do ensino bsico, aplicada em provas de seleo e utilizada como aferio de conhecimento e interpretao de discurso. Embora no sejam mais vistos como deletrios formao da juventude, certo que os quadrinhos, enquanto linguagem e meio de comunicao, continuam amplamente desconhecidos. Como afirma o pesquisador francs Thierry Groensteen, preciso que se aprenda a l-las pelo que elas tm de mais representativo, que sua linguagem icnica.

    Desde a dcada de 1960 a academia vem se dedicando ao estudo dos quadrinhos, contribuindo para seu reconhecimento como Arte. As HQs passaram de entretenimento a objeto de estudos, que estabeleceram os elementos prprios de sua linguagem. Hoje os grupos de estudos, sobretudo ligados a programas de Ps-Graduao em Comunicao, aprofundam a investigao sobre a capacidade criativa e cognitiva dos quadrinhos.

    O Grupo de Pesquisa em Humor, Quadrinhos e Games GP-HQG, do Ncleo de Artes Miditicas do Programa de Ps-Graduao em Comunicao da UFPB, criado em 2010, desenvolve estudos no s no campo das histrias em quadrinhos, mas tambm de expresses miditicas paralelas e complementares, como o humor e os games. O estudo das Artes Visuais em sua interface com a Comunicao o objetivo do grupo, que conta com uma equipe formada por alunos e professores do Mestrado em Comunicao e reas afins.

    Como os estudos no se completam sem sua difuso, a revista Imaginrio! o espao de divulgao dos trabalhos realizados pelo grupo, em forma de artigos, resenhas, entrevistas, ensaios artsticos do prprio grupo e de colaboradores autnomos ou vinculados a outras instituies de ensino. Com este primeiro nmero apresentamos nossos trabalhos e abrimos espao para a crtica e a colaborao dos interessados pelos temas.

  • Imaginrio! - n 1 5CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    DAS FORMAS DE NARRAR O COTIDIANO NOS

    FANZINES PUNK (1980-1990)

    Alessandro Wilson Gonalves Reinaldo Fernandes1

    Resumo: A partir da dcada de setenta do sculo XX o punk figurou como um movimento disseminador da contracultura em parcela dos jovens vindos das periferias urbanas. No meio dos fanzines (publicaes de f para f) o punk formulou uma nova tcnica de produo independente (faa voc mesmo!) com uma linguagem sem conceituaes estabelecidas. atravs dos discursos nos punkzines das dcadas de 1980 e 1990 que o artigo interpreta as contradies na ideologia do cotidiano; ou como o prprio punk entende: a sociedade catica. Recorremos aos fanzines bem como as fontes bibliogrficas para compreendermos esses fragmentos sociais deixados cotidianamente.

    Palavras-Chave: Fanzine; Movimento Punk; Cotidiano.

    1 - Mestrando do Programa de Ps-Graduao em Comunicao (PPGC/

    UFPB). Integrante do Grupo de Pesquisa em Humor, Quadrinhos e Games -

    GPHQG.

  • Imaginrio! - n 1 6CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    1. ACORDES INICIAIS SOBRE O MOVIMENTO PUNK

    Se desordem liberdade, seremos subversores da ordemKarne Krua

    Em meio correria de um grande centro urbano insistia um jovem: O que sobra pra gente o resto. O resto a violncia e a guerra. Esse discurso dentre tantos outros se tornaram mximas do punk ao se expressar socialmente. Pelos becos da cidade o signo de garotos do subrbio acompanha este movimento desde seus primrdios, ainda na gerao 77 - leia-se 1977 - do punk ingls.

    A partir da dcada de setenta do sculo vinte, vindo dos Estados Unidos e Inglaterra, o punk figurou como um movimento disseminador da contracultura em parte dos jovens das periferias urbanas; germinando caractersticas de uma nova categoria social que comeara a surgir, e se manifestando em expresses culturais peculiares.

    Confrontando outras parcelas do movimento contracultural da poca como os hippies, o punk surgiu como uma nova alternativa ao j desgastado emblema de paz e amor. Essa nova gerao trazia o retorno ao rocknroll bsico, alm de criticarem o idealismo das geraes anteriores. O que prevaleceria agora era o ideal no future (no haver futuro).

    Exclamava a msica Condenado do grupo Ratos de Poro: No h esperana para eu e voc. Diferente da interpretao niilista dada pela impressa a esse movimento, o ideal no future tinha a intencionalidade de mostrar as contradies sociais e mesmo que no dizendo objetivamente, super-las.

    Desde o surgimento de bandas como o Sex Pistols, The Clash, The Damned entre outras, o punk conseguia traduzir atravs de uma ao esttica a realidade de muitos

  • Imaginrio! - n 1 7CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    jovens descrentes com os novos rumos da sociedade, j no to atuante como o ureo 1968. Este movimento parecia a resposta para a nsia de expresso de uma parcela da juventude.

    Se o Sex Pistols, entre msicas de no mximo trs minutos, contestava padres com o lema Anarchy in the U.K., no subrbio de um pas de terceiro mundo apareceria algo novo e inquietante, punks do Brasil com caractersticas prprias:

    Em sua grande maioria, garotos moradores dos subrbios e periferias, de famlias de trabalhadores de baixa renda, que ouviam rock e viviam em busca de informaes, novos discos e tendncias musicais, sentiram-se atrados pelos sons, imagens, ideias e visual de rua dos grupos punks da Inglaterra. (CARMO, 2000, p.146).

    Agora traduzidos em lngua tupiniquim, a anarquia catica pregada na Europa se adequaria a um Pnico em SP, ou como completa o socilogo Carmo (2000), o punk nacional no se tratava de uma mera cpia importada, mas uma identificao adaptada realidade local.

    Se a dcada de 1970 brindou uma parcela da juventude inglesa com o punk rock, o Brasil bebeu na dcada de 1980 uma nova frmula musical, o hardcore. Essa nova vertente dentro das vias punk surgiu da necessidade de renovar o que j estava sendo gasto pela grande mdia. Surgia um subgnero com sonoridade mais rpida, agressiva e muitas vezes incompreensvel.

    O hardcore foi bero de vrias bandas por todo pas: Olho Seco, Armagedom, Ratos de

    Figura 1 - Punks em Juiz de Fora/MG - por Humberto Nicoline.

  • Imaginrio! - n 1 8CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Poro, Lobotomia, Brigada do dio, Cmbio Negro, Atack Epilptico dentre vrias outras que soaram seus rudos de revolta em cada centro urbano. Todo esse cenrio nas grandes e mdias cidades onde o movimento se adentrou tornou-se uma premissa para os discursos dos fanzines sobre o cotidiano punk.

    2. UM HISTRICO SOBRE OS FANZINES

    Surgido na j longnqua dcada de 30 do sculo XX, o termo fanzine trata-se de um neologismo formado pela contrao dos termos fanatic e magazine - revista do f para o f -, e teve sua origem com o informativo de fico cientfica The Comet, editado pelo americano Ray Palmer.

    Apesar do surgimento ainda na dcada de 1930, a denominao de fanzine segundo Magalhes (2003) foi criada na dcada posterior. Essas primeiras produes que caracterizavam uma insatisfao com os grandes meios, alavancaram uma srie de produes zineiras2.

    De sua origem pra c so mais de 80 anos desse rebulio apaixonante tal como ainda descreve Magalhes (2003), onde o gnero de fico cientfica foi o precursor, passando pelos fanzines de quadrinhos, ainda na gerao do mimegrafo, at na dcada de 1970 com a popularizao a baixo custo da fotocopiadora e o surgimento do movimento punk.

    Contestadores desde sua origem, os fanzines iniciavam uma nova poca com o surgimento do punk. A ousadia, a autogesto como forma de protesto e as novas maneiras de narrar as formas do cotidiano, tudo isso numa bricolagem desorganizada, catica, seria uma nova maneira de fazer no mais imprensa alternativa, mas independente.

    2- O termo zineiro aqui se refere cena fanzineira, tal

    como punkzines mencionado posteriormente faz referncias

    aos fanzines punk.

  • Imaginrio! - n 1 9CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    3. INSCRIO DO COTIDIANO PUNK ATRAVS DOS FANZINES

    No diga mais no a si prprio. Deixe tudo explodirInocentes

    Seguindo as pistas do mtodo sociolgico aplicado na lngua, tal qual nos diz o filsofo da linguagem Bakhtin (2009), estudaremos o ato enunciativo, afirmao de natureza social, ligada s condies comunicacionais, ou seja, s estruturas conflituosas. A partir disso, arriscaremos a interpretao do movimento punk atravs do conceito de cotidiano, ou seja, a vida dos indivduos. Ao definirmos o mesmo sobre esse conceito, analisaremos como os punkzines das dcadas de 1980 e 1990 compreendem as contradies sociais e constroem o movimento atravs de sua escrita. Para isso faremos abaixo uma breve introduo sobre os mesmos.

    A dcada de 1970 sem dvida foi um marco no s para o gnero zineiro como tambm para o movimento juvenil. Era o surgimento do punk como descrito na primeira parte, uma tica alternativa de interpretar a sociedade, e agora protagonizado segundo a sociloga Abramo (1994), como sendo uma vertente contracultural constituda em grande parte por jovens vindos da classe baixa.

    O ideal de faa voc mesmo! significou uma nova forma acionria, onde grupos considerados subversivos buscavam outras referncias de vida para a formao de uma conscincia social. Essa subverso significava um rompimento com o discurso ideolgico3 at ento dentro da msica, imprensa, bem como a prpria sociedade.

    A autogesto alavancou diversas produes dentro do movimento punk. O ato de produzir, dominar a tcnica que em grande parte encontra-se nas mos da classe dominante, carrega em si uma tica contestatria, acionria e alternativa.

    3- O conceito de ideologia aqui trabalhado significa

    um conjunto de ideias que procura ocultar a origem nos

    interesses sociais de um grupo em particular na sociedade. Para Marx & Engels (2007)

    a ideologia conceitua-se como falsa conscincia, com a finalidade de mascarar os

    ndices de contradio social. Utilizando dessa premissa

    acrescentamos que ideologia trata-se de uma compreenso

    da sociedade, incluindo a preceitos culturais dentre

    outros. Para alm do verticalmente imposto, temos

    a formao de uma anttese onde grupos questionam

    instncias ou vias do poder.

  • Imaginrio! - n 1 10CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Os punks questionam o conformismo no apenas por parecerem e soarem diferentes (o que tem importncia discutvel), mas para colocar em xeque os modos de pensar predominantes. O conformista no se questiona sobre aspectos como trabalho, raa, sexo e sobre si mesmo porque suas ideias so determinadas por aqueles que o cercam. J o no-conformista no se apoia nos outros para determinar sua prpria realidade. (OHARA, 2005, p.34).

    O mtodo acionrio do movimento punk expandiu-se e imbricou-se no gnero zineiro primeiramente com o fanzine Sniffing Glue - Cheirando Cola - editado pelo ingls Marky Perry, que em suas posteriores edies convoca muitos outros a produzirem por si mesmo.

    Essa iniciativa de autogesto influenciaria uma quantidade significativa de novas produes, inclusive no Brasil com o pioneiro Factor Zero, editado por David Strongos, da banda punk paulista Anarcolatras.

    As novas produes dos fanzines punk nacionais trouxeram um novo mtodo de contestao seguindo a trilha do anarquismo, mesmo que ainda indefinidamente: A nossa luta no para entrarmos nos padres sociais, mas para mostrar que nem tudo que bom pra eles bom pra ns. (Cf. FZ, n.02, 198_).

    Interpretando o ato enunciativo sob a ptica de Bakhtin (2009), entendemos que cada palavra [...] se apresenta como uma arena em miniatura onde se entrecruzam e lutam os valores sociais de orientao contraditria. A palavra revela-se no momento de sua expresso, como um produto da interao viva das foras sociais. (p. 67).

    Figura 2 - 1 edio do fanzine punk Factor Zero. Editado por

    David Strongos.

  • Imaginrio! - n 1 11CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Uma primeira gerao de punkzines no pas que comeara a surgir, mesmo que prematuramente, reinscrevia um movimento que j estava constitudo em pases como Inglaterra e Estados Unidos, mas no Brasil comeava a soar suas primeiras composies prprias. Esse novo meio miditico, diferente do jornalstico, produzia vias alternativas ao signo ideolgico de mercado apropriado pelas grandes instncias. Embora Bakhtin (2009) descreva esse signo como plurivalente, observa-se que a classe dominante possui interesses em torn-lo monovalente4.

    Essa produo de vias alternativas remete a um novo tipo de imprensa agora popularizada pelos punkzines, bem como a inscrio de um movimento de carter prprio que comeara a surgir. Todo esse cenrio uma pea chave para entendermos como se construram as caractersticas das produes zineira na dcada de 1980 e como houve uma melhor compreenso do ponto de vista poltico nos punkzines e no movimento, ambos imbricados, para compreenso dos discursos do cotidiano.

    Os primeiros percalos dos punkzines na dcada de 1980:

    O fanzine Factor Zero editado pelo David Strongos foi sem dvida o pioneiro para uma nova gerao zineira que surgia. Como j dito anteriormente, o Brasil vivia uma nova fase do punk, o hardcore; completando com um movimento que j estava germinado e maturava suas posies polticas em relao dcada anterior.

    O hardcore iniciou uma fase onde o punk saa da moda para comear a se constituir como movimento, e sem dvida os fanzines cumpriam um papel chave para apreendermos um pouco do que foi o movimento nesta poca:

    O aspecto mais importante est no fato de o fanzine ser uma espcie de porta-voz do movimento que afirma tratar da realidade, do dia-a-dia dos punks. Uma vez que qualquer punk pode fazer o fanzine, tem-se que aceitar a pluralidade de opinies e

    4 - O entendimento de signo ideolgico trata-se de uma segunda via (agora

    permeando a linguagem) ao conceito de ideologia como mascaramento de conflitos,

    assim visto em Marx & Engels (2007). importante

    ressaltar que a obra de Mikhail Bakhtin, Marxismo

    e filosofia da linguagem, teve sua primeira edio (1929)

    na ento URSS anos antes da edio de Marx & Engels A ideologia alem em 1933.

  • Imaginrio! - n 1 12CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    posies no interior do prprio movimento. (OLIVEIRA, 2006, p.23).

    O entendimento de porta-voz aqui trabalhado nos fanzines tem uma conceituao pblica, que pertence e se une a um determinado grupo, diferente da grande mdia publicizada, que possui a tcnica, mas no ecoa voz aos que possuem. Esse conceito essencial para entendermos como os punkzines reescrevem e conceituam o cotidiano do movimento em suas pginas.

    O conceito de cotidiano aqui trabalhado refere-se ao que a sociloga Agnes Heller (2004) define como a vida do indivduo, um envolvimento entre particular e genrico. no cotidiano que se coloca em funcionamento todos os sentidos, sentimentos, ideias e ideologia.

    Neste ponto usaremos para a anlise trs punkzines paulistas: Factor Zero (FZ), j mencionado anteriormente; 1999, editado por Clenira e outros punks; e o Espectros do Caos (EC), que na nica edio analisada no discrimina a autoria. Todos editados entre a primeira metade da dcada de 1980.

    Ao usarmos como pontap inicial uma citao do historiador e pedagogo Oliveira (2006) onde o mesmo interpreta a evoluo dos primeiros punkzines nacionais que passavam de meras descries das bandas para a reflexo crtica sobre o cotidiano, temos uma premissa para analisarmos os trs punkzines descritos acima. Nossa premissa inicial de que essa primeira gerao na dcada de 1980 se constituiu em dois cenrios ambivalentes. Primeiro, uma nova constituio de imprensa ao mesmo tempo em que se contrapunha oficial, e a outra na inscrio do cotidiano punk.

    Se a tcnica de inscrio dessa nova categoria era at ento de domnio da grande impressa, que muitas vezes pejorativamente a definia como jovens que protestavam contra tudo e todos5; os punkzines, ou como podemos definir essa nova imprensa independente,

    5 - Palavras descritas na coluna do Arthur da Tvola, no jornal O Globo do Rio de Janeiro, com a matria ttulo Os punks invadem o Brasil e a TV deve estar de olho. A mesma descrevia os ltimos

    acontecimentos sobre o punk que foram exibidos em

    programas como o Fantstico em 1982 entre outros.

  • Imaginrio! - n 1 13CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    diferente da alternativa que figurava na poca do regime civil-militar no Brasil, inscreveram e representavam o que o movimento punk ansiava.

    A noo de imprensa independente aqui trabalhada remete ao que Magalhes (2009) define atravs do carter amador, [...] livre das amarras do mercado, da imposio das grandes tiragens, da linguagem consensual para um pblico genrico. (p.107). Ou seja, podemos interpretar sempre uma imbricao entre objetividade e subjetividade para definirmos esse conceito de independente.

    Esse meio de imprensa independente norteava-se pelas poucas vivncias para criarem vias opostas ao tradicional com experincias vividas no momento, na sociedade e muitas vezes sem estrutura slida dos meios: Eu no sei como se escreve um editorial, na verdade no sei nem o que isso, mas um sujeito me disse que isso importante. Relatava o editorial da edio de nmero zero do Factor Zero.

    A contraposio ao grande monoplio da imprensa muitas vezes se dava pela insatisfao com a distoro do punk produzido pela mesma. Essa primeira gerao de punkzines nacional constitua novos meios para o movimento agora advindos do prprio movimento.

    Essa inscrio atravs da autoproduo tinha um carter de revisar tudo aquilo massificado pela grande imprensa sobre o movimento: Ns, os punks, no somos adeptos da violncia, ao contrrio, nosso visual e msica agressiva so justamente um protesto contra a violncia camuflada de que somos vtimas dia aps dia. (Cf. EC, n.01, 1984).

    Os punkzines alm de traduzirem o cotidiano do movimento, nessa poca serviram

    Figura 3 - 5 edio do fanzine 1999. Matria sobre a banda punk Inocentes. Editado por Clenira e

    outros punks.

  • Imaginrio! - n 1 14CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    principalmente como organizadores coletivos; cumprindo assim o papel conceitual de fanzine e que nesse momento exercia uma tarefa fundamental em um movimento que estava se articulando: a vivncia de fs/ativistas.

    Apesar de no se discutir muito as bases polticas do movimento punk, se fechando muitas vezes ao recorte sobre bandas do gnero, ainda assim restavam espaos para conscientizao: Outra coisa a ser dita aqui que j se v pessoas confundindo Anarquia com violncia, isto to ridculo quanto as mesmas pessoas que fazem esta confuso, confundem punk com rock. (Cf. FZ, n.02, 198_).

    Outros se dedicavam a entender essa nova vertente que estava nas entranhas do punk, o hardcore. Procurando conceituar, discutir e negar que essa vertente tinha vindo para ofuscar o punk rock. O meio utilizado para entender esse novo gnero eram as experincias cotidianas, numa discusso que at hoje se encontra em voga no movimento, onde muitos ainda tentam fracionar radicalmente o punk. (Cf. 1999, n.05, 1983).

    Observa-se que mesmo com alguns entraves, essa primeira gerao da dcada de 1980 cumpriu um papel fundamental como anteriormente dito. Aliceraram uma base slida para o que viria a ser construdo posteriormente, discutindo algumas premissas sobre o punk que serviram de uma crtica mais slida. importante enxergar que as geraes no se excluem, e sim h momentos que se estranham como outros que se completam, tornando-se assim essenciais para a constituio das mesmas.

    1990 e o anarco-punk: evoluo da revoluo:

    Surgido entre as dcadas de 1970 e 1980 na Europa, com as bandas precursoras do gnero, Crass e Conflict, o movimento anarco-punk s se difundiu no Brasil entre a segunda metade da dcada de 1980 e o comeo da dcada de 1990.

  • Imaginrio! - n 1 15CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Para um entendimento inicial sobre o anarco-punk usaremos um conceito do socilogo Oliveira (2008) ao definir como uma vertente do punk que possui prticas de contra-cultura radicalmente anticapitalistas e anti-Estado, que apresenta uma aparncia (expresso) fragmentria e constitui-se de (um ncleo) contedos anarquistas. (p.79-80).

    Completando essa definio, necessrio entendermos a contracultura punk como uma categoria juvenil que se autorrenova. Desde os primrdios na dcada de 1970 temos uma evoluo do punk passando pelas vias do hardcore, anarco-punk, noisecore, crustcore, street-punk/oi! entre outros subgneros.

    Quando citamos essas vertentes que nasceram no bero punk, necessrio entendermos essa evoluo no em um tempo linear, mas como uma raiz que por mais que se tente apreender, no possvel se definir um comeo ou um fim. Estamos tratando de um movimento que se reconstri, se adapta ao mesmo tempo em que entra em conflito com cada realidade de uma regio ou pas.

    Da mesma forma, temos essa constante evoluo da revoluo nos punkzines, onde a esttica bricolada e uma narrativa catica so apenas algumas pistas para compreendermos um pouco desse gnero nos fanzines.

    Para esse tpico usaremos como anlise trs fanzines que por mais que no resumam as caractersticas de toda a dcada, conseguem apreender algumas noes do que foi essa gerao, so eles: Agonia Revoltante (AR), editado por Renato Curse; Gesto de Revolta (GR), editado por Feio e Andr e por fim o Protesto Katiko (PK), editado por Jlio Porra.

    Figura 4 - 3 edio do fanzine Protesto Katico. Editado por

    Jlio Porra.

  • Imaginrio! - n 1 16CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Diferente da gerao anterior, essa gerao trazia uma maturao de cunho poltico, localizando cada vez mais o movimento punk dentro do anarquismo6. Interpretaremos esse novo vis atravs do anarquismo proposto pelo gegrafo russo Piotr Kropotkin (1842-1921).

    Kropotkin (2007) norteava o princpio bsico do anarquismo na negao do egosmo absurdo e da opresso, bem como da moral imposta. Conceituao essa que j se fazia presente nos fanzines anarco-punks dessa poca, onde se comeavam uma autocrtica das aes no movimento.

    O punk se constitua agora no mais como uma baguna ou uma nova frmula de fazer msica, mas [...] um movimento cultural de luta e ao direta, de liberdade de expresso e de comportamento. (Cf. AR, n.19, 1995). Ou seja, estamos tratando de um movimento que rompe alm das barreiras musicais que j havia fincado e assim constitua-se como uma minoria que defendia tambm outras minorias: [...] oprimidos grupos como: homossexuais, por achar que todos tm direito de opo sexual sem ser discriminado, grupos de negros, feministas e outros grupos de atividades alternativas e libertrias. (idem).

    Constituam-se novas caractersticas que, segundo OHara (2005), negavam cada vez mais aes restritivas a exemplo do sexismo, onde os punkzines cumpriram um papel essencial criticando e convocando boicotes para grupos, fanzines ou atitudes consideradas repressoras dentro do movimento.

    Mesmo o anarco-punk tendo suas caractersticas prprias em cada regio ou pas, estamos tratando agora de uma vertente que seguia a premissa internacionalista do anarquismo, ou seja, onde as partes se constituam num todo indivisvel.

    Alm da negao a atitudes opressivas e o apoio a grupos minoritrios na sociedade, os punkzines inscreviam novas formas sociais onde questes objetivas como o monoplio

    6 - importante destacar que mesmo o anarco-punk se constituindo como uma grande parcela do punk na

    dcada de 1990, ele ainda se constitua como uma parte de

    um todo bem mais amplo.

  • Imaginrio! - n 1 17CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    do capital internacional, guerras por interesses espoliadores eram contestados (Cf. GR, n.03, 1996).

    H quase que constantemente a necessidade de retorno s razes do punk para a autocrtica. Esse retorno s antigas formas serve como uma base que sustenta a crtica sempre permanente em um movimento que se constri de maneira dialtica, sem se fechar numa sntese:

    O movimento punk surgiu por volta de 1976 na Inglaterra, com alto teor de rebeldia na forma musical e de vestimentas, causando espanto na sociedade. [...] O punk tenta mostrar em sua maneira de se vestir o conformismo, a pobreza e a misria do povo, e a revolta desta minoria perante a sociedade. [...] o maior inimigo do punk o governo. Moda sinnimo de alienao. (Cf. GR, n.03, 1996).

    Essa forma do movimento enunciar socialmente modelava outros significados na ideologia do cotidiano punk. Bakhtin (2009) define as bases para o que podemos definir como ideologia do cotidiano, onde se produz e se estabelece os sentidos, os signos dentro de uma arena conflituosa. Ao entendermos esse conceito vemos como o signo punk era compreendido na sua produo, no se tratava apenas de uma negao pura, tal como era visto na primeira gerao dos punkzines, mas o combate s opresses sociais que tambm residiam ideologicamente no movimento.

    Esse novo signo atravs do anarco-punk reinscrevia um movimento no mais ligado a uma rebeldia sem causa. No vamos sustentar nenhum governo que venha nos alugar. No precisamos ser governados, e nem tampouco submetidos uma ordem hierrquica.

    Figura 5 - 19 edio do fanzine Agonia Revoltante, editado

    por Renato Curse. Matria intitulada Rede Globo: 30 anos de

    lavagem cerebral.

  • Imaginrio! - n 1 18CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    [...] Sem lderes. (Cf. PK, n.03, 199_). Essa embate anti-hierrquico inclua crticas s burocracias capitalista e stalinista sovitica.

    Alm dessas caractersticas apreendidas nos punkzines da dcada de 1990 temos a convocao para a militncia punk/anarquista. Entendendo essa militncia, nos apropriaremos ao que descrito por Kropotkin (2007): sem a luta de todos os dias, para que chamar-se revolucionrio? A ideia e a ao so inseparveis, se a ideia tem ascendncia sobre o indivduo; e, sem ao, a prpria ideia atrofia-se. (p.35).

    Compreende-se que um movimento de caractersticas urbanas se constitua em sua urbanidade, entendendo aqui urbanidade como a ao, ou seja, a militncia punk em seu ambiente, as ruas.

    Sobre a conceituao em geraes:

    Ao separarmos aqui os punkzines nacionais em geraes dividindo entre as dcadas de 1980 e 1990, entendemos no como fase histrico-linear. Apesar de fecharmos em duas dcadas compreendemos que essas duas geraes esto em constante enraizamento, estranhamento e evolues.

    A diviso em geraes surge da necessidade de entendermos as particularidades que cada poca interpreta as formas sociais j abordadas. Alm de como cada uma se articula dentro do movimento e se representa nele.

    importante evocarmos novamente a colocao que Oliveira (2006) nos diz ao definir as diferenas dos punkzines em sua fase inicial, 1982, que tratavam principalmente das bandas, para posteriormente [..,] 1984 os fanzines refletiam mais sobre o cotidiano no s dos punks, mas tambm do pas. (p.40).

  • Imaginrio! - n 1 19CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Ou seja, por mais que tentemos apreender, repartir em pocas, o gnero fanzine (e no caso especfico os punkzines) deixa muitos pontos ainda para se compreender. Onde aspectos como o prprio ato de autogesto e o grande intercmbio na troca de conhecimentos dentre outros so valorizados nessa imprensa zineira.

    4. CONSIDERAES SOBRE O COTIDIANO PUNK

    Voc nasceu para mandar, eu nasci pra desobedecerClera

    Se a cada poca histrica a juventude tinha suas caractersticas prprias, a juventude punk constituda como movimento teve o lazer como uma das prticas estticas de agir socialmente. E atravs de meios como o lazer que o punk se manifestou:

    O lazer, para os jovens, aparece como um espao especialmente importante para o desenvolvimento de relaes de sociabilidade, das buscas e experincias atravs das quais procuram estruturar suas novas referncias e identidades individuais e coletivas [...] O lazer se constitui tambm como um campo onde o jovem pode expressar suas aspiraes e desejos e projetar um outro modo de vida. (Abramo, 2004, p.61-62).

    Temos a concepo do cotidiano em que o ser muitas vezes no se reconhece na alteridade, e onde praticamente no h formas para expresso do que Heller (2004) entende como o particular e o genrico. Porm a autora ainda lembra que embora a vida cotidiana seja um terreno propcio de alienao, a priori [...] no de nenhum modo necessariamente alienada. (p.38).

    O lazer e suas diversas formas inerentes o que poderamos chamar de espaos de

  • Imaginrio! - n 1 20CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    reconhecimento e funcionamento do movimento punk para agir na vida cotidiana. atravs da cotidianidade que o indivduo/grupo constitui sua identidade social.

    Essa cotidianidade exige a militncia no movimento atravs da ao social para o entendimento das contradies vividas, onde muitas vezes o ser no se enxerga enquanto acionrio, mas como uma extenso do capital, constituindo-se apenas no individualismo. O individualismo aqui tratado no se refere ao que Heller (2004) entende como individualidade, ou seja, a forma particular de se reconhecer entre o genrico. Entendemos ento o cotidiano como um espao de expresso, de ao entre as contradies sociais.

    Para entendermos sobre como a identidade punk constituda apropriaremos o que a autora usa como particular e genrico:

    Todo conhecimento do mundo e toda pergunta acerca do mundo motivados diretamente por esse eu nico, por suas necessidades e paixes, uma questo da particularidade individual. Por que vivo?, Que devo esperar do todo?, so perguntas desse tipo. [...] Tambm o genrico est contido em todo o homem e, mais precisamente, em toda atividade que tenha carter genrico. (Heller, 2004, p.20-21).

    atravs de questionamentos como os descritos pela autora que o ser se reconhece e compreende seu papel social. Ao tratarmos de um movimento crtico das formas sociais, temos o entendimento de que o punk tenta, mesmo que muitas vezes imaturamente, compreender essa forma individual/genrica.

    Figura 6 - Punks nas ruas. Gerao No Future.

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    O termo imaturo no caso no tem um significado pejorativo, refere-se a uma compreenso do vivido para o entendimento da vida cotidiana. Esse vivido dos jovens com faixa entre 13 a 20 anos, ou seja, um perodo em que demarca a construo do indivduo acionrio, com pouca experincia, surpreende de como os mesmos encaram e agem em meio s contradies sociais.

    Contradies essas que muitas vezes relegam o punk a um signo estranho, ou a outras formas pejorativas de tratar o movimento. Constitui-se ento o estranho que no se reconhece frente ao absurdo, ou seja, o que eles interpretam como caos urbano; e o absurdo, que no reconhece aquele estranho na sociedade.

    Podemos utilizar o que Heller (2004) diz como o carter representativo, provocador, para entendermos como esse movimento contracultural tenta modificar essa ordenao da sociedade. Lembra ainda a autora que [...] a conduo da vida no pode se converter em possibilidade social universal a no ser quando for abolida a superao a alienao. (p.41).

    A partir do pensamento da autora compreendemos que mesmo um grupo especfico, ou seja, constituindo apenas uma pequena parcela da sociedade e no um movimento popular, germina sua interpretao, compreenso e questionamento no cotidiano ideolgico. Esse questionamento o que nos leva a compreender como o punk inscreve-se na alteridade.

    atravs da negao enquanto prtica, principio em que se alicerou o discurso punk, que compreendemos o agir socialmente de um movimento moldado em contradies ideolgicas, posies polticas, msica, imprensa, arte; contracultura enquanto emancipao do ser social.

  • Imaginrio! - n 1 22CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    REFERNCIAS

    ABRAMO, Helena Weldel. Cenas juvenis: punks e darks no espetculo urbano. So Paulo: Editora Pgina Aberta, 2004.BAKHTIN, Mikhail (V.N. Volochnov). Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do mtodo sociolgico na cincia da linguagem. So Paulo: Hucitec Editora, 2009.CARMO, Paulo Srgio. Culturas da rebeldia: a juventude em questo. So Paulo: Senac, 2000.HELLER, Agnes. O cotidiano e a histria. 7.ed. - So Paulo: Ed. Paz e Terra, 2004.KROPOTKIN, Piotr A. O princpio anarquista e outros ensaios. So Paulo: Editora Hedra, 2007.MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. A ideologia alem: crtica da mais recente filosofia alem em seus representantes Feuerbach, B. Bauer e Stirner, e o socialismo alemo em seus diferentes profetas (1845-1846). So Paulo: Boitempo, 2007.MAGALHES, Henrique. Fanzine: comunicao popular e resistncia cultural. In Visualidades: Revista do Programa de Mestrado em Cultura Visual | Faculdade de Artes Visuais. - V. 7, n.1 (2009). Goinia-GO: UFG / FAV, 2009.MAGALHES, Henrique. O rebulio apaixonante dos fanzines. Joo Pessoa: Editora Marca de Fantasia, 2003.OHARA, Craig. A filosofia punk: mais que barulho. 1.ed. - So Paulo: Radical Livros, 2005.OLIVEIRA, Antnio Carlos de. Os fanzines contam uma histria sobre punks. So Paulo: Editora Achiam, 2006.OLIVEIRA, Vanti Clnio Carvalho de. O movimento anarco-punk: a identidade e a autonomia nas produes e nas vivncias de uma tribo urbana juvenil. Natal: Edio prpria, 2008.

  • Imaginrio! - n 1 23CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Fanzines

    1999. Nmero 05, 1983.Agonia Revoltante. Nmero 19, 1995.Espectros do Caos. Nmero 01, 1984.Factor Zero. Nmero 00, 1981.Factor Zero. Nmero 02, 198_.Gesto de Revolta. Nmero 03, 1996.Protesto Katico. Nmero 03, 199_.

  • Imaginrio! - n 1 24CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    PROJETO MAMUTE: UM ESTUDO DE CASO

    DE ENSINO DE HISTRIA EM QUADRINHOS COMO AO

    VOLUNTRIA EM ESCOLA PBLICA

    Autor: Alberto Ricardo Pessoa1

    Resumo: O objetivo deste artigo apresentar um estudo crtico de um estudo de caso de uma proposta de ensino voluntria em uma escola pblica de 1 e 2 graus, abrangendo desde concepo da proposta, implementao, dificuldades e resultados obtidos.

    Desenvolvendo os resultados apresentados na dissertao de mestrado intitulada Quadrinhos na educao: Uma proposta didtica na educao bsica, consideramos que o estudo de caso necessita de uma reviso crtica e apontamentos pedaggicos de pesquisadores como Waldomiro Vergueiro, Paulo Ramos e Will Eisner. Dentro dessa linha de pensamento, este artigo se prope a estabelecer conceitos tcnicos e tericos que propiciem a conjectura de um curso voluntrio na educao bsica.

    Palavras-chave: Educao. Histria em Quadrinhos. Interdisciplinaridade.

    1- Formao inicial em Educao Artstica (Faculdade de Artes Alcntara Machado),

    Mestrado em Artes Visuais (Universidade Estadual

    Paulista Jlio de Mesquita UNESP SP) e Doutorado em

    Letras (Anlise de Discurso na Universidade Presbiteriana

    Mackenzie). Atualmente, atuando na docncia de cursos de graduao em Comunicao em Mdias Digitais na Universidade

    Federal da Paraba Contato: professoralbertopessoa@

    hotmail.com

    mailto:professoralbertopessoa%40hotmail.com?subject=mailto:professoralbertopessoa%40hotmail.com?subject=

  • Imaginrio! - n 1 25CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    1. HISTRIAS EM QUADRINHOS: DEFINIES

    As histrias em quadrinhos so uma linguagem difcil de ser definida por possuir diversos elementos que se imbricam formando uma mdia de sintaxe e gneros complexos. Diversos pesquisadores procuram um conceito preciso para as histrias em quadrinhos, o que, naturalmente, resulta em opinies convergentes e divergentes.

    Will Eisner concebe as histrias em quadrinhos como arte sequencial, e distingue a narrativa grfica dos quadrinhos. Para Eisner (2005, p. 10), a narrativa grfica uma descrio genrica para qualquer narrao que use imagens para transmitir idias enquanto que quadrinhos estruturam-se conforme disposio impressa de arte e bales em sequncia, particularmente como acontece nas revistas em quadrinhos.

    Scott McCloud (1995 p. 9) entende que a conceituao de Will Eisner ampla demais para especificar essa linguagem e complementa afirmando que as histrias em quadrinhos so imagens pictricas e justapostas em sequncia deliberada, destinadas a transmitir informaes e/ou a produzir uma resposta no espectador.

    Por fim, Vergueiro (2004, p. 31) afirma que as histrias em quadrinhos constituem um sistema narrativo composto por dois cdigos que atuam em constante interao; o visual e o verbal. Cada um desses ocupa, dentro dos quadrinhos, um papel especial, reforando um ao outro e garantindo que a mensagem seja entendida em plenitude.

    No nosso entendimento, histria em quadrinhos uma mdia que se constitui da convergncia da linguagem verbal com a visual no balo cone que distribui o texto e a imagem em uma sequncia e estabelece discursos que se somam. O discurso verbal acrescenta informaes ao discurso visual e vice-versa, e juntos constroem uma sequncia narrativa capaz de prover, ao receptor, subsdios necessrios para compreenso da histria

  • Imaginrio! - n 1 26CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    que se plasma nos quadrinhos.

    A maioria dessas nomenclaturas e definies utilizadas exigem do docente que quer trabalhar com histrias em quadrinhos ampliar o seu repertrio de leituras sobre gneros, estilos, histrias, culturas a serem exploradas em sala de aula.

    2. UM ESTUDO DE CASO: PROJETO MAMUTE CURSO DE DESENHO E HISTRIAS EM QUADRINHOS

    O Projeto Mamute, criado oficialmente em 07 de Agosto 2003 na escola estadual Ibrahim Nobre, em So Paulo, nasceu com o intuito de oferecer a comunidade daquela escola princpios bsica na produo de histrias em quadrinhos.

    Os resultados concretos do projeto puderam ser vistos atravs da divulgao em sites especializados em quadrinhos como o Universo HQ, Ligazine, em exposies como o HQ Festival, Arte pela Paz e Traos Criativos e do Recanto da Arte.

    O Projeto Mamute prioriza a produo e a reflexo acerca de histrias em quadrinhos, promovendo a troca de experincias entre os alunos e profissionais da rea de quadrinhos, ilustrao e design, objetivando a descoberta de talentos e orientao de projetos, para que o aluno consiga se expressar com essa linguagem.

    A proposta foi sendo aperfeioada e hoje ela atua em trs frentes pedaggicas: A primeira e mais importante o ensino virtual, com postagens de aulas virtuais no espao www.professoralbertopessoa.blogspot.com. Essa estratgia faz com que qualquer pessoa interessada em aprender elementos pertinentes na construo de histria em quadrinhos aprenda no seu tempo e com possibilidades de contatos com o docente atravs das redes

  • Imaginrio! - n 1 27CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    sociais ou pelo e-mail.

    Outra estratgia so reunies com desenhistas e entusiastas em eventos como desenhos coletivos. So encontros descontrados dos quais os desenhistas desenham em folhas coletivas com tcnicas diversas e com isso h trocas de informaes e de aprendizado.

    Por fim, as aulas presenciais so ministradas atualmente na Universidade Federal da Paraba, ainda em ambiente voluntrio, do qual qualquer pessoa pode freqentar. Atualmente estamos no segundo semestre de curso, sempre com turmas pequenas, entre seis dez alunos.

    Abaixo segue algumas sugestes de elementos que podem ser considerados para o docente que pretende ensinar histrias em quadrinhos como estratgia complementar de ensino.

    3. ELEMENTOS DE APRENDIZAGEM COM AS HISTRIAS EM QUADRINHOS

    Na produo das histrias em quadrinhos, o autor , muitas vezes, o escritor, desenhista, arte finalista e colorista. Em sala de aula, este trabalho pode ser individual ou em grupo.

    Para completa compreenso das histrias em quadrinhos necessrio entender o suporte de publicao desse gnero, ou seja, o projeto editorial a que a histria se destina, se para ambiente impresso ou para a web. Ao docente, cabe observar os elementos tcnicos das histrias em quadrinhos e considerar a importncia educacional em sua disciplina ou em atividades interdisciplinares.

    A tirinha a estrutura bsica de uma histria em quadrinhos. O quadrinho, em sua menor clula, a tira, condensa uma srie de elementos da cena narrativa, que por mesclarem

  • Imaginrio! - n 1 28CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    diferentes signos, possuem um alto grau informativo, constituindo um instante especfico ou uma sequncia interligada de instantes, que so essenciais para compreenso de uma determinada ao ou acontecimento.

    No caso das histrias em quadrinhos a linguagem pode adquirir a gradao de uma tira cmica a uma histria seriada sem fim, com aprofundamento da mensagem e seus respectivos mecanismos de representao verbal e visual.

    O docente pode examinar com os alunos os elementos verbais e no verbais de uma tirinha e demonstrar como a construo de sentido possvel com a interseco das duas linguagens.

    Quando separamos os elementos integrantes dos quadrinhos, temos uma interpretao diferente daquela em que a leitura feita na conjuno dos elementos verbais e no verbais.

    Para ilustrar este nosso pensamento, apresentamos uma tira de histrias em quadrinhos produzida para o artigo. Ela ser fragmentada em texto verbal e no verbal.

    Nen, no aguento mais essa histria de perder as coisas! Relgios, blusas, dinheiro... S no perde a cabea porque t colada no corpo!

    No bem assim, mame!

    Vide figura abaixo.

  • Imaginrio! - n 1 29CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Fig. 1: Histria em quadrinho sem texto verbal

    Fonte: Arquivo pessoal do autor (2010).

    A linguagem no verbal apresenta para seu receptor uma situao ainda menos clara. Inicialmente aparece uma mulher com expresso corporal e facial de insatisfao. A cena se repete e na ltima seqncia ela se depara com uma cabea no cho.

    Mesmo em histrias que no possuem texto verbal, ser no uso de onomatopias e signos reconhecveis pelo leitor que o quadrinho no verbal ir ser compreendido.

    Por fim, a leitura da histria em quadrinhos, na sua completude:

  • Imaginrio! - n 1 30CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Fig. 2: Histria em quadrinho completa.

    Fonte: Arquivo pessoal do autor (2010).

    Com a juno dos textos, mesmo com o grotesco da cena em que a mame encontra a cabea do filho, explcito que o autor quis fazer uma aluso s reclamaes que mame estava realizando, principalmente frase s no perde a cabea porque t colada no corpo! Nesse quadrinho absurdo plausvel a figura de uma cabea viva, falante e que se relacione normalmente com a personagem.

    Apenas em uma tira possvel explorar um amplo espectro de anlise das personagens, desenhos, cores, intenes e compreenso de texto verbal e no-verbal. O aluno que se depara com esta mdia aprende e reflete, dependendo de como o professor trabalhe em sala de aula.

    interessante que o docente desenvolva a capacidade do aluno de leitura e de interpretao de textos. Nestas atividades, o discente pode desde ler a histria completa, como se concentrar em um nico quadro com imagens e texto e a partir dali criar sua prpria histria.

  • Imaginrio! - n 1 31CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Fig. 3: Bryan Hitchs Ultimate Comics Studio

    Fonte: HITCH (2010, p. 111)

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    Fig. 4: Capito Amrica: Renascimento

    Fonte: HITCH (2010, p. 08 - 09)

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    Fig. 5: Superboy, the boy of steel Fonte: JOHNS e MANAPUL

    (2010)

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    Uma aula de redao que utilize a prtica de histrias em quadrinhos ir oferecer processos de organizao e criao de histrias que nem sempre a redao convencional proporciona.

    Story line usado pelos roteiristas quando a escrita de uma histria em quadrinho ou a criao de uma personagem est em seu estgio embrionrio. Essa tcnica consiste em escrever de maneira sucinta a trama bsica que o roteirista vai desenvolver com o artista.

    O story line contm: o cenrio ou introduo, o problema, a ao que mostra como a personagem lida com o problema, a soluo e o desfecho.

    O roteiro d ao artista uma viso exata do que o escritor deseja e cabe a ambos suprir as deficincias que tanto a linguagem verbal como a visual possuem quando transportados para as histrias em quadrinhos, como imagens estticas, desprovidas de som ou movimento.

    A interseco destes elementos se d por conta do balo de texto. Como j mencionamos, antes do balo, as histrias em quadrinhos eram todas legendadas, diminuindo a fora do dilogo direto entre personagens e transformando a histria em quadrinhos em uma histria ilustrada, ou seja, com imagens e textos que recebiam uma leitura diversa desta em que essas linguagens se oferecem para serem lidas em conjuno.

    Com a dinmica e gnero escolhido para produzir as histrias em quadrinhos, o aluno define os tipos de discursos que sero inseridos na histria.

    Os discursos so considerados uma forma de narrar uma histria, e dentro das histrias em quadrinhos temos diversas formas de narrao.

    Narrao subjetiva Toda a histria ser narrada em primeira pessoa, geralmente por uma personagem protagonista. Essa narrativa simula acontecer em tempo real com as aes

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    ilustradas nas pginas ou no passado.

    Narrao onisciente A histria ser contada em terceira pessoa e o narrador tem conscincia de todos os elementos da histria. Ele sabe exatamente o que as personagens pensam, o que vai fazer e como vai terminar a histria.

    Narrao complementar Neste caso a narrao fragmentada por diversos tipos de discursos, geralmente interpretadas pelas personagens da histria. um tipo de histria mais complexa de ser produzida, pois requer do escritor senso de organizao, interpretao das expresses que cada personagem ir usar e busca pela unidade da histria, que ser difcil de obter, uma vez que uma histria retalhada, formada por diversos discursos.

    Na verdade, podemos considerar o quadrinho como um palco onde devemos dispor os objetos e personagens em harmonia para atender as necessidades do leitor para compreender a histria (ex: local, tempo, personagens centrais e secundrios e etc.).

    Para o aluno que deseja ser um autor de histrias em quadrinhos essa percepo crtica fundamental, pois alm de saber escrever, desenhar e estabelecer as tonalidades de cores adequadas, fazer a interseco entre a imagem e a palavra com o uso do balo de texto, o autor precisa envolver o leitor na atmosfera criada para a histria, e isto s se consegue ao criar uma narrativa que desperte o prazer da leitura.

    Ambrose e Harris (2009, p.110) consideram que as imagens podem ser manipuladas para alterar sua aparncia, enfatizar ou obscurecer certos aspectos ou isol-las completamente para uso em um design.

    Douglas Keller (apud Carlos e Silva 2009, p. 15), considera que ler imagem criticamente implica aprender como apreciar, decodificar e interpretar imagens, analisando tanto a

  • Imaginrio! - n 1 36CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    forma como elas so construdas e operam em nossas vidas, quanto o contedo que elas comunicam em situaes concretas.

    A compreenso da imagem nas histrias em quadrinhos requer uma interao entre o artista da arte sequencial e o leitor, pois a histria retrata situaes concretas, mesmo quando se trata de temas de fico ou fantasia. Cenrios, animais, tecnologia, expresses faciais so elementos essenciais que precisam estar em sintonia entre o criador e o receptor.

    A motivao da personagem outro fator que o autor precisa se preocupar na sua construo. Para tanto, o autor pode pesquisar biografias de personalidades famosas, ou basear-se em experincias vividas por parentes, amigos ou nos prprios acontecimentos ocorridos em sua vida.

    O contexto importante para a construo da personagem. Nele se inscrevem a cultura, perodo histrico, classe social, profisso, hobby, crenas, grau de instruo, entre outras coisas, que iro moldar os valores, aspiraes e emoes da personagem.

    A construo da personagem envolve tanto a criao de sua forma de se expressar e sua compleio fsica quanto sua motivao, seu comportamento psicolgico.

    A personagem Capito Amrica, de Stan Lee e Bill Everett, foi criada como um garoto franzino chamado Steve Rogers que, ao fazer parte de um experimento chamado Soro Super Soldado, adquiriu um corpo perfeito e, aps treinamento com os melhores professores de diversas artes da guerra, foi enviado Alemanha para integrar ao exrcito aliado na Segunda Guerra Mundial sob o codinome Capito Amrica. Suas reaes so calcadas em seus valores patriticos e no conceito de justia, entendido sob a tica ocidental e defendendo os interesses de sua ptria.

    Ziraldo, ao criar sua verso de Capito Amrica na srie Zeris, explorou outra face do

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    Capito Amrica, a do heri que luta contra bandidos, no necessariamente antipatriticos, ou sequer vindos de alguma guerra. Ao final do dia, o heri est to cansado que, mesmo prximo de uma bela mulher, ele cai de sono; afinal, no fcil combater o crime, e o Capito, dentro do contexto ziraldiano, reage como um trabalhador que teve uma jornada exaustiva de trabalho. uma personagem que condiz com o pensamento latino, com uma postura irnica, retirando o mtico da personagem criada por Lee e Everett.

    A personagem coadjuvante deve ser criada com este cuidado at para o autor ter mais liberdade de criao dos enredos em que ela atua. Protagonistas como Superman ou o Menino Maluquinho possuem caractersticas slidas, tanto em personalidade quanto em esteretipo. A personagem coadjuvante tambm rica por ser flexvel no acrscimo de detalhes; ela pode representar a inverso dos valores do heri.

    A cor um elemento essencial leitura no verbal por ser um meio de distino da personagem, do evento ou linha temporal na qual a histria se passa.

    A cor transmite ao leitor as emoes. O autor precisa considerar o contraste, claridade e leitura de suas cores para que sua mensagem chegue de maneira ntegra ao leitor. Se uma personagem est nervosa, a cor vermelha fica acentuada. Caso a personagem esteja plida, tons claros iro representar essa situao. A personalidade pode ser representada pelos tons das roupas.

    Ao estudar a cor, o docente pode propor um exerccio em que o aluno faa uma adaptao de determinada passagem literria para os quadrinhos.

    As histrias em quadrinhos podem ser trabalhadas como uma atividade ldica em que a ausncia da cor tenha significados importantes.

  • Imaginrio! - n 1 38CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Figura 6: Calvin e HaroldoFonte: Waterson (1996, p. 9)

    O docente que deseja trabalhar com histrias em quadrinhos deve pesquisar o impacto da cor nas pginas e nas personagens. Entender alguns conceitos da cor vai ajudar a explicar para o aluno o que determinada histria em quadrinhos quer passar e se a colorizao ajudou ou no na construo de sentido da histria.

    Para Timothy Samara (2010, p.83), h poucos estmulos visuais to potentes quanto as cores; elas so uma ferramenta de comunicao extremamente til.

    No entanto, o significado transmitido pelas cores, por resultar da reflexo de ondas de luz transmitidas pelos olhos para um rgo interpretador o crebro , tambm profundamente subjetivo.

    O mecanismo de percepo das cores universal entre os seres humanos. O que fazemos com as cores logo que vemos, porm, outra histria, e control-las visando comunicao depende do entendimento de como suas qualidades pticas se comportam.

    As cores estimulam no ser humano diversas sensaes que podem definir determinadas aes quando em face de um objeto, animal, comida, paisagem, etc.

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    Um dos elementos primordiais para compreenso do texto verbal nas histrias em quadrinhos o uso adequado da tipografia. Cabe tipografia dar forma ao contedo, sendo importante na transmisso de uma mensagem, pois se trata de mensagens especficas de personagens para o leitor.

    2 - Para maiores estudos na rea da tipografia, ver ROCHA

    (2005).

    Fig. 7Fonte: Acervo do autor (2010)

    Por exemplo, se a personagem possuir uma origem nrdica, como Thor, uma personagem mitolgica, a tipografia ser baseada em caracteres representativos dela. Lidar com tipos a mesma coisa que controlar a voz de algum: o autor deve utilizar a tipografia como na qualidade de uma voz. O design tipogrfico visvel e porque no, um meio de udio do leitor. Neste caso, o balo sofre alteraes no seu design, tornando um elemento que refora a fora do texto e a personalidade do protagonista.

    A tipografia no usada apenas como uma forma de tratar visualmente o texto verbal. Ela tambm pode adquirir elementos no verbais e ter seu significado assimilado por todos os

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    filtros de percepo visual, emocional, intelectual.

    A tipografia se torna essencial como meio de mensagem em qualquer histria em quadrinhos.

    A perspectiva age como orientador para o leitor entender o estado emocional que o quadrinho quer passar. A perspectiva aliada ao design tambm acentua diferenas dos quadrinhos nos diferentes pases onde so produzidos.

    A perspectiva nos quadrinhos essencial tambm como um veculo educacional, pois a criana comea desenhando figuras bidimensionais, ou seja, chapadas e sem noo de

    Fig. 8Fonte: Acervo do autor (2010)

  • Imaginrio! - n 1 41CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    profundidade.

    Por fim, no estudo das histrias em quadrinhos, interessante que se insira tambm o tpico de publicao, para que o aluno compreenda como uma histria pode ser publicada e a importncia disso. As histrias em quadrinhos so uma linguagem, um meio de comunicao.

    O aluno como editor precisa ter em mente que a mensagem precisa ser clara e de simples assimilao. Para tanto essencial que o design da publicao seja sbrio e contenha elementos inovadores na concepo da sua forma.

    O docente entra como um orientador deste processo, mostrando o quanto o planejamento

    Fig. 9Fonte: Acervo do autor (2010)

  • Imaginrio! - n 1 42CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    fundamental para que nenhuma mensagem seja mal interpretada e tendo muito cuidado para no dispor elementos de forma aleatria e comprometer a comunicao.

    Por fim, no estudo das histrias em quadrinhos, interessante que se insira tambm o tpico de publicao, para que o aluno compreenda como uma histria pode ser publicada e a importncia disso. As histrias em quadrinhos so uma linguagem, um meio de comunicao.

    O aluno como editor precisa ter em mente que a mensagem precisa ser clara e de simples

    Fig. 10: Duas sequncias contando a mesma histria sob perspectivas de cenas diferentes Fonte: Eisner (2001, p. 98, 99)

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    assimilao. Para tanto essencial que o design da publicao seja sbrio e contenha elementos inovadores na concepo da sua forma.

    O docente entra como um orientador deste processo, mostrando o quanto o planejamento fundamental para que nenhuma mensagem seja mal interpretada e tendo muito cuidado para no dispor elementos de forma aleatria e comprometer a comunicao.

    Desta maneira, o docente acaba por promover uma atividade que extrapola os limites da escola e influencia o modo de expresso e criao daquele aluno.

    4. CONSIDERAES FINAIS

    A definio das histrias em quadrinhos uma tarefa bastante complexa, pois os estudiosos do assunto apresentam entendimentos variados acerca da natureza dessa linguagem plurimedial.

    Deste estudo, conclumos que o docente pode ministrar aulas de leitura e de criao de tiras em quadrinhos como recorte de estratgia de aula, mas se ele optar por orientar projetos em histrias em quadrinhos, precisa conhecer as peculiaridades e diferenas entre tiras em quadrinhos e os comics, por exemplo.

    Com esta iniciativa, o aluno passa a ter um repertrio amplo de gneros das histrias em quadrinhos e o professor poder orientar projetos com maior liberdade de criao.

    O docente pode criar atividades interdisciplinares com histrias em quadrinhos que privilegiem o espao multimdia da escola. As histrias em quadrinhos esto se adaptando s novas mdias graas a autores que esto optando por suportes diversos do impresso. Essa

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    adaptao vai ao encontro das necessidades dos alunos de serem pessoas aptas a lidar com linguagens diversas e suas respectivas tecnologias.

    necessrio que o docente agregue ao aluno novas prticas de leitura escrita criao de imagens e oralidade, sem perder de vista a atualizao tecnolgica que o aluno precisa conhecer.

    Este ciclo de conhecimento cria autonomia nos usos de linguagens em sala de aula e o papel do professor passa a ser o de orientador de projetos. Para isso, necessrio oferecer ao professor conhecimentos tcnicos acerca da linguagem que ele pretende utilizar em sala de aula. So saberes que podem ser ministrados como histrias em quadrinhos ou que sejam realizados mediante um recorte tcnico em uma dada atividade.

    Atualmente muitos docentes estimulam a leitura e criao de histrias em quadrinhos de forma ldica sem levar em considerao aspectos tcnicos ou estticos que envolvem o trabalho que o aluno realiza. Com esse tipo de atividade se desperta a sensibilizao do aluno em relao aos quadrinhos, no entanto, se quisermos que o aluno se torne um indivduo capaz de ser autnomo no uso de diferentes linguagens, a prtica ldica no basta. preciso o ensino tcnico e posteriormente a orientao reflexiva sobre a produo do aluno.

    Construmos a idia de que tanto as histrias em quadrinhos enquanto linguagem e mdia como a educao so beneficiadas quando uma se insere no contexto da outra.

    O aspecto mais relevante deste consrcio o entendimento de que a produo de histrias em quadrinhos deve se vista como um projeto interdisciplinar, que pode gerar novos questionamentos e revises de contedo. Deste pensamento partem muitos estudos que consideram as histrias em quadrinhos como meio de criao de contedo e no apenas como meio de assimilao de contedo.

  • Imaginrio! - n 1 45CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Neste artigo esperamos ter dado mais uma resposta a essa pergunta de construo simples, mas de respostas mltiplas. Temos plena convico de que muitas outras respostas ainda podem ser encontradas.

    REFERNCIAS

    AMBROSE, Gavin; HARRIS, Paul. Design bsico: Imagem. Porto Alegre: Bookman, 2009.EISNER, Will. Quadrinhos e arte seqencial: princpios e prticas do lendrio cartunista (Trad. Lus Carlos Borges e Alexandre Boide). 4.ed. So Paulo: Martins Fontes, 2010.______. Narrativas Grficas de Will Eisner (Trad. Leandro Luigi Del Manto). So Paulo: Devir, 2005.HELLER, Steven. Linguagens do design: Compreendendo o design grfico. So Paulo: Edies Rosari, 2007. (Coleo Fundamentos do Design).HITCH, Bryan. Bryan Hitchs ultimate comics studio. Cincinnati: David & Charles Publish, 2010.______. Capito Amrica Renascimento. Histria publicada em Os Novos Vingadores n82. So Paulo: Panini Comics, 2010.JOHNS, Geoff; MANAPUL, Francis. Superboy, the boy of steel. Nova Iorque: DC Comics, 2010.MCCLOUD, Scott. Desvendando os Quadrinhos. 2 edio. So Paulo: Makron Books, 2005.OLIVEIRA, Rui de. Pelos jardins de Boboli: reflexes sobre a arte de ilustrar livros para crianas e jovens. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2008.PESSOA, Alberto Ricardo; UTSUMI, Luciana Miyuki Sado. A formao do professor e as histrias em quadrinhos na sala de aula. So Bernardo do Campo: ACADEMOS -

  • Imaginrio! - n 1 46CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Revista Eletrnica da FIA. Vol.V, n.5, 2009.______. Histrias em quadrinhos: um Gnero Imagtico. In: FERREIRA, Dina Maria Martins (org.). Imagens: O que fazem e significam. So Paulo: Annablume, 2010.ROCHA, Claudio. Projeto Tipogrfico - Anlise e Produo de Fontes. So Paulo: Rosari, 2005.SEGER, Linda. Como criar personagens inesquecveis. So Paulo: Bossa Nova, 2006.

  • Imaginrio! - n 1 47CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    DOS ZINES AOS BIOGRAFICZINES: NARRATIVAS VISUAIS

    NO PROCESSO DE FORMAO CONTINUADA

    DE DOCENTES-PESQUISADORES1

    Gazy Andraus2

    Elydio dos Santos Neto3

    Resumo: O Biograficzine um fanzine que tem por objeto as histrias de vida: narrar experincias de vida e formao tendo como objetivos o autoconhecimento, a partilha de narrativas pessoais com outros interessados, o trabalho com as imagens e o desenvolvimento de autoralidade. Este trabalho apresenta uma experincia vivida com biograficzines no Mestrado em Educao da Universidade Metodista de So Paulo, no processo formativo de docentes-pesquisadores. Alm de expor, de maneira sucinta, a gnese e importncia dos zines, relatamos a origem desta experincia, o seu desenvolvimento, o processo de construo dos biograficzines e apresentamos uma narrativa escolhida entre os biograficzines resultantes4.

    Palavras-chave: Narrativas visuais, fanzines, biograficzines, autoralidade.

    1 - Este trabalho foi inicialmente apresentado

    como Comunicao Oral no IV Seminrio Nacional de

    Pesquisa em Arte e Cultura Visual da Universidade Federal

    de Gois em junho de 2011.

    2 - coordenador e professor do curso de ps em Docncia no Ensino Superior da FIG-UNIMESP, pesquisador do

    Observatrio de Quadrinhos da ECA-USP, autor de HQ

    autorais adultas de temtica fantstico-filosfica e editor independente de fanzines. -

    [email protected]

    3 - Professor Adjunto no Centro de Educao da

    UFPB. pesquisador do Observatrio de Quadrinhos/USP; do Grupo de Pesquisa

    Humor, Quadrinhos e Games/UFPB e do Grupo de Estudos

    e Pesquisa Paulo Freire/UMESP. - [email protected]

    4 - Link para download do arquivo: http://www.megaupload.

    com/?d=J4KH2QG8

    mailto:gazya%40yahoo.com.br?subject=mailto:elydio%40gmail.com?subject=http://www.megaupload.com/?d=J4KH2QG8http://www.megaupload.com/?d=J4KH2QG8http://www.megaupload.com/?d=J4KH2QG8

  • Imaginrio! - n 1 48CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    O biograficzine um fanzine (do ingls fanatic + magazine : revista do f) que tem por objeto as histrias de vida: contar experincias de vida e formao tendo como objetivos principais o autoconhecimento, a partilha de narrativas pessoais com outros, o trabalho com as imagens e o desenvolvimento de autoralidade. Esta experincia foi vivida no Mestrado em Educao da Universidade Metodista de So Paulo, com a participao dos autores deste texto. A experincia ocorreu em dois semestres: a primeira vez, no primeiro semestre de 2008, no Seminrio Temtico Formao de Educadores, narrativas autobiogrficas e histrias em quadrinhos; a segunda vez, no primeiro semestre de 2009, no Seminrio Temtico Cultura Visual e Formao de Educadores: um estudo a partir das histrias em quadrinhos.

    O ponto de partida da experincia foi a considerao de que houve um tempo em que se acreditava que para formar bem um professor/a era suficiente o domnio intelectual do contedo que ele/a iria ministrar alm, claro, do conhecimento de algumas tcnicas didticas. De fato, durante um tempo em que as relaes educativas estiveram marcadas pela formalidade e, em muitos casos, pela atitude burocrtica tanto do professor/a como dos alunos/as, talvez isso tenha sido suficiente, mas hoje, com certeza, embora sejam saberes muito importantes no so, contudo, suficientes.

    Vivemos um tempo em que est mais claro, para ns professores/as, que a construo do conhecimento se faz no contexto da relao pedaggica, isto , no encontro entre o professor/a como pessoa e os/as alunos/as como pessoas. E como desenvolver capacidade dialogal, escuta sensvel, autonomia e autoralidade sem autoconhecimento? Sem rever, nas razes da prpria trajetria formativa, as tendncias educativas que estabeleceram as bases da postura de hoje? Sem partilhar estas experincias com outros/as colegas e, na troca, aprender com o/a outro/a? Estas foram as nossas primeiras motivaes que nos levaram experincia com o biograficzine, que nasceu dos fanzines.

    Os fanzines tm uma histria longa que vai das actas diurnas romanas, passando pelos

  • Imaginrio! - n 1 49CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    menestris e bardos medievais, trabalhos do artista, do sculo XVIII, William Blake, bem como as cartas lidas e copiadas no Renascimento, encontrando os primrdios dos jornais e, por fim, chegando a criao de jornais, revistas e fotocopiadoras que baratearam e facilitaram esse desenvolvimento, at culminar nos fanzines (ou zines), mdias paratpicas e revistas temticas independentes extremamente diversificadas e criativas.

    Como j dissemos anteriormente, o biograficzine um fanzine que une as duas necessidades formativas que destacamos acima. Retomar a trajetria formativa pessoal, com a provocao da pergunta: Como me tornei o ser humano profissional que sou hoje? E partilhar, utilizando imagens e a linguagem das histrias em quadrinhos, muito presente nos zines, a reflexo sobre a prpria trajetria com outras pessoas envolvidas no mesmo tipo de processo formativo.

    Como foi desenvolvido num ambiente de mestrado em educao, foi necessrio estar atento quilo que so objetivos deste segmento formativo: a formao do pesquisador na rea da educao e o aperfeioamento de sua ao como docente do ensino superior. Para isso encontramos em Antonio Nvoa (1988), Christine Josso (1988) Franco Ferrarotti (1988) e Paulo Freire (1982) elementos tericos que nos guiaram no trabalho com histrias de vida e formao.

    Para atender a todas estas necessidades o trabalho foi organizado por etapas ao longo das quais foi sendo construda, de maneira crtica e reflexiva, a trajetria formativa e foi sendo elaborado o biograficzine: uma narrativa visual sobre a experincia formativa dos mestrandos no formato de um fanzine muito especfico, pois notadamente autobiogrfico.

    Oficinas, mostras, dilogos em torno da fanzinagem, dos quadrinhos e, depois, a mo na massa mediante as tarefas de criar um roteiro, desenhar, recortar figuras, fazer colagens, compor a prpria narrativa foram algumas das atividades que ocuparam os mestrandos aps os estudos tericos sobre as histrias de vida e formao.

  • Imaginrio! - n 1 50CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Escolhemos o biograficzine resultante da oficina Helena em: E a histria continua... Sempre!, de Maria Helena Negreiros e Jos Luis O. Junior, seja por conta da qualidade das imagens elaboradas para narrar a experincia de Helena como professora, seja por conta da profundidade contida na conjugao imagem-texto, prpria da linguagem dos quadrinhos.

    A ilustrao da capa do biograficzine j , por si s, uma imagem e uma metfora muito interessante da profisso professor/a: Helena se equilibra sobre uma pilha de livros e, ainda, equilibra trs pratos girando sobre varetas em cada uma das mos e em um de seus ps. A imagem sugere a tenso, o esforo, o cansao, o empenho permanente de equilbrio para manter-se como professor/a. Ser possvel suportar isso o tempo todo?

    De fato, na primeira pgina da narrativa de Helena, ela j aparece no cho com os pratos quebrados, os livros espalhados e com a experincia de exercitar a tristeza, o medo, a insegurana e porque no, o cansao negado por tanto tempo. A narrativa sugere que um momento de crise que exige retomar a prpria histria para tentar compreender, se possvel, o que est sendo vivido. E assim Helena comea uma viagem imagtica que se inicia em Mossor, no Rio Grande do Norte e chega a So Paulo, passando pelas escolas em que estudou, pela formatura at ver-se frente ao desafio de subir as escadas do campo da educao... Equilibrando pratos. No caminho uma surpresa: o poder/poltico representado por um homem careca, de culos escuros e que fuma charutos lhe oferece um tapete mgico. A possibilidade de voar, mas sempre com muito que fazer: Nos seus registros, famlia, nem sempre em primeiro plano, viagens, sonhos, medos, congressos, fruns, seminrios, defesas, retrataes.... E, de repente, quando a equilibrista de pratos est sendo admirada e aplaudida, acontece uma nova surpresa: o poder/poltico puxa-lhe o tapete. O tapete era uma concesso, com tempo marcado para terminar, independentemente de minha dedicao... o vo acabou! BUUUUUMMMMM! Helena no cho... Aos cacos.

    A narrativa termina com Helena juntando, com uma vassoura, os prprios cacos. E diz,

  • Imaginrio! - n 1 51CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    talvez sob inspirao de Walter Benjamin que afirma que as crianas constroem histria a partir do lixo da histria: Sorriso no rosto, fora nas mos e coragem na alma! A histria continua... Sempre!.

    O biograficzine de Helena nos parece um exemplo de como a narrativa visual pode servir no apenas aos processos de elaborao integradora das experincias vividas no campo profissional, no exigente caminho de profissionalizao da carreira docente, mas tambm para retomar, de maneira expressivamente esttico-prtica, na formao continuada de professores, que impossvel separar o eu pessoal do eu profissional. Neste sentido a cultura visual emerge como um horizonte rico e interessante para a formao de docentes-pesquisadores, horizonte que, nos parece, precisa ser melhor considerado e explorado no referido campo.

    REFERNCIAS

    ANDRAUS, Gazy. A independente escrita-imagtica catico-organizacional dos fanzines: para uma leitura/feitura autoral criativa e pluriforme. Trabalho apresentado ao Eixo 14 - Escritas, Imagens e Criao: Diferir no 17. COLE. Campinas, julho de 2009.FERRAROTTI, F. Sobre a autonomia do mtodo biogrfico. In: NVOA, A. & FINGER, M. (Orgs.) O mtodo (auto) biogrfico e a formao. Lisboa, Ministrio da Sade, 1988. p.17-33.FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. 11ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.JOSSO, C. Da formao do sujeito... ao sujeito da formao. In: NVOA, A. & FINGER, M. (Orgs.) O mtodo (auto) biogrfico e a formao. Lisboa, Ministrio da Sade, 1988. p.35-49.MAGALHES, Henrique. O que fanzine. So Paulo: Brasiliense, 1993.

  • Imaginrio! - n 1 52CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    RAINE, Kathleen. William Blake. London: Thames & Hudson, 1970.SANTOS NETO, Elydio dos. Reinveno do educador, visualidade e fanzinagem. Revista Debates em Educao Vol. 2, No. 3 (2010), Programa de Ps-graduao em Educao, Universidade Federal de Alagoas. http://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacao. Acesso em 29/04/2011. ZAVAM, A. S. Fanzine: A Plurivalncia Paratpica. Revista Linguagem em (Dis)curso. v. 5, n. 1, jul./dez., 2004. http://www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/0601/01.htm .

    Para entender melhor a anlise empreendida neste artigo, leia a seguir o biograficzine Helena.

    http://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacaohttp://www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/0601/01.htmhttp://www3.unisul.br/paginas/ensino/pos/linguagem/0601/01.htm

  • Imaginrio! - n 1 58CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    DANTE NO INFERNO

    Autor: Marcelo Bolshaw Gomes1

    Resumo: Compara-se aqui o texto da Divina Comdia, escrita por Dante Alighieri no sculo XIV, com o DVD de animao Dantes Inferno: um pico animado (2010), ressaltando a sntese mitolgica realizada dentro da narrativa em um enquadramento tico cristo nos dois trabalhos e o acrscimo na narrativa digital de enredos psicolgicos (as lembranas de Dante das Cruzadas) e de combates com criaturas infernais que no existiam na narrativa original.

    Palavras-chave: Estudos das Narrativas. Mitologia. Banda desenhada (animao).

    1- Doutor em Cincias Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (2006). Professor

    adjunto do Departamento de Comunicao Social da

    Universidade Federal do Rio Grande do Norte, ministrando

    a disciplina Sociologia da Comunicao nos cursos

    de radialismo e publicidade e a disciplina Poltica e Comunicao Miditica no mestrado de Estudos

    da Mdia. Coordenador do Ncleo de Estudos sobre Animao e Histrias em

    Quadrinhos (NEAHQ - grupo de extenso).

    http://lattes.cnpq.br/4277715352803619

  • Imaginrio! - n 1 59CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    1. INTRODUO

    Dantes Inferno: Um pico animado um filme de animao em DVD direto lanado em 09 de fevereiro de 2010. O filme um spin-off de Dantes Inferno, um jogo eletrnico de ao-aventura em terceira pessoa publicado pela Electronic Arts e desenvolvido pela Visceral Games (antiga EA Redwood Shores) e Artificial Mind and Movement (verso PSP) escrito por Will Rokos e tambm lanado em 2010.

    Tanto o filme como o game baseiam-se na primeira parte da obra Divina Comdia de Dante Alighieri (o Inferno), porm alm de lutas contra demnios e personagens de outras narrativas clssicas em cada um dos nove crculos infernais cruzados pelo prprio Dante (o escritor tambm conta sua estria na terceira pessoa) em busca da amada Beatriz, h tambm um enredo explicativo (o seu passado como cavaleiro nas Cruzadas) em que o heri se confronta com a lembrana de seus pecados. No jogo, no entanto, o jogador controla a personagem Dante apenas nos combates durante sua viagem pelo inferno. O confronto tico com o prprio passado (a reflexo sobre os prprios pecados) no faz parte das exigncias necessrias para passar para o prximo nvel do jogo, representado pelo ciclo infernal seguinte; enquanto, no filme, a saga interior do heri mais importante do que seu desempenho nas lutas externas.

    Ambos, o filme de animao e o videogame, considerados esses acrscimos de enredos interior e exterior, seguem fielmente o texto original escrito no sculo XIV.

    A Divina Comdia uma sntese crist de toda mitologia anterior realizada na perspectiva crist, no apenas a mitologia clssica dos gregos e romanos, mas das mitologias arcaicas, em que a visita ao Inferno e s regies subterrneas no era nenhuma novidade. As deusas Inanna, da Sumria; Isthar, da Babilnia; e Demter, dos gregos, foram algumas das que desceram aos infernos para se tornarem senhoras dos trs domnios (Cu, Terra e Inferno).

  • Imaginrio! - n 1 60CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Tambm, nos tempos patriarcais, vrios heris alcanaram a imortalidade descendo aos infernos. H ainda os livros dos mortos (egpcio, tibetano, entre outros) que relatam o percurso da alma aps a morte e que tambm podem ser interpretados como narrativas iniciticas.

    O historiador das religies Mircea Eliade associa essa jornada noo de Centro do Mundo. Para ele, o simbolismo do centro faz parte do universo das sociedades arcaicas. O universo foi criado a partir desse centro (tambm chamado de umbigo do mundo) e uma passagem tanto para os infernos subterrneos como para regies celestiais. Tal o sistema simblico das sociedades tradicionais, do qual derivam as imagens cosmolgicas, os mitos e concepes religiosas nas mais diversas culturas: os pilares ou totens, as montanhas sagradas, as rvores da vida, as escadas csmicas so representaes do Axis Mundi (ou eixo do mundo), em torno do qual o universo se organiza. Para os judeus, o monte Tabor o Centro do Mundo, enquanto para os gregos o Olimpo. O monte Meru dos hindus, o Himinghjor dos germnicos, o Haraberezaiti dos iranianos, a Kaaba dos islamitas todos so passagens verticais para outras dimenses e se situam no Centro do Mundo dessas cosmovises. Eliade acredita que nas sociedades mais antigas a imagem visvel deste pilar csmico , no cu, a Via Lctea, que se expande a partir da constelao Ursa Maior (polo norte estelar) e se direciona para constelao do Cruzeiro do Sul (polo sul estelar).

    Para o simbolismo cristo, o Centro do Mundo o Glgota, em Jerusalm, lugar sagrado tanto da crucificao do Cristo como da queda de Lcifer. A Divina Comdia, seguindo a estrutura simblica da cabala e do esoterismo cristo medieval, prope um universo formado por uma sucesso de quatro crculos concntricos: o mundo dos homens; o Inferno, cuja a porta ficaria na terra santa, no centro do mundo; o Purgatrio, cuja

  • Imaginrio! - n 1 61CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    a entrada ficaria no centro do nono crculo infernal; e o Paraso Celeste, de onde a humanidade foi expulsa no Gnesis e para onde voltar no final dos tempos, atravs da Nova Jerusalm. O Inferno, por sua vez, subdividido por nove crculos concntricos e se torna mais profundo e terrvel a cada nvel, uma vez que os pecados menores esto logo nos primeiros crculos enquanto os mais graves situam-se nos ltimos, prximos passagem para o Purgatrio.

    Vejamos, ento, como toda essa estrutura simblica se coloca na narrativa tanto no texto original como em suas recentes verses audiovisuais.

    2. ESTRUTURAS ARQUETPICA E DISCURSIVA

    Em contraste com as tragdias que sempre terminam mal para seus protagonistas, a Divina Comdia, seguindo a classificao da poca, chamada de comdia no por ser engraada mas porque termina bem: Dante, o personagem, chega ao dcimo cu e, com a ajuda de So Bernardo e da Virgem Maria, encontra-se com Deus. Curiosamente Dante, o escritor, faleceu logo em seguida concluso da obra em 1321. Apesar de se tratar de um poema de vis pico com propsitos filosficos, com vrias citaes mitolgicas clssicas, o autor tinha a inteno de escrever um texto popular, por isso o fez em toscano (um dialeto local de Florena) e no em latim, como exigia a erudio da poca. Ele elaborou uma jornada inicitica para o heri cristo (narrador e protagonista da saga) estruturada como uma estria erudita de alcance popular. E conseguiu. Inspirou vrios pintores durante sculos (Botticelli, Gustave Dor e Dal para citar os mais famosos) e se tornou o primeiro e maior poeta do idioma italiano.

    O texto est dividida em trs partes: Inferno, Purgatrio e Paraso. Cada uma de suas partes est dividida em cantos, compostos de Tercetos. A composio do poema baseada no

  • Imaginrio! - n 1 62CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    simbolismo do nmero trs (simbolizando a Santssima Trindade). Cada estrofe tem trs versos e cada uma de suas trs partes contm 33 cantos. Os trs livros da Divina Comdia so divididos em 33 cantos (sendo que o Inferno possui um canto a mais que serve de introduo ao poema), com aproximadamente 40 a 50 tercetos. No total so 100 cantos e 14.233 versos. Os lugares/partes do texto (o inferno, o purgatrio e o paraso) so divididos em nove crculos cada, formando no total 27 (trs vezes trs vezes trs) nveis.

    A narrativa possu ainda trs personagens principais: Dante, narrador e protagonista; Beatriz, que personifica seu corao, sua Anima, o Sagrado Feminino; e Vrgilio, autor da Eneida, poeta predileto de Dante-narrador, que personifica a razo e seu alter-ego masculino, seu Animus, que acompanha o seu ego-heri em sua jornada atravs do Inferno. E, em contraposio a essa estrutura ternria, est Lcifer, antagonista central da narrativa.

  • Imaginrio! - n 1 63CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Posio Funo Modelo gerativo

    Elementos narrativos

    Divina Comdia

    S1/S2 relao de contradio eixo dos contrrios

    protagonista x antagonista

    Dante x Lcifer

    ~S1/~S2 relao de contradio eixo dos sub contrrios

    ajudante x sociedade

    Virglio x Beatriz

    S1/~S1 relao de contrariedade

    esquema positivo

    protagonista & ajudante

    Dante e Virglio

    S2/~S2 relao de contrariedade

    esquema negativo

    antagonista & sociedade

    Lcifer e Beatriz

    S1/~S2 relao de complementaridade

    deixa positiva protagonista + sociedade

    Dante + Beatriz

    S2/~S1 relao de complementaridade

    deixa negativa antagonista + ajudante

    Lcifer + Virglio

    Incluindo Lcifer como antagonista na estrutura ternria de Dante, pode-se aplicar a metodologia analtica do Quadrado Semitico Narrativo (GREIMAS, 1989) Divina Comdia. O conflito central da narrativa (S1/S2) entre o bem (Dante) e o mal (Lcifer) e o conflito secundrio (~S1/~S2) entre o corao (Beatriz) e a razo (Virglio). Os esquemas positivo (S1/~S1 - Dante + Virglio) e negativo (S2/~S2 - Lcifer + Beatriz) mostram como os elementos narrativos se agrupam e organizam na narrativa.

    Porm, so as relaes de complementaridade (S1/~S2 e S2/~S1), as diagonais internas do Quadrado Semitico Narrativo, que melhor explicam tanto a originalidade da Divina

    Tabela 1 Quadrado Semitico Narrativo aplicado Divina Comdia de Dante

  • Imaginrio! - n 1 64CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Comdia em relao a outras narrativas de jornadas iniciticas pelo inferno bem como sua adeso tica crist. Em outra ocasio (GOMES, 2011), demonstrei que as relaes Ego-Self (a inverso narrativa entre o Eu e sua representao narrativa no heri) e Sombra-Outro (a renncia ao Sagrado Feminino e o papel de Judas na estria de Jesus) so a essncia e a singularidade do cristianismo. De certa forma, a Divina Comdia adota e aperfeioa essas caractersticas da tica crist. Em relao relao Ego-Self, h a identidade (Dante) entre narrador e protagonista. Tambm aqui h a renncia/sublimao ao Sagrado Feminino. Renncia aos desejos e instintos sublimados em sentimentos de f e de amor. E a relao com o Outro, a razo, tambm vista como um ardil do antagonista.

    Essas relaes marcam tambm a diferena fundamental entre o texto original da Divina Comdia e suas recentes adaptaes audiovisuais. No filme de animao e no videogame, Dante deixa de ser o poeta toscano que escreve a prpria jornada para ser um cavaleiro templrio em Jerusalm, o narrador no mais protagonista.

    3. BANDA DESENHADA

    O filme/game dividido em onze partes. Cada captulo animado, produzido e dirigido por grupos diferentes, com estilos variados (o que d margem a vrios problemas de continuidade, inclusive na identidade dos personagens principais). No entanto, todos utilizam-se de tcnicas de anims (desenhos animados japoneses feitos a partir de histrias em quadrinhos ou mangs), em que h muitos movimentos de cmera entrelaados ao udio e pouco movimento cintico dos corpos e objetos. O resultado

    Imagem 1 Quadrado Semitico Narrativo de Greimas

  • Imaginrio! - n 1 65CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    de um conjunto narrativo de diversas camadas visuais que mantm uma unidade multifacetada, bem ao estilo esttico dos jogos de videogame contemporneos. Para cada captulo, h um ttulo para a viagem.

    No texto da Divina Comdia, Dante, sem saber ao certo como, talvez por estar sonolento, perdeu-se em uma selva sombria. Ento Dante achou um monte, subiu-o e logo apareceram trs feras representando os trs tipos de pecados: a Pantera (incontinncia), o leo (violncia) e a loba (fraude) refletem nveis de gravidade de acordo com a inteno consciente do crime. Ento, Dante encontra Virglio que lhe prope uma jornada pelo inferno, purgatrio e paraso. Dante se acovarda e tenta desistir da jornada, entretanto Virglio o impede, revelando ter sido mandado por Beatriz para que o ajudasse. Dante, ento, recupera sua f e inicia a epopeia. Dante e Virglio chegam ao vestbulo do Inferno onde esto os mortos que no podem ir para o cu nem para o inferno. O vestbulo a morada dos indecisos e covardes. Os covardes so condenados a correr em filas, sendo picados por vespas e mosces. Entre o vestbulo e o 1 Crculo, est o rio Aqueronte, no qual se encontra Caronte, o barqueiro que faz a travessia das almas. Porm Dante muito pesado para fazer a travessia no barco de Caronte, por ser vivo. Entretanto, Virglio adverte o barqueiro de que a travessia em seu barco uma ordem celeste. atravs deste barco que Virglio e Dante atravessam o rio.

    O 1captulo, A Chegada, dirigido por Victor Cook, pr-produo pela Film Roman e animado pela Big Star. O filme, com pequenas diferenas, reproduz A Divina Comdia, mas acrescenta um novo enrendo: o retorno de Dante da Terceira Cruzada, que o manteve longe de sua casa durante vrios anos. Ao chegar em casa, ele encontra os servos e o seu pai mortos e sua noiva Beatriz ainda agonizante. Quando ela morre e comea a subir ao cu, Lcifer surge e a leva embora para o Inferno. Na perseguio, Dante chega aos portes do Inferno e Virglio se oferece para gui-lo. Depois de Dante evocar sua f, ele capaz de abrir os portes e entrar no Inferno.

  • Imaginrio! - n 1 66CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Entrada para o Inferno, 2 captulo de Dantes Inferno - dirigido por Victor Cook, pr-produo pela Film Roman e animado pela Digital Emation , narra o episdio da travessia de Dante e Virglio a bordo da balsa demonaca que leva almas para o primeiro crculo do Inferno. Caronte, no entanto, no aceita transportar um viajante mortal e manda seus demnios atacarem Dante. O heri mata as criaturas e o prprio Caronte, tomando-lhe o barco e atravessando o rio.

    No 3 captulo, Limbo - dirigido por Shukou Murase, produzido por Manglobe -, Virglio e Dante entram no primeiro crculo, o Limbo, que abriga principalmente virtuosos pagos (filsofos como Aristteles, Plato e Scrates) e os bebs no batizados. aqui onde Dante descobre que Beatriz estava grvida de seu filho enquanto ele estava nas Cruzadas e abortou. Tambm aqui Dante encontra o rei Minos, cuja tarefa julgar todas as almas dos mortos, condenando-as, segundo seus pecados, ao seu crculo especfico do inferno que merecem. Quando ele nega passagem ao heri, eles batalham e Dante vence Minos, abrindo seu caminho at o 2 crculo. Enquanto isso, Lcifer tenta convencer Beatriz de que Dante no merece seu amor.

    No texto original da Divina Comdia, o rei Minos est no 2 Crculo, o Vale dos Ventos, e no no Limbo. Nesse crculo ficam os luxuriosos, que sofrem e so atormentados e arrebatados por um furaco que no para nunca, arrastando os espritos com violncia, atormentando-os; da mesma forma que, em vida, eles eram levados por suas paixes que os arrastavam. Aqui esto Semramis, Clepatra, Helena, Aquiles, Pris, Tristo e mais mil homens que se sacrificaram por amor. Aqui tambm est Francesca de Rimini e seu amante Paulo Malatesta, que seu cunhado.

  • Imaginrio! - n 1 67CAPA EXPEDIENTESUMRIO

    Em Luxria, o 4 captulo do filme - dirigido por Shukou Murase, produzido por Manglobe , Dante e Virglio chegam Ilha da Luxria, onde as almas so arrastradas pela interminvel tempestade de paixo. Dante atrado para um quarto com meretrizes que se transformam em demnios e tentam mat-lo e Beatriz chora distncia. Dante, ento, percebe que quebrou sua promessa de fidelidade a Beatriz: durante a cruzada, uma mulher oferece sexo para salvar o marido de ser espancado at a morte. Tendo estado sob a iluso de que ele foi absolvido de todos os pecados pela igreja, Dante aceita a proposta. Ao ouvir isso, Beatriz comea a perder a sua f no amor do heri e Lcifer lhe pede a mo em casamento, prometendo torn-la a Rainha do Inferno.

    A saga de Dante continua no 5 captulo, Gula, dirigido por Jong-Sik Nam, produzido por Dong Woo Animao, no 3 crculo em que esto os gulosos, flagelados por uma chuva putrefacta e so vigiados pelo mitolgico co de trs cabeas, Crbero. Virglio diz a Dante que a nica forma de chegar ao 4 crculo atravs do co. Dante se permite ser comido e ele acaba dentro do co do inferno. Encontrando Ciacco, um homem que conheceu na vida e ao sentir piedade por seu sofrimento, Dante usa sua f para libertar o homem da tortura a que ele teve de suportar. Isto provoca a ira de Lcifer; ele revela seu plano de se casar com Beatriz e que o pai de Dante tambm est no inferno. Para escapar da barriga de Crbero, Dante ataca e destri o corao da besta, fazendo o demnio cuspi-lo em um rio de sangue que flui para o crculo seguinte.

    No 4 Crculo esto os prdigos e avarentos. Suas riquezas materiais se transformaram em grandes pesos de barras e moedas de ouro que um grupo deve empurrar contra o outro e tambm trocarem injrias, pois suas atitudes em relao riqueza foram opostas.

    A entrada para 5 Crculo est numa cachoeira de sangue borbulhante e fervente que forma um lago chamado Estige, onde esto amontoados os acusados de ira, em estado de permanente revolta e briga entre si.

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    No 6 captulo do filme, Ganncia - dirigido por Jong-Sik Nam, produzido por Dong Woo Animao -, Dante e Virglio vee