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Textos Completos: II Congresso Internacional de História da UFG/Jataí: História e Mídia – ISSN 2178-1281 1 Anais do II Congresso Internacional de História da UFG/ Jataí Realização Cursos de História, Letras, Direito e Psicologia ISSN 2178-1281 IDENTIDADE CAIPIRA: O CAIPIRISMO NAS PRODUÇÕES CINEMATOGRÁFICAS DE AMÁCIO MAZZAROPI* 1 Agnaldo Divino Gonzaga** 2 RESUMO: O objetivo desse artigo é refletir sobre identidade caipira, com um recorte sobre o caipirismo nas produções cinematográficas de Amácio Mazzaropi. Para isso, está dividido em três partes. A primeira e a segunda procuram conceituar termos básicos que servirão de referência teórica para se tratar especificamente de elementos importantes que caracterizam a identidade caipira. Esses termos são: cultura, identidades, identificação, espaço, linguagem e caipira. A terceira e última parte trata da cena, do olhar e da identificação: de apontamentos da história do cinema no Brasil e da vida artística de Amácio Mazzaropi; da recepção dos que assistiram e teciam críticas sobre suas produções; e do porquê do sucesso e da importância de suas produções para a história do cinema brasileiro e para a discussão sobre o caipirismo na cinematografia nacional, sob a ótica de identidade sócio-cultural. PALAVRAS-CHAVE: Identidades. Cultura. Identificação. Caipira. Caipirismo. Amácio Mazzaropi. Cinema. 1. Introdução Os estudos sobre identidades nos últimos anos têm se tornado necessário em muitos espaços acadêmicos. A contribuição da antropologia, da sociologia e da psicologia, particularmente, tem levado muitos pesquisadores e repensarem suas óticas, reprojetando inclusive suas linhas de pesquisas. É que essa contribuição tornou-se objeto de análise de vários ramos das ciências, inclusive da história. Conjuga-se a isso as transformações sociais em processo simultâneo ao aprofundamento científico, é claro que se deram nos últimos anos. Se em um período próximo a temática das classes sociais era prioridade nas discussões das ciências humanas, na busca de igualdade, cuja justiça se dava nas redistribuições de bens diversos, ultimamente a metamorfose das relações sociais tem conduzido grupos a reivindicar seus direitos de equidade, na busca de reconhecimento de sua diferença. Direto a equidade, de ser reconhecido como tal, nas suas particularidade, com as elementos com os quais se identifica, que constroem sua identidade. Prioriza-se para isso o campo da cultura, onde o processo identitário se efetiva por meio da identificação. Aqui as relações sociais, políticas e econômicas são analisadas, mas considerando os significados de sua dimensão simbólica construídos historicamente por um determinado grupo, e em permanente construção. O sentido das coisas é um construto, já que paradigmas, categorias e * Trabalho apresentado à disciplina Identidade sócio-cultural: novas fronteiras, novas articulações, ministrada pela Profª. Drª. Libertad Borges Bittencourt, na Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás. ** Doutorando em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás.

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Textos Completos: II Congresso Internacional de História da UFG/Jataí: História e Mídia – ISSN 2178-1281

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Anais do II Congresso Internacional de História da UFG/ Jataí – Realização Cursos de História, Letras, Direito e

Psicologia – ISSN 2178-1281

IDENTIDADE CAIPIRA: O CAIPIRISMO NAS PRODUÇÕES CINEMATOGRÁFICAS DE AMÁCIO MAZZAROPI*1

Agnaldo Divino Gonzaga**2

RESUMO: O objetivo desse artigo é refletir sobre identidade caipira, com um recorte sobre o caipirismo nas produções cinematográficas de Amácio Mazzaropi. Para isso, está dividido em três partes. A primeira e a segunda procuram conceituar termos básicos que servirão de referência teórica para se tratar especificamente de elementos importantes que caracterizam a identidade caipira. Esses termos são: cultura, identidades, identificação, espaço, linguagem e caipira. A terceira e última parte trata da cena, do olhar e da identificação: de apontamentos da história do cinema no Brasil e da vida artística de Amácio Mazzaropi; da recepção dos que assistiram e teciam críticas sobre suas produções; e do porquê do sucesso e da importância de suas produções para a história do cinema brasileiro e para a discussão sobre o caipirismo na cinematografia nacional, sob a ótica de identidade sócio-cultural. PALAVRAS-CHAVE: Identidades. Cultura. Identificação. Caipira. Caipirismo. Amácio Mazzaropi. Cinema.

1. Introdução Os estudos sobre identidades nos últimos anos têm se tornado necessário em

muitos espaços acadêmicos. A contribuição da antropologia, da sociologia e da psicologia, particularmente, tem levado muitos pesquisadores e repensarem suas óticas, reprojetando inclusive suas linhas de pesquisas. É que essa contribuição tornou-se objeto de análise de vários ramos das ciências, inclusive da história. Conjuga-se a isso as transformações sociais – em processo simultâneo ao aprofundamento científico, é claro – que se deram nos últimos anos. Se em um período próximo a temática das classes sociais era prioridade nas discussões das ciências humanas, na busca de igualdade, cuja justiça se dava nas redistribuições de bens diversos, ultimamente a metamorfose das relações sociais tem conduzido grupos a reivindicar seus direitos de equidade, na busca de reconhecimento de sua diferença. Direto a equidade, de ser reconhecido como tal, nas suas particularidade, com as elementos com os quais se identifica, que constroem sua identidade.

Prioriza-se para isso o campo da cultura, onde o processo identitário se efetiva por meio da identificação. Aqui as relações sociais, políticas e econômicas são analisadas, mas considerando os significados de sua dimensão simbólica construídos historicamente por um determinado grupo, e em permanente construção. O sentido das coisas é um construto, já que paradigmas, categorias e

* Trabalho apresentado à disciplina Identidade sócio-cultural: novas fronteiras, novas articulações, ministrada pela Profª. Drª. Libertad Borges Bittencourt, na Faculdade de História da Universidade Federal de Goiás. ** Doutorando em Educação pela Faculdade de Educação da Universidade Federal de Goiás.

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conceitos são flexíveis. Com isso, nada se explica sozinho, tudo pode estar interrelacionado a um sistema partilhado de significações.

Nesta ótica, vários teóricos têm discutido várias questões, trazido reflexões no campo da cultura em geral, mas também no da cultura popular. Esse recorte aponta um campo fértil de pesquisa que tem como objeto de análise o lugar e a linguagem, por exemplo.

Neste trabalho parti-se do conceito de cultura, identidades e identificação, acrescentando análise sobre o espaço e a linguagem como constitutivos identitários essenciais de determinado modo de ser no mundo. Seguem alguns apontamentos sobre cinema no Brasil e seu impacto sobre os que olhavam as produções feitas, até o período histórico em que Amácio Mazzaropi produziu seus filmes.

O caipira é pesquisado nesse contexto em vista da caracterização de sua identidade em geral e do caipirismo presente nas produções cinematográficas de Amáio Mazzaropi.

Uma pergunta de fundo é sobre o porquê do sucesso de dezenas de filmes de Mazzaropi produzidos durante quase três décadas. E filmes que falam da roça, do caipira e seu modo de ser e de viver, de seus conflitos, costumes, de sua rusticidade pessoal em meio a um mundo em transformação.

Se em tempos passados esse tipo de indivíduo fora classificado como atrasado, arcaico e inculto, seu sucesso como ator de teatro e de circo, depois de cinema – exercendo múltiplas funções –, parece indicar valores submersos, ignorados ou não vistos por muitos na sociedade de seu tempo.

Esse estudo traça este caminho: procura analisar o constitutivo da identidade caipira, fundamentando-se nas discussões recentes sobre identidades, em fontes históricas e na literatura, evidenciando o caipirismo presente nas produções cinematográficas de Amácio Mazzaropi.

2. Cultura, Identidades e identificação

Cultura tem a ver com sistema de significação por meio do qual indivíduos e grupos criam, em determinado tempo e espaço, motivações para viver e conviver, para compartilhar elementos fundamentais como o espaço, a língua, a religião, o trabalho e as artes. Estas realidades são construídas historicamente, mantidas por formas cotidianas de atualização, fazem parte da cultura, mas não são estáticas, dão-se dentro de um processo dinâmico, é uma construção permanente. Partir de uma ideia tal de cultura faz-se necessário, porque ela tem a ver com sistema ou herança de valores e objetos compartilhados por grupos de indivíduos coesos, relativamente. Assim,

...se nos ativermos fielmente à concepção antropológica do termo cultura, que é, de longe, a mais fecunda, logo perceberemos que um sem-número de fenômenos simbólicos pelos quais se exprime a vida brasileira tem a sua gênese no coração dessa vida, que é o imaginário do povo formalizado de tantos modos diversos, que vão do rito indígena ao candomblé, do samba-de-roda á festa do Divino, das Assembléias pentecostais à tenda de umbanda, sem esquecer as manifestações de piedade do catolicismo que compreende estilos rústicos e estilos cultos de expressão (BOSI, 1992, p. 322-3).

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A cultura consiste em valores indispensáveis à experiência dos indivíduos, sem os quais seria impossível pensar sua organização e convivência. “Ela fornece, antecipadamente, algumas categorias básicas, um padrão positivo, pelo qual as ideias e os valores são higienicamente ordenados. E, sobretudo, ela tem autoridade, uma vez que cada um é induzido a concordar por causa da concordância dos outros” (DOUGLAS , apud Woodward, 2000, p. 42). Mas ao contrário de muitos estudos convencionais, daqueles que tendiam rotular de residuais certas manifestações culturais populares, como as folclóricas, por exemplo, estudos atuais que tratam da temática cultura veem em cada manifestação cultural um valor próprio. A cultura de um povo – em sentido lato, já que trata-se de termo paradoxal –, é constituída na verdade por expressões culturais diversas, podendo ser construídas sob matizes comuns. No caso do Brasil, a cultura europeia, indígena e africana moldaram a cultura do povo brasileiro. Por isso se pode dizer que “tudo o que estiver sob o limiar da escrita, e, em geral, os hábitos rústicos ou suburbanos, é visto como sobrevivência das culturas indígenas, negra, cabocla, escrava ou, mesmo, portuguesa arcaica: culturas que se produziram sempre sob o ferrete da dominação” (BOSI, 1992, p. 323). A sociedade é, sob o ponto de vista da cultura, caracterizada pela diferença e tem um sistema de classificação. Aqui os significados são produzidos.

Os sistemas sociais e simbólicos produzem as estruturas classificatórias que dão certo sentido e uma certa ordem à vida social e as distinções fundamentais – entre nós e eles, entre o fora e o dentro, entre o sagrado e o profano, entre o masculino e o faminino – que estão no centro dos sistemas de significações da cultura... (WOODWARD, 2000, p. 67-8).

Essa classificação se dá porque existe a diferença, e esta se constroi a partir

dos sentidos diversos dados às coisas. Então cada cultura vai tendo, no processo dinâmico da história, um sentido próprio das coisas e uma classificação própria do mundo. Constrói-se significados interligado que tornam-se comuns aos membros de uma sociedade, dando a esta coesão, provocando o consenso, levando à ordem social. Cultura é, logo, sistemas partilhados de signifiação (WOODWARD, 2000, p. 41).

Bosi (1992), para quem no Brasil há a cultura erudita, cultura de massa e cultura popular, diz que esta última se caracteriza pelo modo de viver específico.

Cultura popular implica modos de viver: o alimento, o vestuário, a relação homem-mulher, a habiração, os hábiros de limpeza, as práticas de cura, as relações de parentesco, a divisão das tarefas durante a jornada e, simultaneamente, as crenças, os cantos, as danças, os jogos, a caça, a pesca, o fumo, a bebida, os provésbios, os modos de cumprimentar, as palavras tubus, os eufemismos, o modo de olhar, o modo de sentar, o modo de andar, o modo de visitar e ser visitado, as romarias, as promessas, as festas de padroeiro, o modo de criar galinha e porco, os modos de plantar feijão, milho e mandioca, o conhecimento do tempo, o modo de rir e de chorar, de agredir e de consolar... (BOSI, 1992, p. 324).

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Cultura popular, para Basi (1992), refere-se ao homem rústico, sertanejo ou interiorano, iletrado, e ao homem pobre suburbano, não incluso pelas estruturas simbólicas da cidade moderna. Não se trata de uma subcultura, mas de uma cultura específica, direrente.

Mas tal idéia não é de consenso entre as vertentes de intelectuais que pensam sobre a cultura brasileira. Há tradicionais que entendem ser a cultura popular uma espécie de fóssil primitivista, atraso, demora, subdesenvolvimento (BOSI, 1992). Outro extremo, enfatiza esse mesmo autor, dá-se pelos que defendem o romantismo-nacionalista, romantismo-regionalista e o romantismo-populista, cujas matizes mudam conforme a conjuntura e que tomam por valores obsolutamente válidos aqueles transmitidos pela cultura popular, negando seu vínculo com as culturas de massa e erudita. Tal situação nos direciona para o sentido extremo da pertença, para a identificação, para a temática de identidades. Discussão recente no campo acadêmico, ao menos com as particularidades tratadas na atualidade, o estudo de identidades se desdobra em relação à discussão das velhas identidades que teve sua importância singular. Sua busca, destas, se dava no sentido de unificação do indivíduo, impulsionadas pelo modo cartesiano de pensar, pelo jeito iluminista de ver e interpretar o mundo, concebendo a natureza e a história como realidades estáticas. A auto-emancipação do ser humano era o sonho iluminista (RAJAGOPALAN, 2002). Já os estudos atuais percebem a fragmentação do indivíduo moderno, justamente porque a atual sociedade assim se faz3, no processo de globalização em andamento que tem remodelado o globo conforme as novas exigências do capitalismo, a partir de seu novo ciclo de expansão. Como seu processo é dinâmico, a cultura se faz dinâmica e, simultaneamente, as identidades são fluidas e móveis, um construto dos grupos que as modelam segundo significações que deem sentido à existência de seus integrantes.

É nessa linha de reflexão que se dá a discussão sobre identidades. “(Este tema) tem se destacado como uma questão central nas discussões contemporâneas, no contexto das reconstruções globais das identidades nacionais e étnicas e da emergência dos movimentos sociais, os quais estão preocupados com a reafirmação das identidades pessoais e culturais” (WOODWARD, 2000, p. 67). A modernidade propiciou a fragmentação do indivíduo. As culturas humanas já não se sentem bem localizados ante as tradicionais paisagem culturais como gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade. Houve um deslocamento que levou a perda de referências (HALL, 1999). Com esse deslocamente, os conceitos são teorizados numa perspectiva de mudança permanente. E como não existem conceitos absolutos, identidade íntegra, unificada e originária, o fundamental em qualquer crítica é valer-se do que existe com o máximo de rigor na ordem do pensamento e em suas fundamentações4.

3 Diante dessa situação de mudanças de paradigmas, de referências teóricas básicas, é que se fala

de crise de identidades, resultado das mudanças substanciais ocorridas no interior das sociedades modernas. As estruturas e processos centrais das sociedades deslocaram-se. Com isso, os quadros referenciais dos indivíduos, que lhes proporcionavam estabilidade no mundo, viram-se abalados, deixando-os inseguros, provocando crises (HALL, 1999). 4 Com essa preocupação, vários estudiosos têm dado sua contribuição para o aprofundamento dessa

temática. Dentre eles, destacam-se os teóricos do „hibridismo‟ (Bhabha, 1994), do „transnacionalismo‟ (Gilroy, 1992), das „fronteiras‟ evanescentes (Anzaldúa, 1987), da „subalternidade‟ (Spivak, 1996), da „subversão e transgressão‟ (Grossberg, 1996), das zonas de contato e rotas (Clifford, 1997) e outros

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Tem havido uma explosão discursiva em torno do conceito de identidades, que tem se submetido a severa crítica. “Está-se efetuando uma completa desconstrução das perspectivas identitárias em uma variedade de áreas disciplinares, todas as quais, de uma forma ou de outra, criticam a ideia de uma identidade integral, originária e unificada” (HALL, 2000, p. 103). Para Silva (2000), identidades não é referência à essência, não é um dado ou um fato.

A identidade não é fixa, estável, coerente, unificada, permanente. A identidade tampouco é homogênea, definida, acabada, idêntica, transcendental. Por outro lado, podemos dizer que a identidade é uma contrução, um efeito, um processo de produção, uma relação, um ato performativo. A identidade é instável, contraditória, fragmentada, inconsistente, inacabada. A identidade está ligada a estruturas discursivas e narrativas. A identidade está ligada a sistemas de representação. A identidade tem estreitas conexões com relações de poder (SILVA, 2000, p. 96-7).

Identidades são particularmente marcadas por símbolos (WOODWARD, 2000). As coisas que fazem parte da vida, do convívio dos indivíduos ou de grupos tornam-se parte singular do cotidiano de todos que são unidos por valores comuns. E o como indivíduos de um grupo veem ou sentem as coisas (símbolos) que estão à sua volta, reflete diretamente em sua forma de pensar e agir sobre o mundo material. Identidades tem a ver, assim, com a pessoa e tudo que ela faz, com seu jeito de pensar, de falar, com seu espaço, seu trabalho, com o sentido que dá a si e às mundo. O intento particular deste trabalho se liga diretamente a outro conceito discutido na teoria social e cultural, o de identificação. É nos processos dinâmicos e contínuos das experiências identitárias que acontece a identificação. Esta

é construída a partir do reconhecimento de alguma origem comum, ou de características que são partilhadas com outos grupos ou pessoas, ou ainda a partir de um mesmo ideal. É em cima dessa fundação que ocorre o natural fechamento que forma a base da solidariedade e da fidelidde do grupo em questão (HALL, 2000, p. 106).

Mas a identificação é uma construção permanente, algo em processo em que nem se ganha nem se perde. Identificação é relativa, depende dos meios e não anula a diferença.

Embora tenha suas condições determinadas de existência, o que inclui os recursos materiais e simbólicos exigidos pra sustentá-la, a identificação é, ao fim e ao cabo, condicional; ela está, ao fim e ao cabo, alojada na contingência. Uma vez assegurada, ela não anulará a diferença. A fusão total entre „mesmo‟ e o „outro‟ que ela sugere é, na verdade, uma fantasia de incorporação... (HALL, 2000, p. 106).

como “Eric Hobsbawm (1987), Michael Oakeshott (1991), Anthony Giddens (1991) e Charles Taylor (1992)” (RAJAGOPALAN, 2002, p. 77).

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Hall (2000) também diz que identificação é um processo de articulação, uma

suturação, não anula a diferença, é uma sobredeterminação ou uma falta, mas nunca se faz ajustada por completo, não se apresenta como totalidade. Se o diferente se faz distante, não havendo aí identificação, mas distanciamento, a identificação é aproximação de algo que se faz próximo.

3. Espaço, linguagem e caipira

O modo de ser de pessoas em grupos, em dado tempo, é que vai dizer a que cultura ele pertence. E o espaço onde esse grupo está localizado é parte determinante de seu complexo cultural e social. Sua vida simbólica e social se dá dentro de um determinado espaço. Por isso “não é possível pensar o espaço que nós habitamos sem levar em consideração o fato de que ele se constitui no mesmo movimento em que nos organizamos como seres sociais” (MACIEL, 2000, p. 12). Este mesmo autor fala de espaço estriado e liso. Aquele trata-se do espaço sedentário, orgânico, constituído de funções formadas e de matérias sedimentadas, é o espaço das sedimentações históricas (advindos das segmentações sociais). “Trata-se de um espaço esquadrinhado que entrecruza fixos e variáveis, ordena e faz se sucederem as formas distintas” (MACIEL, 2000, p. 12), e que tem a cidade como exemplo por excelência, por ser “onde o meio físico e as funções sociais, administradas pelo aparelho de Estado, constituem estratos que fixam e normatizam a vida” (MACIEL, 2000, p. 13). Quanto ao espaço liso, diferentemente do espaço estriado, trata-se de um espaço direcional, e não dimensional como o espaço estriado. “Sua superfície expande-se em múltiplas direções, constituindo um plano amorfo e ilimitado. Neste aspecto, opõe-se ao tecido, que enquanto modelo tecnológico é constituído por tramas limitadas de direito.” (MACIEL, 2000, p. 14). Para os indivíduos que partilham esse tipo de espaço, as direções são mais importantes do que as dimensões. Prioriza-se aqui as intensidades, as forças e as qualidades que atingem as vias sensitivas. A vida, nesse espaço, “se desdobra em um espaço aberto, sem finalidade, cujas ações livres resultam de afetos produzidos por forças instáveis de um meio em constante variação intensiva” (MACIEL, 2000, p. 14). Há uma oposição entre os espaços estriado e liso, mas a diferença de sua natureza não impede que haja mistura entre ambos. Mas um movimento inverso pode dissolver as estrias e restituir os espaços lisos, e estes podem ter um caráter de resistência que se apresenta como protesto presente no campo social, nos impasses de funcionamento dos espaços estriados. Trata-se de “um movimento que se insurge contra os poderes e os saberes estratificados da sociedade. Essa resistência é verificada, por exemplo, no nível da mendicância, da vagabundagem, das greves, dos protestos de movimentos rebeldes, na marginalidade e no banditismo” (MACIEL, 2000, p. 19).

No que tange à cultura popular, ao mundo caipira particularmente, o espaço onde se mora é onde a vida acontece em quase todas as suas dimensões. E se a cidade é exemplo de espaço estriado, esquadrinhado, regido pela ordem, o espaço rural impõe-se como espaço liso porque é onde a vida acontece intensamente e com ações livres que se movem mais pelas direções do que pelas dimensões.

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Assim, a casa rústica, o quintal e a periferia próxima – o bairro, a vizinhança, acabam não sendo apenas os lugares do trabalho familiar, mas igualmente os espaços de quase toda a vida social e simbólica do caipira paulista. Ali as pessoas convivem entre parentes, “cumpadres” e vizinhos. Ali “festam” nos batizados, casamentos e mutirões. Ali praticam em família ou “no bairro” quase toda a vida religiosa: a pequena reza do terço que reúne à volta de um oratório caseiro as pessoas da família, os parentes e vizinho de residência próxima; as festas familiares de devoção coletiva, que obrigam à reunião de grupos maiores para a “devoção” ou “cumprimento de um voto válido”, com comida, reza, canto e dança, de que os festejos roceiros dos santos juninos ou de São Gonçalo são bons exemplos (BRANDÃO, 1983, p. 77).

Ao descrever a casa de um caipira goiano, Leal (1980) destaca a simplicidade

do povo local, para quem louça e mobília são coisas de luxo. “Ha em vez de cama ou de rede – o giráo, outra geringonça feita de varas sobre forquilhas cravadas no chão; em vez de bancos – troncos de árvores ou pesadas pedras. Um pericarpo ou uma cuia, substitue a bacia, o bulle, a chicara, o prato, a farinheira, conforme o tamanho” (LEAL, 1980, p. 67).

Outro tema pressuposto na discussão sobre identidades é o da linguagem. Gondar (2002) lembra que para Aristóteles a linguagem é equívoca e as palavras devem ter sentido para que possam exercer bem sua função. “A relação entre linguagem e identidade (essência das coisas, no sentido clássico) é, assim, uma relação de adequação: à identidade do conceito deve corresponder o senido único da palavra que o expressa” (GONDAR, 2002, p. 108). Mas o problema da linguagem e da identidade desdobrou-se, tomando dimensões mais complexas:

passamos de uma concepção mentalista ou essencialista para uma filosofia da linguagem de cunho pragmatista (inaugurada por Wittgenstein), na qual a identidade depende do uso que se faz das palavras, num determinado contexto. A filosofia da linguagem será criticada, por sua vez, pelos filósofos da diferença (Deleuze, Derrida, Foucault, entre outros), que pensarão a linguagem e a identidade como produções articuladas ao desejo e aos jogos do poder (GONDAR, 2002, p. 108).

A linguagem é indispensável para que haja relacionamento entre os membros de um mesmo grupo, e deste para com os demais que compõem a sociedade. É valor cultural porque construída em espaço impregnado de outros valores que dão sentido a vida humana. A linguagem é construtora do mundo que cerca os indivíduos, é fazedora de verdades, porque código de construção humana. “Só as declarações-enunciados podem ser verdadeiras, mas o mundo não pode sê-lo. Os seres humanos fazem verdades ao fazerem linguagens nas quais formulam essas declarações” (PORTY, 1995, p. 31). Aqui “a linguagem é sobretudo um código, um meio de representação, que também opera como meio de expressão...” (VOTRE, 2002, p. 98).

A linguagem muda o mundo quando os homens a mudam. A criação de um novo vocabulário ou discurso configura-se contribuição para conquistas revolucionárias que se efetivam nas artes, na ciência, no pensamento moral e

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político, com caráter de inovação (VOTRE, 2002, p. 100). Ademais, é próprio da linguagem ter sentidos, o literal e o metafórico. Se aquele conserva, este abre-se a novas teorias, torna o interlocutor diferente.

O sentido literal e o sentido metafórico correspondem a usos familiares e não-familiares de sons e letras, ruídos e sinais, significantes. Enquanto o uso literal supõe teorias antigas, o uso metafórico leva a desenvolver novas teorias. Lançar uma nova metáfora é produzir um novo efeito no interlocutor, torná-lo diferente. A nova metáfora, enquanto nova, não pode ser parafraseada. No momento em que o puder, estará moribunda ou morta, caminhando para o sentido literal (VOTRE, 2002, p. 100-1).

O dialeto caipira, um dos que compoem as variedades dialetais no Brasil5, impõe-se como exemplo. Mesmo sob preconceitos e discriminações sofridos em relação à lingua dominante, sobreviveu, conservando-se como próprio ou caracterizador de um jeito de ser e de viver no mundo. No Brasil, deu-se esse processo de discriminação e preconceito em relação aos dialetos que foram surgindo, privilegiando a língua portuguesa como oficial, imposta abruptamente, negando as línguas indígenas e africanas. E mesmo entre os dialetos, foi-se valorizando mais uns do que outros: os do Centro-sul, por exemplo, privilegiados politicamente, e os do Norte e do Nordeste, depreciados (GUIMARÃES, 2004). Oficialmente, a imposição da língua portuguesa no Brasil como oficial aconteceu na segunda metade do século XVIII, por meio do Marques de Pombal.

no reinado de D. José I, de quem foi ministro o poderoso Sebastião José de Carvalho e Mello, conhecido pelo título de Marquês de Pombal (1750 a 1777), implantou-se uma política de imposição da língua portuguesa... Em 1770, Pombal ordenou aos mestres de língua latina que, ao receberem seus alunos, os instruíssem previamente, por seis meses, na língua portuguesa, usando a Gramatica portugueza, composta por Antônio José dos Reis Lobato (VILLALTA, 2004, p. 61).

As conseqüências ficaram evidentes com o passar dos anos. Houve uma redução de cerca de 1200 línguas que eram faladas para cerca 200 línguas que ainda sobrevivem no país. Destas, 150 são indígenas. Além dessa conseqüência quantitativa, a qualitativa: a moral dominante impôs-se sobre a cultura caipira, insistiu na subalternidade de seu dialeto. E a escola funcionou como mecanismo simbólico de distinção, contribuindo concretamente para as divisões sociais na sociedade brasileira: os que estudavam eram os que mais bem se colocavam nos espaços de trabalho no mundo urbano ou rural, e os sem estudos ficavam com os trabalhos menos remunerados e de menos prestígio social (GUMARÃES, 2004).

5 Guimarães (2004), em seus estudos lingüísticos através do Instituto de Estudos lingüísticos da

Universidade de Campinas, diz que no Brasil existem pelo menos sete dialetos, com cerca de vinte variações e subvariações. Os sete são estes: amazônico, nordestino, baiano, cuiabano, mineiro, sulista e fluminense.

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Para Martins (2007) o dialeto caipira é resultado de uma variação dialetal da língua portuguesa, muito influenciada pelo Nheengatu, a língua geral desenvolvida pelos jesuítas nos séculos XVI e XVII. A base do Nheengatu foram o vocabulário e a pronúncia tupi, a língua das tribos da costa brasileira, e sua referência à gramática da língua portuguesa, tendo sido inclusas palavras portuguesas e espanholas. Então foi das dificuldades de se falar o português que os que falavam o Nheengatu deram origem de fato ao dialeto caipira.

As sonoridades desse dialeto foram marcadas pelas dificuldades que índios e mestiços tiveram em pronunciar as palavras novas da língua portuguesa. E como a repressão lingüística não alcançava toda extensão territorial do Brasil, o dialeto caipira pode desenvolver-se mais em seu interior, na zona rural de regiões do Brasil e seus descendentes urbanizados. Fez-se, assim, língua de resistência ante a imposição da língua portuguesa, cuja finalidade era “legitimar a posse da terra e coibir o uso do Nheengatu, temido como forma de os missionários controlarem os índios. Esta política de imposição da língua portuguesa tinha um sentido claro de promover a dominação dos povos e a obediência ao monarca” (VILLALTA, 2004, p. 61).

O dialeto caipira foi fundamental para o processo de socialização das populações que o tinham como meio de comunicação e de construção de significado. Fazia parte do jeito de ser do caipira, da forma de se organizar e se relacionar, do modo como se relacionava com a própria natureza.

(No passado) as formas de vida e de trabalho e as relações sociais entre os moradores das zonas rurais construíram o dialeto caipira como o seu veículo de expressão e comunicação de significado. O dialeto caipira expressa uma forma de sociabilidade que tem na linguagem oral e na informalidade o meio para a conciliação de diferenças, resolução dos conflitos do cotidiano e a manutenção dos vínculos comunitários, necessários para a reprodução da vida material e espiritual do grupo em um meio rural marginalizado, como pode ser ilustrado pelos mutirões para a colheita, as reuniões para oração do terço ou para as festas e também pelo empenho na preservação dos laços familiares e no respeito aos idosos da comunidade. Não é possível, então, estabelecermos uma fronteira que separe a fala do idioma da vida econômica e da relação do grupo falante com a natureza (BUENO, 2009).

O dialeto caipira é, portanto, fruto do processo histórico-cultural vivido no Brasil. Como qualquer língua, é dinâmico, muda com o passar do tempo, é expressão do que se vive em determinado espaço; é também inventivo, de acordo com suas necessidades: “quando o novo aparece, o caipira inventa, a partir da matriz da palavra, algo que tem sentido para ele.” (MARTINS, apud Bueno, 2009). Em um determinado lugar, com língua própria, é que se faz presente o caipira, com sua cultura, construindo sua identidade, identificando-se com aquilo que dá sentido à sua existência. Etimologicamente, para Cascudo (1954, p. 223) duas são as origens vocabulares mais convincentes referidas ao termo caipira: caapora e curupira, ambos advindos da língua tupi. Traduzindo literalmente, caapora (caá = mato; pora = habitante) é aquele que habita no mato, gente rústica; já “curupira

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designa um ente fantástico, espécie de demônio, que vagueia pelo mato, e só como alcunha injuriosa poderia ser aplicado aos camponeses” (CASCUDO, 1954, p. 223)6.

Estudioso do Tupi na geografia nacional, Sampaio (apud Cascudo, 1954) faz provir caipira de cai-píra, o envergonhado, o tímido. Para Beaurepaire-Rohan (apud Cascudo, 1954, p. 223), caipira é nome que se refere a vários habitantes do campo, que tem seus correspondentes nos vários Estados brasileiros:

Equivale a labrego, aldeão e camponês em Portugal; roceiro no Rio de Janeiro, Mato Grosso e Pará; tapiocano, babaquara e muxuangro, em Campos dos Goitacases; matuto em Minas Gerais, Pernambuco, Paraíba do Norte, Rio Grande do Norte e Alagoas; casaca e bahiano no Piauí; guasca no Rio Grande do Sul; curau em Sergipe; e finalmente tabaréu na Bahia, Sergipe, Maranhão e Pará (BEAUREPAIRE-ROHAN apud Cascudo, 1954, p. 223).

Segundo Silveira (apud Cascudo, 1954, p. 223), caipira é “Homem ou mulher que não mora na povoação, que não tem instrução ou trato social, que não sabe vestir-se ou apresentar-se em público”. Para Houaiss (2003), o caipira é alguém acanhado, inibido, inseguro, tímido. Ou

Aquele que vive no interior, fora dos centros urbanos, no campo ou na roça; roceiro. (Aquele) que leva vida campestre, rústica, tem pouca instrução, pouco convívio social, e hábitos e modos rudes (por vezes). Aquele que é tímido, acanhado, pouco sociável, que é avarento, sovina, mesquinho. Indivíduo caracterizado pela cultura de subsistência, pela cultura itinerante e por não ter posse da terra. (...) indivíduo simplório, habitante do campo, de pouca instrução e modos pouco refinados. Malandro, vazio (HOUAISS, 2003, p. 116)7.

Já para Rennhack (et alii, 2001, p. 85), caipira é “pessoa do interior, indivíduo

do campo. Pessoa de mau gosto, cafona. Pessoa pura, fiel às raízes, interiorano, provinciano” Há outros termos cujo significado se aproxima do jeito de ser do caipira, como caipirada: “grupo ou ajuntamento de caipiras: ação, atitude, hábito ou comportamento próprio ou típico de caipira („roceiro‟, „rude‟, „cafona‟); caipiragem, caipirice...” (HAUAISS, 2001, p. 564). Caipirismo refere-se ao conjunto de elementos ou sistema que compõe o mundo caipira e o seu modo de ser nesse mundo, incluindo sua linguagem, seus trajes, costumes e hábitos. Refere-se à “ação ou dito próprio do caipira...” (LAROUSSE, 2001, p. 143).

O ponto inicial para melhor compreender a formação da sociedade e da cultura caipira, segundo Cândido (1979), é analisar o processo de povoamento que se deu no Brasil por meio das bandeiras, atividade por si só nômades e predatórias. Esse processo foi ao mesmo tempo uma invasão ecológica e possibilidade de um

6 O mesmo autor lembra que, embora em Ponte-de-Lima, reino de Portugal, o homônimo caipira

signifique “sovino” e “mesquinho”, não se pode duvidar de que seja de origem brasileira, de que fora levado para aquela região e lá tivesse uma ressignificação. 7 Outros: araruama, arigó, babaquara, babeco, baiano, brocoió, bruaqueiro, caapora, caboclo, caburé,

caiçara, capa-bode, capiau, capuava, cascudo, casca-grossa, catimbó, groteiro, jeca, jeca-tatu, mateiro, matuto, mocó, mocorongo, pé-duro, roceiro, sertanejo (HOUAISS, 2003, p. 116).

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determinado tipo de sociabilidade, com formas próprias de uso do solo e novas relações inter e intragrupais. Aos poucos “a vida social do caipira assimilou e conservou os elementos condicionados pelas suas origens nômades” (CÂNDIDO, 1979, p. 37). Por isso seu espaço foi tendo também caráter de efemeridade. Conjuga-se a essa condição a autonomia do caipira em relação a quase tudo de que precisava para viver. Basicamente o sal é que buscava na cidade. Sob esse ótica é que se pode compreender o porquê de sua morada ser feita provisoriamente, de palha ou pau-a-pique, e de não se fazer consumidor de produtos da cidade. No que tange à literatura brasileira, seja de caráter ficcional, documental ou histórico, há produção rica em narrativas que tratam do caipira, do modo como é e vive: da sua cosmovisão espacial e temporal, sua linguagem, seus costumes, seu modo de ser no mundo. No caso específico do caipira, há obras que merecem menção, por descrever minuciosamente as coisas à sua volta e suas práticas cotidianas. Oscar Leal, um jovem carioca que passou por terras goianas na segunda metade do século XIX, caracteriza o caipira dessa região: é capaz de perdoar, de relevar, tem preguiça e é negligente (LEAL, 1980). Diz também de seus costumes e de sua casa: “...onde as jovens ficam da cozinha espreitando-nos pelas fendas das paredes mal barradas, onde os porcos andam dentro de casa com a mesma liberdade que têm no chiqueiro, onde de um banco se faz uma mesa...” (LEAL, 1980, p. 69). Quando de passagem por Pirenópolis, comenta: “nesta cidade assim como em vários pontos do Estado o povo é dócil, afável, porém, desconfiado. (...) À exceção de seis famílias, as senhoras e moças só aparecem na rua de noite ou aliás ao domingo por ocasião da missa” (LEAL, 1980, p. 74). Leal não vê civilidade no modo de ser do caipira.

Um sistema claustral, estúpido, abominável mais próprio de caipiras do que de gente que se preza de civilizada. (...) Em Pirenópolis assim como em outros pontos de Goiás não é costume as senhoras sentarem-se à mesa nas horas de refeição. (...) É costume geralmente servirem-se os homens de casa e depois as senhoras que as mais das vezes comem na cozinha... (LEAL, 1980, p. 76).

Considerando o sentido geral dado ao caipira que se caracteriza sob vários nomes, conforme Beaurepaire-Rohan (apud Cascudo, 1954, p. 223), o caipira do nordeste, chamado sertanejo, é homem forte, desengonçado e humilde.

O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral. A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecável, o desempenho, a estrutura corretíssima das organizações atléticas. É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Quasímodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fracos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gigante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados. Agrava-o a postura normalmente abatida, num manifestar de displicência que lhe dá um caráter de humildade deprimente (CUNHA, 1999, p. 142).

Cunha (1999) diz ser o sertanejo trabalhador um cansado, perenemente audacioso e forte, “passando da máxima quietude à máxima agitação; da rede

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preguiçosa e cômoda para o lombilho duro, que o arrebata, como um reio, pelos arrastadores estreitos, em busca das malhadas. Reflete, nestas aparências que se contrabatem, a própria natureza que o rodeia” (CUNHA, 1999, p. 145). Ademais, o sertanejo dos sertões do Brasil busca em Deus a justificativa de sua condição: “entende que cada qual deve ser tão bom como tão bom, que em nada existe diferença (...). Eu já encontrei uma mulher apatacada, que me disse não usar de dentes postiços porque sendo Deus quem a puzera no mundo e lhos tirara, não havia de gostar...!” (LEAL, 1980, p. 68). Dentre os vários termos utilizados para designar o caipira, vários tem sentido depreciativo, tendo-o como incapaz de realizar certas ações devido a sua falta de instrução, de capacidade cognitiva e de relacionar-se com malícia. Assim, torna-se sujeito de fácil engano, incapaz de fugir das armadilhas dos mais instruídos. Na literatura, contrariamente, há escritores que destacam a “Esperteza de caipira”, como em um conto – que assim se intitula – do escritor goiano Pedro Gomes8. Vários são outros que destacam a figura do caipira nas suas características relativas à sua cultura, com seus traços identitários9.

4. Cena, olhar e identificação

A história do cinema reserva uma infinidade de importantes surpresas. De repente, com o passar dos anos, um aparelho chamado “cinematógrapho”, criado pelos irmãos Lumière para experiências científicas de movimento, no final do século XIX, transforma-se no maior criador de ilusões da era moderna (BERNARDET, 2006). “...o cinema é realmente uma arte, uma legítima forma de expressão cultural” (CARRIÉRE, 2006, p. 167). Pela imagem, confere realidade a coisas impossíveis de serem “reais” de outra forma, senão por essa. O cinema traz a novidade da ilusão. “O cinema dá a impressão de que é a própria vida que vemos na tela, brigas verdadeiras, amores verdadeiros” (BERNARDET, 2006). Também confere realidade às fantasias. Substancialmente, é imposição da própria realidade de forma vigorosa. O cinema possibilita a pessoa a se fazer também sujeito da trama que assiste, a reviver tempos e espaços.

8 Pedro Gomes narra o que aconteceu com Chico Rosa, um liquidante da empresa Ferraz & Cia que

cavalgou quilômetros para receber de qualquer jeito uma conta de Julião, caipira famoso na região de Jamimbu, próxima a Itapirapuã. Famoso por ser “estradeiro” que não pagava “nem fogo na roupa”. Julião recebe Chico Rosa gentilmente em sua casa e combina a quitação de sua dívida: levaria o seu cavalo preto, de sua mulher, com pagamento – mas nunca teve cavalo preto, apenas um branco. No dia seguinte o liquidante fora até Itapirapuã receber de outros devedores, tendo combinado com Julião que pousaria ali ao final daquele dia; mas que o cavalo ficasse preparado. Chegado o final da tarde, Chico Rosa decide pegar seu cavalo preto e seguir viagem. Feito isso, pousou à margem do Córrego Raizama, deixando ali próximo seu cavalo, peado. Passado aquela noite chuvosa, de manhã não encontrou seu cavalo. Aconteceu que Julião tinha ido lá, à noite, e levado o animal de volta para sua terra. Depois de procurá-lo sem sucesso, Chico Rosa vai até a casa de Julião, que indica direção contrária à de onde estaria o seu cavalo branco. Sim, agora branco, já que a chuva tirou toda a tinta que utilizou para torná-lo preto. E o ex-devedor meteu-se para dentro, com o fim de guardar, por seguro, a cuia onde que havia preparado a composição química de seu invento, resultante da mistura de sebo de vaca, carvão vegetal moído, azeite de mamona e leite de figueira brava, com que fizera do Rução, por algum tempo, um belo „cavalo preto‟, calçado de três pés, com uma estrela branca na testa... (DENÓFRIO E SILVA, 1992). 9 Mário Palmério escreveu Chapadão do Bugre e Vila dos Confins; Carmo Bernardes, Jurubatuba;

Bariani Ortencio, Paciência de Goiano; Bernardo Élis, A Enxada, dentre outros.

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O cinema consegue obter este impacto emocional, fundamental para a eficácia cognitiva do conceito-imagem, através de certas particularidades da técnica cinematográfica, das quais destaco as três: I) a pluriperspectiva, isto é, a capacidade que tem o cinema de saltar permanentemente da primeira pessoa (o que vê ou sente, o personagem) para a terceira (o que vê a câmara) e também para outras pessoas ou semipessoas que o cinema é capaz de construir, chegando ao fundo de uma subjetividade (...). II) Em segundo lugar, a quase infinita capacidade do cinema de manipular tempos e espaços, de avançar e retroceder, de impor novos tipos de espacialidade e temporalidade como só o sonho consegue fazer. III) Em terceiro lugar, o convite cinematográfico, a pontuação, a maneira particular de conectar cada imagem com a anterior, a sequência cinematográfica, a montagem de cada elemento, o fraseado cinematográfico (CABRERA, 2006, p. 31-2).

As primeiras imagens produzidas no Brasil datam do final do século de criação do cinematógrapho, poucos anos depois de os irmãos Lumière exibirem no Rio de Janeiro as primeiras imagens. Ainda no final desse século foi construída a primeira sala de cinema, também no Rio de Janeiro, e dez anos depois já existiam mais de vinte, muitas das quais com equipes de filmagens. O primeiro filme brasileiro de grande sucesso foi “Os Estranguladores”, de Francisco Marzullo (1906), com mais de 800 exibições no Rio. Nos anos seguintes outras produções foram encaminhadas, mas a partir de 1911, por cerca dos trinta anos seguintes, alguns imigrantes italianos (Gilberto Rossi, João Stamat e Arturo Carrari) tomariam conta do mercado cinematográfico nacional. Vittorio Capellaro e Antônio Campos produzem "Inocência" (1915) e "O Guarani" (1916); Luiz de Barros, valendo-se também de de obras de José de Alencar, produz "A Viuvinha" (1915), "Iracema" (1918) e "Ubirajara" (1919).

A Primeira Guerra Mundial provocou o enfraquecimento da produção cinematográfica européia. Em contrapartida, os Estados Unidos se estruturaram e, a partir de então, dominaram o mercado mundial. A difusão dos filmes estadunidenses supôs acordos comerciais entre os países que levaram, por conseguinte, à maior divulgação e consumo da produção estrangeira e dificuldades para produção interna (RAMOS, 1987). Depois do eixo Rio-São Paulo, o cinema nacional teve desenvolvimentos regionais, como os de Recife, Porto Alegre, Belo Horizonte, Campinas-SP, João Pessoa, Manaus e Curitiba. E essas regiões tornaram-se também consumidoras principalmente do que se produzia em Hollywood. Numa tentativa de seguir o ritmo Hollywoodiano, à moda brasileira, houve importante tentativa de industrialização do cinema aqui produzido.

Tratar temas do Brasil com a melhor tecnologia e linguagem mundiais foi o que seduziu um grupo de empresários e banqueiros paulistas que, ao lado de Franco Zampari, fundaram a primeira grande produtora de cinema nacional, a Vera Cruz, com estúdios e equipamentos de última geração, elencos fixos e diretores europeus (SALLES GOMES, 1980). 18 filmes são produzidos em 5 anos. Dentre eles, a comédia caipira intitulada “Candinho” (1954), o terceiro filme de Amácio Mazzaropi. Outras grandes produtoras, seguindo o mesmo intento da Vera Cruz, não conseguiram se desenvolver no mercado e foram à falência.

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A essa altura, produções de auto custo e com temáticas que muitos compreendiam ser de auto valor cultural parecia ser um caminho sem retorno. Produções de baixo valor, rápidas e de fácil comunicação com o público foi outra linha seguida, tendo o carnaval como tema principal. Inicia-se o período das chanchadas – temo espanhol que significa “porcaria”, mas que no Brasil, significou espetáculo com humor simplório (BUENO, 1996). A produtora Atlântida produz vários filmes nessa linha, como “Este mundo é um pandeiro” (1947) e “Carnaval no fogo” (1949). Como o apelo popular aí é contemplado, muitas outras produções seguem por essa mesma linha.

No final dos anos de 1950 o estilo chanchada decai. E é nesse período que cineastas brasileiros são intensamente influenciados pelo Neo-realismo italiano. Críticos à idéia de seguir o estilo Hollywoodiano, diretores como Alex Viany e Nelson Pereira dos Santos trabalharam na busca de um realismo brasileiro. Produziram, respetivamente, “Agulha no palheiro” (1953) e “Rio, 40 graus” (1955) (BERNARDET, 1979).

O Brasil dos conflitos políticos e sociais foi mostrado pelos que intencionavam produzir filmes que falassem da realidade concreta do país, e mais, que buscassem sua transformação. Inicia-se então o movimento cinematográfico intitulado Cinema Novo, a partir do início da década de 1960.

Até o golpe de Estado de 1964, o Cinema Novo concentra-se principalmente na temática rural. Três obras de grande destaque abordam a miséria dos camponeses nordestinos: Vidas Secas (Nelson Pereira dos Santos, 1964), Deus e o Diabo na Terra do Sol (Glauber Rocha, 1964) e Os Fuzis (Ruy Guerra, 1964). A finalidade temática não impede que os enfoques e os estilos sejam diversificados. Vidas Secas tem uma expressão discreta que situa o personagem centreal, Fabiano, e sua família, em relação ao trabalho, à propriedade da terra, às instituições, à cultura popular e erudita, à repressão policial, à submissão e a violência, etc. Enquanto Deus e o Diabo é uma espécie de ópera antropológica que lida com o misticismo e a violência como processo de revolta (BERNARDET, 2006, p. 102).

Na década de 1970, até a seguinte, surge a pornochanchada, gênero do

cinema brasileiro que trouxe elementos da chanchada, agora acrescidos de alta doze de erotismo. Grandes sucessos de bilheterias tiveram produções desse período. São filmes feitos para as massas, com forte influênca das comédias populares italianas (SOUZA, 1981).

“Mercado é cultura”. Essa era a palavra de ordem de um grupo importante dos que pensavam o cinema nacional. Com produções da Embrafilme, com as pornochanchadas, comédias do tipo “Os trapalhões” e com a obrigatoriedade de todos os cinemas brasileiros exibirem uma cota de filmes nacionais anualmente, as produções passaram a fazer parte o mercado cultural, do que depois convencionou-se chamar Indústria cultural. Produziam para o grande público, falando a sua linguagem – “Dona Flor e seus dois maridos” (1976) chegou a 11 milhões de expectadores, superando em bilheteria qualquer outro filme estrangeiro (SALLES GOMES, 1980).

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Nos anos seguintes o país é agravado pela crise econômica, pelo fim da ditadura militar e por crise na procução cinematográfica. O que se produzia tinha cada vez mais a preocupação mercadológica: produzia-se para o consumo fácil, valendo-se de temas simples e com forte caráter sexual ou de violência (BERNARDET, 2006).

É até esse período da história do cinama brasileiro em que atuou Amácio Mazzaropi, o filho de mãe portuguesa e de pai italiano que nasceu em abril de 1912, no bairro Santa Cecília, na capital de São Paulo. Mudaram dois anos depois para Taubaté. Mazzaropi ficou uma temporada com seu avó materno, um tocador de viola caipira, dançarino e animador de festas rurais, para as quais levava seu neto. Já desde criança decorava textos teatrais e apresentava-se em festividades escolares. Aos 14 anos começou a trabalhar no Circo La Paz, contando piadas. Atuou depois em vários teatros, como no Theatro Polytheama, em Taubaté, no cine Tremembé. Em março de 1934 ingressa na companhia teatral Olga Crutt, que depois tornara-se Troupe Mazzaropi devido a sua influência. No ano seguinte constroi um Pavilho, ou Teatro de Emergência: um barracão de táboas coberto de lonas, com cadeiras e bancos. Apresenta-se depois na capital e interior com a Troupe Companhia Amácio Mazzaropi. Quando enfrentava diviculdades financeiras devido a enfermidade do pai, foi convidado para substituir Orcarito em uma peça no Teatro João Caetano no Rio de Janeiro. Depois de dissolver seu pavilhão, resolve recompô-lo e instalá-lo em São Paulo (SALEM, 2009).

Em março de 1946 estreia na Rádio Tupi, com o programa Rancho Alegre. Fez muito sucesso contando piadas e cantando ao lado de um sanfoneiro. As Emissoras Associadas criam o Show Brigada da Alegria, com Mazzaropi e grande elenco, dentre eles Hebe Camargo. Passando por vários estados, foi criando um público fiel. Ao final daquele ano assina contrato com a Companhia Dercy Gonçalves e atua ao lado da famosa atriz na revista “Sabe lá o que é isso?”. É convidado para o show de estréia da primeira emissora de televisão brasileira, a TV Difusora de São Paulo, canal 3. Tornou-se, assim, o primeiro humorista na TV, atuando no Programa Rancho Alegre, ao lado de Geny Prado e sob a direção de Cassiano Gabus Mendes. Em 1951 já estava trabalhando na Rádio e TV Tupi de São Paulo e do Rio de Janeiro, além de apresentações em teatros (SALEM, 2009). Depois de ter um público formado e prestígio, Mazzaropi é convidado pelos diretores Abílio Pereira de almeida e Tom Payne para fazer um teste na Companhia Cinematográfica Vera Cruz. Então começa, aos 39 anos, sua atuação no cinema, sendo ator principal de “Sai da Frente”, que foi lançado em 15 de junho de 1952. Famoso, sua história é contada em jornais e na novela sertaneja “O meu mundo é aquele rancho” . Rapidamente a Vera Cruz projetou o segundo filme, “Nadando em dinheiro”, lançado naquele mesmo ano. O terceiro, “Candinho” (1953), foi lançado ainda pela Vera Cruz, que já mergulhava em crise financeira. “A Carrocinha” (1955) é produzido pela Fama Filmes e Produções Jaime Prades, e “O gato da madame” (1956) pela Brasil Filmes, com participação e estréia de Odete Lara no cinema. Pela Cinelândia Filmes, do Rio de Janeiro, e pela Cinedistri, de São Paulo, produz “O Fuzileiro do amor” (1956) e “O noivo da girafa” (1957). No ano seguinte, também pela Cinedistri, lança “Chico Fumaça” (SALEM, 2009). Até então Mazzaropi foi ator. Mas empolgado com o sucesso de bilheteria de seus filmes, e acostumado a múltiplas funções, monta sua própria produtora, a Produções Amácio Mazzaropi (PAM filmes). A partir de “O chofer de praça” (1958),

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será ator, diretor, produtor, argumentista ou roteirista em todos os seus 24 filmes seguintes10. Ao todo atuou em 32 filmes, produzidos até 1980. Montou uma grande produtora na Fazenda da Santa, em Taubaté-SP – inclusive com a metade dos equipamentos comprados da Vera Cruz –; trabalhou com artistas que se destacariam nas produções futuras de cinemas e telenovelas, como Tarcísio Meira, Luiz Gustavo, Hebe Camargo, Geny Prado e Agnaldo Rayol; e ganhou vários prêmios como o troféu Campeão de Bilheteria no 4º Festiva de Teresópolis. Em 1975 Mazzaropi investe numa mega construção do que seria o início da indústria do cinema brasileiro, o Hotel Studio PAM Filmes. E, por fim, veio a falecer em 1981, aos 69 anos, em meio a produção de “Maria tomba homem”. É associado ao caipira em exposições e eventos promovidos pelo Museu Mazzaropi, em Taubaté, que busca recuperar e divulgar a memória do ator (SALEM, 2009). O olhar dos que assistiam aos filmes de Mazzaropi se multiplicaram quanto ao gosto e às críticas: enquanto multidões lotavam os cinemas ou esperavam ansiosos pelo próximo lançamento, muitos dos críticos eram diretos e sem cerimônia classificando o autor caipira de “bitolado”, “fora de época” ou de “ganancioso”. Há quem diga que Mazzaropi seria um representante clássico do provincialismo paulista, que se faz mais rústico (e atrasado) do que outros atores que, explorando o mesmo gênero caipira, vieram antes dele, como Sebastião Arruda, Nhô Anastácio, Genésio Arruda e Cornélio Pires11. Não para poucos, seria também um aproveitador da ingenuidade do público para facilmente se enriquecer, já que parecia que de cultural suas produções nada traziam.

Mas o cinema por si só tem seu vigor, seu olhar automático, implacável, objetivo, isento dos preconceitos culturais e das interferências subjetivas.

É irônico que, justamente porque não tem „interioridade‟, o olhar da máquina possa atingir o princípio interior dos movimentos, revelar a

10

Em “Chofer de praça”, de 1958, foi produtor, roteirista, argumentista e ator; em “Jeca Tatu”, de 1959, foi produtor, roteirista, argumentista e ator; em “As aventuras de Pedro Malazartes”, de 1960, foi diretor, produtor e ator; em “Zé do piriquito”, de 1960, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “Tristeza do Jeca”, de 1961, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “O vendedor de lingüiça”, de 1962, foi produtor, argumentista e ator; em “Casinha pequenina”, de 1963, foi produtor, argumentista e ator; em “O Lamparina”, de 1964, foi produtor e ator; em “Meu Japão brasileiro”, de 1964, foi produtor, roteirista e ator; em “O puritano da rua Augusta”, de 1965, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “O corinthiano”, de 1966, foi produtor, argumentista e ator; em “O Jeca e a freira”, de 1967, foi diretor, produtor, argumentista, roteirista e ator; em “No paraíso das solteironas”, de 1968, foi diretor, produtor, roteirista e ator; em “Uma pistola para D‟Jeca”, de 1969, foi produtor, argumentista, roteirista e ator; em “Betão ronca ferro”, de 1970, foi produtor, argumentista e ator; em “O grande xerife”, de 1970, foi produtor, argumentista e ator; em “Um caipira em Bariloche”, de 1973, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “Portugal, minha saudade”, de 1973, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “O Jeca macumbeiro”, de 1974, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “Jeca contra o capeta”, de 1975, foi diretor, produtor, argumentista e ator; em “Jecão, um fofoqueiro no céu”, de 1977, foi diretor, produtor, argumentista, roteirista e ator; em “Jeca e seu filho preto”, de 1978, foi produtor, argumentista e ator; em “A banda das velhas virgens”, de 1979, foi diretor, produtor, argumentista, roteirista e ator; por fim, em “O Jeca e a égua milagrosa”, de 1980, foi diretor, produtor, argumentista, roteirista e ator. 11

Cornélio Pires, paulista de Tietê, destaca-se por ter sido o primeiro a gravar música caipira no Brasil, em 1929, e a divulgá-la com seu grupo “Turma de Cornélio Pires”, em um Teatro Ambulante. O primeiro disco caipira, produzido pela Columbia, em 78 rotações, trazia de um lado “Jorginho do Sertão” e , do outro, “Moda de Pião”, ambas de autoria de Cornélio. (Fonte: http://www.widesoft.com.br/users/pcastro4/glosscp.htm).

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verdade que, organicamente, expressa-se em sentido pleno, imprime-se numa textura do mundo que só a câmara é capaz de registrar. O próprio instantâneo fotográfico, em sua estrutura mais simples, já nos mostra quanto a imagem revelada faz emergir dados ocultos que não estavam na mira fotógrafo (XAVIER, 2003, p. 42).

O cinema produz imaginário, estando aí, provavelmente, sua força. Esta que se desmembra em sua dimensão tecnológica, mas sobretudo na simbólica:

o cinema é tanto uma maquinação (uma máquina de pensamento) quanto uma maquinaria, tanto uma experiência psíquica quanto um fenômeno físico-perceptivo. Sua maquinaria é não só produtora de imagens como também geradora de afetos, e dotada de um fantástico poder sobre o imaginário dos espectadores. A máquina do cinema reintroduz assim o Sujeito na imagem, mas desta vez do lado do espectador e do seu investimento imaginário, não do lado da assinatura do artista (DUBOIS, 2004, p. 44-5).

E foi com essa máquina que Mazzaropi produziu falando do caipirismo, do

caipira e do que compõe o seu modo de ser e de viver. Caipira esse materializado no personagem Jeca, do “Jeca Tatu” que fora idealizado por Monteiro Lobato, que escreveu “Jeca Tatuzinho” em 1924 – ou idealizado pelo próprio Cornélio Pires, conforme alguns estudiosos. O fato é que esse personagem causou impacto deveras importante e suscitou discussão entre os que teorizavam o cinema nacional. Ele mesmo fez sucesso logo no primeiro filme, produzido pela maior produtora nacional, a Vera Cruz. No segundo, já nem tanto, mas quando “Candinho” é lançado, o jeito caipira parecia encarnar-se nele definitivamente. E o caipira – cujo jeito de ser foi por ele muito estudado, quando percorreu várias regiões observando seus hábitos e costumes – era alguém presente também na cidade grande, e o que fazia era interpretá-lo do modo mais original possível.

(sobre a caracterização) de caipira? É o que a vida oferece. Não precisa ir muito longe, é só ir para o lado de Socorro, Santo Amaro, que já se encontra esse tipo que faço. Você viaja pelo interior e vê gente desse tipo. Aliás, havia críticos no início que diziam que eu fazia um caipira estilizado. Não é estilizado não. Eles que não têm conhecimento da realidade brasileira. Lêem livros de Monteiro Lobato e de outros escritores, mas interpretam da maneira deles... Como não convivem com o caipira, com o pessoal da roça, acham que não é daquele jeito. Acham que caipira tem que ser como o da festa de São João, em baile de Santo Antônio. Isto sim que é estilização (MAZZAROPI, apud Wolf, 1978).

Tão logo os filmes de Mazzaropi foram ocupando os espaços da grande crítica, não tardaram os que subestimavam o seu gênero. Loyola, que até parece compreender o porquê de Mazzaropi conseguir grande público e dinheiro, referindo-se a um de seus filmes faz crítica depreciativa direta à cultura brasileira, medíocre por apreciar filme como os do ator caipira.

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Nosso povo vive dentro de um estágio cultural condicionado pelo subdesenvolvimento. Sob tal condição, é natural que a exaltação da mediocridade vingue. Compreende-se que o homem do povo aceite, até por desfastio, o cinema banal, vulgar, incipiente, imbecil. Falta-lhe, além de um gosto apurado, a oportunidade de conhecer obras superiores. Todavia, quando um homem tido como de cultura, tendo em suas mãos um instrumento de divulgação, senta-se numa poltrona de cinema e aprecia o vulgarismo, a imbecilidade, o primarismo (e ainda recomenda como de alto teor), então, é a mediocridade, é o andar para trás. Neste caso, ele se emparelha àquele que, na tela, vende por baixo preço, a cretinice. Isto vem a propósito de Meu Japão Brasileiro e sua indicação por aquele que em tempos idos foi eminente e respeitado crítico cinematográfico, mas hoje vive a destilar o ódio da frustração. Infelizmente, Mazza está certo dentro do seu raciocínio que não é longo, ao contrário. Primarismo ainda faz dinheiro. E é incompreensível que homens de talento (?) defendam e estimulem este tipo de atitude. Julgando-se gênio incompreendido, Mazza escreve, dirige, produz, canta e procura cercar-se sempre de gente com nível mais baixo que o dele na realização de suas películas (LOYOLA, 1965).

Contrariamente, outros bem conceituados no mundo da crítica cinematográfica encontram valores a destacar em suas obras. “Utilizando o inverossímil, o lugar comum e a linguagem cabocla, Mazzaropi defende uma moral tradicional. E também brinca com o público” (TAVARES, 1976). Para Paulo Emílio, o lugar comum é sempre verdadeiro e aprofundá-lo é o desafio que se impõe. “Mazzaropi não aprofunda propriamente nada, mas os lugares comuns se acumulam tanto que o terreno acaba cedendo e como muitas descobertas ao acaso de desbarrancamentos, de repente desponta dessas fitas incríveis uma inesperada poesia". (EMÍLIO, apud Tavares, 1976). De fato, o que acabava sendo desconfortável para muitos críticos era o fato de os filmes de Mazzaropi fugirem às regras ou vieses comuns. Tratava-se de um ator não acadêmico que controlava desde as montagens das argumentações e roteiros, custos, passando pela distribuição das películas em todo território nacional até a arrecadação nas bilheterias. Embora tivesse alguns atores que depois tornar-se-iam famosos nacionalmente, a grade maioria era composta de amadores e muitas cenas surgiam de improvisos, com o desenrolar das filmagens. Tecnicamente, em certas passagens, são visíveis falhas que evidenciam um certo amadorismo de montagem. Sua companhia distribuidora, a PAM filmes, sediou-se em seis capitais brasileiras. E o resultado disso foi que durante 28 anos todos os seus filmes fizeram sucesso. Seu faturamento era, em média, de duas a três vezes mais o que o custo de produção.

Mas o chamativo das produções de Mazzaropi vai para além do aparato técnico ou pessoal. O conteúdo parece se impor com veemência. Ele é o conteúdo, porque é o mais próximo do caipira mais original e de seu caipirismo – do seu jeito de falar, de agir, de conduzir as relações, de melhor se colocar, esteticamente, em meio ao cenário também caipira.

Por tudo isso, sua condição dentro de cenário cinematográfico brasileiro se destacou, fazendo-se alvo de olhares diversos. E afora as multiplicidades dos olhares que também se colocam no campo da contingência, algo, para muitos,

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parece indiscutível: “verdade seja dita, é o dele o cinema mais popular feito por aqui” (BERNARDET, 1978). Suas produções, como quaisquer outras, dão-se em meio a uma determinada cultura em movimento. Cada personagem ou trama em desenvolvimento está vinculada a um espaço e tempo específicos e todos estão interligados por um sistema de significação. O sentido dado às coisas reflete as matizes comuns que ligam e interligam as pessoas, seus lugares e seus desejos, possibilitando a coesão do grupo. Assim partilham espaços, língua, trabalho e tudo que vai dando sentido à existência, coletivamente, mas supondo diferenças dentro de uma estrutura de classificação própria das sociedades, produzidas pelos sistemas sociais e simbólicos. Nesse sentido, cultura popular é um jeito próprio de viver a cultura, de estar no mundo. E se em tempos de natureza estática das coisas as culturas classificavam-se em superioras ou inferiores, puras ou impuras, os estudos sobre identidades apontam outro caminho: o da diferença, da identificação e do reconhecimento. Considera-se para isso que as coisas que compõem a cotidianidade dos indivíduos (espaço, objetos, fala) podem tornar-se símbolos, significando algo que deem sentido à própria existência. Isso acontece no tempo histórico. Por isso a realidade presente é fruto também do passado e a ele está interligada. Assim as coisas vão significando e, quando distanciadas, podem aproximar-se mediante a identificação, que se dá no reconhecimento de alguma origem comum. Perguntado sobre o que vinha a ser cultura popular, Mazzaropi responde, deixando subentendido nas entrelinhas de sua fala que o povo o entende, mas os intelectuais, não: “(cultura popular são) as raízes do povo brasileiro. Assim, negar o caipira brasileiro é negar a própria raiz. Acho que cultura é justamente não esquecer o passado, não esquecer nossas tradições... O meu público está comigo há 40 anos e não me larga. Quer dizer que ele me entende" (MAZZAROPI, apud Abreu, 2009). Os espaços das manifestações culturais são diferentes. Podem ser estriado: “sedentário”, “constituído de funções formadas”, e de “sedimentações históricas”, “esquadrinhado”; ou liso: que prioriza as “direções”, as “intensidades” e as “qualidades que atingem as forças sensitivas”. Nas produções de Mazzaropi isso se evidencia: diferentemente da casa do fazendeiro – que não compartilha experiências caipiras essenciais –, o rancho de pau-a-pique, de adobe ou de madeira e coberto de palha ou “telha comum”, presentes em vários filmes de Mazzaropi12, traz as marcas da provisoriedade. São feitos para tempo breve, por isso sem detalhes e com funções variadas. Dentro de seu rancho o Jeca se assenta no “rabo do fogão” à lenha, roupas secam em “varal” ali mesmo. Em alguns de seus ranchos não há divisória de sala, quarto ou cozinha: existe um só cômodo onde o caipira e sua família jantam, acolhem visitas ou animais como cachorro ou galinhas, pilam arroz, têm montado o oratório com imagens de santos, flores e terço. As paredes estão pontilhadas de objetos como lamparinas, arreio, quadros de santos, peneiras de abanar arroz, réstia de alho, bule de café, espingarda, chapéu, cabaça, mais uma infinidade de objetos. Do lado de fora, nas paredes, crânio de vaca, para espantar “mau olhado”, bacia de banho, ferramentas. À volta de seu rancho não existem

12

Dentre eles, “Jeca Tatu” (1959), “Tristeza do Jeca” (1961), “O Jeca e a freira” (1967) e “Jeca contra o capeta” (1975).

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plantações, mas pasto, colonos e grandes fazendas. Aquele espaço em tempo passado teve a presença de mais pessoas, mas mesmas que, em decorrência do êxodo rural, foram para as cidades grandes, impulsionadas pelo progresso.

Sua presença por vezes incomoda. Em “Jeca Tatu” (1959), seu rancho e pequena propriedade são um “atrapalho” para o interesseiro Geovane, o fazendeiro descendente de italiano que faz tudo para expulsá-lo dali e ampliar sua plantação. Mas a insistência em ali ficar após seguidas tentativas de expulsão – Jeca tem inclusive seu rancho queimado pelo próprio Geovane – tem, no campo social, um caráter de resistência ante à ampliação e insistência de outro espaço (esquadrinhado) que se impõe. Jeca abandona o lugar, mas constrói outro rancho em fazenda próxima, com a colaboração de outros colonos vizinho. Ademais, Jeca fala do mundo que fez parte da vida de muitos dos que moram na cidade grande. Seus filmes, com a força própria da cena e do olhar, aproximaram o distante, tornou presente o ausente.

Em determinado espaço cultural está também a linguagem como parte da cultura, necessária à articulação. É construtora de sentido, mas também articulada ao desejo e aos jogos de poder. É construção histórica, fruto das relações entre pessoas e grupos. Linguagem é código que pode ter vários sentidos. E assim como a língua portuguesa foi se impondo sobre os povos do Brasil, o dialeto caipira foi se construindo, sendo um reforço à própria identidade de quem o falava e se impondo como resistência. Por isso muitas palavras13 ou expressões caipiras14, mataforicamente, funcionam como armas contra os que inferiorizam o dialeto caipira. São criadas em situações particulares para, a seu modo, zombar de quem procura tirar-lhe proveito. Em “Tristeza do Jeca” (1961), quando este conversa com um dos filhos de seu patrão e o capataz da fazenda, aquele diz não conhecer “a psicologia do caboclo”. Jeca se sente ofendido e pede para a esposa se afastar, achando ser expressão imoral. Depois diz “atrair”, e o capaz o corrige. Então Jeca diz saber conjugar verbo, que aprendera com sua professora a conjugá-lo desta forma: “Eu, tu traíra, ele trairova...”. Enraivecidos, os visitantes saem. Assim, o dialeto caipira, como linguagem, é característica identitária do indivíduo caipira, que também se identifica com espaço próprio e faz parte de um jeito cultural, de um modo de ser no mundo. O caipira é sujeito de ações específicas, diferentes, simbólicas, tem sua identidade, mesmo que em movimento. E se assim

13

Vários personagens de Mazarropi utilizam palavras com significado próprio, construídas a partir de seu meio e suas relações: Coisando: fazendo alguma coisa (Candinho, 1953); Corecta: correta (As aventuras de Pedro Malasartes, 1960); Desprazer (“eu vou com muito desprazer”): prazer (Casinha Pequenina, 1963); Exerte: existe (As aventuras...); Folosofo: filósofo (As aventuras...); Infinicidade: infelicidade (As aventuras...); e Pira (“Dá o pira”): sair, retirar-se. (Candinho, 1953). 14

Analfabeto de pai e mãe: sem boas maneiras (Tristeza do Jeca, 1961); Beber água da cirola: apaixonar-se (Casinha Pequenina, 1963); Com faca não se brinda (Candinho, 1953); Fora de distribuição: fora de sintonia, desarticulado, impossibilitado de fazer algo (O Jeca Macumbeiro, 1975); Gente de sangue azul: gente “chic”, da cidade grande, civilizada (Casinha Pequenina, 1963); Loteria espiritiva: loteria esportiva (O Jeca Macumbeiro, 1975); O hóspede, por mais ordinário que seja, deve ser servido em primeiro lugar (Candinho, 1953); Pão com mortandélia: pão com mortandela (O Jeca Macumbeiro, 1975); Pobre é assim: quando não tem, quer ter; quanto tem, não sabe o que faz. (O Jeca Macumbeiro, 1975); Quando Deus dá o saco, o diabo carrega a farinha. (O Jeca Macumbeiro, 1975); Quanto mais alto, maior é o tombo. (Tristeza do Jeca, 1961); Sete palmos de terra: túmulo (Casinha Pequenina, 1963); Toca-gado (sentido duplo: tocar gado e defecar) (O Jeca Macumbeiro, 1975); e Mulher de vida fácil: Prostituta. (Candinho, 1953).

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se constitui, é porque o caipirismo, o complexo identitário do qual o caipira é parte e sujeito, é resultado de um construto histórico de embates e que o liga a um tempo, espaço e símbolos do presente – enraizados no passado – que foi moldando o jeito de ser do caipira, de sua falar, de seu vestir-se, do seu viver. Então o caipira é fruto do seu meio que também é construído por ele. É diferente do homem urbano, da civilização, identificado com o que ordinariamente faz parte do seu caipirismo. Não considerá-lo assim talvez seja o ponto primaz gerador do preconceito contra ele.

Tendo conseguido elaborar formas de equilíbrio ecológico e social, o caipira se apegou a elas como expressão da sua própria razão de ser, enquanto tipo de cultura e sociabilidade. Daí o atraso que feriu a atenção de Santi-Hilaire e criou tantos estereótipos, fixados sinteticamente de maneira injusta, brilhante e caricatural, já neste século (séc. XX), no “Jeca Tatu” de Monteiro Lobato (CÂNDIDO, 1979, p. 82).

O caipira não foi feito para o progresso. Sua mudança é o seu fim, “porque

(sua cultura) está baseada em tipos tão precários de ajustamento ecológico e social, que a alteração destes provoca a derrocada das formas de cultura por eles condicionada” (CÂNDIDO, 1979, p. 82). O progresso se dá na expansão do capitalismo, concretizado no processo de industrialização das cidades e, posteriormente, do campo. A tecnologia facilita o trabalho, diminuiu custos, aumenta a produção, mas exige mudança nas relações entre patrão e empregados, entre a lida propriamente com a terra. Como resultado final vem o lucro que pode propiciar outros espaços, outras relações e “superioridade” entre os que não têm capital. O progresso exige refazer o sentido simbólico dado às coisas, já que estas podem mudar quando ele vai se efetivando.

O caipira presente nas produções de Mazzaropi é o caipira paulista que, aliás, ele conhecia muito bem o seu jeito e de que gostava devido as suas experiências exteriorizadas em apresentações teatrais e circenses. Não é o caipira de “Sertão sem fim” de Bariani Ortencio, que tem em seu quintal muitas plantações.

Seu espaço, o do Mazzaropi, exceto seu rancho, não é tão matreiro, tão rústico. Pessoalmente, sim, está sempre de calça curta, de cirola amarrada à cintura com corda, de botina rasgada, camisa xadrez, chapéu e seu inseparável cachimbo ou cigarro de palha. É um colono submisso ao grande fazendeiro, mas que tem originalidade, que é diferente, por isso não se curva passivamente ante às suas imposições – de ofensa moral, geralmente, ou simbólica – das quais discorda; mas também não é contestador das estruturas sócio-econômicas. Para ele as coisas são dadas. Não se sente injustiçado por ser pobre economicamente, por isso não tem pretensões quanto à riqueza e preocupa-se com o mínimo vital – sua preguiça é problema para o fazendeiro, não para ele ou seus colegas. Jeca e sua família são pobres, mas são honestos. “Do que vale ter dinheiro, se não tem honradez”. Para o caipira fundamental são os valores morais. Mazzaropi trabalha essa temática em vários filmes, como em “O Jeca e a freira” (1967). Aqui a filha de um fazendeiro, apaixonada pelo filho do Jeca, diz que ele herdou do pai “a coisa mais importante desse mundo, a sinceridade”.

Os valores morais têm ocupações claras: materializam-se nas instituições presentes: na família, na Igreja, na delegacia. Essas instituições não são questionadas, conservam-se naturalmente. Quanto à família, por exemplo, diz:

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“lugar de mulher é na cozinha”, filho tem que ouvir os conselhos dos pais, marido não pode trair a esposa e o que conta é o amor dos pais pelo filho, e não a cor deste ou de onde ele veio (Jeca e seu filho preto, 1978).

Jeca é líder político, não por vocação, mas devido as condições. É procurado por outros quando se sentem vitimados (Meu Japão brasileiro, 1964). É pobre, mas não é bobo (Tristeza do Jeca, 1961). Pelo contrário, é muito esperto, a seu modo. “As aventuras de Pedro Malasartes” (1960) talvez seja o filme que mais evidencia essa característica identitária do caipira de Mazzaropi, a esperteza. Sai de casa, andando pelo mundo, com apenas um ganso e uma panela. Livra-se inclusive de processo em tribunal. No final, sua bondade e esperteza lhe possibilitam não passar fome, não ser preso e cuidar das crianças que encontrou pelo caminho.

Jeca não é dado a boas maneiras, próprias da gente da cidade grande, do povo civilizado. O Jeca de “Jeca Tatu” (1959), na cidade, difere-se dos demais no seu jeito de andar e vestir. Está de botina, chapéu, guarda-chuva – que não utiliza –, arrasta um cachorro amarrado a uma corada e é zombado pelos citadinos. Em sua casa cuspe ao chão e usa o tição do fogão a lenha para acender para acender seu cigarro ou cachimbo.

Em “Jecão, um fofoqueiro no céu” (1977), a condição social do caipira é dada por Deus. A esposa do Jecão, em choro após saber que seu marido morrera assassinado por alguém que tentou roubar sua mala de dinheiro, ganhado na loteria esportiva, diz que eram felizes em seu rancho, e que o dinheiro só trouxe problemas para sua família. E embora apresenta-se sempre como católico, ladeado por imagens de santos e oratório em casa, sua religiosidade é bem a seu modo, ao modo de seu tempo: neste filme e noutros participa de centro espírita, encarna-se e é encarnado por alguém que já morreu. Quando no céu, diz voltar à terra para encarnar-se e comunicar-se com sua família.

O caipira de Mazzaropi é cômico e as situações vividas é que lhe proporcionam o objeto de seu humor. Enquadra-se, seu humor, no que diz Comparato (1983): está ligado á crítica de costumes e de política, surge da inspiração do momento, das ações humanas dadas, é forma de tratar com comicidade assuntos sérios do cotidiano da vida, num determinado tempo, num determinado espaço, de acordo com a significação de sua realidade cultural específica. Mas também é à seu modo, meio absurdo. Em “O grande xerife” (1972), usa uma espingarda de cano torto, cujo projétil sai à direita, causando confusão quando dela faz uso. Às vezes seu humor é sutil, não provoca riso, mas exterioriza malícia e esperteza.

Como se vê, grande importância tem as produções de Mazzaropi porque elas provocam identificação. Ele valeu-se da força que tem as imagens ordenadas e que formam o cinema para comunicar valores fundamentais a um público que conhecia bem. Falou de lugares e situações impregnados no imaginário de seu público e que constituíam seu passado abandonado pelas mudanças provocadas pela nova ordem social que se impunha. Atiçou a identidade perdida, aproximou o distante, não filmou para impor um produto de consumo para suprir uma demanda comercial, como muitos de seu tempo fizeram, falando de realidades, artificialmente.

Mazzaropi atinge o arcaico da sociedade brasileira e de cada em de nós. Um inverso da redundância. Ele é estimulante quando repete e se repete incansavelmente e sem nos cansar. De tanto repetir, de

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repente, uma inesperada poesia. Sucede quando ele não está fazendo nada de especial, apenas olhando, andando ou pondo o fumo no pito. Mas, influenciado pelos seus cineastas, Mazzaropi os deixa fazer o cinema ruim dos bailes de carnaval ou de luta generalizada, no erotismo e na ação. São os momentos do filme em que os espectadores aproveitam para conversar e criticar (EMÍLIO, apud Barcelos, 1976).

Para Bernardet, isto explica o sucesso de Mazzaropi: ele fala da vida do povo que o assiste, de seus problemas, de seus hábitos.

Mazzaropi só tem sucesso porque seus filmes abordam problemas concretos, reais, que são vividos pelo imenso público que acorre a seus filmes. Não é só, porque é careteiro e tem um andar desengonçado. E porque põe na tela vivências e dificuldades de seus espectadores, e se assim não fosse, não teria o sucesso que tem. A temática de "Mazza" são problemas da terra, do camponês oprimido pelo latifundiário, dos intermediários entre o pequeno produtor agrícola e o mercado, das relações entre marido e mulher, pais e filhos, das religiões populares, etc. (BERNARDET, 1978).

Por fim, há caipirismo presente nas produções cinamatográficas de Amácio Mazzaropi. Sobretudo seus personagens, os caracteristicamente caipiras, personificam um sujeito histórico cujo modo de ser – de viver, de agir e de falar, de crer – revela elementos marcantes da identidade caipira que se identificaram com muitos dos que assistiram suas produções.

5. Conclusão

As discussões atuais de temáticas em torno da questão de identidades são pertinentes. Buscam tratar, de forma profunda e bem articulada, de assuntos tidos como quase que esgotadas no trato dado por pesquisadores. Mas de repente, a fixidez costumeira de referências paradigmáticas fazem-se flexíveis, mudando os focos a partir dos quais se pode olhar e reconceituar tudo que envolve o ser, o estar, o falar, o agir humano na história, na cultura. Novas fronteiras surgem, novas articulações são necessárias.

Por esse viés reflexivo, perspectivar um horizonte com pontos característicos da identidade caipira, de seu caipirismo, presentes nas produções cinematográficas de Amácio Mazzaropi, também se impõe como pertinente e desafiador. Pertinente porque a identidade caipira é campo aberto e farto para pesquisas sociais, históricas e culturais, dentre outras. E desafiador porque, mais do que insistir em chegar ao limite da discussão, em todo momento impõe-se a necessidade do contrário: de mostrar que o trabalho aqui elaborado abre caminho para discussões mais verticais e abrangentes, inclina-se à abertura de um aprofundamento maior.

As transformações ocorridas nas ultimas décadas têm gerado novas relações e um deslocamento espacial de pessoas e grupos que, por conseguinte, reconceituam a si mesmos e o mundo a sua volta. As coisas tornam-se símbolos mutantes, significam algo hoje, mas uma outra coisa amanhã. As reivindicações de grupos étnicos acorridas nos últimos tempos é um exemplo expressivo dessas

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transformações, porque reivindicam direitos novos a partir de novas transformações ocorridas.

Nesse sentido também o passado pode ser acolhido como objeto de releitura. A colonização, dentre outros temas, tem importância singular. Isso é olhar para o passado, reler os fatos sob outra referência, e dizer que aquilo ali pode ser outra coisa, que foi ou é outra coisa e não era – ou pelo menos não só – o que diziam que era. O caipirismo, o jeito de ser do caipira e o mundo caipira à sua volta – o espaço, a linguagem – é, senão um modo de ser e de viver no mundo, fruto de sua história e rede de significação construídas, pelo menos expressa marcas profundas, identitárias, de um jeito de ser e de viver. Jeito esse jamais estático, fixo, atrasado ou incapaz de influenciar e ser influenciado. E justamente por assim ser, sobrevive. Faz-se presente na lisura (ou “desordem”) espacial presente nos espaços urbanos, mesmo que reconstruído, remodelado, reconceituado; mas também nas palavras ou expressões proverbiais do dia a dia do homem do campo ou citadino.

Impõe-se, portanto, o caipirismo via produções de Mazzaropi, presente em museus de cinema, em espaços críticos e acadêmicos ou nas telas dos que adquirem, mesmo que em paralelo, seus filmes para relembrar tempos do passado vividos, e que ali se apresentam bem ordenados, cinematograficamente, em tempo e espaço do presente – o distante se faz próximo, o ausente se faz presente. E mesmo sendo o caipira de Mazzaropi um caipira paulista, descendente de italiano que parece não contestar a estrutura da sociedade de seu tempo, ele proporciona uma identificação, uma satisfação identitária. Referências ABREU, Nuno César. Anotações sobre Mazzaropi, o Jeca que não era tatu. Disponível em: http://www.museumazzaropi.com.br/crono.htm. Acesso: 20 de outubro de 2009. BARCELOS, Caco. O Jeca contra o tubarão. In: Jornal Movimento, 5 de abril de 1976. BERNARDET, Jean-Clauude. Cinema brasileiro: propostas para uma história. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979. . Nem pornô, nem policial: Mazzaropi. In: Última Hora, 22-3 de julho de 1978. . O que é cinema. São Paulo: Brasiliense, 2006. (Coleção primeiros passas, v. 9). BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. 4ª edição. São Paulo: Companhia das letras, 1992. BRANDÃO, Carlos Rodrigues. Os caipiras de São Paulo. São Paulo: Brasiliense, 1983. BUENO, Eva. O dialeto caipira: expressão não regulamentada e resistência. Disponível em: http://www.espacoacademico.com.br/073/73praxedes.htm. Acesso: 15 de outubro de 2009. BUENO, Francisco da Silveira. Minidicionário da língua portuguesa. São Paulo: FTD, 1996. CABRERA, Julio. O cinema pensa: uma introdução de Ryta Vinagre. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.

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