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I. O século XVIII entre o Rocaille e o Neoclassicismo
No século XVIII, a França definiu-se pela constância das suas tradições. A
monarquia dominava e as políticas e os costumes do Ancien Régime persistiram durante
todo o reinado de Luís XV e da sua influente concubina, Madame de Pompadour. A
aristocracia francesa recuperou a sua liberdade e dedicou-se a consolidar o poder durante
o longo governo de Luís XV. Porém, a riqueza continuava restrita a uns poucos
privilegiados e a era foi marcada pelo abismo entre ricos e pobres, entre aristocratas e
camponeses.
O artista como “libertino”; a mulher e os salons
A primeira metade do século é um tempo de decadência no qual as mulheres ditam
algumas coordenadas; estão presentes nos famosos salons e ditam o tom da civilização
como uma sociedade efeminizada. A liberdade é um conceito interpretado como
libertinagem. A sedução entre os sexos atinge patamares de devassidão até então e talvez
nunca mais conhecidos ou vistos; relações frias e calculistas em que, totalmente sem
sentimentos, o sexo é visto como um jogo de poder e não um entendimento sentimental.
O libertino/a, através de uma ausência total de sentimentos, impõe-se ao outro pela razão;
o outro é um objeto a ser conquistado e dominado. A crítica a este excesso de libertinagem
é que vai ser o motor dos iluministas.
A produção artística ao serviço da felicidade: o Rocaille
O Rocaille emergiu como estilo no século XVIII, em parte como reação às obras
de grande escala, movimento e colorido intenso, ou de sombras profundas, que
caracterizavam a centúria de seiscentos. As cores pastel, o pequeno formato e a delicada
representação de figuras e de cenários espelham a frivolidade e a extravagância da arte
do Rocaille, grandemente apreciada pela aristocracia.
Desenvolveu-se a partir do Barroco, mas em oposição direta ao seu espírito
grandioso e solene. A sua primeira aparição como estilo distinto verificou-se em França.
A ascensão do Rocaille em França acompanha o crescimento do poder da aristocracia, de
onde sairiam os seus principais clientes.
O pintor Jean-Antoine Watteau logrou captar o espírito optimista da sua clientela
e elevou o Rocaille a um estatuto que conquistou a estima geral. Foi Watteau quem criou
o género conhecido por fête galante (festa galante) e a subtileza manifestada na gradação
dos tons ajudou a consolidar a supremacia dos Rubenistas sobre os Poussinistas, no debate
que opôs a cor ao desenho. François Boucher e Jean-Honoré Fragonard prosseguiram a
tradição de paisagens e retratos alegóricos e sensuais.
Watteau Boucher Fragonard
As categorias pictóricas mais humildes da natureza morta e das cenas de género
ganharam novo alento com a obra de Chardin, cujas cenas, fruto de uma observação
cuidada, manifestam uma dignidade tranquila, assim como transmitem lições
moralizantes, ao estilo das tradições flamengas e holandesas do século anterior.
Contudo, foi nos interiores dos hôtels que o estilo Rocaille se apresentou mais
elaborado, exercendo uma influência que se disseminaria pela aristocracia e alta
burguesia europeias.
A commédia dell’arté
O sentido teatral do Rocaille aproxima-se da “commédia dell’arté”. A comédia
italiana estabeleceu-se em Paris, onde os seus enredos foram adaptados por Molière;
aparecem transpostas, estas comédias, para melancólicos Pierrots franceses nos quadros
de Watteau e vão ser os motivos mais populares para a nova arte menor da modelação da
porcelana.
O regresso do Classicismo e a apropriação dos modelos da Antiguidade
A notável evolução das nossas ideias leva-nos a crer avizinharem-se novas e mais
vultuosas transformações. Porém, só o futuro poderá avaliar os objetivos; a natureza, os
limites desta evolução e as suas desvantagens, apenas a posteridade saberá julgar com
exatidão os contornos desta extraordinária mudança, não nós, seus contemporâneos.
Jean d’Alembert
Roma por volta de 1760: Fonte do Neoclassicismo
Roma, cidade-mãe dos tesouros da Antiguidade e do Renascimento, detinha
inequivocamente o título de primeiro centro artístico mundial. A cidade atraiu um sem
fim de artistas em busca de inspiração, bem como os ricos viandantes do “Grand Tour”
da Itália. Descobertas arqueológicas então recentes (em especial as de Herculano e
Pompeia) tinham vindo reavivar o interesse pela Antiguidade junto dos académicos e dos
artistas. Nos seus influentes ensaios, o historiador de arte Johann Wickelmann encorajava
uma nova apreciação da arte grega, com base no que definiu como superioridade moral e
estética da mesma.
Na segunda metade do século XVIII, a cultura ocidental entrou na época
contemporânea e as populações foram obrigadas a adaptar-se de forma sucessiva e
constante, a novos valores políticos, mudanças nas condições socioeconómicas e novas
teorias científicas. A seu tempo, a industrialização viria, também ela, a espalhar-se por
todo o planeta. Para o florescimento da sociedade civil muito contribuiu a ascensão de
uma classe média endinheirada, ávida de novos luxos, incluindo obras de arte. Estas
mudanças têm raízes no Iluminismo.
O espírito das luzes
Com a mudança do modelo cartesiano para o modelo de Locke, onde tudo era
relativo e não existiam ideias inatas, tudo passou a ser questionado: a tradição deixou de
ser um argumento e as verdades, até agora, inquestionáveis são postas em causa. Para os
iluministas, o racionalismo permitia criticar o antigo e criar uma nova relação com o
mundo. Pretendiam a construção de uma nova sociedade, de um homem novo de acordo
com a austeridade e rigor, regras e moral.
O Iluminismo desmitifica o poder real, que deixa de ser visto como uma espécie
de Olimpo. Pela primeira vez acontece uma consciencialização dos custos económicos e
sociais das extravagancias da aristocracia. Termina o espanto respeitoso e começa a
Revolução que questiona o trabalho e o esforço do povo.
Chamou-se ao século XVIII a “Idade da Razão”; os homens começaram a recusar-
se a aceitar que o que estava estabelecido era o certo porque era antigo ou porque a
autoridade assim o determinava. Voltaire, Diderot e Montesquieu são os pensadores mais
destacados. A igreja deixou de ser o centro da existência e como o conceito de realeza
estava bastante abalado, não havia nada de grandioso para servir de inspiração.
O artista como “intelectual”
As mudanças sentidas na sociedade iriam invocar uma vez mais a imagem da
Antiguidade Clássica, num esforço para invocar um estilo sério e superior. O
Neoclassicismo encontraria em David um grande intérprete.
Jacques-Louis David foi o principal artista do neoclássico, grande figura virtuosa
e solitária, o “artista oficial” da revolução. Vive e participa na Revolução Francesa –
época do terror – mas para David a morte é necessária caso seja em prol de objetivos
maiores.
Surge Francisco Goya que é do mesmo tempo de David, mas que rejeita os
antigos. Representa o final de uma época e o início de outra, “o último pintor dos antigos
e o primeiro dos modernos”; a sua modernidade projeta-se muito além do século XIX.
Vive tempos tumultuosos e responde de forma muito sensível a esses tempos. Para Goya
as ideologias não são nada se não estiverem ao serviço das pessoas. É um homem do
Iluminismo, acredita nas ideias revolucionárias mas percebe que estas trouxeram novas
atrocidades e foram subvertidas.
As trajetórias de David e Goya são paralelas, mas completamente diferentes.
É nesta altura que surgem as grandes disciplinas da arte: a Crítica da Arte
(Diderot); a História da Arte (Wickelmann); a Estética e a Arqueologia. Para Diderot, a
pintura tinha a função pedagógica de formar as pessoas; a arte tinha como função dar
lições de virtude aos cidadãos e tornar odiosos os vícios.
Nos finais do século XVIII atingia-se os tempos realmente modernos que se
iniciariam quando a Revolução Francesa pôs fim a tantos princípios tidos como
verdadeiro desde sempre. Esta revolução deu um impulso enorme ao interesse pela
história e pela pintura de temas heroicos. Os revolucionários gostavam de ser
considerados gregos e romanos renascidos e a sua pintura refletia o apelo que era
designado como grandeza romana. Para o Neoclassicismo as formas clássicas eram
perfeitas e não podiam ser superadas.
Roma por volta de 1760: Fonte do Romantismo
Pela mesma altura, o Romantismo aparecia nas suas primeiras manifestações. O
gravador e editor Giovanni Piranesi prestou homenagem à Antiguidade romana com
teatrais vedute (vistas panorâmicas) das mais espantosas obras de arquitetura
monumental, edifícios que encarnavam o sublime, uma qualidade associada à vastidão
espacial, à obscuridade, ao poder e à infinitude que geravam no observador sentimentos
de um temor respeitoso, de susto, de terror, inclusive. Piranesi e outros adotaram, com
intensidade crescente, o culto do sublime, refletindo nas suas obras a procura de um
público interessado em obras de arte que evocassem emoções intensas, mesmo de medo
ou terror; que produzissem um efeito de transporte emocional.
II. A Génese do Mundo moderno: Romantismo
A ruptura com a tradição que marcou o período da Revolução Francesa iria alterar
toda a situação em que viviam e trabalhavam os artistas. Academias, exposições e críticos
tinham-se esforçados por introduzir uma distinção entre a arte e o oficio.
É impossível precisar o momento exato em que o Neoclassicismo morreu e deu lugar
ao Romantismo. Da mesma forma que os elementos neoclássicos e românticos – a razão
e a emoção – coexistiram nas várias artes durante o Iluminismo, de 1750 a 1789, o
Neoclassicismo e o Romantismo floresceram também lado a lado de 1789 a 1848, durante
os anos que medeiam entre a Revolução Francesa e as revoltas dos trabalhadores
europeus.
O Romantismo não oferece um estilo; existem tantos estilos como artistas. E por isso
é impossível caracterizá-lo em termos formais como até agora os estilos podiam ser
detalhados. No Romantismo, há uma busca pelas emoções intensas e poderosas; sendo
que a filosofia romântica assentava na ideia do sonho e da fantasia. Os românticos não
queriam estar no seu tempo e por isso evadiam-se através da mente, da imaginação.
O primeiro Romantismo Inglês (1780)
Em Inglaterra, o anseio pela ordem e pelo empirismo coexistiu com um desejo
igualmente forte de emoções e experiências subjetivas. Na arquitetura e no desenho
paisagístico, surgiram evocações neoclássicas de uma Antiguidade Nobre, de par com o
deleite romântico pelo exótico e pelo desejo de suscitar emoções poderosas e proibidas.
O gosto britânico pelo sublime traduziu-se, com êxito, no desenho paisagístico de jardins,
onde combinou, com particular felicidade, a interessante variedade do pitoresco com os
vários níveis de significado do associacionismo, conceitos levados à plenitude em solo
inglês. Ao mesmo tempo, o revivalismo gótico refletia as sensibilidades românticas, ao
realçar as emoções sublimes suscitadas por grandes espaços melancólicos. Os pintores
não ficaram imunes ao efeito ambivalente do apelo do neoclássico e Romântico e se
artistas como Stubbs e Wright souberam fundir as duas correntes em várias das suas obras,
outros, como Heinrich Fuseli, adotaram o terror sublime de alma e coração, transportando
os observadores para uma era romântica de forma teatral e intensa.
O artista como “dândi”
O sistema de mercado que se começou a impor no século XVIII abriu caminho a
uma certa liberdade. O artista, enquanto ser estranho e especial, tornara-se fascinante. O
Romantismo reconduziu a critica de arte, do objeto para o sujeito: descobrindo através da
obra a personalidade do artista criador. Foram os primeiros a dominar a intenção do
artista, a distinguir o impulso sincero, generoso e humano do artista autentico.
O artista era o único capaz de transmitir a sensação da dor na alma que é provocada
pela relação com a realidade – a melancolia. As ruinas corroídas e semi destruídas
tornaram-se na personificação dessa melancolia romântica.
Este gosto pelas ruinas já vinha do neoclassicismo e tornou-se um dos tópicos
fundamentais do romantismo, ao ponto de as fabricarem em espaços ao ar livre: as ruinas
lembravam o passado. O retorno continuo ao passado com o regresso ao presente são a
essência das obras românticas. A recusa do iluminismo, a valorização do misticismo, do
transcendente e do sublime como experiencias humanas fundamentais, são princípios
intrinsecamente românticos.
O Romantismo Alemão
É na Alemanha que o modelo teórico do Romantismo tem início. O Romantismo
tem uma génese nórdica e o alemão é o que surge mais cedo, como movimento que cria
a conceptualização própria do Romantismo. Este movimento nasce nos finais do século
XVIII, contrapondo-se ao culto exacerbado da razão imposto pelo Iluminismo, que
roubava ao mundo o seu encantamento, o vinculo com o sobrenatural.
Os românticos acreditavam profundamente numa imagem do homem que não era
só razão, mas sentimento, desejo místico, atração pela natureza e que tinha no seu interior
uma vida a ser revelada.
Caspar Friedrich foi um dos pintores românticos alemão mais conhecido. As suas
paisagens refletiam os estados de alma da poesia romântica do seu tempo através de
efeitos comovente e dramáticos. Apresentavam um ambiente nostálgico e melancólico,
quadros em que a presença humana era representada contemplando a natureza de costas
para o observador.
O Romantismo Inglês
O romantismo inglês nasce da insatisfação de vários artistas em relação ao
academicismo reinante.
William Blake é um dos mais notáveis exemplos da nova abordagem. Era um
homem profundamente religioso, vivia no mundo da sua própria criação e desprezava a
arte oficial das academias. Recusava-se a aceitar os seus padrões.
Turner e Constable foram os dois pintores principais que elevaram a pintura de
paisagem a uma nova dignidade.
O Romantismo Francês
Depois dos percursores Diderot e Rousseau – com a sua explosão de sensibilidade
e sentimento, Napoleão foi um dos incentivadores do culto dos princípios românticos em
França.
Utilizaram o orientalismo como instrumento de propaganda do seu imperialismo,
mostrando o oriente como bárbaro e necessitado das luzes francesas. Gros e Decamps
produziram várias obras neste ambiente. Depois de Waterloo, os temas históricos
perderam o interesse e a sociedade francesa retraiu-se para uma vida burguesa que
renegava a movimentação dos dias revolucionários e imperiais.
Delacroix foi uma exceção importante. O seu estilo chocava frequentemente os
salões parisienses, com o seu cromatismo intenso e contrastes marcantes, em
composições históricas agitadas por uma exacerbada emoção.
Acreditava que na pintura a cor era muito mais
importante que o desenho e a imaginação mais do
que o conhecimento.
Para o pintor, a obra era a ponte entre o artista e o
espectador.
Constable Turner
Gros Decamps
O Nacionalismo
No início do século XIX surge a consciencialização do conceito de nação que é
preciso preservar, proteger e divulgar. Esta ideia ganha grande valorização nesta época.
Este racionalismo foi um foco determinante do movimento romântico. O homem
romântico é rebelde e luta pela liberdade em nome do que quer que seja. É uma rebeldia
em constante atualização que valoriza o individual, mas também este individual num
contexto coletivo.
III. A reação positiva: Realismos, Impressionismo
Vários países europeus foram abalados por revoluções durante o ano de 1848, um ano
que coincidiu com a ascensão de uma filosofia assente no materialismo e no pragmatismo,
que surgiu em substituição da imaginação romântica. As sociedades europeias foram, de
novo, refundidas e reformadas e os seus habitantes voltaram a ver a ciência e os factos
como base do conhecimento.
A arte deste período, conhecido por Era do Positivismo, pertence na sua maior parte
a um movimento chamado Realismo. Em vez de idealizar a vida, os pintores escolheram
representar as realidades da era moderna, da miserável existência dos pobres às atividades
de lazer dos mais abastados. Na pintura de paisagem, o Realismo foi dando, aos poucos,
lugar ao Impressionismo que documentou a transformação da França rural nos subúrbios
parisienses.
Realismo/Naturalismo
A forma de entender o mundo vai-se alterar para algo mais realista: il faut être de
son temps – ser do próprio tempo. Segundo os realistas/naturalistas, os românticos não
queriam viver no seu tempo (pintura de evasão) e os académicos viviam do passado
(pintura clássica).
A evolução realista diz que o século XIX, com a revolução industrial, é um século
de mudanças e de progresso cientifico, e as artes acompanhavam essas alterações.
Desenvolveu-se o método da observação direta e a crença nas capacidades humanas. O
realismo/naturalismo assentou no modelo positivista – baseado na razão.
Apesar de serem conceitos semelhantes, o Realismo e o Naturalismo apresentam
algumas diferenças:
REALISMO NATURALISMO
Subverte as ideologias (socialismo
utópico) e é ligeiramente anterior.
Movimento mais próximo da ciência –
“maravilhas do mundo moderno”
Ligado à política (burguesia instalada,
difunde a sua ideologia e encontra
“inimigos”)
- Período conservador.
Aplicação do método científico na análise
dos comportamentos humanos (lado
filosófico e científico)
Empenhado na denúncia do capitalismo
“selvagem” e das explorações
(proletariado)
Progresso das artes semelhante ao
científico – procura a neutralidade (pode
levar a denúncias; paisagens, quotidiano,
folclore)
O século XIX, com a perspetiva do progresso presente, tem uma visão do futuro
expectante e otimista. Três ideias fundamentais deste tempo:
1) É preciso sermos do nosso tempo, sem estarmos fixados no passado; é preciso
viver e representar o tempo presente, olhando para o futuro. O
realismo/naturalismo procura a verossemelhança, o assumir da temporalidade
presente ao captar o momento real, verdadeiro, com sinceridade em relação ao
seu tempo.
2) Os métodos científicos tinham resultados tao espantosos nas ciências, porque
não aplica-los às ciências humanas – artes plásticas e literatura.
[nota]: foi um grande erro pensar que o progresso da ciência pode ser equiparado às áreas
da filosofia ou das artes – estas não têm um progresso linear.
3) Procura da verossemelhança, mimesis da realidade nas artes plásticas.
O artista como “flâneur”
O pintor apresenta-se como um “flâneur” – aquele que deambula, que anda sem
destino ou objetivo concreto, somente apreciando o crescimento e desenvolvimento da
cidade. É um ser urbano, amante da multidão e do incógnito, que mergulha nela como
num imenso reservatório de eletricidade; como num espelho tão imenso como esta
multidão; como um caleidoscópio dotado de consciência. Alguém (que sabe/é conhecedor
desse talento) que é incógnito, vagueia sem destino na multidão e dela extraia a energia
para pintar. “O caminho faz-se caminhando.”
O Realismo em França
Com a ascensão de Napoleão III, na sequência da Revolução de 1848, a sociedade
francesa sofreu profundas transformações, com a rápida aceleração da industrialização e
da ascensão da burguesia. Enquanto Paris era transformada na cidade que hoje
conhecemos, os artistas foram registando as profundas transformações sociais francesas:
Gustave Courbet e Jean-François Millet assumiram-se como paladinos dos estilos de vida
e das ocupações das classes trabalhadoras. A partir da década de 1860, pintores como
Manet e Degas trouxeram o realismo à cidade.
Courbet Millet
O Impressionismo
Podemos dividir o Impressionismo em três tempos da história:
1) 1863 – Napoleão III cria um salão com todas as obras recusadas do Salão Oficial
– inicia-se a ruptura entre o salon e as vanguardas.
2) 1869 – Nascimento do Impressionismo. É no verão deste ano que Monet e Renoir,
dois grandes nomes impressionistas, se juntam e criam este estilo ao decidirem
pintar ao ar livre a paisagem do momento.
3) 1874 – Primeira exposição dita impressionista do célebre fotógrafo Nadar, na qual
constava o quadro de Monet, “Nascer do Sol”.
O Impressionismo vai ter duas dimensões muito importantes:
1) Revolução formal – renega tudo o que tinha sido pintura até ao século XV. Monet
pretendia um olhar puro e sem preconceitos. Diluía a forma em pinceladas de cor,
espessas e texturadas de tinta, com manchas de luz, dissolvendo a matéria em
oposição à construção formal.
2) Celebração do instante que acontece e passa, ainda menos que o momento.
Celebra-se os instantes bons da vida, a eterna juventude.
Apesar destas “definições”, o Impressionismo é um movimento puramente visual,
sem teorias. Dum ponto de vista contextual, o Impressionismo não é assim tão
escandalizante porque se insere no Naturalismo (forma) e no Positivismo (conceito). O
Impressionismo vai levar mais longe “o aqui e o agora” para “o instante”, Não surge “do
nada”. Do ponto de vista plástico, contudo, é muito importante. O Impressionismo é
tipicamente francês, mas dada a sua importância, os países cederam a um “pecado
Manet Degas
Monet Renoir
original” – a história dos países foi comparada com o Impressionismo como se fosse um
auge a atingir.
IV. A Arte no Feminino
No Impressionismo, pela primeira vez, surgem de forma mais marcante as mulheres
artistas, expondo de igual para igual com os homens. Mary Cassatt e Bherte Morisot são
as mais importantes. Destacaram-se e foram definidas como pintoras impressionistas de
direito.
O século XIX é um século de grande ambiguidade em relação à afirmação das
mulheres na sociedade em geral e não só na arte.
Ao longo do século XVIII, foram adquirindo relevância e importância. Quando o
modelo burguês assume o lugar do modelo aristocrata, após a Revolução Francesa, a
importância das mulheres anula-se socialmente e remetem-se novamente para o espaço
doméstico exclusivamente.
As poderosas e manipuladores mulheres do século XVIII dão lugar no
Romantismo a objetos de adoração, sem ação, sem densidade física e intelectual. No
Realismo/Naturalismo passam a objeto de interesse cientifico.
A liberdade condicionada conquistada no século XVIII foi totalmente aniquilada
no seculo XIX com a emergência do modelo burgues repressor moral e sexual. O modelo
aristocrata era assente na casa, na linhagem e no nome. No modelo burguês interessa o
individuo, alguém que se impõe por si próprio.
No século XIX há um excesso de pudor, de uma etiqueta extremada, em que uma
conversa de bom tom não pode ter a palavra “perna”. Paralelamente a isto, as guerras
napoleónicas dizimam vidas masculinas jovens, deixando uma multidão de mulheres
jovens viúvas, órfãs e que perdem o seu único sustento, obrigando-as a trabalhar:
governantas e perceptoras no melhor das casas, costureiras de vestidos e chapéus ou
empregadas de lojas, prostitutas no pior dos casos.
Desta situação surge também a pintura, que deixa de ser um hobbie e passa a ser
algo sério do ponto de vista artístico e do ensino – mulheres autónomas com grande
cultura e capacidades intelectuais enchem as académicas privadas porque as oficiais lhes
eram negadas.
Mary Cassatt Bherte Morisot
V. A CONSTRUÇÃO DO HOMEM FINISSECULAR
As artes visuais produzidas na Europa e nos Estados Unidos, de 1880 a 1914, não se
podem agrupar sob uma única designação estilística. Contudo, podemos entendê-las
coletivamente como resposta aos desafios da modernidade. A ambivalência perante a vida
urbana, as novas tecnologias, o imperialismo e capitalismo refletem as contradições que
definem essa mesma modernidade. Por um lado, o interesse positivista pela investigação
cientifica e pelos avanções tecnológicos aponta para uma atmosfera de otimismo
generalizado; pelo outro, a procura idealista de autenticidade por vias espirituais ou nas
culturas “primitivas” indicam que as benesses do progresso não foram aceites por todos.
Os pós-impressionismos: os “casos” Van Gogh, Cézanne e Gauguin
Unidos pelo desejo de responder à inovações estilísticas do Impressionismo e pela
ambição de criar obras de arte inconfundivelmente contemporâneas, os pós-
impressionistas usaram uma grande diversidade de estilos, temas e técnicas, afastando-se
das premissas realistas do Impressionismo para criar as suas porpiás utopias e universos
privados ou primitivos.
Georges Seurat foi o único dos quatro grandes pós-impressionistas que se ateve a
uma imagética da modernidade e recorreu às teorias cientificas da ótica e da psicologia
da cor e do traço para apresentar a vida moderna de forma controlada e idealista. Seurat,
em vez de pensar o efémero, interessava-lhe o momento. No pontilhismo as cores puras
misturam-se na tela. É uma contradição à linguagem fluída e ao trabalho visual do
Impressionismo. É a densidade teórica do Impressionismo e apresenta uma linguagem
metódica e trabalho mental.
Encontrando pouco conforto na ciência ou na civilização, Paul Cézanne, Vicent
van Gogh e Paul Gauguin procuraram a autenticidade estética (e muitas vezes espiritual)
fora do burburinho parisiense.
Cézanne Van Gogh
Gauguin, em particular, adotou temas e hábitos de culturas que ele acreditava
serem mais primitivas do que as de Paris, da Europa ou dos Estados Unidos da América,
para produzir obras de arte que transmitissem maior honestidade em vez do artificialismo
que associava à modernidade.
Decadentismo e Simbolismo
Tal como o Pós-Impressionismo, o Simbolismo desencadeia-se como reação
descontente face ao progresso desenfreado. Alguns europeus, desencantados com a
industrialização, preferiram olhar para os territórios colonizados como utopias/santuários
a salvo do materialismo.
Dando continuidade à tradição iniciada no século XVIII por Jean-Jacques
Rousseau, as chamadas sociedades primitivas eram vistas como estando ainda
profundamente enraizadas na natureza e, portanto, puras e virtuosas. A isto associou-se
uma nova procura espiritual e a ascensão da psicologia com as teorias sobre o
inconsciente. “Progresso” foi a palavra de ordem do século XIX e a força que motivou
reações artísticas que o rejeitaram, procurando alternativas espirituais e mais primitivas.
O Simbolismo é um movimento que procura a evasão face às pressões da vida
moderna e o desejo de experiencias autenticas que conduziram os simbolistas para vias
alternativas. Procuravam inspiração em terras distantes das cidades modernas e viraram-
se para o interior – abstiveram-se do espaço físico para se refugiarem no espaço espiritual
da imaginação, considerando a mente como único veiculo de transformação estética.
Subjetivismo, musicalidade e transcendalismo são características deste
movimento. Os pintores simbolistas deram preferência às temáticas ligadas à religião, à
morte, ao pecado com forte teor de moralidade.
Gauguin foi de certa forma um simbolista quando a partir de 1890 passou a
temáticas alegóricas, não lhe bastando pintar a realidade, mas demonstrando nas telas a
essência sentimental das personagens.