hypnos 34

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HYPNOS A revista “Hypnos” é uma publicação semestral do Departamento e Programa de Estudos Pós-Graduados em Filosofia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo Hypnos is a journal of the Graduate Program in Philosophy at Pontificia Universidade Católica de São Paulo Centro de Estudos da Antiguidade Greco-romana (Ceag) HYPNOS, São Paulo, v. 34, 1º sem., 2015, p. 1-143 ISSN 2177-5346 Portal SEER (Sistema Eletrônico de Editoração de Revistas): Hypnos digitalizada http://revistas.pucsp.br/hypnos Apoio: Editora da PUC-SP instituto HYPNOS o prazer de saber

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Revista Hypnos 34

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  • HYPNOS

    A revista Hypnos uma publicao semestral doDepartamento e Programa de Estudos Ps-Graduados em Filosofia da

    Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo

    Hypnos is a journal of the Graduate Program in Philosophy

    at Pontificia Universidade Catlica de So Paulo

    Centro de Estudos da Antiguidade Greco-romana (Ceag)

    HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p. 1-143

    ISSN 2177-5346

    Portal SEER (Sistema Eletrnico de Editorao de Revistas): Hypnos digitalizada

    http://revistas.pucsp.br/hypnos

    Apoio:

    Editora da PUC-SP

    instituto

    HYPNOS

    o prazer de saber

  • Editor Responsvel:Editor:

    Rachel Gazolla (Faculdade de Filosofia de So Bento) ([email protected])

    Editores assistentes:Assistant Editors:

    Prof. Ivanete Pereira (UFAM) ([email protected])Prof. Bruno L. Conte (PUC-SP) ([email protected])

    Conselho Editorial:Editorial Council:Nacional: FERNANDO REY PUENTE (Univ. Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, Brasil) GILDA NACIA M, DE BARROS (Univ. So Paulo, Brasil) HENRIQUE G. MURACHCO (Univ. Federal da Paraba, Brasil) JAYME PAVIANI (Univ. de Caxias do Sul, RS, Brasil) JOS GABRIEL TRINDADE SANTOS (Univ. Federal da Paraba, Paraba, Brasil) JOO QUARTIM DE MORAES (Unicamp, So Paulo, Brasil) MARCELO PERINE (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil) RACHEL GAZOLLA (Faculdade de Filosofia de So Bento, Brasil)

    Internacional: ALEJANDRO VIGO (Univ. de Navarra, Espanha) ELISABETTA CATTANEI (Univ. Studi di Cagliari, Itlia)

    FRANCISCO BRAVO (Universidad Central de Venezuela, Caracas, Venezuela) FRANCISCO LISI (Univ. Carlos III, Madrid, Espanha) GRACIELA MARCOS DE PINOTTI (Univ. de Buenos Aires, Buenos Aires, Argentina) HUGO RENATO OCHOA DISSELKOEN (Univ. Catlica de Valparaso, Chile) JORGE MARTINEZ BARRERA (Pont. Universidad Catlica de Chile, Santiago, Chile) LIVIO ROSSETTI (Univ. de Perugia, Perugia, Itlia) LUIS ALBERTO FALLAS (Univ.de Costa Rica) MARIA IZABEL SANTA CRUZ (Univ. de Buenos Aires, Argentina) PETER P. SIMPSON (City Univ. of New York, EUA) THOMAS M. ROBINSON (Univ. de Toronto, Canad)

    Revisores:Revisers:

    Anita Cmara (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil)Bruno Conte (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil)Claudiano Avelino dos Santos (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil)Fernando Sapaterro (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil)Ivanete Pereira (UFAM, Manaus, Brasil)Julio Cesar Moreira (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil)Maria Luiza Pires (Pont. Univ. Catlica de So Paulo, Brasil)

    Secretaria: Programa de Estudos Ps-graduados em Filosofia PUC-SP ([email protected] www.pucsp.br/~posfil)

    Diagramao:Desktop Publishing:

    Waldir Alves ([email protected])

    Capa:Cover:

    Rachel Gazolla e Waldir Alves

    Indexao: THE PHILOSOPHERS INDEX (Bovling Green, Ohio, EUA)CLASE Comit de Evaluacin y Seleccin de Publicaciones (Univ. Autnoma de Mxico, Mxico, Mx)LATINDEX Sistema Regional de Informacin para las Revistas Cientficas de Amrica Latina, el Caribe, Espaa y Portugal (Mxico, Mx)QUALIS Capes (Brasil)

    Catalogao:ULRICHS International Periodicals Directory (NY USA)

    Registro:IBICT Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia

    Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)

    Hypnos : revista do Centro de Estudos da AntiguidadeGreco-Romana (CEAG) . Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. Ano I, n. 1 (1996) . So Paulo : EDUC ; PAULUS ; TRIOM, 1996 Periodicidade Semestral.

    A partir de 2002 Semestral revista do Instituto Hypnos e da Pontifcia Universidade Catlica de SP, Programa de Estudos Ps-Graduados em Filosofia.ISSN 1413-9138

    1. Estudos gregos Peridicos. 2. Grcia Antiguidades Peridicos. I. Pontifcia Universidade Catlica de So Paulo. Centro de Estudos da Antigui dade Greco-Romana (CEAC).

    CDD 938.005

  • Cabea de Hypnos: Hypnos, segundo a Teogonia de Hesodo, filho de Nyx, irmo de Thnatos e Oneron. Da primeira gerao dos deuses, o sono e a inspirao, por isso sua cabea esculpida tem, do lado direito, asa em vez de orelha.

    (Cpia romana de original grego, sculo IV. d.C.Museu do Prado, Madri)

    Head of Hypnos: Hypnos, in Hesiodes Theogony, is Nyxs son, Thnatos and Onerons brother. From the first generation of gods, Hypnos is sleep and inspiration, there-fore his sculptured head has a wing on the right side, instead of an ear.

    (Roman copy from a Greek original, 4th century AD.Museum of Prado, Madrid)

  • IV

    1. Hypnos is a journal for Greco-Roman Philosophy. We also seek to increase the dialogue between Philosophy and other subject areas in Classical Antiquity that are nowadays well established in universities: Literature, History, Philology etc. It is the conviction of Hypnos that researchers in Philosophy should approach the culture of Antiquity in a comprehensive way. The Editors pursue this aim by publishing not only texts that are specific to Philosophy, but also those that concern the areas of Literature, Linguistics, History, Psychology, Anthropology, and so forth. Hypnos has a generous policy as regards acceptance of works that extend beyond the academic boundaries. Basically the journal is a vehicle to enhance the study of Gre co-Roman studies and to further interactions between students in the area, whether they are Bra zilian or not, and whether they are academic scholars or not.2. The Editors of Hypnos have adopted the po licy that, despite the preference of the journal for studies in the Philosophy of Classical Antiquity, studies in periods of philosophy other than that, up to and including the pre sent day, can also be published provided that they are in agreement with the main theme for each issue. So if a particular issues central theme is, say, Ethics, then texts from pe riods of the History of Philosophy other than Antiquity and which deal with Ethics will be welcome.3. Papers not pertaining to the main theme for a particular issue of the journal, but presenting a relationship between a Greek or Roman thinker and another from a historical period other than that of Classical Antiquity, may be accepted for evaluation by the Consultative Council and the Editorial Council. Texts from other areas of investigation besides those of Philosophy or Classical Studies might be featured occasionally, depending on the editors acceptance and on the pertinence and importance of the given text for philosophical stu dies in Brazil.

    Published material is the sole responsibility of their authors. The texts must be originals. For texts previously published outside Brazil, this fact must be mentioned clearly, indicating the name, number or edition, publishing date, and country of origin of the journal. Hypnos Editorial Committee will then decide about the publication.

    1. A Hypnos , qualitativa e quantitati va mente, uma revista de Filosofia Greco-romana. Busca ampliar, tambm, o dilogo com outros saberes da Antigidade Cls sica, hoje bem delineados em nossas Universidades: Literatura Clssica, Histria Greco-romana, Histria das Religies, Lnguas Clssicas etc. Acreditamos que a cultura Greco-romana deve ser assumida pelos estudiosos em Filosofia com o mximo de abrangncia. A Editoria persegue esse objetivo e procurar publicar, sempre que possvel, no s os textos sobre Filosofia Greco-romana mas as pesquisas literrias, lingsticas, histricas, psicolgicas, antropolgicas e outras condizentes com esse perodo histrico. A extenso da cultura grega e romana antigas faz com que as atuais divises acadmicas sejam uma necessidade, mas no uma regra que venha a limitar o investigador, filsofo ou no. Por isso, a Hypnos apresenta largos limites para a recepo desses estudos. Basicamente, esta revista um veculo de auxlio para a interao dos estudos Greco-romanos brasileiros e no brasileiros.2. A Editoria da Hypnos compreende que os estudos filosficos posteriores Grcia e Roma, at os nossos dias, tambm devam ser publicados, porm em menor nmero que as investigaes sobre o perodo clssico, desde que obedeam temtica principal de cada nmero. Assim, rico e vigoroso que pesquisas de outros momentos da Histria da Filosofia sejam aceitas se concer nentes ao tema central, por exemplo, se um nmero tiver como temtica central a tica e os textos em questo versarem sobre tica.3. Havendo um Conselho Consultivo e um Conselho Editorial para decises, artigos apresentados fora da temtica de um nmero, porm expondo uma relao entre um texto de autor grego ou romano com outro de qualquer outro perodo histrico, podem ser aceitos. Outras reas de investigao que no se refiram Filosofia e aos Estudos Clssicos podero dar eventual contri-buio, ficando a cargo da Editoria deliberar sobre a aceitao desses trabalhos, levando-se em conta sua pertinncia e o peso que venham a ter para as pesquisas filosficas.

    Os textos publicados so de responsabilidade exclusiva dos autores. Os textos devem ser originais. Caso tenham sido publicados em alguma revista no brasileira, favor indicar clara-mente o nome, nmero e data da publicao e pas. A editoria decidir sobre o interesse em publicar na Hypnos.

    LINHA EDITORIAL / EDITORIAL FOCUS

  • VI NORMAS AOS AUTORES1. Os textos devem contemplar a rea da revista, ou seja, Histria da Filosofia Antiga e Es-tudos Clssicos no todo ou em parte , ficando a cargo da editoria a publicao eventual de outra rea caso seja de seu interesse;2. Os textos passaro pelo seguinte trmite: recebimento pelo editor responsvel, envio ao conselho de pareceristas, deciso de publicao do conselho de publicao, envio do parecer ao autor e publicao digital e em papel;3. Nos artigos apresentados revista deve constar a data de envio, e-mail do autor, instituio em que trabalha e/ou investiga, endereo;4. Os textos devem ter um pequeno resumo de 8 linhas no mximo, com at quatro palavras--chaves, no idioma do autor e em ingls;5. A formatao dos textos deve seguir as regras de publicao de peridicos (vide normas ABNT), em fonte Times New Roman, letra 12, espao 1.5;6. No caso de no haver parecerista no conselho de pareceristas que responda pela rea de investigao do autor, a editoria indicar parecerista ad hoc;7. A publicao exige que o autor dispense direitos autorais, uma vez que a Hypnos no tem fins lucrativos;8. O conselho de publicao decidir sobre o interesse em publicar, eventualmente, textos no originais; neste caso, o autor deve indicar as referncias da primeira publicao;9. O contedo dos textos de inteira responsabilidade do autor, reservando-se a editoria a no aceitar aqueles que trouxerem em seu bojo ilegalidade de qualquer gnero, quer por discriminao de sexos, orientao sexual, religiosa, poltica, tnica ou incitao violncia;10. Cabe ao autor, caso se sinta prejudicado pela publicao de seu texto de modo incorreto, dar cincia aos editores das devidas reclamaes.

    II NORMAS AOS EDITORES, CORPO DE REVISORES, PARECERISTAS, TRADUTORES E DIAGRAMADORES

    1. Os editores assumem o direito de no publicar artigos cujo contedo venha a ferir qualquer dos itens expostos no item 9 das Normas aos Autores, alm de seguirem estritamente essas normas no processo de recebimento do material at sua eventual publicao;2. Os editores se comprometem a investigar, aps a publicao dos textos, problemas jur-dicos que venham a prejudicar os autores e, na medida de seu alcance, san-los, tais como retrataes, correes, republicaes, a depender de cada caso, se receberem reclamaes a respeito;3. Os editores, tradutores e pareceristas obrigam-se a preservar o anonimato do material recebido dos autores at sua eventual publicao;4. Os editores , revisores, pareceristas, tradutores e diagramadores no podem apresentar conflitos de interesses em relao aos autores, instituies financeiras, temas ou qualquer outro tipo de conflito nesse sentido, que venham a prejudicar a eticidade do seu trabalho na Hypnos;5. Os pareceristas estao proibidos de emitir pareceres caso haja interesse particular com relao ao autor ou conflito de interesse de qualquer especie.

    III SOBRE EVENTUAIS FALTAS TICAS1. A Hypnos se compromete com os mais altos padres de integridade alinhados legisla-o vigente. M conduta e comportamento antitico podem ser identificados e levados ao conhecimento do editor a qualquer momento, por qualquer pessoa. Quem informa o editor de tal falta deve fornecer informaes e provas suficientes para que uma investigao seja iniciada. Todas as denncias sero respeitadas da mesma maneira, desde que no firam

    NORMAS AOS AUTORES / RULES FOR AUTHORS

  • VI as normas j estabelecidas pela revista, at chegar-se a uma deciso clara. 2. Uma deciso inicial para a investigao ser tomada pelo editor, que seguir o seguinte trmite: As provas sero recolhidas com zlo e anonimato; em qualquer caso ser dada ao autor

    o direito de defesa; Carta de advertncia ao autor ou a qualquer outra pessoa envolvida no assunto dever

    ser enviada pela editoria; Em caso de um assunto que fira gravemente a eticidade social, a editoria dever buscar

    uma autoridade superior para posterior investigao e ao.

    IV POLTICA DE PRIVACIDADEOs nomes e endereos informados nesta revista sero usados exclusivamente para os ser-vios prestados por esta publicao, no sendo disponibilizados para outras finalidades ou a terceiros.

    I RULES FOR AUTHORS

    1. The subjects of History of Ancient Philosophy or Classical Studies, which are the areas of interest of our journal, must be fully or partly addressed by the article; it is the editors role to decide a possible publication of another area; 2. On receipt of the article by the editor, it will be analyzed by the board of reviewers, the publication board will decide upon its publication, authors will be notified about the article acceptance or not; case positive then it will be published in paper and online.3. The following information is necessary for articles submitted to the journal: submittal date, authors email address, the institution for which he or she works, and post address; 4. The text must be accompanied by an abstract comprising at most eight lines, with up to four key-words, both in its original language and English, as the case may be;5. The text must be formatted according to the rules for publication of periodicals (check ABNT rules),written in font Times New Roman, size 12, line spacing 1.5;6. If a reviewer is not available for the authors field of investigation, an ad hoc reviewer will be appointed by the editorial board;7. Hypnos is a non-profit-making journal, therefore authors should not expect payment for published articles;8. Eventually secondary publication of material published in other journals may be justifiable and beneficial. The board may decide, in these conditions, for the publication of non-original texts. In this case, the authors must provide the references for the original publication of their articles;9. The contents of the text are the sole responsibility of their authors; while reserving the editorship the denial of those which bring in its body illegality of any kind, such as discrimination of gender, sexual orientation, religious, political, ethnic or incitement to violence;10.In case the author feels injured or notice any significant error in their publication, it is his responsibility to notify promptly the journal editor.

    II RULES FOR EDITORS, BOARD OF REVIEWERS, REVIEWERS, TRANSLATORS

    AND VISUAL DESIGNERS

    1. The editors assume the right not to publish articles whose content hurts any of the items outlined in item 9 of the Rules for Authors, in addition to strictly follow these rules from the receipt process of the text until its eventual publication.2. The editors are committed to undertake investigations of any legal problems that may harm the authors after the publication of the texts, and in the extent of their power, to adopt and follow reasonable procedures, such as retractions, corrections, republication, depending on each case, if they receive complaints about;

  • VII3. Editors, translators and reviewers are obliged to preserve the anonymity of the received authors material until its eventual publication;4. Editors, reviewers, translators and visual designers may not have any conflicts of interest in relation to the authors, financial institutions, themes or any other type of conflict that may harm the ethicity of his work on Hypnos; 5. Reviewers are forbidden to issue opinions if there is any particular interest in relation to the author or conflict of interest of any kind.

    III ON ETHICAL ISSUES

    1. Hypnos is committed to the highest standards of integrity and in accordance with relevant legislation. Misconduct and unethical behavior may be identified and brought to the attention of the editor and publisher at any time, by anyone. Whoever informs the editor or publisher of such conduct should provide sufficient information and evidence in order for an investigation to be initiated. All allegations should be taken seriously and treated in the same way, until a successful decision or conclusion is reached. 2. An initial decision for investigation should be taken by the editor, then the investigation runs as follows: Evidence should be gathered with zeal and anonymity. In any event, the author will be

    given the opportunity to respond to any allegations. A warning letter to the author or to any other person involved in the matter should be sent

    by the editors; In case of serious misconduct the editor may report the case and outcome to a higher

    authority for further investigation and action.

    IV- PRIVACY STATEMENT

    Names and addresses informed to this publication are used exclusively for our publishing ends, and will in no occasion be disclosed to third parties.

  • VIII ENVIO DE ARTIGOS, PERMUTAS E DOAES ARTICLES, EXCHANGE AND DONATIONS

    Para envio de artigos, intercmbio de revistas ou envio de obras a serem creditadas por esta revista (p/ deciso do Conselho Edito rial), o endereo o seguinte:

    Revista HypnosA/C Profa. Rachel Gazolla (FFSB)[email protected]

    Pela web enviar ao site do Seer seguindo as regras para envio: http://revistas.pucsp.br/hypnoslogin e usurio escolha do articulista

    Para intercmbio de revistas e cadernos (de produo universi t ria) basta enviar o(s) volu me(s) com carta de apresentao do editor e soli citao de intercmbio, indicando um endereo de e-mail para contato.

    Address for submitting articles, exchan ge of journals, and works to be credited in this Journal (at discretion of the Editorial Board):

    Revista HypnosAtt. the Editors:Profa. Rachel Gazolla (FFSB)[email protected]

    For exchange of journals and publications, it is sufficient to send the issues accompa nied

    by a presentation letter from the editor and a request for exchange, informing a contact

    e-mail address.

  • IXSUMRIO

    ARTIGOS (ARTICLES)

    Os sons da msica: O ethos modal em Problemata XIX, 48The Sounds of Music: Modal Ethos in Problemata XIX, 48

    Peter Simpson ............................................................................................ 1

    Dialctica y retorica: Scrates y GorgiasDialectics and rhetoric: Socrates and Gorgias

    Hugo Renato Ochoa Disselkoen ............................................................... 23

    Nombre y significado en Platn, Crtilo 384a8-391a4: El modelo tcnico del lenguaje como solucin a la controversia entre naturalismo y convencionalismoName and Meaning in Platos Cratylus 384A8-391A4: The Technical Model of Language as a Solution to the Controversy between Naturalism and Conventionalism

    Fabin Mi .............................................................................................. 35

    Linguagem, nome e simbolismo no Crtilo de PlatoLanguage, name and symbolism in Platos Cratylus

    Patrick Oliveira Almeida ......................................................................... 55

    Nietzsche e a reforma metodolgica da filologia: o problema da cientificidade no contexto dos estudos clssicosNietzsche and the methodological reform of philology: the problem of scientificity in the context of classical studies

    Eduardo Nasser ........................................................................................ 79

    Sobre a estrutura demonstrativa no FdonOn demonstrative structure in the Phaedo

    Fernando Barbosa ................................................................................. 105

    Vcios e virtudes, virt e fortuna em MaquiavelVices and Virtues, Virt and Fortuna in Machiavelli

    Renato Ambrosio .................................................................................... 123

    La cosmologa presocrticaPre-Socratic Cosmology

    David Torrijos Castrillejo ....................................................................... 132

  • X Normas bsicas da ABNT para citao (2002) ................................ 140Basic ABNT rules for citation (2002)

    Normas para a transliterao de termos e textos em grego antigo .................................................................................. 141

    Permutas e doaes ........................................................................... 142Exchanges and Donations

  • HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p.1-22

    OS SONS DA MSICA: O ETHOS MODAL EM PROBLEMATA XIX, 48

    THE SOUNDS OF MUSIC: MODAL ETHOS IN PROBLEMATA XIX, 48

    PETER SIMPSON*

    ResumoO artigo tem por foco o problema de como aos modos gregos antigos (harmoniai) puderam ter sido atribudos to amplos e diversos efeitos morais e emocionais pelos autores antigos. A interpretao moderna padro dos modos gregos torna impossvel ler os autores antigos literalmente. Uma soluo satisfatria ao problema, contudo, est disponvel a partir de um livro de Kathleen Schlesinger sobre os modos, injustamente caluniado. Este artigo explica, com o auxlio de diagramas, os aspectos fundamentais da soluo de Schlesinger e por que devemos lev-la a srio.Palavras-chave: Harmonia, Ethos, Sons, Gregos antigos

    AbstractThe article focuses on the problem of how the Ancient Greek musical modes or harmoniai could have had the widely diverse emotional and moral effects attributed to them by ancient authors. The standard modern interpretations of the Greek modes render it impossible to take the ancient authors literally. A satisfactory solution to the problem, however, lies ready to hand in an unfairly maligned book on the modes by Kathleen Schlesinger. This article explains, with diagrams, the basics of Schlesingers solution and why we should take it seriously.Keywords: FALTAM

    * Peter Simpson

    Artigos

  • HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p.1-22

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    2 INTRODUO

    Em Problemata XIX, 48, assim lemos, segundo a traduo de Mayhew1:

    Por que os coros na tragdia no cantam nem no modo hipodrico nem no hipofrgio? Ser porque essas harmoniai possuem muito pouca melodia, o que muito necessrio ao coro? O hipofrgio tem carter de ao, por isso mesmo no Geryon2, o xodo e a tomadas de armas (episodes) so compostos nesse modo, porm, o hipodrico magnificente e firme, por isso tambm , dentre as harmoniai, a mais prpria para o canto com acompanhamento da ctara. Portanto, essas duas harmoniai so imprprias para o coro e mais adequados aos encarregados da parte cnica. Esses atores, ento, so imitadores de heris: e entre os antigos somente os lderes eram heris, ao passo que as pessoas das quais o coro consiste so homens. Por esse motivo, harmonizam-se com o coro a melodia e o carter plangentes e tranquilos; porquanto so caractersticas humanas. E as outras harmoniai tm essas designativas3, mas o frgio4 o que tem menos dentre eles; pois excitante e bquico [e o mixoldio as possui mais do que todos]5. No que diz respeito a esta harmonia somos, portanto, afetados de certa forma; e os fracos so mais emocionveis que os fortes; por isto, esta harmonia tambm adapta-se bem a grupos; e ns agimos maneira do hipodrico e do hipofrgio, o que no adequado para o coro. Pois o coro um observador inativo, visto que somente mostra atitude amigvel em relao queles com os quais est presente.

    A passagem uma expresso clssica dos fatos bem conhecidos, mas

    ainda obscuros, a respeito da msica e seus efeitos morais ou emocionais,

    1 Mayhew (2011, p. 577, 579, e notas 119-122). [Nota do tradutor: Empregamos, para a adapta-o em portugus deste artigo, a traduo de Maria Luiza Roque (pp. 67-69), com modificaes conforme indicado nas notas.]2 Tragdia atribuda a Nicmaco Alexandrino da qual temos apenas o ttulo. [Nota da tradutora brasileira dos Problemas, Maria Luiza Roque.]3 Isto , as harmonias que no so nem hipodricas nem hipofrgias possuem caractersticas apropriadas ao coro [nota de Mayhew].4 Na traduo inglesa de Mayhew, adotada por Simpson, h correo da lio dos manuscri-tos, onde se l, aqui, hipofrgio (cf. n. 6 ad loc). Essa correo no foi incorporada edio brasileira. [Nota do tradutor]5 H aqui uma lacuna no texto. A frase que adiciono baseada na traduo de Gaza. O autor pode ter prosseguido em dizer mais a respeito de por qu a harmonia do mixoldio possui tais caractersticas mais do que as outras [nota de Mayhew].

  • HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p.1-22

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    3alegados por Plato, Aristteles e pela tradio pitagrica em geral6. Os pro-blemas postos a ns por esses fatos so fundamentalmente dois: o que eram os modos gregos e como isso de terem eles os efeitos mortais e emocionais, ou o ethos, alegados? A maneira padro de responder a essas questes pode ser bem ilustrada por um artigo de Robert Wallace:

    compreenso padro que Damon tenha correlacionado harmoniai com ethos, isto , com tipos de comportamento e de carter. Encontramos tais correlaes no livro 3 (398 c-399 c) da Repblica de Plato e em muitas fontes posteriores... Como funcionavam as correlaes? Sempre intrigou os estudiosos que o deslocamento mesmo de uma nota na escala pudesse produzir efeitos emocionais e comportamentais profundamente diferentes. Por exemplo, como indicam as escalas em Barker e West, a harmonia drica difere da harmonia frgia apenas na ltima nota da escala... Ainda assim, todas as fontes antigas descrevem essas harmoniai como sendo completamente diferentes em seu carter... (WALLACE, 2005, p. 148).

    E assim conclui:

    [N]a poca de Damon, as harmoniai em si mesmas no tinham, em sua maior parte, correlaes simples a um ethos. Msicas tristes, alegres ou srias poderiam ser tocadas em qualquer harmonia... Se no era possvel [Damon] ter categorizado o ethos de cada harmonia individual, porque tal ethos variava de cano para cano, o que resta so as outras qualidades variveis da msica, a poikilia, incluindo o tom e o andamento, agog, com respeito s quais atribui-se a ele expressamente o interesse em Repblica 400... (ibid., p. 155)

    Outros estudiosos afirmam coisas semelhantes7. Seja l o que fosse o ethos dos diferentes modos, ele no poderia, a despeito do testemunho unnime

    6 Para as evidncias, junto a uma discusso informativa, ver Barker (1948, pp. 163-169). Barker cita ainda passagens significantes de Plato, Repblica, 194-402, e Aristteles, Poltica, VIII, 6-7 (1984, pp. 128-136, 174-182). Ver tambm Lippman (1975), especialmente o captulo 2, Theories of Musical Ethos, e West (1992, 246-253).7 Ver Barker, como mencionado na nota anterior. Assim tambm, escreve Jan (1895) em sua nota a Pr. XIX, 48 (p. 109): Harmoniis singulis qui fuerit ordo tonorum et semitoniorum habes in Cleonidis isagoga...; sed ad naturam illarum constituendam timeo ne plura accesserint, melodiae formae quaedam et certae versiones, quas nos plane ignoremus. (O que era a or-dem dos tons e semitons nos modos individuais pode-se encontrar na Isagog de Cleonides...; mas quanto constituio de sua natureza, temo que mais coisas se acrescentassem certas formas e verses definidas de melodia das quais somos francamente ignorantes). Por fim, Anderson (1966, pp. 178-179) fala da caracterizao tica de um modo atravs de suas carac-tersticas tcnicas efetivas, mas acrescenta imediatamente que [t]al procedimento no pode,

  • HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p.1-22

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    4 dos autores antigos, ser caso de uma diferena na escala. Ele precisaria ser funo de muitas outras coisas e, ao final, talvez, fosse apenas questo de preferncia subjetiva ou preconceito nacional.

    A consequncia dessa compreenso da msica grega que os modos gregos no poderiam ter os efeitos alegados por Plato, Aristteles e os pita-gricos, ou ento que os efeitos seriam em larga medida subjetivos, para os gregos da poca (ou para Plato, Aristteles e os pitagricos em particular), ou ento que eles de fato se produzissem, no pela mera diferena nos intervalos entre diversos modos, mas por uma srie de diferenas que se estenderiam ao estilo, ao tom, a maneirismos, associaes culturais e coisas semelhantes. Mas tal interpretao no muito plausvel. Plato e Aristteles eram pouco propensos a iluses irracionais: eles no eram subjetivistas modernos, nem se seduziam por fenmenos meramente subjetivos eles absolutamente no estavam falando de diferenas de estilo e maneirismos. Assim, a no ser que queiramos engolir tais implausibilidades, devemos concluir que a pesquisa moderna sobre os antigos modos gregos tem se equivocado e, com efeito, tem buscado respostas no lugar errado. Se os modos eram algo semelhante ao que Plato, Aristteles e os pitagricos dizem que eram, eles no se dife-renciavam apenas na maneira como os investigadores modernos falam ou pensam a respeito.

    H mesmo uma razo ainda mais forte para rejeitar o que dizem a os investigadores modernos. Pois tudo comea, sendo uma confisso geral, com os relatos usuais da teoria musical grega encontrada nos antigos escritos sobre o assunto. A surpresa aqui que esses mesmos textos, ou, melhor dizendo, o texto a que todos retornam e sobre o qual se apoiam ainda quando seja para critic-lo, confessa ignorncia dos modos gregos como eram entendidos no tempo de Plato e de Aristteles (WALLACE, 2005, p. 147). Pode-se perguntar, surpreso, por que os estudiosos modernos insistem em tomar esses textos por guia. Se vai se dizer que eles no tm escolha, essa resposta, primeiro, no verdadeira (os fatos essenciais da msica no so dependentes do tempo e podem ser investigados agora com experimentos diretos na mesma medida em que o eram no passado) e, segundo, ela no uma resposta: pois se os

    por si mesmo, ser associativo, e continua dizendo que tratar dados tcnicos como sendo significativamente relacionados a termos ticos nunca foi algo seguro, e que tal transferncia de sentido resultou possivelmente de uma apreenso inadequada da msica por parte dos filsofos....

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    5textos antigos dizem que nada sabem a respeito daquilo que estamos falando, eles do-nos razes para ignor-los, no para deles fazer uso.

    O texto a que todos os outros textos retornam so os Elementos har-mnicos de Aristxeno (sc. IV a. C., aluno de Aristteles), cujos primeiros livros, de qualquer maneira, sobreviveram praticamente intactos. Esses livros sustentam um ataque e uma crtica queles chamados por Aristxeno os har-monistas ou, em outras palavras, os modalistas (pois harmonia , em grego, o modo musical). Aristxeno diz fundamentalmente, e repetidas vezes, que esses modalistas no entenderam o bsico sobre a msica e se equivocaram sobre quase todo o restante. Com efeito, Aristxeno dispensa esses modos como nada alm de confuso e at mesmo etno-centrismo, como a seguir:

    A exposio dos tonoi pelos harmonistas exatamente semelhante ma-neira como os dias do ms so contados, onde, por exemplo, o que os Corntios chamam dcimo, os Atenienses chamam quinto, e outros ainda oitavo (Harm., II, 37; BARKER, 1989, p. 153)8

    Deveramos, portanto, concluir e certamente os estudiosos da msica grega antiga precisam concluir que tudo a respeito de teoria musical grega que chega at ns a partir de Aristxeno em nada ajudar a compreender o que pretendiam seja Plato, seja Aristteles, seja Pitgoras. Deveramos, por-tanto, desde o comeo jogar fora aquela pea arquetpica da teoria musical aristoxeana, a saber a diviso das escalas em tetracordes (ou, ao menos, em tetracordes entendidos como sendo sempre intervalos de uma quarta). De acordo com Aristxeno, a maneira de entender a msica entender o canto, e a maneira de entender o canto est em comear com o menor intervalo consonante, a saber a quarta. O prximo intervalo consonante, a quinta, pro-duz, em conjunto com uma quarta, o intervalo consoante final da oitava (de acordo com Aristxeno, apenas esses trs intervalos so consonantes). Com efeito, o que faz Aristxeno combinar quartas atravs do intervalo de um tom, j que uma quarta mais um tom produz uma quinta, e uma quarta mais um tom mais uma quarta produz uma oitava. Todas as escalas de Aristxeno,

    8 Sendo Aristxeno um estudante de Aristteles, pode parecer enigmtico que ele trate com tanta desconsiderao a teoria musical anterior e, assim, tambm a de Aristteles. Mas, em primeiro lugar, Aristxeno parecer ter sido de um carter um tanto arrogante (BARKER, 2007, p. 136); em segundo, ir de encontro ao prprio mestre algo que Aristteles ele mesmo j havia feito antes e, em terceiro, Aristteles parece ter dedicado muito pouco estudo sistemtico aos aspectos tcnicos da teoria musical, de modo que contrapor-se a ele pode ter parecido a Aristxenos, e talvez at ao prprio Aristteles, uma prerrogativa do especialista face ao leigo.

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    6 incluindo seus equivalentes dos antigos modos (pois ele usa os nomes dos modos para algumas de suas escalas), so construdas a partir de diferentes tipos de tetracordes e suas combinaes.

    Os tetracordes de Aristxeno so intervalos de uma quarta e, para que elas permaneam assim, as duas notas limtrofes do intervalo precisam ser inamovveis com respeito uma outra (pois se alguma mudasse de altura sem que a outra a acompanhasse, o intervalo deixaria de ser uma quarta). As duas notas internas ao tetracorde podem, contudo, mover-se, pois no afetam o intervalo integral do tetracorde. A teoria de Aristxeno, portanto, consiste de tetracordes compostos de duas notas inamovveis e duas mveis. As duas notas mveis produzem, movendo-se prximas uma outra e para o mais baixo das duas notas inamovveis, os trs generos ou tipos de tetracorde: o diatnico, quando essas duas notas so separadas uma da outra e da nota mais baixa por intervalos de um tom; o cromtico, quando so separados por semitons; o enarmnico (isto , o modal da maneira como Aristxeno entende os modos), quando so separadas por intervalos de um quarto de tom. Aristxeno no preciso como somos com respeito aos intervalos do semiton ou do tom, pois ele permite haver semitons e tons de tamanhos diferentes. De fato, ele tem trs tamanhos de semitom e dois tamanhos de tom. O resultado ele ter seis variedades no total: um tamanho de quarto de tom (Aristxeno no permitia que pudesse haver intervalos menores do que a voz humana possa facilmente cantar e o quarto de tom, ou diesis, o menor desses intervalos, no podendo ser ulteriormente dividido), trs de semitom e dois de tom. Por conseguinte, conseguimos no apenas tetracor-des cromticos e diatnicos, mas tambm os cromticos suave, hemilico e tnico, os diatnicos suave e tenso, os quais, somados ao enarmnico nico, do seis gneros no total9.

    Mas todos esses comentrios so apenas por curiosidade. Eles no tm, e no podem ter, qualquer relevncia para entender o que Plato, Aristteles e a passagem acima dos Problemas queriam dizer com os modos. Eles tm relevncia apenas para entender os textos que nos restam da teoria musical grega, todos e cada um deles seguindo Aristxeno ao falar de tetracordes e da diviso e classificao das escalas de acordo a diferentes maneiras de combinar diferentes espcies de tetracorde.

    9 Veja-se o til sumrio de West sobre esses pontos, bem como a respeito das variantes fornecidas por Ptolomeu e Ddimo (1992, pp. 169-170).

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    7Como e por que Aristxeno acabou por inventar uma teoria da musica

    baseada em tetracordes dessa maneira daria uma histria interessante, mas

    essencialmente intil. A teoria, ainda que de enorme importncia historica-

    mente (pois ela influenciou o pensamento e a prtica, sem interrupo, at

    o final da Idade Mdia), musicalmente arbitrria. No h razo necessria

    para basear as escalas nos tetracordes aristoxenianos; no h razo necessria

    para construir os tetracordes de cima para baixo (como faz Aristxenos); no

    h razo necessria para confinar os intervalos consonantes a quartas, quintas

    e oitavas; no h razo necessria para limitar os tons, semitons e quartos

    de tom s poucas variedades permitidas por Aristxeno. Evidentemente,

    Aristxeno poderia e fez apelo aos limites impostos pela capacidade da

    voz humana, mas no h razo necessria para construir a msica, ou sua

    teorizao, de acordo com esses limites. Nossa msica moderna h muito

    abandonou a maior parte das invenes de Aristxeno, em muito para a

    melhoria tanto da prtica quanto da teoria. A msica muito mais rica em

    suas possibilidades do que admitia Aristxeno, embora seu caminho tambm

    seja uma dessa possibilidades que merecem seu lugar ao sol, desde que no

    exclua, como Aristxeno fez com que se exclussem, todas as outras.

    A preocupao aqui, contudo, no com Aristxeno e seu legado, seno

    para dispensarmo-nos de consider-los mais a fundo como meio de enten-

    der os modos. Mas, uma vez que nos dispensarmos de Aristxeno significa

    dispensarmo-nos da totalidade dos escritos gregos antigos remanescentes,

    estamos forados, se se deseja encontrar algo sobre os modos antigos, a

    comear, no apenas com quaisquer escritos (e nem, com feito, com qualquer

    partitura musical sobrevivente, pois a sua interpretao depende de uma

    interpretao prvia das escalas em que elas se baseiam), mas com os fatos

    musicais atemporais. A questo quais devem ser esses fatos musicais, uma

    vez que h muitos fatos com os quais se poderia comear. Felizmente, h

    ao invs disso uma guia moderna que podemos seguir, ela, em virtude de

    seu extensivo conhecimento teortico e prtico da msica e de instrumen-

    tos, bem como por um processo de investigao inspirada, marcou a trilha

    a seguir, ou ao menos a primeira trilha a seguir. Pois, ainda que haja outras

    trilhas a tambm seguir, no h dvida de que esta, sob muitos aspectos,

    seja a correta e certamente uma que no se pode ignorar na tentativa de

    compreender os modos gregos antigos.

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    8 O PROBLEMA E UMA SOLUO MAIS VERDADEIRA: OS MODOS GREGOS

    A guia em questo Kathleen Schlesinger em seu esplndido e injus-tamente malfalado livro The Greek Aulos [O aulos grego] (1939)10. Deve-se comear, como ela faz, com certos fatos principais sobre a msica os quais, como vai aparecer, devem ter estado origem dos modos gregos, seja l o que mais for verdadeiro a seu respeito e seja l o que mais houver que nos esteja ainda oculto.

    Os fatos em questo so dois, fundamentalmente: primeiro a respeito do monocrdio e segundo a respeito do aulos. O monocrdio, instrumento, como indica o nome, de uma corda esticada sobre uma prancha sonora, uma inveno de Pitgoras para explorar os intervalos musicais. Ele ainda de fato uma ferramenta essencial para teorizar sobre a msica e o som. Infelizmente, a maneira como o monocrdio atualmente explicado e utili-zado leva a equvocos. Tal maneira consiste em dividir toda a corda em uma srie de diferentes fraes, primeiro a de uma metade, ento de um tero, de um quarto e assim por diante. A primeira diviso, com a corda dividida em dois, produz, quando a corda inteira tocada e ento sua metade, o intervalo de uma oitava. A segunda diviso, com a corda dividida em trs, produz, quando toda a corda e tocada e ento dois teros dela, o intervalo de uma quinta. A terceira diviso, com a corda dividida em quatro, produz, quando toda a corda tocada e ento os seus trs quartos, o intervalo de uma quarta, e assim por diante. Essa, claro, uma maneira de fazer experi-mentos com o monocrdio. O principal problema que ela requer dividir e ento redividir a corda inteira em muitas diferentes divises, uma aps a outra. Uma maneira mais simples e bvia de usar o monocrdio consiste

    10 Diz West de seu livro: Kathleen Schlesinger escreveu um livro enorme e espantoso, The Greek Aulos, fundada na crena de que os tubos gregos tambm tivessem orifcios equidistantes. Ela no se perturbou com o fato de que isso no verdade para o nico sobrevivente dos auloi clssicos que ela estudou (1995, p. 96). Essa observao falsa, podendo-se demonstr-lo, como ir mostrar a considerao de Schlesinger (1939, p. 97), onde precisamente esse fato notado e explicado. Teria West se intimidado pelo carter enorme e espantoso do livro a ponto de no o ter lido propriamente? Andrew Barker (1989, p. 154 n. 33) tambm descon-sidera Schlesinger, ainda que com menos rudeza. A preferncia de Barker claramente por Aristxeno. Anderson (1966, pp. 23-25) oferece mais suporte, at mesmo referindo-se teoria de Schlesinger como inusualmente atraente. Mas ele descondiera suas ideias em parte por estarem em dissidncia com os relatos dos tericos, no tendo qualquer suporte inequvoco de qualquer evidncia escrita, o que, precisamente, o que se deveria esperar se os tericos e a evidncia escrita dependem todos, como o caso, da obra de Aristxeno.

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    9em dividir a corda inteira apenas uma vez, mas dividindo-a em mltiplas divises semelhantes, chegando ao nmero de 16, 30 ou 60. Procede-se ento a tocar a corda na primeira dessas divises, digamos em um dezesseis avos de seu comprimento. Toca-se a corda ento em dois dezesseis avos, ento em trs e assim por diante, at o fim. Esse processo produz tambm os mesmos intervalos de antes, mas sem a necessidade de fazer repetida-mente a diviso da corda. Pois a segunda nota, tocada em dois dezesseis avos, produz, com a primeira nota em um dezesseis avos, o intervalo de uma oitava; a terceira nota produz, com a segunda nota, o intervalo de uma quinta; a quarta produz, com a terceira, o intervalo de uma quarta, e assim por diante. Dessa maneira, obtm-se todos os intervalos simplesmente ao mover progressivamente, ao longo da corda, aumentando o comprimento a ser tocada por um igual incremento a cada vez.

    H duas peculiaridades nessa maneira de usar o monocrdio que mere-cem observao. Primeiro, produzir-se-, dessa forma, intervalos progressi-vamente menores em uma srie sistemtica (e extensvel indefinidamente), com efeito na srie harmnica; segundo, esses intervalos sero produzidos de cima para baixo, no de baixo para cima. A maneira anterior de empregar o monocrdio, que a maneira moderna padro, produz os intervalos de baixo para cima. Essa segunda maneira, mais simples, no pode seno produzir os intervalos na direo oposta. Os gregos, como sabemos, construam suas escalas de cima para baixo, e certamente Aristxeno assim o fez. Mas no h uma razo que necessariamente o constrangesse a construir os intervalos de cima para baixo e no o contrrio. O fato de ter ele procedido de cima para baixo ao invs de baixo para cima quase certamente devido ao fato de que os tericos anteriores, os modalistas por ele criticados, procederam de cima para baixo. Assim, no de modo antinatural que Aristxeno procedeu da mesma maneira a despeito, ou antes por conta de sua crtica a eles. Mas por que os modalistas procederam de cima para baixo? Talvez sua prtica fosse muito arbitrria, mas devemos levar a srio a possibilidade de que tenha havido uma razo: a razo intrnseca ao modo mais simples e bvio de utili-zar um monocrdio (que ns no utilizemos o monocrdio da maneira mais simples e bvio sem dvida porque em nossa msica moderna, por razes histricas, construmos nossas escalas de baixo para cima, e assim tambm construmos os intervalos no monocrdio). Que Pitgoras e seus seguidores tenham usado o monocrdio construindo intervalos de cima para baixo pode ser quase tomado por certo, se no por outro motivo, porque isso faria toda a coisa simples e bvia. Construir os intervalos de baixo para cima, ainda

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    10 que possvel, nada acrescentaria ao entendimento musical (j que tudo que se pode fazer de uma maneira pode tambm ser feita da outra) e, todavia, acrescentaria muito de inconvenincia prtica.

    Que os modalistas criticados por Aristxeno construssem suas escalas de cima para baixo sabemos por certo, a partir de dois fatos que o prprio Aristxeno revela em sua crtica, a saber, que eles se orientavam musicalmente pelo aulos e que construam seus diagramas com intervalos densamente comprimidos. Pois, para abordando primeiro este segundo ponto, ao descer o monocrdio atravs de incrementos iguais, todos os intervalos anteriores reaparecem, mas com menos intervalos entre eles. Assim, o intervalo da oitava aparece entre a oitava e a quarta nota tocada, mas com os intervalos formados pela quinta, sexta e stima notas no meio; a oitava tambm aparece entre a dcima sexta e a oitava nota tocada, mas agora com muitos outros intervalos no meio, intervalos que so eles mesmos duplicatas, mas mais abaixo, dos intervalos j tocados mais acima. Esse fenmeno salta aos olhos e aos ouvidos a partir da srie descendente de intervalos no monocrdio, como mostra abaixo o diagrama na figura 1. Isso salta ainda mais aos olhos na figura 2 abaixo. Pois, ao tomar o monocrdio e marcar em sua caixa de ressonncia os pontos nos quais os intervalos para todos os modos devem ser colocados, alguns desses pontos ficaro muito prximos uns dos outros (em intervalos de muito menores do que o quarto de tom, para no dizer do semitom). Assim, na figura 2 abaixo, imagine todas as linhas de intervalo estendendo-se para cima, a partir de cada uma das fileiras inferiores em direo fileira superior. A fileira superior apresentaria assim uma srie de linhas densamente comprimidas11.

    Esses diagramas explicam de imediato o que pretendiam os modalistas, algo absolutamente no compreendido por Aristxeno e desconsiderado por ele como ignorncia. Mas Aristxeno quem era ignorante, como os diagramas e os fatos musicais correspondentes deixam claro. Pois, ainda que muitos dos intervalos que se descubram dessa maneira no monocrdio sejam

    11 Quase certamente os modalistas criticados por Aristxeno desenhavam diagramas seme-lhantes figura 2. Talvez at estivessem procurando detectar pelo ouvido a diferena entre os mnimos intervalos para ver como esses pequenos intervalos poderia distinguir os modos. Mas tais intervalos so muito pequenos para serem detectados individualmente quando descom-primidos. Eles precisam ser escutados dentro de sua sequencia modal, no transversalmente, entre sequencias modais. Nessa medida, Aristxeno estava correto em suas crticas. Ele errou apenas em supor que assim os modalistas no soubesse de qu estavam falando em seus diagramas, quando sem dvida eles o sabiam muito bem.

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    11impossveis de cantar ou no sejam meldicos, como reclama Aristxeno (uma vez tendo ele insistido em orientar-se na teoria musical pelo que cantvel pela voz humana), so, no obstante, sonoros e audveis, pois o monocrdio ir toc-los. Eles so certamente, portanto, intervalos musicais, mesmo que no cantveis, e esse resultado, no que concerne aos modalistas e aos modos tradicionais, teria sido perfeitamente suficiente.

    O segundo fato diz respeito s propriedades musicais do aulos (bri-lhantemente expostas e experimentalmente comprovadas por Schlesinger). Pois o aulos funciona, de fato, como um monocrdio de sopro. De certo dessa maneira que ele funcionar, seguindo-se o caminho mais fcil e mais bvio, do ponto de vista prtico, de construir e tocar um aulos. Precisamos, com efeito, ter em mente que na Grcia antiga, mesmo em suas pocas mais sofisticada, e com maior razo em suas mais primitivas, nada havia das tcnicas e das mquinas modernas de que hoje dispomos para produzir instrumentos de quase qualquer dimenso e divises (e, em particular, para produzir instrumentos afinados nossa escala temperada, altamente artificial e matematicamente sofisticada).

    Os primeiros tocadores de aulos, pastores nos campos com seus reba-nhos, estariam limitados tcnica mais simples. Ao tocar-se o aulos, ou simplesmente um canio de algum comprimento, ser notado, ainda que por acidente, que o canio soa uma nota quando soprado sem orifcios ao longo de seu comprimento, e uma outra nota, ou muitas notas, quando pos-sui orifcios e estes so abertos e fechados pelos dedos. Primeiro, talvez, os orifcios, se por acidente, poderiam ter sido dispostos em qualquer ponto do comprimento do canio, sem que nenhuma conexo pudesse ter sido encon-trada entre as notas tocadas. Mas se um pastor, passando o tempo enquanto suas ovelhas comem erva, decidisse fazer os orifcios por si mesmo, como ele procederia? Bem, ele seguiria um mtodo, e o mtodo natural e bvio seria de colocar os orifcios em distncias iguais. Ele poderia comear com um metade do comprimento do canio, e ento fazer um outro metade do comprimento e assim por diante. Ou, talvez, ele os fizesse em um tero ou dois teros do comprimento, ou ento no ponto mdio entre eles, ou ainda de outras formas. Devemos acrescentar que o aulos efetivamente composto por dois canios, o tubo principal funcionando como ressoador (essa parte tudo que sobreviveu do que se encontrou dos restos de auloi nas escavaes arqueolgicas), e um canio menor inserido sobre ele, ao bater as extremidades achatadas colocadas na boca (canio duplo), ou ao bater uma lngua alongada e articulada, cortada nele (canio simples), que

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    12 produz o som. Uma vez que este canio menor se acrescenta ao compri-mento total do aulos, uma diviso do ressoador principal em, digamos, seis, seria efetivamente uma diviso em sete, se o canio menor fosse igual em comprimento quele com seis divises. De todo modo, podemos facilmente imaginar como os pastores poderiam produzir auloi com orifcios espaados em muitas sries diferentes de intervalos iguais.

    O que se obtm musicalmente de um aulos assim divido? A resposta que se produzem notas relacionadas umas s outras da mesma maneira que as notas do monocrdio, quando formadas em ordem descendente. Se todos os orifcios de um aulos so deixados abertos, ele vai soar sua nota mais alta, isto , a nota formada pelo orifcio mais prximo boca. Se esse orifcio bloqueado, vai soar a nota formada pelo prximo orifcio no sentido descendente; este, pela prpria natureza da circunstncia, deve formar com a primeira nota (e tambm com as outras notas) um intervalo que relacio-nado a ela da mesma maneira que um intervalo numerado no monocrdio. Digamos, para argumentar, que o aulos seja dividido em 12 segmentos iguais, com o intervalo numerado 12 sendo a nota fundamental, ou a nota que o comprimento completo do aulos soa quando todos os orifcios so bloque-ados. Vamos ainda supor que os orifcios no aulos estejam localizados nos segmentos numerados de 6 a 11.

    Quando todos os orifcios esto abertos, o som produzido atravs do orifcio 6 e essa nota formar, com a fundamental, o intervalo de 6 a 12 (que uma oitava, 1:2). Quando esse orifcio fechado, o som se produzir atravs do orifcio 7 e essa nota formar, com a nota do orifcio 6, o intervalo de 7 a 6 (que uma terceira com stima) e, com a nota fundamental, o intervalo de 7 a 12 (que uma sexta aumentada); os sucessivos orifcios produziro notas em intervalos de 8 a 7 (o tom com stima) e de 8 a 12 (a quinta, 2:3), 9 a 8 (o tom) e 9 a 12 (a quarta, 3:4), 10 a 9 (um tom menor) e 10 a 12 (a tera menor, 5:6), 11 a 10 (um tom mais diminuto) e 11 a 12 (um tom ainda mais diminuto)12. Se o aulos for dividido de acordo com algum outro nmero (digamos, 11 segmentos ao invs de 12), os intervalos e divises sero algo completamente diferente.

    Importante de notar que qualquer aulos, bastando que seja construdo (da maneira como quase certamente ele o seria em condies primitivas) com orifcios espaados em divises iguais, produziria necessariamente uma srie

    12 De acordo com Schlesinger (1939, pp. 19-23), esse modo na verdade o frgio. Ver figuras abaixo.

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    13de notas, uma escala, em outras palavras, que estariam relacionadas assim como esto um ou outro dos intervalos em um monocrdio descendente. Simplesmente no poderia ser de outra forma.

    O que segue disso? Canios podem ser encontrados em muitos lugares diferentes, mas as pessoas que vivem nesses lugares tm linguagens, tradies, hbitos e preferncias diferentes. Um canio com orifcios de acordo a um conjunto de divises iguais pode produzir uma srie de notas que agrada-riam a um grupo de pessoas, enquanto um canio com orifcios de acordo a outra diviso agradaria a outro grupo. Dessa forma, canios divididos de uma maneira tenderiam a dominar em uma localidade, canios dividos de outra em outro lugar. Os frgios teriam canios e auloi construdos para produzir um conjunto de intervalos musicais, os ldios outro e os drios um terceiro. medida que esses grupos interagissem, pelo comrcio, pela guerra ou ao acaso, e comparassem seus diferentes auloi, eles comeariam a perceber as diferenas e passariam a chamar os auloi e os intervalos dos outros de maneira frgia, ou ldia, ou drica. Em resumo, eles fariam referncia s escalas e construes de notas (harmoniai) de acordo ao jeito frgio, ldio ou drio ( o que significam, com efeito, as palavras gregas para os modos , , literalmente). Tal, como Schlesinger pela primeira vez to bem argumentou, um modo grego antigo, e sobre isso que Plato e Aristteles, na passagem acima dos Problemas, esto falando. Um modo, portanto, nada tem a ver com o que sonhava Aristxeno ou com o que nos tenha legado qualquer outro terico musical grego cujas obras tenham sobrevivido. Podemos, no obstante, confirmar, e at provar, que tal o que um modo, a partir do que Aristxeno disse ao criticar os modalistas. Pois, em sua prpria incompreenso, ele deixou pistas decisivas a respeito daquilo que realmente estavam fazendo esses modalistas.

    Para provar os pontos acima argumentados, suficiente seguir Schelsinger a citar algumas das passagens dos Elementos Harmnicos de Aristxeno para os quais ela mesma chama a ateno. Tudo aquilo rejeitado por Aristxeno como absurdo e simplrio nos modalistas no nem aburdo nem simpl-rio, mas faz completo sentido quando visto luz dos fatos aduzidos por Schlesinger13. Esse fato mostra que no eram os modalistas a no entender

    13 A incompreenso de Aristxeno poderia ser explicada, e at em certa medida desculpada, se, sua poca, por conta das sofisticaes na construo de auloi (e principalmente o uso de um s tubo, no lugar de dois), os orifcios nesses auloi no fossem mais confiveis para obter notas na srie harmnica descendente, de modo a no mais serem confiveis para preservar

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    14 aquilo de que estavam falando, mas Arisxenos quem no entendia do que falavam os modalistas.

    Harm. II, 39: Com respeito ao objetivo atribudo cincia chamada har-mnica, alguns dizem que ele est na notao das melodias, alegando ser esse o limite da compreenso de cada melodia, enquanto outros o situam no estudo de auloi e na habilidade de dizer de que maneira e a partir de qual origem surgem os sons emitidos pelo aulos. Mas dizer tais coisas sinal de total incompreenso... (BARKER, 1989, p. 155)

    Harm. II, 41: No menos absurda a concepo a respeito dos auloi... No por causa de qualquer das propriedades dos instrumentos que a afinao harmnica tem o seu carter e arranjo. No porque o aulos tem orifcios para os dedos, calibre e coisas assim... que a quarta, a quinta e a oitava so consonantes, ou quecada um dos outros intervalos tem a sua magnitude apropriada (ibid., p. 157).

    Harm. II, 42: Se algum imagina que, por ver serem os orifcios os mesmos todos os dias... por isso encontrar a afinao fixada permanentemente neles e mantendo a mesma organizao, ele absolutamente um simplista (ibid., p. 158)14

    Harm. II, 43: Est claro, portanto, no haver razo para basear o estudo da melodia no aulos, j que esse instrumento incapaz de estabelecer a verdadeira ordem da afinao... (ibid., p. 158).

    a estrutura e o carter dos modos. Schlesinger explica com algum detalhe o que poderia estar acontecendo nesse caso no captulo dois de seu livro.14 Barker discute essas passagens brevemente em uma obra posterior (2007, pp. 58-60) e expressamente reala o fato (notado muito antes por Schlesinger) de que um aulos tendo os orifcios perfurados em intervalos espaciais equidistantes produzir notas em intervalos musicais decrescentes. Assim ele aponta que, por exemplo, um aulos com o primeiro orifcio perfurado a 8 unidades do bocal, com o segudo a 12 unidades e o terceiro a 16 unidades produzir notas nas propores de 8:12 (uma quinta, 2:3) e 12:16 (uma quarta, 3:4), embora as distncias espaciais (4 unidades) sejam a mesma em cada caso. Ele quase tropea, o que se quer dizer, na descoberta de Schlesinger sobre os modos. Todavia, diferentemente dela, ele no persegue o assunto mais longe porque, ao que parece, ele est sobremaneira impres-sionado (como estava talvez Aristxeno antes dele, ver nota anterior) com as maneiras pelas quais orifcios equidistantes no aulos podem, com a utilizao de numerosos truques musicais (especialmente aqueles introduzidos pelo tubo simples), produzir uma variedade de notas diferentes e no apenas aquelas determinadas pelo espaamento entre os orifcios. Assim, ele abate a possibilidade de que a significncia musical fundamental da distncia equivalente possa ser a pista que faltava para saber o que eram os modos antes da teorizao de Aristxeno ter obscurecido a questo.

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    15O PROBLEMA E UMA SOLUO MAIS VERDADEIRA: O ETHOS DOS MODOS

    Com esse entendimento do que eram os modos, podemos agora nos dirigir ao segundo problema mencionado ao incio, o problema do ethos dos modos. Pois, se esses modos so aquilo que Schlesinger diz deles e pela evidncia por ela aduzida prova-se qu e assim deveria ser , ento supor que esses modos, enquanto modos, isto , enquanto sistemas de intervalos musicais, poderiam produzir os diferentes efeitos morais e emocionais a eles atribudos, isso perfeitamente plausvel. Ao invs dos modos se diferencia-rem apenas em altura, em ordem ou em apenas um ou dois intervalos, eles diferem em tudo. Pois se tomamos uma corda soando uma nota fundamental, digamos F duas oitavas abaixo do C mdio, e se ento a dividimos em 9, 10, 11 ou 12 divises iguais, produziremos uma srie completamente diferente de intervalos descendendo da mesma nota fundamental. Alm disso, uma vez que essa srie ser uma srie harmnica descendente em cada caso, ela ter uma nota principal ou arch (a saber, a nota mais alta de onde comea a srie e tambm, por derivao, de qualquer intervalo de oitava a partir dela, como o quarto, oitavo ou dcimo sexto graus descendentes) situada em pontos diferentes na srie. Se a diviso por 12, essa nota principal ou sua oitava derivada estar a quatro graus da fundamental (8 de 12); se a diviso por 11, estar, a oito graus, e assim por diante. Essa nota principal nada tem a ver com o que chamamos a tnica de uma escala. Pois nossas escalas no se baseiam nas srie harmnica descendente (nem mesmo na ascendente). Alm disso, a tnica em nossas escalas est sempre no mesmo grau da escala, a saber a primeira nota, indo de baixo para cima. A nota principal para os gregos, porm, por eles chamada mes, no nada seme-lhante nossa tnica e aparece em diferentes graus em cada um dos modos (de uma forma que at mesmo Aristxeno admitia).

    J que, assim, cada modo difere tanto em cada um dos seus intervalos quanto na posio relativa de sua nota principal, cada modo ser toto caelo diferente de todos os outros. No haveria, portanto, nada suprendente que modos assim diferentes tambm possam diferir em seus efeitos ticos. Em consonncia, as afirmaes de Plato, Aristteles e dos Pitagricos sobre os efeitos extraordinariamente diversos dos diferentes modos podem ser tomados por seu valor de face, sem que precisem ser desconsiderados como subje-tivos, obscuros ou equivocados. Schlesinger, com efeito, afirma ela mesma:

    Nenhuma pessoa familiar com as sequncias modais das Harmoniai na Grcia antiga alimenta dvidas com respeito potncia de seu Ethos. To-

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    16 car uma simples frase meldica nos mesmos graus de cada Harmonia em sucesso fornece uma demonstrao convincente da realidade do Ethos caracterstico dos Modos. (SCHLESINGER, 1939, p. 135)

    Dada a comprovada confiabilidade de Schlesinger em outros assuntos relativos aos modos gregos, e dada a sua extensa experimentao nas recons-trues de auloi e monocrdios, devemos aceitar a verdade de sua afirmao. Evidentemente, seria interessante se pudssemos ns mesmos confirmar o que ela diz, fazendo o que ela fez e o que recomenda, a saber, ouvir os modos gregos por ns mesmos e, particularmente, uma simples frase mel-dica tocada, alternadamente, em cada modo. Pois a pergunta que no deixa agora de provocar instigante interesse de que maneira os modos, como os distingue Schlesinger, efetivamente soam e como eles nos afetam diver-samente. O melhor mtodo a seguir neste caso, claro, seria efetivamente produzir instrumentos com intervalos de acordo aos modos de Schlesinger e toc-los. Infelizmente, tais instrumentos, at onde eu saiba, no existem e, alm disso, nenhuma das gravaes de msica grega antiga atualmente disponveis segue as descobertas de Schlesinger. Elas seguem, ao invs, o que se encontra nos escritos remanescentes dos tericos gregos e o que os estudiosos modernos elaboraram desses escritos. Por conseguinte, ainda que possam representar com preciso como soavam algumas das msicas gregas em sua performance ps-aristoxeana, elas no representam, e no podem representar, a maneira como os modos soavam para Plato, Aristteles, os pitagricos e seus contemporneos.

    E, todavia, no estamos completamente perdidos, pois podemos olhar e comparar os modos ( maneira como Schlesinger os reconstri), em conformi-dade com seus intervalos individuais e caractersticos. luz desses intervalos podemos talvez arriscar um bom palpite sobre a causa de terem o ethos que se atribui a eles15. Retornemos, ento, citao dos Problemas com a qual abriu-se este artigo, e vamos observar o que, nela, atribui-se expressamente aos diferentes modos.

    A citao concerne principalmente aos modos hipodrio e hipofrgio, e com o fato de que ambos tm o carter ou ethos da ao, sendo assim apropriados aos atores na tragdia, mas no ao coro, que no heroico e no atua. Os outros modos, especialmente o mixoldio, so mencionados como sendo apropriados ao coro, tendo carter plangente e tranquilo,

    15 As reflexes a seguir sobre os modos so em larga medida as minhas prprias, inteiramente despertadas pelas observaes de Schlesinger.

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    17excetuando-se o frgio, o qual, ainda que apropriado, em termos, ao coro, excitante e bquico.

    Para ver como esses modos podem ajustar-se s descries, considere a partir do diagrama seguinte a maneira como Schlesinger os reconstri, de acordo srie harmnica descendente baseada em divises progressivas de 8 a 14 (ou o dobro da oitava deleas no caso das divises de 8 a 12)16. Observe que a nota marcada em negrito, 6 ou 16, a mes, ou a arch do modo. Ela est sempre em algum intervalo de oitava a partir da primeira nota implcita de qualquer dessas sries, a saber, 1 (pois a primeira oitava a partir de 1 em ordem descendente 2, a seguinte 4, ento 8, 16 e assim por diante). Em deferncia prtica moderna, as notas esto dispostas em ordem ascendente de altura, da esquerda para a direita, de modo que a nota mais baixa no modo a que est mais esquerda, e a mais alta e que est mais direita.

    Mixoldio 14 13 12 11 10 9 8 7Ldio 13 12 11 10 9 8 7 6Frgio 24 (12) 22 20 18 16 14 13 12Drio 22 (11) 20 18 16 14 13 12 11Hipoldio 20 (10) 18 16 14 13 12 11 10Hipofrgio 18 (9) 16 15 13 12 11 10 9Hipodrio 16 (8) 14 13 12 11 10 9 8

    Figura 1: Os modos nos intervalos

    Figura 2: Os modos em localizao espacial no monocrdio

    Esses modos esto evidentemente relacionados de uma maneira sis-temtica. Cada um diferente do seu vizinho imediatamente anterior por um, isto , ao aumentar (ou diminuir) o nmero da diviso por um (ou o

    16 Os detalhes da construo de Schlesinger e o porqu dessa ou daquela diviso ajustar-se a esse ou outro modo so demasiado complexos e difceis para serem aqui expostos. O leitor interessado deve consultar o captulo um de seu livro.

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    18 seu dobro), de 8 para 9, para 10 e assim por diante, at 14. Esses modos esto tambm relacionados de uma maneira sistemtica ao repetirem-se os intervalos encontrados em outros modos, mas em um ponto da escala que sempre diferente, nunca no mesmo. Assim, cada escala, como foi observado, toto caelo diferente uma da outra, a despeito das similaridades sistemticas.

    A fim de melhor entender esses modos e seus padres de intervalo espe-cficos, preciso primeiro recordar de que maneira os intervalos expressos em razes numricas se traduzem em quintas, quartas, teras etc. A traduo a seguinte:

    1:2 oitava = diapason medieval ou intervalo dplice2:3 quinta = diapente medieval ou intervalo sesquitrcio

    3:4quarta = diatessaron medieval ou intervalo sesquiltero

    4:5 tera maior5:6 tera menor6:7 tera menor com stima7:8 tom inteiro com stima ou segunda

    8:9tom inteiro ou segunda = intervalo sesquioctavo medieval

    9:10 tom inteiro menor ou segunda10:11:12:13:14:15 tons inteiros menores diminudos15:16 semi-tom3:5 sexta maior5:8 sexta menor7:12 sexta maior com stima8:15 stima maior9:16 stima menor5:9 stima menor diminuda4:7 stima menor com stima

    Figura 3: Os intervalos como propores

    Considere a seguir o diagrama dos modos de Schlesinger, agora com os vrios intervalos reduzidos aos seus termos mais baixos, a fim de deixar clara a sua interpretao:

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    14 13 12 11 10 9 8 77 6 5 4

    4 33 2

    2 1

    Ldio

    13 12 11 10 9 8 7 66 5 44 33 2

    2 1

    Frgio

    24 22 20 18 16 14 13 1212 11 10 9 8 7 66 5 4 34 3 23 22 1

    Drio

    22 20 18 16 14 13 12 1111 10 9 8 7 6

    5 4 33 2

    2 1

    Hipoldio

    20 18 16 14 13 12 11 1010 9 8 7 6 55 4 3

    3 22 1

    Hipofrgio

    18 16 15 13 12 11 10 99 8 6 5

    4 36 5 4 3

    3 23 22 1

    Hipodrio

    16 14 13 12 11 10 9 88 7 6 5 4

    4 34 3 2

    Figura 4: Os modos com seus intervalos nos termos mais baixos

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    20 Cada modo estende-se por uma oitava, mas apenas trs contm duas quartas (3:4) arredondando a escala (o equivalente aos dois tetracordes aris-toxeanos), a saber o hipofrgio, o hipodrio e o frgio. Os demais contm apenas um intervalo de quarta. Os primeiros trs e isso significativo so modos assinalados pela passagem dos Problemas como no adequados, ou pouco adequados ao coro. O frgio, a propsito, o nico modo que corres-ponde inteiramente aos requisitos de Aristxeno, por ser o nico composto de dois tetracordes de uma quarta juntos, ao meio, por um tom inteiro. O hipofrgio e o hipodrio tm o tom inteiro respectivamente abaixo e acima de duas quartas. O hipofrgio, como o frgio, tem duas quintas, mas o hipo-drio caracterstico por comear e terminar sua oitava na mes, a arch do modo, isto , na maior e na menor altura do modo. Essa peculiaridade talvez explique por que a passagem dos Problemas diz que esse modo possui um carter magnificente e firme, pois ele arredonda a escala inteira com o princpio do modo.

    Ora, esses trs modos so os nicos que se cravam firmemente em quar-tas e quintas. Todos os outros circundam suas nicas quartas e quintas com teras e segundas. Podemos j conjecturar, portanto, que esses outros modos no sero modos de ao pois as solidas harmonias de quartas e quintas no arredondam a escala, mas desvanecem, em qualquer das pontas, em harmonias diminudas de teras e segundas. No se vai sentir, assim, que o modo mova resolutamente de um passo a outro, mas muito mais que, depois de um passo slido de quarta ou quinta, somos parados com o balbucio ou com o fraco meio-passo de uma tera ou segunda. Por essa mesma razo, esses outros modos entregar-se-o melodia, como sugere a passagem dos Problemas ao dizer: porque so tais as harmoniai que menos possuem melodia, sendo esta o que h de mais necessrio ao coro?. Pois, uma vez que elas no estaro voltando com muita frequncia a quartas e quintas, vo mais livremente alcanar outros e mais variados intervalos. Assim, finalmente, estimularo mais a reparar na melodia do que a agir.

    Por que, no obstante, seria o frgio excitante e bquico? Bem, ele , cravando-se sobre quartas e quintas, um modo de ao, certamente, mas por que um modo de ao excitante e bquica? Talvez porque ele seja o nico dos trs modos de ao que tem o tom inteiro (8:9) ao meio da escala. Assim, medida em que se desce, ao invs de comear ou terminar com um tom inteiro (8:9) que arredonda ou resolva a quarta com uma quinta, comea--se ou termina-se com tons inteiros menores diminudos (11:12, 12:13) que, assim, no arredondam ou resolvem quartas com quintas. Dessa maneira,

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    21sente-se a necessidade de seguir procurando adiante pela resoluo, sem encontr-la, assim tornando-se mais e mais e mais frentico. Por contraste, esses tons inteiros menores diminudos, no caso dos modos hipodrio e hipofrgio, so mantidos de modo seguro nos liames das quartas resolvidas. Assim, esses ltimos modos so ativos, porm no bquicos.

    Todos os demais modos, por contraste, no so modos de ao, pois, como se disse, eles no esto cravados em quartas e quintas, o que sufi-ciente para explicar o que a passagem dos Problemas diz a seu respeito. Mas a passagem diz tambm que o mixoldio mais plangente e tranquilo. Sua carter tranquilo suficientemente evidente pelo fato de no ser um modo de ao, mas o plangente se pode entender a partir de algo para qu Schlesinger chama a ateno particularmente. O mixoldio o nico dos modos que desce em passos equivalentes sem saltar qualquer passo. Assim diz Schlesinger desse modo:

    Na escala modal descendente [i. : da esquerda para a direita nas figuras 1 e 2 acima] ou em um uso meldico da sequencia modal mixoldia... o luto aprofunda-se em uma atmosfera de melancolia e depresso que se torna quase insuportvel medida em que o melos mergulha em passos lentos partindo da mes, atravs do segundo tetracorde... at a tnica [sc. a nota mais baixa do modo]. (SCHLESINGER, 1939, p. 136)

    Pode-se pensar que Schlesinger esteja sendo demasiado dramtica; mas, em sua defesa, preciso notar, como ela faz, que o mixoldio tem a mes, ou a arch do modo, no ponto mais alto da escala de todos os modos, ou seja, a nota marcada em negrito nas figuras 1 e 2 acima , nesse modo, a que fica mais direita ( exceo do hipodrio que, como foi notado, tem por carac-terstica a mes em ambas as pontas do modo, na maior e na menor altura, de modo a no ter nem um centro mais alto, nem um centro mais baixo), dando ao modo um centro de grande altura caracterstico, e a tristeza e o choro no raramente se expressam por uma altura elevada (cf. Pr., XI, 50).

    Um ltimo ponto diz respeito ao modo drio, o qual, ainda que no seja mencionado na passagem dos Problemas, regularmente associado por Plato e Aristteles com a moderao e a firmeza. Que ele no seja um modo de ao ajuda a explicar sua firmeza (ele no prepara ao). Sua firmaze tambm se explica por ter sua mes mais o mais prximo do centro. O frgio tambm tem sua mes o mais prximo do centro, mas um modo de ao e, como se explicou, um modo de ao bquica no , assim, estvel. O drio est tambm no ponto mdio de todos os modos em termos do nmero de

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    22 divises para a construo das notas (11 estando a meio caminho entre 8 e 14), e assim nenhuma delas se eleva a uma altura, nem mergulha no grave, ao partir da mes, como fazem os outros. Ele mantm a mediania, como tal, de sentimento e ao, sendo assim associado, apropriadamente, moderao.

    No h dvida de que, se se aprofunda a explorao dos modos, especial-mente se for possvel ouvi-los em instrumentos adequadamente construdos, chegar-se- a mais evidncias em apoio das pretenses afirmadas acima. Mas o que se disse aqui deveria, espera-se, ser suficiente para mostrar que a passagem dos Problemas, com a qual iniciou-se este artigo, fazem bastante sentido, quando analisadas luz do magnfico trabalho de Schlesinger a respeito dos modos musicais gregos.

    Traduo do ingls: Bruno Conte (PUC-SP)

    RecebidoAceito

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

    ANDERSON, Warren D. Ethos and Education in Greek Music. Cambridge: Harvard University Press, 1966.

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    _____. The Science of Harmonics in Classical Greece. Cambridge: Cambridge University Press, 2007.

    JAN, Carolus. Musici Scriptores Graeci. Leipzig: Teubner, 1895.LIPPMAN, Edward. Musical Thought in Ancient Greece. New York: Da Capo

    Press, 1975.MAYHEW, Robert. Aristotle: Problems, vol. 1: Books 1-19. Cambridge: Harvard

    University Press, 2011 (tr. brasileira ARISTTELES. Problemas musicais: Seo XIX dos Problemas. Traduo notas e ndices Maria Luiza Roque. Braslia: Thesaurus, 2001)

    SCHLESINGER, Kathleen. The Greek Aulos. London: Methuen, 1939.WALLACE, Robert. Performing Damons Harmoniai. In Hagel, S.; Harrauer,

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    West, M. L. Ancient Greek Music. Oxford: Oxford University Press, 1992.

  • HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p. 23-34

    DIALCTICA Y RETORICA: SCRATES Y GORGIASDIALECTICS AND RHETORIC: SOCRATES AND GORGIAS

    HUGO RENATO OCHOA DISSELKOEN*

    Resumen

    Se pretende, en virtud de una comparacin entre el discurso de Scrates en la Apologa, y el de Gorgias en el Encomio de Helena, establecer los alcances y lmites de un discurso que aspira a ser puramente racional, es decir, que se rehsa a utilizar elementos retricos. Asimismo, ya que el Encomio es de hecho un elogio de la retrica, se analiza el sentido de esta defensa y su fundamento.Palabras clave: Platn, Scrates, Gorgias, retrica, dialctica.

    Abstract

    The aim here is to use a comparison between the discourse of Socrates in the Apology and that of Gorgias in his Encomium of Helen in order to set out the reach and limits of a discourse that aims to be purely rational, that is, of a discourse that refuses to use elements of rhetoric. Also, since the Encomium is in fact a eulogy of rhetoric, the meaning of this defense and its foundation are analyzed.Keywords: Plato, Socrates, Gorgias, rhetoric, dialectic

    El gora es el lugar pblico de la palabra, y el caso de la defensa y acusa-cin de Scrates no es ms que un momento peculiar de ese espacio. Ahora bien, esta palabra, por su mismo carcter pblico, es un modo de interlocu-cin tal que vuelve imposible arbitrar el discurso por medio de preguntas y respuestas, como suele hacer Scrates. Y, si bien lo lleva a cabo con Meleto, no puede hacerlo con los jueces, quienes son los verdaderos interlocutores de la defensa de Scrates, para fijar el sentido, alcance y contenido de su discurso. De modo que se debera comenzar por disponer el nimo de los jueces si se quiere que las palabras tengan una buena acogida, ya que las

    * Hugo Renato Ochoa Disselkoen professor da Pontificia Universidad Catlica de Valparaso, Chile. Email: [email protected]

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    24 palabras no son capaces, de suyo, de hacer lo que dicen. Quiero decir, por ejemplo, que la palabra fro, no enfra o la palabra dolor no duele; lo cual es obvio, pero de esto se concluye que la pura semntica de los trminos, en virtud de su inevitable anfibologa, es incapaz de comunicar, es decir, poner realmente en comn, una experiencia, tal vez s slo meros pensamientos. Tal es el contexto en el que se va a desenvolver la defensa de Scrates.

    Al comienzo de la Apologa, Scrates hace un elogio, sin duda irnico, de la retrica de Meleto: su persuasin es tal que incluso ha hecho olvidar a Scrates que el acusado es l mismo, al punto de haber asentido mientras escuchaba la acusacin que, no obstante, como luego afirma, es completa-mente falsa. Entre otras cosas, Meleto previene a los jueces contra el logos socrtico, ste sera un hbil (deinos) orador, lo cual, segn Scrates, ser inmediatamente refutado, porque l se limitar a decir la verdad, sin adornos retricos. Con esto queda claro desde un principio la distancia entre medios y fines. Por una parte, el lenguaje corriente del gora, por la otra el lenguaje tcnico ajustado a un tribunal, por una parte la verdad, por otra lo pseudos. Pero Scrates no se limita a ironizar respecto del discurso de Meleto, y a renunciar al uso del lenguaje apropiado a la circunstancia, sino que adems le fija al tribunal su cometido: ... que no se preocupen del modo como me expreso, sea mejor o peor, y que consideren y pongan atencin tan slo al hecho de si es justo o no lo que digo. Pues en esto consiste la virtud propia del juez, y la del orador, en decir la verdad1.

    No obstante, la labor del juez puede ser entendida de dos maneras diversas. O bien ha de juzgar conforme a la justicia; o bien ha de estable-cer simplemente qu es lo justo en ese caso concreto. Evidentemente para Scrates el juicio de los jueces, para que sea justo, ha de conformarse a lo que la justicia es de suyo. No obstante cabe pensar, sobre todo atendiendo a los gritos y protestas que Scrates se ve obligado a acallar y que interrumpen varias veces su discurso, que para los jueces se trata simplemente de juzgar a Scrates, de tal modo que el veredicto mismo es el que establece lo justo, y es precisamente eso lo que convierte a los jueces en jueces.

    Se puede decir esto mismo tambin de otra manera, no habra la justicia, sino slo lo justo; no hay tal sustantivo con una identidad esencial que lo defina, sino que se trata siempre de un adjetivo. Ahora bien, si en lugar de una justicia sustantivada se trata en el juicio de establecer qu atributo conviene

    1 PLATN. Apologa de Scrates. Traduccin, anlisis y notas de Alejandro G. Vigo. Santiago: Editorial Universitaria, 2005, p. 33.

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    25a Scrates, el de ser justo o el de ser injusto, entonces el discurso adquiere un sentido completamente distinto, por cuanto la persuasin obra el objeto en la misma medida que establece, en virtud del juicio, lo que es y lo que no es. El juez juzga, entonces, de acuerdo a su propia conviccin o, incluso, si se quiere, dicho en trminos contemporneos, de acuerdo a su conciencia (no de acuerdo a una presunta justicia allende el sujeto), conciencia que no puede tener otro fundamento que, precisamente, la propia conviccin; ms an, fallar contra la propia conciencia, contra la propia conviccin, constituye un acto de fundamental injusticia para consigo mismo.

    De modo que la pretensin de Scrates, es decir, que los jueces juzguen slo si lo que Scrates dice es justo o no, contrastando sus palabras con la justicia misma, sin atender en absoluto a la fuerza o debilidad persuasiva de sus palabras, significa desconocer lo que es, para los jueces, el fundamento real del juicio que han de emitir, esto es, su conviccin.

    Ahora bien, si Trinidade Santos2, y tambin Castoriadis3 tienen razn, cuando afirman que en la religin griega no hay ninguna forma de revelacin ni tampoco algn dios que sancione definitivamente lo justo y lo injusto, lo verdadero y lo falso, entonces es la asamblea, el tribunal, el lugar propio de tal sentencia, y all se resuelve legtimamente sobre ello, y esto slo puede ocurrir de acuerdo al lgos ms persuasivo en la medida que es ste el que produce conviccin.

    En este sentido, la apelacin que hace Scrates al dios de Delfos significa una subversin radical frente a la autoridad de la asamblea, no slo porque as de hecho desconoce esta autoridad, sino tambin porque la deslegitima. Pero paradjicamente, al afirmar Scrates que la sabidura humana vale poco o nada con lo cual Gorgias seguramente estara de acuerdo, le da la razn al tribunal en su cometido de establecer qu es lo justo en ese caso, ya que, por una parte, el tribunal no tiene otra alternativa que juzgar, debe hacerlo y, por lo tanto, no le queda otra ms que establecer, desde su propia y nica autoridad, qu es lo justo, es decir, la culpabilidad o la inocencia de Scrates,

    2 A circunstancia de at a era crist os gregos no terem uma religio revelada coloca suas propostas ticas num contexto cultual muito diferente do nosso. Perante o silncio dos deuses ou a consabida ambigidade de seus pronunciamentos, do prprio homem que se espera a definio dos princpios que comandam a ao. SANTOS, J. T. Para ler Plato. tomo I. So Paul: Edies Loyola, 2008, p. 13.3 CASTORIADIS, C. Lo que hace a Grecia, 1. De Homero a Herclito. Seminarios 1982-1983. La creacin humana. Mxico: Fondo de Cultura Econmica, 2006, p. 127 ss.

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    26 sin poder remitirse, en razn de esa ignorancia sealada por Scrates, a una justicia sustantivada.

    As, pues, al afirmar Scrates que slo el dios es verosmilmente sabio, implcitamente apela a su veredicto y lo coloca por sobre el de sus jueces. Efectivamente, insiste varias veces que l ha sido fiel a la misin que le habra encomendado el dios, llegando por ello incluso a descuidar sus asuntos personales, y concluye, casi al final, que no cree que los dioses le reserven un destino infausto a quienes han vivido conforme a la virtud, es decir, as como desconfa del juicio de los hombres, por el contario confa en el juicio divino. De este modo Scrates parece distinguir dos formas retricas: por una parte, la retrica humana, que apela a lo humano del hombre, es decir, a su pathos, y, por otra parte, la retrica socrtica, la cual sera, de alguna manera divina de modo que, si bien el daimon no lo ha interpelado esta vez, esa misma ausencia significa que el dios no tendra nada que objetar a la actuacin de Scrates.

    La defensa de Scrates, antes del veredicto, tiene slo dos momentos fundamentales. En el dilogo con Meleto, Scrates no expone propiamente su inocencia, sino que se limita a mostrar, en una argumentacin ad hominem, en el mejor de los casos, que Meleto jams se ha interesado por los jvenes, que no debi haberlo trado a un tribunal, sino slo haberlo aconsejado y amonestado en privado y, adems, que se contradice en su acusacin. Es decir, en este dilogo no expone en absoluto su inocencia, sino que desa-credita al acusador. En el segundo momento, Scrates insiste en el carcter divino de su misin, la cual habra llevado a cabo en servicio del dios.

    Sin duda no se puede decir, propiamente, que la defensa de Scrates carezca de elementos retricos, no obstante, en general, ste pretende limi-tarse a una argumentacin sobre todo racional, sin apelar a elementos emo-cionales o patticos. La retrica humana, no obstante, como se dirige a seres irremediablemente ignorantes (segn la afirmacin de Scrates), no puede sino estar asentada en la persuasin, pero nada se podra esperar de all, porque en definitiva, segn Scrates, a tales jueces, como nios ignorantes, no les cabra sino obrar al azar. Sin embargo, la persuasin persuade, esto es, orienta, seala, la direccin del juicio de acuerdo a lo que presenta. A este respecto, la crtica socrtica es conocida; en el Gorgias4, Scrates sostiene que la retrica persuade en virtud de una adulacin, un simulacro, y se dirige al

    4 PLATN. Gorgias, 463b. Introduccin, traduccin y notas de ngel J. Cappelletti. Buenos Aires: Editorial Universitaria, 1967, p. 141.

  • HYPNOS, So Paulo, v. 34, 1 sem., 2015, p. 23-34

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    27placer sin considerar en absoluto el bien. Sin embargo, si la ignorancia es invencible, y as parece que es, ya que Scrates mismo, el ms sabio, confiesa la suya, entonces cabe sostener que el placer, que es algo cierto, puede ser una buena gua, frente a un saber siempre incierto.

    Se puede decir que el mismo Homero, maestro de la antigedad griega, ensea no slo el valor del honor, el mrito de la valenta, la eficacia de la astucia, etc., sino tambin y sobre todo el poder de la pasin, y que no tenerla en cuenta, puede arrastrar los negocios humanos al fracaso y al desastre. Ms an, el honor, la valenta, la astucia, pero tambin la justicia y la prudencia, para ser ejercidas, para hacerlas vivir en los hombres, requieren de una buena dosis de pasin.

    La palabra expone, expresa, siempre un vnculo, sea el que ata a hom-bres y dioses, sea el que ata a los hombres con su pasado, sea el que ata al hombre con la naturaleza, sea el vnculo que ata a los amantes, etc., no se limita a declarar, anunciar o describir; la palabra con sentido tampoco se limita meramente a discurrir de un lgos a otro al interior del mismo lgos. Pero la palabra tampoco se limita a establecer vnculos, ya que sta de alguna manera tambin determina la ndole del vnculo, es decir, la presencia, y todo lo que se presenta, est necesariamente cargada de una cierta fuerza presencial. As, las palabras traen a veces presencias que son casi ausencias, otras palabras son slo un escenario, por decirlo as, de lo que realmente importa, pero hay otras que se imponen hasta el dolor o hasta el placer, hasta la tristeza o la alegra, y las palabras adquieren tal fuerza en la medida que efectivamente logren conmover el nimo.

    A este respecto cabe traer a colacin a Gorgias, maestro de retrica quien, en un juego de su arte, realiza un elogio de Helena que, en realidad, es un elogio de la retrica poniendo en evidencia el poder de las palabras.

    Pues, as como entre los frmacos, unos extraen del cuerpo algunos humo-res y otros, otros, y hacen cesar ya sea a la enfermedad, ya sea la vida, as tambin de los discursos, unos causan dolor, otros, deleite, ot