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Da Hipoteca 465 26 DA HIPOTECA Sumário: 26.1 – Apresentação. 26.2 – Conceito. 26.3 – Características jurídicas da hipoteca. 26.4 – Princípios que regem a hipoteca. 26.4.1 – Imprescindibilidade do registro da hipoteca. 26.5 – Pluralidade de hipotecas. 26.6 – Perempção da hipoteca, 26.7 – Remição do imóvel hipotecado. 26.7.1 – Remição pelo adquirente do imóvel hipotecado. 26.7.2 – Remição pelo credor da segunda hipoteca. 26.7.3 – Remição pelo executado ou membros de sua família. 26.8 – Objeto da hipoteca. 26.9 – Classificação. 26.9.1 – Hipoteca convencional ou comum. 26.9.2 – Hipoteca legal. 26.9.3 – Hipoteca especial. 26.9.3.1 – Da hipoteca de vias férreas. 26.10 – Efeitos da hipoteca. 26.11. Extinção da hipoteca. 26.11.1 – Extinção da hipoteca pela averbação do cancelamento no registro. 26.12.– Hipoteca cedular. 26.1 APRESENTAÇÃO A hipoteca é um dos direitos reais de garantia acolhido pelo Código Civil, ao lado da anticrese. É, talvez, o mais utilizado na prática. Basta ver os contratos de empréstimos realizados diariamente pelos adquirentes de casa própria, onde o devedor oferece o próprio imóvel adquirido como garantia de financiamento. O agente

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Da Hipoteca

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DA HIPOTECA

Sumário: 26.1 – Apresentação. 26.2 – Conceito. 26.3 – Características jurídicas da hipoteca. 26.4 – Princípios que regem a hipoteca. 26.4.1 – Imprescindibilidade do registro da hipoteca. 26.5 – Pluralidade de hipotecas. 26.6 – Perempção da hipoteca, 26.7 – Remição do imóvel hipotecado. 26.7.1 – Remição pelo adquirente do imóvel hipotecado. 26.7.2 – Remição pelo credor da segunda hipoteca. 26.7.3 – Remição pelo executado ou membros de sua família. 26.8 – Objeto da hipoteca. 26.9 – Classificação. 26.9.1 – Hipoteca convencional ou comum. 26.9.2 – Hipoteca legal. 26.9.3 – Hipoteca especial. 26.9.3.1 – Da hipoteca de vias férreas. 26.10 – Efeitos da hipoteca. 26.11. Extinção da hipoteca. 26.11.1 – Extinção da hipoteca pela averbação do cancelamento no registro. 26.12.– Hipoteca cedular.

26.1 APRESENTAÇÃO A hipoteca é um dos direitos reais de garantia acolhido pelo Código Civil, ao lado da anticrese. É, talvez, o mais utilizado na prática. Basta ver os contratos de empréstimos realizados diariamente pelos adquirentes de casa própria, onde o devedor oferece o próprio imóvel adquirido como garantia de financiamento. O agente

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financeiro do SFH292 empresta a importância necessária para o adquirente pagar ao vendedor do imóvel e, concomitantemente, na mesma escritura por instrumento particular, que tem força de escritura pública, é feito um contrato de mútuo com garantia hipotecária. Vê-se, logo, que é um instrumento criado em favor do credor hipotecário, que não pode existir isoladamente, sem a obrigação a que adere; é um instrumento de expansão do crédito e possibilita a criação de riquezas. Enormes são, pois, suas vantagens, devido ao seu poder de estimular o desenvolvimento econômico do país, na medida em que permite a realização de numerosos negócios em que, aquele que dá o bem em garantia (devedor), conserva-o em seu poder, podendo, inclusive, perceber-lhe os frutos. 26.2 CONCEITO O que distingue a hipoteca dos demais direitos reais de garantia, é que a posse do bem, oferecido como garantia, continua com o devedor, que pode, inclusive, perceber-lhe os frutos. Com essa característica principal e considerando que a hipoteca normalmente recai sobre bem imóvel, embora a lei permita a sua incidência também sobre aeronaves e navios (bens móveis), podemos defini-la como o direito real de garantia, que sujeita um imóvel, um navio ou uma aeronave em poder do devedor, pertencente a este ou a terceiro, ao cumprimento de uma obrigação existente entre credor e devedor.

Pressupõe, portanto, dois elementos essenciais: 1) a dívida, que uma pessoa contrai com outra; 2) a garantia, que o devedor ou um terceiro oferece para assegurar o pagamento, representada, geralmente, por um imóvel.

Sendo um direito real, confere ao credor o direito de seqüela (seguir o bem onde ele se encontrar) e o direito de preferência (de excutir judicialmente o bem dado em garantia para, com o produto então apurado, receber preferencialmente). Analise o seguinte aresto: “O credor hipotecário tem preferência para receber seu crédito no

292 SFH = Sistema Financeiro de Habitação.

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processo de execução em primeiro lugar e sem concorrência de terceiros, independentemente de ter promovido a execução de seu crédito e efetivado a penhora” (in RT 651/154).

Face ao exposto, podemos concluir que o objetivo da hipoteca, assim como dos demais direitos reais de garantia, é assegurar o pagamento da obrigação principal. 26.3 CARACTERÍSTICAS JURÍDICAS DA HIPOTECA Da análise do conceito oferecido, podemos extrair os seguintes caracteres jurídicos da hipoteca:

1) É direito real de garantia sobre coisa alheia, porque esse direito se prende à coisa que fica sujeita à solução da dívida. Por isso, a hipoteca, assim como os demais direitos reais de garantia, se encontram munidos da prerrogativa de seqüela e do direito preferencial, como já vimos. Pode, também, a hipoteca propiciar a venda judicial da coisa dada em garantia, para o credor poder receber a quantia que lhe é devida, preferencialmente a qualquer outro credor do devedor, exceto pelas custas judiciais, tributos e salário do trabalhador.

É preciso não esquecer que o próprio Código Civil inclui a hipoteca entre os direitos reais (art. 1.225, n. IX).

2) Permite que o devedor hipotecante continue na posse do bem gravado. Essa característica não lhe é exclusiva, pois há alguns casos especiais de penhor (rural ou industrial) em que a posse do bem oferecido como garantia também continua com o devedor.

3) A hipoteca é indivisível. Enquanto não for liquidada a obrigação, o bem gravado subsiste por inteiro, mesmo com o pagamento parcial do débito. Não importa que a obrigação principal seja divisível: a indivisibilidade decorre de lei, porque a finalidade do instituto é assegurar a eficácia do pagamento do débito. A indivisibilidade não é, por conseguinte, da coisa, mas do vínculo existente entre o credor e a obrigação principal.

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4) A hipoteca é direito acessório, porque pressupõe a existência de um direito de crédito, servindo de garantia o próprio bem, objeto da hipoteca. Não pode, pois, existir isoladamente, sem a obrigação principal a que adere. Essa a razão pela qual é um direito de garantia. Nessas condições, o pacto adjeto293 da hipoteca segue o destino da dívida principal, extinguindo-se quando esta se extinguir. 26.4 PRINCÍPIOS QUE REGEM A HIPOTECA A hipoteca sujeita-se, obrigatoriamente, aos princípios da especialização e da publicidade.

1) Princípio da especialização294 – Por este princípio, é imprescindível que, para a existência do ônus real, seja fixado o total da dívida e a especificação da coisa dada em garantia. É necessário saber, pois, a descrição minuciosa do bem e o quantum o devedor hipotecário está devendo. A escritura deve identificar os bens dados em garantia, o que torna impossível a existência de hipoteca sobre bens futuros. Se o montante da dívida for desconhecido, determina-se por ocasião da constituição da hipoteca, uma estimativa, de tal modo que, na época do vencimento, tenha um valor certo e líquido.

Em suma: o princípio da especialização significa que todo registro deve recair sobre um objeto individuado a ser garantido e de uma dívida.

A falta de especialização, torna ineficaz a hipoteca.

2) Princípio da publicidade – O registro de imóveis tem o dever de emprestar publicidade aos ônus que recaem sobre os bens, de forma a proteger terceiros interessados em adquiri-los ou que pretendam por qualquer modo se utilizarem deles. Por este princípio faz a publicidade. Basta registrar o título constitutivo no Cartório de Registro de Imóveis correspondente para valer contra terceiros.

293 Adjeto = acrescido, juntado, adjunto. 294 Especialização = descrição minuciosa do bem a ser garantido, e da dívida.

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O Registro de Imóveis, como é sabido, é o veículo da publicidade imobiliária, onde todos os atos relativos à propriedade devem ingressar para o necessário conhecimento erga omnes. Por isso, a hipoteca somente se constitui após seu registro. A própria lei, expressamente determina, no art. 1.492 do CC, o seguinte:

“As hipotecas serão registradas no cartório do lugar

do imóvel, ou no de cada um deles, se o título se referir a mais de um”.

É oportuno lembrar o conteúdo do art. 168 da Lei n. 6.015 de 1973 que trata da sistemática do Registro de Imóveis: “Na designação genérica de registro, consideram-se englobadas a inscrição e a transcrição a que se referem as leis civis”. Portanto, a hipoteca é registrada no Cartório de Registro de Imóveis onde se situar o bem dado em garantia, salvo o caso da hipoteca sobre as vias férreas, que será registrada no Município da estação inicial da respectiva linha (CC, art. 1.502). A hipoteca sobre navios é registrada no Tribunal Marítimo (Lei n. 2.180, arts. 92 a 100); sobre aeronaves, no Registro Aeronáutico Brasileiro, que é o único para todo o país (Código Brasileiro do Ar, Decreto-lei n. 32, de 1966, arts. 18 e 19). “A hipoteca dos navios e das aeronaves – diz o parágrafo único do art. 1.473 do CC - reger-se-á pelo disposto em lei especial”.

O registro é também um meio de estabelecer a prioridade entre vários credores hipotecários. Aquele que primeiro registrou a hipoteca tem a preferência de receber antes daquele que registrou depois. É o que se extrai da dicção textual do art. 1.493 do CC, in verbis: “Os registros e averbações seguirão a ordem em que forem requeridas, verificando-se ela pela da sua numeração sucessiva no protocolo. Parágrafo único. O número de ordem determina a prioridade, e esta a preferência entre as hipotecas”.

Com efeito, é através do protocolo que se verifica aquele que se apresentou em primeiro lugar, pois no momento em que a escritura é protocolada, surge um número e é em função deste número que se

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determina a prioridade ou preferência.

O art. 174 da Lei n. 6.015, de 1973, a essa altura, é oportuno: “O Livro n. 1 – Protocolo – servirá para apontamento de todos os títulos apresentados diariamente, ressalvado o disposto no parágrafo único do art. 12 desta lei”. Esse parágrafo admite que os títulos sejam apresentados no registro imobiliário apenas para serem examinados.

Pode acontecer a apresentação ao oficial, do registro de uma segunda hipoteca, com referência expressa à existência de uma anterior. Se isto acontecer, o oficial deve, depois de prenotá-lo, aguardar 30 dias pela apresentação da primeira e, na hipótese de se esgotar esse prazo, sem que apareça o primeiro título para registro, o segundo será registrado, obtendo preferência sobre aquele (CC, art. 1.495).

“Não se registrarão no mesmo dia duas hipotecas, ou uma hipoteca e outro direito real, sobre o mesmo imóvel, em favor de pessoas diversas, salvo se as escrituras, do mesmo dia, indicarem a hora em que foram lavradas” (CC, art. 1.494).

Em suma: para que seja garantida a publicidade imobiliária, todos os atos sujeitos ao registro terão que ser efetuados no Cartório da jurisdição em que estiver a propriedade hipotecada. Com isso, estará garantida a publicidade imobiliária, aliás, a principal finalidade do registro.

26.4.1 Imprescindibilidade do registro da hipoteca As hipotecas somente valem contra terceiros desde a data do registro.

Enquanto não inscritas, as hipotecas só subsistem entre os contratantes, ou seja, a falta de registro da hipoteca não a invalida;

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apenas afasta seus efeitos contra terceiros, vigorando o contrato somente entre as partes signatárias com força executiva. 26.5 PLURALIDADE DE HIPOTECAS A Lei autoriza o dono de imóvel já hipotecado, mediante novo título, a constituir mais hipotecas, quer em favor do primitivo credor hipotecário, quer em favor de um terceiro credor (CC, art. 1.476). A hipoteca de imóvel hipotecado denomina-se sub-hipoteca.

Acontece que o credor sub-hipotecário exerce seu direito, após o credor hipotecário satisfazer seu crédito e aquele só terá direito às sobras, se houver. É o que se extrai da dicção textual do art. 1.477 do CC, in verbis: “Salvo o caso de insolvência do devedor, o credor da segunda hipoteca, embora vencida, não poderá executar o imóvel antes de vencida a primeira”. O credor da segunda hipoteca, por conseguinte, tem como garantia a parte do valor do imóvel que restar, depois de paga a primeira. Entretanto, se “o devedor da obrigação garantida pela primeira hipoteca não se oferecer, no vencimento, para pagá-la, o credor da segunda pode promover-lhe a extinção, consignando a importância e citando o primeiro credor para recebê-la e o devedor para pagá-la”. Se o devedor não pagar, o segundo credor, efetuando o pagamento, se sub-rogará nos direitos da hipoteca anterior (CC, art. 1.478). “Se o primeiro credor estiver promovendo a execução da hipoteca, o credor da segunda depositará a importância do débito e as despesas judiciais” (par. ún. do art. 1.478).

Consoante observa Sílvio Rodrigues, pode “convir ao credor da segunda hipoteca fazer tal remição, pois assim evita que uma execução ruinosa ou inoportuna, promovida pelo credor preferencial conduza a se obter, em praça, apenas o bastante para o resgate da primeira dívida, sem que remanesçam sobras para o pagamento das demais”295

26.6 PEREMPÇÃO296 DA HIPOTECA

295 Ob. e vol. cits., p. 397. 296 Perempção = modo por que se extingue uma relação processual civil.

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Deve o contrato de hipoteca mencionar o seu prazo de vencimento. Esse prazo pode ser prorrogado pelo requerimento de ambas as partes, mediante simples averbação no Registro de Imóveis. “Mediante simples averbação, requerida por ambas as partes, poderá prorrogar-se a hipoteca, até perfazer vinte anos, da data do contrato” (primeira parte do art. 1.485, CC). Portanto, a prorrogação não pode ultrapassar vinte anos da data do contrato. Decorrido o prazo, o contrato não mais prevalece, ocorrendo a perempção da hipoteca. Para subsistir o direito de garantia, haverá necessidade de se constituir novo título e novo registro (segunda parte do art. 1.485). Nesse caso, será mantida a precedência que então lhe competir.

Observa-se que perempção pelo transcurso do tempo só vale em relação a hipotecas convencionais; as legais, perduram indefinidamente. 26.7 REMIÇÃO DO IMÓVEL HIPOTECADO

Diz o art. 1.475 do CC: “É nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado”. Significa que o proprietário do imóvel hipotecado pode vendê-lo. Se isto acontecer, dentro de trinta dias, contados do registro do título aquisitivo, tem o adquirente do imóvel o direito de remi-lo, citando os credores hipotecários e propondo importância não inferior ao preço por que o adquiriu (art. 1.481).

Remição297 da hipoteca – escreve De Plácido e Silva – é “o benefício legal assegurado a certas pessoas para que possam livrar o imóvel de ônus hipotecário, resgatando, assim, a obrigação que, pela hipoteca, se garantia”. E continua: “exprime o resgate do ônus hipotecário ou o pagamento da dívida hipotecária por pessoa que não se encontrava, pessoalmente e originariamente, obrigada ao respectivo pagamento ou desoneração do imóvel”298. Enfim, remição

297 O atual Código Civil emprega remissão com dois ss e com ç no mesmo capítulo: arts. 1.481, § 2º e 1.483. 298 Ob. cit., vol. IV, p. 88.

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é o direito que têm certas pessoas de liberar o imóvel hipotecado, pagando a totalidade da dívida.

Visa, pois, liberar o imóvel hipotecado, independentemente da anuência do credor ou contra sua vontade299.

Esse direito cabe ao adquirente do imóvel hipotecado, ao credor de segunda hipoteca, bem como ao devedor quando executado e ao seu cônjuge, descendentes e ascendentes. “Realizada a praça, - diz o art. 1.482 do CC - o executado poderá, até a assinatura do auto de arrematação ou até que seja publicada a sentença de adjudicação, remir o imóvel hipotecado, oferecendo preço igual ao da avaliação, se não tiver havido licitante, ou ao do maior lance oferecido. Igual direito caberá ao cônjuge, aos descendentes ou ascendentes do executado”. 26.7.1 Remição300 pelo adquirente do imóvel hipotecado Registrada a hipoteca, nasce o direito real de garantia, oponível erga omnes301. Vale dizer, o credor tem o direito de perseguir o imóvel nas mãos de quem quer que o detenha. Se o imóvel for vendido a terceiro e à revelia do credor hipotecário, pode este executar o imóvel, fazendo a devida penhora do imóvel gravado. Contudo, a lei garante ao adquirente o direito de remir o imóvel gravado. Analisemos novamente o princípio do art. 1.481 do CC, in verbis: “Dentro em trinta dias, contados do registro do título aquisitivo, tem o adquirente do imóvel hipotecado o direito de remi-lo, citando os credores hipotecários e propondo importância não inferior ao preço por que o adquiriu”.

“Se o credor impugnar o preço da aquisição ou a importância oferecida, realizar-se-á licitação, efetuando-se a venda 299 Caio Mário da S. Pereira, p. 330. 300 Remição = resgate, salvação dos pecados por meio de expiação. Remissão = compensação, perdão total, alívio, perdão. 301 Erga omnes = para com todos.

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judicial a quem oferecer maior preço, assegurada preferência ao adquirente do imóvel” (§ 1º do art. 1.481).

“Não impugnado pelo credor o preço da aquisição ou o preço proposto pelo adquirente, haver-se-á por definitivamente fixado para a remissão do imóvel, que ficará livre de hipoteca, uma vez pago ou depositado o preço” (§ 2º do art. 1.481).

“Se o adquirente deixar de remir o imóvel, sujeitando-o a execução, ficará obrigado a ressarcir os credores hipotecários da desvalorização que, por sua culpa, o mesmo vier a sofrer, além das despesas judiciais da execução” (§ 3º do art. 1.481).

“Disporá de ação regressiva contra o vendedor o adquirente que ficar privado do imóvel em conseqüência de licitação ou penhora, o que pagar a hipoteca, o que, por causa de adjudicação ou licitação, desembolsar com o pagamento da hipoteca importância excedente à da compra e o que suportar custas e despesas judiciais” (§ 4º do art. 1.481). 26.7.2 Remição pelo credor da segunda hipoteca Existindo duas hipotecas a favor de credores diferentes, terá preferência no recebimento integral do crédito, o credor que primeiro registrou sua hipoteca no Registro de Imóveis. O sub-hipotecário só terá direito às sobras, se houver.

Para que o credor sub-hipotecário não venha a ser prejudicado, a lei lhe dá a prerrogativa de remir a hipoteca anterior. O art. 1.478 do CC dispõe, com muita clareza, a respeito do assunto em tela, dizendo textualmente o seguinte, in verbis:

“Se o devedor da obrigação garantida pela primeira hipoteca não se oferecer, no vencimento, para pagá-la, o credor da segunda pode promover-lhe a extinção, consignando a importância e citando o primeiro credor para recebê-la e o devedor para pagá-la; se este não pagar,

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o segundo credor, efetuando o pagamento, se sub-rogará nos direitos da hipoteca anterior, sem prejuízo dos que lhe competirem contra o devedor comum”.

A remição do sub-hipotecário é, pois, o meio pelo qual este faz o pagamento ao credor da hipoteca anterior, em qualquer ocasião, com sub-rogação nos direitos deste. Com isso não há a extinção da primeira hipoteca. O sub-hipotecário apenas ocupa o lugar deixado pelo credor da primeira hipoteca, assumindo os direitos inerentes à hipoteca de registro antecedente, sem perder seus direitos ligados ao registro subseqüente de que era originalmente titular. 26.7.3 Remição pelo executado ou membros de sua família Ao próprio executado, seu cônjuge, seus descendentes ou seus ascendentes, é conferido o direito de liberar o imóvel hipotecado, oferecendo preço igual ao da avaliação, se não tiver havido licitantes, ou igual ao do maior lance oferecido. ´´E o que dita art. 1.482 do CC: “Realizada a praça, o executado poderá, até a assinatura do auto de arrematação ou até que seja publicada a sentença de adjudicação, remir o imóvel hipotecado, oferecendo preço igual ao da avaliação, se não tiver havido licitantes, ou ao do maior lance oferecido. Igual direito caberá ao cônjuge, aos descendentes ou ascendentes do executado”. 26.8 OBJETO DA HIPOTECA

“As construções e as máquinas instaladas em imóvel objeto de hipoteca, a esta se incorporam. Assim, torna-se inviável a constrição judicial que desconsidera o bem como um todo, porquanto ela abrange tanto o principal como os acessórios” (in RT 776/310).

Em regra, podem ser objeto de hipoteca bens imóveis

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alienáveis, abrangendo todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. É o que se extrai da dicção textual do art. 1.474 do CC, in verbis: “A hipoteca abrange todas as acessões, melhoramentos ou construções do imóvel. Subsistem os ônus reais constituídos e registrados, anteriormente à hipoteca, sobre o mesmo imóvel”. Os bens móveis estão excluídos, com exceção dos navios e das aeronaves, que o legislador permite que sejam objeto de hipoteca. No art. 1.473 do CC, o legislador oferece um elenco das coisas que podem ser objeto de hipoteca. “Podem ser objeto de hipoteca:

I – os imóveis e os acessórios dos imóveis conjuntamente com eles;

II – o domínio direto;

III – o domínio útil;

IV – as estradas de ferro;

V – os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se acham;

VI – os navios;

VII – as aeronaves”. Pelo artigo retro e pela ementa do acórdão destacado acima transcrito, verificamos que os acessórios dos imóveis só podem ser hipotecados juntamente com o seu principal. Por exemplo, as árvores e os frutos pendentes podem ser objeto de hipoteca, desde que o sejam juntamente com o imóvel correspondente; não isoladamente.

Em regra, a hipoteca tem por objeto bens imóveis alienáveis. Os que estão fora do comércio, inclusive os bens de família, são insuscetíveis de hipoteca. O Prof. Caio Mário da Silva Pereira ensina que os apartamentos, as salas, os conjuntos comerciais e as lojas podem ser dadas em hipoteca, independentemente da anuência dos demais comunheiros. Em fase de construção, “é lícito dar em hipoteca a fração ideal do terreno, caso em que o ônus hipotecário compreenderá com ela a edificação na medida ou na proporção em

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que se desenvolva”302.

Se o bem se encontra em estado de indivisão (condomínio tradicional), pode ser hipotecado, obedecendo aos seguintes princípios: se o bem for indivisível, só com a anuência dos demais condôminos, e o imóvel todo; se for divisível, a parte de cada um303.

Tornando a observar o artigo retro, vemos que os recursos naturais a que se refere o art. 1.230, independentemente do solo onde se acham minas e pedreiras, são bens suscetíveis de hipoteca. Contudo, as jazidas minerais pertencem à União, como propriedade distinta do solo. Considerando que só o proprietário da coisa pode dar em hipoteca, o proprietário do solo não poderá oferecer as jazidas em hipoteca. Somente após a concessão do Governo, “podem ser dadas em garantia, hipotecando-se as instalações fixas”304.

Quanto às pedreiras, só poderão ser objeto de hipoteca as que, por natureza, não dependem de concessão do Governo.

As estradas de ferro previstas pelo artigo acima, como objeto de hipoteca, têm que sê-lo na sua universalidade, ou seja, como um todo. Mas a nota de maior destaque na análise do artigo supra é a admissão de hipoteca de certos bens móveis, como é o caso dos navios e aeronaves.

26.9 CLASSIFICAÇÃO

Pode-se classificar a hipoteca em convencional, legal e especial. 26.9.1 Hipoteca convencional ou comum A hipoteca convencional realiza-se por contrato bilateral. Para a sua constituição, exige-se: a) que o devedor hipotecário seja 302 Ob. e vol. cits., p. 309. 303 Caio Mário da Silva Pereira, ob. e vol. cits., p. 309. 304 Caio Mário da Silva Pereira, ob. e vol. cits., p. 311.

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proprietário da coisa que irá assegurar o cumprimento da obrigação principal entre ele e o credor; b) que o devedor tenha capacidade de alienar; c) que o contrato tenha a forma de escritura pública ou particular; d) que o título constitutivo seja registrado no Cartório de Registro de Imóveis que lhe é peculiar.

Pressupondo a existência de uma obrigação principal, cujo cumprimento é garantido pela coisa oferecida ao credor pelo devedor ou por terceiro, pode-se afirmar que a hipoteca é um começo de alienação. Assim, se o devedor não cumprir sua obrigação, o credor passa a ter o direito subjetivo de executá-lo judicialmente, para, com o produto apurado no leilão, pagar-se preferencialmente. Nessas condições conclui-se, facilmente, que só aquele que pode alienar, pode hipotecar. Vale dizer, somente quem é dono pode hipotecar. O compromissário-comprador, por exemplo, não pode dar o imóvel prometido em hipoteca.

Cabe aqui lembrar, que, tratando-se de ônus real que recai sobre imóvel, impõe a lei a necessidade da outorga do outro cônjuge para constituir hipoteca.

Apesar da lei exigir do devedor hipotecante o poder de dispor da coisa, os incapazes podem hipotecar, através de seu representante legal, desde que mediante prévia autorização do juiz305.

Finalmente, para o contrato de hipoteca valer contra terceiro, fazendo surgir o direito real, é imprescindível o registro do título no Cartório de Registro de Imóveis competente. Sem o registro é impossível que terceiros tomem conhecimento da existência do ônus. Aliás, em verdade, o registro do contrato só é necessário para valer contra terceiros. “Inter partes”, o contrato tem plena eficácia, independentemente de registro. 26.9.2 Hipoteca legal A hipoteca legal se origina da lei. É imposta por lei em favor de certas pessoas que, por se encontrarem em determinadas situações, 305 Orlando Gomes, ob. e tomo cits, p. 500.

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devem ser protegidas. O art. 1.489 do CC relaciona essas pessoas, in verbis:

“A lei confere hipoteca:

I – às pessoas de direito público interno (art. 41) sobre os imóveis pertencentes aos encarregados da cobrança, guarda ou administração dos respectivos fundos e rendas;

II – aos filhos, sobre os imóveis do pai ou da mãe que passar a outras núpcias, antes de fazer o inventário do casal anterior;

III – ao ofendido, ou aos seus herdeiros, sobre os imóveis do delinqüente, para satisfação do dano causado pelo delito e pagamento das despesas judiciais;

IV – ao co-herdeiro, para garantia do seu quinhão ou torna da partilha, sobre o imóvel adjudicado ao herdeiro reponente;

V – ao credor sobre imóvel arrematado, para garantia do pagamento do restante do preço da arrematação”.

São credores especiais as pessoas relacionadas acima, e a lei

oferece a elas, como garantia, respectivamente, o imóvel de propriedade do administrador público, do pai ou da mãe, do autor do ato ilícito, do herdeiro e do credor.

Assim como acontece com a convencional, a legal exige especialização306 e publicidade, devendo ser registrada no Registro de Imóveis.

Devemos ter em mente que há necessidade de um procedimento judicial por não existir um título convencional a ser registrado. O CPC disciplina a matéria nos arts. 1.205 a 1210.

“A hipoteca legal pode ser substituída por caução de títulos da dívida pública federal ou estadual, recebidos pelo valor de sua

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cotação mínima no ano corrente; ou por outra garantia, a critério do juiz, a requerimento do devedor” (CC, art. 1.491). 26.9.3 Hipoteca especial São hipotecas especiais: a naval, a aérea e a de vias férreas. Destaca-se a hipoteca de vias férreas que tem também disciplina especial, embora prevista nos artigos 1.502 a 1.505 do CC, devido à sua importância econômica e social de prestação de serviços à comunidade como meio de comunicação.

26.9.3.1 Da hipoteca de vias férreas

A via férrea compreende, além do solo onde se assentam os trilhos, as estações e demais edifícios, todo o material rodante (o trem), formando uma universalidade, dotada de natureza imóvel. Sendo imóvel, pode ser objeto de hipoteca, mas devido à sua importância econômica e social, o legislador traçou normas especiais a essa espécie de hipoteca. Nessas condições, a característica predominante é a de o credor hipotecário não interromper a atividade da estrada, devendo respeitar a administração e suas decisões no que tange à exploração da linha (CC, art. 1.503). “Os credores hipotecários poderão opor-se à venda da estrada, à de suas linhas, de seus ramais, ou de parte considerável do material de exploração; bem como à fusão com outra empresa, sempre que com isso a garantia do débito enfraquecer” (CC, 2ª parte do art. 1.504).

Para valer contra terceiros, deve o título constitutivo ser registrado no Município da estação inicial da respectiva linha (CC, art. 1.502).

Se houver execução das hipotecas, será intimado o representante da União ou do Estado, para, dentro de quinze dias, remir a estrada de ferro hipotecada, pagando o preço da arrematação ou da adjudicação (CC, art. 1.505).

306 Especialização = descrição minuciosa do bem a ser garantido e da dívida.

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26.10 EFEITOS DA HIPOTECA

“Nos termos do art. 848 do (antigo) CC, a falta de anotação no registro de imóveis da hipoteca não retira sua validade, mas afasta seus efeitos contra terceiros, dentre eles o direito de preferência ao crédito em casos de concurso de credores” (in RT 768/382).

Mas o efeito principal da hipoteca é o de vincular o bem

hipotecado ao cumprimento de uma obrigação e, caso a dívida não seja paga, tem o credor hipotecário o direito de propor ação executiva contra devedor solvente. Consoante prevê o art. 585, III, do CPC, o contrato de hipoteca é um título executivo extrajudicial e, caso a dívida se torne exigível e não seja paga, o credor hipotecário pode promover a execução forçada, cuja penhora recairá sobre o próprio bem imóvel que serviu de garantia, seguindo-se a execução regular. Enquanto a dívida não vencer, o credor é detentor de um direito real de garantia e, como tal, seu direito é provido de seqüela e preferência, como já foi visto.

Outro importante efeito ocasionado pela hipoteca é a preferência que tem o credor no recebimento do produto sobre o que foi apurado na ação de execução sobre qualquer outro credor, exceto para as custas judiciais, os impostos e taxas devidos à Fazenda Pública e as dívidas advindas do salário do trabalhador agrícola. “Excetuam-se da regra estabelecida neste artigo as dívidas que, em virtude de outras leis, devam ser pagas precipuamente a quaisquer outros créditos” (parágrafo único do art. 1.422 do CC).

De outra feita, antes do vencimento do débito, o devedor conserva todos os direitos sobre a coisa, inclusive o direito de perceber-lhe os frutos, desde que não pratique atos capazes de desvalorizar, deteriorar ou destruir o bem gravado. Só após a arrematação do bem, é que o devedor perderá a posse e, conseqüentemente, o direito de perceber os frutos.

Por conseguinte, o direito real de hipoteca produz efeitos

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tanto em relação ao credor como em relação ao devedor e, também, em relação a terceiros. Inscrita a hipoteca, o direito real torna-se oponível erga omnes, vale dizer, o credor tem o direito de perseguir o imóvel nas mãos de quem quer que o detenha. 26.11 EXTINÇÃO DA HIPOTECA Conforme enumeração do art. 1.499 do CC,

“A hipoteca extingue-se:

I – pela extinção da obrigação principal; II – pelo perecimento da coisa;

III – pela resolução da propriedade; IV – pela renúncia do credor; V – pela remição;

VI – pela arrematação, ou adjudicação”.

1) PELA EXTINÇÃO DA OBRIGAÇÃO PRINCIPAL:

Não há dúvida de que o meio mais comum de extinguir a hipoteca é o cumprimento da obrigação principal. Sendo a hipoteca um direito acessório, ao desaparecer a obrigação principal a que estava ligada, ela também desaparece. Portanto, pode o devedor dar causa à extinção da garantia pagando a dívida por ela assegurada, o que pode fazer até mesmo contra a vontade do credor.

Também a perda da propriedade, objeto da hipoteca, pelo advento de condição ou termo resolutivo, caracteriza outro caso de extinção da hipoteca.

2) PELO PERECIMENTO DA COISA:

Perecimento é a destruição total da coisa. Essa situação acontece em virtude do direito real ficar sem seu objeto. O credor, então, será indenizado, se a coisa hipotecada não for substituída por outro bem. Se a coisa destruída se encontrava segurada, haverá sub-rogação incidindo a garantia sobre o valor da indenização. A quantia recebida passa a ser o objeto da hipoteca, e o credor exerce o seu

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direito preferencial307 sobre o valor sub-rogado.

Se a destruição não for total, pode acarretar o vencimento antecipado da dívida, se o devedor, regularmente intimado, não reforçar a garantia prestada. É o que dita textualmente o art. 1.425, I, do CC, assim redigido: “A dívida considera-se vencida: I – se, deteriorando-se, ou depreciando-se o bem dado em segurança, desfalca a garantia, e o devedor, intimado, não a reforçar ou substituir”. Portanto, no caso de uma casa que pega fogo e fica destruída totalmente, remanesce o terreno, havendo apenas uma desvalorização do bem gravado, aplicando-se este artigo.

Não há dúvida de que a extinção da hipoteca pela destruição da coisa se dá mais em relação a bens móveis (avião ou navio).

3) PELA RESOLUÇÃO DA PROPRIEDADE: Diante do implemento de uma condição resolutiva ou do

surgimento de um termo resolutivo, a propriedade resolúvel muda de titular. Este é a pessoa que se aproveita da incidência da condição ou do termo. Portanto, uma vez resolvida a propriedade, quem deu o bem em garantia deixa de ser dono, e, conseqüentemente a hipoteca deixa de existir.

4) PELA RENÚNCIA DO CREDOR: A renúncia é um ato unilateral, por parte do credor, visando

ao despojamento de determinado direito. Pode o credor renunciar expressamente à garantia, requerendo ao oficial do registro de imóveis. Considerando que a extinção da hipoteca se dá através do ato formal do cancelamento, a renúncia só pode ser expressa; nunca tácita.

5) PELA REMIÇÃO: 307 Art.1.425, § 1º, do CC = “Nos casos de perecimento da coisa dada em garantia, esta se sub-rogará na indenização do seguro, ou no ressarcimento do dano, em benefício do credor, a quem assistirá sobre ela preferência até seu completo reembolso”.

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Não devemos esquecer de que a hipoteca é um ônus real, uma

relação jurídica acessória que segue o destino do principal. “Antes de arrematados ou adjudicados os bens, pode o devedor, a todo tempo, - diz o art. 651 do CPC – remir a execução, pagando ou consignando a importância da dívida, mais juros, custas e honorários advocatícios”. ´´É a chamada remição da execução. Há, ainda, a remição de bens, ato que só pode ser exercido pelo cônjuge, descendente ou ascendente do devedor, no prazo de 24 horas entre a arrematação dos bens e a assinatura do auto. “O direito de remição de que trata o art. 787 do CPC – decidiu o tribunal - deverá ser exercitado mediante depósito em dinheiro do valor alcançado pelos bens na avaliação ou na praça no prazo de 24 horas, não se admitindo a prestação de caução” (in RT 647/206). Portanto, desaparecendo a obrigação principal, desaparece o ônus real, e a hipoteca se extingue ao se extinguir a obrigação por ela garantida.

6) PELA ARREMATAÇÃO OU ADJUDICAÇÃO:

Quando o devedor não cumpre a sua obrigação, o credor pede ao juiz a penhora do bem gravado e, posteriormente, a conversão do bem em dinheiro. Se o bem for adquirido por terceiro ou pelo próprio credor exeqüente quando disputar a licitação, configura-se um caso de “arrematação”; se for adquirido pelo próprio credor sem a participação do lançador, configura-se um caso de adjudicação. Quer através da arrematação, quer através da “adjudicação”, o Estado transfere a terceiro a propriedade do bem penhorado. Portanto, tanto a arrematação, como a adjudicação, nada mais são do que uma venda judicial do bem penhorado, fazendo extinguir a hipoteca.

26.11.1 Extinção da hipoteca pela averbação do cancelamento no registro

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Por exemplo, o credor pode renunciar308 à hipoteca através de um documento público ou particular requerido ao oficial do registro de imóveis. Se isto acontecer, haverá a averbação do cancelamento da hipoteca do registro no cartório imobiliário. Portanto, a hipoteca também pode ser extinta pela averbação do cancelamento do registro no cartório imobiliário. “Extingue-se ainda a hipoteca – determina o art. 1.500 do CC - com a averbação, no Registro de Imóveis, do cancelamento do registro, à vista da respectiva prova”. Se existirem, por exemplo, uma ação anulatória da hipoteca e a sentença judicial cancelando a hipoteca, far-se-á a averbação do cancelamento do registro no cartório imobiliário.

De real valia a observação de que, antes de ser levado um imóvel hipotecado à praça, sejam intimados com pelo menos dez dias de antecedência, os credores hipotecários, que não sejam de qualquer modo parte na execução (CPC, art. 698). “Não extinguirá a hipoteca, devidamente registrada, - diz o art. 1.501 do CC - a arrematação ou adjudicação, sem que tenham sido notificados judicialmente os respectivos credores hipotecários, que não forem de qualquer modo parte na execução”. A falta da intimação dos credores hipotecários que não tenham figurado no processo judicial, torna ineficaz a arrematação ou adjudicação do imóvel, não se extinguindo a hipoteca.

26.12 HIPOTECA CEDULAR Para o crédito hipotecário agrícola, o legislador criou a cédula rural hipotecária (Decreto-lei 167/67), destinada aos financiamentos para fins agrícolas. É um título representativo de crédito, isto porque a referida cédula tem a natureza de título de crédito. Após o registro da cédula junto ao cartório imobiliário, a hipoteca convencional ganhará eficácia erga omnes, e a célula estará apta a circular livremente por endosso.

Em 1966, surgiu a cédula hipotecária habitacional (Decreto-lei 308 Renúncia = ato unilateral de despojamento de um direito.

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n. 70/66). É um título emitido pelo credor e, uma vez feita a averbação da cédula à margem do registro correspondente, o título ganha circulação através do endosso. Trata-se de uma cédula nominativa endossável em preto, sujeita, portanto, à averbação na matrícula correspondente do Registro de Imóveis. Consoante avisa Afrânio de Carvalho, “a averbação da cédula anuncia aos interessados que a hipoteca passou a ter circulação fora do Registro de Imóveis, de modo que as suas transmissões devem ser buscadas nos endossos, os quais, todavia, podem ser reconduzidos, por meio de averbações, ao registro, onde o cancelamento da inscrição somente se operará à vista do título quitado (Decreto-lei nº 70, de 1966, arts. 9-27)”309.

A cédula hipotecária habitacional, admitida nas operações pertinentes ao sistema financeiro de habitação, é um documento que representa a hipoteca, ou seja, é a hipoteca em imagem, razão pela qual, o seu cancelamento somente se operará à vista do título quitado, isto porque a relação jurídica passou a girar em torno da posse do título. “Se a cédula estiver extraviada - explica Afrânio de Carvalho – será suprimida por quitação em separado do emitente ou endossante, isto é, do credor que aparece no registro em virtude da averbação inicial daquela”310.

O atual Código Civil, art. 1.486, prevê a existência da cédula hipotecária, na forma e para os fins previstos em lei especial, como vimos. Eis o seu conteúdo: “Podem o credor e o devedor, no ato constitutivo da hipoteca, autorizar a emissão da correspondente cédula hipotecária, na forma e para os fins previstos em lei especial”.

Não devemos esquecer que a cédula hipotecária tem natureza jurídica de título de crédito, circulando livremente e, por isso, dando maior mobilidade ao crédito.

309 Ob. Cit., p. 150. 310 Ob. Cit., p. 187.

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JURISPRUDÊNCIA

1. “As construções e as máquinas instaladas em imóvel objeto de hipoteca, a esta se incorporam. Assim, torna-se inviável a constrição judicial que desconsidera o bem como um todo, porquanto ela abrange tanto o principal como os acessórios” – RT 776/310.

2. “Nas incorporações imobiliárias, a hipoteca do terreno, em que foi construído o empreendimento imobiliário, não induz automática oneração hipotecária da unidade autônoma pela contratação de outra hipoteca após o término da construção, mormente se o compromisso de compra e venda, ainda que não registrado, estiver quitado e o compromissário já exerça a posse direita e de boa-fé sobre o imóvel” – RT 773/235.

3. “Nos termos do art. 848 do CC, a falta de anotação em registro de imóveis da hipoteca não retira sua validade, mas afasta seus efeitos contra terceiros, dentre eles o direito de preferência ao crédito em casos de concurso de credores” – RT 768/382.

4. “A obrigação assumida pela incorporadora de outorgar escritura definitiva de compra e venda, transferindo o imóvel livre e desembaraçado de ônus, uma vez pago o preço, persiste, ainda que tenha, com a anuência do compromissário comprador, dado o imóvel em hipoteca para garantir o pagamento da dívida contraída para andamento e conclusão da obra. Anuência do comprador que não importou obrigação de aguardar o vencimento da dívida hipotecária para somente então receber a escritura definitiva” – RT 767/219.

5. “Conforme interpretação do art. 848 do CC e art. 252 da Lei 6.015/73, a decisão que anula o cancelamento da hipoteca incidente sobre imóvel posto à venda e que restabelece a garantia não pode beneficiar nem prejudicar terceiros; assim, se ao tempo da alienação não existia registro do gravame, o adquirente tem o inequívoco direito de ver sua propriedade a salvo da hipoteca, impondo-se o seu cancelamento” – RT 749/289.

6. “O gravame da hipoteca é acessório da obrigação principal, ou seja, do débito que garante, e a possibilidade de buscar este em Juízo prescreve em vinte anos” – RT 730/347.

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7. “O autor, como adquirente, com título registrado, com respeito à hipoteca lavrada, é interessado que se legitima ao direito de pagar (art. 930 do CC), estando o credor hipotecário na obrigação de receber – Requisitos dos arts. 292 e 293 da Lei 6.015/73, na nova redação dada pela Lei 6.941, de 14.9.81, foram preenchidos” – RT 718/146.

8. “É nulo o pacto com o qual se convém que, no caso de falta de pagamento do crédito no termo estabelecido, a propriedade da coisa hipotecada ou dada em penhor passe ao credor. É princípio reconhecido por todas as legislações que o credor não poderá apropriar-se da coisa dada em garantia, se o devedor não cumprir a obrigação garantida” – RT 687/69.

9. “Hipoteca judiciária é efeito secundário da sentença que, a todo momento, pode ser especializada e inscrita no Registro Imobiliário, dinamizada, então, como direito real, oponível contra terceiros, que não se submete a qualquer prazo de preclusão. É instituto em desuso, frente às atuais disposições dos arts 592, I, e 593 do CPC – RT 564/207.

10. “Hipotecar reclama-se do mandatário a obtenção de poderes especiais e expressos, dispensada somente a designação do bem a ser hipotecado. Contudo, não pode hipotecar o mandatário que apenas dispõe de poderes para alienar” – RT 674/128.

11. “Tratando-se de execução hipotecária fundada no SFH, se inexistente prova de que os avisos regulamentadores de que trata o art. 2º, IV, da Lei 5.741/71 foram enviados ao endereço do imóvel financiado, inexistente, também, qualquer elemento no sentido de que o executado ou algum morador do imóvel os tenha recebido, a ação deve ser extinta, sem julgamento de mérito, por falta de constituição válida do processo” – RT 647/115.

12. “O credor hipotecário tem preferência para receber seu crédito no processo de execução em primeiro lugar e sem concorrência de terceiros, independentemente de ter promovido a execução de seu crédito e efetivado a penhora” – RT 651/154.

13. “Se o terceiro adquirente não efetua a remição ou não paga a dívida hipotecária, sujeitar-se-á à excussão do imóvel. Um dos característicos da hipoteca é precisamente a seqüela, por via da qual pode o credor executar o imóvel onde quer que se encontre” – RT 674/138.

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14. “Tratando-se de títulos garantidos por hipoteca, o credor pode exercitar a execução cambial em vez de excutir a hipoteca” – RT 549/128.

15. “Execução de imóvel hipotecado pelo primeiro credor. Necessidade de notificação judicial dos demais credores hipotecários, nos termos do art. 826 do CC, que nenhuma distinção faz entre a primeira e as sucessivas hipotecas. Nulidade da adjudicação, que não atendeu ao preceito supramencionado” – RT 565/250.

16. “Como a cédula equivale à escritura, para fins de registro imobiliário, se ela contiver o valor da avaliação dos bens oferecidos em garantia, dispensada estará a avaliação judicial, por força do art. 818 do CC” – RT 556/136.

17. “Se o credor hipotecário, notificado, intervém na execução e protesta por preferência, tem ele direito de levantar o depósito feito pelo que remiu o bem praceado” – RT 553/148.

18. “Na execução de crédito hipotecário, a penhora deve recair, independentemente de nomeação, sobre a coisa dada em garantia (art. 655, § 2º, CPC), ainda que, à primeira vista, possa o seu valor superar a dívida exeqüenda, já que o excesso somente se configura após a sua avaliação, momento em que poderá ser determinada a redução da penhora (art. 685, I, CPC)” – RT 796/355.

19. “As regras gerais sobre hipoteca não se aplicam às edificações financiadas por agentes integrantes do Sistema Financeiro da Habitação, eis que as unidades a serem construídas serão alienadas a terceiros, que responderão apenas pela dívida que assumirem com o financiamento da casa própria e não pela eventual inadimplência da construtora do empreendimento” – RT 794/280.

20. “O terceiro adquirente de imóvel hipotecado não pode valer-se de direito de oposição de embargos, em face de decisão que determinou a desocupação de imóvel financiado pelo Sistema Financeiro da Habitação, eis que fica também sujeito aos efeitos da hipoteca, que confere ao credor o direito de seqüela” – RT 794/357.

21. “A coisa dada em hipoteca fica sujeita, por vínculo real, ao cumprimento da obrigação, conforme estabelece o art. 755 do CC e, por força do art. 759 do mesmo Estatuto, o credor hipotecário tem direito de excutir a coisa hipotecada e preferência, no pagamento, a outros

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credores, inclusive ao crédito que tenha natureza propter rem, que não deixa de ser um crédito comum, destituído de qualquer preferência ou privilégio, sendo irrelevante a circunstância de que outro credor tenha proposto a ação executiva” – RT 793/305.

22. “Se a hipoteca preexistia ao negócio de compra e venda, circunstância que era de perfeito conhecimento do comprador, não há previsão legal para a extinção da garantia no momento da transferência de domínio do imóvel, sob pena, inclusive, de tolher o direito do credor hipotecário de excutir em juízo a coisa hipotecada” – RT 789/269.

23. “Os bens dados para garantia hipotecária em cédula rural são impenhoráveis, consoante expressa disposição do art. 69 do Dec.-lei 167/67; todavia, declarada a insolvência do devedor, cessam os efeitos dessa imunidade executiva, instalando-se o concurso universal de credores” – RT 803/182.