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HEPATITE C SUAS MANIFESTAÇÕES EXTRA-HEPÁTICAS KAREM LÓPEZ ORTEGA NILCE SAMECIMA KAWAJI Este texto é produto de parte de Monografia de conclusão de Curso de Especialização em Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais da FUNDECTO-FOUSP em 2006. 1- INTRODUÇÃO A hepatite C vem sendo estudada há vários anos. Nos últimos 10 anos, avanços significativos foram feitos no estudo de sua epidemiologia, modos de transmissão, patogênese, diagnóstico e tratamento (STRAUSS et al.,, 1999). A grande maioria das infecções é assintomática e anictérica e, apenas um quarto dos indivíduos, relatam anorexia, fraqueza, náuseas, vômitos e adinamia (AYUB, 2000). Dentre as hepatites virais é a única que apresenta manifestações extra– hepáticas, sendo que a maioria delas possui origem imunológica. O tratamento da hepatite C crônica pode melhorar a evolução dessas manifestações (AYUB, 2000). As manifestações extra-hepáticas podem ser divididas em hematológicas, glandulares, renais e dermatológicas (HAJJAR et al., 1999). Ainda que qualquer alteração sistêmica possa interferir no tratamento odontológico do paciente portador de hepatite C, a síndrome de Sjögren, as lesões liquenóides e o líquen plano, são as manifestações extra-hepáticas de especial interesse em odontologia.

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HEPATITE C SUAS MANIFESTAÇÕES EXTRA-HEPÁTICAS

KAREM LÓPEZ ORTEGA

NILCE SAMECIMA KAWAJI

Este texto é produto de parte de Monografia de conclusão de Curso de

Especialização em Odontologia para Pacientes com Necessidades Especiais da

FUNDECTO-FOUSP em 2006.

1- INTRODUÇÃO

A hepatite C vem sendo estudada há vários anos. Nos últimos 10 anos,

avanços significativos foram feitos no estudo de sua epidemiologia, modos de

transmissão, patogênese, diagnóstico e tratamento (STRAUSS et al.,, 1999).

A grande maioria das infecções é assintomática e anictérica e, apenas um

quarto dos indivíduos, relatam anorexia, fraqueza, náuseas, vômitos e adinamia

(AYUB, 2000).

Dentre as hepatites virais é a única que apresenta manifestações extra–

hepáticas, sendo que a maioria delas possui origem imunológica. O tratamento da

hepatite C crônica pode melhorar a evolução dessas manifestações (AYUB, 2000).

As manifestações extra-hepáticas podem ser divididas em hematológicas,

glandulares, renais e dermatológicas (HAJJAR et al., 1999).

Ainda que qualquer alteração sistêmica possa interferir no tratamento

odontológico do paciente portador de hepatite C, a síndrome de Sjögren, as lesões

liquenóides e o líquen plano, são as manifestações extra-hepáticas de especial

interesse em odontologia.

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2- REVISÃO DA LITERATURA

2.1- Hepatite C

2.1.1 – O vírus

O vírus da hepatite C (VHC) foi identificado pela primeira vez em 1989, nos

Estados Unidos, a partir de plasmas de chimpanzés contendo o agente da hepatite

não A e não B (JUNIOR et al. 1995; FOCACCIA et al., 1997; NAGAO et al., 2004).

O VHC é um vírus RNA da família Flaviviridae. Apresenta um formato

esférico, com envelope lipídico de diâmetro de 35-50 nm (AYUB, 2000, JUNIOR et

al., 1995), que contém genoma em fita simples de polaridade positiva medindo 9,7

kilobases de comprimento (STRAUSS, 2001). Na poliproteína, com uma longa fase

de leitura aberta (open reading frame) distinguem-se as proteínas estruturais: core,

E1 e E2 (regiões mutáveis) e as não estruturais ou NS (2 a 5). Essas últimas são

responsáveis pela replicação viral (STRAUSS, 2001) (Figura 1).

Figura 1- Vírus da hepatite C. A) Exemplificação esquemática do VHC (NIDDK, 2006); B) Exemplificação gráfica das proteínas contidas no genoma viral (ANZOLA, BURGOS, 2006).

Portanto, o agente etiológico da hepatite C, não é uma partícula homogênea,

podendo apresentar uma diversidade ampla de genótipos. Já foram descritos 6

genótipos e 30 subtipos (Figura 2) (MACCONALDT et al., 2004; JUNIOR et al., 1995;

BRANDÃO et al., 2001; POLJACKI et al., 2000), sendo os mais estudados os

genótipos 1a e 1b.

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Figura 2 – Árvore pilogenética dos tipos e subtipos de VHC (SIMMONDS, 2006).

2.1.2 Curso clínico

A grande maioria das infecções é assintomática e anictérica. Após um período

médio de incubação de 50 dias (15 a 150 dias), dependendo da carga viral

adquirida, quase todos os pacientes apresentam aumento nos níveis de

transaminases (AYUB 2000).

Após a exposição inicial, o RNA do vírus da hepatite C pode ser detectado no

sangue, dentro de 1 a 3 semanas (HAJJAR et al., 1999, AYUB 2000).

Somente 25 a 35 % desenvolvem sintomas como mal-estar, dor no

hipocôndrio direito, náuseas, vômitos, fraqueza ou anorexia e alguns se tornam

ictéricos (HAJJAR et al., 1999). Outros autores relatam que os sintomas podem

aparecer em até 50% dos casos de hepatite aguda (JUNIOR et al., 1995).

Estima–se que 20% a 30% dos pacientes se livram da infecção, caracterizada

pela cura autolimitada, desaparecendo o RNA-VHC e ocorrendo a normalização das

enzimas hepáticas (FOCACCIA et al., 1997, AYUB 2000). A probabilidade de a

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infecção aguda evoluir para forma crônica é de aproximadamente 80% (AYUB 2000)

(Figura 3).

Figura 3 – Representação esquemática do curso clínico da infecção pelo VHC (JORGE, 2006).

Configura–se quadro de hepatite crônica quando os pacientes que não

conseguem clarear o vírus após seis meses de infecção. Os níveis de transaminases

têm ampla oscilação no decorrer da doença, não atingindo a normalização. Nos

primeiros vinte anos a infecção segue silenciosamente, e o paciente raramente

apresenta fadiga ou mal estar (AYUB 2000).

A hepatite C é diagnosticada na doação de sangue ou quando os níveis de

transaminases estiverem altos nos exames laboratoriais de rotina. Os sintomas

relativos à disfunção hepática, como icterícia, ascite e sangramentos, só aparecem

nas fases avançadas (AYUB 2000).

O diagnostico de hepatite crônica só pode ser feito após a realização de uma

biópsia hepática, que deve ser indicada após seis meses de transaminases

persistentemente elevadas (AYUB 2000).

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A cirrose é o ponto final desse processo e acomete os infectados, após, pelo

menos, 20 anos de contagio (AYUB 2000).

Com cerca de 30 anos de infecção pelo VHC e com quadro de cirrose, pode

aparecer câncer de fígado (AYUB 2000).

2.1.3 – Meios de transmissão

O VHC é isolado no sangue, urina, saliva, sêmen, liquido ascítico e outra

secreções. Entretanto, é a transmissão parenteral o principal meio de disseminação

viral, tornando fundamental o controle na qualidade do sangue oferecido na

transfusão (AYUB 2000).

A mais importante forma de transmissão é por transfusão de hemoderivados.

Com a obrigatoriedade de testes para detecção do RNA do VHC em bancos de

sangue, houve uma redução nos casos relativos à transfusão (AYUB 2000).

Atualmente a transmissão via endovenosa em usuário de drogas é

responsável pela metade dos casos novos. Tatuagens, “pieercings”, acupuntura e o

uso de cocaína intranasal também são descrito como outra forma de transmissão.

Pacientes renais crônicos submetidos à hemodiálise constituem outro grupo de risco.

Apesar da transmissão sexual ser incomum, é de grande importância epidemiológica

e social. A transmissão vertical parece ser diretamente proporcional à carga viral

materna. Também pode ocorrer soroconversão após acidente ocupacional com

profissionais de saúde. (AYUB 2000, POLJACKI et al., 2000). A transmissão através

de pele ou mucosa ainda não foi provada (POLJACKI et al., 2000).

Modos de Transmissão da hepatite C

Comuns Incomuns

Uso de drogas endovenosas Cocaína intranasal

Transfusões de sangue Piercing

Acidentes com agulhas Tatuagens

Transmissão perinatal Transmissão sexual

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Figura 4 – Modos de transmissão da hepatite C (JORGE, 2006).

A figura 5 evidencia os fatores de risco para o contágio pelo VHC.

Fatores de risco para o contágio da hepatite C Transfusão de sangue ou derivados

Uso de drogas ilícitas

Hemodiálise

Exposição a sangue por profissionais da área de saúde

Receptores de órgãos ou tecidos transplantados

Recém-nascidos de mães portadoras

Contatos sexuais promíscuos ou com parceiros sabidamente portadores

Exposição a sangue por material cortante ou perfurante de uso coletivo sem esterilização adequada:

• procedimentos médico-odontológicos • tatuagem (agulhas e tintas) • acupuntura • manicure / pedicure • body piercing • contato social ou familiar com material de uso pessoal ( barbeadores, escovas dentais,

etc ) • "medicina" folclórica ( inclui "cirurgias espíritas" ) • barbeiros e cabelereiros

Figura 5 – Fatores de risco para o contágio da hepatite C (JORGE, 2006).

2.1.4 - Diagnóstico

A pesquisa de infecção pelo VHC se baseia em dois tipos de testes

laboratoriais: os testes que detectam anticorpos contra o vírus da hepatite C (ELISA

e RIBA) e os que pesquisam a presença do RNA do VHC no soro (PCR). (JUNIOR

et al., 1995).

O teste sorológico para diagnostico de hepatite C, rotineiramente utilizado

desde o inicio dos anos 90, é um teste imunoenzimático (ELISA) para detecção de

anticorpos contra o vírus da hepatite C (anti-VHC) (AYUB 2000). Esse teste adquiriu

maior sensibilidade e especificidade com o desenvolvimento de suas segundas e

terceiras gerações (ELISA II ou III) (STRAUSS 2001).

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Assim sendo, nos casos com valor preditivo alto para a infecção pelo VHC, a

reatividade do teste ELISA possui valor diagnóstico definitivo. Na dúvida, é possível

requisitar testes confirmatórios, como o imunoblot (RIBA e INNOLIA). A realização

desses testes revela-se particularmente útil no descarte de falsos-positivos em

populações de baixo risco (STRAUSS 2001, Ayub 2000).

Os testes RIBA II ou III têm sido empregados na avaliação diagnóstica de

pessoas com baixa probabilidade de infecção pelo VHC e com reação positiva ao

teste ELISA (BRANDÃO et al., 2001).

A reação em cadeia da polimerase (PCR) é uma das técnicas que amplifica

uma parte do genoma do vírus (STRAUSS 2001), utilizando sondas de ácido

nucléico (sondas genéticas, ou primers) que são fragmentos de DNA ou RNA com

estrutura complementar a uma seqüência do acido nucléico a ser detectado

(BRANDÃO 2001).

Outra variante técnica é aquela que em vez de parte do genoma viral,

amplifica-se o sinal de sua presença, conhecida como “branched DNA” (bDNA),

muito mais reprodutíveis porém menos sensíveis do que a PCR (STRAUSS 2001).

Os métodos que adotam técnica de biologia molecular para genotipagem,

utilizando porções do genoma, incluem a PCR aninhada (“nested PCR”), a técnica

de RFLP (“restriction fragment length polymorphism”), a hibridização reversa e o

seqüenciamento direto da região não-codificante 5. Suas principais vantagens são a

informação direta sobre seqüência dos nucleotídeos do genoma viral, alta

sensibilidade, por se basearem na PCR, e a possibilidade de identificar o subtipo

viral (BRANDÃO et al., 2001).

A biópsia hepática por punção guiada por ultra-sonografia ou por

videolaparoscopia é considerada como padrão-ouro no acompanhamento de

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pacientes com hepatite C crônica. Deve ser indicada antes do tratamento para

afastar outras possibilidades de hepatopatias e outras contra-indicações. Por se

tratar de exame invasivo não isento de morbidade, deve ter uma indicação criteriosa.

É contra-indicado em indivíduos com aumento no tempo de protrombina e deve ter

indicação cuidadosa nas pessoas com cirurgias gastrintestinais prévias (AYUB,

2000).

2.1.5 - Tratamento

O tratamento da hepatite C objetiva deter a progressão da doença hepática

pela inibição da replicação viral. A redução da atividade inflamatória costuma impedir

a evolução para cirrose e carcinoma hepatocelular, havendo também melhora na

qualidade de vida dos pacientes. Os medicamentos disponíveis até o momento,

entretanto, conseguem atingir os objetivos propostos em menos da metade dos

pacientes tratados. A precocidade do diagnóstico leva ao tratamento de pacientes

freqüentemente assintomáticos, impedindo que quase metade deles evolua para

fases sintomáticas da doença hepática, de mais difícil controle (STRAUSS, 2001).

A eficácia do tratamento deve ser definida bioquimicamente com a

normalização das transaminases e com o desaparecimento do antígeno viral. A

resposta sustentada é definida como a manutenção dos parâmetros anteriormente

citados por, no mínimo, seis meses após o término do tratamento (AYUB, 2000).

Até meados da década de 90, a única medicação disponível para o

tratamento da hepatite crônica C era o interferon-α. Contudo, após 48 semanas de

tratamento, a resposta virológica (negativação do RNA do VHC por PCR) era

observada em apenas 5% a 20% dos pacientes. Esse insucesso, apesar das

diversas dosagens, preparações e esquemas terapêuticos utilizando monoterapia

com interferon, estimulou a realização de estudos com terapia combinada, sendo a

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mais avaliada a associação de interferon-α com ribavirina, um análogo nucleosídio

sintético (ALVES, 2003).

A combinação do interferon-alfa com a ribavirina melhora a resposta

virológica sustentada para 38-43%, com correspondente melhora na análise

histológica (biópsia) e, possivelmente, nas complicações a longo prazo da hepatite

(mas para esse último faltam estudos prospectivos a longo prazo ) (JORGE, 2006).

Hoje recomenda-se a terapia com interferon α - 3.000.000 unidades por via

subcutânea, 3 vezes por semana e ribavirina 1.000 mg ao dia por via oral em < 75

kg e 1.200 mg em > 75 kg (JORGE, 2006).

Infelizmente, os melhores resultados do tratamento são naqueles pacientes

com doença que naturalmente seria mais benigna, ou seja, genótipo do vírus que

não seja o 1, baixa viremia e ausência de fibrose ou cirrose ao início do tratamento

(JORGE, 2006).

Mesmo na ausência de fatores benéficos ao tratamento, ele deve ser

realizado, mas recomenda-se que dure 48 semanas, ao contrário das normais 24

semanas (nos pacientes acima, não há melhora significativa da resposta dobrando-

se o tempo de tratamento, mas nos casos mais severos sim ) (JORGE, 2006).

Os interferons são glicoproteínas produzidas por células infectadas por vírus.

Até agora foram identificados três tipos: o alfa, produzido por linfócitos B e

monócitos, o beta, por fibroblastos e o gama, por linfócitos T-helper e NK. O IFN-alfa

age diretamente contra o vírus e também aumenta a resposta imune (JORGE,

2006).

Bioquímicamente, os interferons pertencem à superfamília das citoquínas e

modulam a atividade de vários componentes do sistema imune, aumentando a

habilidade dos organismos na luta contra infecções bacterianas, parasitarias e virais.

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Constituem–se, portanto, em famílias de proteínas responsáveis por efeitos

antivirais, antiproliferativos e imunomoduladores por excelência (CONTE, 2000).

A ribavirina é uma análogo sintético da guanosina que tem ação direta contra

vírus RNA e DNA, por provável mecanismo de inibição da DNA polimerase vírus-

dependente. A ribavirina sozinha, no entanto, não tem qualquer efeito sobre a

hepatite C (JORGE, 2006).

Recentemente uma nova formulação de interferon foi introduzida no

tratamento dos pacientes portadores do VHC, o Interferon peguilado ou

peginterferon. Associando a molécula polietilenoglicol ao interferon, conseguiu-se

produzir uma nova modalidade de interferon com absorção e eliminação mais lentas.

Graças a isso, o interferon peguilado pode ser administrado por via subcutânea

apenas uma vez por semana e ainda manter um nível no sangue contínuo, mais

adequado que as três administrações semanais do interferon comum - o resultado

são melhores resultados e uma discreta menor incidência de efeitos colaterais. Em

monoterapia, a taxa de resposta virológica sustentada é de 39%, com resultados

ainda maiores com a associação peginterferon + ribavirina (JORGE, 2006).

Alem da baixa eficácia terapêutica, os medicamentos disponíveis, interferon e

ribavirina, provocam efeitos colaterais importantes e devem ser administrados por

período de tempo prolongado, exigindo monitoração médica especializada

constante. Outro aspecto a ser considerado é o alto custo do processo terapêutico,

onerando não apenas os indivíduos acometidos, mas toda a sociedade, já que em

nosso país existe a distribuição dos medicamentos pelo Sistema Único de Saúde

(STRAUSS, 2001).

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Em 1 a 2% dos casos aparecem manifestações auto-imunes em pacientes

sob tratamento com interferon: tireoidite, síndrome de Sjögren, artrite e anemia

hemolítica (Figura 6).

Lesões liquenóides induzidas por medicamentos podem estar presentes com

várias características clínicas, incluindo as lesões clássicas de líquen plano, lesões

psoriasiformes, pápulas eczematosas e placas, localizadas ou generalizadas.

Lesões liquenóides surgem caracteristicamente no tronco e nas extremidades,

diferindo da distribuição flexural do líquen plano clássico. O período de latência para

o desenvolvimento das lesões líquenóides varia de meses a mais de 1 ano, baseado

na dosagem, resposta do hospedeiro e tempo de exposição à droga (ARMOUR et

al., 2005).

Efeitos colaterais do tratamento com interferon alfa e ribavirina na hepatite C

Leucopenia

Neutropenia

Trombocitopenia

Anemia hemolítica

Fadiga

Depressão e outros transtornos psiquiátricos

Sintomas "gripais": febre e dores musculares

Sintomas gastrointestinais: náuseas e perda do apetite

Sintomas respiratórios: tosse e falta de ar Dificuldade no controle de diabetes

Disfunção na tireóide: hiper ou hipotireoidismo

Sintomas dermatológicos: descamações (rash) e perda de cabelos

Risco aumentado de defeitos de nascença em grávidas Figura 6 - Efeitos colaterais do tratamento com interferon alfa e ribavirina na hepatite C (JORGE, 2006).

O desenvolvimento de líquen plano em pacientes com hepatite C crônica em

uso de interferon α, com ou sem ribavirina, tem sido relatado. Não há tendência

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particular entre os tipos de interferon α (2a ou 2b, padrão ou peguilado) para indução

das reações liquenóides. É interessante notar que pacientes com hepatite C crônica

e com líquen plano, tratados com interferon α, apresentam melhora no líquen plano

coexistente. A ribavirina sozinha pode causar foto-sensibilidade, mas não está

associada ao aparecimento de líquen plano ou lesões liquenóides. Destacam-se,

alguns casos de lesões liquenóides induzidas secundariamente ao uso de

propanolol G-CSF (ARMOUR et al., 2005).

A infecção pelo VHC afeta cerca de 170 milhões de pessoas no mundo

(SÈNE et al., 2004). Seguida à infecção aguda, desenvolve-se hepatite crônica em

80% dos casos, podendo levar ao carcinoma hepatocelular. (LAUER and WALKER

2001 apud SÈNE, 2004). Outras doenças são freqüentemente relatadas, associadas

à infecção pelo VHC, porém sem necessariamente provar a real associação (SÈNE

et al., 2004).

2.2- Manifestações extra-hepáticas no VHC

A ocorrência de manifestações extra-hepáticas não é muito elucidada, por

causa dos mecanismos envolvidos em sua gênese e pela repercussão multi-

sistêmica da hepatite C, que envolve uma complexa resposta vírus-hospedeiro

(HAJJAR et al., 1999).

Embora as evidências sejam ainda incompletas, as síndromes extra-

hepáticas, observadas na hepatite viral crônica, parecem ser mediadas por

mecanismos imunológicos. Esses pacientes comumente, apresentam manifestações

imunológicas, incluindo auto-anticorpos circulantes e doenças auto-imunes (HAJJAR

et al., 1999).

Há vários mecanismos potenciais para explicar as manifestações extra-

hepáticas da infecção pelo vírus da hepatite C, incluindo: (1) injuria direta citopática;

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(2) lesão produzida pela deposição de imunocomplexos; (3) resposta imunológica

induzida pelo vírus, como a formação de auto-anticorpos ou ativação de linfócitos

citotóxicos; (4) indução de linfócitos monoclonais ou policlonais; e (5) lesão

produzida pelos efeitos indiretos da resposta inflamatória, como pela liberação de

citocinas (como os interferons e o fator de necrose tumoral) (HAJJAR et al., 1999).

Entre as manifestações extra-hepáticas associadas à hepatite C, podem ser

citadas a crioglobulinemia mista e suas complicações em pele, alterações

neurológicas e renais e o envolvimento reumatológico. Outras doenças como

vasculite sistêmica leucocitoclástica, linfoma, fatiga, porfíria cutânea tardia, síndrome

de Sjögren, produção de auto-anticorpos e glomerulonefrite (Nagao, 2004) Também

são evidenciadas as manifestações de moderado grau de associação à hepatite C,

que incluem o linfoma não-Hodgkin de células B, trombocitopenia auto-imune,

urticária e Diabetes Mellitus tipo II. Outras doenças, como a tireoidite auto-imune e o

líquen plano, são questionadas quanto a sua eventual associação com o VHC

(SÈNE et al., 2004).

A primeira associação da infecção crônica pelo vírus C com manifestações

imunomediadas foi sugerida em 1990, quando foram relatados dois pacientes com

hepatite C e crioglobulinemia mista. Desde então, um número considerável de

manifestações extra-hepáticas tem sido descrito. Didaticamente, as manifestações

extra-hepáticas podem ser divididas em hematológicas, glandulares, renais e

dermatológicas (HAJJAR et al.,, 1999).

2.2.1- As alterações hematológicas:

Crioglobulinemia mista

Crioglobulinas são imunoglobulinas circulantes ligadas a outras

imunoglobulinas ou proteínas que se precipitam de forma reversível em baixas

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temperaturas. Os sintomas da crioglobulinemia do tipo I são decorrentes da oclusão

vascular resultante da precipitação protéica. Já a crioglobulinemia mista (tipo III) é

uma doença por deposição de imunocomplexos (LEVY, 2006).

As crioglobulinas do tipo I são imunoglobulinas monoclonais, IgG ou IgM mais

freqüentemente, embora IgA e proteínas de Bence Jones já tenham sido

identificadas. Crioglobulinas do tipo II consistem em dois tipos de componentes de

imunoglobulinas, sendo um deles monoclonal. A composição mais comum é de um

fator reumatóide IgM monoclonal formando um complexo com uma IgG policlonal.

Embora a concentração de crioglobulinas do tipo II seja muito alta, um pico

monoclonal típico nem sempre é aparente na imunoeletroforese. Os fatores

reumatóides monoclonais do tipo IgG são identificados em 10% dos casos de

crioglobulinemia do tipo II, e os fatores reumatóides do tipo IgA são raros (LEVY,

2006).

A crioglobulinemia mista é uma doença linfoproliferativa, que pode levar a

deposição de imunocomplexos circulantes, em vasos de pequeno e médio calibre.

Em muitos casos, apresenta-se com a tríade clínica de púrpura palpável, artralgia e

fraqueza, mas pode envolver os rins, o sistema nervoso e o cérebro (HAJJAR et al.,

1999, POLJACKI et al., 2000). Pode ser detectada em 35-54% dos pacientes com

hepatite C. Quando a crioglobulemia ocorre em associação com uma doença

primaria como a síndrome de Sjögren, denomina-se crioglobulemia essencial mista

(HAJJAR et al., 1999). Encontrar anticorpos VHC e/ou RNA viral em 96 % dos

pacientes com crioglobulinemia mista, pode ser considerado prova definitiva entre a

associação da etiopatogenia entre a infecção da hepatite C e a crioglobulinemia

mista (POLJACKI et al., 2000).

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Embora as crioglobulinas sejam encontradas em vários pacientes, sintomas

só ocorrem em 25 % dos casos (HAJJAR et al., 1999).

Diversas formas de tratamento são empregadas no controle da

crioglobulinemia mista, entre elas os imunossupressores, como os corticóides. Mas,

geralmente o tratamento do VHC, baseado na terapia com interferon, apresenta

resultados satisfatórios no controle dessa doença (MAZZARO et al.,2000).

Linfoma

Ferri et al., (1996) descreveu um aumento na prevalência de anti-vírus VHC

(20 a 40%) em pacientes com linfomas não-Hodgkin, mas não em outras neoplasias

hematológicas. Duas grandes séries mostraram que a correlação mais forte ocorria

no imunocitoma, um tumor com malignidade de baixo grau associada com a

crioglobulinemia. A possibilidade de que a crioglobulinemia por vírus VHC poderia

progredir par um linfoma não-Hodgkin foi testada em um estudo com 31 pacientes

com crioglobulinemia mista e RNA do vírus VHC no soro e na medula óssea. A

biópsia de medula óssea confirmou a presença de linfoma não-Hodgkin de baixo

grau em 12 (30%) e de infiltração medular policlonal não reativa em 11 (36%). O

seguimento desses pacientes mostrou a progressão de distúrbios linfo-proliferativos

em 50% dos casos. Embora o RNA viral fosse detectado em todos os pacientes,

evidências clínicas e bioquímicas de doença hepática só eram presentes em 48% e

anticorpos anti-VHC eram indetectáveis em alguns. Não está claro se o

desenvolvimento do linfoma não-Hodgkin está relacionado a um efeito direto do vírus

da hepatite C nos linfócitos ou se a proliferação monoclonal ou policlonal é induzida

por estímulo viral ou por inflamação crônica. O fato é que o RNA do VHC tem sido

detectado em linfonodos de pacientes com linfoma não-Hodgkin, mas este não tem a

capacidade de se integrar ao DNAm do hospedeiro e não apresenta oncogenes

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conhecidos nem a transcriptase reversa, o que torna improvável um efeito

oncogênico (FERRI et al., 1996).

Anemia aplástica

O desenvolvimento de anemia aplástica tem sido descrito em seguida a

hepatite por vírus C pós-transfusional, em associação com anticorpos anti–LKM1 e

crioglobulinemia. Em séries maiores, não houve diferença na prevalência de anti-

VHC em anemia aplástica associada à hepatite e anemia aplástica de outras causas.

A detecção do RNA do vírus da hepatite só se correlacionava com o número de

transfusões de sangue, recebidas após o desenvolvimento da anemia aplástica.

Apesar ser uma associação rara (HAJJAR et al., 1999).

2.2.2- Alterações glandulares:

Tireoidopatias

As doenças da tireóide são as doenças auto-imunes mais comumente

associadas com a hepatite C crônica. Anticorpos anti-tireóide estão presentes em

5,2 a 12,5 % dos pacientes com hepatite C (PANTERON et al. , 1993 apud HAJJAR

et al., 1999). A doença da tireóide, principalmente o hipotiroidismo, ocorre em 3,1 a

5.5 % dos pacientes (TRAN et al, 1993). A maior prevalência, tanto de anticorpos

quanto de doença clinicamente manifesta, encontra-se entre as mulheres mais

velhas. Porém, um estudo suscitou duvidas sobre essa associação, na medida em

que não encontrou diferença na prevalência de anticorpos anti-tireóide entre

doadores normais e aqueles com hepatite C (WILSON, 1997 apud HAJJAR et al.,

1999).

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O interferon pode induzir à formação de anticorpos anti-tireoide e à doença

tireoideana, que às vezes desaparecem após a suspensão do tratamento, fato que

pode confundir a investigação sobre sua gênese (HAJJAR et al., 1999).

Síndrome de Sjögren

A síndrome de Sjögren clássica é uma desordem auto-imune caracterizada

por infiltração linfocítica das glândulas salivares e lacrimais, decorrente da disfunção

de linfócitos T e da hiper-reatividade de células B, associados ao aumento da

produção de imunoglobulinas e de auto-anticorpos, apresentando a tríade

característica de xerostomia, xeroftalmia e artrite reumatóide. (CABRAL et al., 2001,

MELO et al., 2000).

A doença pode ocorrer de forma isolada (Síndrome de Sjögren primária) ou

associada a outras doenças reumáticas auto-imunes (Síndrome de Sjögren

secundária). Em alguns casos, esta síndrome pode se apresentar com sintomas

vagos relacionados apenas com xerostomia e xeroftalmia em outros, o processo

auto-imune pode assumir a forma de uma doença grave, afetando vários outros

órgãos. A síndrome pode ser acompanhada de outras doenças presumivelmente

auto-imunes, como a cirrose biliar primária, hepatite crônica ativa, poliartrite, lúpus

eritematoso sistêmico, esclerodermia, poliartrite nodosa, macroglobulinemia de

Waldenströn e tireoidite de Hashimoto. Microscopicamente as alterações são há

muito conhecidas sob o nome de Mikuliez ou lesão linfoepitelial benigna (MELO et

al., 2000).

Foram sugeridas varias causas para esta síndrome: genéticas, hormonais,

infecciosas e imunológicas. Alterações imunológicas sugerem um processo mórbido

de grande complexidade. A alteração generalizada se refere a uma hiperatividade

policlonal das células B que reflete uma falta de regulação por subpopulações da

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célula T. Basicamente uma reação inflamatória crônica, de origem auto-imune, que

pode ficar limitada às glândulas exócrinas ou se propagar, envolvendo distúrbios

sistêmicos do tecido conjuntivo (MELO et al., 2000).

A síndrome acomete predominantemente mulheres na meia idade (proporção

de 9:1 homens), embora possa ser vista em todas as idades, incluindo a infância. A

prevalência da síndrome de Sjögren primaria é de cerca de 0,5% a 1% e cerca de 30

% dos pacientes com doenças reumatóides apresentam síndrome de Sjögren

secundária (MELO et al., 2000).

A característica típica da doença primária é a secura da boca e dos olhos, em

conseqüência da hipofunção das glândulas salivares e lacrimais. Isto,

freqüentemente, resultando em sensação dolorosa de queimação da mucosa bucal,

nariz, laringe, faringe e arvore traqueo-bronquial (buco-faringo-laringite seca) e a

vagina. Na forma secundária, a artrite reumatóide e lúpus eritematoso são as

doenças auto-imunes mais comuns. Menos freqüente, doenças como esclerodermia,

cirrose biliar primaria, polimiosite, vasculite, parotidite e hepatite crônica ativa. Há

relatos de que os pacientes apresentam maior incidência de linfomas, acometendo

pulmões (doença pulmonar intersticial difusa subclinica) e o trato gastrintestinal. Os

linfomas podem aparecer após vários anos de aparência benigna, geralmente em

pacientes com doença sistêmica (MELO et al., 2000).

Pacientes com Sjögren e infectados pelo vírus da hepatite C comumente têm

capilarite linfocítica (17 a 49%), mas tendem a apresentar uma forma mais leve que

aquela observada na doença primária. Apenas 14% tem as manifestações

histológicas observadas no Sjögren “verdadeiro”. Além disso, a sialoadenite

linfocítica, observada na infecção pelo vírus C, em muitos casos não se associa com

xerostomia ou com a presença de anticorpos anti-Ro (SS-A). Também difere a

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natureza do infiltrado inflamatório observado nesses pacientes, predominantemente

constituído de linfócitos CD8, contrastando com o observado no Sjögren primário. As

diferenças clínicas e patológicas sugerem que a infecção pelo vírus da hepatite C

está associada com a sialoadenite linfocítica crônica e não com a síndrome de

Sjögren verdadeira (HAJJAR et al., 1999).

A sialoadenite linfocítica consistente com síndrome de Sjögren foi,

inicialmente, descrita em 57% de pacientes com hepatite crônica, mas estudos mais

recentes, em pacientes com Sjögren primário, mostraram que a infecção com o VHC

ocorria em percentagem similar a da população–controle. Em estudo realizado em

110 japoneses com doenças crônica de fígado; sendo 29 com o vírus da hepatite B

(VHB) e 81 com o VHC, foi observado que a prevalência da Síndrome de Sjögren,

de acordo com critérios europeus e japoneses, foi significantemente mais elevada

em pacientes com infecção crônica de VHC do que nos pacientes com infecção

crônica de VHB. Simultaneamente, combinando líquen plano oral e síndrome de

Sjögren observou-se 8,6% (7/81) pacientes com infecção pelo VHC, mas apenas em

9 com infecção pelo VHB (NAGAO et al., 2003).

Estudo na França encontrou 57 % de infecção crônica de VHC associado à

doença crônica do fígado, exibindo grau 3 ou 4 de sialadenites. Um estudo

subseqüente notou que, em contraste à síndrome de Sjögren, a infiltração linfocítica

nos pacientes infectados pelo vírus VHC foi pericapilar ao invés de peridural, com

uma não destruição dos ductos das glândulas salivares e que capilares linfocíticos

assemelham-se a um estágio inicial da doença. Dados remotos mostram que até

80% de indivíduos infectados pelo vírus VHC, poderão ter alguma anormalidade

salivar ou lacrimal, freqüentemente representado por sinais histopatológico de

sialadenite moderada, evidencia clínica de boca seca e, principalmente, de olhos

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secos, está freqüentemente ausente (mas, pode ser subestimado). Alguns estudos

parecem indicar que esta sialadenite pode ser significantemente diferente da que

síndrome de Sjögren primária (CARROZZO et al., 2003).

Pacientes infectados com VHC podem ter síndrome de Sjögren com

sialadenite com sintomas clínicos moderados, embora se tenha poucos dados sobre

as funções salivares e lacrimais desses pacientes (CARROZZO et al., 2003).

2.2.3- Alterações renais

As alterações renais, como a glomerulonefrite membranoproliferativa e a

síndrome nefrótica, têm sido descritas como manifestações extra-hepáticas

associadas à hepatite C.

A relação entre insuficiência renal e hepatite C aumenta consideravelmente

na presença de crioglobulinemia. O tratamento com interferon resulta na redução da

proteinúria, correlacionada com a redução da viremia. Mas, não se observa melhora

da função renal. Sendo comum a recidiva da viremia e da doença renal. Alguns

pacientes com infecção crônica pelo vírus C também podem apresentar proteinúria e

insuficiência renal na ausência de crioglobulinemia, o que sugere que todos os

pacientes com doença glomerular devem ser submetidos à sorologia para o vírus C.

Além da doença glomerular, inflamação e atrofia tubulointersticial são

comuns. Esses dados apontam para o fato de que o vírus da hepatite C

possivelmente represente um fator crítico no desenvolvimento de glomerulonefrite

em alguns pacientes cuja etipatogênese parece estar relacionada com a deposição

de imunocomplexos associada com a crioglobulinemia ou com a deposição de

antígenos virais, seguida de uma resposta imunológica. Hipóteses alternativas

advogam que a infecção crônica com o vírus da hepatite C resulta na formação de

autoanticorpos que reagem com antígenos nativos renais e que a doença crônica

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hepática, pode contribuir para a patogênese da glomerulonefrite

membranoproliferativa diretamente (HAJJAR 1999).

2.2.4 - Alterações dermatológicas

Vasculite leucocitoclástica

A vasculite leucocitoclástica se caracteriza pelo processo inflamatório de

pequenos vasos cutâneos, principalmente vênulas, podendo alcançar também

artérias, promovendo necrose de pele. Histologicamente observa-se a presença de

leucocitoclasia (resíduo de núcleos de leucócitos), promovendo a "poeira nuclear"

(PANICO, 1998).

A apresentação mais freqüente é a púrpura palpável, que tem predileção

pelos membros inferiores e comumente está associada ao envolvimento articular,

mas também pode haver a vasculite urticariforme, de curta duração e não

pruriginosa. A vasculite de vasos de médio calibre manifesta-se usualmente por

neuropatias: polineuropatia simétrica, mononeurite simples ou múltipla, neuropatia

autonômica ou cranial. Na pele, pode haver lesões ulceradas (como na poliarterite

nodosa), livedo reticular, rash maculopapular e paniculite. está associada à

positividade do fator reumatóide e do fator antinuclear (FAN), à presença dos

anticorpos anti-Ro (SSA) e anti-La (SSB), ao consumo de frações do complemento e

à presença de hipergamaglobulinemia e crioglobulinas. Os pacientes que

apresentam hipergamaglobulinemia costumam evoluir com ataques recorrentes de

púpura palpável (BACON, CARRUTHERS, 1995; RAMOS-CASALS ET AL., 2004).

Alguns casos de vasculite leucocitoclástica são descritos em pacientes com

hepatite C, sendo geralmente conseqüência da crioglobulinemia. Apresentando–se

clinicamente como púrpuras palpáveis e petéquias. A análise histopatológica

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demonstra vasculite dérmica, associada a um infiltrado neutrofílico intra e

perivascular (HAJJAR 1999).

Porfiria cutânea tardia

As porfirias são um grupo de distúrbios provocados por deficiências das

enzimas envolvidas na síntese do heme. O heme, um composto químico que

transporta o oxigênio e confere a cor vermelha ao sangue, é um componente

fundamental das hemoproteínas, um tipo de proteína encontrado em todos os

tecidos. A maior quantidade do heme é sintetizada na medula óssea para a

produção de hemoglobina. O fígado também produz grandes quantidades de heme

e a maioria é utilizada como um componente dos citocromos. Alguns citocromos no

fígado oxidam substâncias químicas estranhas, incluindo medicamentos, para que

sejam eliminadas mais facilmente do organismo. Oito enzimas diferentes intervêm

nas etapas seqüenciais da síntese do heme. Quando existe deficiência de uma das

enzimas que participam da produção do heme, os precursores químicos do heme

podem acumular-se nos tecidos (especialmente na medula óssea ou no fígado)

(MERCK, 2006).

A porfiria cutânea tardia, a forma mais comum de porfiria, causa a formação

de bolhas na pele exposta à luz solar. A porfiria cutânea tardia ocorre em todo o

mundo e é a única porfiria não hereditária. Este distúrbio, uma porfiria hepática,

ocorre quando o uroporfirinogênio descarboxilase, uma das enzimas hepáticas

necessárias para a síntese do heme, é inativada. Os fatores que contribuem para o

seu aparecimento são o ferro, o álcool, os estrógenos e a infecção pelo vírus da

hepatite C. Menos comum, a porfiria cutânea tardia ocorre em indivíduos infectados

pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV). Embora o distúrbio não seja

hereditário, uma deficiência parcial da enzima uroporfirinogênio descarboxilase

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herdada de um dos pais algumas vezes torna o indivíduo suscetível. Nestes casos,

ele é denominado porfiria cutânea tardia familiar (MERCK, 2006).

Além de ocorrer a formação de bolhas nas áreas expostas ao sol, a pele,

especialmente a das mãos, também torna-se sensível a pequenos traumatismos. As

bolhas são substituídas posteriormente por crostas e cicatrizes que levam um longo

tempo para cicatrizar. A lesão cutânea ocorre porque as porfirinas produzidas pelo

fígado são transportadas pelo plasma sangüíneo até a pele. Pode ocorrer um

aumento da pilificação facial (MERCK, 2006).

A porfiria cutânea tardia é a porfiria mais fácil de se tratar. O procedimento

mais amplamente recomendado é a flebotomia, na qual é realizada a remoção de

meio litro de sangue a cada 1 ou 2 semanas. Este procedimento acarreta uma

discreta deficiência de ferro no paciente. As concentrações de porfirinas no fígado e

no plasma sangüíneo diminuem gradualmente e a pele melhora e, finalmente,

recupera-se totalmente (MERCK, 2006).

A infecção pela hepatite C tem sido considerada um importante fator de

precipitação da sintomatologia da porfíria cutânea. Não considerando o alto nível de

soropositividade entre porfíria cutânea tardia em pacientes (62-100%), a associação

entre com a infecção pelo VHC, ainda não está muito claro (POLJACKI et al., 2000).

Líquen plano

O líquen plano é uma doença inflamatória crônica relativamente comum.

Acomete pele e membranas mucosas, separadamente ou em combinação (NAVAS-

ALFARO et al., 2003), podendo acometer a mucosa genital (CUNHA et al., 2002).

Freqüentemente envolve a cavidade oral, com ou sem comprometimento cutâneo

concomitante. A mucosa oral pode apresentar variações relacionadas às

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características locais da mucosa na cavidade oral (NAVAS-ALFARO et al., 2003,

CUNHA et al., 2002).

Foi descrito clinicamente pela primeira vez por Erasmus Wilson, em 1969, e,

apesar de mais de um século transcorrido após sua primeira descrição, sua etiologia

e patogênese permanecem obscuras. (CUNHA et al., 2002, ISSA et al., 1999).

A associação entre líquen plano oral e doença hepática crônica foi descrita

pela primeira vez em 1978, por Rebora e colaboradores (CUNHA et al., 2002,

BORTOLLUZZI et al., 2002).

Para alguns autores parece claro o envolvimento da infecção pelo VHC no

desenvolvimento de alguns casos de líquen plano oral, entretanto porque isso ocorre

ainda não foi esclarecido. A variação de manifestações clínicas do líquen plano oral

e seus diferentes cursos, bem como seu potencial cancerizável, sua variação

histopatológica e sua etiopatogenia obscura tornam essa doença desconcertante na

abordagem clínica dos pacientes por ela acometidos (BORTOLUZZI et al., 2002).

A prevalência de líquen plano em pacientes com hepatite C e vice–versa varia

amplamente na literatura, com alguns trabalhos mostrando resultados favoráveis a

essa associação e outros não apontando uma correlação.

Poljacki e colaboradores (2000) evidenciaram 35% de prevalência de

desordens hepáticas em pacientes com líquen plano. As manifestações clínicas do

líquen plano na infecção pelo VHC eram caracterizadas por lesões de pele

generalizadas, com envolvimento erosivo das membranas da mucosa oral. A

eficiência da terapia com interferon era variável (POLJACKI et al., 2000).

Issa e colaboradores realizaram a pesquisa de anticorpo anti-VHC, em 34

pacientes portadores de líquen plano de pele. Para fins comparativos, 36 pacientes

portadores de hepatite C foram submetidos a exame dermatológico na busca de

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lesões sugestivas de líquen plano. Foi constituído um grupo controle de 60

pacientes, doadores de sangue selecionados aleatoriamente em um banco de

sangue e aparentemente saudáveis. Entre esses, apenas os que apresentaram

sorologia positiva para os VHB e ou VHC foram submetidos a exame dermatológico.

Entre os 34 pacientes portadores de líquen plano, apenas 2 apresentaram sorologia

positiva para VHC. No grupo de pacientes portadores de hepatite C, nenhum

apresentou lesão sugestiva de líquen plano. No grupo controle, o único doador de

sangue com sorologia positiva para o VHC também não apresentou lesão sugestiva

de líquen plano oral. Os autores concluíram que os índices de positividade para o

VHC registrados na casuística dificultavam o limite entre causalidade e casualidade

da associação líquen plano à hepatite C (ISSA et al., 1999).

Erke e colaboradores, em 2001, avaliaram a presença de anticorpos anti-VHC

e RNA do VHC no soro em 54 pacientes com líquen plano e em 54 pacientes com

doenças dermatológicas menores. Foram colhidas biópsias de tecidos com e sem

lesão cutânea dos pacientes infectados pelo VHC. Relataram 7 pacientes (12,9%)

com líquen plano no grupo estudado, e 2 pacientes do grupo controle (3,7%)

apresentavam anticorpos anti-VHC positivos. Cinco dos sete pacientes que

apresentaram anticorpos anti-VHC positivos apresentavam também RNA-VHC na

biopsia de lesão de pele. Estava ausente o RNA viral em 3 das 4 amostras de soro

dos pacientes com líquen plano positivos para RNA–HVC e que correspondia com

as biopsias de pele não lesionada. A prevalência de infecções por VHC não

aumentou em pacientes com líquen plano, entretanto os achados sugerem que o

vírus pode potencializar a função patogênica em tecidos cutâneos, causando líquen

plano em pacientes infectados pelo VHC geneticamente suscetíveis.

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Para elucidar uma relação direta entre o líquen plano oral (LPO) e a infecção

pelo VHC, Nagao et al., (1998) investigaram a existência do RNA HVC em 19

amostras de tecido de LPO de indivíduos com e sem anticorpos para HVC. Os

resultados indicaram que o HVC persistia e se replicava em lesões de LPO,

sugerindo uma função patológica do HVC no LPO.

Chainani-Wu et al., (2004) fizeram uma revisão da literatura de 1966 à junho

de 2003, relacionando o líquen plano oral e o VHC. No estudo de prevalência de

VHC entre pacientes com líquen plano oral foram encontrados diferentes resultados

pelos pesquisadores (Figura 7).

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AUTORES E ANO DE PUBLICAÇÃO

PAÍS/CIDADE NÚMERO DE PACIENTES

PORCENTAGEM

Nagao et al, 1995 JÁPÃO 45 62%

Tanei et al., 1995 JAPÃO 45 37,8%

Dupond et al., 1998 FRANÇA 28 29%

Grote et al., 1999 ITÁLIA 100 13%

Roy et al., 2000 ESCÓCIA 6 0%

Van der Meij e Van der

Waal, 2000

HOLANDA 55 0%

Chainani-Wu et al., 2000 SAN

FRANCISCO

31 45%

Eisen, 2002 OHIO 195 0%

Romero et al., 2002 ESPANHA 62 11,3%

Mahboob et al., 2003 PAQUISTÃO 184 23,4% Figura 7 – Prevalência de VHC em pacientes com líquen plano oral

Nesse mesmo trabalho, Chainani-Wu et al., (2004) também relataram a

prevalência de líquen plano oral entre pacientes com VHC (Figura 8).

AUTORES E ANO DE PUBLICAÇÃO

PAÍS/CIDADE NÚMERO DE PACIENTES

PORCENTAGEM

Grote et al., 1999 ALEMANHA 127 2.4%

Henderson et al., 2001 ESCÓCIA 40 20%

Mignogna et al., 2001 ITÁLIA 300 1,6%

Nagao et al., 2002 JAPÃO 59 8,5% Figura 8 – Prevalência de líquen plano oral em pacientes com VHC.

Em estudo com casos controles, relatando a prevalência de VHC em

pacientes com líquen plano oral foram encontrados os resultados da figura 9

(Chainani-Wu et al., 2004).

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AUTORES E ANO DE PUBLICAÇÃO

PAÍS/CIDADE GRUPO ESTUDO

n (%)

GRUPO CONTROLE

n (%)

Carrozzo et al., 1996 ITÁLIA 19/70 (27,1%) 3/70 (4,3%)

Bagan et al., 1998 ESPANHA 23/100 (23%) 5/100 (5%)

Ingafou et al., 1998 INGLATERRA 0/55 (0%) 0/110 (0%)

Mignogna et al., 2001 ITÁLIA 76/263

(28,8%)

3/100 (3%)

Beaird et al., 2001 ESTADOS

UNIDOS

4/24 (17 %) 1/20 (5%)

Figueiredo et al., 2002 BRASIL 6/68 (8,8%) 1,4 %* Figura 9 – Estudos caso-controle de prevalência de VHC em pacientes com LPO. * dado da população geral; n=número de pacientes estudados; %=porcentagem

A figura 10 demonstra os resultados do estudo comparativo relacionando a

prevalência de LPO em pacientes com VHC com grupo controle de LPO.

AUTORES E ANO DE PUBLICAÇÃO

PAÍS/CIDADE GRUPO ESTUDO

n (%)

GRUPO CONTROLE

n (%)

Bagan et al., 1998 ESPANHA 17/505

(3,36%)

1/100 (1%)

Nagao et al., 1997 JAPÃO 4/61 (6,6%) 6/591 (1%)

Nagao et al., 2000 JAPÃO 5/31 (16,1%) 7/150 (4,7%)

Figueiredo et al., 2002 BRASIL 6/126 (4,7%) 898 (0,6%)* Figura 10 – Estudos caso-controle de prevalência de LPO em pacientes com VHC l. * dado da população geral; n=número de pacientes estudados; %=porcentagem

Estudando 600 pacientes do sul da Itália com líquen plano oral (390 mulheres

e 210 homens, com idade media de 52,6 anos) Mignogna et al., (2002) comparou os

aspectos epidemiológicos da infecção pelo VHC com prevalência de VHC na

população em geral, associados ao líquen plano. E todos os casos de lesões

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liquenóides foram biopsiados para confirmação de diagnóstico. Dos 600 pacientes

com LPO, 169 foram testados com ELISA II para reação de anti-VHC e 165 com

RIBA. 25,5% dos pacientes foram positivos para o VHC. Analisando os grupos por

idades, a prevalência foi de 0,0% (0/3) em jovens com menos de 30 anos, 4.6

%(3/65) no grupo de 30-39 anos, 12,5 % (15/120) no grupo de 40-49 anos,

27,5%(55/200) no grupo de 50-59 anos e 43,3% (92/212) no grupo acima de 60

anos. Os autores sugerem que dados epidemiológicos, quando comparados, sejam

feitos considerando-se a idade e o comportamento clinico do líquen plano diante do

tratamento ou não com interferon. Concluíram que os relatos que evidenciam

associações entre líquen plano e VHC podem, possivelmente, conter alguns erros

nos procedimentos de análise, podendo levar a resultados incorretos: (1) grupo

controle sem análise de idade específica e predomínio de anti-VHC positivo; (2)

incapacidade de prever dados em relação ao real predomínio de VHC vírus na

população geral. Os autores também sugerem que mais estudos epidemiológicos de

outros países são necessários, analisando a prevalência de infecção pelo VHC em

torno da idade prevalente especifica, comparando com a real idade da população

em geral, incluindo jovens e idosos (MIGNOGNA et al., 2002).

Mas não só os aspectos epidemiológicos da associação entre o LPO e o VHC

foram estudados. Os autores também se propuseram a determinar a diferença

clínica (características e comportamento) entre o LPO em pacientes positivos e

negativos para o VHC. Os autores evidenciaram Em ambos os grupos, a prevalência

de LPO na forma mista (lesões em placa–reticular e atrófico–erosivo) foi semelhante.

A forma reticular foi mais freqüente em pacientes VHC positivos, as lesões em placa

foram mais prevalentes em pacientes VHC negativos e não houve diferenças

significativas entre as lesões erosivas e lesões atróficas. Com esses dados os

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Page 30: HEPATITE C SUAS MANIFESTAÇÕES EXTRA … · Este texto é produto de parte de Monografia de conclusão de Curso de ... enzimas hepáticas (FOCACCIA et al., 1997, AYUB 2000). A probabilidade

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autores concluíram Concluindo que há diferenças significantes entre LPO entre

pacientes VHC positivos e negativos, na forma reticular e de placa, e que estes

achados reforçam a necessidade de examinar o fígado de todos os pacientes com

LPO (MIGNOGNA et al., 2000).

Em 1998, Mignogna et al., se dispuseram a determinar a positividade para

anticorpos anti-VHC em 263 pacientes com líquen plano oral e em um grupo controle

de 100 pessoas. A prevalência de anticorpos anti-VHC no grupo de pacientes com

líquen plano oral, foi maior do que na população sadia (controle), sugerindo uma

ligação entre as 2 doenças (MIGNOGNA et al., 1998).

Parece haver diferenças geográficas com relação à coexistência de hepatite

C e líquen plano oral. Os trabalhos que mostram associação entre essas duas

doenças são particularmente vistos no Japão e certos paises europeus como Itália,

Espanha e França. É possível que essa diferença geográfica seja devido a um tipo

particular de genótipo do VHC, já que há distribuição geográfica heterogênea do

LPO (CUNHA et al., 2002).

Considerando o grande potencial patogênico do vírus VHC com possível

envolvimento dermatológico, e provável associação entre vasculite cutânea

necrosante com crioglobulemia mista, porfíria cutânea tardia, líquen plano e infecção

crônica pelo VHC, todos os pacientes com estas desordens devem ser testados para

hepatite C e, em todos os casos de hepatite C, deve-se investigar sinais e sintomas

de doenças dermatológicas (POLJACKI et al., 2000).

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