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GRUPO DE TRABALHO 3
MÍDIA E POLÍTICA.
ONDE ESTÁ A POLÍTICA? JORNAIS POPULARES
E A ELEIÇÃO DE 2008 NO RIO DE JANEIRO
Felipe Borba
Gabriel Mendes
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ONDE ESTÁ A POLÍTICA? JORNAIS POPULARES E A ELEIÇÃO DE 2008 NO RIO DE
JANEIRO
Felipe Borba1
Gabriel Mendes2
Resumo:
Este artigo tem por objetivo analisar como os diários cariocas O Dia e Extra cobriram as eleições
municipais do Rio de Janeiro em 2008. Usando dados obtidos com a metodologia desenvolvida pelo
Laboratório de Opinião Pública do Iuperj (Doxa), a análise foca a verificação do espaço concedido
à política e aos candidatos individualmente, observando o formato das matérias, a agenda proposta e
os enquadramentos fornecidos pelos veículos. O trabalho busca fazer ainda uma análise da
cobertura dos jornais levando em consideração a visibilidade cada candidato e a valência desse
noticiário. Os resultados apontam para dois achados importantes. O primeiro é o pouco espaço
concedido ao tema política nos jornais populares. O segundo é a atenção especial que alguns
candidatos recebem por parte dos veículos, como no caso de Eduardo Paes no jornal O Dia.
1.Introdução
A campanha eleitoral é o momento privilegiado da relação entre os cidadãos e a política. É a
hora em que as diferentes opções prestam contas sobre seus atos, informam seus planos de governo
e divulgam que medidas pretendem impulsionar. Neste processo, a mídia jornalística destaca-se por
ser um dos principais veículos de divulgação de informações eleitorais. Inúmeras pesquisas já se
dedicaram a pesquisar o comportamento da grande imprensa brasileira durante as campanhas
políticas. Os principais achados apontam para um enviesamento da cobertura eleitoral em favor de
candidaturas e partidos alinhados aos interesses políticos e econômicos dos grupos de mídia. A
interferência ocorreria em função dos critérios de noticiabilidade que terminam por beneficiar
determinadas candidaturas em detrimento de outras, seja por meio da visibilidade conferida aos
competidores ou por meio da valência atribuída a cada matéria (Aldé, 2003; Dias, 1995; Oliveira e
Camargos, 2000; Rodrigues, 2002; Aldé, Figueiredo e Mendes, 2007; Borba, 2008). Além disso, a
mídia influencia o processo eleitoral ao concentrar o debate político em torno de alguns temas que
passam a configurar a agenda da campanha. Por conseqüência, os eleitores acabam votando no
partido que identificam como o mais apropriado para resolver o problema (Kleinnijenhuis e Ridder,
1998; Porto, 2004).
1 Felipe Borba é doutorando em Ciência Política (Iuperj), bolsista CNPq e pesquisador associado do Doxa-Iuperj. 2 Gabriel Mendes é doutorando em Ciência Política (Iuperj) e pesquisador associado do Doxa-Iuperj
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Em termos gerais, esses trabalhos têm como objeto os jornais tradicionais da grande
imprensa. Poucas pesquisas, porém, ocupam-se em investigar o papel dos jornais populares na
cobertura do processo eleitoral. Uma das poucas exceções é o trabalho de Aldé e colegas (2004)
sobre a eleição municipal do Rio de Janeiro em 2004, na qual ficou constatada uma diferença de
conteúdo na cobertura oferecida pelos jornais O Dia e O Globo, em decorrência das características
sociais dos seus respectivos leitores. A importância de estudar este segmento específico da mídia
jornalística decorre do alto grau de penetração que estes jornais têm sobre as classes média e média
baixa da sociedade. Embora o público situado nestas faixas de renda não possa ser considerado
como o público formador de opinião3, ele constitui, por outro lado, parte estratégica dos núcleos de
campanha por formarem a camada mais numerosa do eleitorado nacional, que invariavelmente
decide o destino de uma eleição. A análise da cobertura dos jornais populares justifica-se, portanto,
pelas implicações diretas que os critérios de noticiabilidade podem exercer sobre o resultado das
eleições.
O foco do presente trabalho incide sobre os padrões de comportamento dos diários
populares O Dia e Extra durante a cobertura das eleições municipais de 2008 no Rio de Janeiro. A
eleição carioca deste ano caracterizou-se por colocar em xeque os padrões políticos da cidade.
Desde 1993, o grupo liderado por Cesar Maia (DEM) comandava a administração municipal.
Mesmo tendo rompido, em 1999, com Luiz Paulo Conde, que o sucedeu em 1996, Cesar voltou a
mostrar força nos anos seguintes. Nas eleições de 2000, derrotou o seu ex-aliado e retornou à
prefeitura, para onde seria reeleito em 2004, permanecendo no cargo até 2008. Nos seus últimos
anos, a avaliação de seu governo entrou em declínio acentuado. Sua administração, considerada
pela população como modelo nos anos 1990, já não encontrava apoio significativo na sociedade e
nos jornais cariocas. Pesquisa Datafolha, aferida em julho de 2008, atribuía a Cesar apenas 25% de
ótimo/bom, contra 43% de ruim/péssimo. As críticas recaíam, sobretudo, sobre o crescimento
desenfreado das favelas, a desordem urbana e o péssimo serviço de saúde, além das críticas ao
“sumiço” do prefeito, acusado de se ocupar mais da confecção do seu blog político do que das
tarefas do dia a dia da cidade.
Neste cenário, o mote da campanha haveria de ser a mudança. Com efeito, a candidata
apontada como sucessora pelo prefeito, a deputada Solange Amaral, do DEM, jamais se mostrou
competitiva, a ponto de figurar entre os primeiros colocados nas pesquisas de intenção de voto. A
disputa acabou por consagrar como competitivos os candidatos que se posicionavam como de
ruptura e oposição ao governo Cesar Maia, mas somente Eduardo Paes, do PMDB, e Fernando
3 Para uma discussão detalhada sobre o papel e a importância dos líderes de opinião, ver Larszerfeld et al (1948)
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Gabeira, do PV, reuniram apoio suficiente para chegar ao segundo turno. Os dois partiram de
índices relativamente baixos de intenções de voto (10% Paes e 9% Gabeira), em março, para
patamares acima dos 20% em outubro, deixando Marcelo Crivella (PRB), Jandira Feghali (PC do
B), Alessandro Molon (PT), Chico Alencar (PSOL) e Paulo Ramos (PDT) para trás.. Na segunda
fase da campanha, a disputa pelo voto foi ainda mais acirrada. Os eleitores ficaram praticamente
divididos até o dia da votação, que terminou com um resultado favorável, mas apertado, de 50,83%
para o peemedebista, contra 49,17% para o candidato do PV.
Durante o período eleitoral, entre julho e outubro de 2008, foi realizado o acompanhamento
diário dos dois principais jornais populares da cidade, O Dia e Extra, cuja circulação atinge
principalmente os bairros menos abastados da cidade, situados nas zonas periféricas do Rio – onde a
votação de Paes foi maior do que a de Gabeira. Através da aplicação da metodologia desenvolvida
pelo Laboratório de Pesquisa em Opinião Pública do Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de
Janeiro (Doxa/Iuperj), a análise consistiu em verificar duas questões principais: o espaço dedicado à
política nestes dois jornais, observando os temas das matérias, a agenda proposta e os
enquadramentos, assim como a distribuição da cobertura jornalística entre os candidatos mais
competitivos, os critérios de visibilidade e valência. Acreditamos que com a análise deste grupo de
questões foi possível descortinar a dinâmica da cobertura, identificando pontos de contato e ruptura
entre os jornais, assim como possíveis tendências de favorecimento a determinadas candidaturas em
detrimento de outras.
2.Metodologia
A metodologia utilizada no artigo proposto vem sendo desenvolvida pelo Doxa desde as
eleições de 2000, e foi aplicada e refinada nos pleitos majoritários subseqüentes. Seu objetivo é
quantificar, qualificar e comparar as notícias e imagens publicadas sobre cada candidato. A
quantificação, ao longo de grandes períodos e com a possibilidade de comparar os jornais entre si e
com os bancos de dados das eleições passadas, nos permite a identificação de tendências,
convergências e discrepâncias no comportamento editorial dos veículos – sempre considerando a
conjuntura política específica de cada eleição.
O material classificado supera em muito nossa possibilidade de apresentá-lo aqui, obrigando-
nos a um recorte inicial e à sugestão de possibilidades futuras de pesquisa. É neste sentido que
apresentamos as categorias de análise completas, embora a descrição dos resultados se limite à
visibilidade e valência (por jornal, e também subdivididos nas partes de opinião e informação), além
do espaço oferecido ao tema política nos jornais pesquisados.
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A planilha de coleta de dados, aplicada ao conteúdo diário de quatro jornais pela equipe do
Doxa, consiste em:
1. Identificação de cada entrada por data e jornal, e classificação das matérias de acordo com
o número da página, o formato4 e posicionamento
5, elementos que permitem avaliar o destaque
recebido pelo assunto eleitoral e por cada candidato6.
2. Tema: permite identificar a agenda eleitoral, contribuindo para a compreensão do contexto
em que aparecem os nomes dos candidatos.
3. Enquadramentos adotados pelos jornais, classificados em corrida de cavalos (pesquisas de
intenção de voto, análises de posicionamento, possibilidades etc); personalista (perfil,
personalidade, trajetória pessoal), temático (tratamento substantivo dos assuntos) e episódico
(dedicado ao acontecimento, fato, agenda etc)7.
4. Visibilidade: número de aparições do nome de todos os candidatos em cada matéria.
Permite verificar o volume da cobertura para cada candidato ao longo do período8.
5. Valência da matéria, se positiva, negativa ou neutra para cada candidatura. Dado o grau de
subjetividade possível na análise de valência, e a polêmica que tal mensuração desperta no meio
jornalístico, convém detalhar os critérios desenvolvidos para minimizar a discrepância na aplicação
da categoria por diferentes analistas.
Procurando contornar a dificuldade de avaliar a presença de intenção ou viés em cada peça
jornalística, o que daria margem a uma variedade de interpretações subjetivas, optamos por verificar
se a informação ou opinião veiculada, em si, é positiva ou negativa para o candidato, independente
do propósito de prejudicar um ou outro. Assim, por exemplo, a publicação de pesquisa de intenção
de voto, que em si não constitui um posicionamento por parte do jornal, será classificada como
negativa ou positiva para um candidato de acordo com o resultado para sua candidatura. A
possibilidade que temos de avaliar o posicionamento político dos jornais se dá quando verificamos
comportamentos diferentes ao longo do tempo – o que significa que, dada a mesma realidade ou
agenda, cada veículo escolhe dar mais ou menos espaço para diferentes acontecimentos, assuntos e
4 Reportagem; Artigo assinado; Editorial; Coluna assinada; Charge / foto / infográfico; Chamada de primeira página;
Nota de coluna; Chamada. 5 Página inteira Metade superior; Metade inferior; Quadrante superior direito; Quadrante superior esquerdo; Quadrante
inferior direito; Quadrante inferior esquerdo. 6 Em Camargos (2000), encontramos a sugestão de um índice de importância da matéria para o jornal, agregando como
indicadores chamada de primeira página, número da página e posicionamento. 7 Este tratamento quantitativo e simplificado dos tipos de enquadramento não esgota a análise, permitindo a
identificação de outros níveis de enquadramento ao longo da pesquisa. 8 Não incluímos as referências aos candidatos como presidente, prefeito, governador, senador etc, partindo da premissa
de que seu uso se equivale entre os candidatos. Incluímos os apelidos humorísticos que os candidatos eventualmente
podem receber por considerarmos que geralmente aparecem em contextos irônicos, expressando posicionamento
político dos jornalistas ou editores.
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atores políticos, e avaliar estes assuntos mais ou menos criticamente. Também é possível analisar
diferenças no tratamento dado aos candidatos através do conteúdo temático e do enquadramento
dado às notícias. Nestes casos, não é a realidade que se impõe sobre uma imprensa vista como
especular, que a reproduz de forma transparente, mas as preferências das empresas, editores e
jornalistas – ao selecionar e enquadrar as notícias, eles interpretam o mundo político para os
leitores.
Têm valência positiva matérias sobre ou com o candidato reproduzindo programa de governo;
promessas; declarações do candidato ou do autor da matéria ou de terceiros (pessoas ou entidades)
favoráveis (contendo avaliação de ordem moral, política ou pessoal) ao candidato; reprodução de
ataques do candidato a concorrentes, resultados de pesquisas ou comentários favoráveis. Têm
valência negativa matérias reproduzindo ressalvas, críticas ou ataques (contendo avaliação de
ordem moral, política ou pessoal) do autor da matéria, de candidatos concorrentes ou de terceiros a
algum candidato; resultados de pesquisas ou comentários desfavoráveis. São consideradas neutras
as matérias sobre a agenda do candidato, matéria sobre ou citação de candidato sem avaliação
moral, política ou pessoal do candidato, do autor da matéria ou de terceiros, inclusive de
concorrentes. Em caso de equilíbrio entre negativo e positivo, a matéria é considerada neutra.
Também levamos em conta, na avaliação da valência da matéria, que elementos editoriais como
título, olhos e legenda contém indicações sobre sua orientação, e devem ser considerados no
momento da análise.
A totalização parcial se deu a cada quinzena, com resultados de visibilidade e valência
publicados on-line na página do Doxa, uma vez que um dos objetivos da pesquisa é a divulgação ao
longo do próprio processo eleitoral, permitindo ampliar o debate sobre a qualidade da informação
eleitoral disponível para o cidadão9.
3. O perfil dos jornais O Dia e Extra
Para ser desenvolvida uma análise mais sistemática da cobertura da imprensa, constitui
importante acréscimo de informação a apresentação dos dados sobre o perfil dos jornais estudados,
ou seja, os dados sobre venda, distribuição e características sociais do público leitor (Oliveira e
Camargos, 2000). Antes disso, porém, é preciso refrescar a memória a respeito da origem e história
desses dois diários cariocas. O Dia, fundado em 1951, constituiu o primeiro jornal voltado
exclusivamente para a classe C. Se no início apostava em notícias sensacionalistas, a ponto de ser
9 Ao menos o que lê jornal, um público restrito cuja influência política é, contudo, relevante, pois são considerados
circuladores qualificados de informação e enquadramentos.
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conhecido como um jornal que jorrava sangue caso expremido, no início dos anos de 1990 houve
inversão de sua produção editorial, que assumiu conteúdo direcionado para classe média, focado
especialmente no jornalismo de serviço. O sucesso de vendas alcançado pelo O Dia foi tão grande
que passou a ameaçar as vendas do Globo nas camadas A e B. Como retaliação, o grupo
empresarial Infoglobo lançou, em 1998, o jornal Extra como concorrente direto do Dia. Nascia
assim a rivalidade entre os dois jornais.
A tabela abaixo demonstra com O Dia e o Extra apresentam um perfil semelhante,
concentrando suas vendas entre os eleitores de classe média e média baixa, situados nas regiões
periféricas da cidade, sobretudo as mais afastadas da Zona Sul carioca, região com os maiores
índices de desenvolvimento humano e econômico. A diferença fica por conta dos números relativos
à circulação dos jornais, segundo medição do Instituto Verificador de Circulação (IVC), no qual o
Extra supera de maneira significativa os números referentes ao seu adversário, com uma tiragem
100% superior, tanto nos dias úteis quanto aos domingos. A tabela abaixo apresenta também os
dados relativos ao jornal O Globo, de caráter “intelectual”, como forma de fazer um contraponto.
Tabela 1: O Perfil dos Jornais O Dia e Extra
Os Jornais
Média de Jornais Classe Social Região
Dias Úteis Domingos A B C DE Zona Sul Zona Norte Zona Oeste Leopoldina Central Baixada Outros
O Globo 277.329 389.032 27 49 22 2 36 11 10 9 14 5 15
Extra 198.762 360.806 4 30 57 9 5 5 23 15 21 19 12
O Dia 89.238 142.009 7 38 47 7 10 11 22 16 16 18 8
Fonte: IVC e Marplan – Segundo Semestre de 2008
Os dados apresentados acima demonstram o caráter classe B e C dos jornais estudados,
sobretudo se o perfil dos seus leitores for comparado ao perfil dos leitores do jornal O Globo.
Enquanto O Dia e o Extra vendem apenas 7% e 4% dos seus jornais para a classe A, O Globo
concentra 27% do seu público nesta faixa social. Com efeito, é nas classes B e C, em especial nesta
última, que encontramos a maior parte dos leitores dos jornais populares. O diário Extra, por
exemplo, concentra 57% de suas vendas na chamada classe C. Os dados de venda por região
corroboram os dados anunciados por classificação social. As zonas Oeste, Central, Leopoldina e
Baixada Fluminense, que na geografia do Rio de Janeiro correspondem às áreas de menores índices
8
sociais e humanos, são as que concentram as maiores vendas dos jornais de cunho popular.
Infelizmente, não temos o recorte por educação relativo aos leitores do jornal O Dia, mas no seu
concorrente fica claro o caráter de “classe” desses jornais, ao verificarmos que apenas 12% do
público leitor do Extra possuem curso superior, contra 55% do público leitor do Globo. Com efeito,
o público leitor do Extra é majoritariamente composto por leitores com apenas o primeiro o
segundo graus, 45% e 43%, respectivamente.
Os dados acima atestam a importância e influência que estes jornais possuem diante das
camadas médias da sociedade carioca. Entender o comportamento da cobertura eleitoral desses
jornais e suas implicações constitui tarefa essências se tivermos a pretensão de entendermos melhor
como ocorrem eleições no Brasil.
4. A Política nos Jornais
Os jornais de circulação nacional caracterizam-se por garantir amplo espaço dedicado ao
tema política em suas páginas, sobretudo quando se aproximam as eleições, momento em que são
lançados os cadernos especiais (Aldé, 2002). Os jornais populares, por sua vez, destacam-se pela
escassez de notícias que abordam o tema, mesmo no momento eleitoral, quando o interesse pelo
assunto aumenta até mesmo nas camadas mais pobres da sociedade. A análise realizada revelou que
tanto O Dia quanto o Extra parecem não se importar muito em relatar o que acontece nas eleições,
ao oferecerem uma cobertura rala, pobre em conteúdo, significativamente menos densa e menos
preocupada, se comparada aos jornais considerados “intelectuais”. Em ambos os jornais, mesmo
durante o processo eleitoral, a política não alcançou um espaço exclusivo ou destacado, aparecendo
secundariamente na seção conhecida como Geral, em evidência muito inferior ao noticiário relativo
à questão policial.
Nas seis quinzenas que antecederam a eleição, , entre julho e outubro do ano eleitoral, o
levantamento indicou que as informações sobre a disputa foram de certa forma raras, ausentes em
determinados dias, circunscritas principalmente a notas de coluna social, reportagens de pouca
profundidade, em charges e em fotografias, sendo praticamente ausente em chamadas de primeira
página, artigos de opinião e editoriais. A análise revelou, contudo, haver uma diferença significativa
entre os dois jornais pesquisados. O Dia destacou-se como um jornal aparentemente mais
interessado em investir no assunto, ao ter uma cobertura mais volumosa e densa, sobretudo em
relação ao número de matérias10
. No período analisado, entre julho e o início de outubro, O Dia
10 Vale lembrar que consideramos como matéria todo tipo de entrada, seja coluna em nota social, charges, reportagens
ou chamadas de primeira página.
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publicou o total de 1005 matérias sobre as eleições, enquanto que o Extra publicou apenas 317. Em
média, esses números significam que O Dia publicava 13.4 matérias por dia, ao passo que seu
concorrente publicava somente 3.3 matérias diárias.
Tabela 2: Número de Matérias Publicadas nos Jornais O Dia e Extra
1-15/Jul 16-31/Jul 1-15/Ago 16-31/Ago 1-15/Set 16/Set-5/Out
Os Jornais Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia
Total de Matérias 37 61 59 168 38 170 54 212 35 124 94 270
Média diária 2.5 4 3.7 10.5 2.5 11.3 3.4 13.3 2.4 8.2 4.7 13.5
Fonte: Banco de Dados do Doxa
A tabela 2 acima demonstra que houve pouca variação na evolução da cobertura eleitoral.
Mesmo com a aproximação das eleições, o Extra insistiu em publicar um jornal ralo, pouco atento
ao assunto eleitoral, como se ele não existisse ou não fosse importante. A média de publicações
cresce ligeiramente no último mês de campanha, mesmo assim este crescimento é tímido, não se
caracterizando como uma inversão nos padrões observados nos meses anteriores. O diário O Dia,
por seu turno, cresce paulatinamente ao longo da disputa, iniciando o período eleitoral com uma
média de quatro matérias por dia até alcançar um numero relativamente significativo, mas mesmo
assim pequeno se comparado aos jornais de grande porte, autores de cadernos especiais. Em toda a
sua evolução, apenas na primeira quinzena relativa ao mês de setembro podemos observar uma
redução no volume de matérias em relação ao período anterior, mas que logo retoma sua tendência
de crescimento. A diferença na quantidade de matérias, no entanto, salta aos olhos. Pode se
observar que, em cada quinzena, O Dia chega a publicar quase que o triplo de matérias do que seu
concorrente. Uma possível explicação para este fato pode ser a tentativa que o que este jornal vem
fazendo em se tornar um jornal também voltado para a classe A, como sinalizou nos seus últimos
anos.
A qualidade da cobertura nos dois jornais confirma que o assunto eleitoral não constitui um
tema de interesse. A maior parte das notícias relativas à campanha municipal aparece em notas de
colunas e em imagens retratadas em fotos e charges. Apenas como terceira principal fonte de
informação aparecem as reportagens clássicas. Artigos assinados, editoriais e colunas de articulistas
praticamente ignoram a competição política, assim como também são raras as chamadas em
primeira página. Novamente, O Dia distingue-se por dar maior visibilidade ao processo eleitoral em
reportagens, ainda que estas não tenham o mesmo destaque que os outros tipos de matéria noticiosa
10
apresentam. O levantamento indicou que, nos dois jornais, as notas de coluna são o principal modo
de informação das notícias eleitorais, percentual que atinge 47% no Extra e 34% no Dia. As charges
e fotos vêm logo a seguir, abarcando o total de 26% no Extra e 36% no Dia. Por último, aparecem
as reportagens, com 20% no Extra e 26% no Dia.
Tabela 3: Tipo de Matérias Publicadas os Jornais O Dia e Extra
Formato 1-15/Jul 16-31/Jul 1-15/Ago 16-31/Ago 1-15/Set 16/Set-5/Out
Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia
Reportagem 4 19 22 78 8 31 5 40 6 24 19 69
Artigo 0 1 0 1 0 0 0 1 0 1 1 1
Editorial 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 1 0
Coluna Assinada 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 1 1
Charge/Foto 8 26 22 62 5 61 17 73 6 48 23 86
1° Página 0 2 14 3 0 3 1 5 1 5 3 15
Nota de Coluna 25 12 0 23 25 75 30 93 22 46 46 98
Total 37 61 59 168 38 170 54 212 35 124 94 270
Fonte: Banco de Dados do Doxa
A tabela acima apresenta a distribuição das frequências por tipos de matéria segundo a
metodologia desenvolvida pela equipe do Doxa. Como se vê, o padrão é relativamente estável ao
longo da campanha. Há um ligeiro aumento no número de reportagens no jornal O Dia que, como
observamos acima, oscila entre um padrão noticioso situado entre o público classe A e o público
classe B e C. O Extra, por sua vez, mantém praticamente intacta sua maneira de informar o público,
recorrendo a informações curtas e rápidas, de apelo visual, sem conteúdo ou debate, de fácil
assimilação por parte do público que lê seu jornal. Não há, por parte deste veículo, qualquer
tentativa de conduzir o assunto “política” para o centro do debate, a característica marcante é
realmente apenas a de relatar o fato em si.
Esta percepção fica ainda mais evidente quando analisamos o tipo de enquadramento que os
jornais oferecem. Seguindo a tipologia proposta por Mauro Porto (2004), é possível observar que o
enquadramento majoritário em ambos os jornais é o episódico, aquele que se limita a relatar os fatos
que marcaram o dia anterior, a agenda dos candidatos, os locais em que fizeram campanha, as
lideranças que vão encontrar e assim por diante. Nos dois jornais, o percentual referente ao
enquadramento episódico é praticamente idêntico, sendo 75% no Dia e 73% no Extra. O
enquadramento temático, aquele que por definição é o que engrandece o processo democrático ao
estimular o debate entre os candidatos sobre questões que teoricamente influenciam o bem estar da
população, como saúde, educação e segurança pública, assuntos que deveriam por consequência
11
despertar maiores interesses na população, ocupa lugar completamente secundário na cobertura feita
pelos jornais, apresentando percentuais de 14% e 17%, no Dia e Extra respectivamente.
Curioso também é o fato de o enquadramento personalista ocupar espaço despretensioso na
cobertura oferecida. Se é verdade que vivemos atualmente a era da política centrada no candidato,
como supõe Wattenberg (1991), seria natural que os jornais focassem na figura dos candidatos, suas
aptidões e defeitos, preparo e competência, fatos de sua biografia política e pessoal que os
habilitassem a ocupar cargos públicos importantes, como é a prefeitura do Rio. Apesar da
importância da personalidade do candidato na hora da decisão eleitoral, os jornais populares sob
análise rejeitaram cobrir este tipo de informação, relegando o enquadramento personalista para o
último plano. No Extra, apenas 2% da cobertura eleitoral foi dedicada a este enfoque durante toda a
campanha, ao passo que no Dia o percentual foi levemente superior, 5%.
Tabela 4: Enquadramento das Matérias no Dia e no Extra
Enquadramento
1-15/Jul 16-31/Jul 1-15/Ago 16-31/Ago 1-15/Set 16-5/Out
Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia Extra O Dia
Corrida de Cavalos 1 7 3 9 1 10 9 7 4 10 8 19
Personalista 2 2 0 24 0 0 0 4 0 2 4 15
Temático 7 8 34 11 7 45 0 29 1 18 4 28
Episódico 27 44 22 124 30 115 45 172 30 94 78 208
Total 37 61 59 168 38 170 54 212 35 124 94 270
Fonte: Banco de Dados do Doxa
A tabela acima, com a frequência relativa de cada tipo de enquadramento por quinzena
analisada, demonstra como evoluiu a cobertura da campanha. Percebe-se que, neste caso, não há
diferenças significativas entre os dois jornais analisados, tendo os dois padrão altamente
semelhante. Diante destes fatos, podemos concluir que os jornais populares no Rio de Janeiro, ao
menos no âmbito da campanha municipal, decidiram por realizar uma cobertura eleitoral rala e
rasteira, de pouco interesse, focada em notícias curtas e com forte apelo nas imagens, sobretudo na
presença de charges humorísticas. Cumpre agora analisar como se deu o direcionamento da
cobertura eleitoral em relação aos candidatos, analisar se houve algum tipo de direcionamento que
pudesse beneficiar um candidato em detrimento de outro, investigar se houve, portanto, alguns tipo
de beneficiamento que pudesse influenciar o resultado da eleição, mesmo neste universo de relativa
ausência de notícias sobre a campanha e seus candidatos.
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5. Visibilidade e Valência
5.1 A cobertura da eleição municipal no jornal Extra11
Como já foi afirmado, o espaço oferecido às eleições municipais por parte dos jornais
populares é significativamente reduzido se comparado com a mídia impressa tradicional. No caso
do jornal Extra, isso fica evidente quando observamos a cobertura eleitoral no segundo semestre do
ano de 2008, que é quando a campanha tem a sua maior visibilidade dentro da sociedade. Durante
toda a segunda metade do ano, o total de menções pra cada candidato por quinzena não chega a 50,
mesmo no caso de Marcello Crivella, que é o candidato com maior visibilidade durante o primeiro
turno. O candidato do PRB teve seu nome mencionado numa faixa de 11 a 21 peças jornalísticas
nessas quinzenas, o que, no caso extremo, daria um pouco mais de uma referência diária.
A ligeira exceção fica por conta da última quinzena do primeiro turno, quando os principais
candidatos tiveram um pouco mais de visibilidade. Ainda sim, nada comparável aos grandes jornais.
O líder nas pesquisas, Eduardo Paes (33% nas intenções de voto), por exemplo, teve, nesse período,
77 menções ao seu nome – a maior visibilidade de um candidato no jornal até então. Ele é
acompanhado por Marcelo Crivella (19% nas intenções de voto), que teve 70 menções ao seu nome
nas páginas do Extra, Fernando Gabeira (20% nas pesquisas) com 62 referências e Jandira Feghali
(13% nas intenções de voto) e 53 menções ao seu nome no jornal. A atenção dedicada a esses 3
últimos candidatos deve-se ao fato de eles chegarem ao dia da eleição brigando entre si para ver
quem iria disputar o segundo turno com Eduardo Paes.
11 A pesquisa do Doxa foi realizada com o corte temporal de quinzenas a partir de 01/07. Além disso, ao longo da
apresentação dos resultados, são feitas considerações acerca das menções aos nomes dos candidatos – que é quantas
vezes o nome próprio do candidato é citado – e acerca das peças jornalísticas onde os nomes são citados – que verifica
em quantas partes do jornal o nome do candidato é citado pelo menos uma vez.
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Gráfico 1: Visibilidade dos candidatos à prefeitura por quinzena no Jornal Extra
0
10
20
30
40
50
60
70
80
01/07 a 15/07 16/07 a 31/07 01/08 a 15/08 16/08 a 31/08 01/09 a 15/09 16/09 a 05/10
Chico Solange Molon Gabeira Jandira Crivella
O que constatamos ao observar os dados mencionados acima é que o jornal Extra só dá
visibilidade alta aos candidatos a prefeito na última quinzena de setembro – aquela que cobre de
16/09 até 5 /10 – dia da eleição. É notável a diferença do volume de cobertura da penúltima para
essa que é a última quinzena do primeiro turno da eleição. Eduardo Paes sai de 22 menções entre
01/09 e 15/09 para 77 referências no período final do pleito. O mesmo crescimento do espaço nas
páginas de jornal conquista Crivella que parte de 26 para 70 referências no mesmo período.
Gabeira, que iria ao segundo turno contra Paes, sai de impressionantes 9 menções na penúltima
quinzena da eleição para 62 no momento final.
5.1.2 Eduardo Paes
O noticiário do jornal Extra para o candidato do PMDB é predominantemente neutro,
mantendo-se numa média de 40% de noticiário dessa natureza e chegando a ter picos de 75% de
noticiário sem valência. Tal afirmação significa que o periódico, além de oferecer a eleição como
um todo pouco espaço em suas páginas, tem postura pouco engajada em relação ao candidato, seja
com tom crítico ou elogioso.
A cobertura sobre o candidato que seria o futuro prefeito da cidade do Rio de Janeiro
começa o mês de julho com um significativo índice de noticiário positivo (42%) e uma baixíssima
taxa de negativo (8%). Contudo, no caso da valência positiva, tratam-se de apenas 5 matérias o que
para quinze dias de análise é muito pouco e insuficiente para apontarmos uma tendência mais
imparcial do jornal. O noticiário neutro é o predominante com podemos ver no gráfico abaixo:
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Gráfico 2: Valência do Candidato Eduardo Paes – Jornal Extra
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Positivo Negativo Neutro Equilibrado
Nesse período, o espaço para noticiário positivo para Paes deve-se, por exemplo, à escolha
que o jornal fez de estampar propostas de campanha do candidato em suas páginas. Paes pôde, por
exemplo, ver no Extra seu programa para Educação considerado quando afirmou que acabaria com
a aprovação automática nas escolas municipais. Outro espaço positivo para Paes encontrado no
jornal é a menção ao sucesso de sua estratégia de campanha nas ruas – que leva o candidato a um
crescimento constante nas pesquisas de opinião – e aos seus atributos administrativos. Isso é
evidente quando o jornal afirma que Paes conhece bem a prefeitura por já ter mandado emissários
para conversar com técnicos e secretários do governo municipal.
Com o desenvolver da campanha nas páginas do jornal, o noticiário sobre a candidatura
Paes continua majoritariamente neutro. No entanto, logo na segunda quinzena de julho, o candidato
do PMDB vê um sutil incremento do seu noticiário negativo e a perda de espaço do seu noticiário
positivo. Sua valência negativa sai de 8% na quinzena anterior para 27%, enquanto o positivo cai de
42% para 27%. Tal inflexão convergente nos gráficos é causada a notícias que saíram no Extra
sobre pedidos de impugnação contra sua candidatura, sobre militantes do PMDB fazendo protestos
contra Paes e sobre o apoio que um candidato coligado ao partido do futuro prefeito dava ao
candidato Marcelo Crivella.
Na segunda quinzena de agosto, a taxa de noticiário positivo de Paes volta ao patamar dos
40%. O candidato salta de 1 matéria positiva na quinzena anterior para 10 no período que vai de
15/08 a 31/08. Esse alto índice de positivo deve-se a sua rota ascendente nas pesquisas de intenção
de voto. No meio da faixa de tempo observada, Paes assume o segundo lugar nas pesquisas ficando
com de 12% a 17% das intenções de voto, dependendo do Instituto que faz a pesquisa. No último
dia da quinzena, Paes chega a 19% e empata tecnicamente com Crivella – que à época tinha 24%.
15
Na última quinzena do primeiro turno, Paes mantém o patamar de 40%. Esse é o único
momento em todo o período observado pela pesquisa em que seu noticiário positivo supera o
neutro. São 18 peças jornalísticas positivas em 20 dias. É pouco se comparado ao Globo12
, por
exemplo, mas é a maior visibilidade de um candidato até então. Esse aumento do noticiário positivo
em relação ao neutro deve-se ao fato de Paes chegar no dia 5/10 com o primeiro lugar consolidado
nas pesquisas e a ida ao segundo turno praticamente garantida.
5.1.3 Fernando Gabeira
Se as menções ao líder Eduardo Paes já são reduzidas, as referências ao candidato do PV são
ainda em menor quantidade. As peças sobre Gabeira ficam entre 6,7 e 10 menções ao candidato por
quinzena, o que dá uma média de menos de uma referência por dia. O noticiário sobre Gabeira é
predominantemente neutro. Sua taxa de valência positiva mantém-se num patamar estável de 30%,
a não ser por uma queda acentuada na segunda quinzena de agosto e primeira de setembro. Essa é a
inflexão que mais chama a atenção na escassa cobertura oferecida ao candidato que iria ao disputar
o segundo turno contra Eduardo Paes. No período mencionado, Gabeira vê em paralelo à queda do
noticiário positivo um incremento fortíssimo no negativo. Na primeira quinzena de setembro,
Gabeira tem 5 peças negativa num total de 6 na quinzena, acarretando 83% de negativo para ele.
Gráfico 3: Valência do Candidato Fernando Gabeira – Jornal Extra
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Positivo Negativo Neutro Equilibrado
Como os números absolutos são baixos, esses tom aparentemente crítico do jornal deve ser
considerado de perto. O noticiário negativo de Fernando Gabeira nesse período deveu-se ao seu
fracasso num teste sobre a realidade dos servidores municipais que o jornal submeteu aos
12 O Jornal O Globo também foi observado pela pesquisa do Doxa/Iuperj
16
candidatos. Como o candidato verde teve desempenho fraco nessa tarefa proposta pelo Extra, isso
foi suficiente para puxar a valência negativa do candidato para cima.
5.1.4 Marcelo Crivella
Também no caso de Marcelo Crivella, a predominância é o do noticiário neutro. Nas duas
primeiras quinzenas da pesquisa, a cobertura sem valência chega a 55% e 58%. O número de peças
jornalísticas que mencionam o candidato é também baixo – vão de 11 a 21 entre julho e setembro, o
que, no extremo, dá um pouco mais de uma referência por dia. A exceção, mais uma vez, é a última
quinzena do primeiro turno, quando o candidato chega a ter 33 peças com menções ao seu nome no
jornal.
Gráfico 4: Valência do Candidato Marcelo Crivella – Jornal Extra
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Positivo Negativo Neutro Equilibrado
Só há dois momentos em toda a campanha em que o noticiário neutro não é o predominante
para o candidato do PRB. Na segunda quinzena de agosto, a taxa de positivo de Crivella sobe a
ponto de mudar pontualmente a tendência neutra do jornal em relação ao candidato. O postulante à
prefeitura sai de 0% de valência positiva na quinzena anterior (1/08 a 15/08) para 33% nesta. São 7
peças positivas dentro das 21 peças ao todo. Esse noticiário favorável a Crivella deve-se à sua
liderança (20%) nas pesquisas de intenção de voto naquele momento, apesar da rota ascendente de
Paes.
Já na última quinzena do primeiro turno, a predominância do noticiário neutro é quebrada
pelo força do noticiário negativo. Crivella sobe de 22% para 36% na valência negativa nesse
período. São 12 das 33 peças que contém o seu nome. Observando o material jornalístico que
fornece os dados para a confecção dos gráficos vemos que esse noticiário negativo tem a ver com
fato de Crivella, que havia liderado a corrida para a prefeitura durante todo o ano, chegar ao fim de
setembro (19/9) praticamente empatado com Jandira no segundo lugar. Além disso, contaram contra
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o candidato matérias jocosas sobre alterações estéticas na foto rosto estampada em peças de
campanha, ataques veiculados pelo Extra de César Maia contra o candidato do PRB e, por fim, a
possibilidade – que acabou se concretizando – do candidato não ir ao segundo turno.
5.2 A cobertura da eleição municipal no jornal O Dia
Apesar de ter uma cobertura em volume menor do que os jornais mais tradicionais, O Dia dá
mais atenção às eleições do que o Extra. Naquele jornal, os principais candidatos ficam entre 50 e
100 menções durante as quinzenas no semestre, com os líderes alcançando picos de 150 de
visibilidade, enquanto no Extra o patamar médio é de 50 referências. Chama atenção no Dia a
atenção maior dada a candidata Jandira Feghali, que inicia a pesquisa com a maior visibilidade da
primeira quinzena. São 27 peças com 54 menções ao seu nome. Por isso, ao longo de toda a
investigação, Feghali será a terceira candidata com maior visibilidade geral – atrás de Crivella e
Eduardo Paes, mas muito a frente de Gabeira.
Efetivamente, nas 3 primeiras quinzenas da pesquisa, Jandira se mantém empatada com Paes
na casa das 80/90 citações ao seu nome. Isso acontece até a segunda quinzena de agosto, quando
Paes ultrapassa a candidata do PC do B e depois ultrapassa Crivella nas intenções de voto e passa a
ser o candidato com maior visibilidade no jornal – diferentemente do Extra onde Crivella é, durante
toda a eleição, o candidato mais visado.
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5.2.1 Eduardo Paes
Diferentemente do que acontece no outro jornal analisado, o noticiário de Eduardo Paes no
Dia é predominantemente positivo. Das 6 quinzenas pesquisadas no primeiro turno, em 4 o
noticiário é majoritariamente positivo para o candidato do PMDB. Nesse sentido, Paes trafega entre
39% e 55% de valência favorável. Nas outras duas quinzenas restantes, a dominância é do noticiário
neutro – o que configura, no total, uma cobertura significativamente simpática para o candidato
Paes.
O pico de positivo é na última quinzena do primeiro turno, quando essa valência bate na
casa dos 55%. Isso se deveu a matérias que salientavam sua liderança cada vez mais consolidada
nas pesquisas e seu distanciamento em relação ao segundo lugar, Crivella. Além disso, o jornal
apresentou as propostas de campanha de Paes e mostrou apoios recebidos pelo candidato,
especialmente do DEM – ao qual Paes já foi filiado quando este partido ainda se chamava PFL.
Gráfico 5: Valência do Candidato Eduardo Paes – Jornal O Dia
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Positivo Negativo Neutro Equilibrado
As notícias amplamente positivas para Paes só foram obscurecidas na segunda quinzena de
julho quando o negativo empata com o equilibrado em 17% e supera o positivo por 2 pontos (17% a
15%). Esse é o único momento mais negativo para Paes no Dia com uma inflexão descendente
aguda na sua taxa de positivo – que cai de 54% na quinzena anterior para 15% nessa. A queda do
positivo para esses 15% e o crescimento do negativo para 17% é uma exceção completa na postura
que o jornal tem em relação ao candidato do PMDB. Fora esse patamar de 17% - que ainda é baixo
– o noticiário negativo para Paes é absolutamente residual no Dia durante quase toda a campanha.
Seus índices são de 11%, 6% e impressionantes 2% em 3 quinzenas consecutivas.
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5.2.2 Marcelo Crivella
O noticiário do candidato do PRB no Dia é predominantemente neutro, ficando acima dos
40% na maior parte do tempo. Nas duas primeiras quinzenas da pesquisa fica acima dos 50% e cai
para 32% somente na última quinzena do primeiro turno. Esse alto índice de noticiário neutro – não
só para Crivella mas para outros candidatos e também no Extra, com a mencionada exceção de
Paes, mostra a pouca movimentação política e eleitoral nas páginas desses jornais. É um noticiário
escasso de debate político que foca-se mais nas agendas de campanha e na apresentação de
resultados de pesquisa.
O noticiário negativo de Crivella é muito baixo, ficando todo o segundo semestre abaixo da
casa dos 20%. O destaque, nesse caso, é para a segunda quinzena de julho e a última de setembro
quando Crivella chega a 17% de valência negativa e vê seu índice de positivo cair de 37% para
13%.
Gráfico 6: Valência do Candidato Marcelo Crivella – Jornal O Dia
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Positivo Negativo Neutro Equilibrado
5.2.3 Fernando Gabeira
Assim como para Crivella, o comportamento do Dia em relação a Gabeira é
predominantemente neutro. Essa taxa fica em geral acima dos 45%, fazendo com que quase a
metade do noticiário do jornal em relação ao candidato seja de neutralidade. No mesmo sentido, o
noticiário negativo para Gabeira no jornal é reduzido, oscilando entre 6% e 17%. Contrariando essa
tendência geral, a primeira quinzena julho de Gabeira alcança 70% de positivo. De 20 peças
jornalísticas que mencionam o candidato do PV, são 14 com valência positiva e nenhuma com
valência negativa. Essa cobertura favorável deveu-se ao crescimento de Gabeira nas pesquisas,
20
chegando a 7% e empatando com Solange Amaral. Além disso, o Dia deu algum espaço para
propostas de campanha do candidato e para matérias sobre a receptividade da candidatura do
candidato, especialmente na orla do Rio de Janeiro.
Gráfico 7: Valência do Candidato Fernando Gabeira – Jornal O Dia
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Positivo Negativo Neutro Equilibrado
Logo depois, na segunda quinzena de julho, constata-se a queda do índice de positivo de
70% para 17% e o crescimento do negativo de 0% para 17%. Esse ligeiro movimento no noticiário
contra o candidato ocorreu por conta de notícias sobre membros do PSDB ( partido coligado com o
PV e que ofereceu o vice de Gabeira, Luiz Paulo) que não aderiram à campanha de Gabeira e sobre
a alta taxa de rejeição do candidato, de 21%. Gabeira era o segundo postulante à prefeitura com
maior rejeição, atrás somente de Marcelo Crivella (que tinha por volta de 30% de rejeição). A partir
daí, contudo, o que se verifica é estabilidade do noticiário positivo para o candidato do PV na casa
dos 30% depois da terceira quinzena da pesquisa e o mencionado predomínio do noticiário neutro.
6. Discussão
A parte final deste trabalho se propõe a pôr em debate dois pontos que consideramos
importantes. O primeiro é o pouco espaço dedicado à política nos jornais populares. Desde a
publicação do clássico The People’s Choice, por Lazersfeld em 1948, sabemos que a participação
política é função, entre outras variáveis, do interesse que as pessoas possuem pelo tema. A questão
que procuramos levantar é se a ausência de estímulo por parte dos jornais populares não seria um
dos fatores que contribui para perpetuar o estado de inércia que a população parece sentir pela
política. Esta questão de cunho normativo não quer dizer que os jornais, por si só, possuem a força
de estimular os cidadãos a terem postura mais engajada no debate público. Para isso, são
necessários outros fatores. Significa apenas que, se a população não encontra nos jornais as
21
informações essenciais da política, aquelas que possuem implicações diretas no seu dia-a-dia, ela
necessariamente não é levada a pensar sobre o tema.
O segundo aspecto, que aponta para um futuro artigo, é a comparação da valência e
visibilidade para os candidatos nos jornais Extra e o Globo – que, como mencionado em nota,
também teve sua cobertura acompanhada pela pesquisa do Doxa. Especialmente no que diz
respeito à atenção dada pelos jornais ao candidato Marcelo Crivella, chama a atenção a discrepância
entre a postura dos jornais que são da mesma empresa: as organizações Globo.
Enquanto no Globo, que tem um público leitor mais elitizado, Crivella é muito visado e tem
um alto índice de noticiário negativo, no Extra, um jornal popular, o candidato do PRB é poupado e
tem um noticiário predominantemente neutro. Chama atenção, inclusive, que numa mesma
quinzena, Crivella tem um pico negativo no Globo e positivo no Extra. Isso, acreditamos, coloca na
mesa de discussões o debate sobre o ofício jornalístico, já que os mesmos fatos ocorridos na
realidade daquela campanha eleitoral em 2008 no Rio de Janeiro foram apresentados nos dois
veículos de forma tão distintas. Somente comparando os jornais populares com os jornais de classe
média poderemos dar maior sustenção a essa discussão aqui proposta.
22
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