gregório - trabalho de conclusão de curso

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  • 7/26/2019 Gregrio - Trabalho de Concluso de Curso

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    UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARCURSO DE ESPECIALIZAO EM FORMAO DE TRADUTORES

    A traduo de referncias culturais na dublagem

    de Everybody Hates Chris

    Gregrio Magno Viana Oliveira

    Maio/2011

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    GREGRIO MAGNO VIANA OLIVEIRA

    A TRADUO DE REFERNCIAS CULTURAISEM EVERYBODY HATES CHRIS

    Monografia apresentada como requisitopara a concluso do Curso deEspecializao em Formao deTradutores da Universidade Estadual doCearUECEOrientadora:Prof. Dr. Vera Lcia Santiago Arajo

    FORTALEZA2011

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    Dados Internacionais de Catalogao na PublicaoUniversidade Estadual do Cear

    Biblioteca Central do Centro de Humanidades

    O48t Oliveira, Gregrio Magno VianaA Traduo de referncias culturais na dublagem de Everybody

    Hates Chris/Gregrio Magno Viana Oliveira.Fortaleza, 2010.49 f. : enc. ; 30 cm.

    Monografia (Especializao) Universidade Estadual do Cear,Centro de Humanidades, Curso de Especializao em Formao deTradutores, Fortaleza, 2010.

    Orientao: Prof.Ps-Dra. Vera Lcia Santiago Arajo.

    1.Traduo2.Dublagem3.Referncias Culturais4.Estrangeirizao5.Domesticao. I.Ttulo.

    CDD:418.02

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    Gregrio Magno Viana Oliveira

    A TRADUO DE REFERNCIAS CULTURAISEMEVERYBODY HATES CHRIS

    Trabalho de Trmino de Cursosubmetido Coordenao do Curso dePs-Graduao em Formao de

    Tradutores como requisito bsico para aobteno do grau de Especialista emFormao de Tradutores daUniversidade Estadual do Cear.

    Orientao:Prof. Dr. Vera Lcia Santiago Arajo

    Aprovada em 30/05/2011

    BANCA EXAMINADORA

    _______________________________________________Profa. Dra. Vera Lcia Santiago Arajo (orientadora)

    Universidade Estadual do Cear

    _______________________________________________Profa. Ms. Maria da Salete NunesUniversidade Estadual do Cear

    _______________________________________________Prof. Ms. Slvia Malena Modesto Monteiro

    Universidade Federal do Cear

    Maio2011

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    H apenas dois [mtodos de traduo]. Ou o tradutor deixa o

    autor em paz, tanto quanto possvel, e move o leitor na direo dele;

    ou deixa o leitor em paz, tanto quanto possvel, e move o autor na

    direo dele.

    Friedrich Schleiermacher

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    RESUMO

    Este trabalho tem como objetivo analisar a traduo de referncias culturais na

    dublagem da srie de TV americana Everybody Hates Chris, de Chris Rock e Ali

    LeRoi. A srie mostra um tpico jovem negro americano crescendo na parte pobre da

    cidade de Nova York nos anos 1980. Consequentemente, h muitas referncias cultura

    daquela poca de daquele local, o que representa um desafio para a dublagem, que no

    dispe de recursos que as modalidades escritas de traduo geralmente dispem.

    Primeiramente, descrevemos o procedimento de dublagem de filmes. Em seguida,

    discutimos como a questo cultural abordada dentro da traduo. A anlise da

    dublagem se baseou nas teorias de traduo propostas por John Catford, Eugene Nida e,

    principalmente, Lawrence Venutti. Dessa forma, as ocorrncias de traduo de

    referncias culturais foram classificadas em cinco categorias diferentes, todas variando

    desde a estrangeirizao at a domesticao.

    PALAVRAS-CHAVE: traduo, dublagem, referncias culturais, estrangeirizao,

    domesticao.

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    ABSTRACT

    This paper aims to analyze the translation of cultural references in the dubbing of the

    American TV series Everybody Hates Chris, by Chris Rock and Ali LeRoi. The series

    shows a typical young black American growing up in a poor New York City

    neighborhood in the 1980s. Consequently, there are many references to the culture of

    that time and place, which represents a challenge to dubbing professionals, which do not

    have the same resources used in written translation. First, we describe the film dubbing

    procedure. Then, we discuss how the cultural question is approached within translation

    theories. The analysis of dubbing was based on the translation theories put forward by

    John Catford, Eugene Nida and especially Lawrence Venutti. Thus, the occurrences of

    cultural reference translation were classified into five different categories, all ranging

    from foreignization to domestication.

    Keywords: translation, dubbing, cultural references, foreignization, domestication.

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    SUMRIO

    Introduo.................................................................................................................................... 7

    Captulo 1: Fundamentao terica........................................................................................... 12

    1.1 A dublagem..................................................................................................................... 12

    1.2 Os procedimentos tradutrios da dublagem................................................................. 13

    1.2.1 Preparao do roteiro................................................................................................ 14

    1.2.2 Escalao do diretor de dublagem e dos atores........................................................ 15

    1.2.3 A escolha dos dubladores........................................................................................... 16

    1.2.4 Gravao em estdio.................................................................................................. 17

    1.2.5 Mixagem..................................................................................................................... 17

    1.3 A questo cultural dentro da teoria da traduo.......................................................... 18

    Captulo 2: Metodologia............................................................................................................. 23

    2.1. Constituio do corpus................................................................................................... 23

    2.2. Anlise da dublagem...................................................................................................... 24

    Captulo 3: A traduo de referncias culturais em Everybody Hates Chris......................... 25

    3.1. Tipo A (expresses mantidas como no original)........................................................... 25

    3.2. Tipo B (expresses substitudas por outras em lngua inglesa).................................... 28

    3.3. Tipo C (uso de hipernimos).......................................................................................... 31

    3.4. Tipo D (domesticao).................................................................................................... 39

    3.5. Tipo E (expresses no relacionadas)............................................................................ 40

    3. Consideraes Finais.......................................................................................................... 47

    4. Referncias......................................................................................................................... 49

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    Introduo

    grande o nmero de sries de TV americanas exibidas no Brasil. Uma

    rpida pesquisa na programao das trs principais redes de TV aberta do pas

    permite-nos constatar que, atualmente, nada menos que 42 sries esto em

    exibio1. A razo para tal nmero a audincia que as sries conquistam. O

    sucesso delas, especialmente com o pblico jovem, inegvel. Legies de fs

    seguem quase que religiosamente os episdios, assistindo-os avidamente e

    aguardando com ansiedade o incio de cada nova temporada. Fruns online e

    websitesso criados para dar vazo curiosidade e para manter os fs atualizados

    quanto s ltimas notcias dos seus seriados favoritos. E ainda h a revolta e

    indignao geral quando uma srie cancelada, tem sua transmisso interrompidano Brasil ou quando algo (horrio/frequncia, dublagem, etc.) no agrada aos fs.

    A enorme popularidade dessas produes audiovisuais contribui de

    maneira significativa para a assimilao de aspectos prprios da cultura dos Estados

    Unidos. Mesmo que de maneira inconsciente, grande parte dos fs acaba se

    familiarizando com aspectos da cultura americana de tal forma que passam a

    compreender e at a usar grias, expresses, piadas e gestos dessa cultura. A

    traduo serve, assim, de canal para essa transmisso cultural. Como afirmamMartins & Salgueiro, aprtica tradutria colabora como importante ferramenta de

    impulso para que as culturas no se limitem s suas fronteiras geogrficas. (p.2)

    O impacto causado pela traduo, na verdade, vai alm da simples

    assimilao de elementos culturais do pas de origem. Ele acaba influenciado a

    maneira como um pas visto por outro, criando, para a cultura-alvo, uma imagem

    da cultura-fonte. Nas palavras de Venuti (1995), a traduo tem um enorme poder

    na construo de identidades nacionais para culturas estrangeiras2. (p.19)

    Os filmes dublados, mais especificamente, acabam sendo um veculo

    ainda mais eficiente nessa transmisso, como afirma Whitman-Linsen (1992): no

    que diz respeito ao impacto, no h dvida de que a exposio do pblico a filmes

    dublados muito superior de tradues escritas3. (p.10)

    1Das quais 34 so exibidas pelo SBT, 6 pela Record e 2 pela Globo.

    2Translation wields enormous power in constructing representations of foreign cultures.(Todas

    as tradues no referenciadas neste trabalho so de minha autoria.)3 As far as impact is concerned, there is no question that the exposure of dubbed films to the

    public far outstrips that of translated written material.

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    A indstria da dublagem [...] imensamente responsvel pela maneira comoum pas visto por outro. [...] O que geralmente se ignora que a indstriade dublagem que lida com esses filmes que, em ltima instncia, faz afiltragem cultural. A dublagem tem o poder de representar e deturpar,distorcer, persuadir, e, em geral, dar uma tremenda contribuio (positiva ounegativa) imagem dos Estados Unidos no exterior.4(WHITMAN-LINSEN,

    1992, p. 11)Apesar desse enorme impacto, poucos estudos abordam a importncia

    da dublagem nos intercmbios culturais. Ainda segundo Whitman-Linsen (1992),

    no se menciona a dublagem em seu papel como mediadora de trocas

    interculturais, em suas funes educativas, sua importncia na promoo da

    comunicao artstica e sua contribuio arte cinematogrfica.5 (p. 10) Esse

    papel, ao mesmo tempo em que uma das contribuies culturais da dublagem,

    constitui um dos seus principais desafios: como transmitir uma mensagem entreculturas, em geral, bastante diferentes -- transferir essa inteno artstica de forma

    que ela possa ser adaptada a um novo ambiente um dos obstculos frente de

    todos aqueles envolvidos no processo de dublagem.6(WHITMAN-LINSEN, 1992,

    p. 15)

    O que despertou o interesse para esta pesquisa foi a indagao sobre de

    que forma esses aspectos culturais, muitas vezes to especficos da cultura-fonte,

    so traduzidos para o pblico da cultura-alvo. De acordo com Whitman-Linsen(1992), o filme tem uma expresso esttica enraizada em um ambiente

    culturalmente limitado, parte da funo conotativa do filme. Em outras palavras, o

    ambiente cultural contribui para a construo do significado do filme como um

    todo. Tal ambiente pode ser percebido no apenas pelas imagens, mas tambm

    pelas falas dos personagens, que transmitem aspectos que muitas vezes so cruciais

    para se entender as estrias e o contexto em que elas ocorrem. Muitas vezes,

    contudo, tais aspectos so to especficos da cultura-fonte que apenas algum que

    tenha razovel familiaridade com ela consegue perceber o significado de algumas

    cenas em particular.

    4The dubbing industry [] is greatly responsible for the way one country is viewed by another.[] What is often overlooked is that it is the dubbing industry handling these films whichultimately does the cultural filtering. Dubbing has the power to represent and misrepresent,distort, sway, and in general make tremendous contribution (positive or negative) to Americasimage abroad.5Yet no mention is made of dubbing in its role as a mediator of intercultural exchanges, in its

    educational functions, its importance in promoting artistic communication, and its contribution to

    cinematic art.6Transferring this artistic intent so that it can be adapted to the new environment is one of the

    highest hurdles facing all those involved in the dubbing process.

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    Isso traz a traduo para o primeiro plano, pois atravs dela que a

    maioria dos fs pode ter acesso ao contedo dessas obras.Contudo, sabemos que a

    traduo audiovisual, especialmente a dublagem, apresenta uma srie de restries,

    como a necessidade de sincronismo com os movimentos labiais dos personagens na

    tela e a impossibilidade de recorrer a explicaes adicionais (como as notas de

    rodap nos livros). Consequentemente, relevante analisar como essas tradues

    so feitas, que procedimentos so adotados e, em especial como as dificuldades so

    superadas.

    Whitman-Linsen (1992) aborda o problema da transmisso de

    referncias especficas de uma cultura para outra, atravs da dublagem. Segundo a

    autora, os tradutores geralmente adotam solues variadas. Em geral, mantm-se as

    referncias cultura-fonte quando estas contribuem para a compreenso do meio

    scio-cultural (milieu) local. A disseminao do cinema americano pelo mundo

    afora to abrangente que algumas expresses podem ser mantidas como no texto

    de partida (Whitman fala de high school promse drive-ins) sem nenhum prejuzo

    para o contedo. A autora ainda argumenta que s h mudana no sentido estrito;

    caso a noo de contedo tambm englobe as funes pragmticas e contextuais

    das falas, ento o sentido mantido (p.128-129).

    Quando no h um correspondente na lngua-alvo e o tradutor no quer

    colocar a referncia, por achar que no far sentido para o pblico-alvo, geralmente

    uma explicao explicitando o significado da expresso colocada no texto.

    Whitman (ibid.) taxativa ao condenar essa como a pior soluo possvel,

    principalmente quando a referncia usada para um efeito humorstico: de todos

    os crimes cometidos contra os espectadores de filmes dublados, esse um dos mais

    assombrosos.7(p. 131).

    Quanto a referncias mais explicitamente ligadas cultura, Whitmandefende que, caso o pblico-alvo no tenha familiaridade com o referente, no faz

    qualquer sentido deix-las na verso dublada. Whitman afirma que o ideal seria

    encontrar algum tipo de expresso semelhante na lngua de chegada, algo que

    suscite uma resposta parecida. Mesmo assim, ainda alerta certo risco:

    O perigo em todas essas adaptaes que, justamente porque elas so re-esculpidas para caberem na frma de um ambiente cultural estrangeiro, outro,

    7

    Of all the crimes perpetrated against viewers of dubbed films, this is one of the mostmonstrous.

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    e substituir referncias originais por outras conhecidas do novo pblico, asassociaes podem ficar distorcidas e o teor do filme comprometido. (p.136)

    No caso da dublagem de sries americanas para o Brasil, pode-se notar,

    de maneira geral, que algumas das abordagens mencionadas so adotadas. s

    vezes, o tradutor usa uma expresso da lngua de partida no texto traduzido,

    deixando para o espectador a tarefa de decifr-lo. Outras vezes, certas expresses

    so substitudas por outras relacionadas cultura brasileira. H, ainda, ocasies em

    que o tradutor parece temer que o pblico, por desconhecer tais expresses, deixe

    de captar a mensagem a ser transmitida e acabe ficando frustrado. Nesses casos, a

    dublagem apaga tais aspectos. Essa estratgia acaba criando textos que

    subestimam a capacidade de compreenso do telespectador, alm de diminurem a

    representao da cultura-fonte atravs da lngua-alvo.A opo de se traduzir ou no tais traos, to caractersticos de uma

    cultura, quando se tenta transmitir a mensagem para um pblico de uma cultura

    diferente pode determinar o modo como o pas da cultura-fonte visto pelo pblico

    da cultura-alvo. Segundo Venuti (1995),

    O objetivo da traduo recuperar o outro cultural como o mesmo, oreconhecvel, at mesmo familiar, e esse objetivo sempre corre o risco deuma domesticao integral do texto estrangeiro, geralmente em projetosaltamente inseguros, nos quais a traduo est a servio de uma apropriao

    de culturas estrangeiras para pautas culturais, econmicas, polticasnacionais.8(p. 18-19)

    A omisso de certos traos culturais pode contribuir para a quebra de

    paradigmas j estabelecidos e tidos como verdadeiros pelo pblico de outra cultura.

    Assim, a traduo pode reforar a viso estereotipada de uma cultura, ou, pelo

    contrrio, ajudar a estabelecer outra viso, mais justa e prxima da realidade.

    Nosso questionamento busca, justamente, mostrar que atitude o tradutor

    geralmente toma quando se depara com tais situaes. Neste trabalho, analisaremos

    a traduo de referncias cultura americana na dublagem brasileira da srie de TV

    norte-americana Everybody Hates Chris. Por meio da comparao da dublagem

    com as falas originais em ingls, podemos notar que, muitas vezes, essas

    referncias s fazem sentido para o pblico americano e, portanto, perdem

    significado quando traduzidas literalmente para o portugus. Nosso objetivo

    8The aim of translation is to bring back a cultural other as the same, the recognizable, even the

    familiar; and this aim always risks a wholesale domestication of the foreign text, often in highlyself-conscious projects, where translation serves an appropriation of foreign cultures fordomestic agenda, cultural, economic, political.

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    verificar que solues so adotadas com mais frequncia pelo tradutor e se essas

    solues tendem a transmitir ou a omitir as referncias cultura americana.

    Neste trabalho, pretendemos, portanto, verificar quais dessas

    abordagens so adotadas com mais frequncia na dublagem da srie supracitada,

    bem como, a partir dessa anlise, identificar tendncias da dublagem de referncias

    culturais em geral.

    Este trabalho est dividido em trs captulos. No primeiro,

    conceituaremos o processo de dublagem, faremos um breve histrico do seu uso e

    abordaremos seus objetivos, bem como analisaremos como a questo da

    transferncia cultural abordada dentro das principais teorias de traduo. No

    segundo captulo, trataremos da metodologia da nossa pesquisa e dos

    procedimentos tcnicos do processo de dublagem. No ltimo captulo, tentaremos

    demonstrar, atravs de exemplos, quais atitudes tradutrias so mais adotadas e de

    que forma elas contribuem para a estrangeirizao ou domesticao do texto de

    partida.

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    Captulo 1: Fundamentao terica

    1.1A dublagem

    A dublagem o processo atravs do qual a voz de um ator/atriz,

    gravada com sua imagem em um filme, substituda pela voz gravada de outro(a),

    o(a) dublador(a), em outra lngua. Whitman-Linsen (1992) a descreve como o

    processo cinematogrfico pelo qual uma voz colada, depois do fato, a um ator

    falante visvel na tela9 (p.12). Para Chaume (2004), a dublagem consiste na

    traduo e ajuste de um roteiro de um texto audiovisual e a posterior interpretao

    desta traduo por parte dos atores, sob a direo do diretor de dublagem e os

    conselhos do assessor lingustico, quando este existe10 (p. 32). Esse processo

    envolve uma srie de procedimentos tcnicos. Neste trabalho, apesar de

    descrevermos brevemente certos aspectos tcnicos, discutiremos mais

    enfaticamente os aspectos tericos desse tipo de traduo.

    O principal objetivo da dublagem tornar uma obra audiovisual

    estrangeira acessvel a um pblico que no domina a lngua na qual a obra foi

    produzida. Sabe-se, no entanto, que o processo j foi usado diversas vezes e em

    vrios pases com o intuito de distorcer a mensagem original contida na pelcula.Esse foi o caso da Alemanha, da Espanha e do Japo, na dcada de 1930, onde os

    regimes ditatoriais criaram leis que limitavam ou impediam a transmisso de filmes

    estrangeiros (principalmente americanos), eliminando, na dublagem, tudo aquilo

    considerado ofensivo para o regime. Diferentemente da legendagem, a dublagem

    permite que contedos sejam adicionados ou omitidos sem que o espectador

    perceba, pois trabalha com o apagamento da trilha sonora do texto de partida. O

    suposto objetivo, nesses casos, era proteger a lngua e o patrimnio cultural de cadapas. Contudo, a realidade revela o temor de que a difuso de produes

    estrangeiras ameaasse o totalitarismo desses regimes (CHAUME, 2004, p. 50).

    Tais episdios mostram a influncia da traduo audiovisual sobre as culturas dos

    pases onde ela veiculada.

    9It is the process of cinematography by which a recorded voice is glued, after the fact, to avisible speaking screen actor.

    10

    El doblajeconsiste en la traduccin y ajuste de un guin de un texto audiovisual y la posteriorinterpretacin de esta traduccin por parte de los actores, bajo la direccin del director dedoblaje y los consejos del asesor lingustico, cuando esta figura existe.

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    Nos primrdios do cinema, os grandes estdios americanos abriram

    filiais em vrios pases, onde atores locais eram contratados e as produes eram re-

    filmadas, cena a cena. Essa prtica, no entanto, mostrou-se demasiadamente

    onerosa, e foi abandonada logo que a tecnologia possibilitou a substituio das

    vozes originais da pelcula por outras gravadas posteriormente. Como destaca

    Whitman Linsen (1992), a prtica da dublagem que surgiu naquela poca

    sobreviveu at hoje, talvez com alguma mudana tcnica, mas sem mudanas

    conceituais significativas.11

    Atualmente, a dublagem amplamente empregada em todo o mundo,

    tendo, em muitos casos, preferncia sobre a outra modalidade de traduo

    audiovisual mais popular, a legendagem. Chaume (2004) destaca a popularidade da

    dublagem de filmes estrangeiros em pases como Espanha, Frana, Alemanha,

    ustria, Itlia, Tailndia e Japo. As causas dessa preferncia vo desde a presena

    de uma lngua dominante na cultura-alvo at o costume j estabelecido em cada

    pas. Cabe ressaltar, tambm, como fator importante na escolha da modalidade de

    traduo audiovisual, o nvel de letramento da populao. Quanto mais baixo esse

    nvel, maior a resistncia legendagem.

    No Brasil, podemos perceber que a dublagem a modalidade de

    traduo audiovisual por excelncia na TV aberta. Raramente se v alguma outra

    modalidade sendo aplicada, exceto quando se trata de documentrios ou entrevistas

    concedidas em lngua estrangeira, nos quais predominam o voice-over, a

    interpretao simultnea ou consecutiva e a legendagem. Podemos afirmar,

    portanto, que a dublagem goza de vasta aceitao e popularidade.

    1.2Os procedimentos tradutrios da dublagem

    A dublagem composta de vrios procedimentos. Embora no haja

    unanimidade, a maioria dos autores divide o processo em quatro ou cinco etapas.

    Chaume (2004) faz um resumo dessas diferentes vises e apresenta as seguintes

    etapas do processo de dublagem:

    1. Compra do texto audiovisual estrangeiro;

    2. Traduo (e eventuais adaptaes) do texto original;

    3. Adaptao da traduo inicial;

    11The practice of dubbing then emerged has survived until today, perhaps with technical, but nosignificant conceptual changes.

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    4. Dramatizao;

    5. Mixagem.

    Chaume (2004) ainda afirma que, mesmo havendo discordncias entre

    os autores quanto ao nmero exato e nomenclatura dessas etapas, todos parecem

    estar de acordo em, pelo menos, diferenciar a parte puramente tcnica da parte

    puramente tradutria e interpretativa. (p. 63)

    1.2.1 Preparao do roteiro

    Na Europa, o roteiro de uma dublagem parte, inicialmente, da traduo

    do roteiro original, que fica, geralmente, a cargo de um tradutor. Essa traduo

    servir de base para todo o restante do processo. Apesar dessa importncia, esse

    tradutor raramente tem acesso ao filme. Tudo o que ele tem em mos umatranscrio dos dilogos, com apenas algumas indicaes do que est acontecendo

    na tela. Como se pode esperar uma traduo adequada se o tradutor no tem acesso

    a informaes vitais transmitidas atravs das imagens? Como o profissional vai

    poder retratar, na traduo, informaes extra-lingusticas, como tom de voz,

    expresses faciais, movimentos corporais? E as informaes lingusticas que

    aparecem na tela na forma escrita, como cartazes, anncios, manchetes de jornal?

    (WHITMAN-LINSEN, 1992, p. 105-106). Muitas vezes, essas informaes ssero acrescidas dublagem no momento em que os atores estiverem gravando suas

    falas.

    Alm disso, essa traduo enfrenta outras dificuldades. Como foi

    traduzido sem o recurso s imagens do filme, esse texto inicial no atende s

    exigncias fonticas e lingusticas da dublagem. Chaume (2004) cita alguns

    problemas que poderiam surgir caso a traduo inicial no passasse por uma

    adaptao. Dentre eles, problemas fonticos que podem afetar a correta dico dos

    atores (cacofonias, palavras de pronncia difcil, termos estrangeiros sem

    transcrio fontica), bem como dificuldades causadas pelo registro oral da

    lngua-alvo e as diversas sincronias exigidas pela dublagem.

    O ajuste desse texto geralmente feito por um roteirista. De posse da

    traduo inicial, esse profissional deve reescrever o texto de tal modo que haja

    sincronia labial entre as falas originais e as traduzidas. Gilbert et al. (apud

    CHAUME, 2004) dividem esse ajuste em duas fases: sincronizao e adaptao. A

    sincronizao consiste em fazer com que a durao e o movimento labial da frase

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    na lngua de chegada [...] coincidam ao mximo com a durao e o movimento

    labial da frase na lngua de origem, enquanto a adaptao tem a ver com o estilo

    do roteiro e com a oralidade dos dilogos. O ajustador deve, assistindo ao filme,

    verificar quais falas encaixam nos movimentos labiais dos atores, substituindo

    aquelas que no atenderem a esse requisito. Tambm pode adaptar falas que no

    soem naturais na lngua de chegada.

    Chaume (2004) diz que geralmente so feitos trs tipos de ajuste:

    a)O sincronismo labial, que a combinao dos movimentos dos

    lbios dos atores na tela com as vozes gravadas em estdio. Alguns

    tericos chegam a defender a substituio de certos fonemas da

    lngua-fonte pelos mesmos fonemas na lngua-alvo (vogais abertas;

    consoantes bilabiais e labiodentais, por exemplo);

    b)O sincronismo cintico, que consiste em ajustar a voz do dublador

    com os movimentos corporais do personagem na tela. Chaume

    (2004) exemplifica afirmando que um personagem que balana a

    cabea horizontalmente no pode emitir um sim, ou que outro que

    leve as mos cabea deve emitir uma exclamao apropriada

    (p.73).

    c)O isossincronismo, que se trata do ajuste da durao das vozes

    gravadas s vozes originais. Tanto Chaume (2004) quanto Whitman-

    Linsen (1992) afirmam ser esta a modalidade de sincronia a

    responsvel pela maior parte das crticas, pois nela qualquer erro

    como um personagem cuja fala continua a ser pronunciada mesmo

    depois que ele fecha a boca, ou um que continua a mover os lbios,

    mas cuja fala no se escuta mais fica bastante evidente e causa

    desconforto no pblico.No Brasil, o processo parecido, mas com uma diferena marcante. o

    tradutor o nico responsvel pela confeco do roteiro. Alm de escrever todas as

    falas, o tradutor brasileiro ainda faz o que se chama de espelho da dublagem. O

    espelho serve como um guia para os atores e diretores de dublagem, pois para cada

    lauda, ele indica quais os atores que gravaro naquele dia.

    1.2.2 Escalao do diretor de dublagem e dos atores

    Terminado o roteiro, ento so escalados os atores e o diretor de

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    16

    dublagem. Da mesma forma que um diretor cinematogrfico, o diretor de dublagem

    tambm deve conduzir a atuao dos dubladores, informando-os que tipo de

    emoo deve ser expressa e aconselhando-os, quando necessrio, quanto ao tom ou

    nfase de certas passagens. Porm, esse profissional tambm desempenha tarefas

    especficas de sua funo, como corrigir eventuais erros de pronncia dos

    dubladores, substituir, no roteiro, palavras de pronncia difcil e escolher dublar

    textos que aparecem escritos no original (cartazes, manchetes de jornal, etc.)

    (Chaume, 2004, p. 75).

    Alm disso, cabe a esse profissional a tarefa de selecionar os

    dubladores, de forma a tentar encontrar aqueles cujas vozes sejam parecidas com as

    dos atores que vo dublar. Essa tarefa se mostra especialmente importante quando a

    voz original mantida em algumas partes do filme, como o caso em musicais.

    Tenta-se, portanto, evitar o estranhamento do pblico quanto diferena entre as

    vozes originais e a dublagem.

    Muitas vezes, o diretor de dublagem no tem conhecimento da lngua-

    fonte. Apenas por meio do roteiro, ele pode conhecer o enredo do filme. Mesmo

    assim, o diretor ainda tem vantagem sobre os dubladores, pois esses, muitas vezes,

    nem mesmo a histria conhecem. Gravam apenas suas falas, muitas vezes,

    separadamente. este o pensamento de Avila (apud Chaume, 2004) que afirma que

    a responsabilidade do todoo processo de dublagem recai sobre uma s pessoa,

    qual se denomina diretor. (p.76)

    1.2.3 A escolha dos dubladores

    Os dubladores so profissionais cujas vozes gravadas substituiro as

    vozes dos atores originais. Geralmente, so tambm atores. A legislao brasileira

    exige o registro profissional de ator para dubladores.

    Os critrios para escolha dos atores, nas palavras de Luyken (apud

    CHAUME, 2004), so, muitas vezes, suas caractersticas vocais, como sotaque, tom

    ou nasalidade, e sua nitidez na pronncia, bem como sua capacidade de

    interpretao. Tambm se valoriza muito a autodisciplina e a humildade, que

    permitem repetir as sequncias tantas vezes quantas necessrias, sem que, por causa

    disso, o ator se incomode.12

    12Los criterios de seleccin de actores suelen ser sus caractersticas vocales, como el acento,

    tono o nasalidad, y su nitidez en la pronunciacin, as como la capacidad de interpretacin.

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    17

    Em pases como o nosso, onde a dublagem a principal modalidade de

    traduo audiovisual na TV aberta, a identificao de atores estrangeiros com as

    vozes de seus dubladores to significativa que a troca de dublador de um ator

    conhecido pode causar rejeio do pblico ao filme (CHAUME, 2004, p. 78).

    Para Kahane (apud Chaume, 2004), uma boa dublagem faz

    desaparecer todas as diferena entre personagem, protagonista e dublador. Perante o

    pblico, quer-se confundir todas as fronteiras. A marca da boa dublagem o

    desaparecimento da fronteira. Aspira-se verossimilhana, ao make believetotal.13

    (p. 77)

    1.2.4 Gravao em estdio

    Segundo Chaume (2004), os atores de dublagem so os encarregados dedar vida traduo, de encarnar os personagens. Alm de terem a mesma

    habilidade de interpretao de atores de teatro ou cinema, enfrentam um desafio a

    mais: dar voz a outro ser, o ator que aparece na tela. Por isso, devem estar atentos

    aos trejeitos, movimentos e at mesmo respirao do personagem.

    Outro desafio enfrentado pelos dubladores o desconhecimento da

    histria a ser gravada. Muitas vezes, como j dissemos, os atores s tm acesso s

    suas falas individuais, e as gravam separadamente, em estdios e at mesmo emperodos diferentes. Chaume (2004) argumenta que os dubladores, muitas vezes,

    sequer tm uma noo global das falas dos seus prprios personagens. A entra a

    figura do diretor, que pode, durante a gravao, fazer alteraes no roteiro, de

    forma a facilitar o trabalho dos dubladores e dar mais verossimilhana cena.

    1.2.5 Mixagem

    Esta a ltima fase do processo de dublagem. Nela, um tcnico de som

    combina as gravaes das vozes dos atores (que podem estar em at cinco faixas

    diferentes) em uma s faixa. Alguns efeitos sonoros tambm podem ser

    acrescentados ou ressaltados, caso o diretor ou o prprio tcnico julgue necessrio.

    Asimismo, se valora mucho la autodisciplina y la humildad, que permite repetir las secuencias

    tantas veces como sea necesario sin que, por ello, el actor se sienta mal.

    13 () lo que se entiende por un buen doblage hace desaparecer toda diferencia entre

    personaje, protagonista y doblador. Ante el pblico se quiere confundir toda frontera. La marca

    de un buen doblage es la desparicin de la frontera. Se aspira a la merosimilitud, al makebelieve total.

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    Alm disso, as vozes gravadas podem ser manipuladas, para ajust-las ao ambiente

    da cena (que pode exigir vozes abafadas ou com eco, por exemplo).

    1.3A questo cultural dentro da teoria da traduoA questo da teoria da traduo bastante polmica. A principal causa

    disso que no h apenas uma teoria da traduo, mas vrias. Diversos estudiosos

    j tentaram sistematizar essa atividade, uns com mais sucesso, outros com menos.

    Trs dos que mais se destacarame que sero de relevncia para este trabalho

    foram John C. Catford, Eugene Nida e Lawrence Venuti. Neste trabalho,

    analisaremos como cada autor abordou, dentro de sua teoria, a questo da traduo

    de aspectos culturais especficos. Antes disso, no entanto, precisamos discorrer

    brevemente sobre os principais postulados de cada teoria.

    Catford define a traduo como substituio de material textual em

    uma lngua por material equivalente em outra lngua. Sua teoria centrada

    justamente na busca por essa equivalncia, muito embora no esclarea

    suficientemente esse conceito.

    Para este trabalho, o ponto de interesse da teoria de Catford aquele em

    que ele aborda a problemtica da traduo de termos que, por serem muito

    especficos de uma cultura, no possuem um equivalente na lngua-alvo. De acordo

    com essa teoria, tais termos so culturalmente intraduzveis. interessante notar

    que, na tentativa de dar uma abordagem lingustica sua teoria, Catford esquece o

    carter cultural dessas tradues?

    Em muitos casos, pelo menos, o que torna 'intraduzveis' itens 'culturalmenteintraduzveis' o fato de o uso de qualquer equivalente de traduoaproximado no texto da lngua-alvo produzir uma colocao incomum nalngua-alvo. Falar de 'intraduzibilidade cultural' pode ser s mais umamaneira de falar de intraduzibilidade colocacional: a impossibibilidade de

    encontrar uma colocao equivalente na lngua-alvo. E isso seria um tipo deintraduzibilidade lingustica. (CATFORD, 1965:101)14

    Por outro lado, Nida, criador da teoria da equivalncia dinmica e

    tradutor da Bblia, afirma que traduzir consiste em reproduzir na lngua receptora

    o equivalente natural mais ntimo da mensagem na lngua-fonte, causando, no

    14In many cases, at least, what renders 'culturally untranslatable' items 'untranslatable' is the

    fact that the use in the TL text of any approximate translation equivalent produces an unusual

    collocation in the TL. To talk of 'cultural untranslatability' may be just another way of talking

    about collocational untranslatability: the impossibility of finding an equivalent collocation in theTL. And this would be a type of linguistic untranslatability.

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    pblico-alvo, o mesmo efeito causado no pblico original. Segundo Carneiro

    (2000), o objetivo de Nida descrever cientificamente o processo de transferncia

    de uma lngua para outra (p.63).

    As supostas prioridades do processo de transferncia, segundo Nida,

    so:

    1) o contedo tem que ser transferido a qualquer custo, com o mnimo dedistoro possvel; 2) importante transmitir a conotao e o impactoemocional da mensagem; 3) podem-se tambm transportar elementosformais, mas isso no prioritrio.

    Apesar de recomendar o mnimo de distoro possvel, Nida sugere

    que uma boa traduo deva se basear no chamado efeito equivalente, ou seja, a

    mensagem traduzida deve causar nos seus receptores o mesmo efeito que a

    mensagem original causou nos seus (apud CARNEIRO, 2000, p. 75), mas sem usar

    os mesmos termos da cultura-fonte. Ao invs disso, o tradutor deve recorrer a

    termos prprios da cultura-alvo. A caracterstica da traduo

    seria a completa naturalidade de expresso e buscaria relacionar oreceptor com os modos de comportamento relevantes no contexto de sua

    prpria cultura, em vez de insistir que ele compreenda os padres culturaisdo contexto da lngua-fonte para que compreenda a mensagem.(RODRIGUES, 2000, p.75-76)

    Ao tratar do lxico das lnguas envolvidas, Nida aborda a questo de

    elementos culturalmente diferentes e os divide em trs grupos, dos quais os dois

    ltimos sero de interesse para nosso trabalho:

    1) termos para os quais h paralelismo nas duas lnguas envolvidas; 2)termos que identificam objetos culturalmente diferentes, mas com funessimilares; e 3) termos culturalmente especficos. (RODRIGUES, 2000)

    Quanto ao segundo grupo, Nida sugere que o tradutor use outro termo

    que reflita a forma do referente, embora com funo no equivalente, ou um que

    identifique a funo equivalente, custa da identidade formal (Nida apud

    Carneiro, 2000, p.82).

    Para exemplificar esse procedimento, sugere trocar, na traduo da

    Bblia, nomes de moedas antigas (talentos ou denrios) por dlares, apenas

    advertindo os tradutores para adequarem os montantes ao contexto. (Carneiro,

    2000:83)

    Contudo, Nida defende a manuteno de termos culturalmente

    especficos (terceiro grupo), por considerar que certos termos esto de tal forma

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    arraigados na prpria estrutura de pensamento em que a mensagem foi construda

    (apud RODRIGUES, 2000, p. 81) que seria impossvel retir-los sem prejudicar a

    transmisso do significado original. Mesmo assim, minimiza a dificuldade trazida

    por tais termos ao considerar que todos os povos reconheceriam que outros povos

    podem ter comportamentos diferentes e notas de rodap poderiam explicar essa

    diversidade (id. ibid.). No entanto, o que fazer no caso das tradues audiovisuais,

    nas quais impossvel aplicar esse recurso? Como declara Whitman-Linsen (1992),

    nos filmes, as referncias culturais no podem recorrer s notas de rodap para

    esclarecimentos, nem se pode acomodar explicaes longas em movimentos labiais

    visivelmente mais curtos na tela.15(p.126)

    Voltando ao pensamento de Nida, Carneiro (2000) defende que

    Nida mostra, com suas afirmaes, acreditar ser possvel que um assuntopossa permanecer intocado pela relao interlingustica e interculturaldesencadeada pela traduo. Alm disso, parece crer na possibilidade deespelhamento de uma cultura em uma segunda lngua, relacionada a umacultura necessariamente diferente. (RODRIGUES, 2000:82)

    Para Carneiro (2000), a primeira das questes levantadas pela maneira

    como Nida trabalha a questo da equivalncia dinmica

    sobre se realmente seria unnime a noo de que uma traduo tem que serlida como se fosse um original, ou seja, se efetivamente a melhor maneira detraduzir gerar um texto que no lembre o leitor de que ele est lendo umatraduo.

    Como se pode notar, ambas as teorias abordadas acima acabam se

    comprometendo no esforo de chegar ao conceito de equivalncia. Carneiro (2000)

    diz que, nas propostas de Catford e Nida, esse conceito se fragmenta. Isso acontece,

    em parte, porque suas teorias deixam de lado um dos aspectos essenciais para a

    compreenso da traduo: as culturas envolvidas. Como afirma Agra (2007),

    uma lngua natural um sistema de representao do mundo e de seuseventos e, para que ela possa dar conta disso, usa sinais cujos sentidos soespecializados em um cenrio que revela uma cultura.

    Isso significa dizer que o desafio do tradutor no apenas achar a

    equivalncia entre termos das duas lnguas, mas tambm considerar todo o

    contexto em que a comunicao ocorre. A esto includos: o tempo e o local de

    utilizao da lngua; o grupo social que a utiliza; a inteno do autor, entre outros.

    15

    Yet in film, cultural allusions cannot resort to footnotes for clarification nor can lengthyexplanations be accommodated in shorter visually perceived lip articulations on the screen.

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    Tanto Catford quanto Nida, contudo, parecem ter ignorado tais fatores.

    Opondo-se s idias de Catford e Nida, Venuti prope o conceito de

    (in)visibilidade do tradutor. Esse autor defende veementemente que o tradutor

    tem sido desvalorizado e esquecido e que uma das causas est justamente na atitude

    que esse profissional adota nas suas tradues. Na tentativa de aumentar a aceitao

    de um texto estrangeiro, o tradutor tenta faz-lo soar to natural ao pblico-alvo que

    parea no ser uma traduo. Venuti (1995) argumenta que essa a atual tendncia

    na traduo de textos para a lngua inglesa, mas, como poderemos verificar, isso

    tambm ocorre na traduo para o portugus. Como revela Venuti (1995),

    um texto traduzido [...] considerado aceitvel [..] quando lidofluentemente, quando a ausncia de quaisquer peculiaridades lingusticas ou

    estilsticas o faz parecer transparente, dando a impresso de que ele reflete apersonalidade ou inteno do escritor estrangeiro ou o significado essencialdo texto estrangeiroem outras palavras, a aparncia de que a traduo no, de fato, uma traduo, mas o original.(p. 1)16

    O grande problema, nesse caso, est em tentar retratar uma cultura

    estrangeira nos termos e padres da cultura local, dando aos leitores a experincia

    narcisista de reconhecerem sua prpria cultura em um outro cultural. (VENUTI,

    1995, p.15). E, para conseguir esse efeito, o tradutor sacrifica o texto original,

    reduzindo-o a representaes j conhecidas e consagradas pelo pblico-alvo. A esse

    processo Venuti denomina domesticao, uma reduo etnocntrica do texto

    estrangeiro para valores culturais da lngua-alvo.17(p.20)

    Uma traduo domesticada pode gozar de imediata aceitao junto a um

    pblico monolngue ou pouco exigente. Contudo, no caso de obras audiovisuais, a

    discrepncia entre o ambiente mostrado pelas imagens e os significados

    transmitidos pela dublagem torna-se evidente. Como aceitar como crvel, por

    exemplo, dois adolescentes americanos que vivem na dcada de 80 fazendoreferncias ao futebol brasileiro?

    Um argumento que provavelmente pode ser utilizado em defesa da

    domesticao de que os termos estrangeiros no faro qualquer sentido para o

    16A translated text [] is judged acceptable [] when it reads fluently, when the absence ofany linguistic or stylistic peculiarities makes it seem transparent, giving the appearance that itreflects the foreign writers personality or intention or the essential meaning of the foreign

    textthe appearance, in other words, that the translation is not in fact a translation, but theoriginal.17

    an ethnocentric reduction of the foreign text to target-language cultural values.

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    pblico-alvo, deixando-os a ver navios em passagens que supostamente deveriam

    causar algum tipo de reao. Na verdade, como j comentamos, essa a ideia

    defendida, at certo ponto, por Whitman (1992). No entanto, essa mesma autora

    alerta para os riscos dessas adaptaes, em alguns casos, quando afirma, por

    exemplo, que o problema inerente dublagem que se corre o risco de derramar

    um molho sem gosto sobre filmes de forte sabor sociocultural.18(p.136)

    Venuti (1995) tambm alerta para os perigos da domesticao. Em sua

    opinio,

    Ao produzir a iluso de transparncia, uma traduo fluente disfara-se deequivalncia semntica verdadeira, quando, na verdade, inscreve o textoestrangeiro com uma interpretao parcial, [...] reduzindo-o, seno

    simplesmente excluindo, a diferena que a traduo convidada atransmitir.19(p. 21)

    Cary (apud WHITMAN-LINSEN, 1992) tambm segue a linha de

    pensamento de Venuti, enfatizando o dilema sofrido pelo tradutor, ao indagar: Ao

    fazer uma traduo, devemos nos prender ao original ao ponto de atingir oleitor

    (ou ouvinte ou interlocutor) com uma transmisso deliberadamente fiel, ou

    devemos naturalizar nossa verso para torn-la mais aceitvel?20(p.108)

    deciso de manter uma verso deliberadamente fiel, Venuti (ibid.)

    d o nome de estrangeirizao. o oposto da domesticao. Ou seja, mantm-se

    os termos tal e qual esto no original, dando assim uma maior representao

    cultura-fonte atravs da lngua-alvo. A estrangeirizao, torna o texto um lugar

    onde um outro cultural se manifesta embora, obviamente, uma alteridade que

    nunca pode se manifestar em seus prprios termos, apenas nos da lngua-alvo

    (BERMAN apud VENUTI, 1995, p. 20). Uma traduo estrangeirizadora d

    significado diferena do texto estrangeiro, mesmo que apenas perturbando os

    cdigos culturais que prevalecem na lngua-alvo. (id.ibid.)

    18The problem inherent in dubbing is that it runs the risk of ladling a nondescript gravy over

    films of pungent socio-cultural flavor.19By producing the illusion of transparency, a fluent translation masquerades as true semantic

    equivalence when it in fact inscribes the foreign text with a partial interpretation, [], reducingif not simply excluding the very difference that translation is called on to convey.

    20

    Doit-on, en traduisant, coller loriginal au point de heurter le lecteur (ou lauditer, oulinterlocuteur) par une transmission dlibrment fidle, ou doit-on naturaliser sa versionpour la rendre mieux acceptable ?

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    Captulo 2: Metodologia

    2.1.Constituio do corpus

    Para este estudo, escolheu-se a srie americana Everybody HatesChris, produzida por CR Enterprises e 3 Arts Entertainment. uma srie cmica

    inspirada na adolescncia do humorista Chris Rock. A histria se passa entre 1982 e

    1987 no bairro de Bedford-Stuyvesant, Brooklyn, Nova York. O humorista narra

    sua infncia em primeira pessoa e, ao mesmo tempo, retratado como adolescente

    (terceira pessoa). Os outros personagens desse centro narrativo so: sua me

    Rochelle, seu pai Julius, seus irmos Drew e Tonya, e seu amigo de escola Greg

    Ulliger. A srie retrata os preconceitos dos quais Chris era vtima (principalmente

    na escola, onde ele era o nico negro) e as dificuldades enfrentadas por uma famlia

    negra e pobre nos EUA dos anos 1980.

    A escolha dessa srie deu-se pelas seguintes razes: 1) uma srie que

    retrata a cultura de um grupo tnico/social especfico dentro da cultura geral

    americana. Esse fato nos fez vislumbrar a possibilidade de encontrar referncias

    culturais para as quais no haveria equivalentes em portugus, o que, por sua vez,

    nos fez indagar qual(is) estratgia(s) seria(m) usada(s) pela dublagem para superar

    essa dificuldade; 2) a srie transmitida no Brasil por uma rede de TV aberta (a

    saber, Rede Record), o que a faz ter uma audincia potencialmente grande; 3) o

    humor da srie agrada pblicos de todas as faixas etrias e, embora sua temtica

    seja voltada para o pblico juvenil, a srie tambm pode ser apreciada por crianas

    e adultos. Finalmente, por constatarmos que a dublagem a categoria de traduo

    audiovisual predominante na TV aberta brasileira, decidimos analisar a verso

    dublada dessa srie, trabalho feito pelos estdios VTI21.

    Inicialmente, pretendamos assistir a todos os episdios das duas

    primeiras temporadas, pois consideramos que a anlise conjunta de temporadas

    dubladas por estdios diferentes poderia influenciar a imparcialidade da pesquisa.

    Iniciamos o trabalho, portanto, assistindo aos episdios da primeira temporada, em

    ordem crescente. Porm, aps assistirmos aos 13 primeiros, notamos que o exguo

    tempo para a concluso do trabalho no permitiria que vssemos todos os episdios

    pretendidos. Portanto, alm dos treze primeiros episdios da 1 temporada,

    21Apenas 1 e 2 temporadas; a dublagem das duas temporadas seguintes ficou a cargo doestdio ArtSound.

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    inclumos o vigsimo-primeiro, pois, ao assistir casualmente, notamos uma

    ocorrncia digna de anlise, bem como trs outros episdios da segunda temporada.

    Estes ltimos foram selecionados aleatoriamente (com exceo do 6, por tambm

    termos notado ocorrncias dignas de anlise ao assistir srie casualmente).

    Ao final do trabalho, 14 episdios haviam sido assistidos, dos quais

    foram extradas 42 ocorrncias de traduo de referncias culturais.

    2.2.Anlise da dublagem

    A anlise das ocorrncias de traduo foi feita da seguinte maneira:

    primeiro, assistamos ao episdio original, com legendas em ingls. Ao notarmos

    qualquer ocorrncia de referncia cultural especfica, a mesma cena era vista no

    episdio dublado correspondente. Em seguida, decidamos como classificar cadatraduo (em um dos cinco tipos que veremos mais adiante). Aps isso, tomava-se

    nota dos tempos e dos personagens envolvidos. Finalmente, os dilogos eram

    transcritos e escrevia-se um breve resumo da cena, para ajudar na contextualizao.

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    Captulo 3: A traduo de referncias culturais em Everybody Hates Chr is

    Ao analisarmos a dublagem da srie, podemos notar que algumas

    referncias culturais permanecem no texto de chegada. Isso geralmente ocorrequando os fatos ou pessoas a quem se referem so tambm conhecidos no Brasil,

    embora haja algumas que o pblico provavelmente desconhece. Entretanto, muitas

    referncias culturais so alteradas e acabam no refletindo a cultura-fonte (norte-

    americana). Alm disso, nem sempre ocorre o mesmo tipo de alterao. Ou seja, em

    certas ocasies, o tradutor tenta encontrar uma expresso semelhante na nossa

    cultura; em outras, a traduo faz referncia a algo completamente diferente.

    Baseados nessas diferenas, classificamos as tradues em cinco tipos:

    A) as expresses so mantidas como no texto de partida, acrescentando-

    se, eventualmente, uma explicao;

    B) a expresso substituda por outra, mais amplamente conhecida,

    apesar de ainda pertencer cultura inglesa;

    C) apaga-se a expresso do texto de partida, colocando-se, em seu

    lugar, um hipernimo;

    D) tenta-se substituir as expresses por correspondentes na cultura

    brasileira;

    E) substitui-se as expresses por outras que tm pouca ou nenhuma

    relao com o texto de partida.

    Apesar de mencionarmos as tradues dos tipos A e B, interessa-nos,

    aqui, descrever principalmente os tipos C, D e E, por considerarmos que, alm de

    serem mais recorrentes, contribuem para a domesticao do texto de partida e,

    consequentemente, com toda uma desvalorizao da cultura-fonte, como j

    discutido anteriormente.

    3.1.Tipo A (expresses mantidas como no original)

    Apesar das vrias ocorrncias de domesticao, detectamos algumas

    ocasies em que referncias potencialmente incompreensveis aos telespectadores

    brasileiros so mantidas quase que na sua totalidade (tradues do tipo A). Tal tipo

    de traduo ocorre, por exemplo, sempre que algum dos personagens faz meno a

    Kunta Kinte, personagem principal do livro Roots: The Saga of an American

    Family (1976), de Alex Haley, que conta a histria de um negro desde seu

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    nascimento na frica, sua captura e venda como escravo para os Estados Unidos,

    at a vida dos seus descendentes. Em 1977, a rede de TV ABC produziu e

    transmitiu uma minissrie homnima baseada no livro, o que ajudou a popularizar a

    imagem do afro-descendente americano. O personagem mencionado em dois

    episdios da srieEverybody Hates Chris, como descrito a seguir.

    O exemplo 1 mostra a primeira ocorrncia desse tipo de traduo. No

    sexto episdio da primeira temporada, intitulado Everybody Hates Halloween,

    Chris lembra a poca em que saa com os irmos para pedir doces ( trick or

    treating) no feriado. Ao relembrar a fantasia que estava usando, Chris (narrador)

    comenta:

    EXEMPLO 1TEMPORADA: 1 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates Halloween)TEMPO: 00:3200:36 TIPO: A

    ORIGINAL DUBLAGEM(If you think that's bad, you should'veseen the year I was Kunta Kintes foot.)

    (Se achou isso um mico, devia me ver no anoque imitei Kunta Kinte, de Razes)

    A referncia ao p de Kunta Kinte deve-se ao fato de, no livro, o

    personagem, aps ser capturado em sua quarta tentativa de fuga, ter que escolher,

    como punio, ser castrado ou ter o p cortado. Ele escolhe a segunda opo, que

    executada por seus captores. Como se pode notar, a dublagem manteve a refernciaparcialmente, e ainda acrescentou uma explicao.

    No dcimo-primeiro episdio da primeira temporada, intitulado

    Everybody Hates ChristmasCaruso, o bully da escola onde Chris estuda (e da

    qual este o nico aluno negro), faz um comentrio preconceituoso depois de

    derrubar o personagem principal no corredor. A dublagem, apesar de omitir a

    primeira referncia (tipo D), deixou a segunda.

    EXEMPLO 2

    TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybod y Hates Chr istmas)TEMPO: 01:24 - 01:26 TIPO: A

    ORIGINAL DUBLAGEMCaruso (para Chris): Happy Kwanzaa ,Kunta Kinte.

    Feliz Natal, Kunta Kinte.

    Duas ocorrncias da traduo do tipo A esto presentes no sexto

    episdio da segunda temporada (Everybody Hates the Buddy System). Aps ver

    Caruso espancando Chris, o Sr. Evans, diretor da escola, convoca-os para uma

    conversa. Ironicamente, ele libera Caruso e tentar convencer Chris de que este o

    22Festival de cultura afro-americana que vai de 26 de dezembro a 1 de janeiro.

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    responsvel por tal tratamento. O narrador, em seu comentrio, faz referncia a

    Rodney King (1965-), afro-americano que, em 1991, foi espancado por policiais em

    Los Angeles. O incidente foi filmado por um cidado e o vdeo foi transmitido

    centenas de vezes no s nos EUA, mas em todo o mundo, causando indignao

    geral do pblico. A referncia preservada na traduo.

    EXEMPLO 3TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 01:19 - 01:26 TIPO: A

    ORIGINAL DUBLAGEMMr. Evans: Have you ever consideredthe possibility this is your fault?Chris (narrador):That's what they said toRodney King.

    J considerou a hiptese de ser sua culpa?(Foi o que disseram ao Rodney King.)

    O outro caso ocorre quando Chris e Caruso, que foram obrigados a ficar

    sempre juntos durante uma excurso da escola a um museu, acabam perdendo o

    nibus de volta. Eles discutem como vo chegar novamente escola. Caruso insiste

    em dizer que ele deve dar as ordens e faz referncia ao filme Silver Streak (O

    Expresso de Chicago), comdia estrelada por dois atores: um branco (Gene

    Wilder) e um negro (Richard Pryor). A dublagem foi praticamente literal.

    EXEMPLO 4TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO:10:4010:45 TIPO: A

    ORIGINAL DUBLAGEMCaruso: Gene Wilder made all thedecisions in Silver Streak. Richard Pryorjust followed orders.

    Gene Wilder tomou as decises em OExpresso de Chicago. Richard Pryorobedeceu ordens.

    Mais uma ocorrncia de traduo do tipo A pode ser encontrada no

    dcimo episdio da primeira temporada. Na cena, Rochelle, a me de Chris, est

    fofocando para Julius, pai do personagem, que finge estar prestando ateno. As

    referncias tambm foram mantidas integralmente.

    EXEMPLO 5TEMPORADA: 1 EPISDIO: 10 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 06:3806:51 TIPO: A

    ORIGINAL DUBLAGEMRochelle: Julius, you are not gonnabelieve this. But you know that girl JodyWatley that used to be on Soul Train?Well, I heard she's leaving the groupShalamar and starting a new group with

    Ashford & Simpson.

    Julius, voc no vai acreditar, t? Mas, sabeaquela tal de Jody Watley que cantava noSoul Train? Bom, eu soube que ela largou oconjunto Shalamar pra montar uma bandacom Ashford & Simpson.

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    3.2.Tipo B (expresses substitudas por outras em lngua inglesa)

    Nas tradues do tipo B, o tradutor, provavelmente por temer que o

    telespectador no compreenda a referncia original, adota uma expresso da lnguainglesa, porm, mais amplamente conhecida. Embora as expresses adotadas

    geralmente no tenham relao com os originais, mantm-se o sentido, de certa

    forma. Alm disso, passa-se a falsa impresso de que o texto continua

    estrangeirizado.

    Aqui tambm temos que considerar as restries inerentes ao processo

    de dublagem, como a exigncia de sincronismo labial e a durao das falas. Em um

    ou outro caso, esses fatores podem ter sido decisivos no momento da traduo.

    Podemos constatar esse tipo de traduo nas seguintes passagens. No

    episdio Everybody Hates Food Stamps(1 temporada, episdio 9), Chris discute

    com seu melhor amigo, Greg, e ambos acabam desfazendo a parceria para a

    apresentao de um trabalho na Feira de Cincias da escola. Ao comentar a briga, o

    narrador compara essa separao ao fim da dupla britnica Wham!, formada por

    Andrew Ridgeley e George Michael. A dupla fez bastante sucesso tanto na

    Inglaterra quanto nos EUA, desde 1982 at ser desfeita em 1986. O tradutor da

    dublagem provavelmente considerou a dupla pouco conhecida no Brasil e, portanto,

    optou por usar uma banda bem mais conhecida.

    EXEMPLO 6TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Food Stamps)TEMPO: 00:2600:31 TIPO: B

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): It was like AndrewRidgeley leaving Wham!

    (Era como se o Mick Jagger fosse largar osStones.)

    Temos outra ocorrncia desse tipo de traduo no dcimo-primeiro

    episdio da primeira temporada (Everybody Hates Christmas). Chris chega

    bastante animado escola, pois est imaginando o presente que vai ganhar no

    Natal. De repente, Caruso derruba-o e pisa em cima dele, sarcasticamente

    desejando um Feliz Natal. O texto de partida, no entanto, faz referncia ao

    Kwanzaa, festival de cultura afro-americana que vai de 26 de dezembro a 1 de

    janeiro. Esse feriado foi criado na dcada de 1960 com o propsito de ser uma

    alternativa dos negros ao Natal, considerado pela comunidade afro-americana uma

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    celebrao de brancos cristos. Devido ao fato de ser pouco conhecido no Brasil, o

    tradutor preferiu retirar a referncia, usando simplesmente Natal em seu lugar.

    EXEMPLO 7TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybod y Hates Chr istmas)TEMPO: 01:24 - 01:26 TIPO: B

    ORIGINAL DUBLAGEMCaruso (to Chris): Happy Kwanzaa,Kunta Kinte.

    Caruso (para Chris): Feliz Natal, Kunta Kinte.

    Vale ressaltar que, na terceira temporada, um dos episdios retrata

    exatamente oKwanzaa(Everybody Hates Kwanzaa, 10 episdio).

    No mesmo episdio, temos mais uma referncia a grupos musicais. Ao

    comentar o otimismo exagerado de Greg, Chris (narrador) afirma que seu amigo

    ainda cr no retorno de que Al B. Sure!, nome artstico de Albert Jason Brown III(1968-). Esse cantor, compositor e produtor americano chegou a fazer bastante

    sucesso no final da dcada de 1980, mas sua carreira apenas declinou desde ento.

    O tradutor preferiu, neste caso, usar uma referncia bem mais clebre.

    EXEMPLO 8TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybody Hates Christmas)TEMPO: 14:41 - 14:43 TIPO: B

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): I always liked that Gregwas so optimistic. To this day, he still

    thinks Al B. Sure! is gonna make acomeback.

    (Eu gostava do Greg ser to otimista. At hojeele acha que os Beatles vo gravar mais um

    disco.)

    Em uma mesma conversa, no dcimo-terceiro episdio da primeira

    temporada, h duas ocorrncias. A situao a seguinte: Chris se prepara para tirar

    a foto do anurio da escola. Sua me lhe presenteia com um bluso que custou

    trinta e cinco dlares. Ao chegar escola, Chris tira o bluso e guarda em seu

    armrio. Pouco antes da hora de bater a foto, porm, ele percebe que o bluso foi

    roubado. O primeiro suspeito Caruso, com quem ele se encontra no vestirio

    pouco depois. Logo que v Chris preocupado com o sumio do bluso, Caruso o

    chama de Scatman, em referncia a Benjamin S. Crothers (1910-1986), cantor,

    danarino, ator e msico afro-americano. Na dublagem, no entanto, seu nome

    trocado pelo de Louis Armostrong, bem mais conhecido mundialmente. Em

    seguida, ainda no mesmo dilogo, Caruso usa, com Chris, o apelido Nipsey,

    referncia a Julius Russel (1918-2005), comediante negro conhecido por sua

    participao em game shows desde a dcada de 60. Na dublagem, tal referncia

    substituda por Shaft, detetive negro personagem principal do filme e minissriehomnimos, transmitidos na dcada de 1970. Embora este termo no tenha

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    qualquer relao com o original, essa substituio talvez tenha sido influenciada

    pelo lanamento, no ano 2000, de uma nova verso do filme, estrelada por Samuel

    L. Jackson.

    EXEMPLO 9

    TEMPORADA: 1 EPISDIO: 13 (Everybod y Hates Picture Day)TEMPO: 09:2609:47 TIPO: B

    ORIGINAL DUBLAGEMCaruso: What's wrong, Scatman?()Chris: That shirt cost U$ 35. And I wantit back.Caruso: I don't have it, Nipsey.

    Fala, Louis Armstrong!()Aquele casaco custou 35 dlares, e euquero ele de volta.Eu no t com ele, Shaft.

    Na segunda temporada, temos outra ocorrncia do tipo B. No sexto

    episdio (Everybody Hates the Buddy System), Chris e Caruso esto embarcando

    em uma excurso da escola ao museu. Ao notar a hesitao de Chris, Caruso ochama de Bubbles, uma referncia ao chimpanz que foi adotado como animal de

    estimao por Michael Jackson de 1986 a 2003. O narrador comenta tal

    comparao dizendo que se sentiria mais seguro no rancho Neverland, propriedade

    que foi a residncia de Michael Jackson de 1988 a 2008. Na dublagem, preferiu-se

    usar uma referncia a outro chimpanz, mais conhecido: Cheeta, de Tarzan. O

    narrador, em seguida, ao invs de no rancho Neverland, menciona no colo do

    Michael Jackson. Nesse caso, apesar de conseguir manter um pouco dacomicidade, perde-se o elo cmico entre a fala de Caruso e o comentrio do

    narrador.

    EXEMPLO 10TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO:06:0806:14 TIPO: B

    ORIGINAL DUBLAGEMCaruso (to Chris): Come on, Bubbles.Chris (narrador): Right now, I'd feel saferat the Neverland Ranch.

    Vambora, Cheeta!Naquela hora, eu me sentiria mais segurono colo do Michael Jackson.

    No episdio Everybody Hates Christmas, o narrador pondera sobre

    como as pessoas s pensam em fazer caridade no Natal, enquanto assegura que

    muita gente tambm tem fome no Dia do Presidente, feriado nacional americano

    comemorado na terceira segunda-feira de fevereiro. Como no temos um dia do

    Presidente no Brasil, o tradutor preferiu usar outro feriado americano, que tem um

    equivalente no Brasil: o Dia da Independncia.

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    EXEMPLO 11TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybod y Hates Chr istmas)TEMPO: 02:4402:52 TIPO: E

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):Its funny how mostpeople only think of feeding the needy

    during Christmas. Im sure theres a lotof hungry people during Presidents Day.

    (Engraado como tem gente que s pensa emalimentar os famintos na poca do Natal. Eu

    tenho certeza de que tem gente com fome noDia da Independncia tambm.)

    No vigsimo-primeiro episdio da primeira temporada (Everybody

    Hates Jail), a professora de Chris avisa a turma de que eles vo fazer uma

    excurso a Washington, a capital dos EUA. Caruso diz para Chris se preparar para

    ir no fundo do nibus, e o chama de Birmingham. Essa uma referncia cidade

    do Alabama onde Martin Luther King Jr. liderou protestos pelos direitos dos negros

    americanos. Os protestos atraram a ateno do mundo todo em 1963 e resultaram

    no fim da segregao e na subsequente Lei dos Direitos Civis de 1964.

    Na dublagem, o tradutor omite Birmingham (uma referncia que

    passaria despercebida para a maioria dos espectadores), mas menciona Martin

    Luther King. Tal procedimento acaba, de certa forma, validando a traduo, pois

    mantm, ainda que parcialmente, a referncia do texto de partida.

    EXEMPLO 12TEMPORADA: 1 EPISDIO: 21 (Everybody Hates Jai l)

    TEMPO: 00:48 - 00:51 TIPO:BORIGINAL DUBLAGEMCaruso (para Chris):Prepare to sit in theback [of the bus], Birmingham23.

    Caruso (para Chris): Voc vai sentar nofundo, Luther King.

    Os diversos apelidos racistas que Caruso usa com Chris fazem

    referncia, na maioria das vezes, a elementos muito prprios da cultura americana.

    Por isso, no so mantidos na dublagem, sendo, ao invs disso, substitudos por

    termos igualmente pejorativos do portugus brasileiro. Analisaremos algumas das

    tradues desse tipo mais adiante (tipo E).

    3.3.Tipo C (uso de hipernimos)

    As tradues do tipo C so caracterizadas pelo uso de hipernimos,

    palavras de sentido mais genrico. Geralmente esses hipernimos ocorrem quando

    a referncia to especfica da cultura fonte que, alm de no fazer sentido na

    lngua-alvo, muitas vezes no tem uma expresso que exera a mesma funo na

    cultura-alvo. Portanto, tal tipo de traduo geralmente tem um efeito positivo.

    23Referncia aos protestos de Birmingham, Alabama, liderados por Martin Luther King Jr. em 1963.

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    Outra situao em que o tipo C utilizado, como j vimos no tipo B,

    ocorre quando os aspectos tcnicos a necessidade de sincronismo, em particular

    foram o tradutor a simplificar o texto de chegada. Alguns exemplos mostram

    como os aspectos tcnicos, e no apenas os estritamente lingusticos, podem

    efetivamente influenciar as escolhas na traduo audiovisual.

    Logo no primeiro episdio da srie, podemos constatar vrias

    ocorrncias de tradues desse tipo. Em uma das primeiras cenas, a famlia de

    Chris est se mudando para Bed-Stuy (um bairro de Nova York) num furgo

    dirigido pelo pai de Chris, Julius. Ao perguntar se podem parar no McDonalds, o

    pai pergunta se eles tm dinheiro para McDonalds. Na dublagem, essa referncia

    substituda simplesmente por lanchonete. Tal substituio , a nosso ver,desnecessria, pois a cadeia de fast food conhecida mundialmente. O dilogo

    apresentado abaixo:

    EXEMPLO 13TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO:(01:38 - 01:45) TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEM- Dad, can we stop at McDonald's?- You got some McDonald's money?- Julius, the kids have to eat.- They ain't gotta eat McDonald's.

    - Pai, d pra parar na lanchonete?- Tem dinheiro pra lanchonete?- Julius, ele tm que comer.- Mas no tem que ser em lanchonete.

    Um pouco mais adiante, Chris, como narrador, afirma que ele era a

    nica pessoa negra em um dos nibus que pegava para chegar escola e ressalta

    como as pessoas recusavam-se a sentar ao lado dele. Na cena, Chris est sentado e

    h um assento vago ao seu lado. Ao oferecer o assento a uma mulher grvida, esta

    recusa e ainda parece irritada. O narrador, ento, em seu comentrio, usa, de forma

    genrica, o nome de O. J. Simpson. Este famoso jogador de futebol americano foiacusado de assassinar a esposa (que era uma mulher branca) e o amante dela em

    1995. O caso ganhou notoriedade internacional e terminou com a absolvio de

    Simpson.

    Na dublagem, o termo O. J., que fora utilizado no texto de partida

    com o significado negro que namora mulher branca, foi substitudo por nego,

    como se pode verificar na transcrio das falas.

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    EXEMPLO 14TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO:08:12 - 08:15 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):If you think she's madnow, wait 'til her daughter brings home

    O.J.24

    (T furiosa, minha filha? Espera at tuafilha levar o nego pra casa.)

    Durante seu primeiro encontro com Caruso, Chris tenta intimid-lo

    dizendo que de Bed-Stuy e que pode trazer metade da Marcy para a escola.

    Marcy uma referncia a Marcy Project (ou Marcy Houses), conjunto

    habitacional construdo em Bed Stuy pela prefeitura de Nova York nos anos 1950.

    Na dcada de 1980, era considerado um dos bairros mais perigosos da cidade, pois

    sofria com altos ndices de violncia e consumo de crack. Era nessa vizinhana que

    Chris morava.

    A dublagem resolveu substituir essa referncia pela palavra gangue,

    que no causa estranheza no telespectador.

    EXEMPLO 15TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO: 09:03 - 09:09 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (para Caruso): I don't play that. I'm

    from Bed-Stuy, boy! I'll bring half ofMarcy up in here!

    Chris (para Caruso): Eu no amarelo! Sou

    da Bed-Stuy, moleque! Eu trago uma gangueinteira pra c!

    Ao comentar seu primeiro encontro com Caruso, o narrador faz

    referncia a DMX, nome artstico do rapper americano Earl Simmons (1970-). O

    tradutor poderia ter deixado o nome do cantor, mas preferiu usar hip-hop.

    EXEMPLO 16TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO: 10:02 - 10:10 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador) :Oh, he got away withcalling me nigger that day. But later inlife he said it at a DMX concert, andalmost got stomped to death.

    (, naquele dia ele me chamou de neguinhoe se safou. Mas tempos depois ele foi a umshow de hip-hop e quase foi pisoteado at amorte.)

    Ocorrncia similar pode ser encontrada no epidsio 11 da primeira

    temporada (Everybody Hates Christmas), no qual Chris reflete sobre a

    intolerncia do pai de Greg no que diz respeito msica.

    24O.J. Simpson (1974-), famoso jogador negro de beisebol.

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    EXEMPLO 17TEMPORADA: 1 EPISDIO: 11 (Everybody Hates Christmas)TEMPO: 02:26 - 02:29 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):Years later, Gregplayed some Ice Cube25and his own

    father shot him.

    (Anos mais tarde, o Greg comeou a curtirfunk e o prprio pai deu um tiro nele.)

    Um caso em que a traduo do tipo C foi bem sucedida ocorre no

    quinto episdio da primeira temporada (Everybody Hates Fat Mike). Rochelle, ao

    voltar do trabalho, encontra a casa completamente bagunada. Julius finge estar

    dormindo no sof e pergunta o que vai ser o jantar. Indignada, Rochelle pergunta se

    ela se parece com a Florence dos Jeffersons. Essa uma referncia srie de TV

    The Jeffersons, transmitida pela CBS de 1975 a 1985 que retratava a vida de uma

    famlia de negros americanos de classe mdia alta. Florence Johnston era a

    empregada da famlia.

    A referncia obviamente no seria entendida pelo pblico brasileiro,

    pois a srie no foi transmitida no Brasil. O tradutor, acertadamente, simplificou a

    fala de Rochelle, trocando Florence dos Jeffersonspor domstica.

    EXEMPLO 18TEMPORADA: 1 EPISDIO: 05 (Everybod y Hates Fat Mike)

    TEMPO: 18:20 - 18:23 TIPO: CORIGINAL DUBLAGEMRochelle: Do I look like Florence fromThe Jeffersons?

    Rochelle: Por acaso eu tenho cara dedomstica?

    Outro exemplo desse tipo de traduo ocorre no episdio Everybody

    Hates Food Stamps (1 temporada, 9 episdio), no qualChris explica que sua me

    sempre tentava economizar ao fazer compras, evitando os produtos de marcas

    famosas. Ao invs de deixar o nome das marcas, o autor refere-se a elas de maneira

    coletiva (coisas para o caf da manh, quando chegava a vez do sabo, etc.). As

    falas da verso americana remetem a cereais (Fruit Loops, Cheerios, Frosted

    Flakes), biscoitos (Oreos, gingersnaps26, Chips Ahoy!) e sabonetes (Zest, Dial,

    Coast, Camay).

    EXEMPLO 19TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Food Stamps)TEMPO: 00:2601:11 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): So instead of FruitLoops, Cheeriosor Frosted Flakes, we

    (Ento, quando ela ia comprar coisas pra ocaf da manh, o que ela escolhia era...)

    25Nome artstico de OShea Jackson (1969-), rapper, ator, roteirista e produtor americano.

    26Gingersnap, na verdade, no uma marca de biscoito, mas um tipo (biscoito de gengibre).

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    gotChris: Cereal?()Chris (narrador):And instead of Oreos,gingersnaps or Chips Ahoy, we gotDrew: Cookie?

    ()Chris (narrador): When it came to soap,instead of Zest, Dial or Coast, we gotChris: Camay?27

    Chris: Cereal?

    (...)(Quando ela chegava na seo maisgostosa do mercado, ela comprava...)Drew: Biscoito?

    (...)(Quando chegava a vez do sabo, elapassava direto pelas marcas famosas ecomprava...)De coco?

    Ainda sobre marcas, no episdio Everbody Hates the Part-Time Job

    (1 temporada, 12 episdio), h uma cena em que o xarope Robitussin

    mencionado vrias vezes. Na dublagem, em todas as ocorrncias, o nome do

    produto substitudopor xarope.

    EXEMPLO 20TEMPORADA: 1 EPISDIO: 12 (Everybod y Hates the Part-Time Jo b)TEMPO: 12:1712: 45 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): Going to the doctorwas serious business, because usually ifsomething was wrong with one of us, myparents thought they could fix it withRobitussin.

    Drew: I burned my finger!Rochelle: Let me see, boy. Let me see.Now, take some Robitussin.

    Julius: Looks like her tooth broke off.Rochelle: I'll go get the Robitussin.

    Rochelle: What?Tonya: Momma, Chris just got hit by acar!Rochelle: Oh, my God! I'll go get theRobitussin.

    (Ir ao mdico era uma parada sria porque,em geral, se a gente ficava doente, meus paisachavam que ia curar a gente com umxaropinho.)

    Ai, me! Puxa, eu queimei meu dedo!Deixa eu ver, menino. Deixa eu ver.Toma um xarope!

    Parece que o dentinho dela caiu.

    Eu vou buscar o xarope.

    O que foi?Mame, o Chris foi atropelado!Ai, meu Deus! T, eu vou pegar o xarope!

    Voltando ao nono episdio, encontramos mais uma referncia a grupos

    musicais. Na cena, Chris e Greg esto na escola, discutindo sobre o tema de sua

    apresentao para a Feira de Cincias. Quando Greg sugere que eles faam um

    trabalho sobre as placas tectnicas, Chris (narrador) diz que pensava que esse fosse

    o nome original do Wu Tang Clan, grupo nova-iorquino de rapformado em 1992.

    Diferentemente das outras ocasies em que h referncias musicais, desta vez, o

    nome da banda originalmente mencionada no substitudo pelo de outra mais

    conhecida. Ao invs disso, temos uma referncia genrica ao tipo de msica que a

    banda toca.

    27Sabonete produzido pela Procter & Gamble desde 1926.

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    EXEMPLO 21TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Food Stamps)TEMPO: 00:2600:31 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): I thought PlateTectonics was the original name of the

    Wu Tang Clan.

    (Pensei que Placa Tectnicafosse o nomede um grupo de rapestourando por a.)

    O tipo C mostra-se bastante til, pois permite que o tradutor transmita

    seu sentido geral. Contudo, como j ressaltamos, tal tipo de traduo , s vezes,

    utilizado desnecessariamente. Constatamos vrios casos em que o tradutor tinha,

    sua disposio, um correspondente na lngua portuguesa. Um desses casos ocorre

    no primeiro episdio. Ao relembrar que seus irmos foram matriculados numa

    escola perto de casa, onde a maioria dos alunos era de negros, e ele tinha sido

    matriculado numa escola predominantemente branca do outro lado da cidade, Chriscomenta o tipo de educao recebida l: No era uma educao do tipo

    Harvard. A dublagem, no entanto, preferiu No era educao de primeira. Tal

    substituio parece-nos ter sido motivada pela restrio de tempo, pois no seria

    possvel fazer a mesma construo em portugus sem along-la, o que no poderia

    ser sincronizado com os movimentos labiais do ator na tela. Este um dos

    exemplos em que os aspectos tcnicos foram fator decisivo para a traduo.

    EXEMPLO 22TEMPORADA: 1 EPISDIO: 1 (The Pilot)TEMPO: 03:44 - 03:45 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): Not a Harvard-typeeducation...

    (No era educao de primeira...)

    No nono episdio, Chris fala para Greg que, sempre que ele liga a TV,

    sua irm quer assistir aos Care Bears. A dublagem, estranhamente, omitiu a

    referncia a essa srie bastante conhecida do pblico brasileiro, dando preferncia

    ao termo genrico desenho animado.

    EXEMPLO 23TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 02:12 02:18 TIPO: CORIGINAL DUBLAGEMChris: At least you get to watch a game.Every time I turn on the TV my sisterwants to watch the Care Bears.

    Pelo menos, voc consegue ver o jogo. Todavez que eu ligo a TV, minha irm quer verdesenho animado.

    No mesmo episdio, Chris (narrador) afirma que o Atari era o

    Playstationde 1982. Aqui, novamente, o tradutor poderia muito bem ter mantido o

    nome do jogo, visto que o console de videogame da Sony bastante popular no

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    Brasil. No entanto, a dublagem preferiu uma expresso mais abrangente.

    EXEMPLO 24TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 02:2602:29 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEM

    Chris (narrador): Atari was thePlayStation of 1982. (Atari era a tecnologia de ponta em 1982.)

    Ainda no episdio Everybody Hates Greg, Greg convida Chris para

    jogar videogamena sua casa. Quando Chris est prestes a ir embora, o pai de Greg

    chega, e Greg impede Chris de sair, afirmando, amedrontado, que seu pai o probe

    de receber visitas enquanto estiver sozinho. Nesse momento, o narrador compara o

    pai de Greg a Ike Turner (1931-2007), que foi marido da cantora Tina Turner de

    1962 a 1978. Ela o acusou de espanc-la violentamente vrias vezes, o que rendeu a

    ele a fama de homem violento. O dublador, no entanto, deve ter julgado esse fato

    desconhecido do pblico brasileiro, pois omitiu essa referncia, substituindo-a por

    uma expresso de sentido vago. Mais uma vez, a dublagem favorece a

    compreenso, em detrimento da comicidade da fala.

    EXEMPLO 25TEMPORADA: 1 EPISDIO: 09 (Everybod y Hates Greg)TEMPO: 09:0309:06 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador):Greg looked at me like

    his father was Ike Turner.

    (Greg me olhou como se o pai dele fosse o

    maior monstro.)

    Na segunda temporada, no episdio em que Chris se candidata a

    presidente do grmio escolar (Everybody Hates the Class President, 2 episdio),

    ele e Greg esto com dificuldades para conseguir votos. Ento, discutem como

    podem ser iguais ao DiPaolo, um dos alunos mais populares da escola. Quando

    Chris fala que ele burro como uma porta, Greg retruca que, apesar de ser burro,

    DiPaolo querido pelas pessoas, Chris (narrador) comenta que isso foi o que

    disseram sobre Fabio. Ele se refere a Fabio Lanzoni (1959-), ator e modelo italianoconhecido nos EUA. Na dublagem, essa referncia foi substituda, como podemos

    ver abaixo.

    EXEMPLO 26TEMPORADA: 2 EPISDIO: 02 (Everybod y Hates the Class President)TEMPO: 06:44 - 06:50 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMGreg: He might be dumb, but people likehim.Chris (narrador): They said the samething about Fabio.

    Pode ser burro, mas gostam dele.Dizem a mesma coisa das modelos e dasmanequins.

    Em outro episdio (Everybody Hates the Buddy System, 2

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    temporada, 6 episdio), o tradutor generalizou duas referncias de uma s vez.

    Devido s suas desavenas, Chris e Caruso so chamados sala do diretor. Chris

    acusa Caruso de odiar pessoas negras, e este se defende dizendo que gosta de vrios

    artistas e celebridades negras. Chris, ento, contesta a validade de tal afirmao

    dizendo: S por que voc assiste ao Soul Train, isso no te faz o Don Cornelius..

    Soul Train foi um programa musical da TV americana transmitido de 1971 a

    2006. Em geral, apresentava artistas negros. Don Cornelius (1936-) foi seu produtor

    e primeiro apresentador.

    Nesse caso, a dublagem simplificou bastante a fala do personagem,

    eliminando as referncias a cones musicais dos Estados Unidos, Mais uma vez,

    parece-nos que a durao da fala traduzida no combinaria com os movimentoslabiais do ator.

    EXEMPLO 27TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 01:24 - 01:26 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (para Caruso): Just because youwatch Soul Train, don't make you DonCornelius.

    S porque gosta desses caras, voc no virao rei do Soul.

    Finalmente, no mesmo episdio, ao ser convidado por Greg para jogar

    videogamena casa dele, Chris comenta que as coisas no tem nenhum problema, ao

    que o narrador comenta, ironicamente, que isso o que as pessoas diziam quando

    estavam embarcando no Amistad. Esse foi um navio negreiro cubano que, em

    1839, aps motim dos escravos, foi parar na costa leste dos Estados Unidos, sendo

    capturado por autoridades americanas. A situao dos escravos ganhou notoriedade

    com o julgamento do caso pela Suprema Corte, que, aps dois anos, decidiu que os

    escravos deveriam ser libertados e conduzidos de volta frica.

    Apesar de o nome da embarcao mencionada ter se tornado clebre

    aps um filme homnimo, dirigido por Steven Spielberg, ter sido lanado em 1997,

    o tradutor preferiu eliminar essa referncia e usar um termo mais comum.

    EXEMPLO 28TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 05:46 - 05:51 TIPO: C

    ORIGINAL DUBLAGEMChris: I mean, it can't get any worse.Chris (narrador):That's what people said

    while they were boarding the Amistad.

    Pior do que isso no pode ficar.(A rapaziada dizia isso quando embarcava

    nos navios negreiros.)

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    3.4.Tipo D (domesticao)

    Dos tipos de traduo vistos at aqui, o tipo D traz as tradues mais

    domesticadas, pois os termos originais so substitudos por palavras e expresses da

    lngua da cultura-alvo que, em tese, teriam a mesma funo que eles. O que causa

    mais estranheza o fato de que o tradutor, com o intuito de representar o sentido do

    texto original com palavras da cultura-alvo, acaba aproximando-o demasiadamente

    desta. Assim, o visual indica jovens americanos da dcada de 1980, mas o udio

    incoerentemente os mostra fazendo referncias cultura brasileira.

    Dois casos nos pareceram dignos de destaque. No segundo episdio da

    segunda temporada, Chris convida DiPaolo a ser seu vice na chapa para presidente

    do grmio escolar. Tentando soar mais convincente, Chris argumenta que eles

    podem ser como Bobby Jones e Henry Bibby, jogadores que faziam dupla no

    Philadelpia 76ers, time de basquete da NBA, na dcada de 1980. DiPaolo, ento,

    pergunta se eles podem ser como Kevin McHale e Dennis Johnson, dos Celtics, time

    rival dos 76ers. Na dublagem, essa passagem foi completamente domesticada, pois

    o tradutor procurou fazer referncia a desportistas igualmente famosos, s que no

    Brasil. O texto traduzido mostra-se incompatvel com o ambiente em que vivem os

    personagens, como podemos verificar na transcrio do dilogo mostrada a seguir.

    EXEMPLO 29TEMPORADA: 2 EPISDIO: 02 (Everybod y Hates The Class President)TEMPO: 10:37 - 10:41 TIPO: D

    ORIGINAL DUBLAGEMDiPaolo: Vice president?Chris: Yeah, with me. We can be likeBobby Jones and Henry Bibby on theSixers28.DiPaolo: Can we be like Kevin McHale

    and Dennis Johnson on the Celtics29?

    Vice-presidente?, comigo. A gente podia ser tipo Pel eTosto na Copa de 70.D pra ser Toninho Cereso e Serginho daltima Copa?

    Em outro episdio (Everybody Hates the Buddy System), mais uma

    vez o tradutor recorre a Pel para substituir o nome de um famoso desportista

    americano. Na cena, Julius presenteia Drew com uma camisa de hquei do jogador

    Wayne Gretzky (1961-). Porm, o nome do jogador est grafado incorretamente nas

    costas da camisa (Gritzky).Chris (narrador) ento diz que, no ano seguinte, seu

    irmo ganhou uma camisa dos Yankees com o nome Mezzie Mackson escrito nas

    28

    Bobby Jones e Henry Bibby foram jogadores de basquete do Philadelphia 76s nos anos 80.29Kevin MacHale e Dennis Johnson jogavam basquete no Boston Celtics, o principal rival do76ers.

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    costas. Isso provavelmente uma corruptela do nome de Reggie Jackson, jogador de

    beisebol que integrou a equipe do New York Yankees de 1977 a 1981. A dublagem

    substituiu o nome errado do jogador por Pil, em uma bvia referncia ao jogador

    de futebol brasileiro.

    EXEMPLO 30TEMPORADA: 2 EPISDIO: 06 (Everybod y Hates the Bu ddy System)TEMPO: 15:0515:10 TIPO: D

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrador): The next year, Drewgot a Yankees jersey that said MEZZYMAXIN.

    (Um ano mais tarde, o Drew ganhou umuniforme com PIL escrito nas costas.)

    Finalmente, temos mais uma ocorrncia de domesticao que envolve as

    modalidades esportivas preferidas nos dois pases: o futebol americano, nos EUA, e

    o futebol, no Brasil. No Dia de Ao de Graas, o pai de Chris mobiliza toda afamlia no preparo da ceia. Chris o compara a um jogador de futebol americano em

    ao (quarterback running player), enquanto a traduo faz meno a uma figura

    altamente popular no Brasil.

    EXEMPLO 31TEMPORADA: 2 EPISDIO: 8 (Thanksgiv ing)TEMPO: 04:05 - 04:10 TIPO: E

    ORIGINAL DUBLAGEMChris (narrator): Because my fatherreally wanted to impress his brother, my

    dad was cooking like a quarterback30running player