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109 REVISTA DE SOCIOLOGIA E POL˝TICA N” 18: 109-129 JUN. 2002 RESUMO Rev. Sociol. Polt., Curitiba, 18, p. 109-129, jun. 2002 Este trabalho discute as transiıes polticas no Brasil no contexto da globalizaªo. Focaliza os legados polticos que ofereceram resistŒncia aos processos externos e os novos freios e contrapesos que constituram condiıes relevantes para o processo de formulaªo e tomada de decisªo de poltica nos anos 90. Indica tambØm que o gerenciamento de polticas macroeconmicas, combinado com o processo poltico mais amplo, foi uma importante dimensªo das transiıes. Conclui salientando a existŒncia de desafios no mbito do tratamento da questªo social e dos vnculos entre os mbitos interno e externo. PALAVRAS CHAVE: transiıes polticas; processos decisrios; poltica externa brasileira; inflaªo; poltica de estabilizaªo. GLOBALIZA˙ˆO E TRANSFORMA˙ES POL˝TICAS RECENTES NO BRASIL: OS ANOS 1990 1 1 Esta Ø uma versªo reformulada do trabalho Globalization and Recent Political Transitions in Brazil apresentada no SeminÆ- rio Internacional Progress and Challenge of Democra- tization and Economic Liberalization, realizado sob o patro- cnio do Kellog Center, na Michigan State University (Michi- gan, EUA), de 14 a 16 de abril de 2000; tambØm foi apresen- tado no 2” Encontro Anual da Associaªo Brasileira de CiŒn- cia Poltica, realizado em novembro de 2000, na Pontifcia Universidade Catlica de Sªo Paulo. Maria Izabel Valladªo de Carvalho Universidade de Braslia Marcus Faro de Castro Universidade de Braslia I. INTRODU˙ˆO Durante uma viagem feita ao Uruguai no incio de maro de 2000, o Presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC), declarou aos jornais que as tarifas impostas pelo governo americano sobre as importaıes de ao e suco de laranja brasileiros estavam diretamente ligadas s precÆrias condiıes sociais em seu pas. Cardoso perguntou: Qual Ø a responsabilidade que tŒm os mercados americanos ou europeus para que nªo se abram as economias, para que se mantenha a situaªo de fome aqui? (Folha de S. Paulo, 02.mar.2000). Cardoso tambØm declarou que as polticas comer- ciais americanas tŒm uma relaªo direta com o emprego daqui e com a condiªo de vida do povo brasileiro. Estas afirmaıes do Presidente Cardoso vieram como resposta a um relatrio publicado pelo gover- no americano, que chamava a atenªo para o desempenho insuficiente do governo brasileiro com relaªo proteªo dos direitos humanos, incluindo, segundo o ponto de vista de Washington, um fraco desempenho na promoªo da justia social, como, por exemplo, nas Æreas referentes s relaıes trabalhistas e ao salÆrio mnimo (UNITED STA- TES OF AMERICA, 2000). Cardoso tambØm suge- riu que as informaıes veiculadas pelo governo americano eram muito enganosas (Folha de S. Paulo, 02.mar.2000), jÆ que levaram em conta o dlar americano como base de cÆlculo do salÆrio mnimo, ao invØs de os valores dos bens de con- sumo locais em reais. As declaraıes do Presidente Cardoso sªo um exemplo de como as transformaıes da poltica e da economia mundiais, assim como de outras condiıes nos anos recentes conhecidas como globalizaªo tŒm tido um impacto nos proces- sos polticos e econmicos das diferentes socie- dades do mundo. Liberalizaıes das contas de capital, que tŒm sido praticadas em vÆrios pases; o impulso em direªo liberalizaªo comercial desde as rodadas de negociaªo do GATT; a difusªo da democracia no mundo tudo isso tem contri- budo para um aumento da interaªo ou competiªo de interesses tanto econmicos quanto polticos, nªo somente dentro dos territrios de Estados, mas tambØm entre Estados, e talvez em uma escala de intensidade sem precedentes.

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REVISTA DE SOCIOLOGIA E POLÍTICA Nº 18: 109-129 JUN. 2002

RESUMO

Rev. Sociol. Polít., Curitiba, 18, p. 109-129, jun. 2002

Este trabalho discute as transições políticas no Brasil no contexto da globalização. Focaliza os legados políticos queofereceram resistência aos processos externos e os �novos freios e contrapesos� que constituíram condições relevantespara o processo de formulação e tomada de decisão de política nos anos 90. Indica também que o gerenciamento depolíticas macroeconômicas, combinado com o processo político mais amplo, foi uma importante dimensão das transições.Conclui salientando a existência de desafios no âmbito do tratamento da questão social e dos vínculos entre os âmbitosinterno e externo.

PALAVRAS CHAVE: transições políticas; processos decisórios; política externa brasileira; inflação; política de estabilização.

GLOBALIZAÇÃO E TRANSFORMAÇÕESPOLÍTICAS RECENTES NO BRASIL:

OS ANOS 19901

1 Esta é uma versão reformulada do trabalho Globalizationand Recent Political Transitions in Brazil apresentada no Seminá-rio �Internacional Progress and Challenge of Democra-tization and Economic Liberalization�, realizado sob o patro-cínio do Kellog Center, na Michigan State University (Michi-gan, EUA), de 14 a 16 de abril de 2000; também foi apresen-tado no 2º Encontro Anual da Associação Brasileira de Ciên-cia Política, realizado em novembro de 2000, na PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo.

Maria Izabel Valladão de CarvalhoUniversidade de Brasília

Marcus Faro de CastroUniversidade de Brasília

I. INTRODUÇÃO

Durante uma viagem feita ao Uruguai no iníciode março de 2000, o Presidente Fernando HenriqueCardoso (FHC), declarou aos jornais que as tarifasimpostas pelo governo americano sobre asimportações de aço e suco de laranja brasileirosestavam diretamente ligadas às precáriascondições sociais em seu país. Cardoso perguntou:�Qual é a responsabilidade que têm os mercadosamericanos ou europeus para que não se abramas economias, para que se mantenha a situação defome aqui?� (Folha de S. Paulo, 02.mar.2000).Cardoso também declarou que as políticas comer-ciais americanas têm uma relação direta com �oemprego daqui� e com a �condição de vida� dopovo brasileiro.

Estas afirmações do Presidente Cardoso vieramcomo resposta a um relatório publicado pelo gover-no americano, que chamava a atenção para o

desempenho insuficiente do governo brasileiro comrelação à proteção dos direitos humanos, incluindo,segundo o ponto de vista de Washington, um fracodesempenho na promoção da justiça social, como,por exemplo, nas áreas referentes às relaçõestrabalhistas e ao salário mínimo (UNITED STA-TES OF AMERICA, 2000). Cardoso também suge-riu que as informações veiculadas pelo governoamericano eram �muito enganosas� (Folha de S.Paulo, 02.mar.2000), já que levaram em conta odólar americano como base de cálculo do saláriomínimo, ao invés de os valores dos bens de con-sumo locais em reais.

As declarações do Presidente Cardoso são umexemplo de como as transformações da política eda economia mundiais, assim como de outrascondições nos anos recentes � conhecidas como�globalização� � têm tido um impacto nos proces-sos políticos e econômicos das diferentes socie-dades do mundo. Liberalizações das contas decapital, que têm sido praticadas em vários países;o impulso em direção à liberalização comercialdesde as rodadas de negociação do GATT; a difusãoda democracia no mundo � tudo isso tem contri-buído para um aumento da interação ou competiçãode interesses tanto econômicos quanto políticos,não somente dentro dos territórios de Estados,mas também entre Estados, e talvez em uma escalade intensidade sem precedentes.

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2 Para uma discussão das diferenças entre as vertentes doneo-institucionalismo (escolha racional, teoria das organi-zações e institucionalismo histórico), ver Immergut (1998).

Porém, o impacto desses fatos ocorridos noambiente internacional não tem sido o mesmo paratodas as sociedades e estados. As diferenças podemser explicadas pela presença de condições locaisespecíficas que alimentam distintas reações a in-fluências externas e que podem modificar anatureza e/ou o timing das transformações po-líticas. Tais condições locais referem-se à maneiracomo valores ou idéias relevantes para o processode formulação e implementação de políticas e paraa organização institucional, por um lado, e osinteresses econômicos e políticos locais, por outrolado, interagem com as forças econômicas exter-nas sob instituições e histórias institucionais locais.

As abordagens históricas neo-institucionalistasrelativas às políticas contemporâneas (em oposi-ção às abordagens neo-institucionalistas com basena teoria da escolha racional)2 têm oferecido análi-ses esclarecedoras sobre a mudança política e astransições no processo de policy-making de dife-rentes nações. Um exemplo bem conhecido é adescrição de como a mudança do modo pré-keynesiano para o keynesiano de formulação eimplementação de políticas ocorreu nos EstadosUnidos, na Suécia e na Grã-Bretanha, no início dagrande depressão dos anos 30 (WEIR & SKO-CPOL, 1985). O ponto relevante nesse tipo deanálise, que também será explorado no nossotrabalho, é a ênfase dada aos condicionamentosimpostos por políticas públicas, estruturas estataise �capacidades burocráticas� às ações de mudança,exercidas por grupos sociais, partidos políticos egovernos.

O foco do nosso trabalho são as transiçõespolíticas e econômicas relativas à política brasilei-ra, no contexto da globalização. Consideraremos,por um lado, as resistências oferecidas pelo legadodo modelo desenvolvimentista e da estrutura corpo-rativa que o acompanhou e, por outro lado, asinovações nas orientações ideológicas e de valor,bem como no contexto social e institucional dopaís, que têm influenciado o processo de tomadade decisão de políticas públicas desde os anos 80.As resistências e as inovações, por sua vez, serãoinvestigadas no contexto de forças econômicasexógenas (�supranacionais� ou �internacionais�).

Portanto, serão discutidas neste estudo transi-ções recentes ocorridas no Brasil, tanto do pontode vista do impacto da globalização sobre o pro-cesso político democrático e sobre as políticas deliberalização, quanto do ponto de vista das condi-ções políticas domésticas que alteraram o timinge a natureza das transformações institucionais.

O estudo começará com a análise da formaçãodo modelo desenvolvimentista e da estrutura cor-porativista de intermediação de interesses nos anos30 e do populismo macroeconômico nos anos 60,ressaltando a sua permanência até os anos 80. Emseguida, será examinado o surgimento, durante adécada de oitenta, de uma considerável descentrali-zação do poder social e político, com a criação de�novos freios e contrapesos� para a operação doprocesso de tomada de decisão pública. A seçãoseguinte examina os efeitos dos �novos freios econtrapesos� no processo decisório de políticaspúblicas. Os anos noventa serão abordados, porum lado, pela perspectiva da influência dos �novosfreios e contrapesos� e, por outro lado, mediantea análise das relações entre a política externa e adoméstica. A conclusão ressalta que a transiçãodos anos 1990 resultou, por um lado, na erosãodo legado do Estado desenvolvimentista e, poroutro lado, nas transformações institucionais quetrouxeram novos condicionantes para o processopolítico e para a formulação e implementação depolíticas econômicas.

II. RESISTÊNCIAS E TRANSIÇÕES ANTIGAS

A globalização econômica foi em grande parteo resultado do declínio das condições econômicasmundiais que prevaleceram durante o período daGuerra Fria. Durante essa fase, fizeram-se esfor-ços em prol da manutenção da paz e da liberalizaçãoeconômica, por meio das rodadas de negociaçãodo GATT, bem como em prol da manutenção deum regime de taxas de câmbio praticamente fixasem todo o mundo, apoiado na assistência financei-ra dada pelo FMI aos governos com dificuldadesno balanço de pagamentos. A recusa de europeuse japoneses em comprar papéis americanos, posi-cionando-se assim contra os déficits dos EstadosUnidos, derivados do financiamento inflacionáriode gastos desse país em programas sociais e naGuerra do Vietnã nos anos 1960 (COX, 1994),criou tensões no sistema econômico mundial. Es-ses fatores contribuíram para o fim do regime cam-bial de Bretton Woods. A suspensão da conversi-bilidade do dólar em ouro pelo Presidente RichardNixon em 1971 foi um grande golpe para o sistema

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econômico internacional. A desregulamentação dosmercados financeiros preparou o terreno para ainternacionalização da indústria bancária na décadade 80, enquanto a liberalização das contas de capi-tal em diversos países combinada com os riscosinerentes à flutuação das taxas de câmbio conduziuao aumento da vulnerabilidade de economiasnacionais, devido ao conseqüente crescimento davolatilidade dos mercados financeiros. Além disso,a tentativa de cartelização efetuada pelos paísesprodutores de petróleo (OPEP) e a elevação dataxa de juros americana sob Paul Volker na décadade 1980 deixaram muitos países em desenvolvi-mento, inclusive o Brasil, em graves dificuldadeseconômicas.

Diversos estados promoveram ajustes a essas

novas condições econômicas mundiais. Contudo,enquanto o ambiente econômico internacionalsofria modificações, as transições no Brasil fo-ram lentas e vieram atingir um ponto de rupturaquando a inflação alcançou os quatro dígitos nofinal da década de 1980 (ver Gráfico 1 abaixo).De fato, enquanto a maioria dos países latino-americanos já tinha adotado reformas liberais (pró-mercado) no final da década de 1980, o Brasil eraconsiderado, juntamente com Cuba, um dos doiscasos de ajuste tardio no hemisfério (ALMEIDA,1996, p. 214). A lentidão da reação brasileira àglobalização pode, em grande parte, ser atribuídaà permanência de estruturas estatais e de idéias epráticas referentes aos processos de formulaçãoe implementação de políticas legadas do passado.

GRÁFICO 1 � Inflação anual medida pelo IPCA no mês de dezembro (1981-1999)

Fonte: IBGE (s/d).

A seqüência pela qual o processo políticodesenvolveu-se ao longo do século XX no Brasil,em seus traços gerais, pode ser descrita da se-guinte maneira:

(i) durante a República Velha (1891-1930) oprocesso político dependia do poder de oligarquiasrurais e a economia baseava-se na exportação deprodutos primários;

(ii) a combinação de governos oligárquicos ede uma economia orientada para a exportação deprodutos primários declina a partir da década de

1930, com a emergência de um poder Executivofederal voltado para a promoção da industria-lização;

(iii) as principais características desse arranjoduraram cerca de 50 anos � 1930-1980;

(iv) na década de 1980, novas práticas e con-dições institucionais começaram a emergir no con-texto de uma transição para a democracia, em dire-ção a uma �descentralização política� que se dis-tanciava muito de uma preeminência político-administrativa do poder Executivo federal.

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O ano de 1930 foi realmente um marco, pois apartir daí se iniciou o processo de evolução dapolítica oligárquica para as políticas populistas cen-tralizadoras, bem como a construção do modelodesenvolvimentista de formulação e implementaçãode políticas. Isso correspondeu, de certa forma,às mudanças ocorridas em outras sociedades, taiscomo as transições de políticas liberais para políti-cas keynesianas intervencionistas, típicas do NewDeal nos EUA e do Welfare State na EuropaOcidental.

O modelo desenvolvimentista caracterizou-sepor: 1) um papel ativo do Estado na promoção docrescimento econômico por meio da industriali-zação rápida; 2) uma política comercial protecio-nista; 3) estruturas estatais regulatórias e financei-ras (crédito oficial), e 4) uma participação diretado Estado no processo produtivo, com a criaçãode empresas públicas. A implementação desse mo-delo estimulou o crescimento econômico impulsio-nado pela produção industrial promovida mediantepolíticas de substituição de importações.

O desenvolvimentismo atravessou diferentesfases da evolução política do país:

a) o período da transição de uma estrutura políticaoligárquica descentralizada para a centra-lização política (1930-1937);

b) o período da ditadura civil (1937-1945);

c) o período do populismo democrático (1946-1964);

d) o período da ditadura militar (1964-1985), e

e) o período de reformas de transição (1986-pre-sente).

As políticas desenvolvimentistas tiveram oapoio ativo dos grupos industriais, dos sindicatose da classe média que se expandia. Tais gruposforam também produtos das novas condições eco-nômicas e sociais resultantes do declínio da hege-monia das políticas oligárquicas. A prevalênciapolítica do novo modelo expressou-se no poderdominante exercido no Congresso Nacional pelacoalizão entre o Partido Social Democrático (PSD)e o Partido Trabalhista Brasileiro (PTB). Essasforam as organizações partidárias que, de 1946 a1964, proporcionaram as vias de negociação políti-ca com a Presidência da República. O PSD absor-veu e adaptou formas anteriores de exercício dopoder presidencial, que passaram a ser postas emprática por meio da estrutura das interventorias

estaduais criadas durante o Estado Novo. O PTB,por sua vez, estabeleceu vínculos desde a sua ori-gem com a estrutura corporativista instituída en-tre 1930 e 1945 (SOUZA, 1990).

Tal estrutura ganhou amplos contornos, incluin-do dimensões econômicas, político-administrati-vas e sociais. O aspecto econômico de tal estruturacompreendeu quatro tipos de instrumentos: �a)órgãos destinados a equilibrar consumo e produçãoem setores agrícolas e extrativos, ou reger suaimportação e exportação; b) órgãos destinados aaplicar medidas de incentivo à indústria privada;c) órgãos destinados à implantação, ampliação ouremodelação de serviços básicos de infra-estruturapara a industrialização; [e] d) órgãos destinados aingressar diretamente em atividades produtivas�(idem, p. 99). O segmento político-administrativodo corporativismo estava sediado no Departamen-to Administrativo do Serviço Público (DASP), umsuperministério cujos escritórios regionais quasesempre funcionavam como escritórios políticospara as políticas presidenciais (idem, p. 96-98).Finalmente, o componente social dessa estruturaconstituiu-se em um conjunto diversificado de fun-dos de aposentadoria e fundos de seguridade so-cial supervisionados pelo Ministério do Trabalho(MALLOY, 1979). A dimensão social da estruturacorporativista, juntamente com a justiça trabalhista,também instituída por Vargas no início da décadade 40, foram os meios pelos quais se desenvolveuuma forma de tutelagem política exercida sobre apopulação, e chamada de cidadania regulada(SANTOS, 1979).

As políticas populistas desde os anos 30 basea-ram-se na legitimação plebiscitária do poder cen-tralizador do Presidente da República, comple-mentada pela supressão da vida partidária (de 1930a 1946), e pela hegemonia da coalizão PSD-PTB(1946-1964). Supuseram também a distribuiçãoclientelística de subsídios, rendas e benefícios agrupos econômicos e sociais por meio da estruturacorporativista, de maneira orquestrada pelo poderExecutivo federal.

As características do modelo desenvolvimen-tista permaneceram por muitas décadas, sendomantidas e expandidas durante a fase autoritária(1964-1984). Contudo, paralelamente às estruturasdo modelo desenvolvimentista dos anos 1930-1950, uma outra característica institucional desen-volveu-se e adquiriu uma relevância crucial desdemeados dos anos 1960. Trata-se do uso político,

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pelo Executivo federal, da administração macro-econômica e de seus impactos econômicos e so-ciais. Essa nova característica do aparelho institu-cional pode ser chamada de uso político da admi-nistração macroeconômica, que, no caso brasileiro,tomou inicialmente a forma do populismo macro-econômico3. O uso político da administraçãomacro-econômica resultou dos comportamentospolíticos induzidos pela percepção social dasvariações das oportunidades de investimento econsumo, que podem ser combinadas com alegitimação plebiscitária do poder presidencial. Opopulismo macroeconômico é o uso político daadministração macroeconômica em que a ênfasepreferencial da política econômica recai sobre ocrescimento e a redistribuição da renda, emdetrimento de preocupações com tendênciasinflacionárias e constrangimentos externos.

A introdução do populismo macroeconômico

no Brasil mudou a forma como os governostratavam os conflitos políticos. Enquanto até adécada de 1930 as tendências de acirramento doconflito político permaneciam sob o controle dasformas de dominação oligárquica, no Estadodesenvolvimentista elas passaram a ser objeto daspráticas de patronagem, do clientelismo e da ope-ração das estruturas corporativistas. Finalmente,durante o regime militar, foram em grande partereprimidas pela coerção e absorvidas pela dinâmicado �uso político da administração macroeconô-mica�. Neste último caso, passaram a interagir asdecisões e medidas de política macroeconômica,a formação de expectativas e decisões dos agenteseconômicos e as oscilações na opinião pública. Ainfluência mútua desses fatores no uso políticoda administração macroeconômica evidentementeintensificou-se com a ampliação do sufrágio paracamadas cada vez maiores da população, comoindicado na Tabela 1.

O uso político da administração macroeconô-mica e o desenvolvimento do populismo macro-econômico foram favorecidos pela internacionali-zação da Ciência Econômica em seus aspectosprofissional e acadêmico e pelo crescimento dessadisciplina como uma área específica de conhe-cimento no Brasil (LOUREIRO, 1997, p. 61-117).A transformação das múltiplas e potencialmenteconflituosas práticas clientelísticas em procedi-mentos decisórios da administração macroeconô-mica4 foi viabilizada e ampliada pela implementação

TABELA 1 � Número de votantes como porcentagem da população total (1945-1990)Ano 1945 1960 1966 1970 1974 1978 1982 1986 1988 1990

Porcentagem 16 22 27 31 35 41 47 52 54 55

Fonte: Souza (1992, p. 197).

gradual de serviços de estatística e pela padroniza-ção de métodos contábeis utilizados na gerênciadas finanças públicas. No caso dos gastos sociais,essa transformação implicou, por exemplo, a uni-ficação do sistema de seguridade social, revertendoa tendência de multiplicação das instituiçõesprevidenciárias, cujo número cresceu constante-mente desde os anos 30 até os anos 40 e começoua decrescer nos anos 50, até a criação do InstitutoNacional de Previdência Social (INPS) em 1967(MALLOY, 1979, p. 83-145; ver Tabela 2 adian-te). A criação da Superintendência Monetária e deCrédito (SUMOC) em 1945 e do Banco Centraldo Brasil em 1964 são outros exemplos de refor-mas que possibilitaram o desenvolvimento do usopolítico da administração macroeconômica, inicial-mente sob a forma do populismo macroeconômicono Brasil.

3 Alguns autores descreveram a adoção de políticas fiscais emonetárias na América Latina e deram-lhe o nome de"populismo econômico" (cf. estudos em DORNBUSH &EDWARDS, 1991). De um modo geral, tais autores destacamo fato de que o populismo econômico acaba frustrando aredistribuição da renda que seria corretiva da pobreza, (ver,por exemplo, CARDOSO e HELWEGE, 1992). Contudo,outros autores interpretam diversamente as relações entre apolítica, tomada em sentido amplo, e a política econômica.Hirschmann (1985), por exemplo, defende os efeitos �positi-vos� dos usos políticos da inflação.

4 Tais procedimentos são caracterizados pelo alto insula-

mento burocrático, que concentra a discricionariedade admi-nistrativa mediante o foco exclusivo na regulamentação des-personificada, neutra em relação a valores e precisamentequantificada, dos fluxos monetários.

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Durante o regime militar, o populismo macro-econômico utilizou três importantes mecanismos:(i) a correção monetária, desde 1964; (ii) asminidesvalorizações cambiais, desde 1967, e (iii)as isenções fiscais. Esses foram o que Skidmore(1973, p. 28-31) chamou de �dispositivosautomáticos�, adotados no processo de adminis-tração macroeconômica e constituindo meios ca-pazes de evitar a multiplicação das crises políticasdurante a ditadura militar, mediante a supressãode procedimentos políticos competitivos.

No final da década de 70, ainda durante operíodo da ditadura militar, dado o aumento nospreços das importações de petróleo, as condiçõeseconômicas internacionais já eram altamente desfa-voráveis à manutenção da linha de políticas desen-volvimentistas, que se apoiava nos gastos públicospara promover o crescimento. Contudo, mesmodiante desse contexto externo desfavorável, o Pre-sidente Geisel (1974-1979) decidiu adotar oSegundo Plano Nacional de Desenvolvimento, cujaestratégia insistiu na substituição de importações.Essa estratégia também incluiu a obtenção de em-préstimos comerciais externos, o que foi inicial-mente viável, tendo em vista a disposição do sis-tema financeiro internacional em reciclar petro-dólares (KAPSTEIN, 1994). Porém, ao longo dadécada de 1980, essa estratégia resultou em difi-culdades econômicas ainda mais graves, originadasdo desequilíbrio do balanço de pagamentos e dosimpactos fiscais do aumento das taxas de jurosnorte-americanas sobre os serviços da dívidaexterna brasileira.

Apesar dos esforços da oposição ao regimemilitar, a transição democrática em 1985 poderiater trazido apenas mais um intervalo democráticono contexto de um padrão cíclico de mudançapolítica marcado pela alternância de governos civise militares no poder, mantendo-se a constante domodelo desenvolvimentista. Em outras palavras,a transição democrática dos anos 80 poderia ter

resultado em uma segunda experiência de populis-mo democrático alinhado ao modelo desenvolvi-mentista. Foi o que ocorreu inicialmente sob aadministração do Presidente Sarney. Porém, essafase não teve continuidade, sendo o modelo desen-volvimentista abandonado nos anos 90.

As novas condições responsáveis pela quebrado padrão cíclico da política brasileira foram umacombinação de: (a) reformas institucionais introdu-zidas no processo de reconstrução do regime de-mocrático brasileiro, especialmente um federalismorevitalizado, que reinstituiu e ampliou proce-dimentos de competição política, fazendo assimdo populismo macroeconômico algo menos facil-mente gerenciável; (b) o crescimento de um plura-lismo de interesses mais diversificado na sociedadebrasileira, devido em parte ao grande crescimentoda população urbana durante as décadas de indus-trialização rápida, e (c) a mudança do populismomacroeconômico para o pragmatismo macro-econômico sob o Plano Real do então MinistroFernando Henrique Cardoso, passando pelo breveinterregno do �personalismo plebiscitário� doPresidente Collor. Esses pontos serão consideradosa seguir.

III. O SURGIMENTO DOS NOVOS FREIOS ECONTRAPESOS

Os estudos sobre a transição democrática noBrasil tendem a enfatizar os entendimentosrealizados entre as elites e as suas conseqüênciaspara a construção de uma ordem democrática(O�DONNELL, 1988; LINZ, 1990). Entretanto,a transição foi também um processo pelo qual opoder social e político foi amplamente distribuídoa diferentes grupos durante a década de 80. Issointroduziu novas condições e tendências na ope-ração do sistema político, contrastantes com a tra-dição de centralização política no Executivo fede-ral, que vinha acompanhando a adoção do modelodesenvolvimentista e do corporativismo desde os

Ano Instituições Segurados ativos Segurados inativos

1923 24 22 991 -

1930 47 142 464 8 009

1940 95 1 912 972 34 837

1950 35 3 030 708 181 267

1960 6 4 222 470 518 088

1970 1 9 545 000 890 000

TABELA 2 � Evolução do sistema de seguro social no Brasil (1923-1970)

Fonte: Malloy (1979, p. 102).

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anos 30. Foi esse legado que começou a sermodificado durante a transição para a democracianos anos 80. Quatro fatores contribuíram de modocrucial para a criação de um novo ambienteinstitucional. O primeiro foi o das eleições diretaspara governadores de estado em 1982. O segundoconstituiu-se na adoção de uma nova Constituiçãoem 1988. A hiperinflação, que frustrou o populismomacroeconômico, destacou-se como um terceiroingrediente. Finalmente, o quarto elemento quetrouxe ímpeto a essas mudanças foi a multiplicaçãode uma grande variedade de grupos de interesse,que se constituíram paralelamente à estruturacorporativa.

As eleições de 1982 foram um primeiro passoem direção à descentralização do poder do Exe-cutivo federal e forneceram mais liberdade de açãopara negociações subseqüentes relativas à transiçãopara a democracia. Como foi indicado por SallumJr. e Kugelmas (1993, p. 290): �A realização dasprimeiras eleições diretas para os governos esta-duais em 1982 e a expectativa de que o processode abertura política prosseguiria sem retrocessosabalaram a hierarquia existente entre os várioscentros de poder político�. Assim, desde 1983 opoder dos partidos de oposição cresceu, e o poderdo governo federal de influenciar as políticas locaisdeclinou. As eleições foram, de fato, �[o] rompi-mento do esquema de controle do poder centralsobre a federação� (ibidem). Isso afetou tambémo relacionamento entre o Congresso brasileiro e onão-mais-monolítico poder Executivo federal. Emresumo, �centros institucionais de poder antessubalternos, como os partidos, Congresso Nacio-nal, Executivos estaduais etc. foram ganhandoautonomia em relação ao poder central e maiorrepresentatividade popular� (idem, p. 291).

Um segundo passo que consolidou a tendênciade descentralização durante a transição para ademocracia no Brasil foi a promulgação da Consti-tuição de 1988. A nova carta política incorporouvários dispositivos que produziram efeitos políticose econômicos significativos. Entre eles destacam-se: o reforço do poder do Congresso Nacional pe-rante o Executivo federal; a repartição federativadas receitas tributárias, com a criação do Fundode Participação dos Estados e do Fundo de Partici-pação dos Municípios; a adoção de uma carta dedireitos detalhada, acompanhada de dispositivosque deram autonomia ao Poder Judiciário e aoMinistério Público. Um federalismo mais forte,uma vida política revigorada no Legislativo e a

chamada �judicialização da política�5 foram conse-qüências relevantes dessas alterações.

A multiplicação de grupos de interesse fora dasestruturas corporativas apresentou-se também co-mo uma mudança importante. Ela começou coma emergência do novo sindicalismo e desenvolveu-se por meio de um intenso crescimento de diver-sos movimentos sociais pelos quais novas questõese formas de ação social foram articulados desde adécada de 70.

De acordo com Gohn (1997) pode-se falar detrês grandes ciclos de movimentos sociais poli-ticamente relevantes no Brasil entre 1972 e 1997.O primeiro ciclo compreendeu o nascimento deassociações da sociedade civil e de movimentossociais, por meio dos quais, de 1972 a 1984, diver-sos grupos mobilizaram-se, nacional ou localmente,em torno de reivindicações do retorno da democra-cia. Exemplos são o Movimento pela Anistia(1977-1978), o Movimento Feminista (1975-1982), o movimento Custo de Vida-Carestia (1974-1980), a Confederação Nacional de Associaçãode Moradores (CONAM) (1982) e a União Nacio-nal dos Estudantes Secundaristas. Vários dessesmovimentos permaneceram ativos e desenvolve-ram vínculos com partidos políticos, como o Mo-vimento dos Sem-Terra (surgido em 1979) como Partido dos Trabalhadores.

O segundo ciclo englobou associações e movi-mentos organizados para lutar por uma pluralidadecada vez maior de interesses e temas no períodoque vai de 1985 a 1989. Aqui estão alguns exem-plos: Movimento Nacional de Meninos e Meninasde Rua; o Movimento dos Índios; o movimentodos Devedores do Sistema Nacional de Habitação;o Movimento Nacional pela Reforma da Educação,e assim por diante.

O terceiro ciclo estendeu-se de 1990 a 1997 ecaracterizou-se por um declínio relativo dos movi-mentos urbanos e por um crescimento dos movi-mentos rurais, assim como por uma articulaçãoente grupos nacionais e internacionais. Esse ciclo

5 O termo �judicialização da política� refere-se aos processospelos quais (a) os tribunais judiciais passam a julgar matériascujo tratamento antes permanecia a cargo do Legislativo e/ou Executivo, e (b) órgãos não-judiciais passam a adotarprocedimentos e critérios típicos do processo judicial. Cf.Castro (1997a).

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abrangeu uma crescente diversidade de interessese temas. Como exemplos: os movimentos VivaRio e Viva São Paulo, cujas preocupações são odesenvolvimento, a segurança e a qualidade de vidaurbana nessas duas regiões metropolitanas; omovimento Ética na Política, organizado contra oPresidente Fernando Collor de Mello (1992); oMovimento contra a Renovação Urbana de ÁreasHistóricas; o Movimento Nacional contra as Refor-mas Estatais; a Ação da Cidadania contra a Fome,a Miséria e pela Vida (1993-1996).

Além da multiplicação de movimentos e asso-ciações civis, houve também uma diversificaçãodas organizações econômicas de produtores e tra-balhadores. Conforme descrito por Almeida,�Sindicatos outrora tolhidos pelas instituições cor-porativistas tornaram-se mais livres e belicosos.Os sindicatos no setor público cresceram em nú-mero e força, seja entre os trabalhadores das em-presas estatais, seja entre os funcionários públicos,cuja organização estava proibida antes da Cons-tituição de 1988. Organizações empresariais tam-bém se multiplicaram, tornando-se mais ativas eautônomas vis à vis o governo do que durante oregime autoritário� (ALMEIDA, 1996, p. 224).

Dessa forma, as eleições para governador em1982, a adoção da Constituição democrática em1988 e o crescimento do pluralismo de interessestanto cívico como econômico introduziram trans-formações sem precedentes na política brasileira.A estrutura corporativa herdada do Estado desen-volvimentista perdeu gradualmente sua importânciacomo a melhor via para a articulação de interesses.O poder do Congresso Nacional cresceu vis à viso poder Executivo comparativamente à fase doregime autoritário6. O sistema partidário tornou-se mais forte e diversificado e a imprensa e aopinião pública passaram a exercer mais influênciano mundo político. Juízes e promotores públicostornaram-se mais ativos no sentido de desafiarpolíticas públicas e proteger os direitos do cidadão(CASTRO, 1997a; ARANTES, 1999). A culturapolítica dos brasileiros começou a mudar, expan-dindo-se o reconhecimento das eleições demo-cráticas como um valor político (MOISÉS, 1995).

As eleições para prefeitos e governadores e aspolíticas locais ganharam maior importância navida da população e no processo político nacional,com o federalismo ganhando cada vez mais força(SILVA, 1997). Em conseqüência, é possível afir-mar que esses fatores contribuíram para a cons-trução, durante as décadas de 80 e 90, de um con-texto político-institucional com características defreios e contrapesos, ampliando significativamentea experiência limitada do período democráticopopulista (1945-1964).

IV. EFEITOS NAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Essa versão brasileira de checks and balancesteve conseqüências que foram muito além dasnegociações entre o governo federal e os governa-dores estaduais quanto à partilha das verbaspúblicas entre os níveis municipais, estaduais efederal. As novas condições institucionais afeta-ram, na realidade, várias áreas do processo políticofederal, inclusive as políticas econômicas. Segundoa descrição de Silva, �A diminuição da possibilidadeda União de manejar os fundos públicos comoelementos de articulação e soldagem de interessesregionais e locais diferenciados tem proporcionadoa abertura de espaços de disputa em relação aoutras questões, que passam pelo arranjo das insti-tuições políticas (o sistema partidário e o sistemaeleitoral); pela definição da política macroeconô-mica nacional e suas repercussões regionais; porinvestimentos em infraestrutura; e, finalmente,pelas formas de organização e representação, nointerior da máquina estatal, dos interesses economi-camente mais fortes [...]� (SILVA, 1997, p. 359).

Os novos freios e contrapesos instituíram no-vos procedimentos e ao mesmo tempo trouxeramnovos desafios para o tratamento político das maisdiversas questões, abrangendo desde as políticassociais até a política econômica. Assim, além dodesenvolvimento da competição entre governado-res e prefeitos pelo repasse de recursos arrecada-dos pelo governo central (ver ABRÚCIO & COS-TA, 1998), os governadores também entraram emconflito na tentativa de atrair fundos federais e in-vestidores, aos quais ofereceram isenções de tribu-tos � o que ficou conhecido como guerra fiscal.

Em resumo, o Brasil apresentou uma tendên-cia à �multipolaridade política� (idem), reaniman-do, de certa forma, as políticas regionalistas quetinham sido abafadas desde os anos 30. Assim,um dos desafios recentes do Brasil nesta área tem

6 Embora os poderes formais do Congresso tenham sidoexpandidos sob a Constituição de 1988, a verificaçãoempírica das conseqüências dessa mudança constitucionaltem sido objeto de controvérsia. Ver Figueiredo e Limongi(1995) e Santos (1997).

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sido buscar formas de transformar o federalismo�não-cooperativo� em um tipo �cooperativo� desistema federal. Além disso, devido ao dispositivoda Constituição de 1988 que trata da repartição darenda arrecadada pela União, vários grupos po-líticos locais tentaram criar novas jurisdições muni-cipais a fim de se tornarem destinatários dessesfundos. Isso levou a um aumento substancial donúmero de municípios no Brasil. No estado doPiauí, por exemplo, o número de municípios cres-ceu de 48 para 221 no período que vai de 1988 a1997, tendo assim mais que triplicado em 9 anos.O aumento do número de municípios entre 1988e 1997 ficou acima de 31%, tornando-se um ele-mento adicional no complexo jogo político dosnovos freios e contrapesos no Brasil.

O federalismo revigorado também afetou oprocesso de elaboração da política social, quepassou a ser descentralizada. O controle local dapolítica social fôra um traço característico da polí-tica brasileira, mesmo durante a era desenvolvi-mentista. Conforme enfatizado por Abrúcio eCosta, �mesmo no caso de políticas sociais for-temente centralizadas e burocratizadas � como aPrevidência Social sob a gestão do INPS, depoisINSS � o caráter assistencialista era asseguradoatravés do controle patrimonial dos cargos estraté-gicos para a gestão do serviço nos níveis regionale local� (idem, p. 111-112).

Na década de 1990, contudo, vieram as expe-riências de arranjos �cooperativos� entre as admi-nistrações municipais, estaduais e federal. Váriosconselhos de Saúde municipais e estaduais foramestabelecidos desde a implementação do SistemaÚnico de Saúde (SUS), criado pela Constituiçãode 1988 (idem, p. 115-142). De maneira semelhan-te, nas áreas de saúde pública e ensino fundamen-tal, vários organismos representativos de comuni-dades locais foram estabelecidos em conexão coma transferência de fundos pelo governo central.Essa é a razão pela qual, em alguns estados ondereformas foram mais amplamente implementadas,diretores de escolas foram escolhidos pelos cole-giados em que pais, professores e funcionáriosestavam representados (idem, p. 144-145).

Finalmente, os freios e contrapesos revitali-zados afetaram também o processo de elaboraçãode políticas econômicas � políticas monetárias efiscais, por exemplo. Eles reinstituíram procedi-mentos competitivos, vinculados às dinâmicaspolítico-eleitorais locais, regionais e nacionais,

com conseqüências relevantes para o processode tomada de decisão na esfera da política econô-mica. Os novos freios e contrapesos tornaram-seassim um condicionante significativo do populismomacroeconômico, adicionando pressões subnacio-nais à expansão fiscal e monetária. Com relação àpolítica fiscal, essa dinâmica na cadeia de interaçõespolíticas entre autoridades locais e nacionais podeser exemplificada através da descrição que se se-gue: �O prefeito [sem ter como atender às deman-das] reclama e pede verbas para o governador. Ogoverno estadual, por sua vez, cujos recursos sãotambém insuficientes, reclama e pede verbas parao Presidente da República. Este, que também nãopode atender todos, joga a culpa para o sistemafinanceiro internacional, FMI, dívida pública, Con-gresso Nacional, Constituição, partidos políticosetc.� (Montoro Filho apud CASTRO, 1997b, p.63-64).

Tendências semelhantes ocorreram com rela-ção à política monetária pré-Real. Segundo umrelatório publicado pelo Presidente do Banco Cen-tral em 1993, governadores que se achavam emfim de mandato em 1982 usaram bancos públicospertencentes aos governos estaduais para financiaras campanhas dos seus candidatos (CASTRO,1997b). O relatório indicou esse fato político co-mo sendo a origem das dificuldades subseqüentespara se implementar no Brasil uma política deajuste fiscal. Os governadores que tomavam possegeralmente continuavam com as mesmas práticasde gastos públicos de seus predecessores. Alémdisso, as constituições estaduais previam a exis-tência e operação de bancos estaduais indepen-dentes da autoridade central. A capacidade de ban-cos estaduais de financiar gastos para fins políticos,mediante a troca de títulos públicos dos tesourosestaduais no mercado financeiro, agravou a pres-são inflacionária sobre a moeda brasileira. Assim,a centralização da política monetária também setornou um problema de política federativa sujeitaà dinâmica dos novos freios e contrapesos. Issocontribuiu para um populismo macroeconômicoadquirisse uma feição politicamente mais descen-tralizada.

V. O VÍNCULO INTERNO-EXTERNO E ATRANSIÇÃO COLLOR

O significado das transições aqui discutidas paraas condições políticas e econômicas internas nãopode ser completamente entendido sem se fazerreferência à sua articulação com a política externa.

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Uma das principais características das transiçõesbrasileiras foi a falta de uma articulação equilibradaentre as políticas internas e externas e a ausênciade uma política externa coerente e assertiva, capazde orientar claramente a negociação e a construçãode arranjos internacionais adequados ao novocontexto de freios e contrapesos e à emergênciados novos interesses políticos e econômicos.

A política externa brasileira foi dominada pelolegado do Barão do Rio Branco desde o início doséculo XX até a década de 1970, excetuando-seos anos da Política Externa Independente (1961-1963). Rio Branco reorientou o curso da diploma-cia brasileira, mudando o foco da política externa,que antes priorizava as relações com a Europa e aInglaterra, para dar preferência ao relacionamentocom os Estados Unidos (STORRS, 1973, p. 102-169). O paradigma de �relacionamento especial�introduzido por Rio Branco permaneceu como o-rientação dominante das relações exteriores do Bra-sil até que o paradigma globalista emergisse apartir da Política Externa Independente dos go-vernos Quadros e Goulart. Embora o golpe militarde 1964 tenha introduzido fatores internos políti-cos e ideológicos que conduziram a política externabrasileira ao modelo �americanista� de Rio Branco,a partir de 1967 o paradigma globalista passou adesenvolver-se dentro de um quadro político diver-so. Essa nova orientação tornou-se aos poucosarticulada e ganhou apoio de membros proemi-nentes da comunidade diplomática brasileira (LI-MA, 1994, p. 34-40). O paradigma globalista in-corporava: (a) uma crítica ao legado da políticaexterna �americanista�, de �relacionamento espe-cial� com os Estados Unidos, que havia prevalecidodesde a época de Rio Branco; (b) a crítica desen-volvida pela Comissão Econômica para a AméricaLatina e Caribe (CEPAL), especialmente por RaúlPrebisch, argumentando que as práticas econô-micas internacionais eram prejudiciais às eco-nomias latino-americanas, e (c) aportes da tradi-ção do pensamento do realismo nas relaçõesinternacionais, o qual, ao caracterizar a ordeminternacional como anárquica, justificava a defesaativa dos próprios interesses nacionais por cadapaís (ibidem).

O paradigma globalista emergiu, portanto,como uma visão abrangentemente articulada sobreo setor externo, que complementava e apoiava aspolíticas internas do Estado desenvolvimentista.A articulação do paradigma globalista de políticaexterna deu-se a tempo de apoiar o Segundo Pla-

no Nacional de Desenvolvimento (II PND) doPresidente Ernesto Geisel. O II PND teve comoobjetivo central o exercício de uma firme açãodiplomática em organismos multilaterais, de modoa tirar proveito de condições internacionais quefavorecessem o crescimento industrial nacional.Segundo Lima, �El eje Norte-Sur posibilitaría alMRE, en cuanto agencia responsable de laconducción de la política exterior, encontrar en ladiplomacia económica multilateral una misiónorganizacional específica: complementar las polí-ticas gubernamentales de desarrollo industrial�(idem, p. 36-37).

Nesse sentido, fizeram-se esforços na área dapolítica de comércio internacional para dar-se umtratamento especial aos países menos desenvol-vidos durante as rodadas de negociação do GATT,assim como através da UNCTAD (LAFER, 1971;ABREU, 1996). O paradigma globalista tambéminsistia em que a ordem mundial prevalecente tendiaa �congelar� relações assimétricas de poder e queo Brasil deveria resistir às políticas internacionaisque impusessem restrições ao acesso a �tecnolo-gias sensíveis�. Finalmente, o paradigma globalistatambém enfatizava a necessidade de o Brasil esta-belecer vínculos e parcerias com uma grande plu-ralidade de países.

A partir do governo do Presidente Geisel, aspropostas do paradigma globalista tornaram-seclaramente perceptíveis. Dessa forma, reconhe-ceu-se que as assimetrias de poder internacional�congeladas� e o relativo isolamento político doBrasil requeriam uma ação diplomática ágil para oestabelecimento de novas parcerias com paísesdo Terceiro Mundo na África, no Oriente Médioe, especialmente, com as nações vizinhas. Ade-mais, recorreu-se a esforços diplomáticos paracriticar regimes internacionais que instituíssem ocontrole sobre tecnologias sensíveis (LIMA, 1994).Por último, cabe destacar que essa orientação dapolítica externa manteve-se com a redemocra-tização, tendo permanecido até o governo JoséSarney. Foi a partir do governo de Fernando Collorde Mello que ela sofreu alterações importantes �como será demonstrado mais adiante.

Por outro lado, é preciso destacar que, duran-te as décadas de 1970 e 1980, o ambiente econômi-co internacional passou por modificações profun-das, advindas das crises do petróleo, do aumentodas taxas de juros norte-americanas, da crise dadívida externa latino-americana e da internaciona-lização da indústria bancária. Novos temas emer-

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giram na política comercial multilateral como umaresposta americana aos problemas dos free ridersdo comércio mundial7, assim como aumentava apreocupação com as barreiras não-tarifárias (taiscomo regulamentações técnicas e incentivos indi-retos do Estado para a produção e para o comér-cio). Dessa forma, no mesmo momento em que apolítica externa brasileira ganhava consistência eímpeto suficientes para efetivamente complementara política interna de crescimento industrial nacio-nal, as condições econômicas e políticas mundi-ais mudaram drasticamente. Paralelamente, aincapacidade dos governos brasileiros de adminis-trar conflitos internos através de procedimentospolíticos competitivos (novos freios e contrape-sos) e conectá-los a uma política macroeconômicaque lograsse sucesso no controle inflacionário foitambém uma característica dos anos 1980.

Portanto, as condições políticas e econômicasdomésticas e externas do Brasil no final dos anos80 podem ser resumidas da seguinte maneira:

(a) transições do ambiente internacional:

· fim da Guerra Fria;

· hegemonia de políticas liberalizantes;

· mudança de ênfase na política comercialmultilateral, refletida nas pressõesamericanas para a regulamentação denovas áreas de atividades econômicas,tais como a da propriedade intelectual emedidas de investimento relacionadas aocomércio, que ao final da RodadaUruguai do GATT (1994) resultaramnos acordos TRIPS (Trade Related In-tellectual Property Rights), e TRIMs(Trade Related Investment Measures);

· como uma reação a desequilíbriostrazidos pela recessão e pela crise dadívida dos países subdesenvolvidos,

deu-se a introdução dos ajustesestruturais como contrapartida para aassistência financeira internacional. Asconseqüências sociais e políticas adver-sas dessas políticas de ajuste para ospaíses receptores de tais financiamentosforam enormes.

(b) transições domésticas:

· transição para a democracia recente-mente completada;

· promulgação da Constituição em 1988;

· novos freios e contrapesos;

· um crescente pluralismo de interessescívicos e econômicos;

· um legado de políticas desenvolvimen-tistas voltadas para a substituição deimportações;

· uma política externa globalista;

· o populismo macroeconômico sujeito àdescentralização política, e

· taxas de inflação crescentes.

Foi sob tais condições que, em 1989, FernandoCollor de Mello foi escolhido Presidente em umaeleição com expressivo conteúdo plebiscitário.Collor foi eleito como um líder de forte apelopopular e fracos vínculos históricos com osgrupos políticos estabelecidos. A sua eleição foimotivada por vários fatores: a) instabilidade socialtrazida pela grave crise econômica pela qual o paíspassava, inclusive com altos índices de inflação;b) o temor dos grupos dominantes de que umcandidato da esquerda (Luís Inácio �Lula� daSilva) poderia ascender ao poder político, e c) ainsatisfação do eleitorado com os partidos políticoshegemônicos8.

Permanece crucial o fato de Collor (1990-1992) ter adotado um estilo político distante dopopulismo macroeconômico e alheio às novascondições da política brasileira expressas napresença dos novos freios e contrapesos. Assim,Collor não se engajou em negociações e nãoprocurou introduzir reformas por meio de proce-dimentos políticos competitivos. Pelo contrário,

7 Desde a Rodada Tóquio (1973-1979), os Estados Unidospassaram a afirmar que o princípio da �nação mais favorecida�,que permitia que os resultados das reduções tarifáriasacordadas fossem estendidos a todos os participantes doGATT, dava oportunidade para que os paísessubdesenvolvidos fossem beneficiados pelos resultados dasnegociações sem necessariamente ter que oferecer algo emtroca. Em outras palavras, a cláusula magna do GATTpossibilitava que esses países adotassem o comportamento�caronista� (LIMA,1986). 8 Esse último ponto é destacado por Lavareda (1989).

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adotando um comportamento típico de uma pre-sidência imperial, ele audaciosamente afirmou que�dispunha de uma única bala para acabar com ainflação�. O Plano Collor � Plano Brasil Novo �implementado por meio de trinta e quatro medidasprovisórias, foi extremamente abrangente eintervencionista. Ele abarcou tanto medidas deestabilização monetária quanto ações que disseramrespeito à regulamentação da economia, privatiza-ção de empresas estatais, venda de imóveis daUnião, reforma administrativa, extinção de órgãosfederais e um Plano Nacional de Desestatização,entre outras.

Se por um lado Collor não procurou negociarmediante os procedimentos políticos competitivosdos novos freios e contrapesos e nem desenvolveruma maneira nova e consistentemente estruturadade fazer um �uso político da política macroeconô-mica�, por outro, tentou apoiar-se sobretudo emseu carisma. Essa forma de fazer política, acimados partidos e ao largo do Congresso Nacional,ignorando os processos negociadores caracterís-ticos das instituições democráticas, trouxe-lhecustos políticos altos. Como no caso de dois outrospresidentes � Getúlio Vargas e Jânio Quadros �que tinham adotado comportamentos semelhantes,Collor não chegou ao fim do seu mandato. Emmenos de dois anos, foi acusado de participaçãoem práticas de corrupção, sendo submetido a umprocesso de impeachment e forçado a renunciarem 1992. Contudo, apesar de sua renúncia, Collorteve tempo suficiente para fazer rupturas decisivascom o importante legado desenvolvimentista.

Com o seu estilo imperial, Collor estabeleceumudanças relevantes na estrutura estatal aointroduzir reformas que alterariam a forma pelaqual o Estado e a economia interagiam. SegundoAlmeida (1996, p. 217), �[a] agenda da adminis-tração Collor, pela primeira vez, associou o com-bate à inflação com reformas destinadas a mudaros padrões de intervenção estatal na economia�.Essas reformas, com conseqüências de longo pra-zo, concentraram-se principalmente em duasáreas: liberalização comercial e privatização deempresas do setor público. Além disso, mudançasimportantes também foram introduzidas na políticaexterna, pela aceleração e ampliação de iniciativasdiplomáticas regionais.

Durante os últimos anos do regime militar, asautoridades já haviam manifestado preocupaçãocom os impactos inflacionários das despesas li-

gadas ao funcionamento de empresas do setorpúblico. No governo do presidente Figueiredo(1979-1985), iniciativas modestas haviam sidoadotadas no sentido de privatizar empresas públi-cas. Collor, porém, implementou um programa deprivatização muito mais ambicioso, cujos objetivosforam �reduzir o déficit público, aumentar aeficiência dos serviços públicos e promover ademocratização do capital, a modernização e acompetitividade da economia� (idem, p. 218). Comsuas reformas, Collor ampliou e acelerou a priva-tização do setor público e estabeleceu uma agendade privatização, que acabou sendo seguida por seusucessor, Itamar Franco (1992-1994), apesar daadesão deste último ao modelo desenvolvimentista.

Na área da política comercial, Collor tambémintroduziu mudanças relevantes. A prática dopopulismo macroeconômico dos anos 60 aos 80,somada à crise da dívida dos anos 80, tinha evo-luído no sentido de conduzir a política comercialpara objetivos de estabilização monetária. Isso teveconseqüências significativas para o vínculo interno-externo, na medida em que resultou na eliminaçãoda área comercial da política externa �globalista�.Nesse sentido, Lima e Santos (1998, p. 16)destacaram que �[a]o longo daquela década, apolítica de comércio exterior deixou de ser uminstrumento de fomento industrial e passou a serutilizada primordialmente para objetivos deajustamento do balanço de pagamentos�. A políticade liberalização comercial dos anos 90 teve oobjetivo de frear a inflação, assim como de aumen-tar a competitividade da indústria brasileira. Nasfrentes multi e bilaterais esperava-se que a buscapor linhas menos contenciosas de ação diplomáticafacilitariam o caminho para uma melhor negocia-ção da dívida externa (ver ABREU, 1997, p. 348).As medidas de liberalização comercial foramadotadas sem negociações políticas com o Con-gresso Nacional ou com grupos de interesse(LIMA & SANTOS, 1998, p. 22-23). Ademais,as reduções tarifárias tampouco foram negociadasem organismos multilaterais de modo que pudes-sem oferecer novas oportunidades econômicaspara os interesses brasileiros. Do ponto de vistada política externa, a estratégia de Collor pode sercaracterizada como um movimento brusco queinstituiu uma ampla liberalização, mas que nãotrouxe nenhuma vantagem tangível correspon-dente que tenha sido obtida dos competidores,incluindo os Estados Unidos. Tal liberalizaçãocomercial foi, inclusive, severamente criticada por

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diplomatas brasileiros alinhados com o paradigma�globalista� (ver, e. g., BATISTA, 1993).

Collor também acelerou e expandiu a políticade integração regional. O estabelecimento de laçosmais fortes com as economias vizinhas foi umponto destacado pela postura �globalista� da políti-ca externa. No governo do Presidente Sarney, odesenvolvimento de uma política externa regionalexpressou-se em documentos como a Declaraçãodo Iguaçu e o Tratado de Integração, Cooperaçãoe Desenvolvimento, ambos assinados conjunta-mente em 1985 e 1988 pelo Brasil e pela Argentina.Entretanto, naquela época, a integração regionalainda era algo visto como um empreendimentolimitado e de longo prazo. A integração entre Brasile Argentina estava programada para acontecerdentro de um período de dez anos, e apenas entãoseria considerada a criação de um mercado co-mum. Collor acelerou e expandiu muito esse pro-cesso. A integração e o desenvolvimento de ummercado comum foram reprogramados para acon-tecer em apenas quatro anos e foram expandidospara incluírem o Uruguai e o Paraguai. Já na Atade Buenos Aires, assinada por Fernando Collor eCarlos Menem em julho de 1990, o prazo previstopara a constituição do mercado comum reduzira-se de dez para quatro anos, e, no Tratado de As-sunção (de março de 1991), Brasil, Argentina,Uruguai e Paraguai comprometeram-se com esseprazo. Na fase de transição para a criação do mer-cado comum (1991-1994), �[...] a preocupaçãoimediata dos negociadores governamentais dosquatro países foi com a remoção do �entulhoprotecionista e anti-integracionista� construído aolongo de décadas de industrialização substitutiva�(ALMEIDA, 1998, p. 50). Em dezembro de 1992(Cronograma de Las Leñas), definiram-se osvalores da tarifa externa comum (TEC) � alíquotamáxima de 35% � e a data em que ela deveriaentrar em vigor � 1o de janeiro de 1995. De 1990a 1994 a alíquota média das tarifas brasileiraspassou de 32,20% para 14,38%, e a máxima de105% para 40% (BRASIL. Ministério do Desen-volvimento, Indústria e Comércio, 2000). Dessaforma, a política de integração regional do governoCollor incluiu-se em uma perspectiva de reforçoda adaptação do país ao processo de globalizaçãoeconômica e de implementação de políticas libe-ralizantes no nível interno (redução do escopo deatuação do Estado e abertura comercial). Porconseguinte, o governo brasileiro afastava-se daperspectiva integracionista mais cautelosa, que

havia sido defendida por Sarney e Alfonsin.

Assim, nessas três áreas � privatização, libe-ralização comercial e integração regional � asreformas de Collor foram rápidas e radicais osuficiente para trazerem modificações profundas,que não poderiam ser fácil ou rapidamente rever-tidas no futuro. Porém Collor não tentou negociarsuas reformas internamente através de procedi-mentos políticos competitivos. Ele não levou emconsideração o surgimento das novas condiçõesinstitucionais correspondentes aos novos freios econtrapesos e nem desenvolveu mecanismos deformulação e implementação de políticas econômi-cas que substituíssem o populismo macroeco-nômico. Além disso, seu governo falhou no con-trole da inflação e na articulação de uma políticaexterna abrangente, que conduzisse a uma inser-ção internacional afirmativa do Brasil e favorecesseo crescimento nacional sustentado, juntamentecom um significativo apoio popular. Foi isso oque Fernando Henrique Cardoso propôs-se a con-seguir9.

VI. POLÍTICA E POLICY-MAKING NO GOVER-NO DE FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Durante o regime militar, todas as forças polí-ticas relevantes, inclusive as oposicionistas, eramfavoráveis às estratégias de desenvolvimento li-deradas pelo Estado (ALMEIDA, 1996, p. 220-221). Contudo, a oposição rejeitou as políticaseconômicas adotadas pelos governos militares ale-gando que elas valiam-se da repressão salarialcomo uma das condições necessárias para o cres-cimento, ainda que essa fosse habilmente mitiga-da pelo uso da correção monetária com datas-basediferenciadas. Assim, no final do período autoritá-rio, grupos pró-democracia insistiram fortementeem uma política econômica apta a �combater ainflação sem punir os mais pobres, retomar o de-senvolvimento econômico, renegociar a dívidaexterna, bem como estabelecer instituições demo-cráticas� (idem, p. 220). Essas foram as reivin-dicações essenciais da Aliança Democrática, acoalizão de centro-esquerda que negociou com oregime autoritário a transição para a democraciaem 1985. Esse amplo consenso, entretanto, erodiuna segunda metade dos anos 1980, devido aossucessivos fracassos governamentais no contro-

9 Ver o discurso de posse de FHC em 1º de janeiro de 1996(BRASIL. PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA, 1996).

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le da inflação. Em especial, o fiasco do Plano Cru-zado durante o governo de Sarney (1985-1989)contribuiu para que emergisse uma nova aborda-gem a respeito da política econômica (idem, p.222). Essa abordagem, considerada como pragmá-tica (Pereira, Maravall e Pzeworski apud ALMEI-DA, 1996, p. 222), criticava o populismo econô-mico e a incapacidade dos governos de trataremdo componente inercial da inflação. De fato, opopulismo macroeconômico alimentara a inflaçãoque, no caso do Brasil, tinha ganho forte dimensãopsicológica. Essa dimensão era o chamado �com-ponente inercial� da inflação10, um legado diretodo populismo macroeconômico e de seu uso dacorreção monetária. Considerava-se que a classemédia brasileira acostumara-se ao jogo da inflação(OLIVEIRA, 1996, p. 26-28) � colhendo os bene-fícios da correção monetária � enquanto as classesde baixa renda sofriam grandes perdas decorrentesdo �imposto inflacionário�. Além disso, a aborda-gem pragmática defendia a redução do Estado,acompanhada da reorientação do seu papel para apromoção do bem-estar social e para o desenvol-vimento de uma política industrial voltada para apromoção das exportações.

Desde 1979, o governo tentou controlar astendências inflacionárias por meio de vários planosde estabilização. Do primeiro Plano Delfim Neto,em 1979, até 1992, houve dez planos de esta-bilização monetária (ver Quadro 1). Contudo, todosesses planos haviam sido extraordinariamente mal-sucedidos ao tratarem do componente inercial dainflação brasileira. Assim, após a experiência de10 planos de estabilização que não deram certo,aparentemente não havia mais meios disponíveispara a superação do impacto prejudicial da hiperin-flação sobre a sociedade.

O Plano Real, adotado por Fernando HenriqueCardoso quando Ministro da Economia no governoItamar Franco (1992-1994), foi extremamentebem-sucedido. Enquanto políticos de esquerda co-mo Lula rejeitavam o plano, agarrados a antigasfórmulas populistas e desenvolvimentistas, Cardo-so estabeleceu alianças com grupos políticos con-servadores do Partido da Frente Liberal (PFL) e

do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB) como basede apoio político para aprovar o Plano Real.

QUADRO 1 � Planos de estabilização (1979-1991)

1. Primeiro Plano Delfim (1979)

2. Segundo Plano Delfim (1981)

3. Terceiro Plano Delfim (1983)

4. Plano Dornelles (1985)

5. Plano Cruzado (1986)

6. Plano Bresser (1987)

7. Plano Feijão com Arroz (1988)

8. Plano Verão (1987)

9. Primeiro Plano Collor (1990)

10. Segundo Plano Collor (1991)

Fonte: Pereira (1992, p. 141-144).

O Plano Real (1994) englobou reformas emer-genciais nas áreas de política fiscal e monetária,além de várias outras reformas de longo prazo.As reformas emergenciais objetivaram controlaro componente inercial da inflação. As reformasde longo prazo consistiram por um lado, no apro-fundamento da abertura comercial, na integraçãoregional, na privatização e na desregulamentação;por outro lado, a estratégia dirigiu-se para o Con-gresso e para as reformas constitucionais. Váriasemendas constitucionais foram promulgadas em1995, as quais flexibilizaram o monopólio estatalsobre o gás canalizado, o petróleo, as teleco-municações e eliminaram a discriminação contrao capital estrangeiro, redefinindo o conceito deempresa nacional (OLIVEIRA, 1996, p. 97). Emseguida, dando seqüência à estratégia legislativa,foram discutidas no Congresso as reformas previ-denciária, administrativa e tributária, as duas pri-meiras já aprovadas, encontrando-se a última aindaem tramitação.

As reformas de longo prazo visaram a intro-duzir mudanças significativas na relação entre oEstado e a economia e no papel do capital estran-geiro nas atividades produtivas, dando continui-dade ao processo de desmonte do desenvolvimen-tismo. Elas buscaram construir uma ordem eco-nômica com características liberalizantes (maiorpresença das relações de mercado), mais integradaa uma economia globalizada. Isso correspondia amudanças na estrutura do processo de formulaçãoe implementação de políticas, de modo a contribuirpara que a estabilização monetária se tornasse umacaracterística duradoura do sistema econômico.

10 O termo �componente inercial� foi �usado por eco-nomistas para descrever a propensão generalizada dos atoreseconômicos a ajustarem os preços constantes de formaautomática, em antecipação à inflação futura, com base nainflação passada� (OLIVEIRA, 1996, p. 26-28).

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Na descrição oferecida por Oliveira (1996), o pla-no de estabilização de Cardoso foi organizado em

QUADRO 2 � Programa de estabilização de Fernando Henrique Cardoso

Fonte: adaptado de Oliveira (1996, p. 31-75).

Do ponto de vista do processo de tomada dedecisão, a principal característica das reformaspropostas por FHC foi o estabelecimento de umaestrutura decisória em dois níveis: em um primeiro,ocorreria uma negociação mais ampla, enquantono outro teria lugar um processo de insulamentoburocrático. De fato, as políticas monetária ecambial permaneceram isoladas da negociaçãopolítica, sendo postas a cargo de uma equipe eco-nômica nuclear, orientada por uma visão tec-nocrática da administração macroeconômica,enquanto que as reformas econômicas não-monetárias ficaram abertas aos procedimentospolíticos competitivos, incluindo o federalismorevitalizado11. O insulamento burocrático e oestrito controle administrativo dos quadros

tecnocráticos foram implementados em áreascentrais do processo de formulação e gestão daspolíticas monetárias e orçamentárias, tais como oConselho Monetário Nacional (CMN).

Com efeito, no passado, a composição do CMNera mais ampla, incluindo a representação de váriasburocracias e do setor privado. Contudo, desde1994, pouco tempo após a posse de Cardoso, onúmero de membros do Conselho Monetário Na-cional reduziu-se ao menor de toda sua história:apenas o Ministro da Economia, o Ministro doPlanejamento e o Presidente do Banco Central hojefazem parte deste Conselho (SOUZA & CASTRO,1995). A variação no número de membros do Con-selho Monetário Nacional é mostrada na Tabela 3a seguir.

quatro grandes fases, conforme indicado no Qua-dro 2.

11 Os estudos sobre as relações entre o Executivo e oLegislativo no governo Fernando Henrique Cardoso mostram,por um lado, uma significativa preeminência do Executivosobre as decisões do Congresso Nacional, quer do ponto devista da formação da agenda e do uso amplo de medidasprovisórias, quer do ponto de vista dos resultados alcançados(MELO, 1997; FIGUEIREDO & LIMONGI, 2000); por

outro lado, apontam também que negociações efetivas foramrealizadas para a aprovação das reformas constitucionais(ALMEIDA & MOYA, 1997; SANTOS, 1997; ALMEIDA,1999). Dessa maneira, a hegemonia do Executivo temconvivido com processos negociadores no âmbito doLegislativo, em contraste com o que ocorreu durante ogoverno Collor.

Fase 1 Ajuste fiscal emergencial (1993):a) Programa de Ação Imediata (PAI): cortes emergenciais em despesas; renegociação das dívi-

das estaduais e municipais; maior controle sobre os bancos estatais; reorientação do progra-ma de privatização.

b) Fundo Social de Emergência (FSE): obtenção pelo Executivo de poder discricionário paragastos orçamentários.

Fase 2 Reformas monetárias emergenciais (fevereiro a julho de 1994):a) Unidade Referencial de Valor (URV) (fev.1994): unificação da correção monetária em um único

�super-índice� para sincronização dos ajustes de preço.b) Adoção do Real como nova moeda (jul.1994)

Fase 3 Reformas monetárias de longo prazo (a partir de julho de 1994):a) Política de contração monetáriab) Alinhamento cambial: ancoramento flexível ao dólar americano

Fase 4 Reformas estruturais (a partir de julho de 1994):a) Liberalização comercial e integração regional: continuação de políticas de governos anteriores;

usada para controlar aumentos de preços internos.b) Privatização: continuação de políticas de governos anteriores.c) Desregulamentação: extinção de regulamentações burocráticas estatizantes.d) Reformas constitucionais: permitem o investimento privado em serviços de utilidade pública

(energia, telecomunicações etc.)

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O poder político da equipe econômica nuclearcresceu também devido à centralização de pro-cedimentos de gestão do orçamento (LOUREIRO& ABRUCIO, 1999). Ou seja, a ampliação dasnegociações como meio de incorporar os novosfreios e contrapesos às políticas do poder Executi-vo federal teve como contrapartida o insulamentode áreas-chave do processo de administração dapolítica macroeconômica e a subordinação da capa-cidade operacional dos ministros às decisões daequipe econômica nuclear, que manteve autoridadee controle prático sobre a liberação de recursos.Dessa forma, Cardoso foi capaz de fazer um usopolítico da política macroeconômica, recorrendoà maior capacidade que o insulamento burocráticooferecia para a defesa radical da estabilidade mone-tária economicamente sustentada em aumentoscolossais nas taxas de juros. A esse respeito, asestratégias de Cardoso foram:

a) neutralizar, desde antes de sua posse, opoder de veto de grupos conservadores na políticapartidária através do estabelecimento de uma alian-ça entre o seu partido, o PSDB, e o PFL e o PTB;

b) tirar vantagem do aumento de popularida-de trazido pela queda acentuada da taxa de inflação,obtida pelo engenhoso controle do seu componenteinercial e a conseqüente supressão do impostoinflacionário;

c) controlar a inflação por meio de (i) umapolítica de alinhamento cambial flexível do realem relação ao dólar, e de (ii) uma política de libe-ralização comercial ampla mas com exceçõesnegociadas, o que permitiu certa proteção a algunsinteresses especiais, como no caso do regimeautomotivo;

d) trocar �taxas de inflação explosivas� por�taxas de juros exorbitantes�, apesar dos reflexosno aumento astronômico da dívida pública, queatualmente gira em torno de 47% do PIB (BANCOCENTRAL DO BRASIL, 2000), e

e) sob os auspícios da coalizão governamen-tal, realizar extensas negociações com referênciaàs áreas não-monetárias do plano.

FHC de fato abandonou o populismo macroeco-nômico, que tinha caracterizado a formulação e aimplementação de políticas no passado, edesenvolveu o pragmatismo macroeconômico, noqual a ênfase da política econômica recai sobre ocontrole de tendências inflacionárias e sobre aatenção aos constrangimentos externos, em detri-mento de preocupações com a redistribuição darenda, o emprego e o estímulo ao crescimentoacelerado. Em resumo, Cardoso aproveitou-se dosrompimentos iniciados por Collor em relação aoslegados do desenvolvimentismo e procedeu à ex-pansão das reformas pró-mercado. Contudo, aocontrário de Collor, Fernando Henrique: (a) desen-volveu uma estrutura político-administrativa, pormeio da qual ele pôde implementar o pragmatismomacroeconômico, e (b) incorporou os novosfreios e contrapesos à sua estratégia política. En-quanto Collor fez uso sobretudo de uma políticaimperial, Cardoso favoreceu negociações no con-texto dos novos freios e contrapesos e ao mesmotempo estabeleceu fortes constrangimentos parao comportamento dos grupos sociais e econômi-cos mediante taxas de juros extremamente ele-vadas, que alimentaram uma gigantesca dívida pú-blica. As tendências ao acirramento do conflitopolítico, antes parcialmente resolvidas por meiode práticas clientelistas e cooptativas das antigasestruturas corporativistas e que em seguida haviamsido absorvidas sob as práticas do populismo ma-croeconômico, juntamente com seus efeitos cola-terais inflacionários, agora, sob o pragmatismomacroeconômico, passaram a sujeitar-se aos im-pactos do gerenciamento da dívida pública. Issofoi complementado, no nível externo, pela maiorcredibilidade perante a comunidade financeira inter-nacional, incluindo o FMI e o Banco Mundial, e,no nível interno, por negociações � sob os olhos

Ano Membros1964 111967 101969 141972 151990 17

1994-presente 3

TABELA 3 � Membros do Conselho Monetário Nacional(1964-1994)

Fonte: Souza e Castro (1995).

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vigilantes da coalizão governante � com gruposde interesse na aprovação de reformas da fase 4do Programa de estabilização12.

A renovação periódica no Congresso do Fun-do Social de Emergência (mais tarde chamado de�Fundo de Estabilização Fiscal� � FEF) e as nego-ciações com partidos, parlamentares, gover-nadores e grupos de interesse, sob o firme controleda equipe econômica nuclear, o atendimento àsrecomendações das agências internacionais,sobretudo o FMI e o Banco Mundial � todos essesfatores permitiram que Fernando Henrique manti-vesse o rumo da estabilização econômica e fosseinclusive reeleito em 1998.

O calcanhar-de-Aquiles da política de Cardoso,contudo, permanceu o aspecto social: a capacidadelimitada de seu governo de enfrentar a situação dapobreza no Brasil (ver BARROS, HENRIQUES &MENDONÇA, 2000). Essa é uma área em que asociedade brasileira nunca passou por qualquertransição. Apesar de todo o virtuosismo dos gover-nos na área de formulação e implementação depolíticas econômicas, tanto sob o populismomacroeconômico quanto sob o pragmatismomacroeconômico, o Brasil permanece com níveisextremamente altos de desigualdade social e pobre-za, conforme indicam as pesquisas recentes doBanco Mundial (WORLD BANK, 2001). Aspromessas originais dos tempos da transição paraa democracia, de se �combater a inflação sem puniros mais pobres�, parecem ter se perdido sob asengrenagens do gerenciamento macroeconômicoe de seus condicionamentos externos.

Nesse ponto, o vínculo interno-externo torna-se mais uma vez inteiramente relevante. É provávelque constrangimentos econômicos do setor exter-no, que condicionam muito do pragmatismo ma-croeconômico, poderiam ser diminuídos comoresultado de reformas das instituições financeirase de comércio exterior13, em uma época em quea política externa brasileira encontra-se em buscade um novo paradigma.

O antigo paradigma globalista não é mais per-cebido de modo consensual pela diplomacia comosendo capaz de gerar uma política externa eficaz(LIMA, 1994; ARBILLA, 2000). O fim da GuerraFria e a redução do poder de coalizão do Sul sãoalguns dos fatores que impedem a efetividadedaquele paradigma na sua totalidade (LIMA, 1994,p. 43). Como também tem sido enfatizado porFHC e foi repetido pelo seu então Ministro dasRelações Exteriores, Embaixador Lampreia (1995-2001), �a excessiva volatilidade dos fluxos finan-ceiros internacionais� é prejudicial �para o Brasile para a economia internacional como um todo�(LAMPREIA, 1998, p. 8). Ao mesmo tempo, éreconhecido que �acabaram-se os tempos do iso-lacionismo e da auto-suficiência� (ibidem). Aindade acordo com Lampreia, o Brasil agora luta por�uma ordem internacional cujos processos deci-sórios estejam mais abertos do que hoje a umnúmero maior de nações, em especial de socie-dades em desenvolvimento� (idem, p. 11).

Uma das principais orientações da recentepolítica externa do Brasil tem sido o estabeleci-mento e o fortalecimento de vínculos regionais,compatível com uma posição diplomática afirma-tiva diante das nações mais poderosas, principal-mente os EUA. Esse propósito traduziu-se, porexemplo, na postura brasileira de fortalecer oMercosul para impulsionar as negociações refe-rentes à ALCA (Área de Livre Comércio das Amé-ricas) nas conferências de Miami e de Santiago,ocorridas em 1994 e 1998, respectivamente. Po-rém, permanece o fato de que a �autonomia pelaintegração� (ibidem) não é suficiente para tratarefetivamente da injustiça social. Essa realidade foicaptada no comentário de Lampreia: �Em síntese,o peso do nosso país vem crescendo de modoacentuado; e estamos assumindo responsabilidadesinternacionais para nós sem precedentes. O Brasiljamais esteve tão próximo de tornar-se um atorrealmente central no cenário mundial. É evidenteque isto dependerá, em primeiro lugar, de conse-guirmos superar os nossos problemas internos,especialmente na área social� (idem, p. 14).

O enfrentamento mais eficaz da injustiça sociale o estabelecimento de um paradigma de políticaexterna capaz de articular um vínculo interno-externo mais adequado aos interesses sociais eeconômicos do país são objetivos que, a nossover, ainda são insuficientemente perseguidos pelaelite governamental do país. Tornar esses objetivos

12 Incluem-se aí a privatização e a abertura de mercados nossetores de serviços (nas áreas de energia, telecomunicaçõesetc.), os quais estavam, até então, fechados a investimentosprivados ou estrangeiros.13 Tais como as que têm sido sugeridas recentemente pelaUNCTAD (2001).

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uma preocupação central das políticas de gover-no parece ser um desafio que os grupos políticosque disputarão as eleições presidenciais de 2002deve-rão, com certeza, enfrentar.

VI. COMENTÁRIOS FINAIS

Nosso trabalho discutiu as transições políticasno Brasil no contexto da globalização. Focalizamosas transformações na estrutura do Estado e oslegados políticos que influenciaram, segundonosso ponto de vista, respostas internas a umambiente internacional em transformação. Enfa-tizamos que o legado do modelo desenvolvimentistade formulação e implementação de políticas e aestrutura corporativa foram importantes para

reforçar as resistências à mudança nas décadasde 1970 e 1980. Indicamos também que ogerenciamento de políticas macroeconômicascombinado com o processo político mais amplofoi uma importante dimensão das transições.Enquanto o populismo macroeconômico desenvol-veu-se desde os anos 60 e forneceu novos instru-mentos aos governos do regime militar paraadministrar os conflitos sociais, o aumento da infla-ção determinou o surgimento do pragmatismomacroeconômico. Também focalizamos o papelda política externa e de seus limites na busca deuma articulação mais adequada do vínculo interno-externo. O Quadro 3 resume esses resultados.

QUADRO 3 � Transições políticas no Brasil

Dessa maneira, se os legados de políticasdesenvolvimentistas e da estrutura corporativistaexplicam de modo significativo o timing tardio e anatureza pragmática da adaptação do país a umcontexto internacional no qual há a hegemonia depolíticas liberalizantes, tais legados tomadosisoladamente não foram suficientes para explicaras transições ocorridas nos anos 90. Para isso éimportante considerar, por um lado, a descentraliz-ação do poder político e social que acompanhou atransição para democracia no país, e, por outrolado, a hiperinflação e a crise econômica. Esseconjunto de fatores contribuiu para a erosão doslegados referidos e para a criação de novos condi-

cionantes para o processo de formulação e imple-mentação de políticas públicas.

Por último, cabe acrescentar que nas transi-ções ocorridas no Brasil, durante o século XX,uma única área permaneceu inalterada: asdisparidades na distribuição da renda e a pobrezadisseminada não foram superadas, seja pelos go-vernos autocráticos, seja pelos democráticos. Elaspermaneceram mesmo diante de diferentes e atéengenhosos estilos de formulação e implementaçãode políticas econômicas.

Recebido em 30 de outubro de 2001.Aprovado em 2 de abril de 2002.

Marcus Faro de Castro ([email protected]) é Doutor em Direito pela Harvard University e Professor doDepartamento de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB).

Maria Izabel Valladão de Carvalho ([email protected]) é Doutora em Ciência Política pela Universidade deSão Paulo (USP) e Professora do Departamento de Relações Internacionais da Universidade de Brasília(UnB).

1930-anos 1980 Anos 1980-presenteEstrutura corporativista

+Práticas clientelísticas

Transição Novos freios e contrapesos

Desenvolvimentismo+

Populismo macroeconômico(desde 1964)

+Política externa globalista

(desde os anos 1970)

Transição

Políticas liberalizantes+

Pragmatismo macroeconômico(desde 1994)

+Busca de um novo paradigma de

política externa

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