gerês rio de janeiro a grade maomaria citroën ds5 · irene grilo gerês rio de janeiro a grade...

7
Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur cheia de arte contemporânea Gorongosa, a sobrevivente BENEDICTE KURZEN/VII NETWORK ESTE SUPLEMENTO FAZ PARTE INTEGRANTE DA EDIÇÃO Nº 8097 DO PÚBLICO, E NÃO PODE SER VENDIDO SEPARADAMENTE FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012

Upload: duongduong

Post on 10-Nov-2018

222 views

Category:

Documents


1 download

TRANSCRIPT

Page 1: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

Irene Grilo

Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5

José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor

Nice é a Côte d’Azur cheia de arte contemporânea

Gorongosa, a sobrevivente

BEN

EDIC

TE K

UR

ZEN

/VII

NET

WO

RK

EST

E SU

PLEM

ENTO

FA

Z PA

RTE

INTE

GRA

NTE

DA

ED

IÇÃO

8097

DO

BLIC

O, E

NÃO

PO

DE

SER

VEN

DID

O S

EPA

RAD

AM

ENTE

FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012

Page 2: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

4 | FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012

Dias de deslumbre no Parque Nacional da Gorongosa, que já foi palco de um dos mais sangrentos cenários de Moçambique. Populações inteiras de animais selvagens quase desapareceram. Agora, recupera o fulgor.

CapaMoçambique

Gorongosa, lugar do silêncio

O homem magro, de testa enruga-

da, não largava a espingarda. Nem

quando se encostava a um canto e

apoiava a cabeça no braço direito.

Dir-se-ia que se esforçava para man-

ter os olhos abertos, mas não deixava

de captar tudo o que se passava em

volta. Também “vê” com os ouvidos

e com o nariz. Mesmo noite cerrada,

percebe a proximidade de uma ma-

nada de búfalos silenciosos.

Não é que Njinga desvalorize os

riscos. É que conhece bem a fauna

bravia do Parque Nacional da Go-

rongosa. Refugiou-se aqui da guerra

civil de Moçambique. Comia raízes,

frutos silvestres, carne de ratazana,

cágado, inhala, piva, impala. “Não

comia massa. Só coisas do mato. Ti-

nha uma roupa caducada. As pessoas

deitavam fora. A gente apanhava no

rio, levava, cosia, punha. Só à frente.

Atrás fi cava sem nada.”

Há qualquer coisa de esmagador

numa extensa zona que a huma-

nidade visita, mas não ocupa. É o

“meio do nada”. O lugar do silêncio,

de quando em quando cortado por

um vozear estranho — o rosnar de

um leão, o grasnar de uma águia, o

bramir de uma impala, o mugir de

um búfalo, o chorar de um crocodi-

lo, o trombetear de um elefante, o

grunhido de um porco do mato ou

o guincho de um macaco.

Dispenso, de muitíssimo bom gra-

do, o silvar de qualquer cobra e o

zunido de qualquer mosquito. Fora

isso, paz.

Saíramos cedo do acampamen-

to sazonal montado no centro do

parque. Era uma daquelas manhãs

luminosas que abrem a estação seca.

Do jipe, seguindo a picada, víramos

cudo, pala-pala, inhala e outros an-

tílopes que não fogem mas que se

afastam ao ouvir o ronco do motor,

como se quisessem salvaguardar as

devidas distâncias do mais perigo-

so bicho. De súbito, leões a acasalar.

Deixámo-nos estar, talvez uma hora,

a observá-los.

Não sei como seria a Gorongosa an-

tes de, “menino e moço”, Njinga ter

sido levado da palhota de seus pais

e forçado a pegar numa arma. Posso

ter uma ideia, por exemplo, lendo o

que sobre ela escreveu, na sua Ronda

de África, Henrique Galvão, em 1948:

“Em todos os percursos [se podem]

admirar as multidões de antílopes

em corrida ou em alertas estatuários,

as manadas portentosas de búfalos,

as fugas destrambelhadas dos ma-

cacos, as galopadas das zebras — e,

com frequência, levantar leões das

suas camas, surpreender leopardos,

ouvir os elefantes na sua faina de le-

nhadores e ver os hipopótamos em

concentração que é decerto a mais

densa e numerosa do mundo.”

Naquele tempo, o extremo sul do

Grande Vale do Rift Africano não era

bem um éden de vida selvagem. A

Gorongosa começou por ser uma

reserva de caça de administradores

Ana Cristina Pereira

da Companhia de Moçambique. Em

1941, fi nda a concessão, o Governo

colonial tentou banir as caçadas e

criar uma estância turística. Só em

1960 a declarou parque nacional. No

fi nal dos anos 1960, a equipa do eco-

logista sul-africano Kenneth Tinley

fez a primeira contagem aérea: 200

leões, 2200 elefantes, 14 mil búfalos,

5500 bois-cavalos, três mil zebras,

3500 pivas, duas mil impalas, 3500

hipopótamos.

À Gorongosa vinha gente de muito

lado. Não só pela quantidade de ani-

mais. Também pela beleza paisagísti-

ca. José Maria d’ Eça de Queiroz, neto

do escritor maior, registou-a quando

a visitou em 1964. “A Gorongosa é

como o mar: sempre igual e sempre

diferente. Existem centenas de ma-

res no mar; na Gorongosa a estepe

tem uma centena de estepes e a sava-

na uma centena de savanas.”

Depois, vieram as guerras. A pri-

meira, a da independência, poupou

a reserva; a segunda, a civil, não.

Renamo, Frelimo, pazQuem me falara na Gorongosa fora

a minha amiga Irene Grilo: um dos

lugares da sua infância estava a re-

cuperar de sistemáticas matanças.

Incansável defensora dos direitos

dos animais, agente de viagens es-

pecializada em safaris, queria ver

como estão as espécies a reagir, que

estruturas existem para receber visi-

tantes e de que forma tudo isso se re-

laciona com as comunidades locais.

Volvidos alguns meses, ali estávamos

nós, num todo-o-terreno conduzi-

do por Blessed, um guia que não

lhe caiu bem, sob o olhar de Njinga,

um guarda que lhe inspirava grande

confi ança.

Njinga nasceu em Cheringoma,

distrito da província de Sofala, que

faz fronteira com a Gorongosa. Aos

14 anos foi levado pela Resistência

Nacional Moçambicana (Renamo) —

pouco depois da independência, ex-

militares portugueses e dissidentes

da Frelimo tinham-se instalado na

Rodésia e lá criado aquele movimen-

to; com a independência do rebapti-

zado Zimbabwe, assentaram arraiais

na África do Sul e, com o Acordo de

Page 3: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012 | 5

Nkomati, em 1983, ergueram o quar-

tel-general, a Casa Banana, no sopé

da serra da Gorongosa. Era um bom

sítio para escapar à observação aérea.

A vida tornou-se infernal para os ho-

mens e para os animais selvagens que

ali viviam. O parque foi encerrado.

Na muita papelada que imprimira

para ler durante a viagem, havia um

livro do politólogo Jaime Nogueira

Pinto sobre a guerra civil. Nele apare-

ce o líder da Renamo, Afonso Dhlaka-

ma, a descrever o modus operandi:

“Actuávamos em grupos muito pe-

quenos, dispersos pela serra, com

grande conhecimento do terreno, e

eles pensavam que nós éramos como

que espíritos da serra da Gorongo-

sa, que estávamos em todo o lado ao

mesmo tempo. Um só homem nosso

podia fazer muitos estragos no inimi-

go naquele teatro de operações!”.

Rapazes como Njinga eram trei-

nados para improvisar. Sobreviviam

com muito pouco. Não usavam farda.

Vestiam t-shirt e calças de ganga ou

fazenda. Só alguns calçavam sapa-

tos ou botas. Njinga lembra-se de

haver 30 quilos de farinha para 500

homens. Odiava aquilo. Fugiu com

um amigo. Ainda passou por casa.

“‘Papá, eu não vou mais à Renamo,

vou viver no mato. Eu sou pessoa.

Meus irmãos já morreram. Eu quero

fi car vivo.’”

Viveram cinco anos no mato. Fi-

zeram uma casa numa árvore para

melhor se protegerem de leões e de

outros predadores. Dormiram lá dois

anos. As temperaturas, à noite, po-

dem cair a pique. “Estávamos a so-

frer muito com o frio. Construímos

uma cabana na fl oresta.” De meses

a meses, noite cerrada, Njinga ia à

palhota da irmã. Foi ela que lhes deu

a notícia: Renamo e Frelimo tinham

assinado a paz.

Os dois rapazes não eram excep-

ção. Nos últimos anos de confrontos,

muita gente se tinha refugiado den-

tro do parque. Havia quem caçasse

só para comer, mas também quem

caçasse para extrair o marfi m aos

elefantes e trocá-lo por armas. As

maiores matanças aconteceram en-

tre 1992 e 1994. Houve descontrolo

total desde a assinatura do Acor-

Há qualquer coisa de esmagador na paisagem da Gorongosa. Isto é o “meio do nada” e o silêncio por vezes é cortado pelo mugir de um búfalo ou o rosnar de um leão. Abaixo, a cascata de Morumbodzi.

PAUL KERRISON

IRENE GRILO

PAULA AGUILERA

Page 4: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

6 | FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012

CapaMoçambique

do Geral de Paz às primeiras eleições

multipartidárias, que reconduziram

Joaquim Chissano. Do parque, saíam

umas 60 toneladas de carne por mês.

O Banco Africano de Desenvol-

vimento, com o apoio da União

Europeia e da União Internacional

para a Conservação da Natureza,

tentou resgatar a reserva. Os meios

revelaram-se escassos para uma tão

desmesurada tarefa: populações de

animais de grande porte estavam re-

duzidas a 10% ou menos; o acampa-

mento de Chitengo, construído na

era colonial, estava desfeito. Homens

como Roberto Zolho e Baldeu Chan-

de passaram anos em tendas a tentar

salvar o que restava.

O charmoso veterinárioQuando o Governo e a Carr Funda-

tion combinaram restaurar a Goron-

gosa, em 2004, era preciso captar

cientistas, engenheiros, gestores, fi s-

cais. Dezenas de ex-combatentes fo-

ram contratados. Njinga pediu para

o ser. E foi. É um fi scal do Parque

Nacional emprestado à primeira con-

cessão privada, a Explore Gorongosa.

Gostava muito de o ter, no banco

de trás do jipe, nas incursões pelo

mato, ao princípio da manhã ou ao fi -

nal da tarde (nas horas mais quentes,

os animais abrigam-se). Sentia-me

segura. E segura perdi a conta aos

animais que vi — perto das picadas

ou longe e, nesse caso, de binócu-

los para não os tomar por mancha

animada.

Estava maravilhada. Queria ir para

lá da mil vezes contada história do

milionário norte-americano Greg

Carr, que decidiu investir 40 milhões

de dólares na restauração da Goron-

gosa. No Chitengo, estava o informa-

díssimo Vasco Galante, português,

director de comunicação. Onde

estava o charmoso veterinário que

aparecia no documentário da Natio-

nal Geographic, Africa’s Lost Eden?

A Irene queria muito conhecer

Carlos Lopes Pereira. Queria dar-

lhe um abraço, expressar gratidão

pelo trabalho feito, mas o director

dos serviços de conservação aca-

bara de ser promovido a assessor

técnico do Governo para todas

as reservas e parques naturais de

Moçambique: não estava. Haverí-

amos de encontrá-lo em Maputo

e de ouvi-lo contar como desistira

de ir para o Botswana e fi cara em

Moçambique por metade do salário.

“Era um grande desafi o técnico.”

A equipa delineou um plano para

recuperar fauna bravia, reconstruir

infra-estruturas, fomentar o desen-

volvimento económico. O núme-

ro de fi scais duplicou — alcançou

os 120. Criou-se um santuário de

vida animal. Previu-se fazer rein-

trodução massiva, recorrendo ao

Zimbabwe. “A situação política não

dava”, recordou o homem alto, de

barba grisalha, botas de montanha,

roupas de cores neutras, adequa-

das ao mato. “As pessoas querem

fornecer os animais. Pagamos por

eles, mas, quando chega a hora, a

licença de exportação, por razões

que ninguém percebe, não chega.”

Não podiam fi car dependentes

da situação política no Zimbabwe.

Quem sabe quando se alterará? O

Kruger Park, no Norte da África do

Sul, estava a terminar um programa

de reprodução de búfalos livres de

tuberculose e tinha de dar destino

àqueles animais. Carlos Lopes Perei-

ra foi lá dizer-lhes que o lugar certo

era a Gorongosa.

Em Agosto de 2006, vieram os

primeiros 54. Havia um risco: a

doença transmitida pela mosca tsé-

tsé, coisa que os búfalos do Kruger

desconhecem há cem anos. O mé-

dico veterinário preparou-se para

intervir. Não foi necessário. Con-

tinuavam resistentes. E os búfalos

abriram caminho aos elefantes.

Os grandes machos quase tinham

desaparecido da Gorongosa. Só ha-

via elefantes com dentes pequenos

ou sem dentes. Em 2008, vieram

dois machos mais velhos e quatro

machos mais jovens, escolhidos a

dedo, a pensar na regeneração do

fundo genético da população que

fora massacrada durante anos.

Se fosse hoje, não traria os mais

velhos. “O elefante não é um animal

comum — pensa, investiga, reage. Os

jovens eram meios medrosos. Anda-

vam perto das manadas, mas não se

integravam. Depois, lá conseguiram.

Os mais velhos punham-se a andar

para a frente e para trás como qual-

quer macho.”

Usavam colares transmissores

de sinal via satélite. Era assim que

a equipa conseguia saber a sua po-

sição. Carlos Lopes Pereira até co-

çava a cabeça ao perceber como se

afastavam da reserva. Um chegou a

estar a 279 quilómetros do parque.

“Lá descobriu a rota dos elefantes.

Foi para o rio Zambeze e voltou. E

tornou a ir. E foi o azar dele. Houve

uns indivíduos que o apanharam.”

Os caçadores furtivos tentaram

destruir o colar. Carlos Lopes Pereira

notou o movimento anómalo. Pediu

ao centro de controlo o número de

emissões do sinal. Preparou-se para

avançar de helicóptero, à procura do

animal. De repente, viu uma linha

recta em direcção à cidade da Beira.

Não podia ser o elefante. Inseriu as

referências geográfi cas no Google: o

colar estava dentro de uma casa.

Eram dois caçadores: um francês

Njinga (em cima) refugiou-se na Gorongosa da guerra civil de Moçambique. Ao lado, o veterinário Carlos Lopes Pereira.

IREN

E G

RILO

ROBERTO SPAAN

DR

Page 5: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012 | 7

quem, como ela, tanto se preocupa,

uma das muitas razões para voltar a

esse lugar co-gerido pelo Governo de

Moçambique e pela Carr Fundation.

“É um dos sítios mais selvagens de

África”, assegura. “Tem um ecossis-

tema muito variado e muito bonito.”

Uma savana de copa fechada a que

chamam “miombo,” palavra suaíli

que nomeia a árvore preponderan-

te, cobre os dois planaltos. No vale,

capim polvilhado de acácias altas,

diversos géneros de savana, fl ores-

tas secas, charcos. Na serra, fl ores-

tas tropicais, capim de montanha,

fl oresta de galeria. “A ida à serra é

imperdível.” Até para se perceber

como tudo, no mundo, se relaciona.

A Fugas esteve na Gorongosa a convite

da Into África Viagens e Safaris Lda.

e um português. “Apanhámos os

indivíduos com a mão na massa.

Apanhámos os restos do nosso ele-

fante, apanhámos uma ponta que

tinha 3,75 metros de um elefante que

tinha sido abatido na Zambézia, apa-

nhámos troféus, armas ilegais, muni-

ções, uma coisa impressionante.”

O outro também teve um fi m trá-

gico. Afastou-se do parque por causa

dos incêndios, que na Gorongosa são

capazes de queimar macacos nas ár-

vores. Caminhou em direcção ao sul.

“Nós tentamos trazê-lo de volta e ele

acabou morrendo numa combina-

ção de inalação de fumo e stress de

transporte.” Agora, a ideia é trazer

uma família inteira. Os elefantes são

muito sociáveis. Vivem em famílias

que incluem uma matriarca idosa,

vários descendentes e suas crias.

Amiúde, diversas famílias partilham

um território. Quando se encontram

em poços ou no mato, cumprimen-

tam-se com as suas trombas.

São grandes bebedores de água.

Para os ver na Gorongosa, melhor

será seguir a picada que se estende ao

longo do rio Urema. Uma pista: mato

alto pisado e ramos e troncos de acá-

cias amarelas partidos. Mas há que

manter distância. Há quem diga — ve-

ja-se o documentário War Elephants,

protagonizado por Bob Poole e Joyce

Poole — que sofrem de traumas de

guerra. É ajuizado evitar picadas

muito fechadas ao anoitecer. Só nos

deparamos com eles quando já esta-

mos muito perto e eles não gostam.

Chitas incompetentesHouve outras aparatosas reintrodu-

ções de animais selvagens. Vieram

180 bois-cavalos do Limpopo. Vie-

ram mais 132 búfalos, cinco hipopó-

tamos, quatro chitas.

Cada animal desempenha o

seu papel na natureza. Os búfa-

los, por exemplo, têm uma língua

comprida que lhes permite comer

ervas grandes e espessas evita-

das por outros animais de pasto.

E isso ajuda os outros animais a

aceder a ervas mais baixas e a des-

cobrir os caminhos para a água.

Já ninguém pensa em fazer reintro-

duções maciças no Parque Nacional

da Gorongosa, como nos primeiros

tempos. Surpreendidos com a re-

cuperação registada entre 2004 e

2007 em várias espécies, como piva,

chango, javali africano, os peritos re-

defi niram estratégias. O parque já se

gaba de ter das maiores populações

de papa-palas, gondongas e oribis.

Boa notícia para os predadores,

como as chitas.

Vimos uma chita macho a andar,

sozinha, no verde da savana. Mor-

reram duas das quatro que para ali

vieram: uma no transporte, outra na

caça. “Meteu-se com uma imbabala”,

explicou Carlos Lopes Pereira. “As

imbabalas são animais muito sérios.

Lutam. Essa chita… não sei o que lhe

deu para ir à procura de imbabalas.

Enquanto esteve a ser alimentada,

no santuário de fauna bravia, comeu

impalas!”

Apesar de selvagens, as chitas vi-

veram algum tempo em cativeiro.

Estavam “meio incompetentes.”

O que lhes valia era as presas tam-

bém sofrerem de inaptidão. Não

havia ali predador tão veloz. Que

outro animal terrestre consegue

atingir 120 km/hora? O veterinário

encontrou-os mortos. “Estavam

um ao lado do outro e o irmão

a olhar. Nem sequer comeu. A

vida real é esta. O resto é poesia.”

Eu diria que foi poesia que tivemos.

Vimos leões dois dias seguidos. E não

haverá nada que dê tanto prazer à

minha amiga Irene como a presença

dos maiores felinos de África, que ali

têm uma juba mais curta do que o

habitual — um mistério que intriga

“O elefante não é um animal comum — pensa, investiga, reage”, explica Carlos Lopes Pereira

ROBERTO SPAAN

PAUL KERRISON

Page 6: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

8 | FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012

CapaMoçambique

Guia prático

QUANDO IR

Há cerca de 100 quilómetros de picadas a partir das quais se pode observar a flora e a fauna bravia na época seca (Abril a Novembro). Durante a época das chuvas (meados de Dezembro a meados de Março), ficam intransitáveis.

COMO IR

Há voos directos de Lisboa para Maputo e para Joanesburgo e de lá para a Beira. O Parque Nacional da Gorongosa fica a cerca de 200 km da Beira. Se decidir conduzir, tenha em conta que não se vende combustível na reserva: as bombas mais próximas ficam em Inchope, Gondola, Beira, Dondo, Nhamatanda, Chimoio, Caia e Vila da Gorongosa. Pode usar a Estrada Nacional Número 1 de Maputo ou a Estrada Nacional Número 6 da Beira. O seu anfitrião também poderá organizar um transfer do aeroporto.

ONDE FICAR

Acampamento Explore Gorongosa O acampamento, sazonal, luxuoso, está montado no coração da reserva. Iniciativa sul-africana, a primeira de ecoturismo no Parque Nacional da Gorongosa, proporciona uma autêntica vivência de isolamento no mato. Não tem electricidade, água corrente, rede de telemóvel ou Internet. A lotação está limitada a sete tendas e uma casa na árvore. Cada tenda tem uma cama de casal king-size ou individual extra-comprida. Ao lado, uma casa de banho com um chuveiro artesanal. O alojamento abarca todas as refeições,

O mundo em volta

A Comunidade do

Vinho é uma espécie de laboratório.

Nela se experimenta tudo o que se

quer fazer nas comunidades em tor-

no da reserva. Ganhou uma escola,

um posto de saúde, uma associação

de mulheres produtoras de vegetais,

que, por ora, só têm um cliente: o

restaurante de Chitengo. Levam

tudo até ao rio Pungué: tomate, alfa-

ce, repolho, feijão, abóbora, melão,

cenoura, pimento, coentros. Um

barqueiro liga as duas margens. O

responsável pelas compras aguarda-

as, no outro lado, num jipe.

Há uma energia nova nas comuni-

dades que rodeiam o Parque Nacional

da Gorongosa. Domingos Muala, do

departamento de desenvolvimento

humano, nota-a. E explicou-a, uma

tarde, no Centro de Educação Comu-

nitária. “Antes, só os fi scais e suas fa-

mílias se identifi cavam com o parque.

Durante o tempo colonial, as pessoas

foram forçadas a deixar o espaço para

os animais. Aquele forçar criou ran-

cores. Além de perderem o espaço, os

lugares sagrados onde os avós foram

enterrados, não ganhavam nada. O

rancor está sendo sarado agora.”

O desenvolvimento local é um dos

pilares do Projecto de Restauração

da Gorongosa. No início, reinava a

descrença. Começaram as acções de

formação. Domingos Muala alfabeti-

zou uns quantos, ensinou português

a muitos mais, inglês a uns poucos.

Centenas foram contratadas pelo

parque ou pelos concessionários.

“Agora, há muita gente com casas,

motorizadas, telefones celulares,

coisas que antes não tinham sonha-

do ter.” E o projecto tem captado

parceiros para construir escolas e

unidades de saúde.

Mesmo optimista, o professor não

tem ilusões. “Há muitas pessoas sem

poder de compra que continuam a

pensar no parque como o sítio onde

vão buscar a carne porque querem

mandar o fi lho à escola ou à univer-

sidade. E o que queremos é que nin-

guém mate os animais. Daqui a 20

e tal anos, quando já forem muitos,

então as comunidades poderão ca-

çar, mas de forma organizada.”

uma bomba, de um reservatório de

água e um sistema de irrigação gota-

a-gota. Domingos Muela vê ali um

exemplo de sucesso. “Para além da

machamba comum, cada senhora

criou a sua própria machamba.”

Encontrei a presidente da asso-

ciação uma manhã, junto à moder-

na escola primária. “Não costumam

vender tudo”, traduziu o guia. “O

restaurante precisa de repolho. Elas

recolhem 10, eles pedem seis. O resto

apodrece.” E isso é um desconsolo

para elas, que ainda não aprenderam

a dividir ou a transformar as sobras.

Há qualquer coisa de perverso

nesta melhoria de vida. “As pessoas

que trabalham no parque têm mais

esposas do que antes”, tem obser-

vado Corina Clemente, técnica de

saúde pública que está a coordenar

um projecto de saúde e ambiente. “A

primeira coisa que faz um homem

quando tem mais rendimentos é ter

mais uma esposa, mais fi lhos.” E “a

sobrepopulação é uma das maiores

ameaçadas à biodiversidade”.

Há um esforço de formação de

agentes polivalentes elementares

de saúde. Brigadas móveis devem

começar a visitar comunidades a um

ritmo mensal, com um enfermeiro a

fazer planeamento familiar, consulta

pré-natal, despistagem e aconselha-

mento de VIH, tratamento de diar-

reias, malária e outras doenças.

A sobrepopulação devasta a fl o-

resta e acentua os confl itos entre

humanos e fauna bravia. De quando

em quando, um crocodilo apanha

alguém a cruzar o rio Pungué. Tam-

bém há incidentes com elefantes,

sobretudo onde antes andavam. O

parque estende-se para lá do rio,

que ali tinha dois braços: um secou

e as pessoas apoderaram-se dele.

Machos que querem ganhar peso

vão lá. Se as plantas estiverem pe-

quenas, até têm cuidado para não

as pisar. Quando estão no ponto

comem-nas. E é o desespero de

quem perdeu mangas, milho ou

bananeiras.

Não se pode preservar a fauna

bravia e descuidar a fl ora ou as nas-

centes, os rios, os lagos. Os métodos

de cultivo tradicionais, baseados no

corte e na queima, depressa degra-

dam os solos. Devagar, o parque

tenta contrair tais práticas. “Ensi-

namos as pessoas a fazer adubo com

material local. No fi m da colheita,

em vez de pôr fogo, as famílias po-

dem cortar e deixar apodrecer. Se

este ano numa porção produziram

milho, era bom que noutro ano pro-

duzissem feijão.”

Em Vinho, o projecto de restau-

ração fi nanciou às mulheres da as-

sociação a compra e instalação de

IRENE GRILO

PAUL KERRISON

Page 7: Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 · Irene Grilo Gerês Rio de Janeiro A Grade Maomaria Citroën DS5 José Sarmento Marques sabe Lisboa de cor Nice é a Côte d’Azur

FUGAS | Público | Sábado 9 Junho 2012 | 9

incluindo lanche a meio da manhã e a meio da tarde, safari, com guia, de manhã e à tarde, de jipe ou a pé: 582,4€ por pessoa/noite num quarto single ou 388€/pessoa noite em quarto duplo.

Girassol Gorongosa Lodge & SafariO histórico Chitengo, construído em 1941, está a ser restaurado e ampliado por um grupo português. Para já, oferece três tipos de alojamento: nove bungalows standard (18 quartos duplos), seis premium (12 quartos duplos), com rede mosquiteira, casa de banho, ar condicionado; e seis garden rooms, que, em vez de ar condicionado, têm ventoinha de tecto. O rebaptizado Girassol Gorongosa Lodge & Safari tem um bar e um restaurante, que tem wi-fi e serve pequeno-almoço, almoço e jantar (cozinha moçambicana e cozinha internacional). E disponibiliza programas pagos à parte: safaris (manhã e tarde), visitas à Comunidade do Vinho (travessia de barco incluída), à cascata de Morumbodzi, na serra da Gorongosa, e a Bué Maria ao pôr do sol.

Canal de Moçambique

OCEANO ÍNDICO

Maputo

TANZÂNIA

COMORES

MOÇAMBIQUE

MADAGÁSCAR

500 km

MALAWI

Parque da Gorongosa

Estadia, com pequeno-almoço:Preços de 1 de Janeiro a 30 de Junho/ 1 de Julho a 31 de Dezembro Bungalow standard – 94,4 € (individual); 118€ (duplo)/ 104€ (individual); 130€ (duplo)Bungalow premium -104€ (individual); 128€ (duplo)/ 114€(individual); 140€ (duplo)Garden room – 70€ (individual); 94,4€ (duplo)/ 77,6 €(individual); 104€ (duplo)Actividades:Safari: 20,8€ adulto/10,8€ criançaComunidade do Vinho: 9,6€Pôr do sol em Bué Maria: 16€Cascatas de Morumbodzi: 56€

Parque de campismoÉ a mais barata opção do Girassol Gorongosa Lodge & Safari: parque de campismo sanitários, balneários, tanques de lavar roupa, churrasco, espaço coberto para convívio, o que custa entre 40 a 61€ por dia. Pode fazer qualquer uma das actividades pagas à parte. Se quiser fazer safari com o seu próprio carro, pode aprender ali mesmo regras de segurança. Convém é que o seu carro tenha tracção às quatro rodas e boa distância do solo ao chassis.

MAIS INFORMAÇÕES

Parque Nacional da Gorongosahttp://www.gorongosa.net/Tel.: (+258) 82 0050253 Email: [email protected]

Into África Viagens e Safaris, LdaTel.: 252 671290/ 918 194 301Email: [email protected]://www.proafrica.com

Veja a fotogaleria na Fugas online fugas.publico.pt/ Diga SIM às férias!

NA SUA LOJA ABREU | ABREU DIRECTO Telef.: 707 20 1840 | Web: www.abreu.pt

SEGURANÇA E COMPETÊNCIA

portuguesa100%

Comum a todos os programas: exclui despesas de reserva de € 29 por processo (e não por pessoa). Taxas sujeitas a alteração. Sujeito a disponibilidade.

Partidas diárias de Lisboa de 1 Jun. a 30 Out. ‘12

Inclui: avião + 2 noites | APA + taxas de aeroporto, segurança e combustível (€ 62) + Seguro Multiviagens

Madrid

Desde

€ 230por pessoa em duplo

Partidas diárias de Lisboa e Porto de 18 Mai. a 14 Jul. + 21 Ago. a 29 Out. ’12

Inclui: avião + 2 noites | APA + Hotel 3 estrelas + 2 dias viatura grupo A + taxas de aeroporto, segurança e combustível (€ 103) + Seguro Multiviagens

Madeira | Fly & Drive

Desde

€ 297por pessoa em duplo

Partidas de Lisboa e Porto diárias de 18 Mai. a 28 Out. ’12

Inclui: avião + 2 noites | APA + Hotel 4 estrelas + 2 dias viatura grupo A + taxas de aeroporto, segurança e combustível (€ 85) + Seguro Multiviagens

Açores | S. Miguel

Desde

€ 299por pessoa em duplo

Partidas diárias de Lisboa de 1 Jun. à 30 Out. ‘12

Inclui: avião + 2 noites | APA + Hotel H10 Roma Città | 4 estrelas + taxas de aeroporto, segurança e combustível (€ 118) + Seguro Multiviagens

Roma

Desde

€ 316por pessoa em duplo

@ Panthermedia | Asier Villafranca

© Turismo Madeira