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Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Geociências Departamento de Cartografia Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais Programa de Especialização em Geoprocessamento GEOPROCESSAMENTO PARA A ANÁLISE DAS DINÂMICAS GEOESPACIAIS E TEMPORAIS DO PATRIMÔNIO CULTURAL DO DISTRITO DE MIGUEL BURNIER, OURO PRETO, MINAS GERAIS Samuel Ayobami Akinruli Dezembro de 2017

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Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Geociências Departamento de Cartografia Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais Programa de Especialização em Geoprocessamento GEOPROCESSAMENTO PARA A ANÁLISE DAS DINÂMICAS GEOESPACIAIS E TEMPORAIS DO PATRIMÔNIO CULTURAL DO DISTRITO DE MIGUEL BURNIER, OURO PRETO, MINAS GERAIS Samuel Ayobami Akinruli Dezembro de 2017

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Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Geociências Departamento de Cartografia Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais Programa de Especialização em Geoprocessamento GEOPROCESSAMENTO PARA A ANÁLISE DAS DINÂMICAS GEOESPACIAIS E TEMPORAIS DO PATRIMÔNIO CULTURAL DO DISTRITO DE MIGUEL BURNIER, OURO PRETO, MINAS GERAIS Monografia apresentada ao Programa de Especialização em Geoprocessamento do Programa de Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Departamento de Cartografia do Instituto de Geociências (IGC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Orientador: Prof. Dr. Plínio Temba (Departamento de Cartografia/IGC/UFMG). Samuel Ayobami Akinruli Dezembro de 2017

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FICHA CATALOGRÁFICA

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Universidade Federal de Minas Gerais Instituto de Geociências Departamento de Cartografia Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais Programa de Especialização em Geoprocessamento TERMO DE APROVAÇÃO GEOPROCESSAMENTO PARA A ANÁLISE DAS DINÂMICAS GEOESPACIAIS E TEMPORAIS DO PATRIMÔNIO CULTURAL DO DISTRITO DE MIGUEL BURNIER, OURO PRETO, MINAS GERAIS Samuel Ayobami Akinruli Trabalho Final aprovado como requisito à conclusão do curso de Especialização em Geoprocessamento do Programa de Pós-Graduação em Análise e Modelagem de Sistemas Ambientais do Departamento de Cartografia do Instituto de Geociências (IGC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pela seguinte banca examinadora: Prof. Dr. Plínio Temba (Departamento de Cartografia/IGC/UFMG). Prof. Dr. Bráulio Magalhães Fonseca (Departamento de Cartografia/IGC/UFMG).

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AGRADECIMENTOS À Deus Supremo por toda sua abundância pela qual eu pertenço e floresço. Aos meus pais Mr. and Mrs. Akinruli que deram o valor da educação como um dos maiores legados que eu levo para toda a vida. À minha melhor amiga, colega, companheira e, acima de tudo, esposa Luana Campos Akinruli, que incentivou esta pesquisa desde a sua gênese à conclusão, e que ficou ao meu lado em todos os momentos, mediante as viagens e tempestades do campo, o cruzamento e análises transdisciplinares de dados de diversas áreas da ciência, além das noites viradas e dias corridos entre a vida profissional, acadêmica e matrimonial. Obrigado por ser a guerreira e a minha razão de continuar quando parece quase impossivel. Ao Prof. Dr. Plínio Temba, obrigado pela excelente orientação, competência administrativa e integridade na coordenação do curso no ano de 2017, e pelo incentivo contínuo que tornaram possível a conclusão desta pesquisa. A todos os professores do curso de Especialização em Geoprocessamento do Departamento de Cartografia do Instituto de Geociências (IGC) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pelos conhecimentos compartilhados que foram de suma importância em minha trajetória acadêmica. Às contribuições e apoios concedidos de diversas ordens pelo Prof. Dr. Carlos Magno Guimarães do Laboratório de Arqueologia Histórica da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (Fafich-UFMG); ao Dr. Domingos Ventura de Miranda Junior, Promotor de Justiça da 4ª Promotoria de Justiça de Ouro Preto do Ministério Público de Minas Gerais; a José Fernando Castro Bolivar da Diretoria de Informação Territorial e Geoplataforma da Fundação João Pinheiro. Ao Instituto de Inovação Social e Diversidade Cultural (INSOD), instituição a qual me filio e que me concedeu apoio para a realização dessa pesquisa. À toda a comunidade do distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, que desde as crianças aos mais velhos compartilharam suas memórias, histórias, realidades de vida cotidianas e noções de territórios comigo e com a equipe de pesquisadores no campo. Valeu pela experiência vivida e pela convivência! A todos que estão comigo e que são apoiadores nesta jornada de busca e ânsia incansável pelo conhencimento. O conhecimento é poder.

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Eni ó máa je oyin inú àpáta, kò gbodò wo enu okó. He who longs to reach the sweet honey within a rock is never bothered by the twisted axe blade. Aquele que almeja alcançar o doce mel dentro da rocha nunca é incomodado pela lâmina de machado torcida. Antigo Provérbio Yorùbá

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RESUMO Este estudo busca otimizar o uso das técnicas e ferramentas de geoprocessamento destinadas à análise do patrimônio cultural material para o entendimento das dinâmicas geoespaciais e temporais de Miguel Burnier, o maior distrito do município de Ouro Preto, Minas Gerais, Brasil. O patrimônio cultural se mostra um empecilho ao crescimento econômico em regiões de mineração de ferro no Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais no contexto de expansão das atividades mineradoras em grande escala vivenciado nas últimas décadas, e seus desdobramentos relacionados aos impactos ambientais de grande envergadura tem provocado inúmeras situações de conflito. Os estudos técnicos de viabilidade ambiental dos licenciamentos ambientais tendem a desqualificar tais referências culturais, de modo a promover diversas maneiras de apaziguamento de sua importância para a memória e história nacionais. Esta contradição latente influencia diretamente as formas de conhecimento, divulgação e proteção do patrimônio cultural. E, a fim de se promover um contraponto à interpretação, difusão e salvaguarda do patrimônio cultural frente às referências da própria comunidade do distrito estudado sobre o que é de sua significância, será tomado o exemplo da aplicação das ferramentas de geoprocessamento em interação com cartografias históricas da localidade objeto de estudo. As múltiplas temporalidades do patrimônio cultural e, fundamentalmente dos bens arqueológicos e arquitetônicos, dialogam e se contrastam de forma cabal com as variáveis configurações do território o que pode ser visualizado, por exemplo, por meio do uso de diversas plataformas de Sistemas de Informações Geográficas que são capazes de combinar e discriminar as interfaces das representações da realidade. Este trabalho se atrela, ainda, às visões pós-colonialistas e ao conceito de Ecologia da Paisagem, no qual a perspectiva da heterogeneidade é ressaltada como parâmetro de um observador específico em uma escala particular através dos filtros de outras espécies ou comunidades. Assim posto, ressalta-se que o tratamento de dados feito por meio do uso de ferramentas do geoprocessamento é indicado como uma estratégia capaz de tirar o véu da racionalidade determinada pela lógica do capital ao desafiar os discursos hegemônicos que influenciam a forma canônica de ser ler e apreender o território. Palavras chave: Conflito Ambiental; Geoprocessamento; Patrimônio Cultural; Miguel Burnier; Quadrilátero Ferrífero; Pós-Colonialismo.

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ABSTRACT This study seeks to optimize the use of geoprocessing techniques and tools for the analysis of material cultural heritage, understanding the geospatial and temporal dynamics of Miguel Burnier, which is the largest district in the municipality of Ouro Preto, Minas Gerais, Brazil. Cultural heritage constitutes an obstacle to economic growth in iron ore mining regions known as Quadrilátero Ferrífero in Minas Gerais, during the expansion of large-scale mining activities in the last decades, and its related consequences to large-scale environmental impacts have provoked numerous conflict situations. The analyzed technical environmental feasibility studies for environmental licensing tend to disqualify such cultural references in order to promote various ways of embellishing their importance to national memory and history. This latent contradiction directly influences the forms of knowledge, dissemination and protection of cultural heritage. And, in order to promote a counterpoint to the interpretation, diffusion and safeguarding of the cultural heritage using the references and significance of the studied community – district, an example of the application of geoprocessing tools in interaction with historical cartographies of the locality under study will be looked into. The multiple temporalities of cultural heritage, especially archaeological and architectural assets, interact and contrast in a complete way with the variable territorial configurations which can be visualized, for example, through the use of several platforms of Geographic Information Systems that are able to combine and discriminate the interfaces of representations of the reality. In addition, analysis of this study treads the concept of landscape ecology where heterogeneity exists for at least one parameter, a specific observer and on a particular scale through the eyes of other species or communities from an ecological perspective. As such, data treatment through geospatial analysis and transdisciplinary approach can be a conjunction of tools capable of unveiling rationality determined by the capital logic by challenging the hegemonic discourses that influence the canonical form of the territory reading and comprehension. Keywords: Environmental Conflict; Geoprocessing; Cultural Heritage; Miguel Burnier; Quadrilátero Ferrífero; Postcolonialism.

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LISTA DE TABELAS 1. Classes utilizadas na Figura 5........................................................................................... 31 2. Métricas adotadas para análise das manchas no Fragstats................................................ 33 3. Métricas de Manchas........................................................................................................ 34 4. Métricas de Classes........................................................................................................... 34 5. Métricas da Paisagem........................................................................................................ 35 6. Distritos de Ouro Preto e sua área em km2....................................................................... 35 7. Distribuição territorial dos distritos de Ouro Preto em porcentagem............................... 36 8. Polígonos identificados na Figura 10 no distrito sede de Miguel Burnier........................ 42

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LISTA DE FIGURAS 1. Mapa da região do Quadrilátero Ferrífero com destaque para o distrito de Miguel Burnier no município de Ouro Preto.............................................................................................. 26 2. Mapa de detecção da mudança da cobertura do solo na região do Quadrilátero Ferrífero, entre os anos de 1988 a 2017, com destaque para o município de Ouro Preto e seus distritos.............................................................................................................................. 27 3. Geolocalização do distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais....................... 29 4. Mapa referente ao processo de mineração no Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais................................................................................................................................ 30 5. Mapa de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais, em relação ao processo de mineração.......................................................................................................................... 31 6. Mapa referente às áreas de interesse mineral de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais................................................................................................................................ 32 7. Geolocalização dos patrimônios culturais materiais identificados em Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais, totalizando 429 pontos de relevância cultural....................... 38 8. Expansão dos empreendimentos da Gerdau no distrito sede de Miguel Burnier (2006)................................................................................................................................ 40 9. Expansão dos empreendimentos da Gerdau no distrito sede de Miguel Burnier (2006-2017). A mancha à direita apresenta a atual malha urbana restante................................. 40 10. Vista do distrito sede de Miguel Burnier tendo à esquerda o empreendimento da Gerdau S.A. e, à direita, a localização do núcleo urbano – Distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 41 11. Bens culturais materiais identificados na sede do distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais. Os itens numerados se tratam dos bens arquitetônicos ainda preservados, e os pontos em verde apontam para os vestígios arqueológicos identificados.................... 41 12. Estrada para Miguel Burnier (MG-030) com intenso fluxo de caminhões e placas indicativas de propriedade particular da Gerdau S.A. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 43 13. Estrada para Miguel Burnier (MG-030) com piquetes e excesso de lama. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................................................................. 43 14. Estrada para Miguel Burnier (MG-030). Miguel Burnier, Ouro Preto/MG...................... 43 15. Estrada para Miguel Burnier (MG-030). Miguel Burnier, Ouro Preto/MG...................... 43 16. Pico do Vigia, bem tombado em nível municipal localizado às margens da estrada para Miguel Burnier (MG-030). Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................... 44 17. Cemitério da comunidade, limítrofe à UTM II que foi construída em fins dos anos 2000. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG...................................................................................... 44 18. Vista do distrito a partir da MG-030, vendo as estruturas e apoio à mineração. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................................................... 44 19. Santuário do Sagrado Coração de Jesus, delimitado com placas indicativas das atividades minerárias. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.................................................................... 44 20. Conjunto da Usina Wigg. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG............................................. 45 21. Antiga edificação associada à Usina Wigg. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................. 45 22. Sede urbana do distrito e local onde existiam os entroncamentos das diversas linhas de trem. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG............................................................................. 45 23. Sede urbana do distrito, com trecho de linha férrea que atualmente está sob concessão da VLI. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.............................................................................. 45 24. Estação Ferroviária de Miguel Burnier. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG....................... 46

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25. Casas em estilo art-déco existentes no núcleo urbano. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 46 26. Imóvel ligado ao patrimônio ferroviário existente no núcleo urbano. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................................................................. 46 27. Conjunto ferroviário da sede urbana em dia de procissão no distrito. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................................................................. 46 28. Túnel da Estrada de Ferro D. Pedro II. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG........................ 47 29. Túnel presente na sede urbana do distrito. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................... 47 30. Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG............................................. 47 31. Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG............................................. 47 32. Edificações associadas à Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 48 33. Edificações associadas à Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 48 34. Edificações associadas à Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 48 35. Muro de pedras do século XVIII, presente no cemitério antigo de Calastrois. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................................................... 48 36. Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 49 37. Cemitério novo da Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................................................................. 49 38. Capela de Nossa Senhora da Conceição do Chiqueiro dos Alemães. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 49 39. Capela de Nossa Senhora da Conceição do Chiqueiro dos Alemães. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.......................................................................................................................... 49 40. Ruínas da Casa de Campo Lago Soledade. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG.................. 50 41. Ruínas da Casa de Campo Lago Soledade, localizada em propriedade particular da Gerdau S. A. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG................................................................. 50

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SUMÁRIO 1. Introdução......................................................................................................................... 11 2. Justificativas e Objetivos do Trabalho ............................................................................. 14 3. Metodologias – Estratégias de Ação................................................................................. 16 3.1 O Patrimônio Cultural e seus Métodos de Identificação: o INRC e o IPAC.............. 16 3.2 A Perspectiva Etnográfica.......................................................................................... 21 3.3 O Geoprocessamento do Patrimônio Cultural............................................................ 23 4. Processamento e Resultados............................................................................................. 25 4.1 A Região do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais.......................................... 25 4.2 O Distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais..................................... 28 4.2.1 O Patrimônio Cultural de Miguel Burnier, Ouro Preto................. 36 5. Discussões......................................................................................................................... 51 6. Referências Bibliográficas................................................................................................ 57

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1. INTRODUÇÃO A pesquisa intitulada Geoprocessamento para a análise das dinâmicas geoespaciais e temporais do patrimônio cultural do distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais tem por objetivo geral desenvolver uma pesquisa que consiga promover a coleta e o cruzamento de dados relacionados ao patrimônio cultural, para fomentar, frente às projeções geográficas e cartográficas produzidas nesta pesquisa, discussões a respeito do ordenamento e distribuição territorial dos bens culturais ao longo do tempo. A pesquisa tem o intuito, ainda, de desdobrar reflexões a respeito das transformações históricas na dinâmica da paisagem do distrito de Miguel Burnier, localizado no município de Ouro Preto, por meio dos patrimônios culturais de duas tipologias específicas: os bens arquitetônicos e arqueológicos. Sublinha-se que o recorte espacial da pesquisa se situa na região do Quadrilátero Ferrífero, possivelmente a maior província mineral conhecida no Sudeste do Brasil, que se localiza na porção central do Estado de Minas Gerais e abrange uma área de 700.000ha. Tem por principais limites a Serra do Curral (a norte), a Serra de Ouro Branco (a sul), a Serra da Moeda (a oeste), e a Serra do Caraça (a leste) (RUCHKYS; TRAVASSOS, 2015: 10). Tal questão é relevante por se relacionar a uma área de ocorrência de patrimônio natural e cultural, e cuja região apresenta ocupação histórica que remonta a aspectos de contextos de mineração colonial, instalação de fazendas, formação de arraiais, fundação de igrejas, desenvolvimento da industrialização e siderurgia, incremento de ferrovias etc. E, a fim de promover um contraponto aos procedimentos de identificação, interpretação, difusão e salvaguarda do patrimônio cultural, serão aplicados diversos mecanismos de gestão de dados espaciais em uma área específica. As múltiplas temporalidades do patrimônio cultural e, fundamentalmente dos bens arquitetônicos e arqueológicos são contrastados com as variáveis configurações do território o que pode ser visualizado, por exemplo, por meio do uso de diversas plataformas de Sistemas de Informações Geográficas que são capazes de combinar e discriminar as interfaces das representações da realidade. Esta pesquisa pretende justapor os resultados decorrentes de práticas que seguem as metodologias de campos científicos das ciências humanas e as metodologias das ciências exatas e da terra, de forma a cruzar fontes primárias e secundárias. Assim, o cruzamento de fontes históricas (manuscritos, fontes iconográficas e cartográficas especialmente levantados para essa pesquisa), em contraste com os artefatos da cultura material (dados arqueológicos da pesquisa in loco), serão somados aos dados secundários presentes em documentos produzidos em pesquisa’ para licenciamentos ambientais constantes nas bases de dados da Fundação Estadual do Meio

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Ambiente (FEAM) e do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), e de outros documentos relacionados ao Inventário do Patrimônio Cultural (IPAC) promovido pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA-MG). Com esse corpus documental, proceder-se-á a utilização de ferramentas de SIG para a produção de dados vetoriais e matriciais que comporão mapas da área de estudo, a fim de promover as discussões a respeito das interfaces das diversas temporalidades do patrimônio cultural material (bens arquitetônicos e arqueológicos) no território; as diversas configurações dos conjuntos patrimoniais formados; bem como sobre as mudanças e permanências do patrimônio cultural no espaço pesquisado. Os aspectos metodológicos de seleção que orientam o recorte dos procedimentos de identificação e caracterização do patrimônio cultural seguem critérios amplamente discutidos tanto pela literatura das Ciências Humanas quanto pelos diplomas legais brasileiros, cujos critérios, de forma em geral, estão associados às práticas sociais coletivas ligadas a valores como importância para a memória, excepcionalidade, monumentalidade, singularismo ou universalidade;valor histórico, científico, artístico; relevância formal, estética ou de uso costumeiro; ser fonte de conhecimento ou de produção técnica ou tecnológica e, ainda pelas relações de afetividade destacadas. O conjunto de bens culturais é classificado, para fins operacionais, de acordo com categorias que se inter-relacionam funcional e espacialmente por meio dos vínculos constitutivos e de pertencimento surgidos ao longo do tempo e do espaço, identificando locais de procedências a valores compartilhados coletivamente que são assim classificados tanto pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) quanto pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG), a saber: estruturas arquitetônicas e urbanísticas (núcleos, sítios e conjuntos urbanos e rurais, bens edificados isoladamente como igrejas, capelas, residências, praças); bens móveis e integrados (acervo de natureza artística e estética, tomados isoladamente ou integrados, como imagens religiosas, cruzeiros, móveis, chafarizes, esculturas, pinturas de igrejas, retábulos), bens naturais, arqueológicos, espeleológicos e paleontológicos (acervo em diálogo direto com o meio-ambiente como serras, ruínas, grutas, cachoeiras); bens arquivísticos (bens documentais tomados isoladamente ou integrados, como livros de tombo, o acervo de um cartório, biblioteca, museu, igreja, coleções de fotografias); bens imaterias (acervo intangível, como festas, danças, formas de fazer). Pretende-se que o ambiente computacional orientado à análise e interpretação dos bens culturais em relação ao distrito de Miguel Burnier possa conceder informações não somente sobre a análise espacial do caso em estudo, bem como iluminar novos aspectos de interpretação

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do relacionamento entre o patrimônio imaterial e material. Assim, a construção, leitura, análise e interpretação dos documentos gráficos serão instrumentos importantes para subsidiar e produzir conhecimento junto à pesquisa histórica e arqueológica, de forma a permitir a compreensão da análise espacial e temporal dos bens culturais permitindo o entendimento sobre a disposição, os uso e apropriações do patrimônio cultural e do território. Esta pesquisa de especialização está em contribuição à pesquisa doutoral em desenvolvimento no Programa de Antropologia/Arqueologia da Universidade Federal de Minas Gerais (PPGAN-UFMG) desde o ano de 2013, que tem por estudo de caso a análise de grandes empreendimentos filiados à mineração de ferro no estado de Minas Gerais, tomando-se por estudo de caso o distrito de Miguel Burnier em Ouro Preto.

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2. JUSTIFICATIVAS E OBJETIVOS DO TRABALHO O contexto de expansão da atividade mineradora na região do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais vivido nas duas últimas décadas e seus desdobramentos relacionados aos impactos ambientais tem provocado situações de conflito. Tais enfrentamentos se situam não somente na instância econômica, mas se refletem nas bruscas alterações dos modos de vida locais, nas disputas territoriais, nas modificações do meio-ambiente, na destruição do patrimônio cultural, nos conflitos de direitos à memória. Esse contexto de disputas de lógicas diferenciadas e contrastantes da noção de desenvolvimento e da apropriação do ambiente provoca confrontos e refletem práticas de desigualdades e violências epistêmicas. As relações assimétricas estabelecidas entre as partes envolvidas com os processos de licenciamento ambiental acabam por definir o direito à vida ou à morte do patrimônio cultural. As ressignificações dos sujeitos, de suas histórias, de suas memórias e de seu patrimônio são chanceladas por referências que geralmente não são as mesmas da comunidade impactada pelo empreendimento, ao passo que o Estado estabelece marcos regulatórios da exploração ambiental que estabiliza as diferenças e legitima as desigualdades ao mobilizar a cultura para fins estratégicos. Esta pesquisa analisa o patrimônio cultural da comunidade de Miguel Burnier, distrito de Ouro Preto, que contempla bens dos séculos XVIII ao XX, suas formas de conhecimento, interpretação e valoração do patrimônio cultural por parte da comunidade, frente ao panorama contemporâneo de disputas e incertezas de salvaguarda no contexto de conflito ambiental a partir da implementação do Complexo Minerário da Gerdau Açominas S.A. Para tanto, emprega-se pesquisa histórico, arqueológica e etnográfica com fins de se identificar o patrimônio cultural da coletividade estudada. E a questão do patrimônio cultural é, atualmente, uma ferramenta de proteção da comunidade frente às discussões sobre pertencimento e identidade local, haja vista que subsidia uma discussão profunda e contraditória na comunidade, na qual dois grupos antagônicos disputam sobre o direito de permanecer ou abandonar o distrito de Miguel Burnier. O patrimônio cultural e, especialmente no contexto estudado o patrimônio arquitetônico e arqueológico, mostra-se um empecilho ao desenvolvimento econômico em regiões de mineração de ferro no Quadrilátero Ferrífero de Minas Gerais. E os estudos técnicos de viabilidade ambiental dos licenciamentos ambientais tendem a desqualificar tais referências culturais, de modo a promover diversas maneiras de apaziguamento de sua importância para a memória e

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história locais, regionais e nacional. Esta contradição latente influencia diretamente as formas de conhecimento, interpretação, apropriação, divulgação e proteção do patrimônio cultural. As múltiplas temporalidades do patrimônio cultural se comunicam e se contrastam de forma cabal com as variáveis configurações do território. Ao fim e, ao cabo, vislumbra-se a quebra da cumplicidade existente na consagração de uma determinada hegemonia do conhecimento do patrimônio cultural que promove violências epistêmicas (SPIVAK, 2010) e os deliberados esquecimentos do patrimônio cultural nos estudos técnicos dedicados à questão patrimonial em Miguel Burnier. É incontestável a antiguidade da ocupação histórica da região do Quadrilátero Ferrífero, que remonta a aspectos de nossa história e memória de contextos de mineração colonial, instalação de fazendas, formação de arraiais, fundação de igrejas, desenvolvimento da industrialização e da siderurgia, incremento de ferrovias, dentre outros, e que refletem os relacionamentos entre o material e o imaterial da cultura. O geoprocessamento é uma ferramenta capaz de tirar o véu da racionalidade determinada pela lógica do capital ao desafiar os discursos hegemônicos que influenciam a forma como lemos e apreendemos o território. Tanto do ponto de vista das temporalidades quanto das espacialidades, o patrimônio cultural reflete as marcas da ocupação do território, as mudanças e permanências da população, suas bases econômicas, o processo de urbanização, os caminhos e rotas das pessoas e de seus patrimônios, os impactos ambientais.

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3. METODOLOGIA – ESTRATÉGIAS DE AÇÃO Esta pesquisa pretende promover uma interação entre metodologias de campos científicos das ciências humanas e ciências exatas e da terra, com destaque para a Geografia, História, Antropologia e Arqueologia, pautando-se tanto nos procedimentos de identificação e registro do patrimônio cultural sob o viés dos órgãos oficiais como o IPHAN e o IEPHA-MG, quanto pela perspectiva etnográfica tendo como referência os discursos dos grupos e dos detentores dos bens culturais. Associado a isso, tem-se o tratamento de dados geoespaciais a fim de determinar o mapeamento das dinâmicas espaço-temporais do patrimônio cultural em Miguel Burnier. 3.1. O Patrimônio Cultural e seus Métodos de Identificação: o INRC e o IPAC A temática do patrimônio cultural tem atraído o interesse de um número significativo de pesquisadores, dentre eles e, prioritariamente, museólogos, antropólogos, arquitetos, arqueólogos, geógrafos e historiadores que, através de abordagens e temas diversos, contribuem para a formação de um conjunto amplo e variado de estudos, muitos dos quais voltados para a pesquisa e a análise dos fenômenos culturais. Atualmente, é ampla a discussão sobre as origens e desdobramentos do conceito de patrimônio. Uma bibliografia, de certa forma já vasta, discute a arqueologia do termo, apresentando o seu uso arcaico em tempos do Império Romano, no qual patrimonium significava “tudo o que podia ser legado por testamento, sem excetuar, portanto, as próprias pessoas”; indo até a referência moderna do termo referente à constituição do Estado nacional da França em fins dos setecentos, no qual se entendia patrimônio como algo que é público, popular e de uso coletivo (FUNARI & PELEGRINI, 2006: 11). Ao longo da história houve um processo de ressignificações do termo patrimônio no qual inicialmente adotava uma concepção aristocrática, patriarcal e individual, advinda da Roma antiga, que foi acrescido pelos sentidos simbólicos e coletivos de influência religiosa durante o Feudalismo, além da concepção monumental e colecionista de influências renascentistas. A Revolução Francesa pretendeu arruinar com tais fundamentos ao fundar naquela sociedade os ideais de igualdade. A concepção moderna de patrimônio se consolidou e foi difundida, em grande medida, a partir da visão de pertencimento dos cidadãos a um mesmo Estado nacional, compartilhando de uma origem, território, cultura e patrimônio comuns. A partir de então e ao longo do novecentos até meados do século XX, consolidou-se uma ideia de patrimônio filiada à homogeneidade das culturas desses Estados nacionais, no qual a monumentalidade dos bens pertencentes ao acervo cultural refletia a importância e solidificação

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dos países nascentes. Tais referências que, muitas vezes, filiavam-se às estruturas de natureza arquitetônica, materializavam uma determinada memória de heroísmo dos grandes homens da história nacional e esboçavam o início de inventário daquele acervo que passou a ser tratado como patrimônio histórico. Eram eliminadas, pois, as diferenças e as heterogeneidades da cultura como estratégia de construção da nacionalidade. Há, nesse processo, uma dicotomia latente entre duas concepções de ver e viver no mundo que é própria do contexto de modernidade: o passado é muitas vezes considerado como algo que precisa ser superado em busca de uma nova civilização, ao passo que, em outros momentos, este precisa ser relembrado, uma vez que é rápido o seu processo de esquecimento. É nessa dinâmica que nascem no Brasil, por exemplo, os primeiros movimentos preservacionistas liderados pelos integrantes do Movimento Modernista que também atuaram no recém-criado órgão de preservação do patrimônio histórico e artístico nacional: o Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN) que data de 1937. Na busca pelas tradições dos brasileiros, era construída uma identidade nacional representada pelas majestosas igrejas barrocas e obras de mestres como Aleijadinho, não obstante as manifestações da cultura popular e indígena como músicas, contos, lendas, medicina, culinária e outros já fossem mencionadas no Anteprojeto de Proteção do Patrimônio Artístico Nacional produzido por Mário de Andrade na década de 1930. Na esteira destas mudanças é ainda relevante sublinhar as grandes transformações sociais geradas pela industrialização, especialmente entre meados do século XIX e do XX. O termo patrimônio assumiu nesse contexto sua relevância social e mesmo simbólica e está, portanto, filiado aos movimentos preservacionistas na medida em que se atesta o processo de modificação, perda e/ou destruição dos acervos culturais. Na contemporaneidade, tal assertiva é bastante relevante no panorama de grandes impactos gerados por um específico modelo econômico desenvolvimentista. Nas últimas décadas, a ampliação dos usos e funções sociais do conceito de patrimônio também alarga a necessidade de interpretação de sua dinâmica na sociedade contemporânea, uma das questões levantadas nesse projeto. Na diversidade de interesses dos benefícios que se espera obter, em um contexto de acelerada especulação dos bens culturais, é relevante sublinhar a problemática a respeito da relevância social do patrimônio cultural. Os valores sociais fundamentam a análise de como o patrimônio é interpretado ao longo do tempo, bem como sobre a forma de classificação e promoção de políticas de salvaguarda.

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A globalização, por sua vez, promove a situação em que as comunidades se manifestam como agentes decisórios na definição do que é considerado por patrimônio. Novas coletividades se tornam visíveis no cenário social, buscando afirmar suas identidades ao mesmo tempo em que a posição privilegiada das identidades até então hegemônicas se tornam passíveis de questionamentos. A nação não é vista apenas pelo prisma da homogeneidade, mas sim por seu conjunto de diferenças e multiplicidades presente no território do país. Essa dinâmica é responsável por estabelecer a valorização das referências culturais locais, de natureza material e imaterial, com o intuito de buscar o conhecimento de uma história aberta às diversidades e abrir caminhos para a constituição da cidadania cultural (SOARES, 2009: 34). É possível afirmar que a ampliação do conceito de patrimônio foi o resultado de um debate que se arrastou por séculos e que foi motivado por inúmeros fatores, como o processo de industrialização e desenvolvimento das cidades brasileiras que passaram a alterar a sua tipologia e configuração espacial. O antropólogo argentino Néstor Canclini sublinha que nos debates sobre patrimônio, normalmente são sempre considerados como os antagonistas das ações em prol dos dos bens culturais os atuais processos de mudança e desenvolvimento urbano, a mercantilização, as indústrias culturais e o turismo. (...) consideraremos essas “ameaças” como contextos, que não só devemos aceitar por serem as condições em que hoje os bens históricos existem, mas também porque contribuem para repensar o que devemos entender por patrimônio histórico e por identidade nacional (CANCLINI, 1994: 95). Nessa perspectiva histórica, é interessante a análise de que a compreensão da noção de patrimônio depende de diversos enlaces, uma vez que é posto o pressuposto que o patrimônio cultural tem usos muito estratégicos na contemporaneidade, com funções políticas e econômicas muito específicas. Quais são os atributos e valores de referência para os bens culturais serem considerados patrimônio? O que faz incluir e excluir referências culturais de inventários? A quem interessa preservar e fazer esquecer? A memória contribui para a organização do redemoinho de nossas percepções, atualizando-as, fixando-as e ordenando-as de acordo com determinada lógica, em um esforço seletivo e estruturante sem o qual as narrativas e identidades se tornariam um caos de impressões. E nesse processo, o presente é o responsável por essa seleção e descrição na tentativa de reconstrução do passado. Seguindo as teorias do sociólogo francês Maurice Halbwachs, as construções do passado são sustentadas por estruturas coletivas e criadas por atores sociais, e tudo o que nós lembramos do passado faz parte de representações sociais que

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são realizadas no presente. Indivíduos não recordam sozinhos, quer dizer, “indivíduos não se lembram por si mesmos e, para lembrarem, necessitam da memória coletiva, isto é, da memória que foi construída a partir da interação entre indivíduos” (SANTOS, 2003: 51). A memória que celebra o patrimônio cultural está muito ligada a certos interesses e desejos de se construir determinada representação e uma memória coletiva de coesão social (DURKHEIM, 1999). Todo real, entendido como conhecimento e interpretação que os homens atribuem à realidade, é uma representação daquilo que existiu de fato, e a história, bem como a memória, também constroem representações desse passado, de modo que a “representação de um objeto corresponde, então, a um conjunto de informações, de opiniões e de crenças referentes a esse objeto” (SILVA, 2000: 86). A identidade de um grupo – as suas diferenças em relação a outros grupos – é construída por meio de um conjunto de representações, imagens e simbologias apreendidos pelos sentidos, pela memória. A memória, portanto, funciona de forma ativa na reconstrução do passado através de suas experiências anteriores, e interfere nas formas de interpretação da realidade. O não entendimento das estratégias específicas do repertório da memória é também um dos resultados do contexto de modernidade que tende a desfazer o antigo em detrimento do novo, o que gera ondas de nostalgia e de salvaguarda daquilo que represente o tempo perdido. A sensação é de perda, de um vazio que só pode ser preenchido pela admiração mítica da coisa antiga, pela atração irresistível aos centros históricos e construções pretéritas, e pelo incremento turístico provocado pelos museus. Pode ser considerado que o esquecimento é em si mesmo um método, uma vez que é preciso “aprender a esquecer para recordar o sentido”, ou em outras palavras é preciso esquecer para que as lembranças possam vir à tona, já que todas as experiências passadas não podem ser fisicamente armazenadas e é justamente a partir desse exercício que conseguimos realizar reflexões filosóficas, abstrações, e mesmo a produção e esquecimento do conhecimento (MITRE, 2003: 27). O Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) foi elaborado pelo Instituto Nacional do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) no ano de 2000, à luz das teorias desenvolvidas pelas ciências sociais, trata-se de um conjunto de procedimentos para o conhecimento, identificação, documentação e registro de bens culturais representativos dos diferentes grupos sociais do Brasil, e a construção de instrumentos e métodos adequados à sua pesquisa e valorização, de forma a promover a preservação do acervo cultural de relevância nacional. Os inventários culturais realizados sob a perspectiva etnográfica, balizada pelo INRC, exigem a participação da comunidade diretamente interessada e relacionada à pesquisa no

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processo de identificação, distinção, avaliação e categorização do saber produzido e utilizando a mediação dos técnicos envolvidos. Nesse processo, a situação de diálogo que necessariamente se estabelece entre pesquisadores e membros da comunidade propicia uma troca em que todos saem enriquecidos: para os agentes externos, valores antes desconhecidos ampliam seu conhecimento e compreensão do patrimônio cultural; e para a comunidade, esse contato pode significar a oportunidade de identificar e valorizar partes do acervo material e simbólico que constitui uma riqueza às vezes desconhecida ou não devidamente avaliada. Dessa forma, faz-se ampla pesquisa participativa de caráter etnográfico para, por e com a comunidade, cidade, grupo étnico ou qualquer coletividade envolvida no estudo. Isso, porque é preciso definir um ponto-de-vista para organizar o que se quer identificar e, para isso, é necessário construir um determinado recorte, baseado em critérios explícitos e que sejam de aplicação universal. Por sua vez, o Inventário de Proteção do Acervo Cultural de Minas Gerais (IPAC/MG) está em uso pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (IEPHA/MG) desde o ano de 1995, o IPAC/MG propõe medidas administrativas de proteção do patrimônio cultural de forma a promover atividades sistemáticas e permanentes de pesquisa, identificação e documentação, visando o cadastramento do patrimônio cultural mineiro em seus 853 municípios, sendo uma metodologia de referência também para outros Estados do Brasil. A execução do inventário pressupõe cruzamentos de diversas fontes advindas de amplas pesquisas de campo, documental, arquivística, oral, cartográfica e bibliográfica. São produzidas fichas de inventário com o preenchimento de campos de informação necessários à identificação, localização e descrição das características materiais e imateriais, compreendendo critérios sociais, econômicos, históricos, estéticos, paisagísticos, ecológicos, construtivos e simbólicos do patrimônio cultural inventariado em relação ao seu contexto. Ressalta-se que as metodologias indicadas e que atualmente orientam os procedimentos de estudos do patrimônio cultural nacional são, nesse estudo, também objetos de investigação na medida em que são por meio desses procedimentos que se constroem as balizas que fundamentam aquilo que tem o direito de se tornar relevante para a memória e história nacional. Nesse aspecto, são profundos os interesses de perscrutação a respeito das estratégias de seleção, recortes e escolhas sobre os bens culturais relacionados à temática dessa pesquisa.

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3.2. A Perspectiva Etnográfica Busca-se, por meio da etnografia, produzir narrativas que apreendam as percepções dos interlocutores sobre o ambiente social, cultural, o clima, a descrição da paisagem, sua história, dentre outros aspectos relacionados ao local ou ao bem estudado, ao mesmo tempo em que são explicitadas questões pertinentes às dimensões específicas do trabalho de campo e do momento da produção escrita pela equipe de pesquisadores envolvidos. O tempo do encontro, a ocorrência do trabalho de campo, a relação, constitui-se uma situação de relação peculiar com os interlocutores, condição de dois mundos em encontro – aquele que é levado a campo pelo pesquisador e daquele outro deparado na realidade do campo. Trata-se da essência da experiência antropológica/etnográfica, cujo registro privilegia não somente a visão do pesquisador sobre os pesquisados, uma vez que a narrativa precisa demonstrar a afetação causada pelos relacionamentos estabelecidos no momento do trabalho de campo. O momento da escrita, por sua vez, o tempo do reencontro, abre espaço para as idiossincrasias da coletividade, para as particularidades dos sujeitos, de modo a expor não somente a norma, mas o seu desvio. Desse olhar treinado que associa o geral e o específico, desenha-se um quadro conceitual e metodológico específico de análise antropológica, em um tempo específico de reflexão sobre o vivido. As escolhas que a pesquisa faz em torno de sua escrita etnográfica são, portanto, resultados bastante particulares do engajamento com o grupo estudado. Neste aspecto, as especificidades de cada etnografia residem tanto nos envolvimentos e interações muito peculiares com os nativos em campo, quanto na reelaboração das experiências por meio da escrita. A empatia do pesquisador com a coletividade pesquisada deve ser fulcral a ponto de se levar a sério o universo cultural de seus interlocutores, concedendo a medida de sua importância e de modo a ressaltar sobre as necessidades de entendimentos linguísticos específicos (FABIAN, 2002). Assim, não se trata de uma extrema separação entre o campo da etnografia no qual se realiza o trabalho de campo e o trabalho de gabinete específico do métier antropológico, haja vista que a noção de experiência e embasamento téorico-metodólogico, esta tensão criativa entre pesquisa e teoria, parecem ser mais faces inseparáveis da mesma moeda. Dissolvem-se essencializações sobre os nativos, promovendo-se, assim, o dinamismo histórico do grupo pesquisado, sem congelar e criar suspensões no tempo das ações dos nativos. A escrita etnográfica, porém, não deixa de ser um distanciamento da realidade vivida, entretanto, de forma a não criar um abismo entre o pesquisador e os nativos ao se tentar manter a “coetaneidade”

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entre o tempo de vida e o tempo de escrita. Se tomarmos as palavras de Vincent Capranzano, a etnografia seria um sintoma do confronto com a alteridade, a tentativa dialética de se colocar um ponto final no encontro, removendo-se assim da vida dos etnografado (CRAPANZANO, 1977). Possivelmente o primeiro ponto de clivagem nas etnografias produzidas que levam em consideração não somente o contexto específico de nossos interlocutores, mas como estes pensam, sentem e produzem o seu próprio conhecimento sobre sua cultura, seja o momento pelo qual o encontro, a relação, e o convívio do pesquisador com o universo do outro passou a ser o fulcro da narrativa. De dois mundos que se encontram, que se comparam, que produzem idiossincrasias, a etnografia produz relação entre seus interlocutores, o que inclui o próprio pesquisador e sua subjetividade. Nem por isso, é possível afirmar que toda etnografia é um registro autobiográfico por excelência, haja vista que carrega em si, ainda, um momento etnográfico de análise dos contextos que não pode ser subdimensionado. A etnografia se trata de uma forma de diálogo não somente sobre o outro, mas com o outro. As múltiplas vocalidades, as cosmovisões, aparecem nas experiências etnográficas como questão prioritária: trata-se não somente de falar sobre o outro, de dar voz ao outro, ou traduzir o universo nativo. É antes uma interlocução entre o mundo do outro e o meu mundo, sendo a etnografia uma ponte entre a teoria nativa e a teoria antropológica. Na ruptura da produção de uma voz genérica sobre as coletividades pesquisadas, pretende-se construir relações simétricas na experiência etnográfica propiciando a interlocução entre o mundo do outro e o mundo do pesquisador (PEIRANO, 1995). As categorias nativas passam a explicitar, portanto, no duplo objetividade/subjetividade, haja vista que para além de simples dados etnográficos, tratam de conceitos e teorias compreendidas nos próprios termos dos outros. Cunha-se, nesta seara de falar com outro, não somente sobre o outro, a ponte entre a teoria antropológica com seus campos conexos, tendo a etnografia e a arqueologia campos profícuos. O deslocamento do eixo promove a busca por outro balanço entre aquilo que é relevante e estruturante para o grupo etnografado. A polifonia passa a ser para além de uma experiência, é a gênese, o modelo de narrativa, o paradigma de construção do conhecimento. A força da fala está, pois, no encontro; o poder do conhecimento está na interlocução. A perspectiva etnográfica que se pretende com essa pesquisa exige pesquisa em campo tanto para o levantamento dos dados primários e secundários a respeito dos bens culturais estudados – os cruzeiros e demais manifestações culturais imateriais associadas – quanto para a seleção e definição dos bens culturais e conceitos relacionados a estes bens junto à comunidade estudada. Os dados deverão ser materializados na forma de mapas digitais, usando-se aplicação

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cartográfica, para que se produza a interpretação da ocupação, intervenção e apropriação do espaço e território devocional. Os inventários culturais realizados sob a perspectiva etnográfica exigem a participação da comunidade diretamente interessada e relacionada à pesquisa no processo de identificação, distinção, avaliação e categorização do saber produzido e utilizando a mediação dos técnicos envolvidos. Nesse processo, a situação de diálogo que necessariamente se estabelece entre pesquisadores e membros da comunidade propicia uma troca em que todos saem enriquecidos: para os agentes externos, valores antes desconhecidos ampliam seu conhecimento e compreensão do patrimônio cultural; e para a comunidade, esse contato pode significar a oportunidade de identificar e valorizar partes do acervo material e simbólico que constitui uma riqueza às vezes desconhecida ou não devidamente avaliada. Dessa forma, faz-se ampla pesquisa participativa para, por e com a comunidade, cidade, grupo étnico ou qualquer coletividade envolvida no estudo. Isso, porque é preciso definir um ponto-de-vista para organizar o que se quer identificar e, para isso, é necessário construir um determinado recorte, baseado em critérios explícitos e que sejam de aplicação universal. 3.3. O Geoprocessamento do Patrimônio Cultural A fim de se determinar o mapeamento das dinâmicas espaço-temporais do patrimônio cultural de Miguel Burnier, foi realizada pesquisa de campo entre os meses de junho a outubro de 2017, com o intuito de se levantar dados primários junto à comunidade. Concomitantemente, foi desenvolvida pesquisa documental em arquivos públicos, como no Arquivo Público Municipal de Ouro Preto (APMOP); Casa Setecentista de Ouro Preto; Casa dos Contos de Ouro Preto; Acervo da Usina Wigg; Centro de Referência em Cartografia Histórica (CRCH) da UFMG; Arquivo Público Mineiro (APM) em Belo Horizonte, especialmente no acervo cartográfico com o intuito de buscar mapas históricos que abordassem o contexto de Ouro Preto e do Quadrilátero Ferrífero. Das fontes cartográficas históricas levantadas, foram processadas duas fontes específicas, a saber: a “Planta Geral dos Terrenos pertencentes a Carlos C. C. Wigg" de 1901 com escala 1/8000, e a “Planta da Fazenda dos Caldeirões” com data de 1904 e escala de 1/8.000. O georreferenciamento desses mapas antigos tem sido feito por meio do uso de ferramentas do SIG – como ArcGIS 10.5; QGIS 2.2 Valmiera, Adobe PhotoShop CC 2015 – com a finalidade de se promover a correspondência de referências do patrimônio cultural identificado atualmente sob uma antiga base, especialmente se levarmos em consideração o panorama de grande alteração da

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paisagem pelo qual o distrito de Miguel Burnier tem passado. A escolha dessas suas bases antigas se fundamenta pelo detalhamento temporal proporcionado pela escala dos mapas e pelo diálogo de temporalidades que eles promovem. Na sequência, foi promovida a correspondência dos mapas antigos sob uma base de imagens de satélite atuais, como as do Bing no caso do distrito de Miguel Burnier, enquanto para a região de Ouro Preto e Quadrilátero Ferrífero, utilizaram-se imagens do Landsat 5 e Landsat 8, disponíveis no sistema do USGS, sendo que a imagem de satélite mais antiga da região é de Landsat 5 datada de 1988, enquanto foi utilizada imagem Landsat 8 de 2017 como segunda imagem à título de comparação. Tais imagens estão sendo processadas por meio do ENVI 5.1 e ArcGIS 10.5, para permitir o entendimento da dinâmica da cobertura e uso e ocupação da região ao longo do tempo. Foram ainda vetorizados os bens culturais identificados nos mapas antigos para análise posterior junto aos dados geográficos oficiais. Para esta finalidade, foi utilizado o QGIS 2.2 Valmiera, Adobe PhotoShop CC 2015, e AutoCAD Civil 3D 2018 Imperial com o intuito de se extrair os dados espaciais através de geoprocessamento e vetorização. Assim, pelo geoprocessamento dos dados cartográficos antigos, dá-se na sequência o cruzamento com dados existentes tanto nas bases oficiais sobre o patrimônio cultural – a exemplo do IPAC (IEPHA/MG) e dos estudos dos licenciamentos ambientais presentes na Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEAM) – junto aos dados levantamento em campo, cujas coordenadas foram levantadas usando-se Garmin Oregon 650 que possui sistema de GPS + GLONASS. Aliado a isto, tem-se o cruzamento com informações disponíveis nas bases de dados geográficas constantes no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Departamento Nacional de Produção Minerária (DNPM), e no Instituto Estadual de Florestas de Minas Gerais. (IEF). Foram usados shapes dos limites do distrito de Miguel Burnier e do município de Ouro Preto em comparação aos dados do processo minerário desenvolvido na região. A partir daí cada um dos polígonos de atividades minerárias existentes nos shapes serão analisados sob a perspectiva da Ecologia da Paisagem, utilizando-se análise de métricas do software Fragstats v4.2.1.603, de forma a refletir sobre a dinâmica espacial em relação aos interesses e atividades minerárias em Miguel Burnier, bem como em contraposição à totalidade do território, este entendido na categoria paisagem.

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4. PROCESSAMENTO E RESULTADOS Este capítulo irá apresentar alguns resultados obtidos a partir do processamento de dados realizados por meio da metodologia indicada no capítulo 3. Para tanto, está dividido em três itens que interagem com o jogo de escalas analítico escolhido, partindo-se do olhar macroespacial que nesse caso se subscreve à região do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais, em direção à análise microespacial que se filia à Miguel Burnier, distrito de Ouro Preto, Minas Gerais, focando-se, assim, na discussão sobre os bens cultuais identificados por meio da pesquisa de campo. 4.1. A Região do Quadrilátero Ferrífero em Minas Gerais O Quadrilátero Ferrífero, possivelmente a maior província mineral conhecida no Sudeste do Brasil, é uma região que tem sido altamente impactada pela extração mineral. É também local propenso à presença de bens culturais associados à mineração desde os tempos coloniais, cujas jazidas minerais têm sido exploradas desde então usando, contudo, novas tecnologias de exploração. Associada à descoberta de minerais na época colonial, deu-se à fundação de vilas, arraiais e fazendas produtivas e, portanto, é notório que junto ao ambiente de exploração mineral, desenvolveram-se estruturas de casas, igrejas, fazendas e diversos tipos de edificações que se consolidam como bens culturais nos dias de hoje. O distrito de Miguel Burnier se localiza nessa província mineral de grande destaque, de modo que também partilha de passado fundado na extração mineral inicialmente de ouro (século XVIII) e, posteriormente e fundamentalmente de minério de ferro, manganês e topázio (séculos XIX-XXI).

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Figura 1 – Mapa da região do Quadrilátero Ferrífero com destaque para o distrito de Miguel Burnier no município de Ouro Preto. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. Assim, buscou-se entender a cobertura e o uso do solo da região de estudo e, ainda, observar se há uma mudança na cobertura através da classificação supervisionada das imagens de satélite no ENVI 5.1. Com a imagem Landsat 5 de 17 de junho de 1988, e a Imagem Landsat 8 de 1 de junho de 2017, baixadas gratuitamente no Earthexplorer (USGS), procurou-se seguintes parâmetros Coordenadas Decimal: Lat: -20.4349 Lon: -43.7722, ou Degree/Minute/Second: Lat: 20° 26' 05" S, Lon: 043° 46' 19" W Data Set: Landsat Collection 1 Level-1 > Landsat 4-5 TM C1 Level-1 e > Landsat 8 OLI/TIRS C1 Level-1 Additional Criteria: Land Cloud Cover = Less than 10% Primeiramente, para abrir uma composição de imagem, carregamos Cores RGB com as bandas 5, 4 e 3 da imagem de Landsat 5 e as bandas 6, 5 e 4 da imagem de Lansat 8 respectivamente. Importamos as bandas e designamos o sistema de coordenadas e Projeção

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(UTM, Datum WGS-84, Unit – Meters, Zone 23 S) no Layer Stacking e salvamos. Prosseguimos com a criação da área de interesse ROI utilizando o polígono para selecionar várias amostras para a nossas classes da classificação no ROI Tool e salvamos como vetor. Em seguida, executamos uma classificação por verossimilhança utilizando Classification > Supervised Classification, empregando-se > Maximum Likelihood. Para tanto, selecionamos o arquivo de stacking salvo como o nosso classification input file, e escolhemos todas as classes (água, solo exposto, vegetação, área construída) predefinidas no ROI, Set probability Threshold = None, e Output Rule Images = No, OK, e salvamos gerando a imagem de classificação com verossimilhança máxima. Exportamos o resultado como Geotiff para processamento contínuo no Arcgis 10.5. Figura 2 – Mapa de detecção da mudança da cobertura do solo na região do Quadrilátero Ferrífero, entre os anos de 1988 a 2017, com destaque para o município de Ouro Preto e seus distritos. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. No ArcGIS 10.5, continuamos o processamento carregando as duas imagens classificadas pela maximum likelihood. Para a finalidade de comparação entre as duas imagens da mesma região, utilizamos a ferramenta diference na image analysis, colocando as duas imagens

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sobrepostas a fim de gerar a terceira imagem da diferença existente entre as duas primeiras. Após gerar a terceira camada, designamos os valores a ela utilizando stretched (Layer Properties > Symbology > Stretched) e escolhendo percent Clip e atribuimos o valor de 0.5 para minimum e maximum respetivamente. O resultado demonstrou que onde existem manchas vermelhas há alta taxa de mudanças e inexistem mudanças onde há manchas em tons de azul, conforme demonstrado a seguir. Observa-se que a distância de 30 metros do pixel das imagens não permite uma análise na escala menor e pode dificultar a análise de detalhes da área de menor tamanho espacial em relação à escala. Ou seja, no caso de Miguel Burnier em relação a escala da imagem de Landsat, esta não permite uma análise micro de detalhes como para ruas, casas e demais objetos específicos. Por este motivo, optamos por empregar a análise da imagem de Landsat com enfoque na região onde o distrito está situado. 4.2. O Distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais Inicialmente, buscou-se entender a dinâmica espacial em relação aos interesses e atividades minerárias na paisagem do distrito de Miguel Burnier, respondendo a algumas perguntas que guiam análise aqui proposta, a saber: - Qual é a área total da paisagem em estudo? - Qual é a área ocupada ou em processo de ocupação pela atividade minerária no distrito? - Qual é a área média das manchas de mineração? - Qual é a variação das áreas das manchas de mineração? - Qual é a área de cada classe presente na paisagem em relação à área total analisada? - Qual a área da maior mancha de mineração? Para tanto, as bases de shapefile utilizadas para a análise das manchas de processos de mineração e limites territoriais foram obtidas junto aos órgãos públicos responsáveis, ou seja, o Departamento Nacional de Produção Mineral – DNPM e o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. O primeiro órgão disponibiliza base dos processos minerários pelo Sistema de Informações Geográficas da Mineração – SIGMINE em vetorais e raster, tendo sido desenvolvido pela Coordenação de Geoprocessamento – CGEO/CGTIG/DNPM. O segundo órgão disponibiliza shapefiles de limites de municípios e distritos. Para a finalidade deste estudo,

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em todos os shapefiles foram feitas a conversão para se obter a projeção e Datum igual a UTM e SIRGAS2000, a saber: Datum: SIRGAS 2000 Projected Coordinate System: SIRGAS 2000 UTM Zone 23S South Projection: Transverse Mercator False Easting: 500000,0 False Northing: 10000000,0 Central Meridian: -45,0 Scale Factor: 0,9996 Latitude of Origin: 0,0 Linear Unit: Meter (1,0) Os dados foram processados no software ArcGIS 10.5 e Fragstats v4.2.1.603, respectivamente. Após redefinir a projeção no ArcGIS 10.5, utilizou-se clip e union para isolar o os dados minerários junto ao distrito de Miguel Burnier, pertencente ao município de Ouro Preto, de forma a unir o limite do distrito com os dados minerários e converter para um arquivo de formato raster para, finalmente, utilizar-se a ferramenta export para salvar o arquivo raster como .tif. Figura 3 – Geolocalização do distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

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Figura 4 – Mapa referente ao processo de mineração no Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

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Figura 5 – Mapa de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais, em relação ao processo de mineração. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. Tabela 1 – Classes utilizadas na Figura 5. OID Valor Contagem em ha Mineral 0 1 23.568 FERRO 1 2 2.126 CALCÁRIO 2 3 955 MANGANÊS 3 4 992 MÁRMORE 4 5 89 CALCÁRIO DOLOMÍTICO 5 6 1.259 TOPÁZIO 6 7 1.511 VANÁDIO 7 8 19.605 MINÉRIO DE FERRO 8 9 40 TOPÁZIO IMPERIAL 9 10 12 MINÉRIO DE SILÍCIO 10 11 3.028 MINÉRIO DE OURO 11 12 143 MINÉRIO DE MANGANÊS 12 13 473 CROMO 13 14 288 GRANADA 14 15 214 BAUXITA 15 16 2.025 QUARTZO 16 17 2.255 DOLOMITO 17 18 205 FILITO 18 19 114 AREIA 19 20 78 DADO NÃO CADASTRADO 20 21 7 GEMA 21 22 71 CAULIM 22 23 2.081 ÁREA RESTANTE

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Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. Com a finalidade de melhor entendimento da dimensão do interesse e da atividade minerária em relação ao território do distrito de Miguel Burnier, as classes foram redefinidas usando a ferramemta reclassify para obter duas classes principais sendo a primeira relacionada aos dados espaciais sem cobertura de atividade minerária, e a segunda classe com os dados minerários dentro do limite do distrito de Miguel Burnier. Assim, no ArcGIS 10.5, utilizamos as ferramentas clips e union para obter o arqivo shape do distrito de Miguel Burnier com todas as classes (ao total são 23 classes, sendo 22 do processo minerário e 1 classe restante/atualmente livre de interesse minerário) dentro do limite do distrito em uma camada única. No attribute, utilizamos select by attribute where “Processo <>” e “Processo =” respectivamente, para ser gerado union e feature to raster. Figura 6 – Mapa referente às áreas de interesse mineral de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

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Após a geração do arquivo .tif, prosseguimos o processamento no software Fragstats v4.2.1.603 que permite estabelecer métricas de análise da paisagem neste estudo. Com este intuito, utilizamos a regra de vizinhança de 8 cells – “use 8 cell neighborhood rule”. A regra de 8 células considera todas as 8 células adjacentes, que compreende 4 vizinhos ortogonais e 4 diagonais. Igualmente, foram analisadas as manchas, as classes e a paisagem ativando as métricas relacionadas ao nosso interesse, como foi delineado na tabela a seguir. Tabela 2 – Métricas adotadas para análise das manchas no Fragstats. Tipo de amostra estratégica Aba Métrica adotada Descrição Ativado Patch (mancha) Area - Edge Patch Area (AREA) Área de cada fragmento e seu respectivo desvio padrão, em ha. Standard Deviation (CSD) Area - Edge Patch Perimeter (PERIM) Perímetro de cada mancha em metros, em relação ao seu respectivo desvio padrão. Standard Deviation (CSD) Shape Shape Index (SHAPE) Perímetro da mancha dividido pela raiz quadrada da área da mancha Indicador adimensional, e também é a métrica que identifica o formato da mancha. Standard Deviation (CSD) Aggregation Euclidean Nearest-Neighbor Distance (ENN) informa a Distância Euclidiana da mancha a mancha vizinha mais próxima, de mesma classe. Standard Deviation (CSD) e Class Percentile (CPS) Class Metrics (Métricas de classes) Area - Edge Total Area (CA/TA) Soma de todas as áreas de manchas de uma determinada classe, em ha. Total Area (CA/TA) Area - Edge Percentage of Landscape (PLAND) Identifica a área de cada classe presente na paisagem em relação à área total analisada. Percentage of Landscape (PLAND) Area - Edge Patch Area (AREA_?) Identifica a área média dos fragmentos em cada classe e seu respectivo desvio padrão. Mean (MN) e Standard Deviation (SD) Landscape Metric (Métricas da paisagem) Area - Edge Total Area (CA/TA) A área total da paisagem em estudo. Total Area (CA/TA) Area - Edge Largest Patch Index (LPI) Porcentagem da maior mancha em relação à área total da paisagem analisada. Largest Patch Index (LPI) Area - Edge Patch Area (AREA_?) A área média da totalidade dos fragmentos presentes na paisagem total e seu respectivo desvio padrão Mean (MN) e Standard Deviation (SD) Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. Os resultados obtidos no Fragstats indicam que a região estudada apresenta um total de 127 manchas ou fragmentos (patch) dispersos sobre o uso da terra dentro do limite do distrito de Miguel Burnier que ocupa uma área total de 194.742.868 km2, sendo que 29 destas manchas da

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área total corresponde à área não ocupada e 98 correspondentes à área total ocupada pelo processo minerário. Dentre estas, destaca-se uma das manchas da classe de processo de ferro, que apresenta maior área possuindo 2.073.5963 km2, enquanto a menor mancha possui 0.3185 km2, o equivalente à área de 1 pixel. A área total ocupada pelo processo minerário no município é 188.114.367 km2, e a área média da mesma é de 9.405.7184 km2 com o desvio padrão de 9.401.8961 km2, enquanto a área total não ocupada pelo processo minerário é de 6.628.501 km2, com a área média desta sendo 22.8569 km2 e o desvio padrão de 97.0984 km2, conforme pode ser analisado nas tabelas a seguir. Tabela 3 – Métricas de Manchas. TIPO ÁREA TOTAL km2 PLAND % LPI km2 ÁREA MÉDIA km2 DESVIO PADRÃO DA AREA km2 1 FERRO 75.069.921 38.5482 224.897 18.767.480 15.770.376 2 CALCÁRIO 6.771.837 3.4773 28.313 483.703 1.424.074 3 MANGANÊS 3.041.912 1.5620 15.358 1.520.956 1.469.992 4 MÁRMORE 3.159.766 1.6225 12.725 631.953 934.169 5 CALCÁRIO DOLOMÍTICO 283.487 0.01456 0.1456 283.487 0.0000 6 TOPÁZIO 4.010.227 2.0592 0.7213 572.890 487.340 7 VANÁDIO 4.812.909 2.4714 24.714 4.812.909 0.0000 8 MINÉRIO DE FERRO 62.446.784 32.0663 194.442 2.014.412 7.302.589 9 TOPÁZIO IMPERIAL 127.410 0.00654 0.0654 127.410 0.0000 10 MINÉRIO DE SILÍCIO 38.223 0.00196 0.0196 38.223 0.0000 11 MINÉRIO DE OURO 9.644.930 4.9526 38.044 1.377.847 2.503.762 12 MINÉRIO DE MANGANÊS 455.490 0.02339 0.1701 75.915 115.219 13 CROMO 1.506.622 0.7736 0.7736 1.506.622 0.0000 14 GRANADA 917.351 0.4711 0.4711 917.351 0.0000 15 BAUXITA 681.643 0.3500 0.3500 681.643 0.0000 16 QUARTZO 6.450.127 33.121 32.794 3.225.063 3.161.358 17 DOLOMITO 7.182.734 36.883 36.883 7.182.734 0.0000 18 FILITO 652.976 0.3353 0.1227 130.595 90.519 19 AREIA 363.118 0.1865 0.1619 181.559 133.780 20 DADO NÃO CADASTRADO 248.449 0.1276 0.1276 248.449 0.0000 21 GEMA 22.297 0.0114 0.0082 11.148 0.4778 22 CAULIM 226.153 0.1161 0.0834 113.076 49.371 23 ÁREA RESTANTE 6.628.501 34.037 27.217 228.569 970.984 Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. Tabela 4 – Métricas de Classes. TIPO ÁREA TOTAL km2 PLAND % ÁREA MÉDIA km2 DESVIO PADRÃO DA AREA km2 Área ocupada pelo processo minerário 188.114.367 96.5963 9405.7184 9401.8961 Área não ocupada pelo processo minerário 6.628.501 3.4037 22.8569 97.0984

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Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. Tabela 5 – Métricas da Paisagem. TIPO ÁREA TOTAL km2 PLAND % LPI km2 ÁREA MÉDIA km2 Landscape Metric (Métricas da paisagem) 194.742.868 100 96.5767 3320.4214 Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. A análise das manchas da área não ocupada pelo processo minerário indica que se comportam da seguinte forma; dentre as 29 manchas da área não ocupada pelo processo minerário, 14 manchas possuem área não maior que 0.3185 km2 (o valor mínimo); 7 manchas entre 0.6370 km2 e 0.9556 km2; 2 manchas de 12.741 km2 e 38.223 km2 respetivamente; enquanto o restante são 15.926 km2, 92.372 km2, 213.412 km2, 840.905 km2, 5.300.252 km2, e o máximo é 188.076.144 km2. Isto indica que o distrito em estudo possui uma área não ocupada pelo processo minerário relativamente menor quando se comparado com a área total e o restante que tem a maior parte ocupada pelo processo minerário. O distrito de Miguel Burnier possui área total de 194.742.868 km2, o que equivale a aproximadamente 17% do total do território do município de Ouro Preto, sendo o maior de todos 13 distritos, incluindo o distrito sede. Os dados analisados possuem resultado demonstrando que somente 3,4% (6.628.501 km2) ainda não é contemplado no processo dentre a área total de 194.742.868 km2. Tabela 6 – Distritos de Ouro Preto e sua área em km2. NOME DO DISTRITO DE OURO PRETO ÁREA TOTAL KM2 Miguel Burnier 194.742.868,00 São Bartolomeu 161.752.260,90 Antônio Pereira 120.405.302,90 Santa Rita de Ouro Preto 120.405.302,90 Ouro Preto (sede) 120.288.151,50 Rodrigo Silva 90.039.871,37 Glaura 71.909.542,97 Amarantina 66.227.467,89 Santo Antônio do Salto 58.336.534,58 Cachoeira do Campo 57.371.711,71 Engenheiro Correia 45.286.902,14 Santo Antônio do Leite 38.002.442,48 Lavras Novas 34.838.098,60 Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

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Tabela 7 – Distribuição territorial dos distritos de Ouro Preto em porcentagem. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017. O processamento das informações demonstrou que poucas áreas (3,4%) do distrito ainda não possuem ações relacionadas ao interesse de mineração. Observa-se que o mineral predominante na área de Miguel Burnier se trata do minério de ferro, seguido de outros minerais não menos relevantes e valiosos, como o ouro, manganês, cromo, vanádio, quartzo, calcário, topázio, mármore. Tais dados consolidam informações colhidas em campo que informam que, atualmente, o distrito de Miguel Burnier é responsável por cerca de 54% dos impostos totais recolhidos em todo o município de Ouro Preto, haja vista que em sua área existem diversas e as mais importantes empresas de mineração, a exemplo da Companhia Siderúrgica Nacional; Ferro + Mineração S.A.; Vale S.A., e a Gerdau Açominas S.A. 4.2.1. O Patrimônio Cultural de Miguel Burnier, Ouro Preto O levantamento do patrimônio cultural, especialmente relacionado aos bens culturais de natureza arquitetônica e arqueológica, desenvolvido em pesquisa de campo e em contraste com o cruzamento de outras fontes já elencadas, aponta para uma expressiva presença de bens culturais que remontam aos séculos XVIII, XIX, XX e XXI, que totalizam 429 pontos de relevância

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cultural. É incontestável a pujante relevância da ocupação histórica local, regional e nacional de Miguel Burnier, que remonta a diversos contextos e temporalidades. Têm-se o contexto da Inconfidência Mineira por meio de José Álvares Maciel que em 1789, declarou ser proprietário de fazenda de lavras de ouro em Caldeirões, herança de seu pai homônimo. A Fazenda São Julião ou Fazenda dos Caldeirões, incluía a Capela São Julião (c.1749-1892), cemitério, galeria de mineração e estruturas produtivas para abastecimento alimentar, comprovando como a agricultura estava associada à mineração nas antigas fazendas da região. Configura-se o contexto da mineração colonial frente aos diversos vestígios presentes em toda a região, tendo o Pico do Vigia um local de refúgio dos negros quilombolas na época do ouro, bem cultural tombado em nível municipal. Esta realidade desdobra-se no contexto da siderurgia, tendo como ícones a Fábrica Patriótica que pertenceu ao Barão de Eschwege e foi a primeira indústria em escala industrial a funcionar no Brasil; a Usina Wigg que inaugurada em 1893, incluía conjunto industrial e vila operária, primeiro estabelecimento a explorar em escala industrial o manganês e que marcou o que poderia se chamar de “a revolução industrial brasileira”; além da Siderúrgica Barra Mansa com estrutura majestosa que funcionou entre os anos de 1969 a 1996. Na esteira destes acontecimentos, o contexto da implantação das ferrovias deixou sua marca indelével na história regional, tendo diversos exemplares como o Conjunto Ferroviário de Miguel Burnier formado a partir de 1884 pela vila, estação, oficina, dormitório, caixa d’água, túnel, dentre outros, que atualmente é tombado em nível municipal. Ali ocorria o entroncamento da “Linha do Centro” da Estrada de Ferro D. Pedro II com o Ramal de Ouro Preto da Central do Brasil, construindo a tessitura entre as estações da Usina, Centro, Hargreaves, Chrockatt de Sá, Rodrigo Silva, dentre outras. O contexto religioso também se mostra relevante na região, tendo diversos e imponentes exemplares como o Santuário do Sagrado Coração de Jesus (1934), composto por antigo Seminário/Orfanato Monsenhor Horta (1946), além de relevantes bens materiais e imateriais; o Conjunto Arquitetônico e Arqueológico da Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois constituído por coreto, cemitério novo, cemitério velho, casa do caseiro, casa do vigário, além de vestígios arqueológicos de mineração (bem tombado em nível municipal); e a Capela de Nossa Senhora da Conceição do Chiqueiro dos Alemães que pertencia ao núcleo da Fazenda do Alemão de propriedade de Capitão-Mor Simão de Mendonça (bem tombado em nível municipal). Tais registros indicam de maneira pujante a ocupação histórica local, o que deve também se expressar na presença de bens culturais, detentores de histórias e memórias, em suas várias categorizações possíveis, como bens de natureza material e imaterial.

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Torna-se contraditória a preservação dos bens culturais em um contexto de ampliação do interesse minerário, como é o caso de Miguel Burnier. A desqualificação destas referências culturais, seja em estudos técnicos de licenciamento ambiental e na não escuta sensível da comunidade em pesquisas de campo que aponta para esses bens, promove diversas maneiras de apaziguamento e silenciamentos da importância desse lugar para a memória e história local, regional e nacional. Esta contradição latente influencia diretamente as formas de conhecimento, interpretação, apropriação, divulgação e proteção do patrimônio cultural e, em última instância, da própria comunidade, que se apropria da proteção legal dos bens culturais tombados para o direito à permanência em seu território. A questão do patrimônio cultural é, atualmente, uma ferramenta de proteção da comunidade frente às discussões sobre pertencimento e identidade local, haja vista que subsidia uma discussão profunda e contraditória na comunidade, na qual dois grupos antagônicos disputam sobre o direito de permanecer ou abandonar o distrito de Miguel Burnier, influenciados pela supervalorização dos interesses minerais no local. Figura 7 – Geolocalização dos patrimônios culturais materiais identificados em Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais, totalizando 429 pontos de relevância cultural. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

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A área urbana do distrito de Miguel Burnier contempla grande número de bens culturais relacionados às várias temporalidades anteriormente indicadas. Atualmente, trata-se de lugar de referência quando se fala sobre o distrito, mas é preciso ressaltar que a área rural do distrito de Miguel Burnier é também composta por subdistritos e comunidades, a exemplo dos subdistritos de Mota, Crockat de Sá e Hargreaves; e das comunidades de Azia, Retirinho, Morro de São Gabriel, Dom Bosco, Usina, Barra Mansa. Tais referências toponímicas têm sido cada vez mais esquecidas e se tornado confusas dentre os próprios moradores, na medida em que a pressão das empresas mineradoras aumenta, tornando o lugar pouco propício à manutenção das atividades agrícolas por parte dos pequenos proprietários rurais e comerciantes, alterando radicalmente a paisagem, seus nomes, seus usos e ocupações. Atualmente, grande parte das edificações históricas é de propriedade da Gerdau S. A., de modo que assim se rompe tanto com as referências espaciais do território, quanto com as antigas referências de uso e funções dessas edificações. Em diversos casos, houve destruição completa das estruturas arquitetônicas antigas, de modo que tais bens culturais se tornaram bens arqueológicos da noite para o dia. O campo de futebol, importante local de sociabilidade no contexto da vila operária, foi destruído para em seu lugar ser edificado o estacionamento da Gerdau S. A.; o Seminário/Orfanato Monsenhor Horta foi vendido pela Arquidiocese de Mariana para se transformar em escritório da empresa. A MG-030 que dá acesso à Miguel Burnier passou a ter catracas de identificação, e o fluxo antes raro apenas de carros de passeio foi tomado pelos caminhões com carga de minérios que ligam Várzea do Lopes-Miguel Burnier-Usina de Ouro Branco. A área coletiva de uso para lazer nas Ruínas da Casa de Campo Lago Soledade foi cercada, e lá ninguém da comunidade pode mais pescar ou fazer pique-pique. O cemitério teve sua paz alterada pela movimentação da limítrofe UTM II. A vila operária da Usina teve seu esvaziamento forçado, suas casas se arruínam a passos largos, e a Igreja de Calastrois está abandonada à sorte do tempo, apesar da condicionante do licenciamento ambiental que obriga a empresa a executar sua restauração. A mesma realidade vive a Capela de Chiqueiro dos Alemães e a Usina Wigg, tendo este último projeto de musealização paralisado por interesses na não preservação do conjunto patrimonial. O histórico de implantação dos diversos e segmentados empreendimentos da Gerdau Açominas S.A. no distrito de Miguel Burnier é um dado que deve ser avaliado para que sejam entendidos os impactos gerados pelo empreendedor na localidade. O processo de aquisição dos direitos minerários se deu a partir de 2004, enquanto o primeiro licenciamento ocorreu em 2007. Daí em diante a sucessão de licenciamentos que, organizados de forma sistemática, expõem como o empreendedor têm mostrado os interesses econômicos e seus investimentos no distrito de

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Miguel Burnier, e a rompante perda de direitos territoriais por parte da comunidade em pouco mais de dez anos de atividades da Gerdau S.A. no distrito. Figura 8 – Expansão dos empreendimentos da Gerdau no distrito sede de Miguel Burnier (2006). Figura 9 – Expansão dos empreendimentos da Gerdau no distrito sede de Miguel Burnier (2006-2017). A mancha à direita apresenta a atual malha urbana restante. Fonte: Google Earth/2006. Intervenções de Samuel A. Akinruli.

Fonte: Google Earth/2017. Intervenções de Samuel A. Akinruli.

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Figura 10 – Vista do distrito sede de Miguel Burnier tendo à esquerda o empreendimento da Gerdau S.A. e, à direita, a localização do núcleo urbano – Distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 11 – Bens culturais materiais identificados na sede do distrito de Miguel Burnier, Ouro Preto, Minas Gerais. Os itens numerados se tratam dos bens arquitetônicos ainda preservados, e os pontos em verde apontam para os vestígios arqueológicos identificados. Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

Foto Digital: Ayobami A. Akinruli – 2017.

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Tabela 8 – Polígonos identificados na Figura 10 no distrito sede de Miguel Burnier. 0 Estação Ferroviária de Miguel Burnier 1 Casa integrante do conjunto da Estação 2 Caixa da água das locomotivas 3 Sede da Associação Comunitária 4 Casa integrante do conjunto da Estação 5 Escola de Miguel Burnier 6 Quadra de Futebol 7 Antiga Plataforma 8 Quadra Esportiva 9 Galpão 10 Galpão 11 Galpão 12 Oficina/Galpão 13 Oficina/Galpão 14 Galpão 15 Galpão 16 Santuário do Sagrado Coração de Jesus 17 Seminário/Orfanato Monsenhor Horta 18 Cemitério 19 Usina Wigg 20 Antigo Laboratório da Usina Wigg 21 Antigo Estádio de Futebol 22 Residência ligada ao Santuário do Sagrado Coração de Jesus 23 Jardim do Santuário do Sagrado Coração de Jesus 24-34 Casas ligadas ao conjunto operário da Usina Barra Mansa 35 Antigo Hotel de Miguel Burnier 36-62 Casas ligadas ao conjunto urbano/ferroviário 63 Antigo Clube do Siderantim Elaboração Samuel Ayobami Akinruli, setembro de 2017.

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Figura 12 – Estrada para Miguel Burnier (MG-030) com intenso fluxo de caminhões e placas indicativas de propriedade particular da Gerdau S.A. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 13 – Estrada para Miguel Burnier (MG-030) com piquetes e excesso de lama. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 14 – Estrada para Miguel Burnier (MG-030). Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 15 – Estrada para Miguel Burnier (MG-030). Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 16 – Pico do Vigia, bem tombado em nível municipal localizado às margens da estrada para Miguel Burnier (MG-030). Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 17 – Cemitério da comunidade, limítrofe à UTM II que foi construída em fins dos anos 2000. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 18 – Vista do distrito a partir da MG-030, vendo as estruturas e apoio à mineração. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 19 – Santuário do Sagrado Coração de Jesus, delimitado com placas indicativas das atividades minerárias. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 20 – Conjunto da Usina Wigg. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 2 – Antiga edificação associada à Usina Wigg. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 3 – Sede urbana do distrito e local onde existiam os entroncamentos das diversas linhas de trem. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 43 – Sede urbana do distrito, com trecho de linha férrea que atualmente está sob concessão da VLI. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 24 – Estação Ferroviária de Miguel Burnier. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 25 – Casas em estilo art-déco existentes no núcleo urbano. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 26 – Imóvel ligado ao patrimônio ferroviário existente no núcleo urbano. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 27 – Conjunto ferroviário da sede urbana em dia de procissão no distrito. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 28 – Túnel da Estrada de Ferro D. Pedro II. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 29 – Túnel presente na sede urbana do distrito. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 30 – Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 31 – Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 5 – Edificações associadas à Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 33 – Edificações associadas à Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 34 – Edificações associadas à Siderúrgica Barra Mansa. Miguel Burnier. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 35 – Muro de pedras do século XVIII, presente no cemitério antigo de Calastrois. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 36 – Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 37 – Cemitério novo da Igreja de Nossa Senhora Auxiliadora de Calastrois. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Figura 38 – Capela de Nossa Senhora da Conceição do Chiqueiro dos Alemães. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 39 – Capela de Nossa Senhora da Conceição do Chiqueiro dos Alemães. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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Figura 40 – Ruínas da Casa de Campo Lago Soledade. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Figura 41 – Ruínas da Casa de Campo Lago Soledade, localizada em propriedade particular da Gerdau S. A. Miguel Burnier, Ouro Preto/MG. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017. Fonte: Foto Digital – Samuel A. Akinruli – 2017.

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5. DISCUSSÕES Em grande medida, esta pesquisa se reflete no conceito de Ecologia da Paisagem, que aborda uma noção unificada de paisagem sendo este considerado “um mosaico heterogêneo composto por unidades de paisagem interativas, onde a heterogeneidade existe para pelo menos um parâmetro, um observador específico e em uma escala particular” (METZGER, 2001: 03). Esta noção adverte para a subjetividade dessa heterogeneidade, haja vista que é essencialmente interpretada tanto através dos “olhos humanos” por meio da abordagem geográfica, quanto por meio dos “olhos” de outras espécies ou comunidades na perspectiva ecológica. São muito variadas as possibilidades e formas de se invisibilizar, e a violência epistêmica se constitui como uma forma de se exercer o poder simbólico. Spivak (SPIVAK, 2010) argumenta em seu texto que o subalterno não pode falar e, quando tenta fazê-lo, não encontra meios para se fazer ouvir. São complexos os procedimentos existentes nos licenciamentos ambientais no Brasil. Há diversos diplomas legais que concedem o ordenamento jurídico ao patrimônio ambiental nacional, ao qual o patrimônio cultural se inscreve e que inclui, nesse último, os bens arqueológicos. Os estudos de impacto ambiental são peças chaves para a verificação da viabilidade ambiental da possível instalação de um empreendimento, bem como para se estabelecer medidas mitigadoras e compensatórias em casos específicos, de forma a tentar compatibilizar o exercício das atividades econômicas com a preservação do meio ambiente, o que inclui o patrimônio cultural. O ordenamento jurídico brasileiro, por força do princípio da prevenção ou da cautela, exige a elaboração de estudo prévio de impacto ao meio ambiente (EPIA) para a instalação de obra ou atividade potencialmente causadora de significativa degradação ambiental.1 Levando-se em consideração as características, peculiaridades e possíveis impactos da atividade ou da natureza do empreendimento, podem ser estabelecidos procedimentos para o licenciamento ambiental mais simplificados – como o Relatório de Ausência de Impacto Ambiental Significativo (RAIAS) ou o Relatório Ambiental Preliminar (RAP) – ou mais complexos – a exemplo do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA).2 A proteção do meio ambiente é de competência concorrente da União e dos Estados, cabendo à União o estabelecimento de normas gerais. Seja qual for a modalidade e a complexidade dos estudos técnicos, estas são peças indispensáveis ao subsídio prévio para a 1 As normas federais que disciplinam o estudo de impacto ambiental são fundamentalmente: Art. 225, § 1º, IV da CF/88; Lei 6.938/81; Decreto 99.274/90; Resolução CONAMA 001/1986. 2Cf. Resolução CONAMA 01/86; Resolução CONAMA 10/88; Resolução CONAMA 13/90; CONAMA 237/97. Resolução CONAMA 347/04.

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análise da concessão ou não do ato autorizativo requerido de instalação, operação ou ampliação de uma atividade ou empreendimento.3 Mas, nos casos em que a legislação federal (CONAMA) prevê a exigência do processo de licenciamento ambiental completo, não pode ser isento ou passível de processo menos rigoroso o licenciamento por ordenamento jurídico específico dos Estados e dos municípios, correndo o risco de se pôr em xeque o princípio de legalidade e o princípio da obrigatoriedade, que preveem que não se podem desviar da lei ou dos princípios especiais que regem a matéria casos excepcionais. Em se tratando de empreendimentos dedicados especificamente à extração e beneficiamento de minério de ferro, considerada “uma das mais impactantes atividades minerárias em curso em Minas Gerais e que vem degradando enormemente nosso patrimônio ambiental”, há a exigência do licenciamento ambiental clássico, ou seja, um estudo mais complexo (MPMG, 2010: 07). A Promotoria do Estado de Minas Gerais ajuizou uma Ação Civil Pública no ano de 2010 pela inconstitucionalidade e ilegalidade do dispositivo DN COPAM 74/2004.4 Esta norma jurídica trata da possibilidade de mineração com base em simples Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF) denunciada pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) pelo fato de vir “ocorrendo completo desrespeito ao ordenamento jurídico vigente”, na medida em que o Estado de Minas Gerais tem concedido a Autorização Ambiental de Funcionamento (AAF). Os promotores alertaram ainda para o fato de que a lavra de minérios, cujo potencial degradador foi reconhecido até mesmo pela própria Constituição Federal (art. 225, § 2º.), foi objeto de tratamento específico pela Lei 7.805/89, Decreto 98.812/90 e Resoluções CONAMA 01/86, 09/90 10/90 e 237/97 (que exigem expressamente o licenciamento ambiental clássico para o exercício da atividade) (MPMG, 2010: 07). Se a legislação federal exige o licenciamento ambiental para essa categoria de empreendimento, a legislação estadual, tão pouco a municipal, poderiam dispensá-lo. 3 Nos termos do art. 1º, I, da Res. CONAMA 237/97, Licenciamento Ambiental é o procedimento administrativo pelo qual o órgão ambiental competente licencia a localização, instalação, ampliação e a operação de empreendimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras ou daquelas que, sob qualquer forma, possam causar degradação ambiental, considerando as disposições legais e regulamentares e as normas técnicas aplicáveis ao caso. 4 Sublinha-se que no ano de 2009, o Promotor de Justiça Marcos Paulo, um dos responsáveis pela ACP do MPMG, já havia publicado um artigo cujo teor corresponde à quase totalidade do texto da ACP de 2010. MIRANDA, Marcos Paulo de Souza. Autorização Ambiental de Funcionamento (DN Copam 74/94) e violação ao princípio da prevenção: uma inconstitucionalidade flagrante e perigosa. In: Artigos Científicos da Associação Mineira de Defesa do Ambiente (AMDA), Belo Horizonte, p.01-06, 2009. Disponível em http://www.amda.org.br/imgs/up/Artigo_03.pdf, acessado em 06 de maio de 2017.

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Dito de outra forma, a não exigência de, no mínimo, estudos ambientais prévios que pudessem avaliar a viabilidade ambiental dos empreendimentos de mineração e/ou beneficiamentos de ferro, indica que seriam desconsideradas questões fundamentais, como os efeitos cumulativos de diversas concessões, o grau de vulnerabilidade do local onde o empreendimento pretende se instalar, a publicidade e a prévia concordância do ente municipal com o empreendimento proposto, e o monitoramento das atividades autorizadas e subsequentes impactos. Na “contramão da sustentabilidade”, o afrouxamento legal que muito hoje em dia se profetiza como flexibilização, agilização, racionalização, modernização e desburocratização do licenciamento ambiental, é apenas uma das questões que refletem as violências epistêmicas relacionadas ao licenciamento ambiental. A trajetória do Direito Ambiental no Brasil deveria caminhar para o estabelecimento de normas capazes de aperfeiçoar a proteção ao meio ambiente, e não de flexibilizar ou abrandar as responsabilidades dos causadores dos impactos ambientais. É interessante que esse flagrante desrespeito do ordenamento constitucional vigente no caso do Estado de Minas Gerais, está situado em um local possuidor de uma das maiores fontes de minério de ferro do Brasil, e para não dizer do mundo. O Quadrilátero Ferrífero, possivelmente a maior província mineral conhecida no Sudeste do Brasil, localiza-se na porção central do Estado de Minas Gerais e abrange uma área de 7.000 km2. Tem por principais limites a Serra do Curral (a norte), a Serra de Ouro Branco (a sul), a Serra da Moeda (a oeste), e a Serra do Caraça (a leste) (RUCHKYS, 2015: 10). Tal questão se desdobra em áreas de ocorrência de minério de ferro que são também de alto potencial de ocorrência de patrimônio espeleológico e arqueológico, cujos impactos negativos estão diretamente associados às atividades de perfuração de rochas, desmonte por explosivos, tráfego de caminhões e equipamentos de lavra. São vários os agentes e agências em diversos âmbitos que atuam em foco nas questões específicas relacionadas ao patrimônio arqueológico no contexto do licenciamento ambiental. Trata-se de um contexto de celeridade, de mudanças de ordenamentos jurídicos, que visa imputar o mínimo necessário que a legislação garante no aspecto de prover avaliações de análise da viabilidade ambiental, cujas licenças devem ser concedidas por etapas e precedidas de estudos técnicos.5 5 Contudo, no panorama atual, ainda se vê a discussão da Lei Complementar 140 e implementação da DN COPAM 213/2017, que passou a permitir o licenciamento que se encaixem nas classes de 1 a 4 pelos municípios, sem a necessidade de passar pela Semad, a depender da localização, porte e potencial de impactos ao meio ambiente. Recente do Decreto 47.137/17 que altera alguns artigos do decreto 44.844 de 2008. Dentre as principais inovações está a possibilidade do licenciamento concomitante, que permitirá que duas ou três fases do licenciamento (licença prévia, licença de instalação e licença de operação), quando as características técnicas assim permitirem, sejam

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As relações assimétricas estabelecidas entre as partes envolvidas com os processos de licenciamento ambiental acabam por definir o direito à vida ou à morte, à lembrança ou ao esquecimento do patrimônio cultural. Não é menos relevante relembrarmos aquelas já muito estudadas relações entre a preservação da história, memória e, portanto, do patrimônio cultural e do território, como bases norteadoras das identidades (CANCLINI, 1997). Balizas temporais e espaciais conformam a noção de identidade, mas e quando não as temos? Ou quando não podemos acessá-las? Ou quando estão fragilizadas, postas em xeque? É relevante sublinhar que Appadurai destaca ainda que a territorialidade, essa dimensão da nação moderna, é relevante para a análise no contexto pós-colonial, haja vista a implosão das referências territoriais na visão pós-moderna – o que o autor trata de translocalidades – que tornam as referências culturais nacionais frágeis e, portanto, redefinem as relevâncias geográficas nos contextos pós-nacionais (APPADURAI, 1997). Dito de outra forma, seria um modo intelectual de controle que teria como efeito o congelamento ou encarceramento dos povos, especialmente de grupos periféricos, minoritários ou considerados marginais, de forma a estabilizar as diferenças e legitimar as desigualdades. O autor chega a profetizar que esta forma de análise equivaleria ao “indiciamento da cultura por sua alegada cumplicidade em alguns dos principais crimes da história moderna” (SAHLINS, 1997: 43). A violência epistêmica, como dito, é uma forma de invisibilizar o outro, expropriando a sua possibilidade de representação, por meio de processos de emenda, edição, apagamento e até o anulamento dos sistemas de representação, que incluem o registro e a memória da experiência. Então, quem tem permissão de narrar a história? (SPIVAK, 2010). Um dos fins dessa violência simbólica, é a violência física, real, não virtual. As edições, os esmaecimentos, os desfoques, os apagamentos, mostram-se de forma concreta em registros não somente da experiência, mas nas representações do que se almeja. Tomemos exemplos de vários licenciamentos ambientais na região do Quadrilátero Ferrífero e podemos ver como as escalas de mapas não permitem identificar e confrontar os aspectos do patrimônio cultural da área estudada. Há ângulos de visão distorcidos, e tratam-se de jogos de escalas nas quais comunidades “minúsculas” onde vivem pessoas “consideradas minúsculas” se chocam com empreendimentos de grande magnitude. Os colossais projetos desenvolvimentistas que prometem levar casa, comida, estradas, dinheiro, progresso, criam estéticas de paisagem pautados da arquitetura da destruição. analisadas simultaneamente. Disponível em http://meioambiente.mg.gov.br/component/content/article/3011-minas-gerais-determina-os-criterios-para-o-licenciamento-ambiental-dos-municipios, acessado em 06 de maio de 2017.

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O diagnóstico do patrimônio cultural feito pelo poder público e pelos licenciamentos ambientais, no aspecto do patrimônio material e imaterial, não fornece dados satisfatórios à realidade da região impactada pelo empreendimento da Gerdau S.A, de modo que a emissão e a atualização de licenças ao empreendimento são dadas de forma a não levar em consideração a relevância da cultura local para a coletividade, o que é demonstrado em trabalho de campo. Os equívocos conceituais e de desuso dos termos de referência, ausência ou parca pesquisa in loco, noção imprecisa das bases teórico-metodológicas do trabalho, dentre outros aspectos, levam a uma leitura errônea da realidade no tocante ao patrimônio cultural da área impactada pelo empreendimento, o que se expressa de modo inequívoco nos documentos apresentados para o licenciamento a partir de suas diversas distorções, análises tendenciosas, inadequações, omissões e insuficiências. As informações contidas nos documentos dos licenciamentos não são suficientes para que se proceda à análise no tocante ao histórico de ocupação das áreas impactadas pelo empreendimento, bem como aos aspectos culturais, com parca presença de citações bibliográficas ou documentais que deem embasamento ao estudo, de modo que tal tema se apresenta de maneira bastante superficial frente aos registros inquestionáveis de ocupação pretérita da região. As informações contidas no EIA não são suficientes para que se proceda à análise da ADA, AID e AII do licenciamento, haja vista que não apresenta seus limites, povoados e comunidades ali localizados em um mapa que registre o patrimônio cultural objeto de estudo, de modo que são representativos dos bens culturais da região impactada pelo empreendimento. Os documentos deixam de trazer informações precisas sobre as comunidades localizadas nas áreas impactadas pelo empreendimento, apresentando informações genéricas e impedindo os princípios de precaução e prevenção para a viabilidade ambiental. É necessária uma preocupação sistêmica, em conjunto, de todas as áreas do estudo de licenciamento ambiental. Da forma como a realidade se apresenta na comunidade de Miguel Burnier na atualidade, fica impossibilitada a coexistência da atividade minerária, a permanência da comunidade e de seus bens culturais que expressam sua memória e sua história, sendo o direito ao território um princípio do direito à identidade. Ressalta-se que essa dinâmica é enfrentada nos tempos atuais, pois ao longo de sua existência, a população de Miguel Burnier sempre esteve associada e dependência às atividades minerárias e de grandes empreendedores. Contudo, a supervalorização dos terrenos, a pressão dos grandes empreendimentos, o apoio político aos responsáveis pela arrecadação municipal e a falta de alternativas da população local frente ao futuro revela o

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panorama contemporâneo de agravado conflito ambiental e, portanto, extinção desenfreada do patrimônio cultural.

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