geografia - práticas de campo, laboratório e sala de aula

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GEOGRAFIA Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula Luis Antonio Bittar Venturi (organizador) P r a t i c a n d o C o l e ç ã o

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Livro organizado por Luis Antônio Bittar Venturi e que conta com a participação de todo o departamento de geografia da Universidade de São Paulo. Traz uma vasta gama de conceitos e técnicas para estudo e pesquisa em Geografia.

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Page 1: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

GEOGRAFIAPráticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

Luis Antonio Bittar Venturi (organizador)

Pra

ticando

Coleção

ADILSON AVANSI DE ABREU

AILTON LUCHIARI

ALFREDO PEREIRA DE QUEIROZ FILHO

BIANCA CARVALHO VIEIRA

CARLA CRISTINA REINALDO GIMENES DE SENA

CLEIDE RODRIGUES

DÉBORAH DE OLIVEIRA

EDUARDO FÉLIX JUSTINIANO

EMERSON GALVANI

FERNANDO SHINJI KAWAKUBO

GLÓRIA DA ANUNCIAÇÃO ALVES

HÉLIO GARCIA PAES

JORGE GUSTAVO DA GRAÇA RAFFO

JOSÉ BUENO CONTI

JURANDYR LUCIANO SANCHES ROSS

LÍGIA VIZEU BARROZO

LUIS ANTONIO BITTAR VENTURI

MARCELLO MARTINELLI

MARIA ALICE VENTURI

MARIA LÚCIA CEREDA GOMIDE

MÁRIO DE BIASI

MARISA DE SOUTO MATOS FIERZ

MAURO LUIZ PERON

NELY ROBLES REIS BACELLAR

NÍDIA NACIB PONTUSCHKA

PATRÍCIA ALBANO MAIA

REGINA ARAÚJO DE ALMEIDA

REINALDO PAUL PÉREZ MACHADO

RÚBIA GOMES MORATO

SAMUEL FERNANDO ADAMI

SÉRGIO RICARDO FIORI

SUELI ANGELO FURLAN

TARIK REZENDE DE AZEVEDO

VANDERLI CUSTÓDIO

WALDIRENE RIBEIRO DO CARMO

9 788599 018941

ISBN 978-85-99018-94-1

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ráticas de Cam

po, Laboratório e Sala de A

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raticando

Coleção

O livro Geografia: Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula reúne informações técnicas e conceituais da pesquisa científica produzidas por 35 professores reconhecidos por sua atuação acadêmica e docente. Apresenta fatos, conceitos e procedimentos fundamentais para a compreensão e a pro-dução do conhecimento geográfico que auxiliarão alunos e profissionais de Geografia, Biologia, Ciências Ambientais, Ecologia e, inclusive, História e Ciências Sociais a construir instrumentos próprios de estudo e investigação sobre a sociedade e a natureza. A obra interessa também aos professores do Ensino Fundamental e Médio, pois traz subsídios para desenvolverem em sala de aula um trabalho articulado entre as teorias da Geografia e as práticas de ensino e aprendizagem dessa disciplina.

OS AUTORES:

PRATGEO_CAPA DEFINITIVA.indd 1 22/06/2011 17:10:02

Page 2: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula
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São Paulo, 2011

Pra

ticando

Coleção

GEOGRAFIAPráticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

Luis Antonio Bittar Venturi (organizador)

pratgeo_miolo_cap00.indd 1 15/06/2011 16:47:49

Page 4: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

Geografia: práticas de campo, laboratório e sala de aulaCopyright © 2011Luis Antonio Bittar Venturi (Organizador)

Direção editorialFrancisco Azevedo de Arruda SampaioRita Marte Arruda SampaioAloma Fernandes de Carvalho

Revisão técnicaEduardo Justiniano

Preparação e revisão de textoIzabel BuenoMaria Rita CamariniHelena Botelho Gomes

Produção e edição de imagemEduardo JustinianoRafael Sato

DiagramaçãoDaniela Fujiwara

CapaFAAS / Brasil Foto

Capa (fotografia)Eduardo Justiniano

Administração e apoioAna Maria P. C. MelloAna Paula de MenezesCarolina Oliveira CremonesiLhuan GameiroEldo Francisco da Silva (Pixinguinha)Paulo Robson do Nascimento Lopes

Projeto gráficoEstúdio BogariJogo de Amarelinha

Todos os direitos reservados.

Editora SarandiAv. Brigadeiro Faria Lima, 1912 – Conjunto 208 B – Pinheiros – São Paulo – SPTel. (11) 3097 -9040http://www.editorasarandi.com.bre -mail: [email protected]

Índices para catálogo sistemático:1. Geografia : Estudo e ensino 910.7

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Geografia : práticas de campo, laboratório e sala de aula / Luis Antonio Bittar Venturi, (organizador). — São Paulo : Editora Sarandi, 2011. — (Coleção Praticando)

Vários autores. ISBN 978-85-99018-94-1

1. Geografia – Estudo e ensino I. Venturi, Luis Antonio Bittar. II. Série.

11-06484 CDD-910.7

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Page 5: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

CARO(A) LEITOR(A),

O objetivo desta obra foi reunir o maior núme-

ro possível de informações técnicas e conceituais

que podem subsidiar pesquisas científicas, assim

como orientar o trabalho do professor. Dirigido

aos alunos de graduação dos cursos de Geogra-

fia, Geologia, Biologia e mesmo Ciências Sociais e

História, o livro também conversa com o professor

do Ensino Médio, sobretudo na seção “Na sala

de aula”, presente nos capítulos. O livro abrange,

então, um público que muitas vezes é represen-

tado pelo mesmo sujeito, já que frequentemente

os alunos universitários são professores da rede

escolar pública e privada.

A grande variedade de assuntos tratados

impossibilita -nos de atribuir uma única orientação

teórica principal. Este é o preço que a Geografia

paga por se ocupar de um vasto e rico temário.

Geotecnologias, técnicas de hidrografia, de análise

de solos, estágio em sala de aula, aplicação de

questionários, pesquisas históricas, entre muitos

outros assuntos aqui tratados, apresentam, cada

qual, suas especificidades teórico -conceituais, ain-

da que os grandes conceitos – como paisagem, região, espaço – sejam contemplados. Metodolo-

gicamente, contudo, o livro propõe procedimen-

tos comuns que serão encontrados em todos os

capítulos. O primeiro refere -se à articulação entre

os conteúdos. Constantemente o leitor irá se depa-

rar com sugestões de atividades, muitas das quais

trazem grande potencial integrador entre áreas,

como, por exemplo, Cartografia Temática, Geo-

morfologia, Fotografia, Biogeografia e Estatística.

Outro procedimento metodológico proposto

é a aproximação dos conteúdos à realidade do

aluno e da escola, de modo que as informações

lhe façam mais sentido. Assim, se o capítulo pro-

põe certa atividade, ela deve referir -se ao contexto

geográfico no qual a escola se insere. Por exem-

plo, ao se praticar a construção de mapas temáti-

cos, deve -se usar dados relativos à região na qual

a escola se situa (população rural, urbana etc.).

Ao se praticar a identificação de áreas de risco,

deve -se buscar indicadores na paisagem na qual

a escola se localiza.

Finalmente, o livro busca superar a perspectiva

tradicional do campo enquanto aula ao “ar livre”,

na qual os alunos seguem um professor e tentam,

apressadamente e nem sempre em condições fa-

voráveis, anotar e gravar tudo o que se ouve e se

fala. Embora isso ainda possa e deva ser feito em

alguns casos, o livro transfere para o aluno uma

boa dose de protagonismo, pela forma como os

conteúdos e as atividades são estruturados. O alu-

no será mais ativo entrevistando, fotografando,

cavando trincheiras, medindo vazão de rios ou

condições atmosféricas. Enfim, o aluno irá com-

partilhar a experiência de campo que se tornará,

assim, muito mais atraente, auxiliando o processo

de ensino -aprendizagem.

Ainda que algumas áreas não estejam nomi-

nalmente referenciadas em capítulos específicos,

seus conteúdos são contemplados em um ou mais

capítulos. É o caso, por exemplo, da Geografia da

População que, embora não seja objeto de um ca-

pítulo específico, está contemplada tanto nos capí-

tulos dedicados à Cartografia Temática e Geografia

da Saúde e, em menor grau, naquele que aborda

as Técnicas de Interlocução.

Assim, conferiu -se ao ensino e à aprendizagem

da Geografia um “sopro de vida” tornando es-

ses processos mais vivos, articulados, interativos

e atualizados.

LUIS ANTONIO BITTAR VENTURI

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Page 6: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .7Praticando a Geografia: o papel da práxis entre a res cogitans e a res extensaADILSON AVANSI DE ABREU

Capítulo 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .11A Técnica e a Observação na PesquisaLUIS ANTONIO BITTAR VENTURI

Capítulo 2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29Técnicas de GeomorfologiaJURANDYR LUCIANO SANCHES ROSS

MARISA DE SOUTO MATOS FIERZ

BIANCA CARVALHO VIEIRA

Capítulo 3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 55Técnicas de HidrografiaCLEIDE RODRIGUES

SAMUEL FERNANDO ADAMI

Capítulo 4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83Técnicas de PedologiaDÉBORAH DE OLIVEIRA

Capítulo 5 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 107Técnicas de ClimatologiaTARIK REZENDE DE AZEVEDO

EMERSON GALVANI

Capítulo 6 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135Técnicas de BiogeografiaSUELI ANGELO FURLAN

SUMÁRIO

Capítulo 7 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 171Técnicas de CartografiaALFREDO PEREIRA DE QUEIROZ FILHO

MÁRIO DE BIASI

Capítulo 8 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 203Técnicas de Cartografia TemáticaMARCELLO MARTINELLI

Capítulo 9 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 231Técnicas de Sensoriamento RemotoAILTON LUCHIARI

FERNANDO SHINJI KAWAKUBO

RÚBIA GOMES MORATO

Capítulo 10 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 255Técnicas de Localização e GeorreferenciamentoJORGE GUSTAVO DA GRAÇA RAFFO

Capítulo 11 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 271Sistema de Informação GeográficaFERNANDO SHINJI KAWAKUBO

RÚBIA GOMES MORATO

REINALDO PAUL PÉREZ MACHADO

Capítulo 12 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 287Técnicas de Geografia da SaúdeLÍGIA VIZEU BARROZO

Capítulo 13 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 309Técnicas de Pesquisa HistóricaNELY ROBLES REIS BACELLAR

PATRÍCIA ALBANO MAIA

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Page 7: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

Capítulo 14 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 321Uso e Registro de Fontes BibliográficasGLÓRIA DA ANUNCIAÇÃO ALVES

VANDERLI CUSTÓDIO

Capítulo 15 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 333A Escola como Laboratório VivoNÍDIA NACIB PONTUSCHKA

Capítulo 16 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 355Técnicas Inclusivas de Ensino de GeografiaREGINA ARAÚJO DE ALMEIDA

WALDIRENE RIBEIRO DO CARMO

CARLA CRISTINA REINALDO GIMENES DE SENA

Capítulo 17 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 381Técnicas de Desenho e Elaboração de PerfisSÉRGIO RICARDO FIORI

Capítulo 18 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 403Técnicas de Ilustração BotânicaMARIA LÚCIA CEREDA GOMIDE

Capítulo 19 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 411Técnicas de FotografiaEDUARDO FÉLIX JUSTINIANO

Capítulo 20 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 435Técnicas de VídeoMAURO LUIZ PERON

Capítulo 21 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 447Técnicas de InterlocuçãoLUIS ANTONIO BITTAR VENTURI

Capítulo 22 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 469Estatística Descritiva em Sala de AulaEMERSON GALVANI

Capítulo 23 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 483A Redação do Trabalho de CampoMARIA ALICE VENTURI

Capítulo 24 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 495Profissão: GeógrafoHÉLIO GARCIA PAES

LUIS ANTONIO BITTAR VENTURI

Capítulo 25 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 519Contos de CampoJOSÉ BUENO CONTI

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Page 8: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

Viajou a palavra auman, que signi�ca em siríaco: o que fabrica, o

que faz, o criador, o pro�ciente, o inteligente, o experiente, o inventor;

viajou esta palavra com os sírios para todas as regiões da Europa,

depois da junção da partícula de de�nição fenícia ha, �cando assim

ha+auman, originando a palavra humano.

“História da Antiga Civilização Síria”, DAUD, AHMED

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Page 9: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

IntroduçãoADILSON AVANSI DE ABREU

CPG

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Page 10: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

8 práticas de geografia

O conhecimento geográ�co tem motivado a publicação de um grande número de livros. A maioria ocupa -se com a divulgação de resultados de pesquisas. Um número menor volta -se para as discussões de natureza teórico -conceitual, fre-quentemente com viés analítico -histórico e pano de fundo político -ideológico. Poucos são os livros editados que se ocupam com a apresentação e a discussão de procedimentos de observação e aná-lise dos objetos materiais ou imateriais que inte-ressam ao campo da Geogra�a. Nesse panorama, a publicação de um livro com o título Geogra�a: práticas de campo, laboratório e sala de aula é digna de ser positivamente recebida, particularmente porque se volta para um público que, em geral, encontra poucas referências dessa natureza.

Este livro cumprirá, portanto, um papel rele-vante no processo de formação acadêmica e pe-dagógica nos diferentes níveis em que a Geogra-�a é ensinada. Será importante para os alunos do Ensino Médio, de graduação e pós -graduação, bem como para o corpo docente envolvido nesse ambiente. Igualmente será útil para os geógrafos que, como pro�ssionais, atuam em institutos de pesquisa ou em órgãos da administração pública ou da iniciativa privada, ocupados com temas que objetivem resolver questões emergentes nos processos de organização do espaço em suas di-ferentes formas e escalas de manifestação.

A análise dos títulos e conteúdos deste livro evidencia a importância que se dá ao verbo pra-ticar e ao substantivo técnica empregados nos seus diferentes capítulos. Em alguns, a discussã o amplia-se, abordando também método (mais fre-quente) e teoria (menos frequente).

A tônica da obra é, assim, indiscutivelmente prático -técnica, com o mérito de deixar que os procedimentos possam dar margem a uma prá-xis que articule o objeto conceitual ou teórico

(res cogitans) com o objeto material ou empírico (res extensa) da Geogra�a, de acordo com as con-vicções pessoais de cada pesquisador.

Nesse contexto emerge uma importante questão para re�exão. As técnicas ou procedi-mentos farão a mediação entre a teoria, o pes-quisador e o objeto da pesquisa, e essa mediação será pautada pela compreensão e linguagem que o indivíduo mobiliza, a partir do conteúdo teóri-co que lhe serve de referência para identi�car e analisar o que ele julga ser o objeto da Geogra-�a. A decomposição, a análise e a apreensão do objeto empírico da investigação serão referen-ciadas, portanto, pelos conceitos teóricos que o geógrafo, progressivamente, construiu em sua visão da ciência, em seu processo de formação cultural, cientí�ca e política. Nesse sentido, a res extensa será abordada por meio de um recorte arbitrário, fruto da res cogitans do observador.

A res cogitans fornecerá a cada pesquisador as possibilidades para sua aproximação da res extensa para observação e análise. O que emer-gir desse processo será um conjunto de resulta-dos que poderá expressar, com maior ou menor �delidade, o objeto observado. O resultado da observação comporá, portanto, um quadro que re�ete apenas parcialmente o objeto, na medida em que ele foi recortado pelo observador, com o descarte de alguns aspectos e a sobrevaloriza-ção de outros, pois esse processo decorre de um juízo do que é e do que não é importante, sendo esse julgamento feito a partir das convicções e imagens mentais prévias que pautam a práxis do pesquisador.

Apresenta -se aqui um problema fundamental: se a observação e a experimentação só podem ser realizadas a partir da teoria, como conduzir a práxis de maneira a articular o objeto pensado (res cogitans) e o objeto empírico (res extensa), sem

PRATICANDO A GEOGRAFIA: O PAPEL DA PRÁXIS ENTRE A RES COGITANS E A RES EXTENSA

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Page 11: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

9introdução

perder a possibilidade de crítica a respeito da di�-culdade de aprender a totalidade dos fenômenos e manter a faculdade de deixar -se surpreender por um dado não previsto na teoria?

Na práxis o pesquisador depara -se com o dilema de como se aproximar do empírico, pautado por processos cognitivos expressos em uma semântica que já recorta a realidade arbi-trariamente, de acordo com suas convicções e conveniências.

Essa situação não é um apanágio da Geo-gra�a. Ela opera em todos os ramos do conhe-cimento e é importante fonte de erros, uma vez que a valorização subjetiva do observador e o estado do conhecimento da própria ciência introduzem um viés que o distancia de muitas questões que ele desconsidera, ou o aproximam dos aspectos que ele sobrevaloriza. O observa-dor sempre corre o risco de apenas reiterar sua visão prévia do problema, se não estiver alerta e aberto para fatos que escapem de sua concep-ção e eventualmente colidam com a concepção teórica que o moveu.

Por pertencer também ao objeto da Geo-gra�a, na qual pretende articular o espaço e o tempo em suas análises, a condição do geógra-fo encontra paralelo com a do historiador. Isso permite uma aproximação com as análises de Paul Ricoeur, quando discute a operação histo-riográ�ca no plano epistemológico, que passa por três momentos: do arquivo, da explicação/compreensão e da representação histórica (RI-COEUR, 2007).

Essa aproximação é pertinente porque o geógrafo, embora pretenda ocupar -se primor-dialmente do espaço, aborda também o tempo, mas em uma espessura ou duração diferente da do historiador. Dependendo da natureza de seu objeto material, essa espessura temporal pode

ser longa, aproximando o geógrafo das últimas etapas da Geologia; outras vezes pode ser mais curta, mas ainda referente a milhares de anos, aproximando -o da Arqueologia e da pré -história; ou, ainda, poderá durar apenas séculos ou es-tar relacionada à duração de décadas ou mesmo anos, aproximando -o da Antropologia, da Socio-logia, da Política, da Economia e da História em suas análises contemporâneas.

Dessa forma, o geógrafo estará, particu-larmente nesses últimos casos, envolvido dire-tamente com os processos que analisa. Nessa situação, sua condição aproxima-se muito à do historiador. Sobre isso, Paul Ricoeur registra:

Por condição entendo duas coisas: de um lado, uma

situa ção na qual cada um se encontra cada vez mais im-

plicado, Pascal diria “ fechado”; de outro, uma condiciona-

lidade, no sentido de condição de possibilidade de ordem

ontológica, ou, como acabamos de dizer, existencial em rela-

ção mesmo às categorias da hermenêutica crítica. Fazemos a

história, e fazemos história, porque somos históricos. […] A

coerência do empreendimento repousa, portanto, na necessi-

dade da dupla passagem do saber histórico à hermenêutica

crítica, e desta à hermenêutica ontológica. Essa necessidade

não pode ser demonstrada a priori: só surge se for posta em

prática, o que equivale a ser posta à prova. Até o �m, a arti-

culação presumida permanecerá uma hipótese de trabalho.1

O geógrafo encontra -se, portanto, diante de uma questão fundamental: como pode se certi�-car de que as representações conceituais com as quais ele se aproxima do objeto da investigação são as mais adequadas? Será que ele não está descartando aspectos relevantes?

1 RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esqueci-mento. Campinas: Editora da Unicamp, 2007.

PRATGEO_5aprova.indb 9 15/06/2011 16:23:08

Page 12: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

10 práticas de geografia

A história da Ciência, em geral, e da Geo-gra�a, em particular, está repleta de exemplos de teo rias que demoraram muito a serem supe-radas, porque a pesquisa continuava a ser feita pelos cânones da teoria adotada, havendo pouca ou nenhuma predisposição dos pesquisadores em identi�car fatos que contrariassem suas con-vicções. A lembrança da geomorfologia davisia-na é paradigmática.

Por outro lado, não são fatos que revogam as teorias, mas sim outras teorias. Enquanto ape-nas se acumulam fatos que não se conformam com determinada teoria, ela é mantida, ainda que em situação cada vez mais desconfortável. Apenas quando os fatos discordantes se trans-formam em conceitos, proposições e princípios gerais surge a possibilidade de emergir uma teo-ria alternativa, que progressivamente se aperfei-çoa e supera a teoria até então dominante, que pode, por algum tempo, permanecer de forma residual. Nesse processo, parte da teoria que é refutada pode também ser incorporada na que emerge.

A transformação processa -se, portanto, pela aceitação de uma nova ideologia que, sob certos aspectos, revoga a ideologia anterior2. Quantas vezes, desde o início do século XX, isso aconte-ceu com a Geogra�a? Nesse processo, inúmeras transformações conceituais e teóricas foram re-gistradas, tendo sido a práxis, em boa parte, o motor das mudanças que acabaram conduzindo, inclusive, à ressigni�cação do objeto material da disciplina.

Por esse motivo, Geogra�a: práticas de campo, laboratório e sala de aula deve ser saudado como referência oportuna e contribuição relevante na formação do pensamento geográ�co.

2 PIRES, Eginardo. A teoria da produção dos conheci-mentos. In: Epistemologia e Teoria da Ciência. Petró-polis: Editora Vozes, 1971.

SOBRE O AUTOR

Adilson Avansi de Abreu é geógrafo, professor

titular, com área de investigação relacionada à gênese e

à dinâmica da paisagem, compreendida como resultante

da interação das forças da natureza e da sociedade. A

geomorfologia, como elemento estruturador temporal

e espacial da paisagem, no contexto da Geografia Física,

recebe particular atenção. A percepção da paisagem na

perspectiva da herança cultural e patrimonial, no contexto

das ciências humanas, é o outro eixo estruturador das

pesquisas que orienta, podendo contribuir também para

os objetivos do planejamento territorial. Foi diretor da

Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas e Pró-

-Reitor de Cultura e Extensão Universitária da Universidade

de São Paulo, além de presidente do Condephaat.

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Page 13: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

A Técnica e a Observação na PesquisaObservação na PesquisaObservação

Introdução, 12

As dimensões humanas

da técnica, 13

O gabinete, o campo

e o laboratório, 19

A observação como

técnica primordial, 22

Na sala de aula, 25

Considerações finais, 27

Referências de apoio, 28

Sobre o autor, 28

1LUIS ANTONIO BITTAR VENTURI

Michael DeYoung / Corbis

PRATGEO_5aprova.indb 11 15/06/2011 16:23:14

Page 14: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

12

INTRODUÇÃO

Neste capítulo, discutem -se alguns aspectos gerais da técnica, úteis à leitura

dos capítulos subsequentes que trazem as especificidades de cada área. Entre os

aspectos tratados estão: a técnica como prerrogativa humana, suas dimensões

artística, produtiva e científica, com ênfase nesta última, quando ela é consi-

derada como apoio operacional à pesquisa; o mito da técnica e os critérios de

escolha e uso, entre outros.

Em um segundo momento, diferencia -se o gabinete, o campo e o laborató-

rio enquanto três instâncias da pesquisa, caracterizando -se cada uma delas e

enfatizando -se sua complementaridade. Em seguida, discute -se a observação

enquanto técnica primordial, a sistematização, a subjetividade e as derivações

(inferências) decorrentes da experiência acumulada.

Finalmente, propõem -se atividades de fixação conceitual e de prática de

observação.

PRATGEO_5aprova.indb 12 15/06/2011 16:23:17

Page 15: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

13capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

As técnicas e os instrumentos desenvolvidos pelo ser humano representam a extensão e o apri-moramento de todos os seus sentidos e habilidades permitindo -lhe enxergar o invisível, alcançar o que era antes inatingível, comunicar -se a distâncias e velocidades não imaginadas. Permitem -lhe ainda expressar sua sensibilidade através da arte, orien-tada por valores estéticos que mudam no decorrer do tempo. Possibilitam ao ser humano aumentar a produtividade de todos os bens econômicos, assim como intensi� car a apropriação e a transforma-ção dos recursos naturais da Terra. Finalmente, ajudam -no a prever o que seria imprevisível e medir com precisão o que os sentidos e a mente humana percebem apenas de forma � uida e sub-jetiva. Observe a seguinte de� nição de técnica:

“[…] em termos precisos, é o conhecimento sobre como

fazer ou fabricar algo […]. O conhecimento racional, pro-

� ssional, das regras de procedimento envolvidas em fazer

ou fabricar algo. Inclui -se sob este rótulo uma variedade

de ciências e artes” (GILES, 1993, p. 150, grifo nosso).

Pelo exposto, podemos identi� car, pelo menos, três principais dimensões da técnica: artística, pro-dutiva e cientí� ca, sobre as quais discorreremos bre-vemente, com maior ênfase na dimensão cientí� ca.

A relação entre técnica e arte já aparece na ori-gem do termo, em diversas de� nições, a exemplo da técnica enquanto “conjunto de processos de uma arte”1. Considerando -se a arte como forma de ex-pressão permeada por valores estéticos num uni-verso simbólico, esta acepção torna a técnica uma prerrogativa exclusiva do ser humano, da criação humana. É, “no sentido mais geral, qualquer coisa criada propositalmente por seres humanos, em con-traste com aquilo que resulta da obra da natureza”2.

1 Cunha (1981, p. 759).2 Ibidem.

Contudo, a submissão dessa dimensão da técnica a uma análise lógico -cientí� ca pode ser pouco profícua, já que a arte não tem vínculos necessários com materialidades e pode transcen-der facilmente o tempo e o espaço, tão funda-mentais para a análise geográ� ca.

Na Figura 1.1, é possível contemplar a técni-ca vinculada à arte. Qual é a materialidade desta expressão artística? Como se situa no tempo e no espaço? Qual o objetivo de se chegar a esse resultado? Tentando responder a essas questões talvez se destrua o propósito do “conjunto de pro-cessos de uma arte”.

Sob outra perspectiva, analisando a técnica pela dimensão produtiva, mais uma vez estaría-mos reforçando -a como prerrogativa humana.

Figura 1.1. Cirque du Soleil.

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AS DIMENSÕES HUMANAS DA TÉCNICA

PRATGEO_5aprova.indb 13 15/06/2011 16:23:20

Page 16: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

14 práticas de geografia

Figura 1.2. Macaco -prego usando “técnica” em que articula

martelo (fragmento de rocha) e bigorna (rocha -base) para quebrar

coquinhos.

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Apenas o ser humano pode desenvolver téc-nicas. O que os animais são capazes de fazer (teias, formigueiros, ninhos, represamentos…) seria apenas o resultado mecânico de caracte-rísticas previstas em seus códigos genéticos em processo de adaptação ao meio. Sob a análise geográ�ca, as “ações” dos animais estariam es-tanques no tempo e no espaço e, por isso, o que uma colônia de cupins era capaz de fazer muitos séculos atrás é praticamente a mesma coisa que faz hoje, salvo algumas adaptações ao ambiente, pois não haveria transmissão de conhecimento no tempo e no espaço, a não ser geneticamente3.

Repare na Figura 1.2. Submeter esta imagem aos recursos analíticos da Geogra�a também seria pouco profícuo, pois o tempo (quando) e o espaço (onde) em que a técnica mostrada foi empregada fazem pouco sentido. Poderia ser há um milênio ou ontem; no Brasil ou em diversos outros lugares.

No entanto, concebendo -se a técnica como atributo humano relacionado à dimensão pro-dutiva, sentimo -nos mais à vontade, pois temos preservados todos os nossos referenciais concei-tuais e analíticos. Nessa perspectiva, a técnica concebe -se como meio de apropriação e trans-formação da natureza para alimentar o ciclo pro-dutivo. Preservam -se aí todos os referenciais da análise geográ�ca, como o tempo, o espaço, a sociedade e a natureza. Há um contexto socio- -econômico de�nido, um conjunto de técnicas viabilizadas por esse contexto, ideais norteado-res (por exemplo, autossu�ciência, soberania), além de uma base físico -territorial que favorece essa atividade produtiva. Há pressupostos histó-ricos para explicar esse contexto, como também

3 Esta assertiva, porém, pode gerar discordância em meio aos cientistas que estudam o comportamento animal. A evolução das ciências pode identificar algumas ca-racterísticas nos animais relativas à transmissão de conhecimento e indícios de teleologia, que exijam revi-são conceitual ou a incorporação de novos critérios de definição de técnica.

é possível considerar as perspectivas ou desdo-bramentos econômicos, sociais, ambientais etc. A relação tempo -espaço se fortalece, pois os objetos técnicos que se acumulam no espaço ajudam a contar sua história4.

Mas, quando a técnica, na dimensão produ-tiva, caracteriza -se pelo trabalho alienado, ela pode voltar, em escala de detalhe, a ser estan-cada no tempo e no espaço. Veja a Figura 1.3.

Outras vezes, porém, o trabalho alienado é operacionalizado por um conjunto denso de ob-jetos técnicos que facilitam sua recontextualiza-ção no tempo e no espaço, como mostra a Figura 1.4, que ilustra o setor industrial britânico em meados do século XX.

Neste capítulo, contudo, daremos mais ên-fase à dimensão cientí�ca da técnica enquanto apoio operacional às pesquisas geográ�cas e ciências a�ns.

Especialmente para as ciências que trabalham com os mais diferentes aspectos do mundo real,

4 Milton Santos torna a técnica uma categoria de análi-se quando afirma que “as técnicas, de um lado, dão -nos a possibilidade de empiricização do tempo e, de outro lado, a possibilidade de uma qualificação precisa da materialidade sobre a qual as sociedades humanas trabalham. […] É por intermédio das técnicas que o homem, no trabalho, realiza essa união entre tempo e espaço” (SANTOS, 1997, p. 44).

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15capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

Figura 1.3. Cortador de cana. Repare na dificuldade de se datar e

situar esta imagem. Poderia ser do contexto nordestino do século

XIX ou paulista do século XXI. Neste caso, a técnica não facilitaria a

empirização do tempo e seria necessário, para isso, situar-se em uma

escala mais generalizante, em que apareceriam outros objetos, como

estradas, usinas e treminhões.

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Figura 1.4. Cena do filme Tempos Modernos, de Charlie Chaplin.

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como a Geogra�a, a Biologia, a Geologia, a Física e a Sociologia, entre muitas outras, as técnicas exercem um importante papel no processo de produção cientí�ca, auxiliando o pesquisador na obtenção e sistematização de informações que irão subsidiar os argumentos, fornecendo -lhes evidências empíricas, atribuindo -lhes consistên-cia e objetividade. Em outras palavras, a aplicação das técnicas possibilita a geração de dados da realidade que irão fornecer lastros empíricos aos caminhos percorridos pelo método. Se o méto-do, dispondo de fundamentação teórica, auxilia o pesquisador na organização do raciocínio, as técnicas, por sua vez, auxiliam -no na organização

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16 práticas de geografia

das informações que lhe darão subsídio. Se, por um lado, a teoria e o método são processos desen-volvidos no plano do pensar, por outro, a técnica desenvolve -se no plano do fazer.

Obviamente, não se trata (e a de�nição ex-posta anteriormente nos mostrou isso) de um fazer sem pensar, automático, mas sim, permea-do pela razão. No domínio humano, o pensar e o fazer andam juntos, são complementares e estimulam -se mutuamente, o que é reforçado pela a�rmação de Anaxágoras (século V a.C.) de que “o homem pensa porque tem mãos”.

Teorias, métodos, técnicas e instrumentos constituem diferentes aspectos de um mesmo processo (cientí�co), ainda que em alguns mo-mentos os separemos analiticamente para com-preender melhor cada uma de suas característi-cas e funções dentro do processo. A criação de dicotomias, por exemplo, entre teoria e técnica (em que a primeira seria reveladora e a segunda alienadora) é maniqueísta e cega para comple-mentaridades. Um falso problema como este po-deria, eventualmente, remir alguns paradigmas teóricos que ajudaram a legitimar as contradi-ções sociais (malthusianismos, determinismos eurocentristas) e, ao mesmo tempo, desvalorizar o apoio técnico -instrumental às pesquisas cien-tí�cas (inclusive auxiliando na comprovação ou refutação de teorias), além dos institutos e órgãos técnicos (IBGE, por exemplo) que produzem e sistematizam dados sobre os quais re�etimos; que fornecem “água para nosso monjolo analítico”.

Sem dúvida, a re�exão reveste -se de um status mais alto na pesquisa, uma vez que é por meio dela que se promovem explicações. Mas, por ou-tro lado, não há como compreender a realidade sem dados, nem transformá-la apenas re�etindo sobre ela. Finalmente, embora haja, de fato, uma hierarquia, pois em um projeto de pesquisa a teo-ria e o método orientam a prática (o homem pen-sa e concebe antes de agir), esta ordem seria mais operacional, pois não haveria como estabelecer níveis de importância para instâncias que têm diferentes funções no mesmo processo.

Caso o fazer promovido pelas técnicas tenha um �m em si, ou seja, esteja desvinculado de um processo de pesquisa cientí�ca, caracteriza -se como um trabalho técnico. Por outro lado, se este fazer vincula -se a um processo de pesquisa con-duzido por um método, evidencia -se um trabalho cientí�co. Vale ressaltar que, num trabalho cien-tí�co, a obtenção de dados não é aleatória, mas sistemática, estando sempre vinculada a um obje-tivo, a uma hipótese dentro de uma problemática preestabelecida5. Essa é a condição básica para que os dados possam atribuir objetividade ao tra-balho cientí�co, já que eles não o fazem por si só. E a decisão sobre a qualidade e a quantidade dos dados, embora seja tomada pelo pesquisador, ou seja, pelo sujeito, será menos subjetiva se estiver atrelada a uma problemática. De qualquer for-

5 Embora a observação aleatória também possa contri-buir para o trabalho científico, como se verá adiante.

Figura 1.5. Aplicação de técnica para fins de pesquisa científica.

Na foto, membros da Comissão Geográfica e Geológica, em

levantamento em Salto dos Patos, no rio Grande (SP/MG), em 1910.

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17capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

ma, o trabalho do pesquisador que faz uso das técnicas produzirá um conhecimento revestido de caráter empírico, baseado, em grande parte, na observação dos fatos, no uso dos sentidos, na prática e na vivência de situações reais.

O pesquisador, enquanto cientista, diferen-temente do técnico, nunca poderá abrir mão do método como processo mental que organiza seu raciocínio, mas poderá fazê -lo, em certa medida, em relação à técnica. É possível que não domi-ne o uso de técnicas, terceirizando -as, o que o tornará mais dependente de recursos e serviços para resolver as questões relacionadas à busca e sistematização de dados. Entretanto, é impor-tante considerar que a falta de tal domínio pode incorrer na perda de espaço no mercado de tra-balho fora do meio acadêmico.

Por outro lado, o domínio da técnica, não necessariamente instrumental, pode assegurar ao pesquisador maior con�abilidade e maior controle sobre os dados que irão subsidiar seus argumentos. Esse domínio aprimora -se quase que exclusivamente no plano da prática, ou seja, no próprio uso da técnica, sobretudo daquelas que empregam instrumentação especí�ca.

As técnicas, diferentemente do método, cujo desenvolvimento vincula -se às questões teóricas e à própria evolução do pensamento humano, evo-luem segundo necessidades (práticas, produtivas, artísticas e cientí�cas) que vão surgindo ao longo da história da humanidade, num percurso contí-nuo, embora não necessariamente linear. Quanto mais complexidades do mundo real o ser humano consegue desvendar por meio dos avanços técni-cos e instrumentais, mais ele se depara com no-vas complexidades. Quando o telescópio Hubble foi construído para resolver determinadas ques-tões acerca do cosmos, não era possível imaginar quantas novas complexidades ele traria aos olhos dos cientistas. Muitos mistérios foram revelados e muitos outros vieram à tona quando os sonares passaram a ser usados para estudos de batimetria oceânica, além de terem possibilitado a con�r-mação de teorias que necessitavam de evidências

empíricas para serem aceitas pela comunidade cientí�ca, como a Teoria da Tectônica de Placas.

Na lógica do mercado, no entanto, muitos instrumentos, especialmente os mais variados softwares, satélites e técnicas a eles associadas, desenvolvem -se com espantosa rapidez. A tec-nologia, em uma de suas acepções possíveis, caracteriza -se pelo conhecimento técnico--cientí�co aplicado a diversos �ns6. Pode voltar -se para a lógica do mercado, aumentando a produti-vidade e o lucro, ao atender demandas reais ou ar-ti�ciais (telefones celulares com jogos, TV, MP3, �lmadoras, GPS e computadores acoplados etc.).

Por outro lado, a tecnologia pode gerar muitos benefícios para a humanidade em diversas áreas, como medicina, comunicação e circulação de in-formações, exploração de recursos naturais, ma-peamentos e monitoramentos ambientais on-line, entre muitos outros. Ainda que haja, atualmente, o discurso da massi�cação da tecnologia, para-doxalmente, o acesso a ela não é universal, já que o poder aquisitivo ainda é fortemente desigual.

A incorporação de valores e necessidades pelo ser humano impulsiona o desenvolvimento das técnicas (e instrumentos) ininterruptamente e com tamanha rapidez que se criam mitos em torno delas, como o mito da tecnologia, do prag-matismo. Em outras palavras e aprofundando -se na questão, cria -se um paradoxo em que a razão é obscurecida por ela mesma, pela miti�cação da técnica. Por isso, torna -se necessário que o pesquisador seja muito criterioso na escolha das técnicas que utilizará e que seus critérios não se esvaeçam diante da sedução do novo.

Impulsionado pelo mercado, o desenvolvimento das técnicas antecipa -se às necessidades, criando--as e recriando -as. Isso induz o usuário menos cri-terioso a mover -se em direção às “novidades” sem antes sentir necessidade delas, tornando -as uma necessidade em si. Novas técnicas e instrumentos

6 A Ciência estaria voltada para a compreensão e a tec-nologia para a aplicação. Ver o Glossário.

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18 práticas de geografia

são buscados sem que os já existentes tenham sido suficientemente conhecidos e utilizados. Desse fato, decorre o risco de uma inversão hierárquica no processo de produção cientí�ca: a técnica, como meio de obtenção de dados, torna -se um �m em si mesma e, não raro, assume o papel do método. Em casos mais extremos, os instrumentos (softwares, imagens de satélite etc.) assumem esse papel. Por isso, há que se rea�rmar que o saber técnico existe para exercer determinadas tarefas com maior e�-ciência possível, mas não resulta em explicações. A explicação de um fato ou fenômeno é produto de um saber cientí�co estruturado por argumentos7. A evolução da taxa de fecundidade, de escolaridade e do poder aquisitivo, por exemplo, representam um conjunto de fatos revelados pela técnica que cole-tou e sistematizou esses dados. Mas é a razão que irá estabelecer conexões entre eles, podendo gerar explicações na forma de argumentos cientí�cos. Se o uso de instrumentos estiver desvinculado das teorias e métodos que regem o processo cientí�co, estará atendendo a outros �ns e os instrumentos poderão tornar -se meras mercadorias.

Critérios de escolha da técnica

No processo de pesquisa, a escolha das técni-cas está, primeiramente, relacionada à natureza do objeto de estudo e sua adequação a ele. Ao se estudar Climatologia, por exemplo, não há como escapar das técnicas e do uso de instru-mentos (por mais digitais que estejam) como as medições de temperatura por termômetros ou da pluviosidade por pluviômetros (ver Capí-tulo 5 – Técnicas de Climatologia). Do mesmo modo, ao se estudar um tema em que a relação sujeito -objeto envolve intersubjetividade, há que se lançar mão das técnicas de aplicação de

7 Uma discussão sobre as diferenças entre o saber técnico e o saber científico pode ser encontrada no segundo capítulo de Granger (1994).

questionários ou entrevistas, entre outras (ver Capítulo 21 – Técnicas de Interlocução).

Em seguida, a escolha da técnica deve levar em consideração a relação custo -benefício. Nada impede que a técnica mais adequada seja a mais moderna, contanto que a relação custo -benefício seja favorável. E não haveria razão para adquirir um caro GPS de última geração para conseguir alguns poucos dados de georreferenciamento que poderiam ser obtidos de forma mais simples, até com uma bússola e um mapa.

Deve -se também considerar a viabilidade e a acessibilidade na escolha da técnica. Ainda que ela possa ser adequada ao objeto e apresentar uma boa relação custo -benefício, o acesso a ela pode ser um obstáculo, seja pelo seu valor, seja por sua disponibilidade. É o que ocorreu durante muito tempo com as imagens de satélite como instrumento básico das técnicas de interpreta-ção de imagens. Hoje, no Brasil, este instrumen-tal é bem mais acessível.

Uma vez desvinculada a adequação da técnica do grau de modernidade que incorpora, pode -se fazer ainda algumas outras considerações. Os ins-trumentos mais simples e tradicionais tendem a ter uma vida útil muito maior. Uma bússola, um heliógrafo ou uma biruta funcionarão inde�nida-mente, enquanto a Terra girar, o Sol brilhar e o vento “soprar”. Funcionam sem fontes arti�ciais de energia e di�cilmente algum componente terá de ser substituído. Nesse sentido, os instrumentos eletrônicos, ainda que ofereçam precisão e rapidez na obtenção dos dados, tendem a ser mais frágeis e dependem de baterias, sinais de satélites, além de apresentarem, pela sua complexidade, maior chan-ce de sofrer algum problema de funcionamento.

Outro aspecto positivo dos instrumentos tra-dicionais ilustra -se pelo fato de que eles forçam o observador a prestar mais atenção na dinâmi-ca da natureza, favorecendo sua compreensão. Um exemplo extremo dessa consideração pode ser dado pela comparação de um relógio digital e um relógio de Sol. No primeiro caso, o leitor obtém automaticamente a hora em números

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19capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

sem nenhum esforço mental, e, se o dado estiver impreciso, ele di�cilmente saberá. No caso do relógio de Sol, ele terá de “lembrar” que a Terra gira no sentido oeste -leste, que o Sol “nasce” a leste, além de ter que considerar qual é a estação do ano e em qual hemisfério está. Observando -se comparativamente o funcionamento de outros instrumentos, por exemplo, uma bússola clássica e um GPS, uma balança digital e uma tradicional, com pesos e contrapesos, é fácil perceber que os instrumentos mais simples exigem mais habili-dades do observador e “mostram” como os fenô-menos funcionam, enquanto os mais so�sticados oferecem resultados imediatos, mas camu�am o funcionamento dos fenômenos.

A valorização de técnicas e instrumentos mais simples ou tradicionais não ocorre aqui (e isso deve estar claro) em detrimento do moderno, do so�s-ticado; da mesma forma que o contrário não seria aceitável. Os instrumentos mais modernos tendem a apresentar maior alcance, rapidez e precisão (ain-da que a questão da precisão não seja prerrogativa exclusiva dos instrumentos digitais), características que podem ser absolutamente necessárias ao es-tudo. Há, também, certos instrumentos so�stica-dos de pesquisa que são insubstituíveis pelo que proporcionam. É o caso, por exemplo, de imagens de radar ou satélite (ver Capítulo 9 – Técnicas de Sensoriamento Remoto). Ainda que não promovam a integração in loco do observador com a natureza, proporcionam uma inigualável visão de conjunto, abstraindo e revelando aspectos ocultos, favorecen-do enormemente a compreensão de diversos fenô-menos, como a evolução de áreas urbanas, desmata-mentos, fenômenos climáticos, entre muitos outros.

É interessante considerar ainda que muitas técnicas e instrumentos que nos são apresentados como novos são, na verdade, roupagens tecnológi-cas de ideias já existentes ou de lógicas há muito conhecidas. Os alunos normalmente se surpreen-dem quando descobrem que dentro de um plu-viômetro eletrônico (ver Capítulo 5 – Técnicas de Climatologia) há uma pequena báscula (um tipo de monjolo), engenho cuja invenção se perde nos

séculos da História. A única diferença consiste em um ímã que, a cada vez que o mecanismo abaixa com o peso da água que recolhe, envia sinais elétricos que equivalem a uma determinada quantidade de chuva. A criação de instrumentos e técnicas também se inspira na observação di-reta de fenômenos da natureza. A observação do sistema de locomoção dos morcegos inspirou a invenção do radar, assim como a observação das aves inspirou o desenvolvimento da aviação.

Finalmente, o bom -senso na escolha da téc-nica e a criatividade para adaptações e usos são aspectos que devem ser considerados com a de-vida seriedade. Essas características favorecem melhor adaptação às condições materiais do ambiente de trabalho e ao contexto socioeco-nômico do lugar onde se vive, possibilitando ao cientista alcançar, mais rapidamente, as soluções requeridas. Por essa razão, também é impor-tante conhecer o máximo de técnicas possível, como forma de ampliar as possibilidades de uso e adaptações em diversas circunstâncias.

O GABINETE, O CAMPO E O LABORATÓRIO

O uso da técnica dentro do processo de pes-quisa pode, em muitos casos, ser dividido em três momentos ou espaços de trabalho: o gabinete, o campo e o laboratório. O laboratório (do latim, laboratorium, lugar de trabalhar, de labore, traba-lhar) está sendo aqui considerado exatamente como um lugar de labor, de trabalho, seja equi-pado com instrumental especí�co ou não. Assim, o gabinete incorpora -se nesta acepção. De modo geral, a divisão entre gabinete e laboratório ocor-re claramente em especialidades que requerem instrumentos mais especí�cos, como a Pedolo-gia e a Climatologia, entre outras. O gabinete é utilizado para o planejamento e a preparação do trabalho de campo e o laboratório, stricto senso, para o trabalho de sistematização das informa-

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20 práticas de geografia

ções recolhidas em campo. Nas pesquisas volta-das para temáticas sociais, não raro o laboratório e o gabinete fundem -se em um mesmo espaço fí-sico de trabalho, já que essas temáticas requerem menor uso de instrumentação especí�ca. Embora se desenvolvam de forma mais independente dos aparatos técnicos, tais pesquisas lançam mão de boa parte das técnicas tratadas neste livro, como a aplicação de questionários e entrevistas (ver Capítulo 21 – Técnicas de Interlocução), de tra-tamento estatístico (ver Capítulo 22 – Estatística Descritiva em Sala de Aula), registros fotográ�-cos e videográ�cos (ver Capítulo 19 – Técnicas de Fotogra�a e Capítulo 20 – Técnicas de Vídeo) e leitura de imagens, entre outras.

Em princípio, o trabalho de gabinete auxilia no preparo do trabalho de campo, isto é, no plane-jamento de ações baseado em um conhecimento prévio da área de estudo. Essas ações podem en-volver providências mais cientí�cas, como o levan-tamento cartográ�co e bibliográ�co da área de es-tudo, a de�nição de pontos de observação segundo a temática e os objetivos da pesquisa, e também ações mais logísticas, como o estabelecimento de contatos com interlocutores, marcação de encon-tros para entrevistas, veri�cação das condições de segurança dos pontos de parada, consulta às previsões meteorológicas, obtenção de autoriza-ções para entradas em Unidades de Conservação, travessia de balsas, hospedagem, além de muitas outras, sempre atreladas aos objetivos do trabalho.

O momento do trabalho de campo representa o contato direto com a realidade, seja como ex-tensão da sala de aula (aula de campo) seja para a realização de pesquisa cientí�ca. Esse contato pode ser de observação imediata ou intermedia-do pelo uso de técnicas e instrumentalização.

Em aulas de campo, que podem ocorrer em qualquer ambiente (natural, urbano, rural e até no oceano, a depender da temática envolvida) os alunos praticam a observação orientada por conceitos apreendidos em aula (erosão, mono-cultura de exportação, densidade populacional etc.), além de usar algumas técnicas e manu-

sear instrumentos. Mas, sobretudo, no campo, os alunos devem praticar a análise integrada, articulando e relacionando os fatos observados.

Em pesquisas cientí�cas, o campo é onde são ge-rados dados primários e con�rmam -se ou ajustam -se os secundários, isto é, dados que podem corroborar ou não hipóteses de trabalho e conceitos cientí�cos. Nesse caso, a observação em campo é mais siste-mática e menos aleatória, embora o contato com a realidade quase sempre gere novas ideias que serão incorporadas como novas variáveis à análise geo-grá�ca. Isso quer dizer que, embora o contato com a realidade seja direto e sistematizado, não se tem controle assegurado sobre os processos, como se pode ter em laboratório. No campo, o pesquisa dor está submetido às dinâmicas da realidade que elegeu estudar. Pode haver um deslizamento de encosta ou um protesto bloqueando a estrada, uma tempestade, um apagão, uma greve. Ou seja, a dinâmica do mun-do real pode nos reservar muitas surpresas, de modo que é comum que o que foi planejado no gabinete não ocorra em campo exatamente como se espera-va8. Isso signi�ca que o planejamento do trabalho de campo, como o da pesquisa, requer certa �exibilida-de do pesquisador e a possibilidade de um plano B.

A tecnologia incorporada cada vez mais aos instrumentos utilizados por determinadas técni-cas (como imagens de satélite de alta resolução, por exemplo) pode diminuir a necessidade de campo, já que fornece informações cada vez mais precisas da realidade. Sendo uma das funções do trabalho de campo conferir as informações obtidas por outros meios, o aumento da precisão das informações pode tender a con�nar o pesqui-sador no laboratório. Mas ele deve ter consciência do risco que existe em transformar seu trabalho no chamado “trabalho de gabinete” e, sobretudo,

8 Lembro -me que, em 1988, programei um trabalho de campo para a pesquisa de mestrado, no Parque Na-cional das Emas (GO), mas um incêndio de grandes proporções impossibilitou o trabalho de campo. Assim uma nova variável, relacionada à vulnerabilidade, foi incorporada à análise.

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21capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

ter clareza de que o campo e as informações que ali podem ser obtidas são insubstituíveis.

Em termos gerais, o trabalho de campo é uma técnica ampla que incorpora outras mais especí-�cas (atreladas aos diferentes objetos de estudo) e, de tão fundamental para a análise geográ�ca, é considerada por alguns como método, assim como o é para os antropólogos9. Esta é uma dis-cussão que, certamente, não se esgotará aqui.

O valor do trabalho de campo para os geógra-fos atravessou séculos, fortalecendo -se com os naturalistas, resistindo às revoluções cientí�cas que reformularam a Geogra�a e chegando ao século XXI com seu status inabalado, represen-tando talvez o maior consenso entre os geógrafos das mais diversas tendências e formações.

O trabalho de campo é, segundo Wooldridge, “fonte primária de inspiração e ideias e inspira uma grande parte tanto do problema quanto do método de nossa área de estudo” (1948:2, apud STODDARD & ADAMS, 2004, p. 53).

O campo é onde a complexidade da reali-dade é revelada e conduzida à compreensão do geógrafo, munido de seus principais conceitos, como paisagem, espaço, região e lugar, por exemplo, os quais se materializam na realidade, dão sentido a ela e dela obtêm sentido. É onde as fronteiras acadêmicas das disciplinas deixam de fazer sentido e são substituídas por inúmeras conexões entre os fatos observados, num proces-so de reconstrução conceitual.

No campo, a visão do geógrafo é simultanea-mente multiescalar, capaz de observar desde o detalhe a seu lado até o conjunto da paisagem, multiplicando -se as possibilidades de conexões verticais (entre escalas de diferentes grandezas) e horizontais (entre os fatos simultaneamente observados). Portanto, o trabalho de campo é uma experiência insubstituível.

9 Um dos métodos científicos da Antropologia refere -se à pesquisa participante, em que o pesquisador passa longo tempo nas comunidades que estuda. Ver mais informações no Capítulo 21 – Técnicas de Interlocução.

O campo também ajuda a socializar os geó-grafos e os alunos, enriquecendo a vivência acadêmica e escolar, tornando o aprendizado da Geogra�a muito mais atraente e a pesquisa geográ�ca cienti�camente mais legítima.

O trabalho em laboratório, por sua vez, envolve o tratamento dos dados obtidos no campo, trans-formando-os em informações. As amostras de solo serão analisadas mais precisamente e classi�cadas, os questionários serão tabulados, as entrevistas serã o transcritas, as fotogra�as serão melhoradas e os vídeos editados, os produtos cartográ�cos serã o eventualmente corrigidos em função do que se observou no campo. En�m, as informações de-vem ser sistematizadas de modo que possam ser incorporadas como base empírica da pesquisa.

O laboratório ainda tem outra função acadêmico -científica. É onde também podem ser feitas simulações de fenômenos, cujo controle é mais e�ciente do que em campo10; simulações que podem, por analogia, promover maior com-preensão do real, a exemplo de testes de porosida-de e permeabilidade de solos, simulações de ba-lanço hídrico, simulações de entrevistas, teste de modelos (climatológicos, geomorfológicos etc.).

Finalmente, o laboratório também exerce uma função mais didática, tanto em escolas como em universidades, pois é o espaço em que se promovem estágios, cuja função é, entre ou-tras, a aquisição de determinadas habilidades e o aprendizado do uso de determinadas técnicas e instrumentos (confecção de mapas, por exem-plo). Lembremos ainda que, nos estágios de ensi-no, a própria sala de aula é um laboratório11. Em suma, o laboratório promove um contato con-trolado entre o pesquisador e o tema estudado, muitas vezes intermediado por instrumentos.

10 Experimentos também são empreendidos em campo, em Geomorfologia, Climatologia, Biogeografia etc., mas exigem uma estratégia de controle mais complexa que envolve a proteção dos instrumentos, instalações, a coleta periódica das informações etc.

11 Ver Capítulo 15 – A Escola como Laboratório Vivo.

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22 práticas de geografia

A OBSERVAÇÃO COMO TÉCNICA PRIMORDIAL

Talvez esta seja a técnica mais antiga e inata ao ser humano, já que ele passa a vida observando. Aqui, estamos considerando dois tipos de obser-vação: aleatória e sistemática. A primeira é descom-prometida de resultados; é mais contemplativa e seu nível de detalhe, velocidade, hierarquia dos fatos dependerá apenas da atenção e do interesse subjetivo do observador. Embora ela não seja me-tódica, contribui para o conhecimento cientí�co, na medida em que pode gerar ideias, insights, de forma mais ou menos espontânea, não raro favo-recida pelo próprio estado de relaxamento men-tal12. Mas como a pesquisa não pode depender do surgimento de insights, é necessário empreender uma observação mais controlada, mais heurética.

A observação sistemática será dirigida ou focada em alguns alvos previamente determinados pelos objetivos da pesquisa, precisamente pelas hipóteses levantadas ou pelas variáveis analíticas seleciona-das13. Quando se vai a campo observar fatos que se relacionam a um objetivo de pesquisa, o observador torna -se um sujeito e o fato observado transforma--se num objeto de estudo. Este tipo de observação pode ser considerada como uma técnica orientada pelo método analítico descritivo e, enquanto técni-ca, não produzirá explicações, mas lhes fornecerá as bases necessárias. Só é possível explicar o que se conhece, portanto, a observação descritiva deve ser valorizada como uma etapa primordial da pesqui-sa, ou o primeiro momento de qualquer conheci-mento cientí�co (ou o segundo, se considerarmos que antes de sairmos observando temos que ter uma problemática ou temas prede�nidos). Mesmo em uma simples aula de campo ou em estudo do meio (que aqui não estão sendo diferenciados), é

12 É comum os alunos voltarem dos feriados e das férias com ideias novas de pesquisa.

13 Diferença que se define apenas pela forma de aborda-gem, ou seja, do método adotado.

útil que o professor de�na alguns temas -alvo para que a atenção dos alunos não se disperse muito.

Ao diminuir a aleatoriedade da observação, é necessário preservar a visão de conjunto, tão essencial à análise geográ�ca integrada. A sis-tematização não deve ser um fator restritivo, como uma viseira limitante do campo de visão. Apenas fará com que o observador, ou melhor, o sujeito, preste mais atenção aos fatos relevados por aquela pesquisa, naquele momento, otimi-zando suas observações. Caso contrário, ele �ca à deriva no oceano dos fatos14.

A observação sistemática poderá ser operacio-nalizada por uma diversa gama de instrumentos. Os instrumentos óticos, como binóculos, lunetas, lupas, lentes e microscópios, atendem a diferentes objetos de estudo das diversas ciências, como a Geogra�a, a Biologia, a Geologia e a Astronomia. Entre tais instrumentos ainda existem aqueles que possibilitam o registro da observação, como câmeras fotográ�cas (ver Capítulo 19 – Técnicas de Fotogra�a) e câmeras de vídeo (ver Capítulo 20 – Técnicas de Vídeo). Há ainda os instrumentos métricos, como o clinômetro, com o qual se obtém a inclinação de vertentes (ver Capítulo 2 – Téc-nicas de Geomorfologia), o termômetro, o helió-grafo, para medir a radiação solar (ver Capítulo 5 – Técnicas de Climatologia) e muitos outros, que serão apresentados neste livro. Finalmente, existem os instrumentos de georreferenciamento que nos dão a posição geográ�ca e a orientação espacial dos fatos observados, como a bússola, o GPS (ver Capítulo 7 – Técnicas de Cartogra�a e Capítulo 10 – Técnicas de Localização e Georre-ferenciamento) e o próprio mapa.

É conveniente ressaltar que não existe o ob-servador ideal, capaz de realizar observações isentas de subjetividade. Não se observa para depois interpretar; a observação e a interpreta-ção fazem parte de um mesmo processo, sendo que a segunda poderá ser re�nada a posteriori. A

14 Consulte também Venturi (2008).

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23capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

observação cientí�ca, portanto, nunca será total-mente objetiva, pois sempre sofre interferências do sujeito da observação. O que será observado, em que ordem, em qual nível de detalhamento, o que será omitido ou negligenciado, tudo isso será impregnado, num bom sentido, pelo sujeito, sua história, seus valores, seu conhecimento prévio. Segundo Hanson (1992), observar é ter uma ex-periência que sofre interferências das experiências anteriores. A experiência acumulada apareceria na interpretação daquilo que se vê, alterando a ex-periência da observação. Para ilustrar essa ideia, imaginemos um geógrafo com seu �lho de cin-co anos passeando no centro de uma metrópole. Embora possam estar observando sensorialmente os mesmo objetos, estão tendo experiências de observação muito distintas.

As diferenças da experiência da observação não existem apenas entre os sujeitos, mas em um mes-mo sujeito ao longo do tempo. A observação do garoto de cinco anos mudará ao longo de sua vida, à medida que suas experiências e seus conheci-mentos possibilitem a realização de novas leituras.

A observação ainda envolveria outros órgãos sensoriais além da visão. Num país estrangeiro, por exemplo, uma palavra só terá algum signi�-cado caso se tenha acumulado alguma experiên-cia linguística daquele povo, embora se possa ouvir os mesmos sons vocalizados.

A linguagem usada para fazer a descrição do fato observado também será impregnada. Assim, dez observadores fariam dez diferentes relatos de observação de um mesmo fato, mesmo que tivessem os mesmos objetivos de pesquisa e a mesma formação acadêmica. São os sujeitos que observam e não os pares de olhos. Apesar dessas pluralidades, há algumas tendências comuns. Não raro, os observadores iniciarão sua obser-vação pelo que mais chama a sua atenção, por exemplo, um edifício mais alto, um pico pontia-gudo. Essa parece ser uma tendência daqueles que se iniciam na observação cientí�ca. Mas o sujeito observador deve tomar alguns cuidados. O primeiro deles refere -se à importância daquele

fato de destaque, lembrando que os fatos não têm importância cientí�ca a priori, mas são rele-vados pelos objetivos da pesquisa. Sendo assim, aquele edifício alto pode ter pouca importância explicativa, enquanto fatos mais sutis seriam mais relevantes. Em segundo lugar, deve -se considerar que, quase sempre, são os fatos mais comuns que ajudam a explicar a realidade e não as exceções.

Certa vez, durante o percurso de um trabalho de campo, em 2007, paramos à beira da rodovia Carvalho Pinto (no estado de São Paulo) para realizarmos um exercício de observação. Havia diante de nós uma grande extensão territorial caracterizada por colinas suaves, recobertas de campos com algum cultivo e alguma pecuária em pequenas propriedades. Porém, ao fundo, víamos as escarpas continentais da Serra do Mar que “sal-tavam” no horizonte, fato que foi relatado com grande destaque pelos alunos. A visão dos alunos ultrapassou toda a paisagem predominante (entre o grupo e a serra) e foi atraída pelo relevo destaca-do ao fundo, ainda que este não fosse representati-vo do conjunto e nem ajudava a explicar o contexto predominante. Em outra parada, já num ambiente serrano, um pico mereceu destaque em meio a um modelado de topos convexizados. Mais uma vez, destacou -se uma exceção e tornaram -se secundá-rias as características predominantes da paisagem, muito mais explicativas dos processos de escultu-ração do relevo. Isso con�gura uma observação, de certa forma, passiva, como se a paisagem “ditasse” ao observador o que descrever.

En�m, existiria uma ordem para se obser-var os fatos da realidade? Sim, não e talvez. Sim, caso se tenha um objetivo especí�co, hipóteses ou variáveis já selecionadas, o que, como visto, orientaria a observação para determinados fa-tos. Não, caso se esteja realizando exercícios de observação descritiva, inventariando fatos que não estão necessariamente relacionados a um objetivo de pesquisa. Observações dessa nature-za são exercícios úteis para praticar a linguagem adequada, o uso de conceitos, a homogeneiza-ção do nível de detalhe etc. Finalmente, talvez,

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Page 26: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

24 práticas de geografia

pois há algumas sugestões em diferentes fontes, que podem ser acatadas ou não. Na perspectiva da Geogra�a Regional “clássica”, sugere -se ini-ciar as observações a partir dos aspectos físico--territoriais, para então proceder à observação das formas de ocupação e uso. Esse procedi-mento pode ser adequado em muitos casos, já que os tipos de uso sempre sofrem in�uên cia das características do ambiente. Há alguns au-tores, ainda, que estabelecem ordem de fatos observáveis. Nagel & Spencer (2000, p. 14 -18) propõem que, em áreas urbanas, por exemplo, a observação deveria ocorrer na seguinte ordem:¾¾ linhas de comunicação (ruas, estradas, aero-

portos);¾¾ tipos de uso (residencial, industrial, comer-

cial) com caracterizações internas (classe média, indústria de tecnologia, comércio de eletrônicos);¾¾ diferenciação entre áreas novas e antigas;¾¾ outros tipos de uso (terrenos baldios, espaços

verdes etc.).

Já as diferentes áreas de estudo da Geogra�a, como Biogeogra�a, Geomorfologia, Pedologia etc., por suas peculiaridades, trazem orientações sobre a ordem de observação dos fatos, como será visto nos capítulos subsequentes.

Seja qual for o caminho da observação, uma ordem escalar deve ser considerada. É sempre conveniente iniciar a observação a partir de uma visão mais geral para, gradativamente, se chegar a detalhes, os quais farão mais sentido dentro de um contexto mais amplo. Se um fato é uma abs-tração momentânea de um todo, ele será mais bem compreendido tendo esse todo como refe-rência, daí a necessidade de contextualizá -lo em conjunturas mais amplas. Além disso, o “conjun-to” tem maior importância para o geógrafo, dado que seus principais conceitos (paisagem, espaço, região, lugar, território) referem-se a territoria-lidades mapeáveis. Os detalhes podem auxiliar na caracterização dos conjuntos.

Também fazem parte da observação fatos que estão fora do alcance direto da visão, ou

seja, que são inferíveis. Re�ita sobre esta de�ni-ção de observação:

“A conclusão ou juízo baseado em elementos objetivos

da realidade. Estes podem fundamentar -se na percepção

dos sensíveis, de elementos da realidade que, embora não

sejam observáveis em princípio ou de fato, no entanto, têm

efeitos observáveis, como os prótons, por exemplo” (GILES,

1993, p. 112 -113).

Assim, à medida que o geógrafo interioriza al-guns conceitos, como o de paisagem enquanto re-sultado da relação entre seus componentes, mais correlações e inferências poderá fazer, ou seja, mais fatos “ocultos” poderá desvendar. Quanto mais conhecer as dinâmicas dos componentes da paisagem e do espaço, mais desvendará essências dissimuladas pelas aparências.

No entanto, é preciso deixar claro, no relato da observação15, o que de fato se viu e o que foi inferido. Quando, à noite, num retorno de campo, passamos pela transição entre uma ba-cia sedimentar e um cinturão orogênico, vários alunos relataram ter observado essa transição es-trutural. Ora, eles apenas sabiam que essa tran-sição ocorria aproximadamente naquela área e poderiam até ter inferido esse fato pela sinuo-sidade que passou a caracterizar a estrada ou por alguma outra evidência ou efeito. Mas não observaram de fato, e isso tinha de �car claro, pois as inferências são derivações interpretativas da observação e, por isso, sujeita a erros.

Para apoiar as observações diretas e as in-ferências, o sujeito pode fazer uso de um “ins-trumento” muito especial: a teoria científica, composta de conceitos e leis que estabelecem relações explicativas entre os fatos e nos ajudam a tornar a realidade mais inteligível. Mas esse assunto �ca para outro momento.

15 Para reforçar a ideia da descrição como relato da obser-vação, leia o Capítulo 23 – A Redação do Trabalho de Campo.

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Page 27: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

25capítulo 1 – a técnica e a observação na pesquisa

NA SALA DE AULA

Propõe -se agora a realização de duas atividades de �xação conceitual e treino de observação.

Atividade 1

Peça aos alunos, diante de uma mesma paisagem, que a descrevam. Padronize o tempo de observação (cerca de 20 minutos16) e a extensão da descrição (uma página). É interessante que a paisagem seja rica em elementos naturais e antrópicos, pois se for muito homogênea o exercício perderá sentido. Caso não haja possibilidade de realizar este exercício fora da sala de aula ou da escola, exponha uma imagem diante dos alunos.

Após o tempo previsto, peça para que cada um leia em voz alta a descrição que elaborou. Neste momento, os alunos terão consciência das in�uências subjetivas na observação do objeto. Discuta com eles os seguintes pontos:¾¾ Por que as observações são tão diferentes, já que a paisagem é a mesma e os alunos estão no

mesmo nível escolar?¾¾ Quantos iniciaram a descrição pelos aspectos mais marcantes, e por que isso teria ocorrido?¾¾ Há aspectos da paisagem que, por serem mais sutis, foram negligenciados?¾¾ Que aspectos predominam na paisagem descrita? É mais urbana? Mais rural? Apresenta regula-

ridade na ocupação ou é do tipo “desordenada”?¾¾ Há elementos novos e antigos coexistindo?

Atividade 2

Em sala de aula, exponha aos alunos uma imagem ou, em campo, pare diante de uma paisagem. A Figura 1.6 é um exemplo possível.a) Quais são os elementos de fato observáveis, relacionados às moradias, a aspectos naturais como vegetação, relevo etc.?b) Quais seriam os elementos inferíveis? Com auxílio das informações do Capítulo 2 deste livro (Técnicas de Geomorfologia), analise se haveria risco de deslizamento. Quais aspectos indicam isso? Veja que foi preciso acumular certo conhecimento para se poder inferir algo, para enriquecer a experiência da observação/interpretação.c) Que outros fatores poderiam ser inferidos (exclusão social, degradação ambiental etc.) e por quais indícios?

Repita esta atividade, agora usando uma imagem bem diferente, como a Figura 1.7, por exemplo.

16 O tempo da observação é muito variável e quase sempre demanda mais tempo do que imaginamos, pois é útil observar a paisagem por um tempo antes de começar a descrevê-la. Os 20 minutos foram propostos apenas para viabilizar o exercício em sala de aula.

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Page 28: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

26 práticas de geografia

Figura 1.7. Agronegócio de soja. Distrito Federal, 2006.

Figura 1.6. Ocupação irregular em área de mananciais no município de São Paulo (SP), em 2006.

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Edu

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Page 29: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

27

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste capítulo, procurou -se argumentar em favor da técnica enquanto uma

instância do processo de pesquisa, ressaltando suas características, funções,

alertando para o risco de sua mitificação e, ao mesmo tempo, para possíveis

preconceitos remanescentes de épocas passadas. Se, por um lado, deve -se ser

criterioso com a escolha e o uso das técnicas, por outro, apenas a prática consoli-

da seu domínio. Mesmo a observação, enquanto técnica investigativa primordial

e base para a compreensão da realidade, deve ser praticada. O conhecimento

enriquecerá a experiência da observação, permitindo inferências cada vez mais

seguras e, assim, mais científicas.

Com base nos aspectos aqui relevados, expõem -se nos capítulos subsequen-

tes uma ampla gama de técnicas utilizadas pela Geografia e ciências afins, das

quais os alunos e professores poderão fazer uso, de acordo com suas necessi-

dades e interesses.

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Page 30: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

28 práticas de geografia

REFERÊNCIAS DE APOIO

Glossário

Heurético: (do grego heuretikós = inventivo) diz -se do

método pedagógico pelo qual se leva o aluno a desco-

brir por si mesmo a verdade que se lhe quer inculcar17.

Inferência: 1 – conclusão deduzida por raciocínio

(CUNHA, 1981, p. 435); 2 – o processo lógico ou con-

ceitual que consiste em derivar uma proposição de

outra ou de outras proposições (GILES, 1993, p. 81);

3 – admissão da verdade de uma proposição, que não é

conhecida diretamente, em virtude da ligação dela com

outras proposições já admitidas como verdadeiras18.

Interpretação: 1 – operação pela qual o espírito passa

do signo para a coisa significada ou, preferivelmente,

para a ideia significada19. Subentende -se, nesta acep-

ção, que a interpretação necessita de conhecimento.

2 – Explicação do sentido de algo […]20.

Observação: percepção atenta. A observação é a

pesquisa das características diferenciadoras de uma

coisa e, nessa qualidade, o primeiro momento de

qualquer conhecimento científico. […] Diferencia -se

a observação natural, que consiste simplesmente em

perceber as coisas […] da observação científica, que

consiste em ler -se instrumentos de mensura (termôme-

tro, barômetro etc.) e que implica num certo interesse

e em certos conhecimentos: a observação nunca é

passiva e só notamos as coisas ou características em

função de nossas disposições mentais e de nossos

conhecimentos21.

Tecnologia: conjunto de conhecimentos, especial-

mente princípios científicos, que se aplicam a um de-

terminado ramo de atividade22.

17 Novo Dicionário Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fron-teira, p. 721.

18 Ibidem.19 GOBLOT, Edmond. Le vocabulaire philosophique.

Paris: Arnand Colin, 1927, p. 311.20 JUPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário

de Filosofia. 3. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1996, p. 146.

21 JULIA, Didier. Dicionário da Filosofia. Trad.: José Américo da Motta Pessanha. Rio de Janeiro: Larousse do Brasil, 1969, p. 231.

22 Idem nota 19 e 20, p. 1 360.

Bibliografia

CUNHA, A. G. Dicionário etimológico da língua portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,

1981.

GILES, T. R. Dicionário de Filosofia – termos e filó-sofos. São Paulo: EPU, 1993.

GRANGER, G. G. A Ciência e as ciências. São Paulo:

Editora da Unesp, 1994.

HANSON, N. R. Observação e interpretação. In: MOR-

GENBESSER, S. (Org.). Filosofia da Ciência. São Pau-

lo: Cultrix, 1992.

LACOSTE, Y. Pesquisa e trabalho de campo. In: Se-leção de textos, n. 11 (Série Teoria e Método). São

Paulo: AGB, 1985, pp. 1 -23.

LENON, B. & CLEVES, P. Fieldwork techniques and

projects in Geography. Londres: Collins Educational,

1996.

NAGLE, G. & SPENCER, K. Geographical enquiries –

skills and techniques for Geography. Londres: Nel-

son Thornes, 2000.

SANTOS, M. A natureza do espaço – técnica e tem-po. Razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1997.

VENTURI, L. A. B. Ensaios geográficos. São Paulo:

Humanitas, 2008.

SOBRE O AUTOR

Luis Antonio Bittar Venturi é mestre (1993) e

doutor (2001) em Ciências (Geografia Física) pela Uni-

versidade de São Paulo (USP), onde também graduou-

-se (1986) e licenciou -se. Atualmente, é professor dou-

tor (RDIDP) da USP na graduação e na pós -graduação

do Departamento de Geografia, orientando pesquisas

de mestrado e doutorado. Atua nas áreas de Geografia

dos Recursos Naturais, Teoria, Método e Técnicas de

Campo e Laboratório de Pesquisa em Geografia, temas

sobre os quais tem publicado artigos, livros e proferido

palestras. É avaliador ad hoc pelo MEC e parecerista

de instituições de fomento à pesquisa e de publicações

especializadas.

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Page 31: Geografia - Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

GEOGRAFIAPráticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula

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9 788599 018941

ISBN 978-85-99018-94-1

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O livro Geografia: Práticas de Campo, Laboratório e Sala de Aula reúne informações técnicas e conceituais da pesquisa científica produzidas por 35 professores reconhecidos por sua atuação acadêmica e docente. Apresenta fatos, conceitos e procedimentos fundamentais para a compreensão e a pro-dução do conhecimento geográfico que auxiliarão alunos e profissionais de Geografia, Biologia, Ciências Ambientais, Ecologia e, inclusive, História e Ciências Sociais a construir instrumentos próprios de estudo e investigação sobre a sociedade e a natureza. A obra interessa também aos professores do Ensino Fundamental e Médio, pois traz subsídios para desenvolverem em sala de aula um trabalho articulado entre as teorias da Geografia e as práticas de ensino e aprendizagem dessa disciplina.

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