garrido, lina - talkshow na era da tv digital · as mudanças inauguram uma nova fase da televisão...

143
FACULDADE CÁSPER LÍBERO MESTRADO EM COMUNICAÇÃO TALKSHOW NA ERA DA TV DIGITAL NOVO CONTEÚDO, NOVA RECEPÇÃO, NOVA PROGRAMAÇÃO LINA CLÁUDIA MOREIRA GARRIDO HORA São Paulo 2009

Upload: lykien

Post on 07-Nov-2018

216 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

FACULDADE CÁSPER LÍBERO

MESTRADO EM COMUNICAÇÃO

TALKSHOW NA ERA DA TV DIGITAL

NOVO CONTEÚDO, NOVA RECEPÇÃO, NOVA PROGRAMAÇÃO

LINA CLÁUDIA MOREIRA GARRIDO HORA

São Paulo

2009

i

LINA CLÁUDIA MOREIRA GARRIDO HORA

TALKSHOW NA ERA DA TV DIGITAL

NOVO CONTEÚDO, NOVA RECEPÇÃO, NOVA PROGRAMAÇÃO

Dissertação de mestrado apresentada ao

Programa de Mestrado em Comunicação da

Faculdade Cásper Líbero, área de concentração:

“Comunicação na contemporaneidade”, linha de

pesquisa “Processos midiáticos tecnologia e

mercado”, como requisito parcial para a

obtenção do título de mestre em Comunicação.

Orientador: Walter Teixeira Lima Jr

São Paulo

2009

ii

iii

Aos meus amores Regina, Lídia, Eleonora, Yolanda; ao meu eterno companheiro Fábio

e àquele que sempre acreditou em mim, Walter Lima.

iv

AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos ao amor e à paciência daqueles que estiveram próximos

de mim nesta fase tão enriquecedora da minha vida.

À minha mãe, avó e tias queridas, meu obrigada pela força e pelo apoio.

Ao meu futuro marido, minha eterna gratidão pela dedicação, compreensão e ajuda

inestimável.

Ao meu orientador, obrigada por acreditar, estimular e reconhecer sua eterna aluna.

Aos professores da Faculdade Cásper Líbero, obrigada pelo conhecimento transmitido.

Aos professores Laurindo Lalo Leal Filho e Pollyana Ferrari, obrigada pelas sábias

intervenções e pela atenção dedicada a esta dissertação que, depois de dois anos, posso

dizer que foi um dos meus mais gratificantes feitos.

v

“A interatividade, quase por definição, é uma função do computador, e não da televisão.

Transformar o televisor numa combinação interativa de teatro, museu, sala de aula,

sistema bancário, shopping center, correio e comunicador é contrário à sua natureza”.

George Gilder, sobre o que viria a ser a TV digital (1990).

vi

RESUMO

Esta dissertação analisa a TV digital e suas potencialidades – alta resolução, multiprogramação, interatividade e mobilidade – utilizando, para exemplificar a mudança de sistema representada pela digitalização da TV analógica, os programas do gênero talkshow. Trata-se de um gênero consagrado em todo o mundo e que faz parte da grade de programação nacional desde o início da TV no Brasil. As novas tecnologias da comunicação modificam tanto o conteúdo quanto a relação da mídia com seus públicos. No caso da TV digital – e suas ferramentas potencializadas pelo Set-top Box e pelo software intermediário nele instalado –, as ações permitidas também influenciam diretamente a postura do telespectador, já que alteram o sistema tradicionalmente unidirecional de comunicação. Devido, principalmente, à interatividade proporcionada, o papel clássico do espectador é transformado e a ele é acrescentada a função de interagente (um vínculo que dá voz ao indivíduo anteriormente chamado de receptor dentro da relação estabelecida desde a primeira metade do século passado). As mudanças inauguram uma nova fase da televisão no mundo, promovendo o televivente e estreando um sistema de comunicação que ainda procura brechas para desenvolver suas potencialidades, e que não deve mais ser compreendido da mesma maneira. Palavras-chaves: 1.Televisão. 2.Tecnologia. 3.TV digital. 4.Interatividade. 5.Recepção. 6.Talkshow.

vii

ABSTRACT

This dissertation analyses the digital TV and its possibilities – high resolution, multiprogramming, interactivity and mobility – using the program genre talkshow as an essay balloon to explain the transition represented by digitalization of analog TV. Talkshow is a worldwide established genre that exists in every national programming grid since the very start of television in Brazil. The new technologies of communication change the content as much as the media relationship with its publics. In the case of digital TV – and the potential tools of Set-top Boxes and its middleware –, the actions allowed influences directly the viewer’s traditional role, as it radically modify the unidirectional nature of such systems. Mainly due to this interactivity, the classic role of the viewer is modified and the function of interagent is added to him (a link that empowers the individual that used to be called receiver in a kind of relationship founded in the first half of last century and kept unchanged ever since). These changes open a new phase of television in the world, promoting the advent of “televivente” and starring a system of communication that is still looking for a chance of fully develop its potentialities, and that should not to be understood the same way. Key words: 1.Television. 2.Technology. 3.Digital TV. 4.Interactivity. 5.Reception. 6.Talkshow.

1

SUMÁRIO

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS, 3

LISTA DE QUADROS E ILUSTRAÇÕES, 4

1 INTRODUÇÃO, 5

2 TALKSHOW, 10

2.1 Gêneros e formatos da televisão brasileira, 10

2.2 O que é talkshow?, 15

2.2.1 História do talkshow no Brasil,18

2.2.2 Características do gênero na TV analógica, 21

3 A DIGITALIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO, 25

3.1 Novas tecnologias, 25

3.2 TV digital, 30

3.2.1 Características gerais, 32

3.2.2 Evolução da tecnologia da imagem audiovisual, 35

3.2.3 Principais sistemas digitais: ATSC, DVB e ISDB, 39

3.3 Set-top boxes: considerações sobre outras mudanças desencadeadas pela

TV digital na cadeia televisiva, 41

3.4 TV digital no cenário da comunicação brasileira, 45

4 INTERATIVIDADE TÉCNICA E CONTEÚDO, 51

4.1 Interação e interatividade, 51

4.1.1 Experiências audiovisuais interativas, 61

4.2 Hipertexto e hipermídia, 70

4.3 Design e interfaces, 75

5 RECEPÇÃO, 85

5.1 O espectador e suas mediações, 85

5.2 O televivente, 91

6 TALKSHOW NA ERA DA TV DIGITAL, 99

6.1 A transição do analógico para o digital, 99

6.2 Mudanças no conteúdo programático, 101

6.3 TV digital e talkshow: exemplos práticos, 104

2

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS, 115

REFERÊNCIAS, 120

GLOSSÁRIO, 134

3

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

ATSC: Advanced Television Systems Committee (Comitê de Sistemas Avançados de Televisão)

ATV: Advanced Television (Televisão Avançada) Bits: Binary Digit (Dígito Binário) CCD: Charge Coupled Device (Dispositivo de Carga Acoplada) CRT: Cathode Ray Tube (Tubo de Raios Catódicos) DLP: Digital Ligthting Processing (Processamento de Luz Digital) DVB: Digital Video Broadcasting (Radiodifusão de Vídeo Digital) DVR: Digital Video Recorder (Gravador de Vídeo Digital) EPG: Electronic Program Guide (Guias de Programação Eletrônica) FCC: Federal Communications Commission (Comissão Federal de Comunicações) HDTV: High Definition Television (Televisão de Alta Definição) IPTV: Internet Protocol Television (TV via Protocolo de Internet) ISDB: Integrated Services of Digital Broadcasting (Serviços Integrados de Radiodifusão

Digital) MPEG: Moving Pictures Experts Group – Formato Digital para Vídeo, com compressão LCD: Liquid Crystal Display (Tela de Cristal Líquido) PIP: Picture in Picture (Imagem sobre Imagem) PLC: Power Line Communications (Comunicação por Rede Elétrica) PVR: Personal Video Recorder (Gravador de Vídeo Pessoal) SBTVD: Sistema Brasileiro de Televisão Digital SDTV: Standard Definition Television (Televisão de Definição Padrão) TVDI: TV Digital Interativa VCR: Video Cassete Recorder (Gravador de Vídeo Cassete) VOD: Video On Demand (Video Sob demanda)

4

LISTA DE QUADROS E ILUSTRAÇÕES

Quadro 1 – Conceitos utilizados para definir o indivíduo que se relaciona com a TV, 97 Quadro 2 – Comparativo entre TV tradicional e TVi, 103

Figura 1 – Diagrama representativo de conceitos elaborados por Vilém Flusser, 82 Figura 2 – Interface programada para acesso a serviços oferecidos pelo governo, 106 Figura 3 – Propagandas interativas (Adidas, Sony Ericsson, Coca Cola Zero e Gillette), 107 Figura 4 – t-commerce (Domino’s Pizza), 107 Figura 5 – Campeonato Europeu (TV3, Catalunha), 109 Figura 6 – Deal or no deal (NBC Universal, EUA), 110 Figura 7 – The Wall (Canal 69, Grécia), 110 Figura 8 – Imagens do DVR TiVo, 111 Figura 9 – Hell’s kitchen (Sky Inglaterra), 112 Figura 10 – Canal Disney (Sky Inglaterra), 113 Figura 11 – Test the Nation (BBC, Londres), 113 Figura 12 – Live greetings, 114

5

1 INTRODUÇÃO

A segunda “revolução” televisiva1 está acontecendo agora. Não é um fato a ser

ignorado a digitalização de todos os meios de comunicação, ainda mais para os pesquisadores

da área televisiva, pois o auge desta mudança, principalmente no Brasil, ocorre neste exato

momento.

A digitalização significa uma “revolução” estrutural e “estruturante” e não deve ser

vista isoladamente (nem mesmo no caso da TV digital) como a evolução de um meio de

comunicação, mas como a mudança do processo comunicacional como um todo e de todas as

suas possibilidades.

As transformações não somente abrangem o campo audiovisual, que englobam a

melhor recepção e qualidade de sinal de áudio e vídeo; um dos principais destaques é a

mudança da narrativa, que tem a oportunidade de ser hipertextual e interativa, com a

capacidade tecnológica ampliada, alterando a via de mão única da emissão televisiva, ao

tornar bidirecional a comunicação com os telespectadores.

A partir do momento que um esquema de comunicação tem parte de sua estrutura

modificada, não se desfigura somente um item, mas todo o ecossistema é reformulado. Por

exemplo, quando é alterado o conteúdo da programação da televisão, é transformado também

o próprio receptor que se vê representado na TV. E a mudança no olhar do espectador

significa novos sentidos para a emissão, o que reestrutura as premissas e os objetivos da

transmissão. A estrutura mais interativa insere esse telespectador no ambiente de produção de

conteúdo, mudando totalmente a lógica tradicional analógica. A bidirecionalidade dita as

regras deste novo universo, colocando o “televivente”2 em destaque com o controle do seu

reinado da sala de estar – e não necessariamente continuará a poltrona sendo sua cadeira real,

já que entra no circuito a questão da portabilidade, uma das ferramentas possíveis de serem

implantadas pela tecnologia existente.

O emissor não tem mais as mesmas obrigações, a produção não elabora os programas

da mesma forma e nem a grade horária é feita da mesma maneira. A leitura não é mais linear,

o entendimento geral das atrações é diferente, assim como as mediações, a recepção e o

próprio telespectador.

1 A primeira revolução foi aqui considerada como a mudança da televisão de imagens em preto e branco para colorida. 2 Aquele que vive a telecomunicação complexa tentando incorporar sua plenitude. Este conceito será exposto de forma mais detalhada no decorrer da dissertação, no capítulo referente ao receptor.

6

Para exemplificar melhor todas as possibilidades da TV digital, principalmente no que

diz respeito ao SBTVD (Sistema Brasileiro de Televisão Digital), esta dissertação recorreu a

um gênero televisivo mundialmente presente na grade de programação das emissoras: o

talkshow 3 – um estudo de caso complementar a esta pesquisa sobre a TV digital.

Embora o foco dos investimentos4 das emissoras em interatividade não seja, neste

momento, o talkshow – e sim as novelas, séries e ficções em geral, assim como jogos

esportivos, que garantem elevadas audiências aos canais –, foi escolhido este gênero por bem

representar um clássico existente desde o início da TV e que tem audiência garantida na grade

de programação.

O talkshow integra num mesmo programa a participação da plateia, o entretenimento,

a informação, a entrevista, o show e, inclusive, o humor – artifício que não tira a credibilidade

do programa televisivo, nem do apresentador. É preciso reconhecer que formatos e padrões de

linguagem parecidos surgiram e tomaram grandes proporções, paralelamente, em diferentes

países, com conteúdos e olhar eletrônico peculiares a cada cultura. A convergência entre as

diversas soluções locais em um mesmo modelo, por assim dizer, “universal”, só se tornaria

possível à medida que a evolução dos meios de transmissão (especialmente a difusão por

satélites) possibilitou tratar a programação televisiva como uma commodity negociável em

âmbito global.

Antes disso, em quase todos os países, programas de entrevistas ocupavam lugares

privilegiados na programação; ter “apresentadores-estrela” com crédito e prestígio popular

próprios e insubstituíveis sempre foi um pré-requisito para que o exercício da opinião não

comprometesse as emissoras, garantindo uma situação favorável e confortável (além de serem

um chamariz a mais para a audiência). Essas são características peculiares ao tradicional

gênero talkshow, que podem ser vistas na televisão analógica. É preciso ter em mente, porém,

3 Desde 2005, o gênero tem sido objeto de estudo da autora, que apresenta interesse particular no tema. Seu Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado na Faculdade de Jornalismo, do Departamento de Comunicação e Filosofia (Comfil) da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), resultou em um documentário intitulado “Talkshow!”, que tinha como objetivo delimitar o universo do gênero, definir as principais características dos programas e dos apresentadores nacionais, pesquisar e descobrir qual a trajetória dos talkshows até a atualidade. Além de definir o que é e o que não é talkshow, a autora encontrou as origens do programa televisivo no rádio e apontou o programa “Bate Papo com Silveira Sampaio” como o precursor do formato na televisão brasileira. 4 As emissoras brasileiras têm concentrado seus esforços na oferta de serviços possíveis com a TV digital (como interatividade – principalmente local –, mobilidade e alta resolução) em um evento esportivo de grande visibilidade, que voltará as atenções de todos os países para o Brasil e que será muito assistido pelos brasileiros, notoriamente apaixonados pelo esporte: a Copa do Mundo de futebol, que acontecerá no país no ano de 2014 (a próxima acontecerá em 2010, na África do Sul). Televisões que projetam imagens em três dimensões, conteúdo televisivo para aparelhos mobiles, t-commerce (comércio via televisão), interfaces amigáveis com informações sobre jogadores, escalações e tabela de jogos são algumas das experiências audiovisuais interativas que as emissoras têm estudado para lançarem mais fortemente na ocasião da Copa de 2014.

7

como se dá o funcionamento do programa para exemplificar a influência que a digitalização

pode ter, em todos os seus aspectos, dentro do sistema televisivo de comunicação e tudo o que

ele envolve.

Fazer uso de um gênero internacionalmente reconhecido justifica a escolha do mesmo

para exemplificar mudanças previstas e possíveis na TV digital. Esta aplicação toma a parte

pelo todo, no sentido de que analisar um gênero de programa pode auxiliar no estudo da TV

digital como um todo, com a complexidade dos seus formatos e modelos.

Com base nesse histórico, pretendeu-se responder nesta dissertação à seguinte questão:

quais mudanças poderá acarretar o formato tecnológico que estrutura a TV digital no

conteúdo dos programas, mais especificamente no talkshow e, consequentemente, na relação

com o telespectador?

As hipóteses para a questão levantada, pertinente à época de digitalização dos meios

de comunicação no mundo, indicam que a estrutura tecnológica da TV digital – que permite

alta resolução, portabilidade, multiprogramação e interatividade (possibilitadas pela instalação

de um middleware – software instalado no Set-top Box – adaptado para um canal de retorno

do público para a emissora) – inaugura uma revolução de conteúdo televisivo e recria, por

consequência, o telespectador, que não pode mais ser chamado da mesma maneira, já que

influencia, interage e participa da produção midiática. A interatividade é um dos aspectos

mais relevantes, por ser responsável justamente pela bidirecionalidade, fator principal na

mudança da relação com o público.

Esta é uma pesquisa interdisciplinar por transitar por várias áreas do conhecimento que

se encontram intrínsecas ao tema escolhido: comunicação (conteúdo do meio televisivo,

aspectos da percepção e recepção dos programas) e tecnologias (estrutura da TV digital, Set-

top Box etc.). É uma pesquisa básica e pura, pois está fundamentada no estudo das

possibilidades do que a estrutura tecnológica, que permite a interatividade, mediada por

tecnologias, pode proporcionar aos espectadores da TV digital e, no caso, dos programas

talkshow, também, por tentar compreender o modo como o receptor ativo pode assistir à TV.

O processo de estudo deste trabalho foi estrutural pela análise da forma, do

funcionamento da TV digital e de seus elementos tecnológicos, além das características que

compõe um talkshow na TV analógica, para assim ser possível tratar do assunto mais

amplamente, na área digital, na tentativa de responder o problema central, e contribuir para o

panorama geral brasileiro da TV digital.

Foram usados instrumentos de observação indireta, bibliográfica e documental. Os

assuntos que nortearam, em linhas gerais, toda a pesquisa foram: tecnologia, TV digital,

8

interatividade, programação de TV e talkshow. Trata-se da construção de uma pesquisa

monográfica e de profundidade, que buscou dados primários e secundários e examinou o

maior número possível de variáveis que interferem no problema específico.

Naquilo que foi possível levantar nesta pesquisa, o Brasil não conta com estudos ou

propostas de pesquisa científica específicos sobre o gênero talkshow – somente na França foi

encontrada uma referência bibliográfica de um livro exclusivo sobre o gênero no contexto do

sistema televisivo europeu, que difere um pouco do nacional e do americano em geral.

Contudo, há uma série de autores que escreveram sobre a história da televisão e/ou a

criticaram sob diferentes pontos de vista, como Maria Celeste Mira, que, ao estudar a história

do SBT, dá dicas da formação histórica de certos programas. Também profissionais que

caracterizam tecnicamente programas e gêneros auxiliaram na produção desta dissertação,

como Ivor Yorke, Jean-Jacques Jespers, José Carlos Aronchi de Souza e Elizabeth Bastos

Duarte. Trabalhar com esse material foi uma porta de entrada crucial para compreender

melhor o gênero-fenômeno proposto como objeto de estudo coadjuvante, sob a TV digital.

George Gilder, Valdecir Becker, Renato Cruz, Valéria Cruz Brittos e César Ricardo

Siqueira Bolaño são alguns dos nomes que se propuseram a estudar o novo meio e que

também serviram de referência para este trabalho. Porém, para exemplificar a implantação da

TV digital, não é possível usar exemplos nacionais, já que no Brasil ela acaba de ser adotada –

embora pesquisadores nacionais já apontem certas tendências. Portanto, foram usados

exemplos de programas transmitidos em outros países que possuem a nova tecnologia

efetivamente aplicada há mais tempo. Uma das pesquisadoras dessa área na Europa, por

exemplo, é a portuguesa Célia Quico.

Outros estudiosos trabalham a questão da transferência de tecnologia e mudanças de

comportamento da sociedade no mundo digitalizado, tais como Dominique Wolton, Nicholas

Negroponte, George Gilder, Lorenzo Vilches e Michael Dertouzos. Existem referenciais nas

áreas relacionadas com as tecnologias digitais e as novas tecnologias de comunicação; alguns

trabalhos foram utilizados como linhas-guias para análise e elaboração de um argumento

sustentável, como os de André Barbosa Filho, Cosette Castro, Takashi Tome, Joseph

Straubhaar e Robert Larose.

Também foram utilizados os pensamentos de autores que podem auxiliar tanto na

questão da interatividade quanto na criação de possibilidades do mundo televisivo sob um

novo olhar eletrônico, agora digital: André Lemos, Marcos Silva, Suely Fragoso e Alex

Primo. Já as possibilidades de interação que a TV digital permite, e que passam por questões

de “navegabilidade” do televisor (ou seja, interfaces e designs que deem acesso à nova leitura

9

hipertextual e hipermidiática do conteúdo) foram tópicos iluminados sob as óticas dos autores

Viscente Gosciola, Lúcia Leão e Pollyana Ferrari.

Todos esses aspectos reunidos, que mudam e reestruturam tanto o veículo de

comunicação quanto o que é transmitido, só poderiam resultar em uma mudança também por

parte do receptor, assunto aqui abordado com o apoio das observações de Jesús Martín-

Barbero, Guillermo Orozco Gómez e Artur Matuck.

Esta dissertação foi dividida de modo a contribuir com o processo de entendimento

geral da questão, com temas ordenados para facilitar a leitura. O próximo capítulo introduz o

universo em que se insere o gênero talkshow, descreve suas principais características

apresentadas na TV analógica e delimita seu formato dentro do conjunto de gêneros da

televisão brasileira. A seguir, no terceiro capítulo, é dado início ao tema da TV digital, de

forma a explicar o conjunto de revoluções proporcionadas pela digitalização (que englobam

as chamadas novas tecnologias da comunicação, universo em que se insere o objeto de

estudo); também são apresentadas as suas potencialidades e as principais mudanças que ela

pode vir a acarretar, inserindo-a no contexto audiovisual brasileiro. Detalhando estas

mudanças, surge o capítulo quatro, que trata das novas interfaces, narrativas e da

interatividade. O quinto apresenta o conceito de “televivente”, atrelado às mudanças relativas

à recepção e percepção cognitiva do conteúdo. Finalmente, no capítulo seis o talkshow volta à

cena para, enfim, exemplificar efetivamente as mudanças possíveis apontadas anteriormente e

embasadas em elementos interativos que tem sido utilizados em outros programas e,

principalmente, em outros países que estão mais avançados com a normatização e

implementação da TV digital.

Cabe ressaltar que esta dissertação teve como foco analisar as possibilidades, e não o

que necessariamente poderá vir a acontecer com a programação – foi avaliado o avanço

internacional da TV digital, entretanto deve-se levar em consideração a cultura de cada país e

também o fato de que, no Brasil, o sistema foi implantado em dezembro de 2007. Com

relação à TV digital no Brasil, o que virá a ser efetivamente implantado é uma questão que

somente terá respostas precisas em um futuro indefinido. Portanto, afirmar qualquer direção

como caminho certo da evolução televisiva – ainda mais devido à velocidade de

aprimoramento da engenharia computacional e da digitalização do nosso universo concreto –

seria um exercício de aposta em técnicas ou tecnologias que podem vir a ser ultrapassadas em

menos de meia década.

10

2 TALKSHOW

Este capítulo trata do gênero que serve de exemplo metonímico para as mudanças

acarretadas pela digitalização da TV. O talkshow é um exemplar objeto de estudo por

representar um dos gêneros de programa mais tradicionais da grade de emissoras do Brasil e

do mundo. Para sua contextualização e descrição específica de seu formato, o capítulo

descreve as principais características, apresentadas já na TV analógica; localiza e delimita seu

formato dentro do conjunto de gêneros da televisão brasileira e aponta algumas questões-

chave, como funcionamento, dinâmica, audiência, credibilidade e popularidade dos

entrevistadores para evidenciar sua importância para o cenário televisivo brasileiro. Tratam-se

de fatores preparatórios para uma análise mais eficiente do gênero e para identificação de

itens que podem ser melhor resolvidos nesta nova etapa digital – que vem a solucionar,

potencialmente, a ânsia do espectador por participar da programação.

2.1 Gêneros e formatos da televisão brasileira

Com base nas principais características de cada programa televisivo, assim como

acontece com os demais meios de comunicação (os jornais e as revistas são divididos em

editorias, e o rádio também é rotulado por formatos), a televisão tem sua programação

classificada em conjuntos estereotipados de programas, estabelecidos por meio da

identificação de aspectos comuns aos mesmos.

Embora as emissoras visem sempre a audiência, dependendo do dia da semana, do

horário ou da cidade, por exemplo, a programação transmitida adquire certas características

que, em sua maioria, apresentam e definem um formato semelhante. Isso torna os programas

veiculados similares, colocando-os em grupos de formatos cujo aspecto principal de cada

componente é o mesmo. Cada grupo recebe um nome de identificação, um gênero.

Por gênero televisivo, compreende-se uma macro-articulação de categorias semânticas capazes de abrigar um conjunto amplo de produtos televisuais que partilham umas poucas categorias comuns. Os gêneros seriam modelizações [sic] virtuais, modelos de expectativa, constituindo-se em uma primeira mediação entre produção e recepção; referem-se ao tipo de realidade que um produto televisual constrói, ao tipo e forma de real a que está ligado e ao regime de crença que propõe ao telespectador. [...] A noção de gênero e televisão não passaria de

11

uma abstração; seria da ordem da virtualidade (DUARTE e CASTRO, 2007, p. 15).

Ao longo do tempo, diferentes pesquisadores procuraram definir o que vem a ser um

gênero televisivo. Seria demais para os fins desta dissertação listar todos os conceitos, mas é

necessário expor alguns dos estudiosos que contribuíram para a definição aqui tomada.

José Aronchi de Souza, que na década de 90 dedicou-se ao estudo dos gêneros

televisivos (tendo como resultado a definição de 37 gêneros, cada qual composto de 31

formatos5 diferentes), bem exemplifica o esquema no qual se insere esta classificação. “Assim

como na biologia existem gêneros e espécies, em televisão coexistem gêneros e os formatos

[...]. Em televisão, vários formatos constituem um gênero de programa, e os gêneros

agrupados formam uma categoria” (SOUZA, 2004, p. 45). O autor divide e estabelece cinco

grandes categorias: entretenimento (maior parte da programação, segundo ele), informação,

educação, publicidade e outros.

Maria Alaíde Matcher ressalta a consideração de Silvia Borelli (MATCHER, 2001),

que deriva a definição dos gêneros com base em seus respectivos elos que reúnem o espaço da

produção, os anseios dos produtores e os desejos do público receptor. Além disso, acredita

que nenhum conceito deve ser tomado como final, pois nenhum gênero está fechado em si

mesmo (em sua opinião, eles são híbridos).

Para LeBlanc, autor do texto “La typologie des genres”6, citado por Marco Loureiro

(LOUREIRO, 2001), a classificação por gêneros permite identificar um programa e dar-lhe

um lugar na grade horária das emissoras, antecipar a reação dos telespectadores e facilitar a

venda de públicos aos publicitários. Nesta pesquisa estudou-se o talkshow, um gênero de

sucesso internacional, presente nas grades de emissoras de todo o mundo. Laurindo Lalo Leal

Filho, reconhecido pesquisador da área de televisão, explica que “quando uma emissora

comercial encontra uma fórmula de sucesso, com grande audiência, logo é copiada pelas

concorrentes, tirando do telespectador qualquer tipo de escolha” (LEAL FILHO, 2006, p. 17).

Quanto ao assunto, o autor francês Jean-Jacques Jespers diz que:

5 Para Souza, “formato é a linguagem desenvolvida pela televisão para dar forma a um gênero de programa de televisão e transmiti-lo” (SOUZA, 2004, p. 183), ou seja, formato é o elemento fundamental para a classificação do gênero. Marie-France Chambat Houillon lembra que a noção de formato não é específica do mundo da produção televisual. “Ela atravessa outros campos de aplicação, como o da informática e o da computação, bem como atualiza o debate em torno do que é conveniente chamar de a interoperabilidade, levantada pela questão da acessibilidade dos arquivos no domínio da informática e da eletrônica” (CHAMBAT-HOUILLON, Marie-France. O formato televisual: produção, programação e recepção. In: DUARTE, Elizabeth Bastos e CASTRO, Maria Lilia Dias de. Comunicação Audiovisual – gêneros e formatos. Porto Alegre: Sulina, 2007, p. 142). 6 Parte integrante do livro Les genres télévisuels dans l’enseignement, publicado em Paris no ano de 1996.

12

O alargamento do público-alvo não se pode fazer senão à custa de uma homogeneização crescente das produções transmitidas, da procura constante do maior denominador comum. Donde, a perda de originalidade das produções televisivas e da standartização das programações (os mesmos tipos de emissão por todo o lado) e das formas (os mesmos gêneros de programas de variedade por toda a parte) (JESPERS, 1998, p. 78).

Diferente de Souza, para o pesquisador Venício Lima, a programação das emissoras

televisivas é divida em quatro categorias maiores e mais abrangentes, que incorporam seus

respectivos gêneros, desta forma: entretenimento (engloba telenovelas, séries, filmes, shows e

esportes); publicidade; telejornalismo e pseudojornalismo (compreende os talkshows, as

entrevistas e variedades). “Valho-me aqui da terminologia empregada por Paletz e Lipinski,

que chamam de pseudonews todo o conteúdo da mídia que fica em 'algum lugar entre o

entretenimento e as notícias'” (LIMA, 2001, p. 203).

Elizabeth Bastos Duarte, que estuda os gêneros e formatos da televisão brasileira,

fazendo referência à obra de Umberto Eco, aponta em seu artigo apresentado para o Núcleo

de Semiótica da Comunicação, do XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação,

uma divisão clássica dos períodos televisivos baseada no tipo de programação

majoritariamente veiculada. Nos anos 70/80, na época da – assim chamada por Eco –

arquitelevisão, a preocupação era mais técnica, funcionalista; por isso, a ênfase era no cenário,

maquiagem, perfeição dos efeitos especiais, etc, o que destacava a produção ficcional e, em

geral, distante das situações vividas pelo homem comum. Já a neo-televisão, dos anos 80/90,

dava ênfase para a performance, privilegiando programas de auditório, magazines, talkshows

que, segundo a autora, acolhem e apresentam o cidadão comum sob o comando de um

apresentador com atributos altamente performáticos. Diferente de Lima, ela coloca o talkshow

em uma categoria informativa:

Como já se referiu, ao se examinar a grade de programação das emissoras de televisão, constata-se que grande parte dos programas são classificados como informativos: - documentários, reportagens, telejornais, entrevistas, talk-shows, programas de auditório, magazines e, hoje, reality-shows – remetendo a essa vertente factual ou de ‘verdade’ e ‘realidade’ que vem ganhando cada vez mais espaço na constituição da programação televisiva (DUARTE, 2003).

Os critérios de classificação variam e, segundo LeBlanc, essa divergência explica-se

de acordo com o tipo de referencial adotado, por vezes o conteúdo, outras o modo de

produção ou mesmo o público-alvo (por exemplo: informativos, reality shows e para jovens,

respectivamente). Essa opinião é compartilhada por outro pesquisador, Jesús Martín-Barbero,

13

que inclui às classificações os anseios dos produtores culturais e os desejos do público

receptor.

Para LeBlanc, as várias definições são resultado das origens dos programas, na maior

parte dos casos já existentes em outros meios de comunicação, o que confunde uma

tipificação reta e direta dos produtos televisivos: “do cinema (os gêneros cinematográficos),

da rádio (telenovelas e outros produtos destinados às donas de casa, sit coms, concursos, talk-

shows), ou da imprensa escrita (folhetins ou rubricas do TJ)” (LEBLANC, 1996 apud

LOUREIRO, 2001).

Após pontuar estas diferenças, podemos perceber que a televisão, como um todo,

apresenta segmentações divergentes, mas com bastantes pontos em comum. Em toda a sua

grade podemos perceber a ideia de presentificação, por exemplo. É nela que a TV baseia sua

legitimidade, criando a ilusão de que o telespectador está em contato com a realidade,

impondo uma credibilidade que se acentua quando da transmissão ao vivo. Segundo Patrick

Charaudeau e Rodolphe Ghiglione, autores do livro francês “A palavra confiscada – um

gênero televisivo: o talk show”,

[...] poderemos dizer que a televisão constrói as suas emissões fazendo apelo, de modo variado segundo os gêneros, a estas diferentes funções da imagem, se bem que possamos constatar uma predominância da “presentificação”, em particular nos talk shows (CHARAUDEAU e GHIGLIONE, 1997, p. 52).

Para Jean-Jacques Jespers, a credibilidade da informação audiovisual passou por três

fases pontuais (e tem seu ápice, da mesma maneira, na transmissão em tempo real):

1. Na época das actualidades filmadas (anos 1930-1970) é o comentário off – assegurado por uma voz anônima, com uma dicção impecável, falando no escuro e no silêncio da sala (‘a voz de Deus’) que assegurava a credibilidade da informação, porque este comentário encarnava totalmente a informação. 2. Nos anos 1970-1980, é o apresentador que assumia a fiabilidade da informação, graças à relação de confiança que se estabelecia entre o telespectador e esta pessoa célebre, mesmo prestigiada que lhe falava olhos nos olhos e não lhe podia nunca mentir. 3. Hoje, o apresentador não é mais que o agulheiro de um grande centro de triagem onde convergem as correspondências, os “directos”, as reportagens e é a máquina informativa em “tempo real” que supostamente deve assumir a credibilidade de informação (JESPERS, 1998, pp. 88 e 89).

Além da presentificação – efeito perseguido por toda produção televisiva –, o cenário

do gênero talkshow também é permeado por uma atmosfera de debate. O debate difere da

conversação, mas ambos dividem o mesmo palco. É a troca e a confrontação de opiniões,

14

organizada e dirigida por um animador ou entrevistador, feita com o objetivo de reconstruir

um espaço público mais democrático ou mesmo oferecer a oportunidade de todos os atores

sociais se exporem. Percebe-se que debate e conversação partem de um mesmo ambiente de

exposição de ideias, e esta origem comum foi descrita por Charaudeau e Ghiglione:

A história do debate televisivo, desde a sua origem (nos anos 60) [...] se seguirmos as conclusões de Noel Nel, existiram quatro grandes períodos: o período do nascimento do gênero (1960 - 68), o período das grandes controvérsias – essencialmente políticas – (1968 - 74), o período dos assuntos culturais ou ditos de sociedade (1974 - 81) e, enfim, o período do espectacular (1981 - 86) (CHARAUDEAU e GHIGLIONE, 1997. p. 53).

Para os autores, o debate corresponde a uma encenação da palavra apropriada para um

tratamento relativamente racional da “descoberta da verdade”. Como se o debate

proporcionasse uma impressão forjada que seria a da construção de uma ideia em conjunto. O

roteiro do programa, pré-estabelecido pela equipe de produção e estudado para cumprir certas

funções, consiste realmente em transmitir esta impressão de descoberta de uma “verdade”

implícita nas entrelinhas do programa de forma imperceptível, pois, na realidade, todo o

programa foi desenhado voltado para uma única conclusão. Ou seja, o roteiro tendencioso

aponta para um conceito que poderá ser tomado pelo telespectador como uma verdade que ele

mesmo descobriu, fazendo ligações de pensamentos induzidos entre os argumentos expostos,

colocados de forma a parecerem completos.

Por esse motivo, os autores diferenciam o debate do talkshow, que seria, para eles:

[...] uma forma de diálogo organizada de maneira a fazer surgir conflito e/ou drama humano, sob diversas configurações, a propósito de um tema pretexto, através de um confronto de juízos ou de opiniões “rectas”, por intermédio de um dispositivo televisivo que se compraz na exposição destes conflitos ou nas sugestões do drama. Pode-se dizer que o talk show corresponde a um espectáculo da palavra adequado para um tratamento sensível, emocional, destas duas formas de desordem humana que são os conflitos entre indivíduos e os dramas íntimos da pessoa, tudo isso ao serviço da “revelação dos seres” [...] O talk show define-se portanto como um paradoxo; ele é dado, apresentado, justificado, legitimado como estando inscrito num confronto de interacção com o telespectador, enquanto a este a palavra é-lhe confiscada. (Ibid., pp. 97 e 106).

Como estes são pesquisadores mais centrados no sistema europeu de televisão

(segundo eles inserido no contexto de uma crise geral da democracia – função que tenta ser

suprida pelos media), que difere em alguns aspectos dos sistemas norte-americano e

15

brasileiro, eles apontam que a existência dos talkshows revela-se como uma realização da

democracia direta ou do seu mito (Ibid., pp. 148 e 149).

Contudo, o que os autores tomam por talkshow não se encaixa exatamente na

definição aqui proposta. Eles incluem no mesmo conjunto de programas os debates

televisivos no estilo “mesa redonda” (programas de auditório baseados em conflitos

familiares) e os talkshows – conforme definidos a seguir (vide item 2.2) –, como se todo o

relacionamento proposto e executado nesses programas, por meio de entrevistas, fosse

basicamente o mesmo.

Patrick Charaudeau e Rodolphe Ghiglione apontam que a temática dos talkshows mais

voltados para atuação do tipo debate gira em torno destes assuntos: atualidade política, vida

dos artistas, cultura, sociedade e ciência (Ibid., pp. 57 e 58). Toda equipe do programa

seleciona os entrevistados, geralmente políticos, especialistas e cidadãos comuns, envolvidos

ou não no assunto em questão. Os apresentadores exerceriam papel de ampulheta (calculando

o tempo destinado às entrevistas), coordenador (no caso de debates), entrevistador,

provocador, professor (no caso de não deixar serem transmitidas informações errôneas) e

mesmo de pacificador.

Segundo José Aronchi Souza, a televisão assumiu papel relevante não somente no

Brasil, sendo também considerada a fonte mais popular de entretenimento nos Estados

Unidos, país que mais produz e comercializa programas no mundo (SOUZA, 2004, p. 24). O

item a seguir define o que é o gênero talkshow, baseado em suas características gerais

presentes em todo o mundo e, principalmente, nas que assistimos nos talkshows nacionais.

2.2 O que é talkshow?

O gênero televisivo talkshow reúne interessantes aspectos pertinentes ao campo da

comunicação e jornalismo, como as técnicas de entrevista aplicadas, o poder de persuasão do

apresentador, o sistema audiovisual, o funcionamento dos programas e outras características

que garantem o sucesso internacional do gênero. Entretanto, no Brasil são raros os artigos

científicos que tratam dessas questões; dentre os programas de mestrado e doutorado

reconhecidos pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC), não constam pesquisas sobre

talkshow. Segundo Laurindo Lalo Leal Filho, a universidade levou muito tempo para perceber

que a TV era um fenômeno social importante (LEAL FILHO, 2006, p. 30).

16

Autores da área escrevem o nome do gênero de maneiras diferentes, mas, nesta

dissertação, a preferência por utilizar a grafia com letra minúscula e sem separação entre as

palavras advindas do idioma inglês “talk” e “show” vem ao encontro do que é referenciado

pelos dicionários contemporâneos, como o Houaiss7.

No início da implantação da TV, nos Estados Unidos, a programação era semelhante à

do rádio (SQUIRRA, 1995, p. 26). Assim como outros programas, o talkshow é um gênero

que teve sua origem neste meio de comunicação e, após o surgimento da televisão, foi

transposto para as telas – que apresentavam, em geral, um programa de rádio com imagens –

embora as apresentações tomassem por base a linguagem cinematográfica, que ainda era

referencial nas décadas de 50 e 60. O próprio meio – e todos os envolvidos, bem como a

produção e a audiência – demorou para encontrar seu papel e função real no “novo” sistema

comunicacional.

O modo de produção dos programas brasileiros foi, também, influenciado pelos

Estados Unidos8.

Embora o formato permita variações, a cópia tem sido o elemento mais encontrado nos programas brasileiros. O programa de Jô Soares traz o mesmo tipo de cenário do programa americano Late Show, apresentado por David Letterman nos Estados Unidos – tem até uma caneca. [...] Jô Soares reiniciou a fórmula – também utilizada por Silveira Sampaio na década de 60 e Ferreira Neto no fim dos anos 70 (SOUZA, 2004, p. 137).

A hegemonia das produções exportadas pelos norte-americanos para o Brasil é algo

que se estendeu para além do período de implantação da TV no país. E creio que este cenário

de importação de modelos pode ter influenciado o pouco aproveitamento das produtoras

nacionais independentes – mas esta é uma outra questão não pertinente ao objeto de estudo

desta dissertação.

A base do conteúdo da TV latino-americana tem raiz norte-americana – isto inclui a

maneira de apresentação e formato dos talkshows nacionais, logicamente pautados no que

seria uma adaptação do gênero, delineado por uma mistura de estilos jornalísticos e artísticos,

com peculiaridades da cultura brasileira.

Ao redor do globo, as emissoras de cada cidade, estado ou país apresentam seus

talkshows com peculiaridades regionais. Entretanto, o gênero como um todo possui 7 Na edição de 2003 do dicionário Houaiss, a palavra “talkshow” é definida como programa de entrevistas com um animador e seus convidados, enquanto a palavra “entrevista” é tida como um encontro combinado, uma conversa para se obter informações de alguém sobre alguma coisa ou até mesmo uma matéria jornalística obtida por diálogo entre o repórter e o entrevistado. 8 A própria denominação talkshow advém do vocabulário inglês norte-americano.

17

características que se repetem em todos os programas do mundo, pontos em comum que dão

forma ao que chamamos de talkshow.

Devido à proximidade entre os países – além de levar em conta a “colonização cultural

televisiva”9 –, o jeito brasileiro de administrar e conduzir seus talkshows se assemelha ao

norte-americano. Neste continente, em particular, os programas estão alinhados entre si de

maneira mais similar do que se comparados aos formatos europeus ou orientais de se fazer

televisão.

Poderíamos dizer com Chacrinha que “em televisão nada se cria, tudo se copia”. Mas a frase, embora genial, tem um defeito: encerra a questão depressa demais. E fácil demais. Se fosse só isso, estaríamos autorizados a pensar nesse tipo de produção como uma espécie de narrativa mítica ou circular, numa mera repetição que se processa a margem da história. Penso que, ao contrário do que parece, essas idas e vindas pelas quais os programas de televisão costumam passar podem dizer alguma coisa (MIRA, p. 108).

A industrialização dos programas de televisão ao redor do mundo permite, além da

otimização de recursos humanos e técnicos, a diminuição dos custos de produção, gerando

maior margem de lucro. “A regravação dos gêneros tradicionais (e a criação eventual de

novos gêneros) está associada a um fator muito mais importante, que afeta a estrutura básica e

a formatação dos programas: o econômico”, confirma José Aronchi de Souza (2004, p. 51).

Em todo o mundo, para se fazer um talkshow você não precisa de nada mais do que

um estúdio, um cenário, um entrevistador e um entrevistado. Em termos puramente

televisuais, os talkshows ao vivo são programas simples e sem muita sofisticação. O cenário

geralmente consiste numa cadeira para o entrevistador e sofás ou poltronas para os

convidados (YORKE, 1998, p. 161).

Como bem afirma Gregório Bacic, diretor do talkshow brasileiro “Provocações” (TV

Cultura), conversar com uma pessoa não tem nada de novo. “A coisa mais barata que existe é

um programa de entrevistas. Você coloca um carinha no estúdio e não te custa nada. Mas o

que importa num programa destes é o conteúdo10”, diz. Nestes moldes, o apresentador do

extinto “Saca Rolha” (PlayTV), Marcelo Tas, acredita que o anfitrião tem de ter ousadia, além

de mostrar coisas interessantes para segurar a atenção do telespectador. “Um talkshow bom é

onde você ouve uma boa história”11, explica.

9 No Brasil, por exemplo, a implantação da TV deu-se por meio da importação do modelo televisivo dos Estados Unidos. 10 Em entrevista concedida ao documentário “Talkshow!”, em 2005. Vide referências. 11 Idem.

18

A maioria dos programas tem apenas um entrevistador e todo o foco do talkshow é

voltado para a entrevista. Geralmente, o programa é gravado e se passa em um estúdio (com

marcações fixas ou não), embora alguns tenham reportagens externas. Grande parte é

transmitida em horário avançado e, para manter o telespectador atento, além de ter bons

convidados, o apresentador tem de saber prender a atenção do seu público – e, para isto,

muitos deles usam de informações privilegiadas, aprofundamento de temas e até toques de

humor. Não é de se estranhar, assim, que muitos dos entrevistadores sejam atores. No Brasil

temos os exemplos de Marcelo Tas (que apresentava o “Saca Rolha”, na PlayTV), Marília

Gabriela (que apresentava o “De Frente com Gabi”, no SBT), Antônio Abujamra

(“Provocações”, na TV Cultura) e Jô Soares (anfitrião do “Programa do Jô”, da Globo).

Tas explica este fato muito bem, inclusive pontuando as vantagens do humorista ao

apresentar um programa televisivo como este. “O talkshow é um programa de palavras. A

câmera não mostra nada de interessante; mostra duas pessoas sentadas. Então é um jogo de

palavras. E o comediante é o cara que não só domina a palavra como domina o tempo

[timing]12”, diz.

2.2.1 História do talkshow no Brasil

Os primeiros talkshows da televisão brasileira foram lançados no início da

implantação da TV no país, dentro dos programas de auditório ou de variedades. Eram

programas longos, em geral popularescos, que possuíam várias atrações divididas em quadros

específicos, tais como show de calouros, musicais, gincanas com artistas ou com o público,

além de entrevistas e reportagens externas sobre curiosidades.

Esse é um gênero enraizado na programação da TV brasileira. Sua origem está ligada aos programas de rádio, cujo formato a televisão assimilou e acabou desenvolvendo fórmulas próprias de sucesso. Os programas de auditório fazem parte da história da televisão brasileira, tendo como apresentadores nomes como Chacrinha, Hebe Camargo e Silvio Santos. Este detém até hoje a liderança do gênero, no programa que leva seu nome, na rede de sua propriedade. Gugu Liberato e Fausto Silva fazem parte da nova geração de apresentadores desse gênero, também classificado em algumas redes como variedades, mas sempre tendo o auditório como atração (SOUZA, 2004, p. 72).

12 Em entrevista concedida ao documentário “Talkshow!”, em 2006. Vide referências: TALKSHOW! Direção e produção: Lina Cláudia Moreira Garrido. Documentário. Entrevistados: Fátima Turci; Gregório Bacic; Marcelo Tas; Max Nunes. São Paulo: 2006. 1 DVD (40 min), son., color.

19

Para José Aronchi Souza, o grande número de quadros apresentados e esta falta de

limite entre o que é e o que não é possível existir em programas deste tipo (como quadros

musicais, entrevistas e jogos) faz dos programas de auditório um gênero que pode ser

confundido com outros. Por isso mesmo, muitas vezes o gênero é chamado de programa de

variedades, por comportar “facilmente vários formatos: há pequenas reportagens, debates,

videoclipes e encenações que dão ritmo à produção”, explica o pesquisador (Ibid., p. 96).

Na década de 60, ameaçadas pela elite detentora dos raros aparelhos de televisão –

tecnologia introduzida no Brasil por Assis Chateaubriand13 em 1950 –, as emissoras viram-se

obrigadas a retirar do ar seus popularescos programas de auditório, por um reclame à

sofisticação da programação. A reclamação era referente ao que era chamado de

“kitschnização” da TV, ou seja, a popularização do conteúdo transmitido pela emissora.14

A problemática do “kitsch” abrange toda a esfera da cultura de massa e é um

fenômeno típico da sociedade industrial. Segundo Maria Celeste Mira, autora do livro “O

circo eletrônico”, ele é ligado “à ascensão da burguesia e das grandes massas urbanas e as

suas ‘pretensões’ no campo do consumo artístico e da diversão” (MIRA, p. 37). Parafraseando

Clement Greenberg, a autora declara:

“Os camponeses que se instalaram nas cidades como proletariado e os pequenos burgueses aprenderam a ler e escrever por amor da eficiência, mas não conquistaram o lazer e o conforto necessários ao gozo da cultura tradicional da cidade. Perdendo, contudo, seu gosto pela cultura folclórica, cujo pano de fundo era o interior, e descobrindo, ao mesmo tempo, uma nova capacidade de tédio, as novas massas urbanas pressionaram a sociedade para que estas lhes fornecessem uma espécie de cultura adequada a seu consumo. A fim de acorrer à demanda do novo mercado, inventou-se uma nova mercadoria: a cultura ‘ersatz’, o ‘kitsch’, destinada aos que, insensíveis aos valores da cultura autêntica, têm, contudo, fome de diversão que só um tipo qualquer de cultura pode proporcionar” (Ibid., p. 37).

Após essa solicitação da elite, os produtores concordaram em promover uma censura

temporária junto aos programas de auditório. Ainda segundo a autora, havia uma convicção

generalizada de que a concorrência desenfreada é que estava gerando o “baixo nível”. As

emissoras, antecipando-se às medidas governamentais, “assinaram um ‘protocolo de

13 Assis Chateaubriand Bandeira de Melo era proprietário da cadeia de veículos de comunicação “Diários Associados” e foi o responsável por trazer a televisão ao Brasil, decisão que tomou após assistir a mesma nos Estados Unidos, em 1948. Chateaubriand treinou e formou profissionais nas emissoras norte-americanas RCA e NBC, nas filiais de Nova York, para lançamento da TV no país em 1950. Para a ocasião, importou 100 aparelhos de TV e distribuiu para anunciantes em potencial e grandes empresários de São Paulo, cidade que recebeu a primeira emissora brasileira (TV Tupi), em setembro de 1950. 14 Na verdade, o conceito é muito mais complexo do que este resumo simplório, indo além das atrações televisivas, tendo origem na desarticulação da cultura tradicional.

20

autocensura’, que visava limitar os abusos ou excessos cometidos na luta pela audiência.

Finalmente, ‘a TV concorda em mudar a imagem’, aplaudiu a crítica” (Ibid., p. 37).

Essa nova estratégia político-econômica se traduziria, no plano cultural e ideológico, num movimento contrário aos programas ‘popularescos’ ou de ‘baixo nível’. O protocolo de autocensura assinado pela Globo e Tupi revela-se numa outra dimensão. Segundo Renato Ortiz, se as emissoras ‘cortam ou redimensionam determinados programas popularescos é porque é necessário garantir o pacto com os militares, que vêem esse tipo de espetáculo como ‘degradante’ para a formação do homem brasileiro definido segundo a ideologia da Segurança Nacional’ (Ibid., p. 45).

Entretanto, devido à lucratividade dos quadros veiculados, os programas de variedades

foram desmembrados, e criaram vida a partir de suas atrações que, então, ganharam um

horário e status de programa: shows de calouros (como “Ídolos”, da TV Record, e “Fama”, da

Rede Globo), relacionamento com artistas (como o metaprograma “Vídeo Show”, da Rede

Globo, e o “TV Fama”, da Rede TV) e, inclusive, quadros de entrevistas (como os talkshows

“Programa do Jô”, da Rede Globo, e “Economia & Negócios”, da Record News). Os

talkshows derivam dessa história, que os coloca dentro de um universo delimitado por linhas

tênues de classificação, paralelas ao universo dos programas de entretenimento.

O registro do primeiro talkshow da televisão brasileira é do “Bate Papo com Silveira

Sampaio”, veiculado pela TV Paulista (canal 5) na década de 60. Começou a ser transmitido

dos estúdios da Avenida da Consolação, em São Paulo, em um espaço térreo e, logo depois,

da Rua das Palmeiras, onde a sede da TV englobava dois ambientes: um com um palco

giratório e o outro com espaço para um pequeno auditório (pertencente à Rádio Nacional), de

onde era transmitido o “Bate Papo com Silveira Sampaio” – programa que nasceu no rádio, na

década de 40, e, depois de passar pela TV Paulista, ainda se prolongou para a TV Record.

O editorial, parte inicial do programa, era uma crítica irônica sobre fatos políticos e econômicos. No decorrer do comentário, um barulho de telefone entrecortava o apresentador, que atendia ao chamado e fingia estar falando com a personalidade comentada ou com um amigo que lhe contava novidades sobre o assunto. Após essa abertura, o apresentador trazia convidados de vários segmentos sociais: políticos, artistas, religiosos, esportistas e outros, para um bate-papo descontraído. Esse tipo de atração teve continuidade na TV através dos programas de Ferreira Neto e de Jô Soares, ambos antigos colaboradores de Silveira Sampaio. Em 1963, o Jô integrava sua equipe, sendo responsável por fazer as entrevistas internacionais (GARRIDO, 2006, p. 11).

Silveira Sampaio foi um dos precursores de uma mudança de condução dos programas

pelos apresentadores que, de “mestres de cerimônia”, passaram a emprestar suas caras aos

periódicos, tornando-se “donos” dos mesmos – representantes da parte pelo todo,

21

caracterizando o estilo dos programas com base em suas opiniões e convicções, e

emprestando a eles sua credibilidade como personalidade do meio artístico/televisivo.

2.2.2 Características do gênero na TV analógica

Talkshow é um formato de programa que pode ser de baixo custo de produção e com

uma tendência a informar mais do que entreter. Entreter é o objetivo principal dos programas

de variedades15, que misturam show, dramaturgia, humor, música, concursos, danças e

gincanas (como o “Domingão do Faustão” e o “Caldeirão do Huck”, da Rede Globo, o “Super

Pop", da Rede TV, e o “Programa da Hebe”, do SBT) e têm a proposta de divertir e informar,

contudo, de maneira menos aprofundada.

Para Souza, os talkshows são programas de entrevistas com um único apresentador,

geralmente carismático e admirado pelo público (SOUZA, 2004, pp. 68 e 69).

Talk show é obviamente uma forma de a televisão transmitir uma conversa e precisa ter dois ingredientes: casualidade e espontaneidade. O talk show combina algumas das principais qualidades de outros gêneros dramáticos de sucesso: intimidade emocional e um pouco de bom humor. [...] Tanto o gênero talk show quanto o gênero entrevista representam o triunfo da personalidade do apresentador, que tem a tarefa de manter o clima do programa em alta, qualquer que seja o assunto ou o entrevistado. Deve contar sempre com uma equipe de produção primorosa, que acompanhe todos os momentos da entrevista e passe para o apresentador as informações e dicas necessárias para manter a conversa interessante (Ibid., pp. 137 e 138).

Para que esta conversa seja interessante e para que o apresentador não perca nenhuma

oportunidade de fazer um comentário inteligente, informativo ou mesmo engraçado, é

utilizado um artifício que eleva a capacidade eloquente do entrevistador. Dicas do que dizer

em momentos específicos do programa são enviadas por meio de um “ponto eletrônico” (em

inglês, talkback), fone de ouvido que permite a comunicação da direção do programa

(presente no estúdio, geralmente na sala de edição) com o apresentador.

Hoje, quase todo apresentador de estúdio possui um pequeno e confortável fone de ouvido pessoal que funciona como um auxiliar de escuta. A outra extremidade se encaixa num cabo constado a uma tomada elétrica atrás da mesa. A princípio, você pode achar impossível usar esse aparelho: é como aquela brincadeira infantil

15 Segundo José Aronchi de Souza, “qualquer que seja a categoria de um programa de televisão, ele deve sempre entreter e pode também informar” (SOUZA, 2004, p. 38).

22

de tentar bater na cabeça e esfregar a barriga ao mesmo tempo. É preciso prática para se concentrar na sua própria fala enquanto as pessoas numa outra sala falam agitadas no seu ouvido, geralmente sobre questões que rigorosamente não lhe dizem respeito (YORKE, 1998, p. 144).

O gênero ainda conta com outras ferramentas implantadas para proporcionar mais

entretenimento, como a apresentação de quadros musicais, humorísticos e shows, contudo,

sem esquecer que o ingrediente principal é a entrevista que se desenrola ao longo do

programa.

Em quase todos os países os programas de entrevistas ocupam um lugar privilegiado na programação. Os apresentadores geralmente têm certo crédito e prestígio popular. E não seria diferente porque para opinar é preciso ter credibilidade suficientemente boa com o público, garantindo uma situação favorável e confortável, além de audiência garantida, independente dos convidados. As pessoas, na maioria das vezes, assistem a esse tipo de programa para ver o entrevistador e não o entrevistado. Sendo assim, a parte show do gênero fica por conta do apresentador famoso que compõe o cenário talk – de conversação (GARRIDO, 2006, p. 24).

O entrevistado é o álibi do apresentador e é sobre ele que o entrevistador constrói suas

conversas, piadas e estratégias de comunicação, promovendo o espetáculo – que não é mérito

apenas do anfitrião, mas dos contrarregras, dos câmeras, da iluminação, da produção, dos que

elaboram o ambiente (cenário, mobília, posicionamento de público) e dos grupos de editores e

redatores que, juntos, vão estipular todos os assuntos que deverão ser tratados durante os

programas. Todos previamente estudados.

Com efeito, em graus diversos e com estratégias diferentes, a palavra do cidadão convidado para um estúdio de televisão é controlada pelo animador. Este utiliza o jogo do questionamento, que encerra o referencial obrigando o entrevistado a inscrever-se no universo das questões que lhe são colocadas, e/ou o jogo das asserções. [...] Ao deixar por isso de ser um jogo que obriga a palavra do outro a infiltrar-se num referencial pré-construído, tanto mais que a possibilidade de questionar pertence, de fato, ao animador. [...] A liberdade de dialogar não se confunde com a necessidade de responder. (CHARAUDEAU e GHIGLIONE, 1997, p. 127).

A plateia é uma relevante parte integrante do cenário televisivo, já que se expressa

naturalmente intervindo por meio de aplausos, reflexões ou mesmo perguntas, influenciando a

percepção geral dos telespectadores. É um artifício muito utilizado pelos produtores, pois cria

um efeito interativo (por exemplo, quando os apresentadores apontam a cabeça para sua

plateia, aguardando uma resposta), do mesmo modo que os olhos do apresentador, focados na

23

câmera, fingindo conversar com os telespectadores, prendem a atenção dos mesmos. Sobre o

eixo do olhar do apresentador e de sua ligação com seu público, Jean Jacques Jespers diz:

É este eixo y-y que é, neste caso, o verdadeiro vector da comunicação, a ‘ligação’ entre o jornalista e o seu espectador. Qualquer interrupção desta ligação y-y constitui uma ruptura da mensagem real e da sua estrutura. Donde a invenção do teleponto16. Esta continuidade da ligação y-y permite uma identificação entre o espectador e o jornalista-apresentador: quando o olhar do jornalista-apresentador abandona o eixo y-y para se virar para um convidado ou para o ecrã onde passam as imagens, o espectador identifica-se com ele. Tudo se passa como se fosse o próprio espectador que interrogava o convidado ou estivesse a ver seqüência. Essa identificação é evidentemente uma das forças da informação televisiva: o espectador sente-se parte activa da informação (JESPERS, 1998, p. 123)

Para Souza (2004, p. 138), a presença de plateia também é frequentemente utilizada

para aumentar o clima de descontração. Entretanto, ele difere o gênero talkshow de outro que

ele chama de entrevistas, como se esta segunda denominação estivesse, de certa forma, mais

ligada aos programas jornalísticos, com apresentadores jornalistas, de carreira sólida. Na

opinião do autor, denotaria compromisso com a verdade a postura de um entrevistador que

não precisaria deixar o entrevistado à vontade, podendo questioná-lo sobre fatos polêmicos e

chegar até à discórdia, o que demonstraria seriedade, atribuição dos programas jornalísticos.

Quando existe descontração e intimidade, pode haver uma redefinição do gênero entrevista. Com tais elementos, o gênero se aproxima do classificado como talk show. Os dois se aproximam, mas com diferenças que demarcam o território do jornalismo e o do show. No gênero entrevista, o entrevistado é o foco e não há show comandado pelo jornalista apresentador (SOUZA, 2004, p. 138).

Além disso, o pesquisador pontua diferenças no cenário como outro fator importante

para ajudar a identificar e distinguir o programa de entrevista do talkshow. Se o apresentador

circula em um grande cenário, percorrendo os espaços destinados a atrações específicas em

cada local, o programa deve ser considerado talkshow. Do contrário, o entrevistado fica 16 O teleponto ou teleprompter é uma câmera “escondida” por trás de uma grande tela, que parece de TV, que apresenta o texto que deve ser lido pelo apresentador. Este texto vai passando pela tela de acordo com a velocidade que ele lê. O teleponto foi criado para que o apresentador não precisasse decorar todo o texto a ser lido (em programas ao vivo ou não) – dando a entender que está sendo completamente informal em sua comunicação com o público, não lendo um texto obrigatório em uma ficha previamente produzida – e para que pudesse fazê-lo olhando para a câmera ao mesmo tempo. Para Jespers (1998, p. 125), a ferramenta é usada para aumentar a credibilidade da mensagem real. Ivor Yorke, pesquisador do jornalismo televisivo, explica que o hardware dos teleprompters evoluiu consideravelmente desde o uso das “dálias”, cartões ou folhas escritas à mão mantidas logo abaixo ou de um dos lados da câmera. “A eficiência desse método simples era prejudicada pela dificuldade de manter os cartões em posição tal que os olhos do apresentador não se desviassem da câmera”, diz. Nos sistemas mais modernos, “as palavras são refletidas por um dispositivo especular que se encaixa na frente de cada câmera sem obscurecer a lente. Enquanto fala, o apresentador olha diretamente para ele – e portanto para o público” (YORKE, 1998, p. 40).

24

sentado para o bate-papo, o que presumiria diálogos mais profundos e de duração mais longa.

Esses argumentos apresentados para diferenciação dos gêneros são aqui tomados como

insuficientes, porque a principal característica de ambos são as entrevistas – os demais

aspectos seriam atrações que permeariam o essencial dos talkshows.

Ivor Yorke aponta que nem todos os anfitriões de talkshows possuem antecedentes no

jornalismo e nem todos os jornalistas querem ser apresentadores de talkshows, entretanto, não

seria difícil perceber uma ligação entre as aptidões necessárias para a condução do programa

(YORKE, 1998, p. 161).

Outra classificação que parece esbarrar no mundo dos talkshows é tratada pelos

pesquisadores Patrick Charaudeau e Rodolphe Giglione. Eles escreveram sobre semelhanças e

diferenças dos reality shows e dos talkshows, colocando que os primeiros apresentam um

universo de identidades narrativas sem referências de identidade social; já os segundos têm

identidades enunciadoras com referências de identidade social arquetípica, características

voltadas para busca de credibilidade ao que é mostrado nos programas.

O imaginário de autenticidade define-se pelo ‘que é’ e que pode ser ‘mostrado’, construindo um mundo de ‘realidade’. O imaginário de verdade define-se pelo ‘que há a descobrir’ e que não pode ser mostrado mas ‘sugerido’ através da palavra e de apresentação de provas, construindo um mundo de ‘real figurado’. Uma das características fundamentais do talk show reside no facto de que ele não é relato a acção, mas encenação da palavra. Esta, como no reality show, corresponde a um objectivo catártico, mas enquanto o do reality show se apóia num imaginário de ‘autenticidade’, o do talk show apóia-se num imaginário de ‘verdade’ (CHARAUDEAU e GHIGLIONE, 1997, pp. 114 e 115).

Embora algumas opiniões sejam divergentes em aspectos específicos, existe uma

linha-guia de coincidências e peculiaridades que delimitam o gênero. Indicados os parâmetros

e as características principais do talkshow, é apresentado, no capítulo a seguir, o universo

digital televisivo, para que possam ser analisadas as estruturas, as tecnologias, a história da

evolução e as consequentes possibilidades da TV digital, tema dessa dissertação.

25

3 A DIGITALIZAÇÃO DA COMUNICAÇÃO

O presente capítulo contextualiza e explica, efetivamente, o que é e quais são os

principais aspectos da TV digital. Para introduzir o tema, é necessário explicar o conjunto de

revoluções proporcionadas pela digitalização, que englobam as chamadas novas tecnologias

da comunicação, universo em que se insere o objeto de estudo. Apresentada a TV digital sob

essa ótica, foram analisadas suas potencialidades e as mudanças estruturais que ela pode vir a

acarretar – inclusive no contexto audiovisual brasileiro.

3.1 Novas tecnologias

A partir da segunda metade do último século, a aceleração da velocidade da evolução

das tecnologias vem surpreendendo, inclusive, os mais céticos. Nossa sociedade vive um

momento único, de avanços constantes, que permitem uma evolução tecnológica como nunca

antes vista, o que proporciona a resolução de muitos dos problemas da humanidade e o

aprimoramento de técnicas já existentes.

Os veículos de comunicação, mais do que levar informações julgadas relevantes para

um grupo de pessoas em um espaço geográfico determinado, cumprem um direito universal e

uma necessidade intrínseca ao homem: de se comunicar. As tecnologias, desde a invenção dos

tipos móveis de Johann Gutenberg, em meados do século XV, facilitam os processos das

mídias, principalmente em questões estruturais dos veículos, como a impressão, distribuição,

teledifusão, edição de conteúdo, entre muitos outros benefícios. O último grande progresso

permitido pelas tecnologias foi proporcionado pela chamada digitalização, que consiste na

transformação de qualquer informação (texto, vídeo, som, imagem ou qualquer outra que a

criatividade alcançar) em códigos diversos, compostos e estruturados por “zeros e uns” que,

em conjunto, formam os chamados bits (Binary Digit ou dígito binário), que compõem os

bytes (medida de armazenamento – cada byte possui oito bits), responsáveis por dar forma

digital à informação em questão.

É como se para digitalizar um texto, por exemplo, fosse necessário renomear cada

letra do alfabeto. O novo nome da letra “A” seria composto de oito numerais específicos, uma

combinação de “zeros e uns” que, na linguagem computacional, traduzem e são responsáveis

por dar origem a esta letra na tela. Depois, ainda entraria em questão o tipo (fonte) e seu

26

tamanho (corpo), seu estilo (se maiúscula ou minúscula, negrito, itálico ou sublinhado etc.), a

posição que aparecerá, a cor, o alinhamento, entre outras formatações e informações que

também serão codificadas por meio de “zeros e uns”.

O caminho desta evolução – das telecomunicações, dos equipamentos eletrônicos ou

analógicos, dos computadores e dos displays – traçado até aqui visa à facilitação dos

processos comunicacionais. Alguns pesquisadores, inclusive, já lançaram mão de teorias

reconhecidas que tratam desta evolução. Um deles foi o, então, presidente da empresa Intel,

Gordon E. Moore, que divulgou, em 1965, o que ficou conhecido como Lei de Moore: uma

previsão sobre o aumento exponencial da capacidade de hardware, indicando que o poder de

processamento dos chips dobraria a cada um ano e meio. A Lei de Moore não seria nada mais

que uma simples previsão, não fosse pelo fato de ter se tornado realidade.

A digitalização permite, então, agilidade nos processos de comunicação, como bem

pontua Paulo Novaes:

Comecemos por recordar o enorme impacto da tecnologia em benefício da produção do nosso jornal diário. A digitalização dos conteúdos fez com que o primeiro contato da palavra com algum tipo de papel ocorra somente na rotativa, trazendo rapidez e versatilidade inimagináveis. As comunicações e a internet nos permitem acessar as fontes em tempo real e colocam à disposição dos editores uma enorme massa de informação e pesquisa. Falamos online com nossos leitores e anunciantes. Resumindo, menor custo, maior receita, mais agilidade, maior variedade de produtos. [...] Todas essas novas ferramentas estão também à disposição das empresas jornalísticas, trazendo enorme potencial de inovação de produtos e serviços para alimentar a criatividade das nossas áreas de relacionamento (NOVAES, 2007, p. 43).

O exemplo do jornalismo impresso pode ser adaptado para o audiovisual. As

informações referentes a sons e imagens (rádio, cinema e televisão) podem ser digitalizadas,

resultando em melhor resolução audiovisual, já que esta reproduz os dados com exatidão, sem

distorções (ou informa ou não informa), ocupando menos espaço de armazenamento e

também no espectro de transmissão (abrindo, inclusive, possibilidade de transmissão via

outros canais) e ainda podendo dialogar com outros veículos – já que informados em uma

mesma linguagem de “zeros e uns”, como acontece com o próprio computador, ou com um

portal de notícias da internet, que oferece conteúdo de texto, gráfico, desenho, audiovisual e

junta todas essas funções em um só veículo de comunicação. Segundo o pesquisador Renato

Cruz, “ao transformar todo tipo de informação em um código binário, a digitalização permitiu

a convergência dos meios. Qualquer rede passou a ser capaz de carregar todo tipo de conteúdo

27

(CRUZ, 2008, p. 84)”. Isso fez com que os mercados de radiodifusão, telecomunicações e

informática se tornassem um só, concorrendo no mesmo espaço.

[...] as tecnologias da mídia passaram por um processo acelerado e constante de modificações radicais que, mais recentemente, alteraram a própria natureza do processo da comunicação em massa. A origem dessas transformações está na chamada revolução digital, isto é, na possibilidade de redução (digitalização) de textos, sons e imagens a bits. Foi esse avanço que deu origem à convergência tecnológica que está dissolvendo as fronteiras entre as telecomunicações, a comunicação de massa e a informática, isto é, entre o telefone, a televisão e o computador ou entre a televisão, a internet e o computador (LIMA, 2001, p. 25).

O mundo digital está tão presente na sociedade que, talvez, em breve, não seja mais

tão óbvia e aparente a separação entre o que é um equipamento analógico e o que é digital –

ele simplesmente será um aparelho digital. Demi Getschko, conselheiro do Comitê Gestor da

Internet no Brasil, disse, em entrevista a Renato Cruz, em abril de 2005, que a internet, por

exemplo, deverá desaparecer no futuro, no sentido de que não será nem usada a palavra

internet, pois as pessoas vão se conectar diariamente e o hábito se tornará intrínseco à ação.

“Da mesma forma como não vamos discutir o que acontece com a energia elétrica, a internet

se tornará onipresente e não precisará ser chamada pelo nome” (CRUZ, 2008, p. 83). Hoje,

por exemplo, ninguém explica que ira se conectar à rede elétrica; simplesmente faz uso dela, e

ponto. Esta diferenciação cada vez mais desaparecerá, pois pode ser percebida a tendência

plena à digitalização de todos os equipamentos que cercam a vida humana. Esta dualidade –

analógico x digital – pode ser vista nas indústrias de informação e entretenimento, onde bits e

átomos são confundidos com frequência.

Uma editora trabalha no ramo da transmissão de informações (bits) ou no da confecção de livros (átomos)? Historicamente, ambas as alternativas estão corretas, mas isso vai mudar rapidamente, à medida que as ferramentas da informação forem se tornando mais ubíquas e mais fáceis de utilizar (NEGROPONTE, 1995, p. 18).

A digitalização, processo presente no universo das comunicações, tem alterado

profundamente este setor. As novas tecnologias englobam as novas mídias geradas a partir do

computador (e, naturalmente, as possibilidades de programação e combinação que dele

surgem), além dos antigos meios. Este processo tem uma enorme capacidade de mudar a

mídia tradicional (jornais, revistas, rádio e TV), produzindo impactos tanto sobre os formatos

quanto sobre as próprias audiências – o que acabam por, praticamente, transformá-la em outro

28

tipo de mídia que não a anterior17. A própria televisão, meio de comunicação objeto desta

pesquisa, ganhou, para esta nova fase, sobrenome que a diferencia de seu ultrapassado sistema

analógico: TV digital.18

Para José Aronchi de Souza, pesquisador da televisão no Brasil, desde sua invenção, a

TV é sinônimo de tecnologia. Tem responsabilidade, por exemplo, no desenvolvimento da

indústria de equipamentos para transmissão de sinais e dados, novos materiais condutores,

como a fibra ótica; microssistemas de captação, como microondas; microfones sem fio;

satélites; imagem digital; e meios de comunicação virtual (SOUZA, 2004, p. 30).

O pesquisador Dominique Wolton acredita que as tecnologias tornam-se o sentido da

comunicação, passando a “sociedade do futuro” a obter também novos títulos embasados na

técnica dominante, como “sociedade da informação ou comunicação” (WOLTON, 2003, p.

31). Antônio Francisco Maia de Oliveira também observou, em dissertação apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Ciências da Informação da Pontifícia Universidade Católica

de Campinas (PUCCAMP), que a história da chamada “sociedade da informação” confunde-

se com a da sociedade “pós-moderna” – ora com a história da revolução da tecnologia da

informação, ora com a da sociedade do conhecimento. “O que há de comum nestas histórias é

a convergência [...] há elementos definidores de uma nova relação homem, máquina e

conhecimento (OLIVEIRA, 2007, p. 78)”. Segundo o autor, o termo “sociedade da

informação” surgiu na década de 70 como revelação da próxima etapa contemporânea pós-

industrial que a humanidade vivenciaria – discussão levantada principalmente pelos Estados

Unidos e Japão, países tradicionalmente empenhados em descobertas tecnológicas

impactantes.

Já na década de 1960, os EUA começam a arquitetar as formas de relação com outros países, centradas no uso da informação (cultura) e da tecnologia (infra-estrutura) para assegurar a supremacia. A nova situação tecnologia-eletrônica força a redefinição do caráter das relações que os Estados Unidos mantêm com o resto do mundo (Ibid., p. 84).

17 Não cabe nesta dissertação a discussão de questões políticas e econômicas que influenciaram a criação e adoção de novas tecnologias voltadas para funções específicas. Há outras pesquisas direcionadas a políticas públicas e privadas de comunicação, como os estudos de César Ricardo Siqueira Bolaño, Valério Cruz Brittos e Renato Cruz, que trabalham muito bem estes temas de indiscutível relevância, mas que dizem respeito a um universo diverso do aqui referenciado. 18 As características desta evolução televisiva estão explicitadas no próximo item e capítulo, referentes exclusivamente ao tema.

29

Em seu mais famoso livro, “Os meios de comunicação como extensões do homem”,

Marshall McLuhan já anunciava a mudança radical da sociedade contemporânea

potencializada pela evolução das tecnologias.

Durante as idades mecânicas projetamos nossos corpos no espaço. Hoje, depois de mais de um século de tecnologia elétrica, projetamos nosso próprio sistema nervoso central num abraço global, abolindo o tempo e o espaço (pelo menos naquilo que concerne ao nosso planeta). Estamos nos aproximando rapidamente da fase final das extensões do homem: a simulação tecnológica da consciência, pela qual o processo criativo do conhecimento se estenderá coletiva e corporativamente a toda a sociedade humana, tal como já se fez com nossos sentidos e nossos nervos através dos diversos meios e veículos (MCLUHAN, 2005, p. 17).

McLuhan propõe uma visão das tecnologias voltadas para suprir a necessidade do

homem de estender suas próprias capacidades. E, quando ele remete seus estudos para os

meios de comunicação, afirma que todos são metáforas ativas em seu poder de traduzir a

experiência em novas formas. “Com o telefone, temos a extensão do ouvido e da voz, uma

espécie de percepção extra-sensória. Com a televisão, vem a extensão do sentido do tato ou da

inter-relação dos sentidos, que envolve mais intimamente ainda todo o nosso mundo sensorial

(Ibid., p. 298)”. O autor percebeu esta tendência do homem de “emular19” certas competências

humanas em um aparelho auxiliar. Com o advento da tecnologia elétrica, o homem teria

prolongado ou projetado, para fora de si mesmo, um modelo vivo do próprio sistema nervoso

central (Ibid., p. 61).

Colocando a comunicação como transporte de dados e informações, ele acredita que

ela não só conduz, como traduz e transforma o transmissor, o emissor, o receptor e a

mensagem emitida. O uso de “qualquer meio ou extensão do homem altera as estruturas de

interdependência entre os homens, assim como altera as ratios entre os nossos sentidos”,

explica (Ibid., p. 108). E, com o objetivo de enfatizar esses aspectos, dá o exemplo da

televisão: “a revolução já ocorreu em casa. A TV mudou nossa vida sensória e nossos

processos mentais” (Ibid., p. 373).

Esse auxílio, então, não apenas mudaria todos os agentes envolvidos no processo de

comunicação, como também influenciaria a relação de participação e envolvimento deste

19 A palavra emular tem sido bastante utilizada no sentido de transferir algo do homem para uma máquina, mais especificamente um computador. Segundo a 4ª edição do dicionário Aurélio (2001), emular significa ter emulação com, igualar, comportar-se como outro, sendo que emulação é o sentimento que incita a igualar ou superar outrem, um estímulo ou incentivo.

30

“novo” indivíduo assistido20. Além disso, este mesmo processo estaria prestes a transformar

ainda mais essas funções e sentidos, já que, segundo o que o autor escreveu na década de 60,

o próximo passo, após prolongado nosso sistema nervoso central em tecnologia

eletromagnética, seria transferir nossa consciência para o mundo do computador (Ibid., p. 81).

Nicholas Negroponte, que pesquisa justamente computadores e sistemas digitais,

escreveu em seu livro “A Vida Digital” que a digitalização modificaria “a natureza dos meios

de comunicação, fazendo do processo de empurrar bits para as pessoas algo que permitiria a

elas (ou a seus computadores) puxá-los”. Na década de 90, os pesquisadores do

Massachusetts Institute of Technology (MIT) – Negroponte foi fundador do laboratório para

estudo das mídias dessa instituição, o Media Lab – já construíam e previam as possibilidades

de alcance dessas máquinas, a possível fusão de alguns aspectos computacionais e digitais

para alguns aparelhos (de modo a aprimorar os resultados dos mesmos) e, mais ainda, a

introdução de uma interatividade técnica por meio de softwares, o que proporcionaria novas

funções aos interagentes (“novos” telespectadores), novas interfaces, novo design, etc.

Todas essas mudanças também influenciariam a qualidade da imagem transmitida e,

por consequência, a visão humana sobre a tela, bem como os papéis daqueles que não podem

mais ser chamados de público, ouvinte, telespectador ou mesmo audiência. Em outras

palavras, a alteração na forma resulta em uma transformação substancial do conteúdo.

Os bits que informam sobre bits vão produzir uma mudança completa nas transmissões televisivas. Eles proporcionarão um gancho por onde agarrar o que for do seu interesse, e dotarão a rede de um meio de despachar bits para quem quer que os queira, esteja onde estiver. As redes vão afinal aprender o que é de fato uma rede (Negroponte, 1995, p. 172).

3.2 TV digital

O objeto de estudo desta dissertação é centrado no meio de comunicação mais

difundido no Brasil e que enfrenta, agora, sua segunda21 mais relevante transformação.

Caminho sem retorno, a digitalização da TV começou com estudos nos Estados Unidos por

volta de 1980 e veio a ter impacto efetivo em nosso país somente na década atual.

A vida e a morte na tecnologia são questões não somente de receitas, mas de

perspectivas (e de tempo). George Gilder, pesquisador do MIT, já apresentava esta visão na

20 Tema aprofundado mais adiante, no capítulo cinco, sobre o “novo” telespectador. 21 Considerou-se a implantação das cores como a primeira grande mudança da televisão.

31

década de 90, quando escreveu o livro “A vida após a televisão”, pontuando que empresas

como as redes de televisão ignoravam o fato de que suas tecnologias básicas estavam mortas.

A TV desafia o mais óbvio fato sobre seus clientes – sua prodigiosa e eflorescente diversidade. As pessoas executam dezenas de milhares de trabalhos diferentes; dedicam-se a um sem-número de hobbies; lêem centenas de milhares de publicações diferentes. A TV ignora a realidade de que as pessoas não são inteiramente passivas; dada uma chance, elas respondem e interagem. (GILDER, 1996, p. 13).

Os computadores, que justamente na década de 90 ganharam força e impulso mundiais

das indústrias de componentes e de telecomunicações, apresentaram às audiências um sistema

diferente de comunicação, que o controle remoto não foi capaz de modificar. Enquanto as

redes de computadores permitiam às pessoas interagir, o sistema televisivo, em qualquer lugar

do mundo, somente oferecia aos telespectadores a opção de assistirem passivamente o que era

veiculado pela mídia.

As transmissões audiovisuais da televisão analógica se dão por meio de sistemas

chamados “top-down”, nome que simboliza o tipo de comunicação estabelecida entre veículo

e telespectador: unidirecional. Ou seja, o aparelho de TV recebe sinais analógicos de áudio e

vídeo de cada emissora e os retransmite pela tela da televisão; ao o receptor só é permitido

assistir às transmissões e mudar de um canal para outro, mas não interagir, modificar,

interferir, propor ou conversar com a própria emissora ou com outros espectadores por meio

do veículo.

As redes de computadores, por sua vez, oferecem tantas possibilidades de conexões

quanto o número de suas máquinas interligadas. Gilder, entre outros autores, chamou o

aparelho de TV de “terminal de recepção burro”22, por não realizar qualquer operação mais

complexa do que retransmissão de sinal23. Para Nicholas Negroponte,

[...] a transmissão televisiva é exemplo de um veículo no qual toda a inteligência encontra-se no ponto de origem. O transmissor determina tudo; o receptor apenas recebe o que é enviado. Na verdade, em termo do volume em centímetros cúbicos, seu aparelho de televisão atual é, talvez, o utensílio mais idiota que você

22 Muitos outros autores também usam o termo “terminal burro” para designar a ausência de bidirecionalidade da televisão, pois trata-se de um meio de comunicação sem canal de retorno, que somente retransmite as imagens e sons que recebe, sem possuir qualquer tipo de processamento mais complexo que, inclusive, permita a participação do telespectador. 23 Mas de maneira diferente de como acontece com o mainframe, criado em 1946, dos caixas eletrônicos de bancos, por exemplo. Os mainframes, muitas vezes chamados de supercomputadores, computam dados praticamente todas as vezes que algum usuário saca dinheiro ou usa cartão de crédito, o que torna o sistema bidirecional, capaz de reagir a uma interação do cliente.

32

tem em casa (e não estou nem falando da programação). Se você possui um forno de microondas, é provável que ele contenha mais microprocessadores do que sua TV (NEGROPONTE, 1995, p. 24).

Gilder não acreditava no futuro da televisão como ela existia. Sua aposta passava por

uma tecnologia por ele chamada de “teleputer”: uma junção da TV com o computador que

agregaria as novas funções geradas pelo micro, distribuindo o que ele chamou de “a

inteligência da rede”, anteriormente localizada no topo da cadeia comunicacional (nas

emissoras, únicas transmissoras de conteúdo). Ele percebia a evolução da TV, com a

digitalização dos equipamentos, de forma tão diversa da maneira como acontecia a

comunicação tradicionalmente unidirecional e focada, que não conseguia conceber esta nova

TV, digital, como sendo o mesmo aparelho que assistíamos.

Não há mais razão para o vídeo usar um sinal vulnerável, complexo, ineficiente e não-manipulável. Não há mais lógica em deixar o cérebro do sistema na estação transmissora. A era da televisão, para todos os propósitos, está encerrada [...] O novo sistema será o telecomputador ou “teleputer”, um computador pessoal adaptado ao processamento de vídeo e conectado por fios de fibra ótica a outros telecomputadores em todo o mundo (GILDER, 1996, p. 37).

3.2.1 Características gerais

A TV Digital consiste, tecnicamente, na transmissão de dados – principalmente

audiovisuais – por meio de um código binário (de “zeros e uns”), via aérea (satélite) ou

terrestre (cabo/ondas). Ela representa uma mudança maior do que sua primeira evolução

representou (a introdução de cores) – uma transformação sem precedentes por todos ou, ao

menos, por muitos dos aspectos que envolvem a TV: a produção de conteúdo, agora digital,

assim como a transmissão dos dados, que muda a forma de envio do sinal para a casa das

pessoas, que assistirão à televisão de outra maneira, não somente devido ao nível de

interatividade permitida, mas por sua resolução máxima primorosa de áudio e vídeo, que

poderá mexer com a cognição humana.

A digitalização representa um salto maior que a passagem da TV em preto-e-branco para a TV em cores, que aconteceu no Brasil em 1972. A TV digital traz recursos como novos serviços interativos, parecidos com o da internet; alta definição, com imagem melhor que a do DVD; multiprogramação, a transmissão de até quatro programas simultâneos no mesmo canal; mobilidade e portabilidade, com recepção do sinal em veículos em movimento e também no

33

celular. Das quatro características novas, somente a alta definição estava presente no lançamento da TV digital no Brasil, em dezembro [2007] (CRUZ, 2008, p. 17)

Esses quatro aspectos citado pelo pesquisador Renato Cruz formam as principais

características do novo aparelho. Por ser digital, o resultado da transmissão possui melhor

qualidade de som e imagem do que a TV analógica24, e ainda não possui interferências – ou o

sinal chega ou não chega à tela da televisão (alta resolução – detalhes no item a seguir, 3.2.2).

A compressão do sinal também possibilita aumento no número de programas veiculados

(multiprogramação) – onde antes só cabia um canal, agora cabem até quatro25. A recepção do

sinal pode ser feita por meio de outros canais não-convencionais portáteis, como celulares

(mobilidade e portabilidade), sem contar com a possibilidade do uso de recursos interativos

(interatividade), mais aprofundados no capítulo quatro.

A digitalização da TV analógica é algo que já acontecia há algum tempo, quando da

disponibilização de serviços no aparelho televisor, como as funções de relógio, textos,

memorização e PIP (picture in picture) – imagem reduzida de uma emissora dentro da

imagem maior de outra, selecionada por controle remoto – com propagação de serviços mais

intensificada na década de 90. Contudo, uma TV com tantas funcionalidades quanto as

propostas pela atual TV digital não seria possível em um sistema convencional.

Dentre as possibilidades da TV digital, há também a disponibilização de dados

informativos para acesso do telespectador, como informações sobre o trânsito, a cotação do

dólar, a sua novela favorita, um filme, um ator, um cantor, tabelas de campeonatos, receitas e

até resultados de votações no congresso nacional. Estes recursos recebem o nome de enhaced

TV, “mais relacionado com a programação existente (que pode ser perfeitamente aproveitada),

agregando-se elementos informacionais e que permitem também uma interatividade”

(WAISMAN, 2002).

Outra porta aberta pela TV digital é a da conversação do aparelho com os demais

equipamentos também digitais da casa. Com os meios analógicos era impossível uma

comunicação, por exemplo, da televisão com o video game, do walkman e do aparelho de

som com a televisão sem o uso de complexos conversores (até mesmo utilizá-lo como

gerenciador de algumas atividades do lar, como controle de estoque, de alarme, secretária

24 Em uma HDTV, TV digital de alta definição, a resolução pode superar dois milhões de pixels, em detrimento do máximo de 300 mil pixels da TV analógica. Ver conceito do que é pixel no item a seguir, “Evolução da tecnologia da imagem audiovisual”. 25 Devido à compressão dos dados por meio da digitalização, o novo espectro possibilita subdividir o espaço de um antigo canal analógico por até quatro canais diferentes, de resolução Standard (SDTV), ou por um único canal, com resolução FullHD, a máxima capacidade de definição que um aparelho atual suporta.

34

eletrônica, entre outras funções levantadas inclusive por Negroponte). Já os sinais digitais

permitem este diálogo integrante, pois se caracterizam, essencialmente, por:

[...] bits e bytes homogêneos, códigos de ligado-desligado que podem ser facilmente armazenados, comprimidos, depurados, editados e manipulados. Em vez de funções incompatíveis, de uso específico, os sinais digitais estimulam o mundo ricamente interativo e relativamente aberto do computador pessoal. Na TV digital, por exemplo, a estação envia não uma cena, mas informações sobre a cena; a imagem é formada, controlada e armazenada não na estação, mas no próprio telecomputador (GILDER, 1996, pp. 150 e 151).

Para receber o sinal digital nas telas das televisões analógicas (basicamente as de tubos

de raios catódicos) ou das TVs apropriadas para transmissão digital (as mais difundidas são as

de Liquid Crystal Display – LCD – ou de Plasma – informações sobre essas tecnologias no

item 3.2.2, a seguir), é necessária a aquisição de um aparelho conversor ou decodificador,

chamado Set-top Box26 (STB). Como bem explica Lara Piccolo, do Instituto de Comunicação

da Unicamp, esse conversor tem como funcionalidades básicas desmultiplexar27 e processar o

sinal digital recebido e, se for o caso, sincronizá-lo com a programação; decodificar

informações de áudio e vídeo; enviar dados via canal de retorno; construir as imagens a serem

exibidas pelo aparelho de TV e convertê-las para o sinal analógico, se for o caso de uma

transmissão para TV convencional.

Além da qualidade audiovisual, a manipulação de dados – executada a partir de

processadores, memórias, modem e dispositivos de armazenamento – faz com que sua

arquitetura se assemelhe a de um computador pessoal. O processador é responsável por

inicializar os vários componentes do hardware do decodificador, monitorá-lo e gerenciá-lo,

carregar dados e instruções da memória e executar programas. A memória é, em si, uma área

de armazenamento temporário ou permanente. O modem é usado para prover serviços de

interatividade, por meio da constituição do canal de retorno, conectando o Set-top Box a uma

emissora ou provedor de serviço. Por tantas possibilidades de ação, a arquitetura dos Set-top

Boxes está incorporando interfaces que facilitam a comunicação com o usuário presente do

outro lado da tela.

26 Para os televisores não adaptados à nova tecnologia, o Set-top Box converte o sinal digital recebido para uma forma analógica, que certamente perde resolução, mas que ainda assim fornece uma definição melhor. Para os detentores dos novos aparelhos de TV, o conversor mais básico apresenta a função de captar, reconhecer e decodificar o sinal digital para reproduzi-lo. 27 Desmultiplexagem é uma técnica que separa um sinal multiplexado (que combina vários canais de dados em um único canal) em vários canais de dados originais, desfazendo o efeito de multiplexagem.

35

3.2.2 Evolução da tecnologia da imagem audiovisual

Descoberto pelo químico sueco Jacob Berzelius, em 1817, o selênio é o elemento

químico que daria origem a um dos meios de comunicação mais importantes do mundo: a

televisão. O inglês Willoughby Smith foi o responsável por perceber sua capacidade de

transformar energia luminosa em elétrica, que só foi aproveitada em 1884, pelas mãos do

técnico alemão Paul Nipkow, inventor do Disco de Nipkow – um disco de ferro, com

pequenos furos posicionados em formato de espiral, que, quando girado rapidamente,

fragmentava uma imagem fixa localizada em uma das extremidades do equipamento em

diversos pontos e projetava-a para o outro lado, reagrupando os chamados picture points,

formando a figura novamente.

A televisão como conhecemos hoje é fruto do cruzamento entre os estudos desses e de

outros pesquisadores. O Disco de Nipkow pouco tem a ver com as mais recentes descobertas

técnicas que transformam uma simples emissão audiovisual em um complexo sistema de alta

resolução, mas a ferramenta criada por Nipkow teve utilidade quando aproveitada pelo

engenheiro escocês John Logie Baird, que, em 1924, realizou uma apresentação de dois

minutos para a comunidade científica da Inglaterra, no Instituto Real de Londres, o que

resultou em sua contratação pela emissora BBC. Quatro anos depois, Baird deu início a

experiências de colorização das imagens televisivas, utilizando-se de filtros.

O invento da TV, no inicio, é caracterizado pelo uso de um sistema mecânico, idealizado pelo alemão Paul Nipkow em 1884, mas ele não chegou a construir um protótipo. A luz passa por um disco perfurado que faz o esquadrinhamento da imagem, gerando um fluxo de elétrons que são transmitidos por um fio. Anos mais tarde, o aparelho foi fabricado com um sistema completo de transmissão e recepção. [...] equipamento mecânico que depois seria superado pelo sistema eletrônico. (CROCOMO, 2007, p. 48).

Em 1887, Karl Ferdinand Braun28 resolvia o problema de maneira diferente de

Nipkow: desenvolvendo um tubo de raios catódicos (CTR ou cinescópio), consequência de

um trabalho de observação de ondas eletromagnéticas por meio de uma tela coberta de

fósforo. Também tentando descobrir alguma forma de reprodução imagética, em 1906,

Arbwehnelt e Boris Rosing, em dois lugares diferentes do mundo, montaram equipamentos

usando um espelho e o tubo de raios catódicos que podiam “desenhar” em uma tela, devido ao

emprego de elétrons que, emitidos pelo filamento negativo e superaquecido do tubo, 28 Físico alemão que também foi Prêmio Nobel de Física no ano de 1909, devido aos seus serviços voltados para o desenvolvimento da telegrafia sem fios.

36

formavam um feixe que, em movimentos rápidos, atingia a tela e, ponto por ponto, formava

imagens luminosas.

Entretanto, a paternidade oficial da TV é do engenheiro eletrônico russo Vladimir

Kosma Zworkyn, ex-aluno de Boris Rosing que, um ano antes da apresentação de Baird, em

1923, criou o que chamou de iconoscópio – uma válvula à vácuo com uma de suas

extremidades cheias de células fotoelétricas que a luz elétrica impulsiona e transforma em

sinais. Ele passou a ser apoiado pela empresa Radio Corporation of America (RCA), onde

também realizou uma demonstração de seu invento, gerando uma das mais famosas

transmissões experimentais da história da TV: a estátua Gato Félix, de dois metros de altura,

localizada frente à emissora. Na mesma época, outro famoso engenheiro norte-americano,

Philo Taylor Farnsworth, criou o tubo dissector de imagens, aparelho que lhe rendeu a

primeira transmissão de imagens estáveis de um lugar para outro.

A vontade do homem de reproduzir a realidade em que vive sempre o motivou a

buscar técnicas que melhor pudessem transmitir as imagens que vemos com nossos sentidos.

Estava dada a largada para a corrida mundial em busca do pixel perfeito, conceito criado antes

mesmo de ser inventado o aparelho de televisão. Segundo o pesquisador Richard Lyon, o

pixel tem sua base na ideia de picture element, revelada por uma reportagem do jornalista

Alfred Dinsdale29, “Demonstração de Televisão na América”, da revista Wireless World, em

1927 (LYON, 2006). Picture element significaria um mosaico de pontos, um grande número

de partes ou mesmo centenas de pequenos quadrados.

No ano de 1930, tiveram início as transmissões mais significativas e periódicas da

emissora NBC, subsidiária da RCA. Cinco anos depois, Alemanha e França30 também

entravam neste mercado. Em 1936, finalmente, nasceu a BBC Television e, em 1938, a

televisão chegou à Rússia.

As transmissões começaram a ser mais regulares (pioneirismo também da NBC) em

1939, ao passo que começaram a ser vendidos os primeiros aparelhos de televisão – que, no

mundo todo, só foram se popularizar em 1946 (quatro anos antes de chegarem ao Brasil).

Dois anos depois, em 1948, surgiu o primeiro tubo de raio catódico que permitia o uso das

cores, resultado de estudos do russo naturalizado americano, David Sarnoff. Em 1951, a

emissora CBS levou esta tecnologia para todos os Estados Unidos.

29 Dinsdale também é o autor do primeiro livro sobre televisão escrito em inglês, no ano de 1926. 30 Países que, na época, estudavam o princípio do magnetismo permanente para permitir a gravação de sons em fita plástica, o que viria a eclodir no videotape, utilizado pela primeira vez pela emissora européia WNBT, em 1955. Outro equipamento que permitia gravação foi desenvolvido por Zworykin, o Orthicom, uma válvula de raios catódicos adaptada a uma câmera.

37

As câmeras, que servem para registrar as imagens a serem transmitidas pelas

emissoras, possuíam uma capacidade tricromática, com filtros especiais, que analisavam a

imagem conforme curvas de luminosidade sensíveis ao olho humano, denominadas RGB

(Red, Green and Blue – vermelho, verde e azul), representativas das três cores primárias.

Esses três elementos são capazes de se combinarem entre si e provocar a exibição de 16

milhões de cores diferentes, parte da composição do pixel.

Outro avanço é a transmissão em cores, possível através de um prisma na câmera e com imagens idênticas separadas nas cores vermelha, verde e azul. A inovação seguinte é a substituição dos tubos pelo CCD – em inglês, Charge Coupled Device (Dispositivo de Carga Acoplada). São minúsculos sensores fotosensíveis. Cada CCD, um de cada cor, brilha com a luz incidente estimulando os semicondutores que são carregados em sequência, enviando continuamente as informações da imagem. Os equipamentos sempre foram caros e utilizados por grandes empresas de comunicação (Ibid., pp. 48 e 49).

Antes de a palavra pixel surgir como significação sucinta da resolução de imagens,

William Schreiber, do MIT, utilizou o termo pel para abreviar e definir picture element ou

picture points. Outra contribuição foi da revista australiana de fotografia Pix, nome que

passou a ser usado como sinônimo às características das fotos. Na década de 70, Fred

Billingsley, estudioso do tema, começou a usar o termo para imagens digitais. O termo pixel,

união das palavras pel e pix, consolida em sua terminologia o menor detalhe capaz de ser

reproduzido, composto por RGB. “A resolução de um sistema é especificada pelo número de

pixels que ele reproduz. Por exemplo, o antigo cinema de 16 mm, do qual se originou a TV

em preto-e-branco, possui uma resolução de 125 mil pixels”31.

Fragmentada em diversos “pedaços”, quanto mais pixels uma imagem possui por cada

unidade de área, maior resolução ela tem. Na televisão analógica, a informação visual era

transportada “em pedaços”. Com a digitalização, o processo de quebrar a imagem em diversos

fragmentos permanece, o conceito de pixel é o mesmo – “subdividida em uma grade com

milhões de pequenos quadrados, cada um dos quais é um pixel, cada quadrado tem a

informação de um determinado tom de cor e da sua localização. Numa escala de cores, é

possível criar gradações com números correspondentes” (Ibid, p. 57).

Voltando à questão da sensibilidade da visão humana, na TV analógica, formada pelo

tubo de raios catódicos, parte da luminosidade do feixe de elétrons é retida na tela e boa parte

chega até o telespectador, cuja retina é estimulada. “O que prende realmente o telespectador

31 Afirmação que pode ser encontrada em: SISTEMA de TV Digital. Parte I. Revista Mackenzie de Engenharia e Computação. Ano 5, n. 5, pp. 13 – 29. 2004.

38

na televisão, esse processo hipnótico, é o estímulo, que é esta luminosidade, da retina”

(SOUZA, 2008),

Quando vejo uma emissão de televisão só entendo algumas palavras e imagens (25 imagens e duas ou três palavras por segundo) no próprio momento em que a informação me chega: a minha percepção é parcelar. Para descobrir (ou melhor: para reconstruir) o sentido do conjunto da informação tenho de esperar até o fim. Cada elemento deve ser ligado ao anterior e ao seguinte para me permitir reconstruir um enunciado coerente e significativo: a minha percepção é cumulativa (JESPERS, 1998).

Em 1968, a RCA desenvolveu a primeira TV LCD.32 Quanto à outra tecnologia

voltada para a alta resolução, atualmente bem difundida, da estimulação dos átomos do

plasma (o gás ionizado, quarto estado da matéria, é absorvido pela parte externa da tela e

forma a imagem), foi lançada pela Pioneer em 1997.

A partir desses aspectos, portanto, pode-se perceber que a definição do sinal e o

aumento da resolução são relevantes para a percepção geral que o telespectador possui da TV.

Por isso, também, a busca incessante do homem por uma resolução mais nítida que os olhos

possam crer serem reais. A evolução audiovisual da televisão remete à perseguição do homem

em busca da reconstrução de sua realidade por suas próprias mãos. Suas pesquisas são

sinônimos da vontade de reproduzir o que vê e de se tornar criador da imagem da vida, com

perfeição. A confusão da cópia com relação à versão real é um desejo que se repete nos

pensamentos humanos desde a reprodução da imagem estática fotográfica33 à holografia.

Bem, o que tem a invenção da fotografia a ver com a evolução da tecnologia da imagem, inclusive da TV? É que através da sensibilização de uma chapa, papel ou filme através da luz, fica caracterizado o que chamamos de imagem “analógica”, ou seja, a luz passa através das lentes levando a informação da imagem de maneira análoga ao que está sendo fotografado, da mesma forma como o olho humano vê. E esse processo analógico foi a base para o cinema, a partir de uma experiência do fotógrafo inglês Eadweard Muybridge. Em 1878, [...] ficou conhecido como “o pai da imagem em movimento”. Muybridge descobriu então, que, uma foto depois da outra acaba resultando na “ilusão” de movimento (CROCOMO, 2007, pp. 55 e 56).

32 O Liquid Crystal Device foi descoberto muito tempo antes, em 1888, pelo biólogo austríaco Frierich Reinitzer, ao observar que o derretimento do benzoato de colesteril primeiro tornava-se enevoado e, depois, ia clareando conforme a temperatura aplicada subia e, se resfriado, o líquido assumia um tom azul antes de cristalizar (uma luz branca que, quando filtrada pelo cristal líquido, mostra a imagem). 33 O primeiro registro fotográfico data de 1826 e é do francês Joseph Nicéphore Niépce.

39

Brincando com a ilusão de ótica, movimento e sensibilidade, o homem conquista, por

meio de tecnologias, realidades alternativas que o permitem controlar, criar e reproduzir seu

próprio mundo.

3.2.3 Principais sistemas digitais: ATSC, DVB e ISDB

Na década de 70, logo após a TV em cores aterrissar no Brasil, os japoneses estavam

preocupados com qual seria o próximo grande passo rumo à evolução da televisão e

apostaram suas fichas na implementação da qualidade cinematográfica de imagem e som

dentro das casas dos telespectadores. O Japão deu início, então, às pesquisas sobre o que seria

a HDTV (High Definition Television), ou televisão de alta definição. As pesquisas foram

subsidiadas pela TV NHK (Nikon Hosu Kyoko) e um consórcio de mais de 100 estações

comerciais34.

O pensamento japonês, em 1972, era focado em um mundo analógico e, como os

pontos positivos da digitalização (como a velocidade que ela daria aos processos) ainda não

haviam sido descobertos, por isso mesmo eles se debruçaram por 14 anos no que chamaram

de Hi-Vision (NEGROPONTE, 1995, p. 42).

No embalo do projeto oriental, a Europa decidiu investir na mesma área, pois seus

técnicos também acreditavam que as imagens em alta resolução eram o mais relevante aspecto

para se pesquisar quanto ao futuro dos equipamentos audiovisuais – o que parece uma

trivialidade frente à capacidade atual dos televisores digitais, como será visto adiante.

Entretanto, como citado anteriormente, os Estados Unidos fazem parte da família de

países que se empenham muito quando o assunto é ser o mais próximo possível de um ente

paterno de uma tecnologia revolucionária – por questões sociais, econômicas e políticas. Já na

década de 80, o país assumiu para si o desafio de aperfeiçoar a tecnologia dos televisores de

forma mais rápida e mais completa do que os pioneiros japoneses. Naquela época, a

compressão digital dava os primeiros passos e, portanto, não parecia um caminho tão óbvio a

se tomar, por isso os estudos da evolução da TV permaneciam no âmbito analógico.

34 Para se ter uma ideia da linha evolutiva da televisão, cerca de 20 anos antes, em 1948, surgiu a TV a cabo, no Oregon (EUA), com o intuito de fazer com que o sinal da TV chegasse a todas as casas, potencializando e propagando a emissão, que era barrada em terrenos montanhosos. Em 1962, teve início a transmissão via satélite e assim foi se formando o mercado de TV por assinatura.

40

Ao contrário das jovens companhias de tecnologia digital como a Apple e a Sun Microsystems, as fábricas de televisores constituíam antigos redutos do pensamento analógico. Para estas últimas, a televisão tinha a ver com imagens, não com bits. Contudo, em 1991, logo em seguida ao despertar americano e quase da noite para o dia, todo mundo passou a propor a televisão digital, na esteira da General Instrument Corporation. Em menos de seis meses, literalmente, todas as propostas americanas para a televisão de alta definição transformaram-se de analógicas em digitais. Havia evidência suficiente de que o processamento do sinal digital seria eficiente em termos de custos, algo que a Europa seguiu contestando até fevereiro de 1993 (NEGROPONTE, 1995, p. 44).

A agência norte-americana reguladora das comunicações, Federal Communications

Commission (FCC), começou a estudar a TV Digital em 1987, quando ainda era chamada de

“televisão avançada” (ATV). Cerca de 25 representantes da indústria daquele país formaram

um comitê para apoio a esses estudos. Em 1990, a General Instrument Corporation propôs o

primeiro sistema digital de alta definição; a partir dessa criação, foram desenvolvidos outros

quatro protótipos de TV digital, cada qual com suas vantagens e desvantagens, e que foram

unificados no ano de 199335, formando o sistema conhecido como “Grande Aliança”. Em

1996, a FCC optou por trabalhar no desenvolvimento deste mesmo sistema e o comitê criado

na ocasião, o Advanced Television Systems Comittee (ATSC), tratou de estipular suas

especificações. No mesmo ano, a HDTV passou a ser comercializada, foram feitas

transmissões ao vivo nesse sistema e foi lançado o Set-top Box naquele país. O sistema ficou

conhecido pelo nome do comitê, ATSC, cujo objetivo principal era obter imagens e sons com

alta definição, seguindo a linha de pensamento japonesa, mas utilizando outra metodologia,

que agilizaria o feito. A primeira transmissão digital em alta definição da história da TV nos

Estados Unidos é reivindicada pela emissora WRAL-TV, afiliada da CBS, da cidade de

Raleigh – datada de 23 de julho de 1996.

Na Europa foi criada uma comissão, em 1993, formada por fabricantes de

equipamentos, radiodifusores e representantes de agências reguladoras nacionais. O grupo foi

chamado de Digital Video Broadcasting (DVB), título pelo qual ficou conhecido o sistema

europeu, cujo principal objetivo diferenciava-se do ATSC: os europeus pretendiam

multiplicar o número de canais, oferecendo aos telespectadores mais opções de programação.

Em 1995, começaram a transmitir TV digital em formato padrão (SDTV – Standard

Definition Television, ou Televisão de Definição Padrão), que não representava a máxima

resolução potencial, mas, mesmo assim, ainda era maior que a anterior.

35 Neste mesmo ano foi lançada no mercado norte-americano uma televisão com tela de perspectiva diferente, aspect ratio wide screen, de formato 16:9 (estilo cinema), o que já a diferenciava das TVs convencionais, medindo 4:3.

41

O último, que completa os três principais sistemas digitais do mundo, é o japonês, que

buscou, a partir de uma evolução do DVB (já que sua tecnologia – analógica – inicial, voltada

para a evolução da TV, não estava mais no páreo), trabalhar com a inclusão de ferramentas de

comunicação móvel avançadas, não deixando de levar em conta a alta resolução. Seu

desenvolvimento teve início em 199536, quando o governo apoiou a criação do grupo

Advanced Digital Television Broadcasting Laboratory (ADTV-LAB), que reunia emissoras e

fabricantes de equipamentos; em 1997, adentraram para o grupo empresas estrangeiras e,

então, foi criado o Digital Broadcasting Expert Group (DiBEG). Em 1999, foi finalizado o

sistema de TV digital japonês, o Integrated Services of Digital Broadcasting (ISDB) (CRUZ,

2008, p. 109). Entre os principais sistemas de televisão digital, o japonês foi o último a ser

lançado, em 2003.

3.3 Set-top boxes: considerações sobre outras mudanças desencadeadas pela

TV digital na cadeia televisiva

A TV digital quebra outro paradigma da televisão, transposto do rádio e muito

enraizado nos veículos de comunicação: o modelo de negócios baseado em publicidade. O

modelo dominante no Brasil, por exemplo, é o da televisão comercial, financiada pela

publicidade, como acontece nos Estados Unidos. Ou seja, o principal negócio das redes é

vender espectadores aos anunciantes (CRUZ, 2008, p. 20).

Tornar a televisão digital exige investimento por parte das emissoras, tanto na

aquisição de um aparato técnico custoso, como na capacitação de profissionais que produzem

e veiculam os produtos televisivos. Assim como em qualquer empresa capitalista, que visa o

lucro, as concessionárias de TV precisam repassar esses custos de forma a fazer tais

investimentos retornarem aos seus caixas; isso acontece por meio de uma negociação

publicitária que envolve a “venda” daquilo que sustenta o poder de barganha das emissoras: a

atenção do seu telespectador, ou seja, a audiência (que também sofrerá mudanças

significativas).

Também a digitalização, que implica a diminuição dos custos de produção e

distribuição, populariza o que atualmente é de propriedade quase exclusiva dos grandes

conglomerados de mídia: a capacidade de produção e divulgação de conteúdo em larga escala.

36 Em 1995, o Japão iniciou suas transmissões oficiais da TV comercial em alta definição em sinal analógico.

42

Trata-se de um mercado cheio de possibilidades de troca e acesso às informações (antes

somente oferecidas pelos veículos de comunicação): sites pessoais, blogs, fotologs,

comunidades virtuais como o YouTube e jornalismo colaborativo – tudo formado por bits, na

tela de seu computador ou em qualquer lugar do mundo via laptops, iPods, celulares,

aparelhos mobiles, para ser assistida a qualquer hora, com ou sem merchandising (a escolher).

Se, na era digital, a transmissão de informações, agora em bits, não requer mais tantos

esforços das emissoras, e também o conteúdo por elas divulgado pode ser visto abertamente

por outras fontes (como, por exemplo, pela rede de computadores ligados à internet, onde

muitos colaboram divulgando materiais sem visar lucro e sem cobrar qualquer quantia para

acesso aos dados disponibilizados), como as TVs manterão a atenção de suas audiências

voltada para um conteúdo que elas podem encontrar em outros lugares, a qualquer hora do

dia? Além disso, com a multiprogramação, esta mesma audiência tende a se dividir ainda

mais. O pesquisador do MIT, Michael Dertouzos, explica o fenômeno, introduzindo ainda

outro player no mercado audiovisual:

As empresas de comunicação e cabo tiram sua força da capacidade de oferecer acesso a conteúdo – milhares de filmes, discos, livros e outros itens. As empresas telefônicas contam com a vantagem natural da conectividade e compartilhamento. Se todo o conteúdo informativo do Mercado de Informação for oferecido pelas empresas de comunicação (mídia) e cabo, então os dois lados – telefone e cabo/mídia – serão adversários equiparados. Um conta com a conectividade; o outro, com o conteúdo. Mas na realidade esse ‘conteúdo’ será oferecido por milhões de pessoas e organizações, conforme elas passem a comprar, vender e trocar livremente informações e trabalho informatizado (DERTOUZOS, 1997, p. 75).

A luta das emissoras é agora pela atenção do usuário, que cada vez mais está dispersa

devido à quantidade de fontes de informação hoje disponíveis. Um grande número de

espectadores atrai um igual número de anunciantes que, por sua vez, são os responsáveis pelo

sustento das TVs. A audiência é a justificativa do preço cobrado para a veiculação da

publicidade. Como dito anteriormente, a TV digital está influenciando muito as várias

relações enraizadas pela TV analógica, e é muito interessante observar a vertente que

influencia o modelo de negócios das emissoras. Com a pulverização da mídia, a era dos

“campeões de audiência” tende a ter fim.

Alguns Set-top Boxes oferecem outras funcionalidades, que não somente as básicas,

citadas acima. Alguns deles, por exemplo, possibilitam a gravação de programas em alta

resolução. Tal procedimento podia ser feito, anteriormente, com a instalação de uma placa de

43

captura de sinais de TV em um computador, mas com a popularização de equipamentos como

o norte-americano TiVo37 (um Digital Video Recorder - DVR), que permite essa gravação

direto da TV (e com a opção de pular, automaticamente, as inserções comerciais), as pessoas

não precisam mais se dar a este trabalho (que, inclusive, exige uma boa dose de paciência

para a configuração correta), passam a não serem mais obrigadas a ver comerciais enquanto

assistem a seus programas favoritos.

Com receio de perder a audiência, levando em conta a multiprogramação ou mesmo a

fabricação de Set-top Boxes mais avançados (como ocorre nos Estados Unidos), que

permitem a transmissão de programas no horário que o telespectador quiser e, inclusive, não

custa lembrar, sem aparição de comerciais, as emissoras têm estabelecido contratos

publicitários que preveem a inserção dentro dos próprios programas, para que as empresas

contratantes tenham certeza de que seus comerciais de produtos ou serviços serão vistos.

Sendo assim, o anunciante não compraria mais, portanto, uma inserção por horário na

emissora; no máximo, por atração, se o merchandising – embutido em forma de logo no canto

da tela, comerciais anteriores ao início do programa, jabás, um canal-catálogo, patrocínios

exclusivos (como o do antigo Jornal Repórter Esso) e outras formas de inserção criativas que

já estão voltando à moda.

Hoje, já é possível fazer segmentação na Internet, com possibilidade, por exemplo, de

envio de mensagem publicitária de acordo com a região geográfica das pessoas (MELO,

2008, p. 4). Na corrida das emissoras concorrentes para chamar a atenção de um público

dividido entre tantos equipamentos digitais,

A pessoa podia receber propagandas de modo personalizado como acontece na internet quando você compra algo em um site, com e-mail de ofertas. Poderiam receber comerciais personalizados, que confundiria inclusive com a informação. Ou o aprimoramento dos merchandisings (SOUZA, 2008).

Os Set-top Boxes podem oferecer, ainda, alternativa para o usuário montar sua própria

grade de programação. “O 'nobre' do horário nobre será a nossa opinião sobre ele e não aquela

de uma massa demográfica abstrata de potenciais consumidores de um novo carro de luxo ou

detergente para máquina de lavar pratos” (NEGROPONTE, 1995, p. 164).

Uma saída para as emissoras continuarem a arrecadar o sustento de suas produções

seria a experiência de verticalização feita, por exemplo, com o programa Big Brother Brasil

37 Segundo reportagem da Revista Veja, de Marcelo Marthe, até o final de 2006, cerca de 14 milhões de americanos possuíam sistemas digitais como o TiVo. Fonte: MARTHE, Marcelo. A nova era da televisão. Revista Veja, a. 39, n. 36, p. 88-97, 13 / set. 2006.

44

desde a sua primeira edição. Venício Lima, inclusive, usa o reality show como exemplo em

seu livro “Mídia: Teoria e Política”, citando o que a diretora-geral do programa, Marluce Dias

da Silva, afirmou em 2002: “O produto foi desenhado, desde o início, para ser transmitido no

rádio, na internet, na TV fechada e aberta, além de ser promovido através de eventos ao vivo,

concursos em jornais e revistas, venda de trilha sonora e de produtos licenciados (LIMA,

2001, p. 101)”.

Há um novo estímulo à experimentação e busca por fontes alternativas de renda para

as emissoras de TV, além da publicidade tradicional. A interatividade, um dos principais

atrativos da TV digital, junto com a alta resolução, multiprogramação e portabilidade, tem

sido utilizada somente como ponte para oferta de maior espaço publicitário, já que permite a

troca e o envio de informações por meio de um canal bidirecional, ferramenta essencial para

compras via TV. De acordo com Fernando Bittencourt, diretor da Central de Engenharia da

Rede Globo e coordenador do grupo técnico de TV digital da Abert, numa novela, “o relógio

usado pelo ator poderá ser comprado na hora, através do controle remoto. (...) A interatividade

trará uma sensível mudança na forma de assistir TV e na forma de comercializá-la”38.

A publicidade poderá ficar cada vez mais incorporada ao conteúdo dos programas na

TV digital. Poderão ser disponibilizados dados adicionais sobre produtos apresentados e

anunciados, ou sobre o anunciante, telefone de contato, endereço das lojas e outros dados.

Essa situação permitirá uma nova possibilidade de relacionamento com o consumidor, e é

pensando dessa maneira que esse filão deve ser aproveitado pelas agências; assim, todos os

setores ganham.

Ocorre que a televisão tem enfrentado uma situação que teve início há muito tempo

para a indústria fonográfica:

Em 2004, as gravadoras americanas faturaram US$ 12,154 bilhões, uma queda de 16,7% em cinco anos. Em 1999, antes da febre das redes de troca de arquivos na internet, haviam registrado receita de US$ 14,584 bilhões. Ao mesmo tempo, a Apple anunciou, em fevereiro de 2006, que vendeu eletronicamente 1 bilhão de músicas em menos de três anos, desde que criou seu serviço iTunes. A empresa já havia vendido também mais de 15 milhões de vídeos. Um programa de TV custa US$ 1,99 no site da Apple. O sucesso do iTunes mostra como o conteúdo digital pode gerar negócios fora do modelo das empresas tradicionais de comunicação (CRUZ, 2008, pp. 51 e 52).

38 Entrevista de Fernando Bittencourt concedida à repórter Thaís Naldoni. Matéria publicada na edição nº 215 da Revista Imprensa, ano 19, agosto de 2006 (p. 36 a 38).

45

Os veículos de comunicação, principalmente os jornais, construíram seus diferenciais

baseados no princípio de escassez – como a informação era rara, tornava-se cara; como o

mercado oferecia pouco conteúdo, as pessoas pagavam muito pelo acesso. Isso já não

acontece mais. A venda de informação gradativamente poderá passar a fixar seu preço na

filtragem de conteúdo, não no fornecimento. Para Negroponte, a resposta está na criação de

computadores que “filtrem, classifiquem, estabeleçam prioridades e gerenciem os múltiplos

veículos, a multimídia, para nós – computadores que leiam jornais, assistam à televisão e que

ajam como editores quando solicitados” (NEGROPONTE, 1995, p. 25).

Pela forma com que altera nossos conceitos de relacionamento e interação, pelas

mudanças de hábitos, práticas comerciais e não-comerciais, e por todas as possibilidades que

descortinam a nossa própria experiência sensorial e cognitiva, a TV digital é muito mais do

que uma evolução da TV analógica – é uma nova plataforma de comunicação.

3.4 TV digital no cenário da comunicação brasileira

Para melhor entender o contexto em que se insere a implantação da TV digital no

Brasil, o pesquisador Renato Cruz dividiu a trajetória da televisão brasileira da seguinte

maneira: fase da instalação (1950 – 1964), a chegada da televisão ao país com as emissoras

regionais; fase da expansão (1965 – 1984), com a organização das empresas nacionais em

rede; fase da consolidação (1985 – 2002), após a ditadura, firmando a TV como poder

independente, etapa de ascensão e declínio; e fase da convergência (2002 – atual), momento

em a TV estaria em xeque, devido ao confronto do poder econômico das empresas de

telecomunicações e os efeitos da convergência de meios (CRUZ, 2008, pp. 49 e 50).

Essa divisão contribui para melhor entender como se deu o processo de decisão do

governo brasileiro em escolher um sistema de TV digital estrangeiro, com patente de outra

nação, ao invés de desenvolver um sistema nacional, como torciam muitos grupos da

sociedade.

Segundo contam César Bolaños e Valério Brittos no livro “A televisão brasileira na

era digital: exclusão, esfera pública e movimentos estruturantes”, os primeiros debates acerca

da digitalização da TV aconteceram ainda durante o governo do presidente Fernando Collor

de Mello, em junho de 1991, quando foi instaurada a Comissão Assessora de Assuntos de

Televisão (COMTV) pelo Ministério da Comunicação (Minicom). Entretanto, as pesquisas

efetivamente voltadas para os sistemas digitais tiveram início em setembro de 1994, após

46

criação de um grupo técnico, formado pela Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e

Televisão (Abert) e pela Sociedade Brasileira de Engenharia de Televisão (SET), que tinha

como objetivo preparar todos os envolvidos, principalmente empresas, para a digitalização. O

grupo tratou de organizar divisões para estudos específicos de cada área de interesse, como

questões pertinentes à produção, estúdios, avaliações técnicas, transmissão e audiência,

juntando representantes de todas as redes de televisão, engenheiros, fornecedores e entidades

de pesquisa (BOLAÑOS e BRITTOS, 2007, p. 135).

Assim que criada a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel), em novembro de

1997, foi extinta a COMTV, e a agência, além de suas competências, passou a reunir grupos e

a exercer todas as funções da comissão anterior, como a responsabilidade de definir o

processo de implantação da transmissão da TV digital terrestre no Brasil.

O grupo Abert/SET, que começou a estudar a TV digital em 1994, firmou, em 199839,

parceria com a Universidade Mackenzie, de São Paulo, para levantamento de campo e testes

de laboratório, iniciados em 1999 – ano em que a Anatel contratou o Centro de Pesquisa e

Desenvolvimento (CPqD) para análise da metodologia empregada e validação das pesquisas,

planejamento sugestivo e elaboração da regulamentação técnica.

Se a escolha do modelo tivesse sido estritamente tecnológica, ela já poderia ter sido

feita no fim do segundo mandato do presidente Fernando Henrique Cardoso (1999 – 2002),

quando testes dos três principais modelos foram realizados. O Mackenzie apontou, no ano

2000, que o ISDB (nacionalidade japonesa) seria o sistema de melhor performance40;

entretanto, tudo leva a crer que a situação financeira ruim das empresas de comunicação foi o

fator-chave para o adiamento deste anúncio.

O relatório do modelo de referência do SBTVD, elaborado pelo CPqD, apontou o ISDB como o mais caro, do ponto de vista do consumidor. O europeu DVB garantiria ao consumidor os preços mais baratos e o americano ATSC preços intermediários. Um terminal de acesso básico no padrão ISDB sairia 18% mais caro que no DVB e um sofisticado 15% mais caro. O DVB é o padrão mais adotado no mundo, presente em mais de 100 países, o que garante redução de preços dos componentes por meio da escala de produção. [...] Do ponto de vista das exportações, o ATSC seria o melhor padrão, pois os EUA não têm mais indústria local de televisores, importando os aparelhos do México e da Ásia (CRUZ, 2008, p. 91).

39 Dezessete emissoras solicitaram a realização conjunta de testes de campo. 40 Em março de 2001, foi realizada uma demonstração do sistema japonês (ISDB) – fato que nunca aconteceu com as outras duas tecnologias – a 400 pessoas, entre autoridades, empresários, jornalistas, engenheiros e acadêmicos, em evento realizado no Hotel Marina, no Rio de Janeiro.

47

Os modelos europeu e norte-americano passaram os anos seguintes tentando provar as

suas características positivas ao governo brasileiro, num esforço para revelar qual poderia

oferecer mais benefícios caso fosse escolhido. A partir do ano 2000, os modelos foram

aperfeiçoados e seus respectivos sistemas evoluíram. Entretanto, o Brasil não escolheu nada

naquele momento, nem deu continuidade aos testes para uma decisão justa no futuro,

resolvendo a questão somente seis anos depois dos resultados apresentados pela Universidade

Mackenzie – uma eternidade quando falamos da velocidade de evolução das novas

tecnologias.

[...] o entendimento de que o padrão japonês é o melhor para o país é unilateral, já que os testes foram conduzidos por entidades ligadas direta ou indiretamente aos radiodifusores, sem a participação regular de representantes de telespectadores, trabalhadores do setor e movimentos sociais. Houve uma fissura no seio do capital, na medida em que o padrão japonês atende ao empresariado nacional (distribuição de conteúdos), mas não contempla o estrangeiro (fabricantes de equipamentos), que pressionou pelo norte-americano, o que contribuiu para o adiamento da decisão final por três vezes, entre setembro de 2000 e julho de 2002 (BOLAÑOS e BRITTOS, 2007, p. 136).

O sistema brasileiro quase foi anunciado em 2002, mas, por ser ano eleitoral, a decisão

acabou adiada. Em 2003, o então Ministro das Comunicações, Miro Teixeira, apoiou a ideia

de criar um sistema completamente nacional ao invés de implantar uma técnica estrangeira. E,

para comprovar a capacidade dos técnicos tupiniquins, compararia o resultado final com os

três outros modelos. “Foram criados consórcios de pesquisa, mas o dinheiro destinado para

esse trabalho, R$ 65 milhões, nunca foi suficiente. No ano seguinte, com a entrada de Eunício

Oliveira no Ministério, a ideia começou a perder força” (CRUZ, 2008, p. 115). Também há de

se considerar que a exclusividade representaria perda de escala, fator essencial para a

lucratividade e sobrevivência das empresas. Além disso, o governo visava à implantação de

uma fábrica de componentes e semicondutores, o que já seria de difícil barganha com os

outros países, quiçá bancar esta instalação e correr o risco de uma aposta brasileira deste porte

falhar (produção é bem diferente de montagem).

[...] utilizar a decisão sobre o padrão de televisão digital como moeda de troca para conseguir outras vantagens, a exemplo da eliminação de barreiras comerciais a produtos brasileiros no exterior. Além de pouco realista, uma proposta desse tipo acabava por validar a posição norte-americana de tratar a questão cultural como questão de comércio internacional, regulada, portanto, pela Organização Mundial do Comércio (OMC), contra o resto do mundo, especialmente a Europa, que defende a chamada exceção cultural (BOLAÑOS e BRITTOS, 2007, p. 288).

48

No ano de 2004, ocorreu a primeira reunião do Comitê de Desenvolvimento do

Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD), com a participação de dez ministros (Ibid.,

p. 162). O comitê tinha o objetivo de orientar o presidente com informações acerca do tema e

decidir o padrão a ser utilizado. No mesmo ano, também foi criado um Comitê Consultivo

para assessorar o SBTVD e opinar sobre os diferentes modelos de negócio. Foi uma época

marcada por intensos debates no mercado, no governo e nas universidades.

Em 2005, assumiu o Ministério das Comunicações o ex-funcionário da maior emissora

de TV do país, a Rede Globo, Hélio Costa. Foi quando os teledifusores ganharam expressão

dentro do governo. No mesmo ano, tratou de negociar, com os países detentores das

tecnologias de TV digital, o compromisso com a instalação de uma fábrica de semicondutores

no Brasil, pontuando que a escolha do padrão poderia ser também acatada por todos os países

do Mercosul, beneficiando ainda mais o país proprietário do sistema a ser adotado.

O projeto do SBTVD mobilizou os pesquisadores brasileiros e obteve resultados

consistentes, que foram entregues no dia 10 de fevereiro de 2006; os estudos, porém, não

tiveram continuidade, pois não havia mais recursos para financiar a pesquisa (CRUZ, 2008, p.

16). Naquele momento, a situação financeira das redes já era melhor e poderia ser tomada

uma diretriz mais consistente, embora fosse um ano eleitoral. Assim, no dia 29 de junho

daquele ano, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o Decreto nº 5.820, que

definia, dentre as diretrizes da implantação da TV digital no Brasil, o modelo de transmissão

escolhido pelo governo brasileiro: ISDB-T41, japonês.

“A decisão sobre o padrão de TV digital foi uma vitória do poder político das

emissoras de televisão sobre o poder econômico das empresas de telecomunicações” (CRUZ,

2008, p. 15). O padrão japonês, apesar de mais avançado tecnologicamente, posto ser o mais

novo, é o que traz menos vantagens para a indústria local e para o comércio exterior;

entretanto, foi o modelo defendido pelo Ministro das Comunicações, Hélio Costa.

No Brasil, a explicação de que as grandes redes preferem o padrão japonês aos demais porque ele permite o sinal para celulares dentro do canal de TV, evitando a entrada das operadoras celulares no negócio, é somente meia verdade. Ao exigir o padrão japonês, com alta definição, as emissoras buscam garantir um novo canal de 6 MHz na transição, evitando o que aconteceu na Europa, em que a opção pela multiprogramação (vários programas simultâneos de resolução normal em um único canal) permitiu que os governos abrissem espaço para o aumento da competição no mercado televisivo, dando às emissoras menos que um canal inteiro para a transmissão digital e leiloando novas faixas de espectro (Ibid., p. 116).

41 Este “T” simboliza a opção do modelo de transmissão terrestre.

49

Do anúncio do sistema escolhido para compor o SBTVD até a inauguração oficial da

TV digital no Brasil, foi um ano e meio de corrida pela modernização dos equipamentos das

emissoras e dos fabricantes, que tinham de adaptar suas produções. A TV digital foi

inaugurada no dia 2 de dezembro de 2007, em São Paulo, em um evento pomposo, cheio de

celebridades, muito alarde e poucas funcionalidades para o aparelho estreado. A grande

estreia foi da alta resolução da programação de algumas emissoras paulistanas: nada de

multiprogramação, portabilidade ou interatividade.

O sistema de decodificação bidirecional e acessos a serviços interativos de TV é o Set-Top-Box. A pesquisa e desenvolvimento de Set-Top-Boxes Digitais no Brasil tem como objetivo desenvolver um sistema de televisão digital compatível com o sistema atual de televisão (PAL-M), que permita a continuidade da utilização de aparelhos de televisão convencionais por um longo tempo, fornecendo todos os recursos citados anteriormente e que seja superior aos padrões atuais de televisão digital em desenvolvimento nos Estados Unidos, Japão e Europa, além de atender as necessidades do Brasil, assim como ocorreu com o sistema PAL-M frente aos demais (ZUFFO, 2001, pp. 76 e 77).

A única tecnologia desenvolvida pelo Brasil que foi incorporada pelo Sistema

Brasileiro de Televisão Digital foi o middleware do conversor digital (Set-top Box) chamado

Ginga, elaborado a partir da união de projetos nascidos na Universidade Federal da Paraíba

(UFPB) e na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ). O Ginga, que

permitiria a interatividade tão aguardada, não foi lançado na ocasião.

Os conversores disponíveis no lançamento da TV digital em dezembro vieram sem o Ginga, o software de interatividade que é a única tecnologia genuinamente brasileira incorporada ao chamado sistema nipo-brasileiro. As principais emissoras comerciais decidiram que não vão adotar a multiprogramação, com medo de fragmentarem a audiência. O celular com recepção de TV aberta não estava disponível, pois os modelos existentes no Japão não funcionam nas redes brasileiras de telefonia móvel (CRUZ, 2008, p. 18).

O Brasil foi o primeiro país da América Latina a dar início à transição das

transmissões analógicas para as digitais, com finalização prevista para 2016, momento em que

as emissoras deixarão de transmitir o sinal analógico juntamente com o digital (simulcasting).

O investimento por parte do telespectador é muito grande. Olhando para todas as

camadas da população que possuem o tradicional televisor analógico42, a aquisição de um

conversor ou de um novo aparelho de televisão digital representa muito no orçamento das

42 Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 98% da população brasileira possui uma televisão em sua residência.

50

famílias de renda mais baixa. Talvez, quando estiver vencendo o prazo para a suspensão das

transmissões analógicas, o governo brasileiro faça como o dos Estados Unidos43, e ofereça à

sociedade algumas cartas de crédito ou desconto para a compra de Set-top Boxes. A TV

digital exige investimento; contempla um outro equipamento, não aquele que está presente em

90,3%44 das casas brasileiras. Estes elevados índices somente afirmam a familiaridade e

empatia que os brasileiros têm pela televisão. São consumidores potenciais da nova

tecnologia, não certeiros. O processo de implantação da TV digital no país – fato oficialmente

ocorrido somente no final de 2007 –, é resultado de mais de dez anos de pesquisa e espera da

população brasileira, em meio a muitos debates, muita polêmica e pouca ação.

43 Os Estados Unidos foram os primeiros a desligar as transmissões analógicas no mundo, em 2009. 44 Dado da Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (PNAD) do ano de 2004.

51

4 INTERATIVIDADE TÉCNICA E CONTEÚDO

Considerada uma das principais revoluções da TV digital por possibilitar a

bidirecionalidade, em detrimento da unidirecionalidade tradicional dos veículos de

comunicação, a interatividade é o tema deste capítulo, juntamente com o que pode vir a ser o

novo conteúdo televisivo. Para falar de tão abrangente mudança, foi preciso pontuar o que a

interatividade pode ampliar na capacidade televisiva analógica e o que pode proporcionar a

partir da reformulação estrutural da TV, processo que deve influenciar as mediações que

intermedeiam o telespectador e o conteúdo, a interface e a composição das novas narrativas a

serem desenvolvidas.

4.1 Interação e interatividade

Salientada pelas emissoras de televisão como um produto autêntico de seus programas,

principalmente quando do início da TV digital no Brasil, a interatividade parece ter aflorado

na lista de adjetivos da programação com o objetivo de transmitir um ar de modernidade à

produção nacional. Como acontece com muitas palavras, o termo interatividade tem sido

utilizado de maneiras muito diferentes, causando problemas na interpretação de seu

significado, o que torna a expressão aplicável em quaisquer situações que os interessados

considerem adequadas.

O termo ganhou repercussão na última década por representar uma das grandes

mudanças dos meios de comunicação da era analógica para a digital. A relação hierárquica

entre o emissor e o receptor, que transpassava a estrutura unidirecional da comunicação de

massa, vê-se ameaçada por um novo paradigma tecnológico que possibilita a construção de

“novos” meios com sistemas baseados na bidirecionalidade. No livro “Comunicação, mídia e

tecnologia”, os autores Joseph Straubhaar e Robert Larose (2004, p. 14) explicam que

“respostas (feedback) eram em grande parte limitadas a relatórios de pesquisas de audiência,

os quais levavam dias ou semanas para serem criados”.

Dos meios, somente o telefone teria continuado com sua função básica de

comunicação, que liga os indivíduos tornando-os emissores e receptores ao mesmo tempo.

52

As tecnologias de comunicação nasceram bidirecionais, mas acabaram perdendo essa característica por imposição de interesses comerciais associados à produção em escala industrial como o telégrafo, o cinematógrafo, o fonógrafo. O telefone foi o único que não perdeu sua finalidade original de tornar possível o uso interpessoal, dialógico. Pelo telefone recebemos informações e dizemos o que queremos, com autonomia. Isso não acontece com a televisão que é um meio de transmissão para a massa e não comunicação de massa. Nela a não bidirecionalidade é uma questão política e não uma impossibilidade tecnológica (CARMO, 2001).

O rádio, quando foi inventado, partiu de igual pressuposto do telefone e pretendia

exercer essa função dialógica, entretanto não foi encaminhado da mesma maneira. Fernando

Crocomo, um dos poucos autores de livros sobre TV digital do país, explica que o gramofone

foi um dos primeiros desses meios a ser comercializado para uso doméstico, sendo um dos

ancestrais diretos de sistemas de “mão única”, como o rádio e a televisão (CROCOMO, 2007,

p. 52). A determinação tem ambientação histórica, exposta por Matuck:

Os fabricantes de receptores, que viam no rádio um meio de criar um mercado para seus produtos e/ou de utilizar a capacidade produtiva desenvolvida durante a guerra de 1914 – 1918, estavam inicialmente preparados para financiar a teledifusão e para pagar pelos programas; eles ficaram muito satisfeitos ao observar que esta tarefa foi sendo desempenhada por companhias licenciadas ou dominadas pelo Estado, e ficaram igualmente satisfeitos ao observar que o custo dos programas estava sendo pago por taxas de licença dos ouvintes. Em ambos os casos, o Estado estabeleceu um meio de controle sobre o novo veículo de teledifusão e determinou que o sistema não teria ‘feedback’ (HOOD apud MATUCK, 1995, pp. 16 e 17)

Devido ao sucesso do modelo de negócios da mídia eletrônica inaugurado pelo rádio,

um mesmo esquema foi absorvido pela televisão e replicado em todo o mundo como o

modelo “natural” da comunicação de massa, extinguindo completamente a intenção

bidirecional e interativa das primeiras radiotransmissões (MATUCK, 1995, p. 19). Os

pesquisadores César Ricardo Siqueira Bolaños e Valério Cruz Brittos também não deixaram

de mencionar a potencialidade do rádio no livro “A televisão brasileira na era digital:

exclusão, esfera pública e movimentos estruturantes”.

Já nos anos 30 do século XX, Brecht apresentava a questão com toda clareza, ao apontar que “O rádio seria o mais fabuloso aparato de comunicação inimaginável da vida pública, um sistema de canalização fantástico, ou seja, o seria se não somente transmitisse, mas também recebesse, portanto, não permitisse somente ouvir a radioescuta, senão também fazer falar, e não isolar, mas pôr-se em comunicação com ele” (BRECHT apud BOLÃNO e BRITTOS, 2007, pp. 89 e 90).

53

As ideias de Bertolt Brecht, que teria idealizado a interação por meio desses veículos,

foram esquecidas, dando lugar à propaganda e seus modelos econômicos de mercado. Um

sintoma desse estado de coisas é o fato das primeiras teorias da comunicação estarem

preocupadas, principalmente, com a eficiência da transmissão e, posteriormente, com a

possibilidade da manipulação de um público que receberia acriticamente a mensagem das

emissoras. O receptor estava totalmente excluído do processo de produção de significados,

fator muitas vezes criticado por teóricos e pesquisadores da comunicação. “Resulta deste

processo uma confrontação contra as instâncias do poder político, inscritas nas formas

verticalizadas das tecnologias da comunicação programadas para direcionar ideologicamente

a emissão e induzir ao silêncio e à passividade.” (MATUCK, 1995, p. 89). Tentar induzir à,

entretanto, não equivale a obter passividade. Sem esta mudança no olhar do pesquisador, não

há como estudar a nova fase da comunicação digital, que tem sua estrutura baseada em outras

premissas e que deve mudar as teorias da comunicação existentes, gerando outras novas.

O termo interatividade surgiu no contexto das críticas aos meios e tecnologias de

comunicação unidirecionais, por volta da década de 70. A comunicóloga Suely Fragoso

pesquisou sobre a raiz da palavra e encontrou, entre as possibilidades de origem para o termo,

um neologismo do vocábulo inglês interactivity, cunhado para denominar uma qualidade

específica da computação interativa, como uma primeira forma de diálogo entre o homem e a

Unidade Central de Processamento, que depois foi estendida para qualquer relação homem-

máquina e, também, para as relações homem-máquina-homem. No livro “A migração digital”,

Lorenzo Vilches (2003, p. 190) relaciona a difusão do termo interatividade com o universo do

hipertexto – palavra cunhada por Ted Nelson na década de 60. Ambos passaram a fazer parte,

desde então, da estrutura básica comunicacional que comporia o atual cenário das novas

mídias digitais.

Já o conceito de interação – que, segundo Maria Helena Bonilla (2002), é definido

como “as relações e influências mútuas entre dois ou mais fatores, cada qual alterando um ao

outro, a si próprio e também a relação existente entre eles” –, tratado muitas vezes como

sinônimo de interatividade, nasceu em outra ciência (na física), foi incorporado pela

psicologia social e, posteriormente, pela área da computação.

P. Lévy diz que até cerca de 1975 o computador era uma máquina binária, rígida, restritiva, centralizadora, mas que, depois, passou a incorporar a tecnologia do hipertexto, criando interfaces amigáveis. Seria, provavelmente, nessa época de transição da máquina rígida para a máquina conversacional, que os informatas, insatisfeitos com o conceito genérico de "interação", buscaram no termo interatividade a nova dimensão conversacional da informática (SILVA, 2007).

54

Talvez por isso alguns pesquisadores validem o uso do termo “interação” para

contatos humanos e “interatividade” para relações intermediadas por máquinas – como se o

conceito de interatividade estivesse contido dentro do conceito de interação. O próprio

Giovanni Moura de Holanda, da diretoria de TV Digital do CPqD (Centro de Pesquisa e

Desenvolvimento em Telecomunicações), entende interatividade como um conjunto de ações

(e reações) dialogais entre um ser humano e um ente puramente técnico, estabelecendo uma

relação de caráter sociotécnico. Envolveria também a noção de bidirecionalidade, entre um

emissor e um receptor, que alternam os papéis de geração da informação, cujo processo de

negociação resultaria na elaboração de um conteúdo específico (HOLANDA, 2004). Da área

de educação, o pesquisador e sociólogo Marcos Silva explica o contexto no qual o termo pode

ter sido aproveitado e reelaborado:

Inclusive, vale lembrar que o ambiente sociocultural em que se encontravam aqueles informatas era, desde os anos 60, o de contestação à unidirecionalidade opressiva e anti-social, particularmente marcante no contexto comunicacional, em favor da bidirecionalidade. Seria interessante também, para localização do surgimento do termo interatividade, fazer uma incursão pela pop art, uma vez que a idéia de interpenetrabilidade, fusão sujeito-objeto (obra), é característica daquele movimento (SILVA, 2007).

As definições de diferentes áreas se completam e mesmo Alex Primo, pesquisador da

cibercultura, vê a interação como uma ação entre os participantes da relação. E, assim como

Suely Fragoso fez com a interatividade, ele pesquisou sobre a origem da palavra interação:

[...] segundo os estudos em lingüística histórica de Starobinski (2002), não apresenta antecedentes da língua latina clássica. O autor relata que o substantivo interaction figurou pela primeira vez no Oxford English Dictionary em 1832 (apresentado na época como um neologismo), e o verbo to Interact, no sentido de agir reciprocamente, em 1839. Já na França, a palavra “interação” surgiu apenas depois de outro neologismo: “interdependência” (que figurou em dicionário apenas em 1867) (PRIMO, 2005).

Uma palavra nova. Viscente Gosciola, olhando a partir dos estudos no campo das

ciências da comunicação e no campo das novas tecnologias, apóia a ideia de que

interatividade se define como um recurso de troca ou de comunicação de conhecimento, de

ideia, de expressão artística e de sentimento. No livro “Roteiro para novas mídias”, o autor

também apresenta a visão de outros pesquisadores, como Anne-Marie Duguet (que acredita

que a interatividade promove no espectador uma mobilização, um desejo de interferir, de se

55

relacionar com a obra e com os seus personagens), e resumiu o conceito usando a síntese de

Ray Kristof e Amy Satran: “interatividade = comunicação + escolha” (GOSCIOLA, 2003, p.

87).

Esta ideia de escolha também é compartilhada por Ana Silvia Médola e Lauro

Teixeira; em seus estudos sobre TV digital interativa, os autores citam Mark Gawlinski que,

em 2003, definia a TV digital como um diálogo entre os ocupantes dos dois pólos do esquema

comunicacional clássico, emissor e receptor, que levaria os telespectadores para “além da

experiência passiva de assistir e os permita fazer escolhas ou tomar ações – mesmo que as

ações sejam tão simples como preencher um cartão postal e enviá-lo pelo correio, ou desenhar

uma imagem na tela da televisão” (GAWLINSKI apud MÉDOLA e TEIXEIRA, p. 3).

Marcos Silva (2007) também contribuiu para a definição complexa de interatividade.

“Em sociologia e psicologia social a premissa é: nenhuma ação humana ou social existe

separada da interação”, o que faz com que possamos afirmar que a interação sempre existiu na

relação homem-TV. O autor aponta que interatividade tem a ver com a disposição ou

predisposição para mais interação/participação; bidirecionalidade, que diz respeito ao modo

como a comunicação é arquitetada, não existindo mais emissor e receptor, pois ambos

exercem potencialmente esta função de codificar e decodificar; intervenção; permutabilidade

e potencialidade, ou seja, grande quantidade de informações instantâneas e total liberdade

para combiná-las, sendo o usuário quem decide o que vai acontecer, com capacidade de

estabelecer uma narrativa permutativa.

Não há uma definição clara limitando o conceito de interatividade e nem é o intuito

desta dissertação traçar um parâmetro especifico. Muitas teorias trabalham a ideia exposta por

Venício Lima (2004, p. 54), de que interatividade é a possibilidade de interação simultânea

entre emissor e receptor (leitor e/ou espectador). Talvez pensando nessa linha, Straubhaar e

Larose optaram por usar o termo para situações de respostas em tempo real que,

continuamente, modificam a mensagem enviada pelo emissor, eliminando o controle remoto

da lista de ferramentas interativas da TV porque ele não permite modificar a mensagem

assistida, simplesmente trocá-la. Um exemplo de modelo de interatividade modificada em

tempo real passaria pelo modelo de Alan Turing, pelos autores mencionado.

Muito provavelmente, o modelo ideal de interatividade seria um sistema que passasse no chamado teste de Turing, assim nomeado em homenagem ao inglês Alan Turing, matemático e pioneiro da computação. Para passar nesse teste, um sistema de informação deve ser capaz de convencer usuários que estes estão interagindo com um ser humano, não com uma máquina (STRAUBHAAR e LAROSE, 2004, p. 11).

56

Essa questão de convencimento natural, apontada por Straubhaar e Larose, muito tem

a ver com a interface desenhada para o aparelho45. Interface e design são palavras geralmente

ligadas aos computadores, assim como interatividade.

Após a disseminação da internet, logo se pôde perceber que este era um meio que,

desde o seu nascimento, tinha como objetivo ser interativo em um nível muito mais elevado

do que o que era permitido até então. Esses recursos que envolvem mais os receptores na

concepção de conteúdo é o que se pretende transpor para a nova TV digital. Fernando

Crocomo trouxe em seu livro “TV digital e produção interativa” o exemplo dado por

Kerchove para se entender melhor as diferentes funções dos meios e os diversos tipos de

interatividade. “Durante a leitura, as palavras levam o mundo para a mente, onde imaginamos

lugares e pessoas. Na TV, a mente entra nela, no mundo que está sendo mostrado.”

(CROCOMO, 2007, p. 38).

Nessa passagem, Crocomo pretendeu mostrar a possibilidade de a audiência também

participar desse processo que mostra diferentes mundos às pessoas. Isso se daria por meio do

uso de câmeras digitais de vídeo, computadores e softwares para edição, além do acesso à

internet banda larga para cidadãos interessados em transmitir vídeos aos canais emissores

autorizados para tal (o que ainda não aconteceu por meio do mesmo canal de recebimento do

sinal, mas poderá vir a acontecer em breve). É tecnologicamente possível e o país não é

avesso às novas tecnologias, haja visto os caixas automatizados dos bancos e o fato de que

também são brasileiras “as maiores experiências do mundo em eleição eletrônica e em

declaração do imposto de renda via internet. Quanto mais o governo adota os meios

eletrônicos para se comunicar com os cidadãos e oferecer seus serviços, mais se justificam as

políticas de inclusão digital”, como bem diz outro estudioso da área, Renato Cruz (2008, p.

160).

Porém, para o processo de emissão de vídeo, o nível de interatividade da TV digital

deveria garantir um Set-top Box com um potente canal de retorno, de preferência com uma

interface amigável para assegurar fácil compreensão e adesão dos telespectadores da (já

ultrapassada) TV analógica. Na realidade, o que garantiria esse aspecto revolucionário da TV

digital nada mais é do que um computador. “Com o terminal de acesso, vai ser possível

receber o sinal e retornar com informações, como, por exemplo, quando se responde a uma

pergunta em um programa de TV.” (CROCOMO, 2007, p. 66).

45 Fator aprofundado no item 4.3 – Design e interfaces.

57

A interactividade varia de programa para programa, mas o telespectador poderá obter mais informações sobre o programa que está a visualizar, votar em sondagens, enviar mensagens para os apresentadores do programa ou colocar uma questão directamente ao entrevistado de um “talk show” (BERNARDO apud CROCOMO, 2007, p. 70).

Em 1990, o diretor do MIT, George Gilder, já acusava a televisão de ignorar a

natureza humana, baseada na interação. Em suas palavras, “a TV ignora a realidade de que as

pessoas não são inteiramente passivas; dada uma chance, elas respondem e interagem”

(GILDER, 1996, p. 13). Para ele, a interatividade é, quase por definição, uma função do

computador, e não da televisão. A rede de computadores, ao contrário da televisão, iria ao

encontro desta necessidade humana permitindo um relacionamento entre pessoas, sempre na

posição de produtoras de mensagens. A partir do reconhecimento público dessa capacidade

técnica, não há mais lógica que restrinja a emissão a um único centro. “Transformar o

televisor numa combinação interativa de teatro, museu, sala de aula, sistema bancário,

shopping center, correio e comunicador é contrário à sua natureza” (Ibid., p. 177).

Esta característica bidirecional, se aplicada à TV digital, mudaria a função e estrutura

básicas da televisão, transformando-a em outro aparelho, mais próximo da informática do que

da velha TV analógica. Por isso mesmo, Gilder tinha uma visão radical sobre a extinção da

televisão; ele via a TV digital como um equipamento-periférico do computador, não como um

desdobramento da própria TV. Como dito anteriormente, Gilder chamava este aparelho de

telecomputador ou “teleputer”, um computador pessoal adaptado ao processamento de vídeo e

conectado por fios de fibra ótica a outros telecomputadores em todo o mundo.

É possível visualizar e afirmar que essa primeira geração de programas da TVDI [TV Digital Interativa] vai ter como desafio adaptar a velha programação aos novos recursos. Apesar da possibilidade de receber e enviar, o formato um para muitos deve prevalecer. Aos poucos, novos programas devem surgir contando com os novos aplicativos. Tecnologicamente, é possível dizer que a televisão vai ser transformar numa nova mídia (CROCOMO, 2007, p. 155).

A tecnologia da informação, sistema nervoso central dos novos meios de

comunicação, resolveria e criaria novas necessidades humanas. Gilder cita Alan Kiron, um

cientista que assessorava o Escritório de Patentes norte-americano, quando pretende

vislumbrar o futuro por meio das estruturas tecnológicas existentes e suas capacidades

técnicas. Kiron disse, em 1969, que todos os aparelhos seriam interligados por novos meios

que permitiriam interação.

58

[Alan Kiron] cunhou o termo ‘domonetics’ para descrever as interações entre cultura e tecnologia. Combinando as palavras ‘domicile’, ‘connections e ‘eletronics’ [‘domicílio’, ‘conexões’ e ‘eletrônica’, respectivamente], Kiron valeu-se do termo para descrever como os padrões de trabalho e de vida seriam remodelados pelo novo computador e outras ferramentas de comunicações. [...] Vivemos dentro de nossos televisores, computadores e telefones tanto quanto dentro de nossas casas (GILDER, 1996, p. 49).

Artur Matuck compartilhou da mesma opinião, entretanto, deu nomes diferentes para o

mesmo processo em desenvolvimento. Pontuou que o futuro iminente da comunicação

interativa não estava centrado apenas no que chamava de videofone, equipamento pensado

para ser o futuro da televisão e cujo sonho foi um pouco concretizado com o desenvolvimento

da TV digital.

O futuro iminente da comunicação interativa não está, entretanto, centrado apenas no videofone. O mais provável é que cada residência ou local de trabalho seja equipado com um aparato transmediático, um conjunto constituído de um terminal audiovisual controlado por um teclado digital integrado a redes externas de comunicação. Este instrumento será capaz de proporcionar uma ampla gama de serviços computacionais, comunicacionais e videográficos. Estes sistemas integrados têm sido chamados de 'Home Communications Set' e são identificados pela siga HCS. Uma série de serviços básicos serão oferecidos ao usuário destes sistemas: recuperação e transmissão de dados, de materiais textuais e visuais, intercâmbio de materiais impressos através de fac-símile e interação audiovisual através de sistemas de vídeo. Naturalmente, usuários poderão estabelecer 'chamadas' visuais para sistemas similarmente equipados, possibilitando a telepresença (MATUCK, 1995, p. 232).

Sobre a TV digital, Thaís Waisman, pesquisadora da Escola do Futuro, da

Universidade de São Paulo (USP), acredita que o telespectador poderá, no futuro, manter um

certo nível de interatividade com o aparelho que o permita usá-lo como gerenciador de

atividades domésticas, como controlar estoques, alarmes e secretárias eletrônicas

(WAISMAN, 2002).

É importante ressaltar que a interação não existe somente por meio do Set-top Box e

da TV digital. As tecnologias podem potencializar a interação – mas ela sempre existirá,

independentemente da base tecnológica utilizada.46

Além disso, muitos pesquisadores dividem a interatividade em níveis técnicos, que

ajudam a estipular parâmetros comparativos para delimitar a pouca ou muita influência das

46 Diferente das teorias ligadas à Escola de Frankfurt, que destacam os aspectos manipulatórios da TV (até mesmo como reflexo dos acontecimentos da 2a Guerra), existem outras teorias que colocam o telespectador como agente responsável por sua própria compreensão e interpretação das mensagens enviadas pelos emissores; a teoria da mediação, de Jesús Martín-Barbero, bem explica esta participação e interação do espectador (de TV, principalmente), porém a abordagem desta teoria não cabe neste trabalho.

59

pessoas sobre os meios – não necessariamente utilizando-se de aparatos técnicos. Uma das

classificações de interatividade muito exploradas pelas emissoras é a reatividade. Por

exemplo, os telespectadores são condicionados a escolher uma alternativa dentre as opções

oferecidas: uma ação simples com baixo nível de interatividade. O telespectador não tem

outras opções e nem pode sugerir suas preferências, somente optar pelo que foi previamente

programado pelo emissor. No artigo “Mídias digitais e educação: tudo ao mesmo tempo agora

o tempo todo...”, os autores Maria de Fátima Monte Lima, Nelson de Luca Pretto e Simone de

Lucena Ferreira bem lembraram que Arlindo Machado colocava que Raymond Willians, já

em 1979, apontava que “as tecnologias vendidas àquela época, tidas como interativas, eram,

na verdade, reativas, pois os usuários apenas reagiam diante delas, fazendo escolhas de

alternativas já definidas” (WILLIANS, Raymond apud MACHADO, Arlindo apud LIMA et

al in BARBOSA FILHO, CASTRO e TOME, 2005, p. 239). A restrição das atividades pré-

definidas da audiência foi também alvo de críticas por Artur Matuck:

Na medida em que este telespectador desliga o televisor ou muda de canal, está começando a ser ativo em reação a este mídium [sic]. Sua atividade é restrita. Diante do fluxo ininterrupto de mensagens vindas de seu televisor ligado, o telespectador não dispõe de quase nenhum meio efetivo de intervir na programação, quanto mais na mensagem que observa no momento. Sem possibilidade de retroação, sua participação é praticamente nula, a não ser enquanto dado estatístico, numa pesquisa de audiência, que normalmente não serve a seus interesses (MATUCK, 1995, p. 104).

Sobre os níveis de interatividade, Crocomo (2007, p. 82) sugere três divisões bem

concisas. No primeiro nível (chamado por outros pesquisadores de interatividade local), os

dados transmitidos são armazenados no terminal de acesso e o telespectador navega nos

hipertextos47 disponíveis na tela. No segundo, haveria um canal de retorno para envio de

mensagens, mas não necessariamente em tempo real, justamente o que o diferencia do nível

três. Este terceiro nível, que faz brilhar os olhos dos estudiosos de TV – já possibilitado pela

tecnologia atual, mas que se depara com entraves políticos regulamentados por cada país onde

existe a TV digital –, torna real algo que há muito tempo a TV analógica vem tentando

simular: um diálogo.

Este simulacro talvez seja o ponto-chave que garantiu, por tanto tempo, a majestade a

esse meio de comunicação. Sem esta impressão dialógica, que participa da mediação do

próprio espectador – envolvido ativa e não passivamente na trama –, a interatividade

televisiva se resumiria ao controle remoto. Gosciola cita Dieter Daniels quando tenta explicar 47 Definições de hipertexto e suas funcionalidades serão vistas no próximo item (4.2).

60

esta relação dialógica; diz que a comunicação é garantida na web, por exemplo, “quando

deixa para trás a interação homem-máquina para se tornar, novamente, a interação

interpessoal, cujas estruturas são modeladas pela supermáquina da Internet com milhões de

computadores e usuários conectados”, ou seja, no ponto em que a interface some e a

prioridade retorna ao diálogo (GOSCIOLA, 2003, pp. 87 e 88).

A TV interativa não deve ignorar essa relação já existente entre conteúdo e espectador,

e sim fortalecer este laço, oferecendo mais espaço para a audiência participar da programação,

fidelizando mais ainda seu público, que aos poucos tem migrado para o meio que, justamente,

permite-lhe a tal interatividade: o computador.

A busca mais aprofundada e as associações com o que ela precisa não vão ficar tão evidentes. É nesse momento então que velhos conhecidos da família – o apresentador da TV, o jornalista ou o artista – vão ajudar essa pessoa a descobrir os novos caminhos da TVDI. A regra número um então é criar programas que mantenham essa relação de diálogo. É preciso não perder um referencial importante: a TV como ela é hoje. E isso é muito diferente da internet (CROCOMO, 2007, p. 113).

Alex Primo, pesquisador da área de interatividade, simpatiza com a classificação de

Steuer que delimita três fatores contribuintes para a interatividade: velocidade, amplitude

(número de possibilidades de ação) e mapeamento (habilidade do sistema em mapear seus

controles em face das modificações no ambiente mediado de forma natural e previsível)

(PRIMO, 2005). Outros estudiosos também fazem classificações interessantes para elencar

níveis diferentes de interatividade, que vão desde sistemas binários (de sim e não) até

proposições complexas com variadas formas de quantificação. Podem ser divididos, por

exemplo, em experiências triviais e não-triviais (mais complexas e com mais possibilidade de

interferência na mensagem), como citado por Analu Andrigueti em artigo publicado no livro

“Hipertexto, hipermídia: as novas ferramentas da comunicação digital” (FERRARI, 2007, p.

100); também podem ser divididos em reação mecânica e mútua – esta última sobre

modificações recíprocas dos interagentes durante o processo (PRIMO, 2000) –; reativa (com

opções pré-estabelecidas), coativa (com controle de sequência, ritmo e estilo) e pró-ativa

(com controle de estrutura e conteúdo) (AMARAL); interação técnica analógico-mecânica

(ato de digitar em um teclado ou telefone, por exemplo), eletrônico-digital (interferência no

conteúdo em tempo real) e social (relação do homem com o mundo) (LEMOS); interferência

simétrica (diálogo constante entre agentes) e assimétrica passiva (MANZINE apud LEMOS);

61

assim como outras que estipulam diferentes nomes para atingir o mesmo objetivo, elencando

estes variados níveis.

4.1.1 Experiências audiovisuais interativas

Embora a palavra interatividade – e seu uso por vezes indiscriminado – tenha ganhado

destaque nos últimos anos, há muito tempo são estudadas e desenvolvidas ferramentas

interativas. Gosciola relata uma das mais antigas experiências documentadas: ele afirma que a

televisão buscava novidades para concorrer com o cinema e, por isso, a produção das

emissoras passou a investir em TV interativa analógica, experimentada pela primeira vez em

1953, no programa Winky Dink and You, transmitido pela CBS, nos Estados Unidos. “As

crianças telespectadoras desenhavam em papel celofane incolor colocado sobre a tela da TV

para copiar o personagem que dava o nome ao desenho animado.” (GOSCIOLA, 2003, p. 62).

Além deste caráter inovador, a interatividade emergiu como foco de atenção da TV

por possibilitar aumento na receita publicitária. A TV bidirecional possibilitaria compras e

funcionaria como uma espécie de videofone – como citado acima. McLuhan já falava disso

em uma de suas mais conhecidas obras, “Os meios de comunicação como extensões do

homem”.

Os interesses das mercearias há muito que anteviram a possibilidade de compras por meio de uma TV em dois sentidos, ou seja, de um vídeo-telefone. William M. Freeman, escrevendo para Secção de Serviços do New York Times (em 15-10-1963. 3ª feira) relata que certamente haverá 'uma alteração decisiva na distribuição dos veículos de hoje... A Sra. Cliente poderá ligar para várias lojas. Sua identificação-crediário será estabelecida automaticamente através da televisão. Artigos em toda gama de cores fielmente reproduzidas lhe serão mostrados. A distância não oferecerá problemas, já que, pelo fim do século, o consumidor poderá estabelecer ligações diretas, independentemente das distâncias' (MCLUHAN, 2005, p. 247).

Um pesquisador que foi além da televisão e passou a estudar o potencial dialógico do

aparelho, Artur Matuck, elencou uma série de experiências audiovisuais interativas artísticas.

Ele mesmo pontua que, após a popularização do vídeo-cassete, fez-se possível emergir uma

nova plataforma de arte eletrônica crítica à televisão unidirecional. “Os artistas foram os

primeiros a perceber esta potencialidade técnica da televisão, construindo sistemas nos quais o

espectador se encontrava implicado na obra” (MATUCK, 1995, p. 135).

62

Allan Kaprow entrou para a lista de Matuck dos artistas que mais incentivaram a

criação da TV digital desde a década de 60. Ele criou um evento, em 1969, intitulado Hello48,

onde projetou um esquema que envolvia quatro lugares diferentes (o Instituto de Tecnologia

de Massachussets, um hospital, uma biblioteca educacional e um aeroporto), com, ao todo, 27

televisores interconectados por cinco câmeras que enviavam sinais para uma emissora de TV.

O desenvolvimento do projeto consistia em projetar as imagens de pessoas que estivessem em

um local para os outros e, se as pessoas que estivessem vendo aquelas imagens, por exemplo,

conhecessem o interlocutor, poderiam responder utilizando-se do mesmo sistema. A TV era,

então, encarada como videofone. Kaprow estava estabelecendo uma ligação pessoal e social

entre os presentes (Ibid., p. 195).

A utopia da televisão interindividual imaginada, ainda em 1974, por Flusser, está em vias de se materializar através do videofone, uma forma recente do fenômeno televisão. O videofone – uma televisão bidirecional e interindividual – desenvolve-se a partir da utilização da rede telefônica para o intercâmbio de informações audiovisuais codificadas em sinais digitais (Ibid., p. 230).

Essas experiências foram levadas à TV no ano de 1971, quando Douglas Davis

convidava os telespectadores a participarem livremente pelo telefone do programa Electronic

Hokkadin, transmitido de Washington pelo canal WTOP TV. Em 1975, Fred Forest realizou

ação semelhante, com o objetivo de transmitir a possibilidade de participação do receptor no

processo televisivo.

Numa primeira emissão, em 29 de março de 1975, Forest lançava um apelo ao telespectador para que lhe enviasse um objeto, a foto ou um desenho deste objeto. Na segunda emissão, em 12 de abril, a totalidade dos objetos enviados foi exibida na tela. Os telespectadores eram então convidados a entrarem diretamente em contato com aqueles que enviaram objetos para que um intercâmbio tivesse lugar ao vivo. No entanto, a terceira emissão, programada para 19 de abril, foi interditada (Ibid., p. 203).

Outro interessante trabalho é o Television Delivers People, de Richard Serra, datado

de 1973, que critica a TV ao extremo, tendo-a como veículo institucional, comprometida com

o Estado e com o sistema capitalista, oferecendo ao espectador uma oportunidade de refletir

acerca de sua própria função. É apresentada uma sequência ininterrupta de frases – sem

imagem nem som, ou seja, o contrário do que é a TV. “O produto da televisão comercial é a

48 Segundo Artur Matuck (1995, p. 194), este foi o primeiro evento a conceituar e a instituir a comunicação interativa através de sistemas de televisão.

63

audiência. É o consumidor que é consumido. Ele consome a você. Você é o produto da TV.”

(Ibid., p. 184).

Segundo os estudos de Matuck, Frank Gillette e Paul Ryan estão entre os primeiros

artistas a criarem processos interativos em vídeo, com a participação do espectador. Ryan

inovou ao apresentar sua TV Confessional em galerias, no ano de 1974, colocando o

espectador diante de si mesmo.49 Gillette também criou Wipe Cycle, considerado um dos

primeiros trabalhos de televisão interativa e, segundo o autor, possivelmente a mais

importante obra apresentada na exibição TV as a Creative Medium, por instituir o uso criativo

e libertário do feedback instantâneo (Ibid., p. 169).

Ainda que artistas como Paul Ryan, Frank Gillette e Ira Schneider não investigassem propriamente a teletransmissão, seus trabalhos indicaram possibilidades inéditas da televisão. Através de videoinstalações interativas, o espectador pôde se ver refletido na tela, experienciando a possibilidade de participar, de estar incluído e não excluído da televisão (MATUCK, 1995, p. 178).

Peter Armstrong, que trabalhava na BBC de Londres, acreditava que os videodiscos

interativos seriam o futuro da televisão, pois permitiriam ao espectador não somente

selecionar o programa, mas intervir no seu desenvolvimento, já que, possuindo um número

maior de informações que um programa normal, o espectador poderia optar por caminhos

alternativos (como escolha de câmera, velocidade) (Ibid., pp. 218 a 221). Armstrong chegou a

criar um sistema chamado TRANSIT (Transmitted Interactive Television).

Há pouco tempo, Fernando Crocomo atuava em um projeto no sul do país para

permitir algumas comunidades produzirem vídeos e aparecerem em uma televisão interativa.

Em 1984, o sistema HI-OVIS (Highly Interactive Optical Visual Information Systems), que

funcionou no Japão, combinava computador, linhas de transmissão óticas e terminais

residenciais audiovisuais com teclado, televisor, uma câmera preto-e-branco e um microfone,

todos conectados a centros específicos que poderiam oferecer retransmissão de programas,

transmissão de programas solicitados, transmissão de imagens estáticas e informação textual

relevante (Ibid., pp. 221 a 223).

Renato Cruz afirma em seu livro sobre TV digital que a primeira experiência

comercial da TV interativa, por meio de um sistema a cabo bidirecional chamado Qube,

aconteceu em 1977, em Columbus, Ohio (EUA). O Qube, pertencente à Warner 49 Neste projeto, a pessoa vai até um confessionário, ajoelha-se, aciona uma trilha de áudio apropriada e se confessa, enquanto seu rosto é gravado; após isso, circunda o confessionário, senta-se no lugar do padre e assiste à sua própria confissão. Uma ação simples se pensada nos dias atuais, mas visionária e ousada à época.

64

Communications (que teria investido entre US$ 12 milhões e U$S 20 milhões), permitia ao

telespectador selecionar filmes disponíveis em nove canais diferentes e solicitar a exibição

deles mediante pagamento (um embrião do que hoje é conhecido como pay-per-view50). O

serviço também permitia às pessoas opinarem sobre assuntos da prefeitura pela TV, fazer

reservas em hotéis e restaurantes, interferir no programa de ficção Lulu Smith, usar serviços

bancários, alarme residencial, ler o jornal local na tela da TV e ainda assistir a cursos,

inclusive com créditos reconhecidos por universidades. Com o preço de US$ 10,95, a

princípio o serviço foi assinado por 31 mil pessoas e, em 1981, foi estendido para mais seis

cidades, chegando a atingir 350 mil residências – mas a demanda massiva era pelo pay-per-

view. “Em um mês, somente um quarto dos clientes assistia a qualquer programa interativo.

Em 1984, o Qube oferecia somente 90 minutos por dia de programação interativa. Dois anos

depois parou de funcionar” (CRUZ, 2008, p. 75). O autor ainda coloca que, em 1994, a TCI

tentou ainda instalar no Brasil um sistema semelhante, Interactive Network, investindo U$S

30 milhões. Dois anos depois, entrou em concordata.

O fato de que as pessoas não se sentiram motivadas a interagir em algumas poucas

experiências interativas que aconteceram antes da digitalização da TV e de sua efetiva

expansão não passou despercebido por George Gilder. Segundo ele, o projeto Cerrito,

lançado em meados da década de 80, representou o primeiro teste completo de serviços

interativos, com vídeo sob demanda, banco, compras e jogos (GILDER, 1996, p. 173) e,

mesmo com toda expectativa inicial, as pessoas não foram mobilizadas em um número

significativo que representasse seus anseios por este tipo de funcionalidade.

Os investimentos na interatividade realmente começaram a partir da segunda metade

dos anos 80, quando a indústria despertou para a digitalização dos meios de comunicação e a

TV digital passou a ser alvo de estudos dos países que detêm hoje esta tecnologia. O Brasil

também foi alvo de investimentos com o intuito de proporcionar interatividade às pessoas,

mesmo com uma TV analógica, como o videotexto. O videotexto era um serviço pago que

dependia da instalação de linhas telefônicas para o seu funcionamento, em uma época onde a

dificuldade para obtê-las era bem maior.

O jornal O Estado de S. Paulo o descreveu assim, em 18 de maio de 1980: ‘É um novo tipo de jornal eletrônico, na TV, com informações de utilidade pública, notícias locais e internacionais, horários de aviões, programação de cinema e teatro, roteiro de restaurantes, sugestões para o fim de semana, anúncios, reserva

50 Pay-per-view é um serviço que permite ao assinante adquirir uma programação específica, comprando o direito de assistir a determinados eventos, filmes ou programas, de acordo com o “pacote” adquirido.

65

de hotéis e até vendas diretas. Até agora seis países começaram a utilizar esse serviço: Inglaterra, Suíça, Canadá, Alemanha Federal, França e Estados Unidos. O Brasil será o sétimo’. Em novembro de 2003, a Telefônica começou a desativar esse precursor da internet, depois de duas décadas de operação comercial. Primeiro serviço de comunicação de dados para um público amplo a ser lançado no país, o videotexto nunca se massificou (CRUZ, 2008, p. 76).

Vicente Gosciola encontrou outra referência importante do audiovisual interativo que

contextualiza o nível de interesse e desenvolvimento do setor na década de 90. Segundo ele,

em 1995 foi lançado o primeiro filme em cinema interativo, chamado Mr. Payback, escrito e

dirigido por Bob Gale. O filme passou em 25 salas adaptadas com poltronas dotadas de botões

e joysticks que permitiam controlar o rumo da história por meio da decisão da maioria das

pessoas presentes (GOSCIOLA, 2003, p. 60).

A primeira TV digital interativa da América Latina veio em dezembro do ano 2000,

quando a DirecTV passou a oferecer jogos, serviços bancários, previsão do tempo, correio

eletrônico, informações sobre beleza, gastronomia e astrologia, além do Playin’TV, a maior

biblioteca de jogos até então criada. Em 2004, a DirecTV nacional já possuía um vídeo

recorder que permitia até oito horas de gravação de programas por dia51.

Em 200252, outra operadora, a Sky, lançou seu serviço de TV interativa, chamado

Mosaico ITV, que oferecia quase as mesmas funcionalidades acima descritas mais o t-

commerce – serviços de compra de produtos e serviços pela TV (apertando um botão você

acessa um software de vendas específico e pode realizar uma compra pela televisão). No ano

seguinte foi lançada a Sky+, que agregava aos aparelhos ferramentas para a gravação de

programas, além da opção de pausar a programação e, depois, continuar a assistir

normalmente (BOLAÑO e BRITTOS, 2007, pp. 202 e 203). Essas duas funções representam

grandes mudanças na foram de se assistir a televisão. Uma das mais populares marcas de

gravador de vídeo digital é a TiVo53, que permite suprimir todos os comerciais da TV, gravar

a programação, pausar ou mesmo avançar.

A pesquisadora Ana Vitória Joly confirma que a DirecTV e a Sky são responsáveis

por proporcionar as primeiras experiências interativas do Brasil. Na época, a televisão aberta

51 Atualmente este serviço não é mais oferecido pela DirecTV. 52 Nesta época, as emissoras de TV aberta nacionais já estavam investindo em pesquisas acerca da interatividade. Um pensamento mais interativo foi desenvolvido no lançamento e acompanhamento do programa Big Brother Brasil, transmitido no país pela Rede Globo. O programa foi desenhado para ser veiculado de formas diferentes em diversas plataformas e meios de comunicação. A corrida criativa por inovações que atraiam as pessoas, com atenção cada vez mais dividida pela grande quantidade de mídias oferecendo informações, é marcada por uma tendência ao marketing direto. Em entrevista à Revista Veja, em 2007, o publicitário Nizan Guanaes cita o filme Náufrago como exemplo: nele, a Fedex e uma bola de vôlei da Wilson não são anunciantes, mas fazem parte da história. 53 Em 2006, mais de 14 milhões de norte-americanos possuíam o gravador digital TiVo.

66

engatinhava na área de TV digital e precisava do apoio de outras mídias para efetivar a

interatividade. O gênero reality show é um bom exemplo – ele se serve de recursos da

internet, da telefonia fixa e móvel, entre outros.

As redes de cabo mais modernas são bidirecionais, podendo transportar informações da casa do assinante ao headend (central processadora de sinal), o que permite seu uso para sistemas interativos, como acesso à internet e TV interativa, entre outros. Nas redes unidirecionais, esses serviços dependem de que o retorno do sinal se efetue por um modem convencional através da linha telefônica. Tal problema tem sido contornado através da combinação do televisor com outra forma de transmissão, como o telefone fixo ou celular, ou através de uma conexão à internet, sendo crucial para o desenvolvimento sistema, pois, equacionado o problema do canal de retorno, os serviços interativos serão o principal apelo da televisão digital (BOLAÑO e BRITTOS, 2007, pp. 27 e 28).

O Brasil recebeu, em 2003, a TV Escola Interativa, lançada em Brasília – uma parceria

do governo federal e da Universidade Mackenzie que perdeu a força nos últimos anos. Era um

sistema de televisão via satélite que armazenava dias de programação, gravava os programas

em CD e permitia ao telespectador participar de cursos à distância e interagir por meio de um

controle remoto e de uma conexão pela rede telefônica. O sistema atingia 18 escolas públicas

em sete estados diferentes (CRUZ, 2008, pp. 170 e 171).

Em outros países, onde as pesquisas nesta área começaram há tempos, serviços

interativos são oferecidos há quase dez anos. Segundo a portuguesa Célia Quico, somente no

primeiro semestre de 2002, a BBC produziu 57 serviços interativos. Em 2003, o Reino Unido

possuía a maior taxa de penetração da TV digital de toda a Europa: 50,2%. No Brasil, em

2009, mesmo considerando a extensão do território nacional, ainda estamos bem distantes

desta porcentagem.

Os melhores serviços de Televisão Digital e Interactiva podem ser mais populares do que os próprios canais de televisão, como é o caso do portal de jogos PlayJam que atraiu em média 250.000 espectadores por dia, através do operador de Sky Digital em 2002. [...] situando-se entre o oitavo e o décimo quinto canal mais visto na Sky Digital [...] Alguns programas interactivos atraem uma vasta proporção os espectadores, como foi o caso de Wimbledon 2001 e 2003 da BBC, que deu a possibilidade aos espectadores de seleccionarem e acompanharem os desafios de tênis do torneio que decorriam em simultâneo – cerca de 50% dos espectadores da BBC com Sky Digital utilizaram esta funcionalidade. Ainda, em Julho de 2002, 3,8 milhões de espectadores acederam à aplicação interactiva dos jogos do Mundial de Futebol para aceder a multi-câmeras, a diferentes canais de áudio (comentários e som do estádio) e repetições dos jogos (QUICO, 2004).

67

O modelo de negócios do Sistema Brasileiro de Televisão Digital (SBTVD), embora

continue impondo a programação gratuita, deixa brechas para que os serviços de

interatividade sejam cobrados, principalmente devido ao custo do canal de retorno, pois em

geral as emissoras não possuem estrutura nem know-how – e, ainda que possuíssem, não têm

autorização para comercializar esse tipo de serviço.

[...] os três padrões existentes comportam ainda serviços e recursos complementares, quais sejam áudio adicional (original e dublagens), legenda adicional (em idiomas diferentes), vídeo adicional (cenas em ângulos diversos), ajuda para deficientes físicos (linguagens de sinais ou legendas em texto), hipermídia (busca de conteúdos ampliados sobre um tema tratado), informativo (transmissão contínua de dados metereológicos, financeiros etc.) e gravação de programas (diretamente no televisor, através de carga remota) (BOLAÑO e BRITTOS, 2007, p. 97).

Como dito anteriormente, Gilder aponta duas visões interessantes sobre o futuro

digital, baseadas nas capacidades e exigências de performance dos equipamentos. A primeira

é do Media Lab, do MIT, que tinha uma visão de que as mídias digitais do futuro seriam um

“Diário de Mim”, pessoais e personalizados, com informações filtradas por um agente

eletrônico programado aos interesses do indivíduo. A segunda visão, de Filder, englobava um

“Diário de Nós”, forjado por editores humanos, não digitais (GILDER, 1996, p. 132).

Além das funções já colocadas, a digitalização permite: disponibilizar serviços de TV

sob demanda, com solicitação de programas específicos em qualquer horário; TV

individualizada, que engloba questões de mudança de câmeras pelo telespectador,

personalização da interface, entre outras funções de estilo; acesso à internet, entre outros

serviços desenvolvidos para a TV digital interativa.

Ana Silvia Médola e Lauro Teixeira ainda apontam categorias de funções interativas

levantadas pelo pesquisador Mark Gawlinski: “TV interativa pode ser composta de: Guias de

Programação Eletrônica (EPG), Teletextos, Walled Gardens, Internet na Televisão, TV

Expandida, Videos Sob demanda (VOD) e Personal Video Recorder (PVR)”. Este último, já

popular nos Estados Unidos, permite que os telespectadores se orientem pelo conteúdo dos

programas, não mais pelo horário em que são passados (não haveria mais o chamado “horário

nobre”), pois oferecem opção de gravar canais (inclusive programando-os à distância, via

computador), com ou sem os comerciais. Negroponte (1995, p. 168) diz que não se trata de

“cada filme caseiro vir a tornar-se um programa de horário nobre. Mas podemos agora pensar

nos meios de comunicação de massa como algo bem maior do que a TV profissional e de

altos custos de produção”. O autor acredita que esses Set-top Boxes, também gravadores de

68

conteúdo audiovisual, deveriam receber bits (sinais digitais) e filtrá-los de acordo com seus

interesses programados, como se o telespectador pudesse “puxar” os bits, não recebê-los

somente.

O conceito deste filtro vai muito além do que as empresas hoje oferecem. Para ele, seu

gravador lhe diria quando chegasse em casa: “Nicholas, enquanto você esteve fora, eu vi 5 mil

horas de televisão e gravei seis segmentos para você, totalizando quarenta minutos. Seu

colega de ginásio apareceu no Today, houve um documentário sobre as ilhas Dodecaneso,

etc” (NEGROPONTE, 1995, p. 168).

Um dos principais fatores-chave que explicam toda a expectativa em torno da TV

digital é o canal de retorno:

A interatividade na TV Digital, por sua vez, está em geral relacionada a dois fatores: com e sem canal de retorno. Quando não há canal de retorno, o usuário recebe em seu aparelho um pacote de aplicativos e pode dispor da escolha e formatação do conteúdo que consome por meio de alternativas que o emissor propõe. Ex: câmeras, informações extras relacionadas ou não ao programa, formatos extensivos de publicidade, guias de programação, etc. Em um nível ainda mais interativo, com canal de retorno, o usuário pode ter um meio com possibilidades similares às das mídias dialógicas, participando efetivamente da comunicação e contribuindo para a formação dos valores. Ex: envio de mensagens e até mesmo vídeos aos emissores, jogos on-line, comunicação com governos e bancos, etc. Além de todos os recursos que uma possível conexão com a internet proporcione (MÉDOLA e TEIXEIRA, p. 13).

O canal de retorno pode ser disponibilizado utilizando tecnologias como a rede de

telefonia fixa e móvel, sinais de radiofrequência e ainda a promissora PLC (Power Line

Communications), que consiste na transmissão de internet banda larga via rede elétrica – em

vias de ser implantada no Brasil (autorizada no final de agosto de 2009). A PLC ainda não foi

amplamente testada, mas tem um grande potencial, haja vista que cada tomada pode ser

transformada em um ponto de acesso à internet. Segundo Renato Cruz, é uma tecnologia

bastante significativa, principalmente porque, no Brasil, 94% das residências têm energia

elétrica. “Várias distribuidoras de energia, como a Eletropaulo (SP), CEEE (RS), Celesc (SC),

Celg (GO), Cemig (MG), Copel (PR), Excelsa (ES) e Light (RJ), fizeram experiências com

PLC” (CRUZ, 2008, p. 172).

A banda larga, sistema de transmissão digital de dados, além de servir de canal de

retorno para a TV digital, disponível geralmente nos Set-top Boxes, pode adquirir outra

funcionalidade. A TV via Internet Protocol (IPTV) quebra alguns conceitos enraizados na TV

analógica, além de proporcionar facilidades que englobam a interligação com outros

69

aparelhos da casa, como computador, telefone fixo e móvel – podendo este servir de controle

remoto.

Ao contrário da TV a cabo, na qual os clientes recebem todos os canais ao mesmo tempo, e a seleção é feita no decodificador ou no televisor, o cliente da IPTV recebe um canal por vez. [...] Isso cria uma capacidade quase infinita de canais e, como a televisão está ligada a um meio interativo, permite o vídeo sob demanda, acabando com o conceito de grade de programação [...] O cliente pode identificar quem está ligando na tela da TV ou transferir música, vídeo e fotos do computador para o televisor. O sistema da Microsoft e da Alcatel foi contratado pela americana SBC Communications. No Brasil, foi testado pela Telemar [...] Em 2005, a Telemar iniciou um piloto, para funcionários, no Rio de Janeiro, onde testou quatro plataformas tecnológicas. (CRUZ, 2008, pp. 53 e 54).

Segundo Renato Cruz, em 2006 eram 500 mil clientes de IPTV para somente duas

empresas, a PCCW, de Hong Kong, e a francesa Free. O autor coloca a Brasil Telecom (BrT)

como a primeira a lançar IPTV no país, em 2007, na cidade de Brasília – mas, por restrições

legais, estariam disponíveis somente vídeos sob demanda (VOD). Bolaños e Brittos trazem

outra informação, de que a pioneira do serviço no Brasil é a IP.TV, da Universidade Virtual

do Maranhão (Univima), operando desde 2003. Com todas estas vantagens, fica muito difícil

a competição da TV digital com a IPTV; entretanto, a tecnologia de IPTV precisa de uma

potente banda larga nacional, o que ainda é muito caro, por isso mesmo a TV digital saiu na

frente na corrida pela sobrevivência das tecnologias.

A impressão que o cenário evolutivo da TV digital passa, principalmente quando

olhamos a tecnologia sob o ponto de vista da interatividade, é que ela seria um display anexo

ao computador. Uma tecnologia descendente do computador, e não evolutiva da TV analógica

– a única semelhança entre ambas é que trabalham com conteúdo audiovisual. “O crescimento

dos computadores pessoais está acontecendo com tamanha rapidez que a televisão de

arquitetura aberta do futuro é o PC, e ponto final [...] E, contudo, seja lá como for que você o

encare, esse aparelho continuará sendo um computador” (NEGROPONTE, 1995, pp. 51 e 52).

Entretanto, é importante pontuar que, em larga medida, os gêneros e a estrutura da

programação permanecem os mesmos, acrescidos apenas de novas funcionalidades ao

programa existente. As novas ferramentas interativas, então, tenderiam muito mais a

acrescentar opções para o telespectador do que mudar algum elemento deste processo que não

fosse a potencial ampliação da qualidade interativa da audiência.

70

4.2 Hipertexto e hipermídia

Interatividade supõe outros temas. Hipertexto e hipermídia são duas palavras

intrínsecas à composição do conjunto de imagens e conceitos que vêm à mente quando

pensamos em interatividade.

Um dos primeiros pesquisadores a esboçar a estrutura do que seria, conceitualmente, o

hipertexto, foi Vannevar Bush, engenheiro e político, inventor do Memex (Memory

Extension) – um equipamento precursor do computador, composto por microfilme e células

fotoelétricas, que armazenava dados e permitia formação de elos entre eles (LEÃO, 1999, p.

19). No artigo “As we may think”, de 1945, ele dissertava sobre o funcionamento dos

sistemas tradicionais de indexação, organização e troca de informações que, por serem

estruturados em uma ordem hierárquica, não estavam de acordo com o pensamento natural

humano, que trabalha por associação e, por isso, não eram muito eficientes.

Quem inventou os termos hipertexto e hipermídia, efetivamente, em 1963, foi o

filósofo e sociólogo estadunidense Theodor Nelson, que considerava o primeiro um conjunto

de escritas associadas não-sequenciais, com conexões possíveis de se seguir e oportunidades

de leituras em diferentes direções (NELSON, 1992, p. 161 apud LEÃO, 1999, p. 21). O

conceito surgiu após o desenvolvimento do projeto Xanadu54, em 1960, “uma rede de fácil

acesso em que documentos estariam disponíveis em formato eletrônico” e que seriam

modificados colaborativamente com seus créditos respectivos – “um sistema de direitos

autorais e escrita não-sequencial”, segundo o pesquisador Renato Cruz. A palavra hipertexto

foi mencionada pela primeira vez em um paper apresentado por Theodor Nelson na

conferência de 1965 da Association for Computing Machinery, a ACM (CRUZ, 2008, p. 81).

Lúcia Leão bem define o hipertexto como um documento digital composto por

diferentes blocos de informações interconectadas, amarradas por elos associativos, os links,

que permitem ao usuário navegar pelo documento na ordem que desejar, inclusive por meio

de buscas. “Além do modelo hipertextual baseado no binômio 'elos & blocos de textos',

existem sistemas com outros tipos de estruturas interativas (relações, séries, série de Petri,

etc). Através dessas estruturas interativas, o leitor percorre a trama textual de uma forma

única, pessoal” (LEÃO, 1999, pp. 15 e 16).

54 Theodor Nelson nunca havia conseguido concretizar o Xanadu. O processador de dados tinha capacidade de lidar com versões múltiplas de documentos e mostrar as diferenças nas versões, mas não tinha capacidade de armazenamento e processamento de dados.

71

Em outras palavras, o hipertexto remeteria a um texto em formato digital, composto

por links que levariam a outros conjuntos de informações. Já a hipermídia diferencia-se dele

pelo conteúdo do documento. O hipertexto, contido no conceito de hipermídia, contém apenas

informações textuais, enquanto a hipermídia pode trazer outros tipos de dados adicionais,

incluindo imagens, vídeos ou gráficos.

Dependendo do autor, o conceito de link recebe nomenclaturas diferentes, tais como

“elo, vinculação, jump, conection, conexão, interconexão, linking, nexo, inter-relação, cross

reference, association, path e trail (mais utilizados para significar uma coleção de links),

caminho, hotlink, hotword, hyperlink, atalho etc” (GOSCIOLA, 2003, p. 79). O link, vínculo

digital que define a interatividade e determina o modo pelo qual serão disponibilizados os

conteúdos aos usuários, liga blocos de informações que são chamados de lexias, termo criado

por Roland Barthes.

Esse vocábulo [lexia] foi retomado por Landow (1992:3-4, 40 e 52) como sendo o ponto onde se está antes de seguir um link. Outros autores preferem usar a denominação nó. De qualquer forma, ambos os termos correspondem às unidades básicas de informação. Uma lexia pode ser formada por diferentes elementos, tais como textos, imagens vídeos, ícones, botões, sons, narrações, etc (LEÃO, 1999, p. 27).

O hipertexto/hipermídia seria um conjunto desses nós, com significações diversas,

conectados por fotos, palavras, gráficos, sons e outros. Os links são justamente as ferramentas

que possibilitam as ligações entre lexias, o que pode ser feito de maneira não-linear55, dando

uma complexidade às relações digitais mais próximas ao modo de pensar humano complexo e

acêntrico56, pois a liberdade de navegação seria uma equação não-linear, com as variáveis

tendendo a soluções infinitas.

É impossível prever as escolhas que o usuário irá efetuar [quando se cria um aplicativo em hipermídia], cabendo ao artista ou diagramador do projeto a função de traçar caminhos permutacionais, criar portas e pontes de acesso. No caso das visitas à Web também: o usuário percorre os nós da rede de uma forma totalmente imprevisível, muitas vezes até para ele próprio. São tantos os fatores que interferem no caminho a ser percorrido na Net, que pode-se afirmar que estamos também diante de uma hipercomplexidade (LEÃO, 1999, p. 57).

55 Linearidade compreende um sentido único e contínuo, existente em uma única ordem. Lúcia Leão comenta que “o conceito de não-linearidade deriva da matemática e tem sido empregado de uma forma bastante frequente, quando se fala de sistemas complexos dinâmicos. Hoje está totalmente fora de contexto alguém pensar que o todo é uma simples soma de suas partes (LEÃO, 1999, p. 57). 56 Damásio diz que o organismo, por exemplo, interage com o ambiente como um conjunto e que as operações fisiológicas que denominamos por mente derivam desse conjunto estrutural e funcional, e não apenas do cérebro (DAMÁSIO, 1996, p. 17 apud LEÃO, 1999, p. 72)

72

Deleuze e Guatari criaram o conceito de rizoma, aplicado em obras impressas, e que

foi utilizado para a internet e, principalmente, para referenciar hipertextos eletrônicos por

muitos autores. O rizoma representa uma ruptura; pode ser quebrado em um lugar qualquer,

mas se retoma como um modelo de crescimento orgânico que não precisa seguir hierarquia de

informação e é interceptado e ramificado de forma que todas as entradas, meios e

extremidades funcionem como uma comunicação em rede (DELEUZE e GUATTARI, 1995,

p. 18 apud LEÃO, 1999, p. 71). Segundo artigo de Urbano Nobre Nojosa, uma obra

rizomática possui princípios de diversidade e multiplicidade, quando pensamos na construção

coletiva da subjetividade, que extrapolaria a subjetividade do autor (NOJOSA, Urbano in

FERRARI, 2007, p. 74).

[...] a textura híbrida da hipermídia entrelaçou a sociedade pós-moderna em uma hierarquizada replicação rizomática de Deleuze, que foi capaz de prever a desterritorialização da escrita, saindo de um regime maquínico – com o livro e a imprensa como seus maiores expoentes – e torna-se um rizoma orgânico na web (FERRARI, 2007, p. 79).

O fenômeno rizomático pode ser percebido na web, onde a organização pressupõe a

ordem e a desordem, ao mesmo tempo que percebe o caminho, em uma linha de tempo

paralela, estabelecida pelo leitor.

[...] facilmente observado nos percursos da leitura hipertextual, supondo um leitor bastante ativo, que vá descrevendo movimentos bastante complexos ao ir saltando de um elo a outro da rede. Apesar dessa desordem de percurso, desse trajeto complicado, uma ordem oculta está presente. Essa ordem pode ser reencontrada através do comando history, que refaz sua trajetória. […] (LEÃO, 1999, p. 71).

Para Vicente Gosciola (2003, p. 34), a hipermídia vai além da multimídia, que lida

com texto, imagem e som, por dar ênfase à interatividade e ao acesso não-linear. “Seria como

a TV que oferece apenas a possibilidade de mudar de canal, alterar o volume do som, alterar a

cor e o brilho”. Com a digitalização, a TV deixaria de ser multimídia e passaria a ser

hipermídia – para o autor, um processo comunicacional que depende do relacionamento entre

seus diversos conteúdos e o usuário. Ele também compartilha da opinião de Laufer e Scavetta,

de que hipermídia é:

[…] o conjunto de meios que permite o acesso simultâneo a textos, imagens e sons de modo interativo e não-linear, possibilitando fazer links entre elementos de mídia, controlar a própria navegação e, até, extrair telas, imagens e sons cuja sequência constituirá uma versão pessoal do usuário... Por sua vez, Michael Joyce

73

cita o 'teórico em hipertexto' Don Byrd, que descreve o que é hipermídia: é quando conteúdo de hipertexto é ampliado com som digitalizado, animação, vídeo, realidade virtual, banco de dados (Ibid., p. 23).

Da mesma forma como autores estipularam diversos níveis de interatividade, de forma

a classificá-la, Swain e Swain também o fizeram com o conceito de hipermídia. O nível um

permitiria interferências simples como as ações de play, stop, fast forward e reverse; o

segundo traria botões programados para serem utilizados em momentos específicos de um

programa; já no terceiro seria possível todo tipo de acesso e controle sobre uma obra

interativa (SWAIN E SWAIN apud GOSCIOLA, 2003, pp. 85 e 86).

A não-linearidade não seria, especificamente, uma novidade surgida com os

hipertextos e hipermídias. As editoras de livros já tinham trabalhos neste sentido, mas que

funcionavam de uma maneira mais organizada. Em seu livro, Lúcia Leão lembra que Aarseth

dizia que a principal característica que muda do hipertexto em relação aos trabalhos literários

anteriores é a possibilidade do jump. O salto propicia uma leitura descontínua, criando uma

sensação colocada pelo autor como sudden displacement, ou um deslocamento quase que

instantâneo (AARSETH, 1993, p. 69 apud LEÃO, 1999, p. 62).

De modo mais analógico que digital, o pesquisador Vilém Flusser pontuava a

relevância dessas mudanças. Duas características importantes para esse processo de

transformação do percurso de leitura e dos próprios telespectadores, que podem ser vistas nos

computadores e, inclusive, na TV digital, são a interatividade e a hipermídia. Segundo

Vicente Gosciola, que estuda roteiro e narrativas digitais para games, internet e TV digital, as

novas tecnologias de comunicação e de informação, ou as novas mídias, que usam de

interatividade e sistemas hipermídia, abriram-se também para as possibilidades de contar

histórias, apontando alguns desses novos aspectos que forçam uma reorganização humana

para releitura dos “novos” meios de comunicação. Ele também explica a leitura das novas

mídias com base na apreciação de uma obra de arte.57 “A obra combinatória, ou

permutacional, é aquela na qual o usuário, ou leitor, pode, a partir de um pequeno número de

elementos, realizar um grande número de usos e leituras.” (GOSCIOLA, 2003, p. 41).

As mudanças na leitura transformam, em sua essência, a narrativa. Além de acabarem

com o paradigma emissor/receptor, também apresentam uma nova forma de construção de

significado, deixando clara a intenção de ampliar as significações, mais do que mantê-las

fechadas em um texto único, feito para uma leitura única. O pesquisador Jesús Martín-

57 Contemplação apontada por Walter Benjamin no texto “A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica”, datado de 1955.

74

Barbero já notava essa mudança desde o surgimento do controle remoto – que, segundo ele,

multiplicava a fragmentação da narração, criando um outro relato pessoal e intransferível.

“Walter Benjamin não pôde ser mais certeiro: a crise da narração aponta para a perda da

comunicabilidade da experiência, não porque o experimentado seja inefável, mas por causa da

fragmentação da subjetividade, na qual se sedimenta a experiência” (MARTÍN-BARBERO,

2001, pp. 100 e 111).

Entendo por palimpsesto o texto no qual um passado apagado emerge tenazmente, embora imprecisamente, nas entrelinhas escritas pelo presente; e por hipertexto uma escrita não seqüencial, mas uma montagem de conexões em rede que, ao permitir/exigir uma multiplicidade de trajetos, transforma a leitura em escrita. Enquanto o tecido de palimpsesto nos põe em contacto com a memória – e com a pluralidade de tempos – que todo texto carrega, acumula, o hipertexto remete à enciclopédia, às possibilidades presentes na intertextualidade e intermidialidade (MARTÍN-BARBERO, 2001, p. 63).

Segundo Gosciola, as obras não-lineares apresentam uma narrativa composta por um

mosaico, não como uma metáfora visual como enfoque, ponto de vista ou perspectiva, mas

como produto da Inteligência Artificial aplicada à visão por computador. A percepção,

inclusive a noção de tempo e espaço, será modificada. O leitor da hipermídia é ativo e, a todo

momento, estabelece novas conexões, optando pelos diversos caminhos que pode seguir.

Talvez por isso, Lúcia Leão tenha metaforizado a hipermídia em labirinto: um número finito

de emaranhados, mas quase infinito em suas possibilidades, percorrido por um leitor que pode

se perder e se encontrar diversas vezes.

Em lugar de hierarquias, nós temos uma escrita que não é apenas tópica: nós podemos chamá-la também de “topográfica”. A palavra “topografia” originariamente significava uma descrição escrita de um lugar, tal como um antigo topógrafo poderia fornecer. Mais tarde, a palavra começou a se referir ao ato de desenhar ou fazer um mapa – isto é, a uma descrição visual e verbal. Não é a escrita de um lugar, mas, mais propriamente, uma escrita com lugares, com tópicos concebidos espacialmente (Bolter, 1990, p. 112 apud LEÃO, 1999, p. 112)

À medida que o arquiteto do sistema hipermidiático constrói essas encruzilhadas,

ocorre um aumento do potencial interativo e permutacional do sistema (LEÃO, 1999, pp. 91 e

112). O maior desafio seria oferecer ao leitor links e estruturas que naturalmente se ligassem,

tornando essas conexões processos naturais e que se completassem mutuamente. Para Michael

Dertouzos, a genialidade da web reside justamente na “ampliação da idéia de hipertexto de

um único livro para uma comunidade inteira de computadores interligados”. A grande sacada

75

seria, então, “manter a infra-estrutura simples em termos de conceito; que seja fácil de usar e

compartilhar; para que se espalhe rapidamente pelo mundo inteiro” (DERTOUZOS, 1997, p.

68).

4.3 Design e interfaces

Segundo Michael Dertouzos, uma infraestrutura de informação possui três camadas:

linhas, instrumentos e interfaces (Ibid., p. 147). Para além das linhas, que estabelecem

conteúdos, os softwares que permitem interatividade fazem uso de mecanismos que traduzem

os “zeros e uns” programados no equipamento em uma linguagem compreensível aos

usuários; esse design estipulado é chamado de interface. As interfaces possibilitam a

comunicação do homem com a máquina computacional e desta mesma máquina com o

próprio homem; são elas as responsáveis por permitir ao usuário reconhecer significados e

atuar no universo digital por meio de ações para ele compreensíveis. Da mesma maneira, são

as interfaces que fazem com que se tornem inteligíveis os códigos da estrutura computacional.

As intenções de ação, ou seja, os comandos dados pelo usuário, são traduzidos para o

computador por meio da interface.58 O pesquisador Vicente Gosciola traz à memória as

definições de Lev Manovich, que percebe a tela do computador como aquela que “separa dois

espaços absolutamente diferentes e que de alguma maneira coexistem”, e de Derrick de

Kerckhove, que a considera uma “metáfora tecnológica dos sentidos” (GOSCIOLA, 2003, p.

91).

O primeiro computador pessoal completo, segundo Straubhaar e LaRose (2004, p.

188), o Alto, desenvolvido nas instalações do XEROX PARC entre 1972 e 1974, na

Califórnia, era uma “estação de trabalho que se vangloriava de ter um mouse, sua própria

linguagem avançada de programação, uma interface ‘amigável’ com o usuário e uma conexão

de rede de alta velocidade, chamada Ethernet”.

Tornar as máquinas computacionais “amigáveis”, ou seja, com funções facilmente

reconhecidas por seus usuários ou mesmo intuitivas por incorporarem símbolos intrínsecos à

cultura humana, é um objetivo perseguido por muitos programadores e desenvolvedores. A

evolução definitiva das interfaces amigáveis seria o holodeck – o sistema audiovisual

imersivo em três dimensões saído da imaginação dos roteiristas do seriado de ficção científica

58 Quando citados os computadores, estes também dizem respeito aos dispositivos digitais programáveis que fazem uso da mesma base estrutural utilizada pelo equipamento, como o Set-top Box.

76

“Jornada nas Estrelas” –, cuja principal característica é permitir ao usuário a simulação de

uma interação indistinguível das que ele mantém com objetos e pessoas reais, sem qualquer

pista de que existe algum tipo de mecanismo envolvido na transmissão audiovisual. Tudo

parece real. Um sistema desse tipo é o que todo pesquisador de televisão sonha em ver um dia

em pleno funcionamento.

Ao lado do teclado, o mouse é talvez o dispositivo de entrada de dados mais familiar para os usuários de computadores pessoais. Ele foi gerado a partir de um trabalho pioneiro do Stanford Research Institute, nos anos 60. O mouse controla as posições horizontais e verticais de um ponto sobre a tela. Foi lançado inicialmente para o público geral de computadores de 1983, a bordo do Apple Lisa, antecessor do Macintosh. Devido aos contínuos esforços para tornar os computadores pessoais mais “amigáveis”, uma ampla variedade de opções de entrada de dados está hoje disponibilizada, incluindo joysticks, trackballs, tabletes sensíveis à pressão, telas sensíveis ao toque e leitores ópticos como aqueles encontrados nos caixas de supermercados (Ibid., 2004, p. 200).

Atualmente, algumas das tecnologias estudadas são de reconhecimento facial e

corporal. Pode-se perceber que a evolução da interface caminha para a concretização de seu

caráter de invisibilidade, de modo a parecer que o usuário não está se relacionando com

computadores. Projetos nesse sentido têm buscado alcançar uma realidade interativa imersiva

que vem sendo estudada há tempos por pesquisadores da área de games e TV digital.

Se para o cinema, de acordo com teóricos como Ismail Xavier, a transparência, em oposição à opacidade, é a capacidade que o filme tem de ocultar o seu procedimento de realização ao espectador, para a hipermídia, conforme Laurel, Bodker e Norman, a invisibilidade, ou opacidade, é a capacidade de a interface da tela e a interface física do computador não serem percebidas pelo usuário, garantindo, assim, a sua imersão e fluxo contínuo pelas telas (FERRARI, 2007, p. 114).

O vídeo game utiliza, ao máximo, as ferramentas de interatividade contínua, com

narrativas adequadas, cujas interfaces caminham para parecerem cada vez mais

imperceptíveis. Gosciola entende, por exemplo, que o “relacionamento com a interface do

game seria uma atividade cognitiva e prioritária em atividades humano-computador, o que

configura o computador como um meio e não como uma ferramenta, que não interromperia a

imersão do usuário” (GOSCIOLA in FERRARI, 2007, pp. 112 e 113).

A comparação das ferramentas utilizadas nos games com a TV digital é inevitável. O

game foi uma das primeiras experiências de interatividade na programação de TV

convencional (STRAUBHAAR e LAROSE, 2004, p. 108). Realidade virtual é um conceito

77

muito utilizado pelos games, que teve sua primeira aplicação relevante nos simuladores de

vôo militares, mas que está sendo alvo de estudos para TV digital. É uma ideia que engloba

conceitos diversos como imersão (pois prevê isolamento dos sentidos para transportá-los para

outro lugar), interação, número de informações e até a experiência da telepresença. Marcelo

Zuffo bem definiu imersão:

Genericamente, o termo imersão relaciona-se com a experiência física de submersão na água. Recentemente, com os avanços dos meios eletrônicos interativos, o termo imersão tem sido utilizado quando o usuário tem a sensação de estar envolto completamente por uma outra realidade através de estímulos físicos e psicológicos suportados pelo computador (ZUFFO, 2001, p. 10).

Para ele, a tecnologia de projeção59 tem sido a mais utilizada na implementação de

sistemas capazes de propiciar ao usuário um sentimento de imersão, principalmente por

permitir a construção de sistemas capazes de envolver parcialmente ou totalmente o usuário,

mais do que com capacetes HMD (Head Mounted Displays). Além disso, é usado um potente

sistema de rastreamento para calcular e recalcular a posição do usuário, assim como

identificar a chamada varinha (wand), que contém botões que permitem a navegação no

ambiente virtual. Também são usados dispositivos de interação tátil (hápticos), que permitem

aos sistemas de realidade virtual induzirem o sentido do tato no usuário, sendo possível “tocar

os objetos deste mundo 3D e senti-los. [...] Os dispositivos hápticos permitem ao usuário

sentir o peso, textura, dureza e outras características de um objeto virtual” (ZUFFO, 2001, pp.

12 e 14). Em resumo, a imersão é induzida por estímulos aos sentidos humanos de paladar,

audição, visão, tato e olfato.

Segundo o pesquisador Lorenzo Vilches, a noção de imersão já estava presente nas

obras de McLuhan, quando ele explicava que, por meio do telefone, há um teletransporte no

sentido de que “transcendemos do nosso corpo para estar com a pessoa com quem estamos

falando (on-line). Os meios eletrônicos são, por natureza, virtuais [...] a realidade virtual não é

uma falsa edição da realidade. Os meios, como extensões que são dos nossos sentidos, não

podem ser falsos ou verdadeiros” (VILCHES, 2003, pp. 66 e 67). Na realidade virtual, a

experiência não seria derivada dos meios. Os próprios meios seriam a experiência. “O que o

criador da realidade virtual e o programador 3D fazem não é mais do que escrever uma

linguagem alfanumérica, que um programa e uma máquina (interfaces) traduzem numa

dimensão espaço-temporal” (Ibid., p. 103). As relações, então, mudariam:

59 Segundo o pesquisador, os sistemas de projeção são baseados em três tecnologias principais: DLP (Digital Ligthting Processing), LCD (Liquid Crystal Display) e CRT (Tubo de Raios Catódicos).

78

O modo humano de aproximar-se da máquina permite uma experiência de gestão por meio de uma série de objetos visualizáveis, preparados para interagir. A interface não é um complemento do ato de ver, como o controle remoto; é o centro da interação, a verdadeira zona de produção das novas relações sociais que regerão o uso da comunicação digital. Desse modo, a interatividade permite aos usuários usarem as mídias para organizar seu espaço e seu tempo, e não o inverso, como acontecia com os meios tradicionais baseados na manipulação das imagens e os sons, a partir de um centro emissor (Ibid., p. 24).

Em tese apresentada em 2001 na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo

(USP), Marcelo Zuffo expôs o que considerou como a convergência da realidade virtual e

“Internet Avançada” em “Novos Paradigmas de TV Digital Interativa”. Idealizou e criou a

Caverna Digital60, um ambiente de multiprojeção estereoscópico61 voltado para aplicações

imersivas de realidade virtual; o Multicomputador Gráfico PLÊIADES, estruturado com uma

arquitetura que suporta processar a demanda de atividades para “dar vida” à Caverna Digital;

e uma família de Set-top Boxes Reconfiguráveis, plataformas de TV Digital que

consideravam a convergência dos, então, futuros padrões de transporte de distribuição de

mídia e os vários serviços que poderiam ser oferecidos pela TV digital interativa. “A nossa

expectativa é que em alguns anos este tipo de tecnologia possa estar incorporada ao cotidiano

doméstico” (ZUFFO, 2001, p. VIII), disse o autor quando apresentou sua tese – mal poderia

imaginar que, ainda em 2009, a televisão aberta do Brasil estaria dando os primeiros passos

rumo a uma interatividade mais reativa do que plena.

O conceito de Set-top Box Digital nasceu como uma plataforma para aplicações

multimídia para redes de serviços digitais bidirecionais. Os primeiros projetos utilizavam “um

microcomputador PC conectado a uma rede, executando programas de descompressão de

vídeo e áudio digital em tempo real, recebendo dados de outras plataformas normalmente em

padrões de mídia como o MPEG-1 e MPEG-2” (Ibid., p. 75). Segundo Nicholas Negroponte

(1995, p. 204), “o futuro provável de todo e qualquer aparelho é transformar-se num PC

reduzido ou incrementado. Uma das razões para que se caminhe nessa direção é tornar os

aparelhos mais amigáveis, mais fáceis de usar e auto-explicativos”.

Com esse breve histórico fica mais fácil perceber o aparelho como um computador e

entender o quanto a interface é um aspecto importante e perseguido pelo homem, assim como

o pixel também o é, como abordado no item 3.2.2, “Evolução da tecnologia da imagem

audiovisual”.

60 Formada por um cubo de três metros de altura, largura e profundidade, com projeções nas suas cinco faces (quatro paredes e o piso) para cobrir o campo de visão do usuário. 61 Percepção estereoscópica engloba a atividade do cérebro de combinar duas imagens 2D levemente deslocadas horizontalmente numa única imagem 3D, com três dimensões.

79

É relendo autores, e não somente os da área de comunicação, que percebemos em seus

textos temas transcendentais às suas respectivas épocas. Nas entrelinhas de uma das obras de

Vilém Flusser, mais especificamente em “O mundo codificado”, podem-se captar parte de

suas complexas ideias, algumas de encontro ao principal objeto de estudo desta dissertação: a

televisão. O autor (que, segundo o organizador do livro, Rafael Cardoso, “dedicou boa parcela

de seu gigantesco poder de reflexão às imagens e aos artefatos, elaborando as bases de uma

legítima filosofia do design e da comunicação visual”), fez alguns ensaios sobre os conceitos

de fabricar e informar, ambas manifestações humanas – uma é consequência da outra – que

pretendem impor sentido ao mundo por meio de códigos e técnicas. Informar é dar forma e

significado, uma das funções de todas as culturas, facilitada pelas tecnologias que, segundo

Cardoso, reformulam a percepção mais do que a própria paisagem (FLUSSER, 2007, p. 10).

A imagem e a mensagem televisivas, caracterizadas como não-coisas – definição

empregada por Flusser para a tradução da cultura chamada, erroneamente, segundo ele, de

imaterial (pois deveria ser considerada materializadora, por efetivamente formalizar o mundo

existente) – nos são mostradas por meio do design, um dos métodos de dar forma à matéria,

acrescentando-lhe conteúdos.

Antigamente, o que estava em causa era a ordenação formal do mundo aparente da matéria, mas agora o que importa é tornar aparente um mundo de formas que se multiplicam incontrolavelmente. Antes, o objetivo era formalizar o mundo existente; hoje o objetivo é realizar as formas projetadas para criar mundos alternativos. Isso é o que se entende por “cultura imaterial”, mas deveria na verdade se chamar “cultura materializadora” (FLUSSER, 2007, p. 31).

As informações inapreensíveis são trabalhadas com objetivo similar, mas com foco em

aspectos econômicos. André Gorz, autor do livro “O imaterial”, explica que, por exemplo, a

expressão contemporânea “economia do conhecimento” apresenta o próprio conhecimento

como principal força produtiva da sociedade, algo contido num trabalho abstrato de valor

imensurável, que modifica de modo relevante o sistema econômico mundial. Para ele, o

conhecimento, inseparável da capacidade de conhecer, é produzido concomitantemente ao

sujeito cognoscente. Nicholas Negroponte estica ainda mais esse conceito quando traz a

imaterialidade como fator tangente ao universo da digitalização, diferenciando os bits dos

átomos.

Flusser também trata da possível curiosidade de seu leitor ao imaginar como seria a

fábrica do futuro (lembrando que este capítulo específico do livro citado, publicado em 2001,

data de 1991). Para ele, as fábricas estimulariam e realizariam as potencialidades criativas do

80

homem – tornando-o mais sapiens do que demens – e seriam voltadas para a produção das

não-coisas, sendo elas, portanto:

[...] lugares onde sempre são produzidas novas formas de homens: primeiro, o homem-mão, depois, o homem-ferramenta, em seguida, o homem-máquina e, finalmente, o homem-aparelhos-eletrônicos [...] podemos considerar as ferramentas, as máquinas e os eletrônicos como imitações das mãos, como próteses que prolongam o alcance das mãos e em conseqüência ampliam as informações culturais adquiridas (FLUSSER, 2007, pp. 36 e 37).

As ferramentas imitariam mão e corpo empiricamente; as máquinas, mecanicamente, e

os aparelhos, neurofisiologicamente. Tratam-se de outros ensaios que nos remetem ao

pensamento de McLuhan quanto às funções e relações entre as tecnologias e os homens.

Segundo ele, “com o advento da tecnologia elétrica, o homem prolongou ou projetou, para

fora de si mesmo, um modelo vivo do próprio sistema nervoso central” (MCLUHAN, 2005,

p. 61). McLuhan, contudo, não tratava somente de não-coisas, mas no âmbito das formas e

“materialidades” foi proponente de teorias que vêem esses equipamentos externos ao homem

além de suas funções mais óbvias, enxergando-os em seus aspectos sociais, políticos e

econômicos e compreendo que, também esses epifenômenos, suprem necessidades humanas.

Todas as coisas existentes (máquinas, aparelhos, objetos etc.) contêm informações e,

para que elas se tornem evidentes para nós, é preciso lê-las, decifrá-las, pois, dotadas de

códigos próprios de uma cultura criativa, estão carregadas de significados. Como falamos

anteriormente, no que tange à TV,

As imagens eletrônicas na tela da televisão, os dados armazenados no computador, os rolos de filmes e microfilmes, hologramas e programas são tão “impalpáveis” (software) que qualquer tentativa de agarrá-los com as mãos fracassa. Essas não-coisas são, no sentido preciso da palavra, “inapreensíveis”. São apenas decodificáveis [...] A base material desse novo tipo de informação é desprezível do ponto de vista existencial. Uma prova disso é o fato de que o hardware está se tornando cada vez mais barato, ao passo que o software, mais caro (FLUSSER, 2007, pp. 54 e 55).

O mundo está fadado ao “consumo” de não-coisas, que não podem ser manuseadas,

assim como as memórias de computador, uma extensão de nossa própria capacidade de

armazenamento de informações de maneira consciente. Essas não-coisas, por sua vez, são

infindáveis, eternas e “inconsumíveis” e estão disponíveis oferecendo as bases para uma

cultura imaterial interplanetária.

81

McLuhan, mesmo com as limitações da evolução tecnológica do seu tempo, também

colocava a questão da interatividade técnica como fator-chave para os novos tempos de

relacionamento entre o homem e os aparelhos – sem contar a interação já existente,

independente de meios técnicos.

Quem quer que se ponha a examinar os padrões da automação logo descobre que o aperfeiçoamento de uma máquina, no sentido de torná-la automática, envolve o feedback (realimentação). Isto significa introduzir um loop ou circuito informacional onde antes havia um fluxo unidirecional, ou seqüência mecânica. O feedback significa o fim da linearidade introduzida no mundo ocidental pelo alfabeto e pelas formas contínuas do espaço euclidiano (MCLUHAN, 2005, p. 397).

Acerca da televisão podemos descrever alguns processos que explicam e traduzem

efetivamente, por meio de não-coisas, de qual cultura imaterial estamos falando. Permeada

por uma forma repleta de códigos, o produto da televisão se faz presente em nossas vidas por

meio de uma narrativa, transmitida por uma interface pré-estabelecida, proporcionando

sentidos para nossas mediações. A estrutura da comunicação, não tão clara em um primeiro

momento, faz parte da mensagem enviada e recebida por emissores/telespectadores. Todos os

aspectos apontados podem vir a lembrar o leitor das características da atual TV digital, que há

pouco mais de dez anos teve seu processo de implantação iniciado mundialmente.

Segundo Vilém Flusser, em seu texto “Linha e Superfície”, datado de 1973 / 1974, o

homem “unidirecional” está desaparecendo e, cada vez mais do que as linhas escritas, as

superfícies adquirem maior importância no nosso dia-a-dia. Isso significa a mudança do

“pensamento-em-linha”, ou linear, ordinal, para o “pensamento-em-superfície”. “Ao lermos

as linhas, seguimos uma estrutura que nos é imposta; quando lemos as pinturas, por exemplo,

movemo-nos de certo modo livremente dentro da estrutura que nos foi proposta [...] A

diferença é de tempo, e envolve o presente, o passado e o futuro”. Sobre essa leitura, ele

completa:

O modo como lemos os filmes pode ser mais bem descrito quando tentamos enumerar os vários níveis de tempo em que a leitura acontece. Há o tempo linear, em que os fotogramas das cenas se seguem uns aos outros. Há o tempo determinado para o movimento de cada fotograma. E também há o tempo que gastamos para captar cada imagem (que, apesar de mais curto, é similar ao tempo envolvido na leitura de pinturas). Há também o tempo referente à história que o filme está contando. E provavelmente existem outros níveis temporais ainda mais complexos [...] nos filmes, ao contrário do que acontece nos textos escritos e assim como acontece nas pinturas, podemos primeiro perceber cada cena e depois

82

analisá-la [...] o tempo histórico em si acontece dentro da leitura dos filmes, em um novo e diferente nível (FLUSSER, 2007, pp. 107 e 108).

O autor divide as experiências mostradas pelas mídias (que, geralmente, não

apreciamos diretamente do local real dos acontecimentos) em dois grupos: o mundo dos fatos

(reino da experiência imediata, ou seja, dos fatos em si) e o mundo da ficção, dividido em

dois reinos, o dos conceitos (explicações) e o das imagens (por exemplo, o das fotografias).

O mundo da ficção sempre seria uma tentativa de representação dos fatos por meio de

símbolos, ou via linhas escritas (relacionando os símbolos aos seus significados, ponto por

ponto, concebendo os fatos) ou via superfícies (por meio de um contexto bidirecional,

imaginando o que os fatos significariam). Essas duas divisões são nomeadas pelo autor como

ficção conceitual e ficção imagética: a primeira mais objetiva, consciente e nítida; a segunda

mais subjetiva, inconsciente, ambivalente e rica. Por sua vez, são atendidas por dois tipos de

mídias: de ficção linear ou em superfície, representadas por publicações científicas e imagens

de TV ou filmes, respectivamente, como exemplifica o diagrama a seguir:

Figura 1 – Diagrama representativo de conceitos elaborados por Vilém Flusser

Para conceituar, é necessário decompor e analisar as imagens, e não há critérios que

distingam fatos de imagens, o que tornaria os dois vieses ficcionais alienantes, devido à perda

da noção de “realidade”. Para Flusser, mesmo assim, o pensamento imagético está se

tornando capaz de também pensar conceitos, e pode, em um futuro, portanto, tornar-se um

metapensamento mais completo sob modelos de superfície do que sob modelos lineares. “Um

83

programa audiovisual de TV que possa ser cheirado e que provoque sensações corpóreas não

é uma escultura. Esse é um dos avanços do pensamento no sentido de representar os fatos de

maneira sensorial, com resultados que ainda não podem ser previstos” (FLUSSER, 2007, p.

119). O autor, que já pensava nas evoluções tecnológicas e estéticas da televisão na década de

70, pôde se antecipar às conquistas da indústria eletrônica e visualizar algumas características

que proporcionam à TV vantagens enquanto meio de comunicação e extensão do homem.

Para compreensão dos dados enviados pelas emissoras, a interface oferecida tem

formatos que, segundo Flusser, estão inscritos na nossa informação genética desde o princípio

da vida na Terra, porque justamente não podemos impor ao mundo as formas que bem

quisermos, pois ele só aceitaria aquelas formas impostas anteriormente ao nosso “programa de

vida”. “Nós montamos o mundo de modo que se tornasse adequado ao nosso código

numérico”, explica o autor, que acredita que “nosso sistema nervoso central recebe estímulos

codificados digitalmente, que são processados por métodos eletromagnéticos e químicos, que

são convertidos pelo sistema em percepções, sentimentos, desejos e pensamentos” (Ibid., p.

135).

Crocomo (2007, p. 119) também pontua a interface como fator essencial para o bom

funcionamento do sistema planejado: “É claro que todas as etapas do programa precisam ser

bem pensadas, e a interface tem que ser de fácil assimilação, bem como o entendimento dos

ícones a serem disponibilizados”. Vicente Gosciola ainda enxerga de forma mais natural o

“diálogo” do homem permitido e mediado pela interface:

Laurel alia o conceito de interatividade contínua ao conceito da primazia da ação desenvolvida a partir das idéias de transparência, de Sussane Bodker, e de envolvimento direto de Donald Norman. Ela defende a interação com a interface como uma atividade cognitiva e a prioridade da ação em atividades humano-computador. Assim se configura o computador como meio e não como uma ferramenta, sem quebrar a imersão do usuário. Isso significa envolver o usuário de tal forma que ele não perceba que existe uma interface – invisível – entre ele e a história da qual está participando. A interface da tela e a interface física do computador deveriam ser completamente invisíveis, pontifica Norman (GOSCIOLA, 2003, p. 89).

Valdecir Becker, Günter Herweg Filho, Carlos Montez e Augusto Fonart, em pesquisa

sobre a usabilidade da TV, entendida como a medida da qualidade da experiência do usuário

ao interagir com um dispositivo operável, colocaram pontos importantes estabelecidos no

Reino Unido (um dos países que, desde o início da implantação da TV digital, muito se

preocuparam com a questão dos serviços interativos) que envolvem a interface desse sistema.

84

A interface do computador e a imagem da TV podem coabitar de maneira mutuamente

exclusiva, concorrente ou pausada, de acordo com a preferência do programador; a fonte

padrão normalmente utilizada nas interfaces européias é a “Tirésias” (projetada pelo Royal

National Institute for the Blind), que distingue facilmente os caracteres projetados na tela; a

indicação do guia de estilo da BBC pontua que o corpo dos textos não deve ser menor que 18

pontos, com espaçamento de 30% entre eles, devem ser escritos com cores claras em cima de

fundos escuros, e os textos, divididos em pequenos blocos com entrelinhas maiores que as

comuns, devem conter no máximo 90 caracteres (BBCi, 2005) (BECKER et al).

[Nielsen] entende que a usabilidade é composta por componentes, mas pode ser resumida em cinco atributos: Facilidade de aprendizado – o usuário rapidamente consegue explorar o sistema e realizar suas tarefas; Eficiência de uso – tendo aprendido a interagir com o sistema, o usuário atinge níveis altos de produtividade na realização de suas tarefas; Facilidade de memorização – após um certo período sem utilizá-lo, o usuário não freqüente é capaz de retornar ao sistema e realizar suas tarefas sem a necessidade de reaprender como interagir com ele; Baixa taxa de erros – o usuário realiza suas tarefas sem maiores transtornos e é capaz de recuperar erros, caso ocorram; Satisfação subjetiva – o usuário considera agradável a interação com o sistema e se sente subjetivamente satisfeito com ele (BECKER et al).

Essas e outras novas variáveis apontadas são mais do que somente uma evolução

tecnológica de um meio de comunicação; a mudança na forma de enxergar a televisão passa

pela capacidade visual do ser humano, pela compreensão da interface apresentada, pelo

entendimento do novo funcionamento (a memória e pensamento voltados para uma visão não-

linear de acontecimentos), pela percepção do formato, pela concepção da imersão então

propiciada (que leva a uma nova função televisiva como a interatividade), pela aprendizagem

de comunicação nesta relação dual, entre o telespectador e o emissor, e múltipla, entre todos.

A TV digital vem a ser mais do que o aprimoramento de uma tecnologia existente. É a

mudança na forma de comunicação do ser humano. E essa transformação externa requer uma

adaptação interna de conscientização sensorial de onde parte, de onde chega e de onde está a

mensagem: do homem.

85

5 RECEPÇÃO

Com todas as mudanças reestruturais do sistema tradicional de comunicação

televisiva, certas consequências são a influência no papel do telespectador analógico,

anteriormente receptor das transmissões das emissoras, e a mudança na sua percepção

cognitiva do conteúdo, resolução, áudio, etc. Assim, o termo “telespectador” passa a não

contemplar mais todas as funções desse novo indivíduo. Com base em autores que pesquisam

o processo de recepção das novas tecnologias, este capítulo sugere a adoção de um novo

termo que define, de maneira mais completa, o novo telespectador.

5.1 O espectador e suas mediações

Quando mudamos o emissor e a mensagem – dois dos importantes elos do tripé que

baseia toda a cadeia comunicacional –, logicamente mudamos também o receptor,

tradicionalmente encarado como a ponta finalizadora da emissão, onde terminava todo o

efeito da mensagem emitida, dentro do contexto das teorias clássicas da comunicação –

contestadas por teóricos da Escola Latino Americana, como Jesús Martín-Barbero e

Guilhermo Orozco. Esses autores já colocavam a questão do receptor de maneira diferente,

ressaltando características específicas como a capacidade de mediações que o ser humano

teria. Martín-Barbero, em seu renomado livro “Dos meios às mediações”, explicou que em

dado momento, alguns pesquisadores começaram a suspeitar daquela imagem restrita do

processo, entre emissores-dominantes e receptores-dominados, sem o menor indício de

sedução nem resistência.

Assim a comunicação se tornou para nós questão de mediações mais que de meios, questão de cultura e, portanto, não só de conhecimentos, mas de re-conhecimento. Um reconhecimento que foi, de início, operação de deslocamento metodológico para re-ver o processo inteiro da comunicação a partir de seu outro lado, o da recepção, o das resistências que aí têm seu lugar, o da apropriação a partir de seus usos (MARTÍN-BARBERO, 2003, pp. 27 e 28).

Orozco, no livro Television y Audiencias, confirma sua crença nessa linha de

pensamento. Segundo ele, Martín-Barbero perceberia a mediação como uma instância cultural

onde o público dos meios produz e se apropria de significado, de sentido e do processo

86

comunicativo. O autor se atém aos aspectos interativos existentes na TV desde a sua invenção

e popularização e, então, explica que no processo de assistir à TV, a audiência não assume,

necessariamente, um papel de receptor passivo. Assistindo à TV, o telespectador se envolveria

em uma seqüência interativa que implicaria diversos graus de processamento mental do

conteúdo televisivo, que começaria com a atenção, passando pela compreensão, seleção,

valorização, armazenamento e integração com informações anteriores, finalizando na

apropriação e produção de sentido pela audiência (OROZCO GÓMEZ, 1996, p. 35).

Ele analisa que, na recepção, além da própria mensagem da mídia, as pessoas também

sofrem influência de fatores externos (sua história, capacidades, família, cultura, por exemplo)

no processamento de informações recebidas, inclusive via televisão. Ao desligar a TV, a

audiência não findaria o processo de interação com a programação. As pessoas levam os

temas às salas de aulas, às casas, eles colocam suas observações enquanto explicam seus

pontos de vista, se reapropriam do conteúdo e circulam suas experiências por vários cenários

que não somente o ambiente da sala de estar. O processo de recepção “sairia do lugar” de

onde está o televisor e “circularia” em outros locais, atuando com outros membros da

audiência, à medida que vai sendo mediado por inúmeras novas situações, agentes e

instituições, que influenciam diretamente na idéia momentânea “final”. “A audiência da TV,

mesmo que ativa, não está isenta de mediações que provêm de suas próprias capacidades,

história e condicionamentos genéticos e culturais específicos”62 (OROZCO GÓMEZ, 1996, p.

37).

No artigo de Cossete Castro (CASTRO in BARBOSA FILHO, CASTRO e TOME,

2005, p. 306), a autora coloca que não existe uma via de mão única que vem da produção até

a recepção, como imaginavam os estudos funcionalistas norte-americanos. “O que existe é um

processo, um movimento de interação em diferentes níveis entre os conteúdos gerados pelo

campo da produção e uma recepção/audiência que não é previsível nem controlada como

seres autômatos, como se imaginava há poucos anos”. Para outro pesquisador, Dominique

Wolton (2003, pp. 42 e 43), o receptor nunca está só em sua interpretação da mensagem, pois

toda a sua história e valores intervêm nessa percepção e análise da imagem. “É o conjunto de

nossas lembranças, valores, idéias que nos permite manter uma certa distância interpretativa

em relação à mensagem e assim sermos livres”.

Com o advento da internet e o surgimento de novas mídias, esse cenário no qual o

emissor e receptor foram imersos traduziu ainda melhor a teoria desses autores, que

62 “La audiência de la TV, aunque activa, no está excenta de mediaciones que provienen de sus propias capacidades, historia y condicionamientos genéticos y culturales específicos” (OROZCO GÓMEZ, 1996, p. 37).

87

colocavam o indivíduo não como receptor fiel das mensagens, mas como senhor de suas

próprias interpretações pessoais – haja vista que o processo de recepção é, cada vez com

maior intensidade, composto por mediações definidas pelo próprio receptor, que entende e

percebe o significado da mensagem de maneira única e individual. Sobre isso, Lorenço

Vilches (2003, p. 29) também acredita que a “nova ordem social e cultural que tem início no

século XXI tornará obrigatório revisar as teorias da recepção e da mediação, que ressaltam

conceitos como identidade cultural, resistência dos espectadores, hibridação cultural etc”. E

continua:

O salto qualitativo que a introdução da microinformática na comunicação representa e as possibilidades de uma emigração global dos usuários para a rede fizeram com que a discussão ficasse centrada principalmente na participação democrática. As redes de Internet aparecem sem as limitações tecnológicas e sociais que caracterizavam todo o território da televisão e que a convertiam em meio no qual a liberdade encontrava limitações externas: nenhuma interferência entre emissor e destinatário (conceito de liberdade negativa); nenhuma liberdade, efetivamente disponível, para escolher; e a impossibilidade de ter acesso às redes, sem qualquer limite de tempo (Ibid., pp. 217 e 218).

O objeto de estudo desta dissertação, a TV digital, passa por questões da interação

mediada por tecnologias computacionais. Porém, não há como ater-se somente às tecnologias,

nem estudar separadamente a tecnologia e o telespectador ativo, pois esta é uma relação e,

assim como acontece com relações humanas, o resultado não é exatamente a soma das partes

(princípio da não-somatividade). Além disso, não se deve esquecer que nos extremos do

sistema comunicacional existem pessoas interagentes.

O artista canadense David Rokeby crê que a interatividade se define no momento em

que o resultado final da obra reflete para o público as conseqüências de suas ações e decisões

individuais. Como se pudéssemos entrar em contato com o nosso self depois de processado e

transformado pelo contato com a tecnologia interativa. “Dessa forma, para ele, o conceito

mais importante em arte interativa advém da exploração do significado que emerge da tensão

entre o interagente (ou leitor) e o reflexo do seu próprio self que a obra de arte lhe devolve da

experiência” (ROKEBY apud LEÃO, 1999, p. 38). Podemos aproveitar esse conceito e

aplicá-lo paralelamente ao campo da comunicação. Sem perceber, Rokeby segue a mesma

linha de pensamento da Escola Latino Americana.

Uma tecnologia é interativa na medida em que reflete as conseqüências de nossas ações ou decisões devolvendo-as para nós. Dessa forma, uma tecnologia interativa é um meio através do qual nós nos comunicamos com nós mesmos, isto

88

é, como um espelho. O meio não apenas reflete, mas também refrata aquilo que lhe é dado; o que retorna somos nós mesmos, transformados e processados. Na medida em que a tecnologia nos reflete de forma reconhecida, nos proporciona uma auto-imagem, um sentido do eu. Na medida em que a tecnologia transforma nossa imagem, no ato da reflexão, nos proporcionaria um sentido da relação entre esse eu e o mundo vivenciado (ROKEBY, 1997, p. 67 apud CROCOMO, 2007, p. 121).

Levando esses conceitos para a pesquisa na área da televisão, pode-se notar que,

mesmo com a invenção do controle remoto, segundo o próprio Vilches, foi possível modificar

essa situação de assimetria. “Por isso é que a televisão sempre foi vista e analisada,

tradicionalmente, como meio essencialmente passivo e, pela mesma razão, como meio do qual

o Poder podia facilmente apropriar-se” (VILCHES, 2003, p. 216). Sobre essa passividade

deduzida, ele faz uma ressalva, atentando para o cuidado no uso dessa palavra. “A noção de

passividade não é simples; é preciso estabelecer uma diferença entre, de um lado, a idéia de

que ver televisão conduza à passividade; e de outro, a idéia de que ver televisão seja, em si

mesmo, um ato passivo” (Ibid., p. 216).

Antes de ser criado o controle remoto, a ação de interatividade que o espectador podia

exercer era a capacidade de ligar e desligar a televisão. Depois de tornar-se zapper63, o

espectador ainda pode contar com o VCR (Video Cassete Recorder), que ampliou o conjunto

de ações que ele poderia fazer. O pesquisador Vilém Flusser, em ensaio escrito em 1973/74 e

publicado posteriormente, já percebia a evolução do espectador e ligava essas suas novas

funções com o vídeo cassete:

Vamos então buscar outro modelo que revele mais claramente o papel de um espectador de TV num futuro próximo. Ele terá à sua disposição um videocassete com fitas de vários programas. Estará apto a mesclá-los e a compor, assim, seu próprio programa e outros na seqüência, inclusive filmar a si mesmo, registrar isso numa fita e depois passar o resultado na tela de sua TV. Ele se verá, portanto, em seu programa. Isso significa que o programa terá começo, o meio e o fim que o consumidor quiser (dentro das limitações do seu videocassete), e significa também que ele poderá desempenhar o papel que quiser [...] O espectador é determinado pela história (pelo videocassete) e ainda atua na história (ao aparecer ele mesmo na tela). No entanto, está além da história no sentido de que compõe o processo histórico e na medida em que assume o papel que quiser dentro do processo histórico (FLUSSER, 2007, p. 122).

Os programas de TV, muitas vezes, tentam criar a ilusão de que proporcionam chances

de participação efetiva aos seus telespectadores. “A participação individual nos sistemas de

63 Indivíduo que zapeia, tem o poder do controle remoto, ou seja, muda de canal, liga e desliga a TV quando quiser.

89

televisão tem sido praticamente nula. Por esta razão a televisão é considerada, por Furio

Colombo, como ‘a máquina que se recusa a responder’” (COLOMBO apud MATUCK, 1995,

p. 124).

Em alguns estudos, inclusive, são colocadas informações contestáveis, como as de que

o telespectador não gosta de interagir:

Um estudo da Dataquest de 1993 revelou que as pessoas realmente não querem interagir com eventos esportivos. A TV Answer, agora Eon, e a Interactive Networks não conseguiram concretizar os planos de dotar de interatividade os televisores atuais através de freqüências de rádio especiais reservadas para esse fim pela FCC. Hollywood descobriu que o público não tem interesse em interferir no desenlace dos filmes; ele prefere a surpresa. Se as pessoas não querem interagir com o vídeo, como conseguirá o mundo ir além da televisão? (GILDER, 1996, p. 175)

Entretanto, como bem lembra Artur Matuck, Stan Vanderbeek já dizia: “Sempre que

uma estação de TV oferece um número de telefone encorajando telespectadores a participar

de um programa, os circuitos são ocupados em 15 segundos” (VANDERBEEK apud

MATUCK, 1995, p. 229). Quanto a essa participação, Gilles Lipovetsky traz alguns dados

interessantes:

Colocam-se num pedestal a iniciativa e a autonomia, mas apenas um telespectador em cada cinco, na França, decide antecipadamente o programa que verá; um telespectador em cada dois liga a televisão sem conhecer o programa que está passando. O consumo de televisão apresenta-se mais como um hábito que como a expressão de uma escolha individual deliberada. Assim, o telespectador pós-moderno não se identifica nem com o homem padronizado das multidões nem com o indivíduo soberano. Ele é o indivíduo “zapeador”, de audiência flutuante. Mais da metade dos jovens entre 20 e 24 anos vêem vários programas ao mesmo tempo. [...] A mídia favoreceu o desenvolvimento da autonomia dos indivíduos; eis eles, agora, prisioneiros de novas dependências. Um francês em cada quatro diz que sofreria muito se ficasse sem televisão durante dois meses (LIPOVETSKY, 2004, p. 76).

A pesquisadora portuguesa Célia Quico reproduziu, em um artigo de 2003, o resultado

de um estudo feito pela BBC (período em que a TV digital dava os primeiros passos no Reino

Unido), que revelou existir quatro novas e importantes tendências das pessoas: elas estão

assumindo o controle do seu consumo de mídia, querem cada vez mais participar e estar

próximo desses meios, consomem cada vez mais mídias simultaneamente e querem

compartilhar conteúdos. “A indústria da televisão está a começar a perceber que a imagem

tradicional da família reunida à volta do televisor está ultrapassada”, disse o, então, diretor de

90

Novas Mídias e Tecnologia da BBCi, Ashley Highfield. Segundo Célia Quico, que teve

acesso aos dados do Ofcom (órgão que regula a TV comercial no Reino Unido), na época, os

países da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte possuíam a maior taxa de penetração de TV digital

de toda a Europa: 50,2% dos lares (QUICO, 2003).

Conforme pontuado, as novas tecnologias surgiram e deram espaço para a criação de

novas mídias. que colocaram o espectador em um novo papel, uma nova função. A

digitalização trouxe maior possibilidade de interação com os meios de comunicação,

transformando o simples leitor/ouvinte/receptor em agente que interage. “Talvez a

humanidade esteja participando da constituição de uma nova realidade humana, o Homo

media, que não só está entre os meios de comunicação, mas interage com eles, neles interfere

e por eles é influenciado” (GOSCIOLA, 2003, p. 28).

Todo leitor de hipermídias traça seu próprio trajeto navegando pela

obra/programa/serviço. O conceito de hipermídia já pressupõe um leitor (e aí incluem-se

ouvinte e receptor) ativo que modifique o próprio caminho estabelecido pelo autor do

programa (embora a leitura linear também continue existindo, afinal, ler uma sentença

continua a ser uma atividade linear, por mais que se pretenda atingir outro ponto não-linear do

conjunto).

É natural do ser humano “linkar” pensamentos e ações, até quando se está

conversando com alguém, “linkando” o tempo todo assuntos específicos. Adriane Canan, no

artigo “A não-linearidade do jornalismo digital”, lembra, inclusive, que “quando pensamos na

não-linearidade de um produto audiovisual, como um filme, ou um website, precisamos usar,

sim, nossa facilidade inerente de fazer associações, respeitando a linguagem de cada área.”

(CANAN in FERRARI, 2007, p. 144).

Segundo Lúcia Leão, alguns pesquisadores já afirmam que a hipermídia representa o

fim da era da autoria individual. “Landow, por exemplo, fala da reconfiguração do autor, que

agora sofre uma erosão do self com a transferência do poder autoral para o leitor, que tem à

sua disposição uma série de opções de escolha em seu percurso” (LANDOW, 1992, p. 71

apud LEÃO, 1999, p. 42).

Além dessa questão das escolhas do leitor em uma obra hipermidiática, tornando-se

autônomo em sua navegação, existe outra realidade apresentada por essas novas mídias, a da

telepresença: estamos em um local diferente do que estamos acostumados, recriando um self,

ou seja, temos um avatar, uma representação de nosso self em um universo ciber64.

64 Embora esse conceito tenha origem nos estudos sobre as redes computacionais, ele tem ligação com esta dissertação quando visto a partir do ponto de vista digital do universo em rede, onde o telespectador participa de

91

Ascott nos fala da emergência de uma nova faculdade, ao mesmo tempo humana e pós-biológica, a “cibercepção” (cyberception). Esta faculdade envolve a capacidade de perceber e habitar o ciberespaço. Ao exercemos nossa capacidade de “cibercepção”, passamos a ter uma posição dupla, presença paradoxal, pois estamos “aqui e potencialmente em qualquer outro lugar”. Além disso, o termo habitar, tal como é empregado por Ascott, implica interagir e deixar marcas da nossa presença no ciberespaço (LEÃO, 1999, p. 109).

A pesquisadora Lúcia Leão, que escreveu um livro sobre hipermídias, coloca o autor

dessas complexas obras como o construtor de um labirinto (como dito no capítulo anterior),

juntamente com o próprio leitor, que vai construir o seu caminho. Ela cita Rosenberg como

um dos primeiros teóricos do hipertexto a se debruçar sobre o complexo tecido criado pelo

viajante, já que desenvolveu três conceitos sobre como se dá esta viagem: actema, episódio e

sessão. O primeiro corresponderia ao ato de seguir um link, levando o leitor para uma outra

parte da obra hipertextual; o segundo, episódio, seria um conjunto de actemas que criariam

uma coerência de pensamento na mente do leitor, resultado apresentado no history, onde se

consegue visualizar as intenções de movimento do leitor. Já a sessão compreenderia a

atividade do leitor em sua continuidade e é esse o principal objeto de estudo de Rosenberg. A

sessão também indica o tempo que dedicamos à exploração de um sistema hipertextual

(LEÃO, 1999, pp. 125 e 128), que finda quando o usuário se desconecta dessa experiência –

momento em que realmente começa a formar uma imagem individual do que foi visitado,

apreendido e, efetivamente, considerado interessante – um filtro que guardará somente o que

foi, pelas mediações do sujeito-leitor, realmente importante.

Analisando todas as mudanças acarretadas pela digitalização nos sistemas tradicionais

de comunicação, como a televisão, só nos resta olhar os indivíduos que os consomem por um

outro prisma e tentar requalificar o papel reservado ao receptor nos antigos esquemas das

teorias de comunicação.

5.2 O televivente

É complexo falar de novas tecnologias justamente em um século no qual mais se vê,

até por culpa da mundialização, a proliferação rápida e constante de novos aparatos

tecnológicos voltados para eficiência, praticidade, resolução de necessidades e o que mais

um complexo maior em sua interatividade com a TV digital – um complexo que envolve outras pessoas, outros emissores e outros receptores em um mesmo sistema.

92

julguemos necessário. Tal prodigalidade pode ser sentida, mesmo se mantivermos foco

exclusivo sobre os novos mecanismos65 propostos para o meio de comunicação mais

difundido no Brasil: a televisão.

A evolução tecnológica e científica tem permitido tantas novas possibilidades que,

mesmo um meio tão bem definido como a TV ganha roupagem inovadora e descaracteriza

conceitos consolidados há mais de meio século. Tanto que, segundo alguns autores, a

televisão pode vir a se transformar em um novo meio de comunicação, conforme pontuado em

capítulo anterior. George Gilder demonstrava acreditar que as novas funções solicitadas pela

audiência e projetadas por engenheiros da informação transformavam a televisão em um mini-

computador, mas ele perdeu de vista que esse novo aparelho serve, basicamente, para o

mesmo fim: transmitir conteúdo de imagem e som para um público que já está mais do que

acostumado com sua vida vinculada à TV.

Guillermo Orozco Gómez, em seu artigo “Comunicação social e mudança tecnológica:

um cenário de múltiplos desordenamentos”, faz referência ao que seria a morte da TV quando

explica que:

[...] as mídias e tecnologias de informação geradas ao amparo da modernidade e inseridas socialmente durante o século passado – como a televisão aberta ou a televisão paga em suas diversas modalidades de recepção – perderam relevância diante da mudança ou conjunto de mudanças tecnológicas mais recentes – ou até morreram, como afirmariam alguns –, parece uma miragem tecnocrática. [...] O que eu penso é que todos os meios, velhos e novos, assim como as diversas tecnologias videoeletrônicas e digitais que os tornam possíveis, coexistem, conformando ou não convergências em sentido estrito, porém constituindo ecossistemas comunicativos cada vez mais complexos” (OROZCO GÓMEZ, 2006, p. 84).

A ideia de evolução para formação de sistemas complexos (de Orozco) e a profetizada

morte da TV como a conhecemos (analógica, linear e não interativa), de Gilder, simbolizam

duas visões sobre o mesmo acontecimento que hoje assistimos: as mudanças em nossa relação

com a televisão possibilitadas pela tecnologia. Se isso representa a morte da TV ou uma nova

fase dela mesma, o que realmente importará para a sociedade será o que essa novidade trará

de benefícios para o indivíduo e o que muda nessa relação.

As novas tecnologias não, necessariamente, suplantam tecnologias anteriores,

principalmente durante sua introdução, quando as pessoas não têm completa noção de todas 65 As possibilidades geradas pela implantação da TV digital são tratadas como “novos mecanismos” no sentido de que podem vir a ser implementadas, via equipamentos e meios técnicos, aparelhagens com melhor resolução, outros métodos de visualização (interface) e novas funções de interação; entretanto, tudo ao redor do conteúdo televisivo já existente – ou seja, são possibilidades de agregar funcionalidades a nossa velha conhecida TV.

93

as suas funções e capacidades. Novos equipamentos precisam de um tempo de aceitação e

implantação, que envolve processos de reordenamento e reacomodação culturais. No Brasil,

segundo César Bolaño e Valério Brittos (2007, p. 39), apesar da escassez de recursos, uma

parcela não desprezível da população brasileira tende a “assimilar as inovações e esforçar-se

para efetuar a migração para patamares tecnológicos mais elevados, como tem ocorrido com

relação ao Digital Video Disc (DVD), fator que pode ser aproveitado numa estratégia de

massificação da televisão digital, de início.

Além dessa assimilação, como consequência, acontece uma mudança nas práticas

sociais comunicativas, já que as novas tecnologias sempre reorganizam o cotidiano ao se

tornarem os novos mediadores de informações, comunicações ou relações. Orozco, que

pesquisa as mudanças ocorridas após a aceitação de novas tecnologias, acredita que, no caso

das provocadas pela TV digital, há a mudança na percepção humana, que chega a atingir

níveis físicos quando, por muitas vezes, adquire dimensões insólitas, que transtornam,

inclusive, o próprio sistema nervoso e as habilidades visomotoras.

Também com a interatividade proposta para o novo modelo, a TV digital faz com que

a audiência se perceba mais colaborativa, pois proporciona uma quebra de barreiras entre

emissora e telespectador – um pouco ilusória. A partir do momento que um aparato

tecnológico oferece um canal de retorno ou de emissão de informação (feedback) por parte da

audiência, dá a sensação de que os consumidores não são somente receptores, mas que

participam efetivamente da construção do que assistem, o que reforça a ideia de veracidade

dos conteúdos. É necessário ponderar que, por vezes, essa sensação de participação não é

totalmente real, pois, afinal de contas, existe ainda um centro emissor que, no caso da TV,

serve de mediador e controlador do conteúdo transmitido. Além disso, ao conectar os

espectadores ao mundo, a TV também, segundo Berger, citado por Artur Matuck, integra-os

entre si.

Ainda que o telespectador não pense conscientemente que milhões de outras pessoas estão sintonizadas no mesmo canal ‘(...) não pode evitar de sentir a massa na qual o programa está se difundindo’. Portanto, a TV, enquanto assegura mediação entre as forças atuantes do mundo e a vasta audiência, também proporciona aos ‘(...) seres isolados que constituem as massas do mundo’, um meio de integração. Proporcionando ‘(...) uma alto-realização coletiva e contínua’, a TV atualiza a função original do mito que é assegurar que os membros de um grupo se sintam unidos (MATUCK, 1995, p. 100).

As mudanças já se iniciaram nos hábitos de consumo e na relação sensorial e

cognitiva, devido à alta resolução da imagem e ao áudio melhor definido, além da experiência

94

distinta da que estamos acostumados a ter. Esse consumo envolve não somente a interface

personalizada, a bidirecionalidade e as funcionalidades possibilitadas por ela, mas também o

VOD (Video On Demand), a programação pay-per-view, os videogames jogados online

diretamente na tela da TV, o número de canais, as ferramentas em constante atualização dos

PVRs (Personal Video Recorder), a videoconferência, acesso à internet, aos bancos (t-

banking), comércio via TV (t-commerce), inclusive por meio de propagandas interativas e

novos ambientes de aprendizagem e educação à distância.

Essas transformações mexem tanto com a estrutura e arquitetura do sistema

comunicacional que fica impossível aceitar o termo “telespectador” para definir quem fica do

outro lado da tela. O conceito não mais contempla todas as funções desse novo indivíduo.

Com todas as mudanças reestruturais do sistema tradicional de comunicação televisiva, certas

conseqüências são a modificação no papel do telespectador (anteriormente receptor das

transmissões das emissoras), a mudança na percepção cognitiva do conteúdo, da resolução, do

áudio e do contexto que envolve o ato de assistir à televisão. A partir desse cenário de

mudanças, nota-se que poderá vir a emergir um novo sujeito-receptor, devido aos novos

modos de recepção das informações, possibilitados pelos avanços e criações de novas

tecnologias em geral, como a TV Digital.

Segundo Vicente Gosciola (2003, p. 19), os telespectadores cada vez mais serão

chamados por outro nome. “E não há mais condição de chamar simplesmente de leitor aquele

que tem contato com uma história estruturada pelas novas mídias. Comumente, ele é chamado

de usuário”. Mas ele é mais do que isso. O espectador não somente se utiliza do que vê, ouve

ou interage; ele é parte, contém e está contido. Orozco Gómez se utiliza da expressão

“televidencia” no original do livro “Television y Audiencias” para justamente nomear o

processo de ver televisão. O termo espanhol tem significado semelhante a “assistir”,

televidentes seriam telespectadores.

Com base nessas mudanças argumentadas, nos estudos de recepção que enxergam o

receptor de maneira diferente, ativa, e no nome do processo dado por Orozco (televidência),

foi tomada a liberdade de, a partir deste momento, aportuguesar e reinventar o termo, pois ele

não compreende esta nova etapa e não contempla, de maneira mais completa, as funções do

novo telespectador. A experiência é, agora, uma “televivência”. E o telespectador-receptor,

como consequência de toda essa mudança, torna-se um “televivente”. Seria algo como

vivenciar e ter a experiência de viver a TV.

A importância dessa nova fase não está somente nas possibilidades tecnológicas que

permitem fundir o papel do emissor e do receptor, mas no que isto implica para a sociedade,

95

as novas formas de comunicação que daí surgem, não só ao redor da relação do indivíduo com

a emissora ou com o televisor, mas com as outras pessoas. O televivente poderá usar de novas

ferramentas para obter informações e, por consequência, poderá estabelecer um diálogo

diferente com a família, amigos e sociedade.

Essas novas relações estão se estruturando neste momento e, por isso, é impossível

prever, sem fazer exercício de futurologia, quais mudanças significativas permanecerão de

modo que possamos apontar um novo padrão comportamental da audiência. O que podemos

afirmar é que ela não é nem será mais a mesma. Mesmo.

Como pontuado anteriormente, os meios de comunicação nasceram com o intuito de

serem bidirecionais, mas o único que manteve essa função foi o telefone. A televisão agora

está chegando perto do que seria essa bidirecionalidade com a popularização da TV Digital e

inserção dos Set-top Boxes, com middleware instalado, no mercado de comunicação.

Existem diversos níveis de interatividade, desde ligar ou desligar a televisão até

participar ao vivo de um programa de entrevistas enviando uma pergunta. Analu Andrigueti,

em artigo sobre o jornalista no mundo dos games, coloca divisões de perfis de leitores feitas

por Lúcia Santaella: contemplativo (leitor de livro, que contempla e medita); movente,

fragmentado (age dentro das novas formas importantes da comunicação); leitor de imagens,

da velocidade, das linguagens efêmeras e misturadas; e imersivo/virtual (integrado à era

digital, com poder de escolhas) (SANTAELLA apud ANDRIGUETTI in FERRARI, 2007, p.

97). O televivente é o sujeito que permeia todo esse universo e tem o poder de interagir em

qualquer nível que desejar. Ele simplesmente tem a possibilidade.

O televivente é, aqui, trabalhado como um conceito especificamente voltado para o

indivíduo que se relaciona com o meio de comunicação TV digital. A crítica aos demais

conceitos que tem por objetivo definir quem está do outro lado da tela da televisão é um

exercício saudável de compreensão desse complexo processo de assimilação de conteúdo e

interação.

O termo usuário, utilizado por Gosciola para definir os receptores nesta nova era

digital, é também criticado por André Barbosa Filho e Cosette Castro, que consideram o

conceito restrito demais por não contemplar a capacidade criativa e de possível produção de

conteúdos dos diferentes grupos sociais, assim como a ampla produção e troca de

conhecimentos que pode ser gerada no processo. Por isso, depois de levantamento e análise de

termos utilizados comumente, eles acreditaram haver espaço para a criação de um conceito

que envolvesse aspectos autorais, e não somente de atores, desse universo.

96

Embora não tratasse diretamente do tema convergência digital, já em 1996, o livro Internet solidari@ - La última revolución, publicado por EusNet elkartes, questionava qual seria o melhor termo para chamar os cidadãos das comunidades de internet: habitanets, internetinos, interpolitanos, redenses, redtantes, entre outros, cuja tradução não combina com a língua portuguesa. No Brasil do começo do século XXI, pensamos em outras possibilidades, como internautas sociais/atores digitais/sujeitos digitais/navegador digital. Ou ainda usuários-cidadãos, como chamam Takashi Tome e Regina Mota [...] Mas, ainda assim, consideramos o termo insuficiente. Por isso, sugerimos o uso da expressão cidadãos digitais. Ela inclui todos aquel@s que usam (ou vão utilizar) internet, assim como tod@s que poderão vivenciar as novas mídias através da convergência digital, atuando não apenas como atores, mas também como autores (BARBOSA FILHO, CASTRO E TOME, 2005, p. 281).

Por outro lado, Adilson Cabral Filho e Eula Cabral, em artigo sobre o modelo

brasileiro de TV digital, defendem o uso do termo usuário por este conferir maior dinamismo

ao papel de quem “se encontra na recepção do processo de comunicação. A conotação de

dinamismo – principalmente quando comparada a uma certa passividade associada ao temos

‘telespectador’ – vai ao encontro das novas potencialidades vislumbradas com a televisão

interativa” (CABRAL FILHO e CABRAL in BARBOSA FILHO, CASTRO E TOME, 2005,

p. 185).

Já Alex Primo, pesquisador da área de cibercultura, prefere adotar o termo

interagente, por acreditar que melhor defina este novo indivíduo com papel diferenciado de

interação em relação às velhas mídias.

O termo “usuário”, tão utilizado nos estudos da “interatividade”, deixa subentendido que tal figura está a mercê de alguém hierarquicamente superior, que coloca um pacote a sua disposição para uso (segundo as regras que determina). [...] abandono desse problemático conceito e preferirá adotar o termo “interagente” (uma tradução livre de Interact, não raro utilizado em pesquisas de comunicação interpessoal), que emana a própria idéia de interação. Trivinho (1996), por sua vez, propõe o conceito de “indivíduo teleinteragente cyberspatial”, que, segundo ele, “pressupõe um traço participativo-interventor cuja plenitude jamais foi verificada, por exemplo, num receptor da comunicação de massa. Nesse sentido, dizer “receptor” parece realmente pouco” (PRIMO, 2005).

O quadro a seguir busca ajudar para uma melhor visualização e diferenciação dos

termos utilizados.

Quadro 1 – Conceitos utilizados para definir o indivíduo que se relaciona com a TV

Conceito Autores que utilizam o termo Característica

97

Telespectador/espectador Estes termos são utilizados desde a invenção da TV por pesquisadores, comunicólogos, engenheiros, produtores, enfim, todos que, por algum motivo, fazem referência à quem assiste à televisão. Tais conceitos, principalmente o de receptor, são mais aplicados aos aparelhos analógicos, pois a digitalização trouxe um movimento de repensar esses conceitos, sendo assim impossível determinar seus usos por autores específicos.

Conceitos tradicionalmente aplicados ao indivíduo que assiste à TV. Estão para a televisão assim como o ouvinte está para o rádio e o leitor para o jornal, livro ou revista.

Receptor Termo universalizado pela tríade emissor-mensagem-receptor, que definia os sistemas tradicionais de comunicação, sendo o receptor a ponta do processo, quem recebe a mensagem final.

Usuário Vicente Gosciola Adilson Cabral Filho e Eula Cabral

Indivíduo que não só assiste, mas faz uso dos meios de comunicação.

Cidadãos-digitais André Barbosa Filho Cosette Castro

Quem usa a internet e pode vivenciar as novas mídias, atuando como ator e autor.

Interagente Alex Primo Não pressupõe hierarquias, mas interação. Tradução livre de interact, termo utilizado em pesquisas de comunicação interpessoal.

Indivíduo teleinteragente ciberespacial

Eugênio Trivinho Definição que pressupõe um traço participativo-interventor no indivíduo que interage no ciberespaço.

Diferente destes termos, o televivente incorpora as mudanças apontadas no sistema

digital de comunicação, atribui ao indivíduo uma característica voltada especificamente para a

TV, e incorpora funcionalidades que são, então, adquiridas pelo telespectador tradicional. Ele

vive a televisão em sua plenitude, fazendo mediações e interagindo com o sistema de forma

autônoma.

Com tantas atribuições, pode ser que surja a dúvida de qual seria a diferença efetiva

entre o televivente e o (já velho conhecido) internauta – afinal de contas, ambos os conceitos

se definem pelo tipo específico de simbiose interativa que mantêm com a mídia com a qual se

relacionam. O tipo de receptor é uma consequência do meio e das formas que este utiliza para

transmitir a mensagem. As diferenças começam pela resolução das imagens apresentadas na

tela, passando pela interface e pela rede de distribuição de informação (a TV tem muito

menos ações Peer to Peer66 do que a internet). Fora isso, a audiência de cada meio o procura

por motivos particulares, aguardando interações diferentes, funcionalidades diferentes, já que

acessa o meio específico em razão de um objetivo único.

Como bem pontuou Pollyana Ferrari (2007, p. 10), se considerarmos que está surgindo

um novo homem, teremos de levar em conta a mudança do sujeito coletivo para o sujeito

66 Do inglês, Peer to Peer significa Par a par, ou entre pares. Seria uma arquitetura de sistemas distribuídos caracterizada pela descentralização das funções na rede, onde cada nó da rede realizaria tanto funções de servidor quanto de cliente.

98

conectivo. O televivente é mais do que um usuário dos novos meios; ele não só compreende

as mensagens por meios de mediações, não apenas faz uso do meio ou interage com as

propostas interativas, ele vive o ambiente televisivo.

Está sendo aqui agregado a esses outros conceitos apresentados uma nova fase própria

do indivíduo telespectador: a fase da interatividade mediada por tecnologias que permitem

imersão e aprofundamento em temas de interesse, feedback (retorno) rápido no contato com a

emissora e com seus pares (o restante da audiência anteriormente desconhecida), e o que mais

a banda larga vir a proporcionar, unida às capacidades de ação do indivíduo pela televisão

(mais especificamente, pela TV digital).

Esta nova postura do televivente provoca muita “interferência” na linha que separava a

emissão da recepção e pode não ser mais justo, em um futuro quem sabe próximo, tratar esse

ente com o qual o televivente mantém contato direto simplesmente como “emissora de TV”.

Talvez seja mais adequado algo como “emissor de conteúdos programáticos”.

Cosette Castro, no artigo “Conteúdos para TV digital: navegando pelos campos da

produção e da recepção”, propõe a mudança do termo programa televisivo para módulos

televisivos em TV digital, “[...] assim como aborda as mudanças que a convergência digital

possibilita, já que as audiências poderão interagir com a esfera da produção, interferir nos

conteúdos e, sobretudo, criar sua própria grade de programação” (BARBOSA FILHO,

CASTRO E TOME, 2005, p. 295).

Pensando nisso, o pesquisador André Barbosa Filho (2005) lembra que talvez tenha chegado o momento de parar de falar no termo programas para TV digital. Estes se traduzem pelo uso simultâneo ou seqüencial de informações audiovisuais lineares que permitem ao receptor interagir através de módulos superpostos com elementos manipuláveis à sua disposição. Por isso, sugere o uso de módulos televisivos, já que a própria noção de grade de programação será modificada (BARBOSA FILHO, CASTRO e TOME, 2005, pp. 314 e 315).

A questão do conceito utilizado para substituir a ideia de programação – que vem

ganhando espaço, paralelamente às discussões realizadas para definição de termos mais

específicos que definam o telespectador – mostra como as mudanças que estão ocorrendo

influenciam e modificam o todo. Não só a tecnologia é outra, mas também o telespectador,

agora televivente, a programação, os profissionais envolvidos, a interface, o contexto, o

sistema estruturante...

99

6 TALKSHOW NA ERA DA TV DIGITAL

Com a digitalização, o sistema de produção, emissão e armazenamento da TV passa de

analógico para digital. Nesse formato, a tecnologia permite alta resolução, multiprogramação,

portabilidade do conteúdo audiovisual e inclusão de funcionalidades interativas semelhantes

às encontradas nos computadores. Essa mudança está reestruturando o sistema, o processo e,

consequentemente, o conteúdo. Conforme o título desta dissertação, depois de analisadas as

características do televivente, este capítulo trata da nova programação – usando, para isso,

como exemplo o gênero talkshow, colocado no início da dissertação para ilustração do

funcionamento dos programas na TV analógica, que agora servirá para exemplificação das

mudanças que podem ser geradas pela nova tecnologia da TV digital.

6.1 A transição do analógico para o digital

A nova programação é consequência das possibilidades tecnológicas, que têm início

na estrutura de hardware e software do sistema. O middleware oficial do Set-top Box do

Sistema Brasileiro de TV Digital (SBTVD) é o Ginga, software que permite interatividade,

desenvolvido pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e Pontifícia Universidade

Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) desde o início desta década.

Segundo Guido Lemos, professor da UFPB, de 80% a 85% das tecnologias utilizadas pelos sistemas internacionais são as mesmas, e foi possível criar um middleware brasileiro compatível com todas elas. Um dos consórcios liderados por [Marcelo] Zuffo foi o do terminal de acesso. Com 65 pesquisadores, o projeto incluiu um padrão de autenticação digital, que, entre outras coisas, impede a contaminação do sistema por vírus. Também participaram desse consórcio a USP [Universidade de São Paulo] de São Carlos, a Unicamp [Universidade de Campinas], a UFPB, o Mackenzie e as empresas Waba, Intel, Xilinx, Samsung e Philco, posteriormente adquirida pela Gradiente (CRUZ, 2008, p. 125).

Com Ginga ou sem Ginga – já que sua efetiva reprodução e comercialização ainda não

foram definidas, quase dois anos depois da inauguração da TV digital no país –, a implantação

de sistemas interativos na programação televisiva já é possível há tempos. O impedimento ao

desenvolvimento e aplicação real dessas ferramentas esbarra em dois fatores: política e

conteúdo.

100

O atraso na definição do padrão que atenderia o Sistema Brasileiro de TV Digital

(SBTVD), retratado em capítulo anterior, já é um indício de quantos interesses políticos

permeiam o universo da digitalização. São interesses de empresas de publicidade, de mídia,

produtoras, associações de TVs abertas e fechadas, engenheiros, programadores, artistas,

enfim, inúmeros grupos de pessoas que pretendem defender seus respectivos patrimônios e

modelos de negócios naquela que seria a segunda grande revolução da televisão, o principal

meio de comunicação do país. Para César Bolaño e Valério Brittos (2007, p. 290), a

prioridade na definição das políticas nacionais na área deveria ser entender a TV digital como

plataforma de inclusão, “visando à universalização do acesso à educação e à saúde, a extensão

da cidadania e a definição de todo um novo sistema de comunicação de massa, concebido

como bem público. Nesse sentido, a regulação deve privilegiar a interatividade e a

participação”. Contudo, acelerar o processo de implantação nesses primeiros anos de

familiarização já seria um grande avanço...

Quanto à segunda questão, Márcio Loss lembra que, em 2002, durante a realização da

National Association of Broadcasters67 (NAB – Associação Nacional de Radiodifusores),

houve unanimidade em torno do fato de que a interatividade na TV dependia da produção do

conteúdo, e não da tecnologia. “Há que se providenciar conteúdo em constante transformação,

em quantidade e variedade, com qualidade. A organização destes conteúdos também deve ser

estudada, possibilitando um acesso rápido e de fácil identificação de suas categorias”

(TRESSE, 2002, p. 7 apud LOSS, 2008, p. 37).

As mudanças prometidas com a digitalização eram tantas que, de milhares de

funcionalidades que passaram pelo filtro das empresas, governos e demais interessados,

sobrou, basicamente, a alta resolução. Ao menos em TV aberta. Um grande avanço, mas que

decepciona mediante as promessas que chegaram junto com a nova TV. Para alta resolução,

as emissoras precisaram trocar os aparatos técnicos; para haver interatividade, as emissoras

precisam trabalhar, mudar o esquema de produção, e oferecer conteúdo – que será transmitido

por meio do Set-top Box, junto a uma interface instalada no aparelho.

Para entender melhor a diferença entre receber o sinal pelo cabo coaxial analógico e

receber o sinal digital no Set-top Box, a pesquisadora da área de computação, Lara Schibelsky

Piccolo (2005), detalha as principais características do processo estruturante e elenca suas

funções: desmultiplexar (vide nota de rodapé, p. 31) o sinal digital recebido, decodificar

67 Feira que acontece anualmente nos Estados Unidos, promovida pela Associação Nacional dos Radiodifusores (NAB), localizada em Washington, que reúne emissoras de rádio e televisão para discussão e apresentação de novidades do setor.

101

informações de áudio e vídeo, processar os dados recebidos (e, se for o caso, sincronizá-los

com a programação), enviar dados via canal de retorno, construir a imagem a ser exibida pelo

aparelho de TV e convertê-las ou não para o sinal analógico. “Pelo fato de manipular dados

além de áudio e vídeo digitais, parte da arquitetura de um set-top Box é muito similar a de um

computador pessoal”, explica. O Set-top Box possui um demodulador que amostra o sinal

sintonizado e converte-o em “feixes de bits denominados Transport Stream, que contém

vídeo, áudio e dados codificados. Uma vez que o stream é recuperado, é feita uma checagem

de erros para então encaminhar o stream ao desmultiplexador”. O desmultiplexador, por sua

vez, “examina todos os identificadores, seleciona pacotes específicos, descriptografa e

encaminha para um decodificador específico. Vídeo para vídeo, áudio para áudio”.

Para processar os dados, tanto de um programa interativo quanto de uma aplicação, o

Set-top Box faz uso de processador, que inicia os componentes de hardware, monitora,

gerencia, carrega dados e instruções para executar programas; também usa memórias e

dispositivos de armazenamento temporários e permanentes, elementos bem conhecidos da

área da informática e da computação. Para garantir um canal de retorno, faz uso de um

modem. E, em razão da convergência, “os projetos de set-top boxes estão incorporando

interfaces que os permitirão se comunicar em tempo real com dispositivos como câmeras de

vídeo, DVD, tocadores de CD e teclados musicais” (PICCOLO, 2005).

Como se vê, a complexidade do sistema exige investimento, não só dos televiventes,

mas das próprias emissoras, para manterem-se atraentes nessa concorrida busca pela atenção

das pessoas, fazendo uso das ferramentas disponíveis e inovando sobre as possibilidades

existentes.

6.2 Mudanças no conteúdo programático

Para exemplificar as mudanças provocadas pela digitalização da TV, esta dissertação

faz uso de um gênero de programa já consolidado nas emissoras de televisão de todo o

mundo: o talkshow. Após descritas e analisadas as características tanto do gênero quanto da

digitalização, o talkshow serve como um microcosmo interessante – pois, pela parte, pode-se

refletir sobre o todo –, que ilustra as novidades que a tecnologia permite aplicar ao

funcionamento dos programas analógicos em migração para a TV digital. Em resumo, esse

item explorou as características e funcionalidades que os talkshows poderão adquirir, ampliar

ou exercer com esta evolução tecnológica.

102

A TV digital, resumidamente a convergência entre as tecnologias digitais e interativas

e a televisão, já tem dado indícios de para onde caminha a sua programação. Ana Silvia

Médola e Lauro Teixeira traduziram o quadro apresentado no artigo “Televisão interativa: Em

breve em uma televisão perto de você”68, de Adams, Anand e Fox, para exemplificar algumas

mudanças nos paradigmas da TV tradicional para a digital e interativa:

Quadro 2 – Comparativo entre TV tradicional e TVi

FONTE: Extraído de MÉDOLA, Ana Silvia Médola e TEIXEIRA, Lauro, p. 4.

A televisão, pressionada e ameaçada por ter de recriar seu modo de produção e modelo

de negócios, e seu relacionamento com o telespectador (que participará mais efetivamente

dessa comunicação, então, bidirecional), terá de se reinventar no sentido de elaborar

estratégias criativas e interativas para manter sua audiência ligada/conectada ao seu canal.

Como um círculo vicioso, uma emissora passará a se empenhar mais nesse sentido quando

observar outra emissora investindo em interatividade, aplicações que geram custos 68 Interactive televison: Coming soon to a television near you. (2001)

103

permanentes para a televisão (diferentemente da efetivação da tecnologia de alta resolução,

que envolve um grande custo inicial, em detrimento de uma manutenção de valor

relativamente baixo).

Portanto, a forma de se pensar os novos programas deve necessariamente passar pela reflexão das novas tecnologias, sob pena de acesso aos recursos interativos, mas sem evolução nos formatos dos programas. Ou do uso de uma interatividade parcial, limitante, que considere o usuário como um mero selecionador de temas, de itens de consumo, e não como um efetivo participante do processo, que opina, que apresenta suas sugestões, que seleciona seu conteúdo. (CROCOMO, 2007, p. 39).

O diálogo entre os programas de televisão e seus públicos sempre existiu (cartas,

mensagens instantâneas, telefonemas69), sugerindo proximidade e intimidade, o que garante

boa parte da audiência das emissoras. Alguns truques da TV analógica para se mostrar mais

interativa com seu público devem continuar a ser utilizados e colocados como “fenômeno da

era digital”70. Não é novidade os apresentadores atenderem telefonemas ao vivo (ideia

apropriada do rádio); eles têm “uma longa história de apresentação também na televisão (os

arquivos da BBC registram em julho de 1954 um programa com telefonema no ar em

televisão para transmissão de um programa de partido político)” (YORKE, 1998, p. 164).

A forma de pensar os novos programas, a partir do momento em que a tecnologia

permite a interatividade técnica, deve passar pela reformulação dos modelos estabelecidos e

adaptar a tecnologia à TV e vice-versa. Para Fernando Crocomo (2007), pesquisador

brasileiro envolvido com o processo de implantação da TV Digital no país, a utilização desses

recursos, entretanto, está atrelada às leis de funcionamento dessa nova televisão, aos formatos

dos programas, à linguagem a ser utilizada, e às políticas e prioridades públicas, e lembra

ainda que a interatividade já poderia ter sido viabilizada há tempos, pois não dependeu

somente da evolução da tecnologia, bastando lembrar o potencial inicial de aparelhos como o

rádio.

69 Podemos aqui citar alguns exemplos brasileiros como os programas Você Decide, Big Brother Brasil (TV Globo); Alô Cristina, Fantasia, Bozo, Bom dia & Cia, Domingo Legal (SBT); Disk MTV, Teleguiado (MTV) e Programa do Hugo (CNT-Gazeta). 70 Como se fossem ferramentas e artifícios proporcionados pela digitalização da TV, passando a impressão de que as emissoras estão se adequando às novas tecnologias interativas (sendo que atender telefonemas e receber cartas, por exemplo, são tipos de interações que já existiam na TV analógica).

104

6.3 TV digital e talkshow: exemplos práticos

Assim como toda a programação deverá passar por mudanças, as novelas, os jogos de

futebol, as séries e filmes de ficção e os talkshows também passarão. O talkshow da TV

digital terá como base a mesma proposta, firmando-se como gênero nesta nova era de

produção de conteúdo: programa de entrevistas que tendem mais a informar do que entreter.

O que muda com a nova estrutura tecnológica é o modo como vão acontecer as coisas no

programa, que agora passa a ser influenciado pelo telespectador antes, durante e depois da

transmissão ao vivo.

Como visto nos capítulos anteriores, o sistema interativo inclui novas possibilidades,

que passam pela implantação de serviços de interatividade técnica, mediada por um

computador. Eis alguns exemplos:

� TV personalizada (Me Channel) – permite a adaptação da programação ao

gosto do telespectador (ângulos diversos de câmeras, personalização das

interfaces);

� Multiprogramação – transmissão de mais canais digitais pelo mesmo espaço

utilizado no espectro analógico, onde era possível a transmissão de somente

um canal;

� Admissão de novos usos do aparelho – novas funcionalidades proporcionadas

pela digitalização para agregar serviços ao mesmo aparelho digital de TV,

como para games (jogos individuais contra a TV/computador ou em rede),

videoconferência e Educação à Distância (EAD) em ambientes de

aprendizagem em rede;

� Video On Demand (Vídeo Sob Demanda) – a compra de um determinado

evento, programa ou filme para ser assistido no momento que o cliente desejar,

sem precisar aguardar o horário de transmissão da emissora que ofereceu o

serviço;

� Personal Video Recorder – Aparelho de uso doméstico que tem como

principal função a gravação digital da programação televisiva (por exemplo, o

TiVo, comercializado nos EUA);

� Pay-per-view – Serviço que permite ao cliente de TV por assinatura adquirir

uma programação específica, que será transmitida em horário pré-determinado,

comprando apenas a exibição de determinados eventos, programas ou filmes,

que variam de acordo com a opção escolhida;

105

� Comércio (T-commerce) e propagandas interativas – aplicativos e interfaces

comerciais que podem promover e comercializar produtos e serviços via

televisão;

� Internet – acesso ao e-mail, serviços bancários (T-banking) e

governamentais (T-government).

O rol de serviços governamentais oferecidos pela TV digital ainda não saiu do papel,

porém, empresas como a ITV Produções Interativas já estão se antecipando à tendência e

elaborando interfaces onde o telespectador pode, por exemplo, marcar uma consulta no posto

de saúde mais próximo, usando para isso sua carteirinha do Serviço Único de Saúde (SUS).

Figura 2 – Interface programada para acesso a serviços oferecidos pelo governo

FONTE: http://www.itvproducoesinterativas.com.br/

Quanto à propaganda interativa e ao comércio via televisão, McLuhan anteviu esses

interesses comerciais em uma TV bidirecional em seu livro “Os meios de comunicação como

extensões do homem”. O espectador entraria em contato com as lojas por meio de interfaces

comerciais e suas “identificações-créditos” seriam estabelecidas automaticamente através da

televisão. “Artigos em toda gama de cores fielmente reproduzidas lhe serão mostrados. A

distância não oferecerá problemas, já que, pelo fim do século, o consumidor poderá

estabelecer ligações diretas, independentemente das distâncias.” (MCLUHAN, 2005, p. 247).

A seguir, para melhor ilustrar as possibilidades da TV digital, exibimos as telas

principais das propagandas interativas de quatro casos de sucesso criados pela empresa

emuse-tech: Adidas, Sony Ericsson, Coca Cola Zero (com possibilidade de competir em um

jogo e concorrer a um videogame Playstation3) e Gillette (esta última usou a mesma interface

inicial para uso na propaganda móbile – em aparelhos móveis, como celulares).

106

Figura 3 – Propagandas interativas (Adidas, Sony Ericsson, Coca-Cola Zero e Gillette)

FONTE: http://www.emuse-tech.com

Já na tela interativa a seguir, a propaganda se dá de outra maneira, sob o modelo do t-

commerce. A Domino’s pizza firmou contrato com a Sky e pôde disponibilizar sua interface

de interação permitindo o telespectador fazer seu pedido de pizza via controle remoto.

Funciona como uma espécie de “delivery ao vivo”.

Figura 4 – t-commerce (Domino’s Pizza)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

107

Esse tipo de propaganda interativa deverá ficar disponível para acesso do televivente a

qualquer horário e em qualquer programa, assim como nos talkshows. Esse é um dos

caminhos que a TV, em geral, terá para driblar uma das funções mais usadas nos DVRs

(gravar a programação pulando os comerciais) e continuar sustentando seu modelo de

negócios por meio de outras ferramentas.

Assistindo a um talkshow, o televivente pode se interessar pelo vestido que a

entrevistada está usando, pela gravata do apresentador, a guitarra do músico da banda que

toca durante o programa ou o livro que o entrevistado está lançando, entre outros produtos

que poderão ser adquiridos imediatamente, via televisão.

Quando a Inglaterra decidiu apostar na digitalização da TV, de pronto disponibilizou

serviços mais completos de guias de programação, video-on-demand (VOD) e pay-per-view

(PPV), jogos, acesso a e-mails, t-commerce e t-banking, soluções fáceis e que davam vida à

nova ferramenta. Segundo Célia Quico, “de janeiro à agosto de 2002, a BBC produziu 57

serviços interativos”. No sistema VOD, os programas devem ficar expostos a qualquer hora

do dia como em uma tabela a la carte. Já o PPV estabelece programas e seus respectivos

horários, disponibilizando a possibilidade de compra por parte do televivente, para que este

tenha o sinal liberado em sua casa e possa assistir ao programa.

Um talkshow, da mesma maneira, poderá ficar disponível (em ambos os casos), assim

como quaisquer outras produções televisivas. São funcionalidades adquiridas pela TV,

somadas ao seu rol de serviços, que influenciam o televivente a permanecer em um mesmo

meio de comunicação para acessar os mais diversos serviços – alguns deles normalmente

acessados por outros meios como o computador (e-mail, banco online) ou telefone (comércio

em geral).

O pesquisador da Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Antônio Oliveira,

acredita que o conteúdo da TV digital deve seguir o mesmo princípio do conteúdo da TV

analógica:

O que vemos hoje na televisão analógica, do telejornal à telenovela, vai ser a “casca” do conteúdo, a primeira camada, bonita e interessante o suficiente para abrir o apetite do espectador mais guloso por informação. Uma reportagem vai ser suficiente para informar, mas deve criar no espectador o interesse em saber mais, conhecer mais sobre o assunto, simplesmente porque agora isso vai ser possível. É como se os produtores da reportagem e do telejornal dissessem subliminarmente: “você gostou do que viu agora, que belo assunto? Pois isto é só a superfície, o melhor está do lado de dentro e você pode conhecer porque agora nós podemos lhe oferecer mais.” (OLIVEIRA, 2007, p. 178).

108

A interatividade pode permitir que, durante um jogo de futebol, os televiventes

acessem informações sobre a pontuação, posse de bola, escalação e dados sobre os jogadores,

número de cartões amarelos e vermelhos, chutes a gol, etc. Ou seja, a transmissão do

conteúdo do jogo é a mesma, tirando o fato de que o televivente pode escolher de quais

câmeras ver o jogo. Mas a experiência de assistir a um jogo tendo todos os dados adicionais

que o televivente poderia precisar em mãos, de modo fácil e rápido, muda o serviço prestado

pela TV e a sua relação com quem a está usando. Essa experiência pode ser vista todos os

sábados na TV3, da Catalunha (Espanha), durante a transmissão dos jogos da temporada de

futebol europeu:

Figura 5 – Campeonato Europeu (TV3, Catalunha)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

Outro exemplo de programa que fez uso de interatividade local, elaborado pela

empresa ensequence em parceria com a emissora NBC Universal, é o Deal or no deal71. A

interface mostra o conjunto de regras para participação no programa e permite interação e

acúmulo de pontos por parte do televivente, entre outras funções. Alguns programas com

formato de quiz (jogo de perguntas e respostas), inclusive, oferecem a possibilidade do

televivente brincar junto com o apresentador, respondendo às questões que surgem na tela e

somando pontuações, como se estivesse no lugar do participante, jogando para ganhar72.

71 Transmitido no Brasil, pelo canal SBT, com o nome “Topa ou Não Topa”. 72 Já há experiências que premiam o televivente que participar, via televisão, dos programas no estilo quiz, e marcar o maior número de pontos.

109

Figura 6 – Deal or no deal (NBC Universal, EUA)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

Na Grécia, no canal 69, o reality show estilo Big Brother The Wall, além de oferecer

interatividade local mostrando o perfil e o histórico dos participantes, permitia personalização

da programação, disponibilizando a opção de acesso às câmeras que filmavam os confinados

23 horas por dia. Em outras palavras, os televiventes tornavam-se editores audiovisuais do

conteúdo.

Figura 7 – The Wall (Canal 69, Grécia)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

A interatividade local no talkshow se assemelha a algumas funções interativas

existentes nos programas até aqui citados. Como complemento à entrevista em si, podem ser

exibidas: informações sobre biografia, histórico e obras dos entrevistados, assim como do

entrevistador; informações técnicas sobre os produtos e serviços citados; a apresentação de

trechos de livros e músicas; notícias sobre o assunto debatido na entrevista; número de

pessoas que já foram entrevistadas; grade da programação, contendo quem já foi e quem ainda

110

será entrevistado nos próximos programas. No caso do “Programa do Jô” (Rede Globo), por

exemplo, dentre as informações que podem ser exibidas na interface que permite

interatividade estão a agenda de shows do apresentador Jô Soares e da banda que toca ao vivo

no programa (o Sexteto), o nome e a partitura das músicas tocadas durante o programa e o

número de entrevistados, além de vídeos das principais entrevistas.

O pesquisador Antônio Oliveira acredita que os links que dão acesso às interfaces

interativas dos programas devem ficar permanentemente disponíveis para o televivente, pois

ninguém vai querer ficar, em seu horário de lazer, com o controle remoto na mão em posição

de espera, pronto para apertar o botão no momento exato da liberação de acesso (OLIVEIRA,

2007, p. 179). Algo como um banco de dados de programas interativos disponíveis para

acesso do televivente a qualquer hora do dia ou da noite. Os próprios gravadores de vídeo

digital, como o DVR TiVo, mencionado anteriormente, fazem com que o conceito de “grade

de programação” se torne obsoleto. “O espectador não precisa mais saber em que horário ou

em que canal passa cada programa, e tem ainda a opção de ver suas gravações sem os

comerciais”, confirma Renato Cruz (2008, pp. 199 e 200). No site oficial da TiVo são

mostradas as principais funcionalidades do DVR. Entre elas, a função da pausa ao vivo e a

solicitação de programas on demand:

Figura 8 – Imagens do DVR TiVo

FONTE: http://www.tivo.com/

Mais do que interatividade local, a tecnologia permite a interatividade plena, com

participação do público, por meio de sistemas bidirecionais. Cosette Castro coloca que, entre

as formas de participação do público na programação, pode ser implantado um termômetro

ao final de cada programa, com um botão de opinião para seleção do televivente; um espaço

voltado para a mostra de produções dos “sujeitos-audiência”, com seção de comentários; e,

“alguns formatos, como os talkshows, reality shows, late shows ou programas de auditório

poderiam contar com a participação remota do público, a partir do retorno com voz ou vídeo

111

(BARBOSA FILHO, CASTRO E TOME, 2005, p. 303). Essa participação pressupõe envio

de perguntas elaboradas por televiventes para serem respondidas, se possível, ao vivo, assim

como dúvidas não respondidas que serão enviadas depois da entrevista, sugestão de nomes de

entrevistados, envio de comentários por voz, texto e vídeo ou mesmo participação em

enquetes, por meio de respostas de texto, voz e vídeo.

A participação do público nos programas pode acontecer de diversas formas. Uma das

maneiras de permitir a interação da audiência é oferecer a opção de voto sobre algum tema

específico. A Sky da Inglaterra ofereceu o serviço na série de reality show Hells Kitchen,

sobre dez celebridades tentando trabalhar como chefes de cozinha, onde o televivente

influencia no processo de eliminação dos participantes durante o programa. Essa é outra

ferramenta que pode ser implementada com sucesso nos talkshows, pois permite que os

televiventes escolham os próximos convidados para entrevista e pode garantir a audiência nos

próximos programas.

Figura 9 – Hell’s kitchen (Sky Inglaterra)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

A Sky da Inglaterra chegou a ativar um portal do canal infantil Disney que apresentava

inúmeras aplicações, como o acesso à grade de programação, voto em categorias de

112

premiações instauradas pelo canal, envio de mensagens e, inclusive, ensino de desenho de

personagens seguindo dicas reveladas na tela da TV.

Figura 10 – Canal Disney (Sky Inglaterra)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

Outro bom exemplo é o já reconhecido Test the nation, da BBC de Londres, que atraiu

mais de nove milhões de pessoas desde 2002. Nesse programa as pessoas participaram

simultaneamente do quiz, respondendo às questões via controle remoto, e tiveram acesso à

sua pontuação final na tela da TV. Test the nation fez tanto sucesso que o portal da BBC ainda

mantém um espaço reservado à audiência para as pessoas interagirem respondendo as

perguntas, calculando seus pontos e comparando seus resultados à média de respondentes.

Figura 11 – Test the Nation (BBC, Londres)

FONTE: http://www.broadbandbananas.com

A experiência da interatividade também já invade a esfera da rede social. Em exemplo

encontrado no YouTube, um programa explora o conceito “live greetings”, ou seja, o envio de

mensagens pré-programadas entre televiventes (por exemplo, “Parabéns pela sua formatura”,

113

“Feliz Natal”, “Feliz Aniversário” ou, ainda, uma mensagem dedicando uma música a um

amigo).

Figura 12 – Live greetings

FONTE: http://www.youtube.com/watch?v=5XsHiLxjzwc&feature=PlayList&p=286DA8BFE8B87A6B&playnext=1&playnext_from=PL&index=3

Pesquisando a televisão interativa na Europa, a pesquisadora portuguesa Célia Quico

encontrou o que seria a referência do primeiro programa interativo a passar em seu país.

“Noites interactivas” era um talkshow e foi transmitido ao vivo no canal promocional 21 da

TV a cabo de Portugal, de março a julho de 2002, todos os dias úteis, com início às 22 horas e

término à meia-noite, seguindo o horário tradicionalmente utilizado para transmissão desse

gênero de programa. A participação do público no programa utilizou algumas ferramentas

específicas:

A acção do talk-show decorria em dois estúdios diferentes: no estúdio principal a apresentadora Luísa Castel-Branco falava com os seus convidados sobre um dado tema ou tópico irreverente, enquanto no segundo estúdio, outro apresentador discutia com vários convidados, cujas opiniões eram comentadas pelos espectadores interactivos, através de opiniões expressas no fórum de debate. O fórum era uma das funcionalidades disponíveis para os utilizadores da ITV Cabo, os quais podiam também seleccionar diferentes ângulos de vídeo, votar qual dos convidados deveria ir para o estúdio principal e mesmo escolher qual o tópico que deveria ser debatido durante os últimos 30 minutos do programa. Os utilizadores podiam também enviar questões e opiniões, que os apresentadores muitas vezes introduziam no debate em estúdio” (QUICO, 2003).

Como o talkshow tem um formato que aceita bem a interação ao vivo (pois engloba

uma entrevista que tem como mote responder às principais curiosidades do entrevistador – ele

pretende fazer um apanhado das dúvidas gerais da população), passa a ser um excelente

114

exemplo de programa televisivo que pode receber inúmeras aplicações interativas. Cabem, no

talkshow, iniciativas criativas, muitas delas já existentes no nível de interatividade local, que

ampliam o leque de informações que o televivente encontra nesse gênero de programa. Isso

sem, sequer, levar em conta as possibilidades advindas da bidirecionalidade de um canal de

retorno.

Analisando todos esses aspectos positivos da interatividade, parece que o foco da

preocupação das emissoras está errado. O modelo mutante de negócios soa como bem menos

importante que a oferta de opções interativas e a produção de conteúdo interessante – que é o

que realmente pode ser traduzido como vantagem competitiva neste novo mercado digital.

Algumas dessas funções – como a busca de guias eletrônicos e o arquivo e registro do “histórico” de buscas anteriores – permitirão conhecer as preferências dos usuários. Não apenas as necessidades de informação e de serviços da população assinante de um canal interativo, mas também os aspectos emocionais da vida serão canalizados através do mercado. [...] não serão os conteúdos, mas sim a gestão do tempo humano que se transformará em mercadoria. (VILCHES, 2003).

Todas as modificações proporcionadas pela evolução das tecnologias vêm com o

propósito de auxiliar a humanidade e, como Lourenço Vilches bem colocou, ajudar na gestão

do tempo humano é um fator que pode ser aproveitado de maneira positiva ou pode ser

abusivo em suas intervenções e manipulação de dados – o que pode acontecer em qualquer

situação. Olhando a digitalização como um todo e as transformações que começam a

reestruturar e reorganizar as ações, as comunicações e a vida da humanidade inteira, é

possível olhar a TV digital como uma tecnologia que veio para reestruturar as relações, seja

dos televiventes com as emissoras, das emissoras com as pessoas responsáveis pela

construção da mensagem, destas com os outros meios de comunicação e vice-versa.

115

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desta dissertação foi mostrar as transformações que a digitalização vem

possibilitando ao meio de comunicação mais difundido no Brasil, a televisão. A relevância do

trabalho está não apenas na representatividade da própria TV como meio de entretenimento e

informação, mas em todas as possibilidades oferecidas pela digitalização, que modificam o

conteúdo, a programação e a recepção.

Vivemos um momento onde é possível notar a mudança estrutural do sistema

televisivo como um todo, desde o emissor até o receptor, agora televivente, bastante

influenciado no processo. Além da mudança na percepção do conteúdo audiovisual – desde as

narrativas hipermidiáticas, a interface e a interatividade em geral até a alta resolução –, a

chance de um novo papel do emissor/receptor muda o processo tradicionalmente unidirecional

da televisão.

A possibilidade de mudar o caminho normal do conteúdo televisivo implica um custo

assumido pelo indivíduo para mudar seus hábitos de como ver, ouvir, sentir e se relacionar

com a televisão. Cada vez mais, as gerações mais jovens têm convivido com novas

ferramentas de comunicação que motivam os televiventes a participarem do sistema de

comunicação, colaborando com a criação do conteúdo. Isso já acontece há algum tempo nos

games (alguns, inclusive, trabalham com alta resolução): a interatividade (como os sistemas

multiplayer, onde pessoas de várias partes do mundo jogam entre si), a possibilidade do

jogador fazer seu caminho de forma personalizada através do jogo ou, ainda, os processos que

induzem à imersão dos indivíduos – todos esses temas são, inclusive, objetos de estudos nos

cursos de graduação e pós-graduação voltados para o universo dos games, que têm se

proliferado bastante nas últimas décadas.

Ao observar tantas capacidades adquiridas e ampliadas, ao avaliar a intensidade de

participação do usuário e ao analisar as interfaces e os processos envolvidos nessas

funcionalidades, é possível concluir que a TV digital não é apenas uma evolução da TV

analógica. Isso pode ficar mais claro se observada a interface utilizada nos middlewares para

dar acesso à interatividade na programação – muito semelhante ao modelo utilizado nas

interfaces dos computadores pessoais –, que metaforiza ações do homem e implanta objetos

repletos de significados intrínsecos à leitura e percepção humanas no chamado Desktop. Essa

interface facilita a interação usuário-máquina, pois, por meio de ícones, traduz a árida

116

abstração dos códigos analógicos de “zeros e uns” da informática para uma formatação

compreensível em termos de pretensas ações humanas.

A arquitetura da TV digital imita o design computacional, assim como as

possibilidades de interação, proporcionadas ao transformar os sinais analógicos em “zeros e

uns” – código natural da computação. Assim sendo, pode-se encarar a TV digital como um

dispositivo estendido, um display periférico que surge das potencialidades computacionais –

como se o computador pudesse agora disseminar suas capacidades extraordinárias em

dispositivos adicionais, nos quais se pretende atingir o nível máximo de potencialidade em

ações específicas. Em vez das pessoas concentrarem todas as suas necessidades de memória e

processamento em um único terminal multifuncional de altíssima capacidade, como vinha

ocorrendo até agora, há indicações claras de um novo modelo no qual vários dispositivos com

alto potencial, mas funções mais específicas, podem funcionar de forma independente ou

interconectados.

Esses dispositivos de alta capacidade podem ser, por exemplo, os sistemas de áudio de

alta fidelidade de um home theater; sistemas de controle de estoque que avisam quando

determinado produto precisa ser reposto; modelos eletrônicos para leitura de livros, revistas

ou jornais (como o Kindle, da Amazon), e até mesmo um display audiovisual interativo,

hipermidiático e de alta resolução para reinar em ambientes como salas de estar. Derrick de

Kerckhove, seguindo a linha de pensamento de McLuhan sobre as tecnologias como

extensões do homem, dizia que a interface dos meios digitais interativos é uma “metáfora

tecnológica dos sentidos” (KERCKHOVE apud GOSCIOLA, 2003, p. 93).

Ainda na década de 90, pesquisadores já alertavam que a chave para o futuro da

televisão é parar de pensar nela como televisão, e começar a encará-la em termo de bits.

Enxergá-las mais como displays com memória e poder de processamento, menos como

receptores automáticos que transmitem sinais analógicos convertidos em imagem e som de

baixa resolução.

Olhar para o futuro do conteúdo, da programação e do sucesso da relação mídia-

televivente implica olhar para o impacto que as mudanças estruturais produzidas pela

digitalização dos meios de comunicação têm causado nos indivíduos. Cada vez mais, eles

possuem o controle dos caminhos a percorrer entre o que é disponibilizado pelos veículos; o

que determina o que é possível ao televivente fazer passa pela estrutura tecnológica do

sistema televisivo.

É essencial aos pesquisadores da comunicação compreender e pesquisar as

tecnologias, já que são elas que edificam e impõem as regras do nosso sistema

117

comunicacional, mesmo não pertencendo diretamente a essa área de estudos. Além da

engenharia, cujos estudos proporcionam a estrutura da telecomunicação, outras áreas têm

entrado no circuito da mídia tradicional e têm pautado este novo mundo digital. Necessário se

torna aos pesquisadores saírem dos limites de suas áreas, pois não é mais possível olhar

objetos de estudo sob apenas um ponto de vista. Os comunicadores devem olhar a TV digital

sob a ótica de outros campos, de forma a compreendê-la mais plenamente – afinal de contas, a

busca pela conexão transdisciplinar é função latente do pesquisador.

Determinar a tecnologia digital a ser aplicada em cada gênero televisivo exige a

compreensão do desenvolvimento da televisão sob vários aspectos. A identificação das

necessidades dos programas e dos recursos disponíveis cabíveis para produção de um gênero

é fundamental para a escolha das tecnologias adequadas. Programas diferentes possuem

brechas distintas para a introdução de ferramentas que complementam o serviço já oferecido.

O talkshow tem necessidades peculiares ao gênero. Como explicado no último

capítulo, suas potencialidades agregam ferramentas interativas já implantadas em outros

programas, sendo o talkshow um excelente espaço de experimentação, por lidar com questões

e dúvidas do público, tratar de situações e relações humanas e por envolver a audiência neste

descobrimento progressivo de curiosidades sobre as pessoas. Diferente das telenovelas e dos

programas esportivos, o talkshow não tem sido foco de atenção e investimentos das

emissoras, muito provavelmente por não representar o volume de audiência de ambos. Isto,

porém, pode ser questão de tempo – o Brasil ainda não tem dois anos completos do SBTVD

(Sistema Brasileiro de TV Digital) implantado.

A TV digital não é só um modelo de negócios voltado simplesmente para ganhos

comerciais ou uma ampliação de características da indústria do entretenimento; é uma nova

plataforma comunicacional, com novos processos, que reestrutura o sistema de transmissão de

conteúdos audiovisuais interativos. Pressupõe muito mais que entretenimento e negócios,

destacando aspectos como os ambientes de aprendizagem virtuais e trocas em diversos níveis,

além do relacionamento com outros indivíduos formadores da audiência, entre pares – algo

como despertar o sentido do coletivo das comunidades e redes de informação, característica

peculiar aos computadores pessoais. Segundo Lourenço Vilches (2003, p. 183), “hoje os

conceitos de emissores-receptores não são adequados para a Rede, e a teoria dos usos e

necessidades terá de ser reformulada em termos de uma nova materialidade dos meios

interativos”. Como explicado anteriormente, principalmente no capítulo sobre recepção, as

teorias tradicionais da comunicação terão de ser profundamente modificadas em vista das

118

novas tecnologias. Daí decorre o subtítulo desta dissertação: novo conteúdo, nova

programação, nova recepção. As transformações em cadeia são uma consequência da outra.

Retomando os objetivos expostos na introdução deste trabalho, podem ser apontadas

algumas diretrizes e confirmadas algumas hipóteses. Durante toda a pesquisa procurou-se

embasar, explicar e verificar quais mudanças poderia acarretar o formato tecnológico que

estrutura a TV digital no conteúdo dos programas, mais especificamente no talkshow e,

consequentemente, na relação com o telespectador.

A TV digital faz parte de um cenário maior que envolve a digitalização dos meios de

comunicação. E essa nova realidade televisiva – interativa, bidirecional, de alta resolução e

com possibilidade de adequar a captação do sinal digital por displays móveis –, que começou

com a mudança de sinal e estrutura das emissoras, cada vez mais tem envolvido os

telespectadores e os transformado em televiventes (que influenciam, interagem, participam e

vivem a televisão), já que provoca a mudança da percepção e o entendimento geral das

mensagens emitidas. Os programas estão sendo modificados, assim como os núcleos criativos

de produção de conteúdo, que passa a ser audiovisual, interativo, hipermidiático, de alta

definição e dotado de narrativas não-tradicionais e não-lineares.

O talkshow foi analisado sob a ótica analógica e utilizado para exemplificar como as

ferramentas digitais interativas podem mudar a programação. Para cumprir esse objetivo,

foram utilizados programas interativos que já possuem aplicativos e funcionalidades deste

tipo. O que o Brasil ainda vê como futuro, já existe em outros países há quase uma década. A

interatividade na TV digital é possível tecnologicamente e sua efetiva implantação tem dado

certo na Europa e nos Estados Unidos, inclusive como modelo de negócios, para alívio da

publicidade nacional. Analisando a programação interativa existente e transpondo os aspectos

que poderiam existir, perfeitamente, nos talkshows, percebemos a viabilidade de funções que

podem ser adquiridas pelo gênero. O talkshow um programa que lida, basicamente, com

pessoas e que trata das pessoas e de suas vidas (plateia, entrevistador, entrevistados), por isso

mesmo traz grandes potencialidades de desenvolvimento neste segmento. Além de ser

considerado programa informativo e de entretenimento, abre espaço para performances e

shows, o que amplia ainda mais o leque de opções do produtor do programa ao criar e

elaborar quadros interativos.

Emissão, produção, conteúdo, recepção. Todas as mudanças acarretadas pela nova

tecnologia da TV digital, elencadas no decorrer da dissertação, levam a pensar que a

digitalização desse meio modifica o sistema comunicacional televisivo como um todo. O

119

talkshow, coadjuvante desse grande processo, simboliza bem as relações que o televivente

poderá ter com esse novo aparelho.

Não se esperava, quando da época da TV tradicional, nada mais que um

relacionamento do tipo on e off; hoje, contudo, podemos esperar da TV muito mais do que

áudio e vídeo, mas um sistema complexo de interatividade com tendência a, cada vez mais,

proporcionar a imersão total no universo televisivo que as pessoas tanto já quiseram adentrar.

Os indivíduos reinarão absolutos na sala-de-estar. Ou não. Eles podem estar conectados, via

tecnologia móvel, de praticamente qualquer lugar onde haja um display pronto para receber a

tecnologia.

120

REFERÊNCIAS

A INVASÃO da luz. Revista Superinteressante. Disponível em: http://super.abril.com.br/superarquivo/1989/conteudo_111797.shtml. Acesso em: maio de 2008.

A TV para o gosto popular. In: O Estado de S.Paulo, São Paulo, 23 fev. 1982. ADAMS, Marc, ANAND, Parul e FOX, Sebastien. Interactive Television: Coming soon In a screen near you. 2001.

ADORNO, Theodor. A indústria cultural. In: COHN, Gabriel (Org.) Comunicação e indústria cultural. São Paulo: Edusp, 1971. p. 287-295.

AMARAL, Marina et al. Abu – Curto e grosso. In: Revista Caros Amigos. Disponível em: http://carosamigos.terra.com.br/da_revista/edicoes/ed54/entrevista.asp. Acesso em: julho de 2008.

AMARAL, Sérgio Ferreira do. Interatividade baseada nas tecnologias digitais em ambientes não presenciais. Seminário de Gestão do Conhecimento em Educação e Tecnologia da Informação, 3. Disponível em: http://beta.fae.unicamp.br/tic. Acesso em: novembro de 2007.

AMORIM, Edgar Ribeiro de. In: Revista Telecentro, n. 6, nov /dez. 2000.

ARBEX JÚNIOR, José. Showrnalismo: a notícia como espetáculo. São Paulo: Casa Amarela, 2001.

AURELIO. O mini dicionário da língua portuguesa. 4ª edição revista e ampliada do mini dicionário Aurélio. Rio de Janeiro, 2002.

BAITELLO, N. O animal que parou os relógios. São Paulo: Annablume, 1997.

BARBOSA FILHO, André, CASTRO, Cosette e TOME, Takashi (orgs.). Mídias digitais: convergência tecnológica e inclusão social. São Paulo: Paulinas, 2005.

BARLOW, John Perry. The Economy of ideas. 1994. Disponível em: http://www.wired.com/wired/archive/2,03/economy.ideas.html. Acesso em: dezembro de 2008.

BARTHES, Roland. A mensagem fotográfica. In: LIMA, Luiz Costa (Org.) Teoria da Cultura de Massa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2000. p. 323-338.

BECKER, Valdecir. TV Digital e a interatividade: impacto na sociedade. T&C Amazônia, ano V, n. 12, p.7-14, out. 2007.

121

BECKER, Valdecir et al. Recomendações de Usabilidade para TV Digital Interativa. Disponível em: http://www.lbd.dcc.ufmg.br:8080/colecoes/wTVd/2006/Paper3.pdf. Acesso em: out. 2007. Acesso em: janeiro de 2008.

BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Magia e Técnica. Arte e Política. São Paulo: Brasiliense, 1994. Coleção Obras Escolhidas. Vol. 1. p. 165-196.

BENTES, Ivana. Globalização Eletrônica e América Latina. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Disponível em: http://bocc.ubi.pt/pag/bentes-ivana-globalizacao-eletronica.html. Acesso em: agosto de 2007.

BOLÃNO, César Ricardo Siqueira. Sociedade da Informação: reestruturação capitalista e esfera pública global. Universidade Federal de Sergipe. Disponível em: www.fclar.unesp.br/soc/revista/artigos_pdf_res/08/05-bola%F1o.pdf. Acesso em: novembro de 2007.

BOLAÑO, César Ricardo Siqueira e BRITTOS, Valério Cruz. A televisão brasileira na era digital: excusão, esfera pública e ovimentos estruturantes. São Paulo: Paulus, 2007.

BOLÃNO, César Ricardo Siqueira e VIEIRA, Vinícius Rodrigues. TV Digital no Brasil e no mundo: estado da arte. In: EPTIC Revista de Economia Política de las Tecnologias de la Información y Comunicación, v. 14, n. 2, mai./ago. 2004.

BONILLA, Maria Helena S. Escola aprendente: desafios e possibilidades postos no contexto da sociedade do conhecimento. 2002. Tese, Faculdade de Educação, Universidade Federal da Bahia, Salvador. p. 188-193.

BORJA, J. M. Qualidade e modos de endereçamento no Balanço Geral e Jogo Aberto. Salvador, BA. 2005. Trabalho de Conclusão de Curso de Jornalismo. Facom/UFBA.

BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997.

BRAGA, José Luiz. Roda Viva: uma encenação da esfera pública. Trabalho apresentado no NP de Jornalismo no VI Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom durante o XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. UnB, setembro de 2006.

BRASIL, Antônio. Google anuncia o fim da TV. Disponível em: http://www.comunique-se.com.br/index.asp?p=Conteudo/ NewsShow.asp&p2=idnot%3D38874%26Editoria%3D286%26Op2%6Op3%3D0%26pid%3D37775420881%26fnt%3Dfdtnl. Acesso em: março de 2008.

BRENNAND, Edna; LEMOS, Guido. Televisão Digital Interativa. Vinhedo: Ed. Horizonte, São Paulo: Ed. Mackenzie, 2007.

122

BRITTOS, Valéria Cruz e BOLAÑO, César Ricardo Siqueira. TV digital: potencialidades e disputas. Trabalho apresentado ao NP 7 de Comunicação Audiovisual, do IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.

BUCCI, Eugênio. Direito de livre expressão e direito social à informação na era digital. Revista Líbero, ano XI, n. 22, dez., 2008. P. 101 – 108.

CANAVARRO, Marcela e GANEN, Paula. TV digital recria publicidade. In: Jornal do Brasil, Rio de Janeiro, 12 de mar. 2006.

CARMO, José Botura do. Interação e Interatividade. Disponível em: http://paginas.terra.com.br/educacao/josue/index%2065.htm. Acesso em: setembro de 2007.

CARPANEZ, Juliana e BUENO, Renato. O que você precisa saber sobre a estréia da TV Digital. Disponível em: http://g1.globo.com/Noticias/Tecnologia/0,,MUL178208-6174,00.html. Acesso em: março de 2008.

CASTELLS, Manuel. A Sociedade em Rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

CHARAUDEAU, Patrick e GHIGLIONE, Rodolphe. A palavra confiscada: um gênero televisivo: o talk show. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.

COM GRAVAÇÃO em alta definição, TV digital gera polêmica sobre pirataria. Disponível em: http://www.oglobo.globo.com/tecnologia/mat/2007/11/25/327314916.asp. Acesso em: janeiro de 2008.

CORRÊA, Rafael. Breve em sua casa. In: Revista Veja, p. 112-115, 26 abr. 2006.

CROCOMO, Fernando. TV digital e produção interativa: a comunidade manda notícias. Florianópolis: Ed. Da UFSC, 2007.

CRUZ, Renato. TV digital no Brasil: tecnologia versus política. São Paulo: Editora Senac São Paulo, 2008.

DALMAZO, Luiza. TV Digital aberta não vai afetar mercado da TV paga, diz ABTA. Disponível em: http://computerworld.uol.com.br/telecomunicacoes/2007/06/27/idgnoticia.2007-06-27.2191081190/. Acesso em: janeiro de 2007.

DELUIZ, Neise. Formação do sujeito e a questão democrática em Habermas. Boletim Técnico do Senac v. 21, n. 1, jan./abr., 1995.

DERTOUZOS, Michael. O que será: como o novo mundo da informação transformará nossas vidas. São Paulo: Companhia das letras, 1997.

123

DIAS, Maurício. Vênus Endividada. In: Revista Carta Capital, a. IX, n. 214, p. 26-31, 6 nov. 2002.

DICIONÁRIO da TV Globo, v.1: programas de dramaturgia & entretenimento / Projeto Memória das Organizações Globo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003.

DUARTE, Elizabeth Bastos. Televisão: entre gêneros/formatos e produtos. Trabalho apresentado no Núcleo de Semiótica da Comunicação, do XXVI Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.

______. Televisão: diferentes modalidades de embaralhamento de realidades discursivas. Trabalho apresentado ao NP 15 – Semiótica da Comunicação, do XXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.

DUARTE, Elizabeth Bastos e CASTRO, Maria Lilia Dias de. Comunicação Audiovisual: gêneros e formatos. Porto Alegre: Sulina, 2007.

DUARTE, Marcelo. O livro das invenções. São Paulo: Companhia das Letras, 1997.

ESPECIALISTA prevê 400% mais IPTV em 2011. Disponível em: http://www.telaviva.com.br/revista/173/scanner.htm. Acesso em: fevereiro de 2008.

FARO, José. Marshall McLuhan 40 anos depois: a mídia como lógica de dois tempos. Disponível em: http://www.jsfaro.pro.br/downloads/macluhan.doc. Acesso em: maio de 2008.

FEENBERG, Andrew. Marcuse ou Habermas: duas críticas da tecnologia. Disponível: http://www.sfu.ca/~andrewf/marhabportu.htm. Acesso em: novembro de 2008.

FERNANDES, Frederico B. et al. Biblioteca digital na era da TV interativa. Universidade Federal da Paraíba. Disponível em: http://libdigi.unicamp.br/document/?view=8296. Acesso em: outubro de 2007.

FERNANDES, Lílian. Quem manda na novela é você. Disponível em: http://www.oglobo.com.br. Acesso em: maio de 2008.

FERRARI, Pollyana. Hipertexto, hipermídia: as novas ferramentas da comunicação digital. São Paulo: Contexto, 2007.

FINOTTI, Ivan. Nas graças do Gordo. Folha de S. Paulo, São Paulo, 15 jun. 2003. Folha Ilustrada, p. E1.

FLUSSER, Vilém. O mundo codificado: por uma filosofia do design e da comunicação: Vilém Flusser; organizado por Rafael Cardoso. Tradução: Raquel Abi-Sâmara. São Paulo: Cosac Naify, 2007.

124

FRAGOSO, Suely. De interações e interatividade. In: Compós, 10, 2001. Brasília. Disponível em: http://www.comunidadesvirtuais.pro.br/hipertexto/ home/interatividade.pdf. Acesso em: outubro de 2007.

FREIRE FILHO, João. História da Televisão: Teoria e Prática. Trabalho apresentado no NP 7 de Comunicação Audiovisual, no IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.

FREITAS, Jackeline Spínola de. Interatividade nas mídias digitais. Universidade Federal da Bahia. Disponível em: http://www.dca.fee.unicamp.br/~jspinola/Diss_Jackie.pdf. Acesso em: setembro de 2007. GARRIDO, Lina. Talkshow! São Paulo:PUCSP, 2005. 61 p. Monografia – Faculdade de Comunicação e Filosofia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2005.

GILDER, George. A vida após a televisão: vencendo na revolução digital. Rio de Janeiro: Ediouro, 1996.

GINER, Juan. A mídia e o consumidor do futuro. In: Encontro ESPM de Comunicação e Marketing, 1. São Paulo.

GORZ, André. O Trabalho Imaterial: O “Capital Imaterial”. In: O imaterial: conhecimento, valor e capital. Annablume. P. 15-57.

GOSCIOLA, Vicente. Roteiro para as novas mídias: do game à TV interativa. São Paulo: Senac São Paulo, 2003.

GRALEB, Carlos. Nosso negócio é conteúdo. In: Revista Veja, a. 39, n. 12, p. 11-15, 29 mar. 2006.

GRECO, Alessandro. Ele inventou a Internet ... E ele criou a WEB. In: Revista Veja Edição especial Tecnologia, a. 39, n. 71, p. 34-45, jul. 2006.

HABERMAS, Jürgen. Técnica e ciência como “ideologia”. Lisboa: Edições 70, 2006.

HOLANDA, Giovanni Moura de. Os Desafios da TV Digital no Brasil: Interatividade e Inclusão. CpqD. dez. 2004. Disponível em: http://www.abtu.org.br/eventos/seminário_TVdigital/apres_interatividade_cpqd_dez04.pdf. Acesso em: agosto de 2007.

HOINEFF, Nelson. TV digital e o desastre anunciado. Disponível em: http://www.midiativa.org.br/index.php/midiativa/content/view/full/1269/. Acesso em: maio de 2008.

125

INTERNET é mais popular que TV na Europa, diz pesquisa. Disponível em: http://tecnologia.terra.com.br/interna/0,,OI2130709-EI4795,00.html. Acesso em: fevereiro de 2008.

JANUÁRIO, Larissa. Apenas 8% dos domicílios brasileiros têm TV a cabo. Disponível em: http://wnews.uol.com.br/site/noticias/materia.php?id_secao=1&id_conteudo=3769. Acesso em: janeiro de 2008.

JESPERS, Jean-Jacques. Jornalismo Televisivo. Coimbra: Minerva, 1998.

JOLY, Ana Vitória. A interatividade na televisão digital: um estudo preliminar. Universidade Federal de São Carlos. Disponível em: http://bocc.ubi.pt/pag/joly-ana-interatividade-TV-digital-port.html. Acesso em: agosto de 2007.

JUNOT, Regis Alvim. Publicidade Interativa na TV Digital. Disponível em: http://www.via.multimidia.nom.br/tvdigital/publicidade_interativa_na_tv_digital.pdf. Acesso em: abril de 2008.

KRYLLOS, Leny; COTES, Cláudia e FEIJÓ, Deborah. Voz e corpo na TV: a fonoaudiologia a serviço da comunicação. São Paulo: Globo, 2003.

LEAL FILHO, Laurindo Lalo. A TV sob controle. Summus, 2006.

LEÃO, Lúcia. O labirinto da hipermídia: arquitetura e navegação no ciberespaço. São Paulo: Iluminuras, 2005.

LEITE, Luiz Eduardo Cunha. FlexTV: uma Proposta de Arquitetura de Middleware para o Sistema Brasileiro de TV Digital. Revista de Engenharia de Computação e Sistemas Digitais PSC / EPUSP, São Paulo, p. 29-49. Disponível em: http://www.pcs.poli.usp.br/revista/n2/r002a003.pdf. Acesso em: outubro de 2007.

LEVY, Pierre. Cibercultura. Editora 34, 1999.

LIMA, Venício A. de. Mídia: teoria e política. Perseu Abramo, 2001.

LIMA, Vilma Silva. Reprodutibilidade técnica em tempos de digitalização da Tevê Universitária Brasileira. Trabalho apresentado no NP de Comunicação Audiovisual do XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação.

LIMA JUNIOR, Walter. Evento marcará o debate sobre a mídia digital. In: Revista Imprensa, a. 19, n. 210, p. 86-87, mar. 2006.

126

______. Novo sonho de consumo: ser garota do tempo. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos.asp?cod=348DAC002. Acesso em: abril de 2008.

______. Pesquisa aplicada na descoberta de novas tecnologias de produção e distribuição de conteúdos jornalísticos. Trabalho apresentado no NP 2 de Jornalismo no V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom. No XXVIII Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. UERJ, setembro de 2005.

LOBO, Ana Paula. TV Digital: Royalties ameaçam lançamento oficial do Ginga. Disponível em: http://www.convergenciadigital.com.br/cgi/cgilua.exe/sys/start.htm?infoid=12529&sid=8 . Acesso em: fevereiro de 2008.

LOPES, Luis Carlos. Objetivismo, subjetivismo e comunicação pela TV. Trabalho apresentado no Núcleo de Teorias da Comunicação, XXVI Congresso Anual em Ciência da Comunicação, Belo Horizonte/MG, 02 a 06 de setembro de 2003.

LOSS, Márcio Rogério. A TV Digital e a invasão da privacidade. Sorocaba: Editora Minelli, 2008.

LOUREIRO, Marco Vinícius Cauduro. Análise de um programa informativo. 2001

LUDWIG, Johannes. The Essential Economic Problem of the Media: Working Between Market failure and cross-financing. 2000. The journal of media Economics. Lawrence Erlbaum Associates, Inc.

LYON, Richard F. A Brief History of Pixel. San Jose, California, USA, 2006.

LYON, Richard F e HUBET, Paul M. Eyeing the Camera: into the Next Century. Santa Clara, California, USA.

MACHADO, Arlindo. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac São Paulo, 2003.

MACHADO, Arlindo; VÉLEZ, Marta Lucía. Questões metodológicas relacionadas com a análise de televisão. E-Compos. Revista da Associação Nacional de Programas de Pós-graduação. N. 8. Abril de 2007. Disponível em: http://boston.braslink.com/compos.org.br/e-compos/ . Acesso em: fevereiro de 2008.

MARTHE, Marcelo. A Nova era da televisão. In: Revista Veja, a. 36, n. 36, p. 88-97, 13 set. 2006.

MARTÍN-BARBERO, Jesús. Tecnicidades, identidades, alteridades: mudanças e opacidades da comunicação no novo século. In: Sociedade Midiatizada. Org. Denis de Moraes. P. 51 – 79.

127

MARTÍN-BARBERO, Jesús e REY, Germán. Os exercícios do ver: hegemonia e ficção televisiva. São Paulo: SENAC São Paulo, 2001.

MARTINO, Luiz C. As epistemologias contemporâneas e o lugar da Comunicação. In: Epistemologia da Comunicação. São Paulo: Loyola, 2003. MARTINS, Rodrigo. TV digital vai demorar para pegar. 26 nov. 2007. Disponível em: http://www.link.estadao.com.br/index.cfm?id_conteudo=12469. Acesso em: janeiro de 2008.

MATCHER, Maria Ataíde. Gênero Ficcional Televisivo: Instância mediadora da comunicação massiva. Trabalho apresentado nno XXIV Congresso Brasileiro da Comunicação do Intercom. Setembro 2001.

MCLUHAN, Marshall. Os meios de comunicação como extensões do homem. São Paulo: Cultrix, 2005.

MÉDOLA, Ana Silvia Lopes Davi e TEIXEIRA, Lauro Henrique de Paiva. Aspectos da TV Digital interativa: como pode ficar a nova televisão do ponto de vista do usuário. Disponível em: http://www.faac.unesp.br/publicacoes/anais-comunicacao/textos/35.pdf. Acesso em: abril de 2008.

MELO, Isabelle Anchieta de. O jornalismo colaborativo não ameaça a profissão do jornalista. Disponível em: http://www.comunique-se.com.br/Conteudo/NewsShow.asp?idnot=39503&Editoria=237&Op2=1&Op3=0&pid=264990&fnt=fntnl. Acesso em: outubro de 2007.

MENAI, Tânia. O senhor skype. In: Revista Veja, a. 40 n. 9, p. 9-13, 7 mar. 2007.

MENEZES, Isabel Padilha de. Habermas e a cidadania. 2007. Disponível em: http://www.puc-rio.br/pibic/relatorio_resumo2007/resumos/EDU/padilha_de_menezes.pdf Acesso em: agosto de 2009.

MENEZES, José Eugênio de O. Ondas que vinculam corpos: mídia primária, mídia secundária e mídia terciária. In: Rádio e Cidade. Vínculos Sonoros. São Paulo: Annablume, 2007. p. 21-43.

MENEZES, José Eugênio de O. e MARTINEZ Mônica. O visionário da mídia. In: Revista Líbero. a. VIII n. 15/16, p. 103-104. 2005.

MILLER, Gustavo. Publicidade ganha braços na TV Digital. Disponível em: http://www.link.estadao.com.br/index.cfm?id_conteudo=9154. Acesso em: janeiro de 2008.

MIRA, Maria Celeste. Circo Eletrônico: Silvio Santos e o SBT. São Paulo: Olho d’água e Loyola.

128

MIRANDA, Gabriela. O futuro chegou (você está preparado?). In: Revista Imprensa, a. 19, n. 207, p. 98-100, nov. 2005.

MOURA, Alex Pereira de. TV Digital no Brasil: do SBTVD ao impasse. Trabalho apresentado no XI Simpósio de Ciências da Comunicação na Região Sudeste. Ribeirão Preto, SP. 2006.

MOURA, Luiz. Um novo olhar para a TV. In: Revista Teletime, a. 10, n. 104, out. 2007.

MURER, Ricardo. O que é IPTV. 2007. Disponível em: http://www.softv.com.br. Acesso em: janeiro de 2009.

NALDONI, Thaís. És multimídia? In: Revista Imprensa, a. 19, n. 21, p. 36-39, abr. 2006.

______. Um outro olhar sobre a TV Digital. In: Revista Imprensa, a. 19, n. 215, p. 36-38, ago. 2006.

NEGROPONTE, Nicholas. Vida digital. Tradução de Sérgio Tellaroli; supervisão técnica Ricardo Rangel. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.

NERY, João Elias. TV Universitária no Mundo Digital. Trabalho apresentado ao NP 7 de Comunicação Audiovisual, do V Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.

NEVES, Artur Castro. O sentido econômico da convergência digital. Disponível em: http://www.cidade.usp.br/arquivo/artigos/index0901.php. Acesso em: setembro de 2007.

OLHAR esperto e seletivo. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/al050920001.htm. Acesso em: junho de 2008.

OLIVEIRA, Antônio Francisco Maia de. Televisão Digital e conteúdos informacionais: contribuições na cosntrução de cidadania e inclusão social. PUC-Campinas, 2007. Dissertação apresentada ao programa de pós graduação em ciência da informação da PUC Campinas.

OPHRA Winfrey e Discovery vão lançar rede de TV. Disponível em: http://www.br.reuters.com. Acesso em: janeiro de 2008.

OROZCO GÓMEZ, Guillermo. Comunicação Social e mudança tecnológica: um cenário de múltiplos desordenamentos. In: MORAES, Denis de. (Org.) Sociedade Midiatizada. Rio: Mauad, 2006. p. 81-98.

129

OROZCO GÓMEZ, Guilhermo. Televisión y Audiências: Um enfoque cualitativo. Madrid: Ediciones de La Torre, 1996.

OS INVENTORES da TV. Disponível em: http://www.electronicapt.com/forum/index.php/topic,1214.0.html. Acesso em: abril de 2008.

PAIVA, Cláudio Cardoso de. O riso e o siso do Programa do Jô: a televisão como canal de informação e entretenimento. Disponível em: www.bocc.ubi.pt. Acesso em: dezembro de 2008.

PARA que pesquisar? Comunicação: uma ciência social aplicada. In: Epistemologia da Comunicação. São Paulo: Loyola, 2003.

PATERNOSTRO, Vera Íris. O texto na TV: manual de telejornalismo. Rio de Janeiro: Campus, 1999.

PATRIOTA, Karla Regina Macena Pereira e FERRARIO, Circe Mascarenhas. Tecnologia e convergência: A propaganda nunca mais será a mesma. Trabalho apresentado ao NP de Publicidade e Propaganda, do VI Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.

PENA, Felipe. A TV Digital no imaginário tecnológico: identidades, mediação e sociabilidade nas fantasias do telejornalismo online. Disponível em: http://www.facom.ufba.br/Pos/gtjornalismo/doc/pena2004.doc. Acesso em: outubro de 2007.

PICCOLO, Lara Schibelsky Godoy. Arquitetura do Set-top Box para TV Digital Interativa. Disponível em: http://www.cin.ufpe.br/~gds/TAI/GDS_CEMR-APLIC-06.pdf. Acesso em: setembro de 2007.

POR DENTRO da TV. In: Revista Cult, São Paulo, a. 10, n. 115, p. 40-63, jul. 2007.

PRIMO, Alex. Enfoques e desfoques no estudo da interação mediada por computador. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. 404NotFound, n. 45. 2005. Disponível em: http://www.facom.ufba.br/ciberpesquisa/404nOtf0und/404_45.htm. Acesso em: outubro de 2007.

PRIMO, Alex e CASSOL, Márcio Borges Fortes. Explorando o conceito de interatividade: definições e taxonomias. Disponível em: http://usr.psico.ufrgs.br/âprimo/pb/pgie.htm. Acesso em: outubro de 2007.

PROVOCAÇÕES inova com antitalk show. In: Revista ISTOÉ. São Paulo: Editora Três, 11 jun. 2001.

PUBLICIDADE ficará incorporada ao conteúdo dos programas na TV digital. Disponível em: http://cidadebiz.oi.com.br/paginas/41001_42000/41677-1.html. Acesso em: janeiro de 2008.

130

QUICO, Célia. Televisão interactiva: o estado da arte em 2002 e linhas de evolução. Disponível em: http://qqwww.bocc.ubi.pt/pag/quico-celia-televisao-interactiva.html. Acesso em: abril de 2008.

______. Televisão Digital e Interactiva: o desafio de adequar a oferta às necessidades e preferências dos utilizadores. Disponível em: http://www.bocc.ubi.pt/pag/celia-quico-televisao-digital-interactiva-desafio-adequar-oferta-necessidades-preferencias-dos-utilizadores.pdf. Acesso em: maio de 2008.

RABAÇA, Carlos Alberto e BARBOSA, Gustavo Guimarães. Dicionário de Comunicação. São Paulo: Campus, 2001.

RAMALHO, Alzimar. Entre universidade e sociedade, há espaço para a televisão. Disponível em: http://www.midiaepolitica.unb.br/visualizar.php?id=257&autor=Alzimar%20Ramalho. Acesso em: fevereiro de 2008.

RYDLEWSKI, Carlos. Conheça sua próxima TV. In: Revista Veja, a. 40, n. 5, 07 / fev. 2007.

RYDLESKI, Carlos e VALLADARES, Ricardo. Plasma ou LCD? Como será sua próxima televisão? In: Revista Veja, a. 39, n. 7, p. 62-73, 22 fev. 2006. SAAD, Beth. Estratégias para a mídia digital: Internet, informação e comunicação. São Paulo: Senac São Paulo, 2003.

SAGAN, Carl. O mundo assombrado pelos demônios. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

SAIBA como será o futuro do entretenimento no Brasil. Disponível em: http://www.oglobo.com.br. Acesso em: fevereiro de 2008.

SANTORO, Maria Teresa. Imagens do Corpo: Interfaces com a Tecnologia. Trabalho apresentado ao NP 08 – Tecnologia da Informação e da Comunicação, do IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom.

SAVAZONI, Rodrigo. Notas sobre a construção de um jornalismo livre. 11 / set. 2007. Disponível em: http://www.observatoriodaimprensa.com.br. Acesso em: setembro de 2007.

SERVIÇO da IPTV fechou 2007 com 15 mi de assinantes. Disponível em: http://www.iabbrasil.org.br/interna.aspx?id_detalhe=1320&origem=0. Acesso em: fevereiro de 2008.

SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do Trabalho Científico, 21ª. ed., São Paulo: Cortez, 2000.

131

SILVA, Marco. O que é interatividade – 14 / mar. 2007. Disponível em: http://www.webly.com.br/tutorial/marketing/9407/o-que-interatividade.htm. Acesso em: outubro de 2007.

SILVEIRA, Sérgio Amadeu. Cidadania digital e imprensa. Disponível em: HTTP://www.culturaemercado.com.br/post/cultura-e-pensamento-5-cidadania-digital-e-. Acesso em: 04 de 2009.

SIMÕES, Luiza. Daqui a 20 anos. In: Revista Imprensa, a. 21, n. 227, p. 34-36, set. 2007.

SINGER, Beatriz. Paixão por TV. Disponível em: http://observatorio.ultimosegundo.ig.com.br/artigos/qtv290820012.htm. Acesso em: maio de 2008.

SIQUEIRA, Ethevaldo. Em cartaz, a alta definição. In: Revista Veja Edição especial Natal Digital, a. 39, n. 84, p. 12-21, dez. 2006.

SIQUEIRA, Ethevaldo; MARTHE, Marcelo. A mágica... e o mágico. In: Revista Veja a. 40, n. 2, p. 54-73, 17 jan. 2007.

SIQUEIRA, Evaldo. Esta é grande mesmo. In: Revista Veja, a. 39, n. 40, p. 112-114, 11 out. 2006.

SISTEMA de TV Digital. Parte I. In: Revista Mackenzie de Engenharia e Computação. ano 5, n. 5, p. 13 – 29. 2004.

SODRÉ, Muniz. Eticidade, campo comunicacional e midiatização. In: MORAES, Denis de. (Org.) Sociedade Midiatizada. Rio: Mauad, 2006. p. 19-31.

SOUZA, José Carlos Aronchi de. Gêneros e formatos na televisão brasileira. São Paulo: Summus, 2004.

SOUZA, Maria Julieta Nunes de. Televisão e computador: repensando a sociabilidade mediada da contemporaneidade. Trabalho apresentado ao NP 8 de Tecnologias da Informação e da Comunicação, no XXV Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Salvador, BA. Setembro de 2002.

SOUZA, Tiago Nogueira de. TV Digital brasileira. Disponível em: http://www.tiagonogueira.com.br. Acesso em: novembro de 2007.

SPIGEL, Lynn; OLSSON, Jan. Television after television. Duke University Press Durham & London, 2004.

132

SQUIRRA, Sebastião. O século dourado: a comunicação eletrônica nos EUA. São Paulo: Summus, 1995.

STRAUBHAAR, Joseph e LAROSE, Robert. Comunicação, mídia e tecnologia. São Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2004. TALKSHOW! Direção e produção: Lina Cláudia Moreira Garrido. Documentário. Entrevistados: Fátima Turci; Gregório Bacic; Marcelo Tas; Max Nunes. São Paulo: 2005. 1 DVD (40 min), son., color.

TEIXEIRA, Lauro. Programação interativa para televisão digital. Disponível em: http://www.slideshare.net/lauropt/programacao-interativa-para-televiso-digital. Acesso em: dezembro de 2007.

TELEFÔNICA. A Sociedade da Informação no Brasil. Presentes e Perspectivas. 1ª ed. 2002.

THOMÉ, Francisco Arquer. As alterações sociais, os debates e o crescimento do mercado de nicho com o sistema de televisão digital no Brasil. Disponível em http://www.artigocientifico.com.br/uploads/artc_1182549937-31.doc. Acesso em: agosto 2007.

TOLEDO, Renata Granchi Steidel de. O discurso da interatividade na televisão brasileira. 2004. Tese, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro.

TV MUDA propaganda. Disponível em: www.atribunanet.com/home/site/ver/?id=63029. Acesso em: Janeiro de 2008.

UM RIVAL para o Youtube. In: Revista Veja, p. 92, 20 dez. 2006.

UMA NOVA tecnologia para a Abril. In: Revista Veja, p. 87, 10 mai. 2006.

VARIAN, Hal R. Economics of Information Technology. University of California, Berkeley, 2001.

______. Why Old Media and Tom Cruise should worry about cheaper technology. Out. 2006.

VENCESLAU, Pedro. Abu, O Provocador. In: Revista Imprensa, a. 19, n. 217, p. 48-49, nov. 2005.

VIEIRA, Soraya Ferreira. Telejornal: um casdo de semiótica. In: Líbero, v.1, n.2, p. 62-67, 1998.

VILCHES, Lorenzo. A migração digital. São Paulo: Edições Loyola, 2003.

133

WAISMAN, Thais. TV Digital interativa na educação: afinal, interatividade para quê? Disponível em: http://www.futuro.usp.br/producao_cientifica/artigos/itv.pdf. Acesso em: maio de 2008.

WEB não vai matar a TV. Disponível em: http://www.jbonline.terra.com. Acesso em: 18/02/2008.

WINKIN, Yves. Descer ao campo. In: A nova comunicação: da teoria ao trabalho de campo. Papirus. P. 129-145.

______. O telégrafo e a orquestra. In: A nova comunicação: da teoria ao trabalho de campo.

Papirus. P. 21-34.

______. O e-mail não é um telégrafo: NITC e aprendizagens sociais. In: A nova comunicação: da teoria ao trabalho de campo. Papirus. P. 189-202.

WOLTON, Dominique. Internet, e depois? Uma teoria crítica das novas mídias. Tradução Isabel Crossetti Porto Alegre: Sulina, 2003.

YORKE, Ivor. Jornalismo diante das câmeras. São Paulo: Summus, 1998.

YOUTUBE Brasil abre espaço para publicidade. Disponível em: http://www.adnews.com.br/internet.php?id=62903. Acesso em: janeiro de 2008.

ZAPPAROLI, Alecsandra. Decifra-me ou te devoro. Revista Veja, 2003. Disponível em: http://veja.abril.uol.com.br/vejasp/180603/perfil.html. Acesso em: julho de 2008.

ZUFFO, Marcelo Znörich. A Convergência da Realidade Virtual e Internet Avançada em Novos Paradigmas de TV Digital Interativa. São Paulo, Julho de 2001. Tese da Escola politécnica da Universidade de São Paulo, departamento de engenharia de sistemas eletrônicos.

ZUFFO, João Antônio. A convergência digital e a interpenetração de mercados nas tecnologias da informação. In: Revista Fonte, Belo Horizonte, n. 3, p. 72-78, dez. 2005. Disponível em: http://www.prodemge.gov.br/images/stories/volumes/volume3/Joaoantoniozuffo.pdf. Acesso em: novembro de 2007.

134

GLOSSÁRIO

Este é um pequeno glossário com alguns termos mencionados ao logo do trabalho. Outros

termos como talkshow, interatividade, hipertexto, hipermídia, interface, links, lexias e pixel

são descritos de forma complexa e mais aprofundada no decorrer da dissertação.

Alta definição/resolução – Refere-se à alta qualidade audiovisual proporcionada pela digitalização.

CCD (Charge Coupled Device – Dispositivo de Carga Acoplada) – Minúsculos sensores fotosensíveis de cores variadas que brilham com a luz incidente, estimulando semicondutores que são carregados em sequência, enviando continuamente informações de imagem.

Desmultiplexar – é uma técnica que separa um sinal multiplexado (que combina vários canais de dados em um único canal) em vários canais de dados originais, desfazendo o efeito de multiplexagem.

Enhaced TV (TV Expandida) – Engloba a disponibilização de dados informativos para acesso do televivente, como informações sobre o trânsito, a cotação do dólar, a sua novela favorita, um filme, um ator, um cantor, tabelas de campeonatos, receitas e até resultados de votações no congresso nacional. O conceito envolve dados disponíveis a partir da programação transmitida, agregando-se a esta elementos informativos complementares.

FullHD (Full High Definition) – Alta definição com resolução maior que a padrão. Geralmente associada a 1080 linhas de resolução vertical da imagem.

Ginga – Middleware do Sistema Brasileiro de TV Digital.

HDTV (High Definition Television) – Televisão de alta definição.

IPTV (Internet Protocol Television – TV via Protocolo de Internet) – Método de transmissão de sinais televisivos que usa o protocolo IP (Internet Protocol) como meio de transporte do conteúdo.

Middleware – Software instalado no conversor digital (Set-top Box) que permite interatividade e pode ser adaptado para acesso a um canal de retorno inverso ao tradicional: dos públicos para a emissora.

Mobilidade / Portabilidade – Diz respeito a serviços móveis. No caso da TV digital, envolve a capacidade que alguns aparelhos móveis digitais têm para recebimento do sinal da TV digital em seus displays.

135

Multiprogramação – No caso da TV digital, refere-se ao envio de mais programas com formato digital no mesmo local do espectro por onde antes era possível somente a transmissão de um canal analógico.

PPV (Pay-per-view – Pague-para-ver) – Serviço que permite ao cliente de TV por assinatura adquirir uma programação específica, que será transmitida em horário pré-determinado, comprando apenas a exibição de determinados eventos, programas ou filmes, que variam de acordo com a opção escolhida.

PIP (Picture in Picture – Imagem sobre Imagem) – Imagem reduzida na tela que mostra as imagens de uma emissora dentro da imagem maior de outro canal – ambas selecionadas por controle remoto.

PLC (Power Line Communications – Comunicação por Rede Elétrica) – Consiste na transmissão de internet banda larga via rede elétrica.

PVR (Personal Video Recorder – Gravador de Vídeo Pessoal) / DVR (Digital Video Recorder – Gravador de Vídeo Digital) – Aparelho de uso doméstico que permite gravação da programação televisiva.

RGB (Red, Green and Blue – Vermelho, Verde e Azul) – Tem a ver com os filtros de cores-chaves utilizados para a gravação e transmissão de imagens. Esses três elementos são capazes de se combinarem entre si e provocar a exibição de 16 milhões de cores diferentes.

SDTV (Standard Definition Television) – Televisão de definição padrão. Totaliza 704x480 linhas em telas widescreen (proporção 16:9).

Set-top Box – Conversor digital de televisão.

Simulcasting – Transmissão simultânea por canais de radiodifusão

T-banking – Serviços bancários acessados via TV. No caso, a letra “T” refere-se à televisão.

T-commerce – Comércio via TV. A letra “T” refere-se à televisão.

TV individualizada / personalizada – Engloba serviços opcionais de mudança de câmeras, personalização da interface, entre outras funções de estilo que podem ser acionadas pelo televivente.

TV sob demanda – O mesmo que VOD – Video On Demand (Vídeo Sob Demanda). Engloba a compra de um determinado evento, programa ou filme para ser assistido no momento que o cliente desejar, sem precisar aguardar o horário de transmissão da emissora que ofereceu o serviço.