fundação getulio vargas entrevistado: arnoldo wald · t.r. – professor, a gente começa falando...

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1 Fundação Getulio Vargas Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV DIREITO RIO) Projeto: História Oral do CEPED Entrevistado: Arnoldo Wald Local: Rio de Janeiro/RJ Entrevistadores: Gabriel Lacerda e Tânia Abrão Rangel Transcrição: Daniela Álvares Data da transcrição: 1º de abril de 2010 Conferência feita por: Raphael Figueiredo Data da Conferência: 30 de maio de 2010 Entrevista: 26.11.2009 T.R. – História Oral do CEPED, Rio de Janeiro, 26 de novembro de 2009. Estão presentes Gabriel Lacerda e Tânia Rangel e nós vamos entrevistar hoje o dr. Arnoldo Wald. G.L. – Por telefone.

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Fundação Getulio Vargas

Escola de Direito do Rio de Janeiro (FGV DIREITO RIO)

Projeto: História Oral do CEPED

Entrevistado: Arnoldo Wald

Local: Rio de Janeiro/RJ

Entrevistadores: Gabriel Lacerda e Tânia Abrão Rangel

Transcrição: Daniela Álvares

Data da transcrição: 1º de abril de 2010

Conferência feita por: Raphael Figueiredo

Data da Conferência: 30 de maio de 2010

Entrevista: 26.11.2009

T.R. – História Oral do CEPED, Rio de Janeiro, 26 de novembro de 2009.

Estão presentes Gabriel Lacerda e Tânia Rangel e nós vamos entrevistar

hoje o dr. Arnoldo Wald.

G.L. – Por telefone.

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T.R. – Professor, a gente começa falando sobre você. Então a gente

gostaria que o senhor se apresentasse, falasse um pouco da sua história

de vida e como chega até o CEPED.

A.W. – Eu me formei em 1953, fui ser assistente dos professores San Tiago

Dantas e Arnoldo Medeiros da Fonseca, a partir de 54 na Faculdade

Nacional de Direito. Defendi a minha tese de Doutorado sobre “a Cláusula

de escala móvel” (São Paulo, Max Limonad, 1956) na Faculdade Nacional

de Direito em 1956, a minha docência na UDF, a atual Universidade do

Estado do Rio de Janeiro (UERJ), em 57, e lecionei em várias outras

faculdades. Assumi a cátedra na UERJ em 1966.

Fui Procurador do Estado desde 1963, até a minha aposentadoria, e

Procurador Geral da Justiça do Estado da Guanabara em 1965/66,

advogado a partir de 54 até agora e Membro do Conselho Federal da

Ordem durante 25 anos.

Fui Presidente da CVM em 87 e 88, e também Membro do Conselho

Monetário Nacional na mesma época.

Dividi a minha vida entre o magistério, onde lecionei durante mais

de 30 anos, a Procuradoria do Estado do Rio e a advocacia.

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G.L. – Magnífico. A sua vinculação com o CEPED...

T.R. – Como ela começou?

A.W. – A criação do CEPED, até hoje, não foi contada no seu detalhamento.

Na realidade ela foi inicialmente uma espécie de decorrência indireta da

Aliança do Progresso, que era um programa do Presidente Kennedy

criado em 1961e que funcionou a partir de 62 e nos anos seguintes, na

qual David Trubek representava a parte jurídica da Embaixada dos

Estados Unidos e especialmente a USAID1, e eu a assessoria jurídica da

Aliança do Progresso, que era um departamento dentro do Ministério da

Fazenda, no qual se discutiam esses programas comuns e os primeiros

acordos internacionais da Aliança quando San Tiago Dantas era Ministro

da Fazenda. E nessas conversas nas quais se discutia o regime dos

contratos internacionais, a eleição de foro e arbitragem, desenvolveu-se a

ideia de se poder fazer alguma coisa no campo do ensino jurídico com

uma dupla finalidade: aproximar o advogado da realidade econômica e

preparar os advogados para a vida prática e a vida internacional de

negócios. É preciso entender que a Aliança para o Progresso pretendia

mudar a relação dos Estados Unidos com a América Latina. Foi concebida

como uma espécie de Plano Marshall para combater a pobreza, mas

também para desenvolver o ensino, fortalecer as instituições e

estabelecer a “rule of Law”, o Estado de Direito (JOHN F. KENNEDY, Discurso

1 A USAID aplicou no Brasil US$ 147 milhões de 1964 a 1967 enquanto o BIRD contribui com US$ 172 milhões (THOMAS SKIDMORE, Brasil: de Castelo a Tancredo, 2.ed., São Paulo: Paz e Terra, 1988, p.87).

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sobre a Aliança para o Progresso, 13.03.1961). Justifica-se, pois, tratar do

ensino jurídico.

Do meu lado, eu estava interessado na matéria desde o meu tempo

de estudante e, em seguida, de assistente do San Tiago Dantas que quis

colocar em prática a proposta de reforma do ensino jurídico que fez na

sua Carta Magna de 1955 à qual assisti e na qual propunha uma nova

didática, enfatizando a importância do “case system” e uma “verificação

do ensino jurídico” como um dos meios de superar a crise social e a

sucessão política. (Palavras de um Professor, 2.ed., Rio de Janeiro: Forense,

2011, p. 51 e seg.).

G.L. – Você fala aqui na Aliança do Progresso Brasil. A Aliança para o

Progresso era um programa realizado pelo Presidente Kennedy e era para

colocar dinheiro nas Américas com uma aliança. E havia uma

correspondente brasileira desse projeto?

A.W. – Havia. Havia um departamento, uma área do Ministério da Fazenda

que tratava desses acordos e que era dirigida, na ocasião, pelo

Embaixador Paulo Nogueira Batista. E na qual havia também a discussão

dos contratos internacionais para o investimento do dinheiro da Aliança

do Progresso no Brasil. Em certo sentido, houve uma vinculação entre a

Aliança do Progresso e uma política de reaproximação do Brasil com os

Estados Unidos, em relação à política latina sul-americana com a ideia de

não ser mais uma política neocolonialista, mas uma parceria entre os

países da América Latina e os Estados Unidos. E foi esse o núcleo do qual

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partiram alguns programas que surgiram na época – nós estamos falando

de coisas que aconteceram há cerca de meio século. São acordos que

foram feitos ou desenvolvidos na época por San Tiago Dantas. Com

Roberto Campos, embaixador do Brasil nos Estados Unidos, houve então

uma tentativa, um esforço de reaproximação em torno da Aliança para o

Progresso. San Tiago Dantas tem várias palestras a respeito, entrevistas

que ele deu na ocasião. E uma das ideias era criar um sistema cultural de

desenvolvimento na América Latina, em que o direito passaria a ter uma

função dentro dos limites em que se queria trazer um pouco da common

law para o direito brasileiro e encontrar um meio de adaptação parcial da

cultura jurídica americana no Brasil, que permitisse tratados

internacionais, acordos internacionais em que se encontrasse no fundo

uma formulação comum que não fosse imposta por um dos países ao

outro, mas que tivessem um denominador comum. Uma das áreas na qual

se pensou também naquela fase foi a introdução da arbitragem, fórmula

de solução de conflitos no campo internacional, e a aceitação do foro no

contrato.

Tratei dessa matéria em parecer que dei na época e que publiquei

posteriormente em resumo. (Estudos e pareceres de direito comercial, São

Paulo, Revista dos Tribunais, 1972, p. 261).

É interessante notar que a Aliança para o Progresso, que se iniciou

com João Goulart (San Tiago Dantas sendo sucessivamente ministro das

Relações Exteriores e da Fazenda) e Roberto Campos, embaixador em

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Washington, continuou no regime militar quando Roberto Campos foi

Ministro do Planejamento o que se explica pela analogia da cultura de

ambos.

Do meu lado, além da experiência vivida nas várias faculdades de

direito nas quais ensinava (FND da Universidade do Brasil e FD da UERJ),

tinha publicado inúmeros artigos sobre a matéria e apresentado

relatórios em vários Congressos e no Instituto dos Advogados Brasileiros,

além de votos que proferi como integrante do Conselho Federal da OAB2.

2 Entre outros artigos sobre ensino jurídico, destacam-se: 1. Direito e ciência da administração. A reforma do ensino jurídico. Revista do Serviço Público, Rio de Janeiro, v. 66, n. 2, p. 219-222, fev. 1955. 2. Novos rumos para o ensino superior. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 19 jan. 1964. Caderno 4, p. 2. 3. A função do advogado no processo revolucionário brasileiro. Revista Jurídica, Rio de Janeiro, n. 19, p. 289-311, 1963/64. 4. A revolução e os juristas. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 10 jan. 1965, Caderno Cultura, p. 10. 5. Elites e reformas. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 14 fev. 1965. 6. Ensino jurídico. Correio da Manhã, Rio de Janeiro, 21 maio 1967. Caderno 1, p. 12. 7. A reforma do ensino jurídico. Tribuna da Justiça, São Paulo, 3 jan./21 fev. 1968. 8. CEPED. In: WALD, Arnoldo; ROCHA, Roberto Paraíso (Org.). Ensino jurídico: análise e reforma. Rio de Janeiro: Instituto dos Advogados do Brasil - IAB, 1969. p. 35-46. 10. Dimensões da advocacia num país em desenvolvimento. Revista Forense, Rio de Janeiro, n. 234, p. 385-394, abr./jun. 1971. 11. A reforma do ensino jurídico. Valor Econômico, São Paulo, 12-14, abr. 2002. p. B-2. 12. A reforma do ensino jurídico. Valor Econômico, São Paulo, 19 fev. 2004. p. B-2. 13. A reforma do ensino jurídico e o direito do desenvolvimento. Revista da Academia Brasileira de Letras Jurídicas, Rio de Janeiro, a. 19, n. 25, p. 13-20, jan./jun. 2004.

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Na ocasião e em seguida, também tratamos da importância da

Aliança para o Progresso em artigo (Estados Unidos e Mercado Comum,

Correio da Manhã, 21.08. 1965) e livro (A Aliança para o Progresso, In:

Desenvolvimento, Evolução e Democracia, Rio de Janeiro: Fundo de

Cultura, 1966. p. 65).

G.L. – Você fala então que o David Trubek tinha manifestado um certo

desconforto com os advogados brasileiros, era preciso melhorar – está

aqui no seu escrito – o nível.

A.W. – Na realidade, ele dizia que se você tivesse uma conversa na época

com os Procuradores da Fazenda, você tinha uma certa dificuldade de

montar contratos internacionais.

G.L. – Estou seguindo seus escritos, o que você escreveu como roteiro...

Esse almoço no Jockey Club, o que você lembra bem desse almoço?

A.W. – Lembro, porque na realidade foi uma coisa importante na ocasião

de se imaginar alguma coisa que não tinha sido feita na ocasião, que

ensejou em seguida a minha ida ao Caio com o Trubek para

conversarmos. No fundo, o Trubek me disse: "Bom, a ideia me parece

viável e interessante, como é que nos podemos montar isso? Você pode

montar isso?" e eu disse: "para encaminhar a idea acho que você precisa

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de alguém que tenha uma situação de comando na universidade”.

G.L. – A ideia qual era? Montar o quê?

A.W. – A ideia era montar um curso, um programa, uma escola, vamos

dizer, um instrumento que pudesse trazer, que pudesse ensejar, uma

parceria entre o Brasil e os EUA em matéria de desenvolvimento da

cultura jurídica. Com uma dupla visão internacionalista de um lado, de

nível internacional, e de aproximação também do direito em relação à

economia. Ideia de que o advogado devia ser também uma espécie de

corporate lawyer.

Yves Dezalay e Bryant G. Garth lembram que a USAID (Aliança do

Progresso) e a Fundação Ford queriam encorajar a reforma do ensino

jurídico e que este projeto acabaria se concretizando com o CEPED. (La

mondialisation des guerres de palais, Paris, Seuil, 2002, p.177).

Por sua vez, James A. Gardner escreve que:

“’Perhaps we can be of assistance to them in training,’ observed an

American lawyer working with the Agency for International Development

(AID), ‘or in helping them in their own attempts to reach the stage of

development we have reached in this coutry.’ Professional self-interests

were also involved. They were reflected both in the service-oriented self-

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image of the American legal profession and in a more tangible lawyerly

interest in an expanding sphere of professional activity. ‘Since the early

1950’s ‘development economics’ has become an interesting career

opening,’ observed one group of American lawyers; ‘a similar growth of

the specialized ‘development lawyer’ is perhaps possible. Finally, the law

and development movement was given impetus by sheer lawyerly hubris.

‘Lawyers are the hand-maidens of justice,’ observed the president of the

American Bar Association, ‘… the technicians of democracy’”. (Legal

Imperialism, Madison, The University of Wisconsin Press, 1980, p. 7).

T.R. – Professor, nesse caso a gente percebe aí que essa aproximação

tinha dois vieses, vamos assim dizer: um mais metodológico, que é essa

questão que o senhor coloca do caso e um outro de conteúdo – e no outro

de conteúdo entraria essa questão da aproximação maior do direito com a

economia. É isso?

A.W. – Com a vida real em geral a internacionalização da econômica e com

o desenvolvimento em particular, e eventualmente também no direito

público com programas sociais, socioeconômicos, direito da habitação e

outras coisas parecidas. Quer dizer, no fundo o preparo, a criação de um

instrumento para formação do advogado para que ele se tornasse um

instrumento do desenvolvimento.

G.L. – Essa foi a conversa sua com o Trubek: "Vamos fazer alguma coisa,

que nós talvez não tenhamos muita certeza do que seja exatamente, que

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ajude a fazer o advogado colaborar com o desenvolvimento"?

A.W. – É, mas que se vislumbrava como um curso ou como programa. Não

se falou nem em doutorado, nem em mestrado, mas alguma formulação

universitária ou pós-universitária para esta finalidade.

G.L. – Foi você quem apresentou o Trubek ao Lamy e ao Caio?

A.W. – Não. Não ao Lamy, mas ao Caio, sim.

G.L. – Discutindo a ideia, você disse: "Bom, vamos falar com o Caio" – e

falou com o Caio, o Caio se entusiasmou e trouxe o Lamy.

A.W. – Eu confesso a você que não me lembro do detalhamento, não sei

quem falou primeiro com quem, mas eu me lembro que nós conversamos

com Mario Henrique para trazer um elemento econômico, que o Mario na

época era o coordenador dos cursos da Fundação e estava escrevendo um

livro comigo e com Chacel para a Universidade de Columbia (A correção

monetária, Rio de Janeiro, Apec, 1970).

G.L. – Então chegou-se à ideia de fazer alguma coisa. Essa alguma coisa

era então o curso de advocacia de empresa?

A.W. – Isso.

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G.L. – E qual seu papel então nesse curso, depois dessa conversa inicial?

A.W. – Depois o Caio como Diretor ou Vice-Diretor da Faculdade, ficou na

gestão do programa e nós acertamos que o Lamy e eu iríamos dar aulas.

Eu acho que você chegou a ser assistente do Lamy na ocasião, não foi?

G.L. – Não, quem trabalhava com o Lamy era o Silveira Lobo. Eu fiquei

trabalhando com o Leoni.

A.W. – O Leoni também participou do CEPED.

G.L. – Você fala aqui também no apoio de fundações e universidades

americanas. Você se lembra se esse apoio chegou a ser formalizado?

A.W. – Chegou a ser com a Fundação Ford. Houve um convênio assinado.

G.L. – A gente ainda não entrevistou oficialmente o Trubek. Temos

conversado com ele, mas isso tudo vai ser detalhado e vamos também

entrevistar o Peter Bell, da Fundação Ford.

A.W. – O Trubek deve lembrar-se mais do que eu do detalhamento,

porque aí houve um convênio com a Fundação Ford e houve também o

apoio das três universidades, de tal modo que Harvard mandou Steiner,

não sei quem mandou o Keith Rosenn e depois nós fomos visitar Yale,

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Harvard e Columbia.

G.L. – Perfeito. Agora, você diz aqui: qual seu papel no CEPED?

A.W. – Eu, na realidade, além de colaborar na sua criação, lecionei no

CEPED. Dei um curso sobre grande empresa, mas não nos aspectos tão

somente de direito civil. Discutimos o direito da habitação, a correção

monetária, problemas de contratos internacionais, etc.

G.L. – É. A correção monetária, só para gente ter um outro cenário, era na

época uma questão relevantíssima. Foi uma jabuticaba, que era uma coisa

que só tinha no Brasil. Mario Henrique que inventou um pouco, né?

A.W. – Não, já existia em muitos países em momentos de crise. Mas em

todo caso, no Brasil ela foi importante naquela ocasião e sobreviveu

durante longo tempo.

G.L. – A sua matéria exatamente qual era?

A.W. – Tratava dos aspectos de direito civil da grande empresa. Lembro-

me que nós discutíamos problemas de contratos internacionais, de

correção monetária, etc.

G.L. – Não há a menor hipótese de você ter guardado as suas apostilas da

época?

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A.W. – Não. Eu acho que é difícil reencontrá-las.

G.L. – Uma outra coisa agora: você fala do Cláudio Viana de Lima. Ele é

vivo ainda?

A.W. – Não. Ele faleceu já há algum tempo. Há 15 anos.

G.L. – Eu tinha na minha lembrança também que você trabalhava com o

Gustavo Leite, que depois foi desembargador aqui. Ele não chegou a ser

seu assistente?

A.W. – Não no CEPED. Quem foi meu assistente na faculdade foram o

Olavo Tostes e o Semy Glanz, mas no CEPED eu tinha levado o Cláudio,

que depois inclusive implantou um sistema não idêntico, mas parecido, na

Cândido Mendes.

G.L. – Você conhece alguma outra pessoa que a gente pudesse falar lá na

Cândido Mendes, já que o Cláudio é falecido? Que se lembre desses

esforços dele?

A.W. – Posso tentar localizar.

G.L. – É, porque eu não conheço ninguém lá. E o Gustavo não foi então seu

assistente?

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A.W. – Não me lembro que o tenha sido no CEPED. Talvez na Faculdade

em outra fase.

G.L. – Agora vamos à pergunta três, que já está aqui na mão: qual, a seu

ver, ou quais as ideias básicas do programa em termos de metodologia do

ensino, conceito de direito e papel do advogado na sociedade?

A.W. – Na realidade, tínhamos duas ideias básicas: uma de metodologia

que era um pouco o sistema americano do case e que já San Tiago Dantas

dava dez anos antes na faculdade quando fui seu assistente, a discussão

de casos específicos e a discussão de jurisprudência; aproximar no fundo

o advogado da realidade judiciária. E de outro lado o conteúdo, que é esse

conteúdo econômico e social do direito como um instrumento que deve

servir ao desenvolvimento econômico e social do país. Eu acho que no

fundo era isso. Eu vou mandar alguma coisa para você que escrevi na

época, em relação ao CEPED. Não estávamos longe da concepção do

corporate lawyer como um “engenheiro especializado em redução de

custos de transação” para referir um autor mais moderno. (Citação de

Ronald Gilson no livro de Oliver E. Williamson, The economic institution of

capitalism, New York, The Free Press, 1985. p. 397). O Lamy chegou a

fazer um depoimento?

G.L. – O Lamy chegou sim. Ele foi o primeiro.

A.W. – O Lamy poderia sintetizar melhor a ideia. Você está falando de um

momento em que ainda não tínhamos a lei da sociedade anônima, não

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tínhamos a lei do mercado de capitais, tudo estava surgindo.

G.L. – Você tem uma frase aqui que eu queria que você, se possível,

elaborasse um pouco mais, porque ela vem muito precisa e não coincide

um pouco com outros depoimentos, que é esta: o advogado deveria ser

um corporate lawyer, "um engenheiro com especialização em redução de

custo de transação".

A.W. – Isso é uma definição que eu encontrei no Williamson. Posso lhe

mandar.

G.L. – Mas na sua percepção essa seria a ideia fundamental?

A.W. – Não sei se era a ideia fundamental, mas, vamos dizer era uma

síntese do que se pretendia fazer e eu acho que é dar ao advogado uma

função na vida econômica e na vida social, numa fase em que o corporate

lawyer estava começando a surgir na vida brasileira e não tínhamos ainda

muito senso da internacionalização.

G.L. – Você considera que o CEPED foi fundamentalmente um curso ou

você o percebe mais como um programa de que o curso seria uma

primeira etapa?

A.W. – Foi um programa, e o curso foi o modo de institucionalizar o

programa numa primeira fase.

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G.L. – O programa seria então formar esse tipo de advogado?

A.W. – Exatamente.

T.R. – Professor, dentro do CEPED como foi feito? Vocês fizeram uma

reunião, se reuniram, definiram esse programa em conjunto ou foi feita

uma divisão das matérias e cada um cuidou de uma matéria, como foi

feito?

A.W. – Na realidade houve as duas coisas: nós tínhamos reuniões em que

foram definidas as áreas de cada um e que, depois, cada um de nós

desenvolveu sem prejuízo de contato com os demais. Você tinha um

trabalho simultaneamente coletivo e individual. Você não teve nem um

grupo criando um sistema rígido, nem também uma série de

individualidades, cada um indo para um canto.

T.R. – Nesse convênio que foi feito com as universidades norte-

americanas, elas chegaram de alguma forma a influenciar ou a interferir

diretamente nessa formulação conjunta que vocês faziam ou não?

A.W. – Não sei se houve convênio com as universidades; acho que o

convênio foi com a Fundação. E a partir daí a Fundação mobilizou as

universidades. E em certo sentido o Steiner teve uma certa influência e o

Trubek também, e houve muita troca de ideias, informações. A nossa

viagem ao EUA teve essa finalidade: mostrar como é que eles

funcionavam e até que ponto nós poderíamos adaptar esse sistema no

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Brasil.

G.L. – Muitas das outras perguntas já estão aqui, a rigor, no seu

questionário escrito. Então eu pergunto: de que forma as ideias e práticas

já existentes em determinados nichos de atores, por exemplo, o jurídico

da Light e o escritório Bulhões, influenciaram as atividades do CEPED.

Você já respondeu por escrito.

A.W. – Eu acho que na realidade tivemos movimentos paralelos que

acabaram se tocando, ao contrário das paralelas normais. Mas havia um

movimento em algumas faculdades, alguns professores que tinham já

aberto esse caminho; eu acho que foi a primeira vez que você teve a

presença do economista e do jurista trabalhando juntos. Eu me lembro

que quando fiz meu livro sobre correção monetária com Mario Henrique e

Chacel, o ministro Miguel Seabra Fagundes me disse: “mas Arnoldo, você

escreveu um livro com economista? Não fica bem”. Mas afinal de contas, o

tema era simultaneamente jurídico e econômico e eu escolhi como

parceiro quem eu achava que conhecia a economia. A ideia de todos os

juristas daquela época ainda era da geração mais antiga, ainda era que o

economista era uma espécie de técnico em contabilidade. Então, você teve

esse caminho que era importante e eu acho que alguns escritórios

também tinham já essa sensibilidade maior, como era o caso do escritório

do Bulhões, e também a Light, que, no fundo, tinha um conjunto de

especialistas do primeiro nível que conversaram em torno disso e

algumas ideias iam surgindo.

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G.L. - Muito interessante essa sua observação do Ministro. É o pai do

Eduardo. Miguel Seabra Fagundes.

A.W. – O Miguel Seabra Fagundes era um homem que tinha 20 anos a mais

do que eu. Quer dizer, um homem nascido nos primeiros anos de 1900.

Então tinha uma visão muito diferente da nossa.

G.L. - É. Ficou emblemático, você fazendo um livro com Mario Henrique

Simonsen e levando a estranheza de um jurista consagrado, de como que

você ia se imiscuir fazendo um livro junto com um economista. Acho que

pode ser um tema emblemático aqui para nós.

A.W. – Só para completar o anedótico, quando publiquei minha tese eu era

professor na Faculdade de Direito da Piedade e tinha como companheiros

de congregação. que lecionavam comigo vários desembargadores. E como

todo jovem que faz uma tese de doutorado, decidi oferecer a minha tese

aos meus colegas de faculdade, tanto mais que viajávamos juntos para a

Faculdade num carro que partia da Central do Brasil, vindo nos buscar e

íamos, conversando até a faculdade, e se criou uma amizade entre pessoas

de várias gerações. E um deles me disse na ocasião: “esse seu assunto é

muito acadêmico”. E quinze dias depois ele ligou para minha casa, 10h da

noite dizendo: “Arnoldo, você não sabe o que aconteceu? Apareceu na

minha Câmara o caso daquele negócio de escala móvel. Eu pedi vista,

porque eu ia fazer um longo voto. E citei aí o seu livro, etc.”. Só para

mostrar a anedota do momento. Então era um divórcio completo de

economia e direito. Acho que este foi também um aspecto importante e

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que levou tempo, porque você partindo do CEPED, só começou a

institucionalizar a relação direito e economia, no fundo, nos dez últimos

anos.

G.L. – É, a cláusula da escala móvel obriga o conúbio entre o direito e a

economia por mil coisas: a teoria da imprevisão, antiquíssima, volta.

A.W. – Eu acho que isso foi importante, mas era uma corrente que se

estabelecia em vários lugares. Você fez qual faculdade? Você se formou

em que ano?

G.L. – 62, PUC.

A.W. – Na Nacional, o nosso professor de economia nos dava aula sobre a

economia no século XIX. Nós tínhamos um outro professor de economia

política, que dava aulas sobre as relações entre o positivismo e o

marxismo.

G.L. – O que você está mostrando aqui, que é um tema muito interessante,

estou digredindo um pouco para depois fechar com várias outras coisas, é

que a economia mostra uma coisa que o direito não conseguiria ver sem o

auxílio dela, que é o “ars aequi et boni” – quando a relação fica de tal

forma distorcida e isso na parte de correção monetária, de escala móvel, é

onde este conúbio começa a nascer.

A.W. – Pelas circunstâncias. Não foi uma decisão teórica ou acadêmica. Foi

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uma posição decorrente da necessidade da vida.

G.L. – Exatamente. Pacta sunt servanda não serve quando realiza a

iniquidade.

A.W. – Ou então “Fiat justitia pereat mundus” também não?

T.R. - Baseado nisso, o ponto de partida seu, da sua história pessoal para

escrever sobre isso no doutorado, acabou sendo uma experiência vivida,

da prática para a teoria, e não o contrário, que seu amigo disse que seria

puramente teórico ou acadêmico.

A.W. – Sim. Mas na realidade, eu quando entrei nessa matéria, eu entrei na

economia fazendo minha tese de doutorado. Então, embora houvesse o

aspecto prático, eu vinha da academia. Não era uma ideia abstrata, mas

era uma ideia que partia da academia. No meu ponto de vista pessoal, isso

não começou na realidade da advocacia. Começou, em certo sentido pela

advocacia, se você quiser subir para a Aliança para o Progresso, mas na

realidade eu ampliei o assunto mais quando fui fazer minha tese. O

Professor San Tiago Dantas me propôs fazer uma tese sobre cláusula

ouro, e eu achei que a cláusula ouro estava envelhecida. E aí, eu tive uma

bolsa para a França e discutia-se muito lá a escala móvel depois da

inflação decorrente da Segunda Guerra Mundial. E quando voltei, pensei

em fazer a tese a respeito da escala móvel, e já era o clima, vamos dizer

propício. No fundo, o CEPED aparece 10 anos depois.

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G.L. – É, já estava overdue. Agora, eu tenho aqui mais algumas perguntas,

vou passar rapidamente, já estão respondidas, mas eu preciso fazer o

registro. Eu perguntei se você conhece algum texto da experiência, você

citou o livro Legal Imperalism e os Anais do Seminário do IAB.

A.W. – Você tem os Anais também, não tem?

G.L. - Temos aqui também, não temos? Temos sim. É muito interessante.

A.W. – Nos Anais, o prefácio acho que é meu.

G.L. – É sim, seu. Eu já li.

A.W. – E há um artigo do Lamy sobre o CEPED.

G.L. - Isso, esse tópico também já conseguimos. Você informa também que

não produziu nenhum texto da época, embora tenha falado a respeito

num seminário. Agora, a pergunta nove é: qual a sua participação em

outros projetos ligados à educação jurídica posteriores aos CEPED?

A.W. – Na realidade, a experiência que eu tive foi lecionar na UERJ, antes e

depois do CEPED, e dentro dos limites das possibilidades da faculdade,

adotar algumas das técnicas do CEPED. Foi o que pude fazer. Quando nós

criamos o CEPED, eu disse ao Caio: “vamos fazer isso na faculdade”. Mas

eu era docente livre, ele era o diretor. E ele me disse: “Arnoldo, você não

conhece nossos colegas. Se você tentar fazer isso na faculdade, não vai

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funcionar. Nós vamos ter todas as dificuldades administrativas e

burocráticas. Vamos tentar sair da faculdade para uma entidade que nos

dê flexibilidade”. Foi a razão pela qual nós fomos para a Fundação Getulio

Vargas.

T.R. - Então o limite que o senhor acabou encontrando como professor na

UERJ, parte vinha disso, da falta de um apoio institucional, vamos assim

dizer, porque não tinha como adotar esse programa todo do CEPED na

UERJ, e tinha algum outro limite? Por exemplo, a questão do material

didático: no CEPED ele era entregue previamente...

A.W. –Você podia fazer, tanto o San Tiago Dantas quanto eu, fizemos, com

recursos próprios, nós mimeografávamos, (na época era mimeógrafo),

fazíamos as cópias mimeografadas e distribuíamos aos alunos, etc. Mas no

fim do curso representava uma despesa que podia superar o que você

ganhava como professor! De forma que também não era muito fácil

manter esse ritmo sempre.

G.L. - Deixa só eu registrar aqui, Wald, também, porque você no seu texto

escrito – eu queria deixar isso consignado – você disse que aplicou na

Faculdade Nacional de Direito e na UERJ, as três ideias básicas: A)

discussão de casos; B) a solução de problemas; C) análise econômica dos

direitos. Então isso tem que ficar registrado, você considera que essas

seriam as três ideias básicas do ponto de vista metodológico do CEPED.

A.W. – Entre outras. Você pode dizer muito mais coisas, mas se você

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quiser sintetizar... Eu acho que no fundo é mudar o raciocínio do

advogado e aproximá-lo da realidade econômica e social e das soluções

dos problemas práticos.

G.L. - E uma das coisas que eu acrescentaria talvez, se as meninas me

deixarem – elas não me deixam acrescentar nada, dizem que eu induzo a

outra pessoa – mas o que eu acrescentaria também é “o indutivo versus o

dedutivo".

A.W. – Certamente. Mas isso é quando você parte da discussão do caso, é

que você vê o exemplo típico. Em vez de dizer “responsabilidade civil do

dono da bicicleta ou do dono do automóvel se fundamenta no risco ou na

culpa”, você diz “tem um ciclista que atropelou o fulano”. Então você parte

do indutivo ao dedutivo. Quer dizer, todo o sistema da common law no

fundo, é este. E a ideia que você teve no Brasil, é complementar o sistema

da “common law” pela “civil law” e vice-versa.

G.L. - É como se dissesse a mesma coisa de uma outra forma. Agora a

pergunta 10, que é a mais crítica, eu pergunto: que influência teve a

experiência CEPED na educação jurídica brasileira? As ideias do CEPED

chegaram a ser adotadas ou influenciaram alguma outra escola de

direito?

A.W. – Eu acho que na realidade o CEPED teve duas influências, a primeira

direta e a segunda indireta. Direta, em relação aos professores que dela

participaram, e dos seus alunos que viraram, na maioria dos casos,

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advogados ou professores. Das gerações do CEPED, quase um terço ou a

metade acabou também indo para o ensino, incidental ou principalmente.

E depois, o exemplo do CEPED também repercutiu, e eu acho que é uma

corrente que se formou entre o CEPED e as gerações futuras, num sistema

de ensaios e erros. Certamente foi um dos fatores, um dos ingredientes

importantes. Na realidade, não se repetiu o CEPED até porque as coisas

mudaram e outros fatores entraram em jogo, outras influências, como a

globalização que facilitou muito tudo isso. Você na época do CEPED ainda

tinha relativamente poucos advogados brasileiros formados no exterior.

Aumentou o número de advogados que foram se formar no exterior, quer

dizer, o CEPED certamente foi um ponto de partida.

G.L. - Penúltima pergunta: por que o CEPED deixou de existir? O que você

sabe a respeito?

A.W. – Basicamente, acho que houve dois problemas até talvez vinculados.

A primeira é que para a Fundação Ford, para os americanos, a ideia do

CEPED era de montar um programa que se tornasse uma espécie de

catalisador de uma revisão do ensino jurídico no Brasil. E o CEPED, na

realidade, ficou basicamente fechado na sua função específica de ser um

programa que não se transmitiu, não se retransmitiu. Por esse motivo

e/ou por outros, acho que houve um momento em que não tivemos mais

recursos para ser mantido. É possível que tenha sido também problemas

de política das fundações, etc. Eu acho que você teve uma primeira razão

que era a não expansão e a não auto-suficiência, a não auto-rentabilidade

do sistema, e o segundo que foi a falta de recursos.

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G.L. - Perfeito. Você refere-se quando você responde essa pergunta, Wald,

aos esforços inclusive da faculdade de direito da USP. O que você lembra

da USP? Eu, pessoalmente, tenho vagas recordações, do pessoal vindo ao

Rio assistir aula aqui. Você sabe um pouco melhor?

A.W. – Não houve muito mais do que isso. Na realidade, houve contato

com a USP, eu me lembro de ter conversado na ocasião com o Professor

Buzaid e houve até uma ida de professores de São Paulo para os EUA com

a finalidade de conhecer o case sistem. A mesma viagem que nós fizemos,

alguns professores de São Paulo fizeram posteriormente.

G.L. - É, jantei com eles lá. Isso foi depois de eles virem aqui. Eu tenho essa

lembrança vaga de uma missão vindo aqui, assistindo aula da gente e

depois uma outra missão indo aos EUA quando eu estava estudando lá,

eu, o Ari Oswaldo, o Beno Suchodolski, o Joaquim Falcão e jantamos com

Rui Barbosa Nogueira e outros.

A.W. – Acho que o Buzaid foi também.

G.L. - Quer dizer, você não tem ideia do nível de oficialidade ou de

formalidade da iniciativa paulista?

A.W. – Não. Eu sei que na volta o Buzaid me disse que “é muito

interessante, mas ainda não dá para fazer agora. Vamos estudar, no futuro

vamos fazer alguma coisa”. Não chegou a ser transmitido, quer dizer,

houve um esforço para transmitir, mas não chegou a funcionar.

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G.L. - Ok. Acho que era só isso. Tem uma outra coisa aqui, tem um registro

seu: você conhece alguma experiência posterior que possa ser

considerada como tendo sido marcadamente influenciada pelo CEPED?

Você já respondeu aqui.

A.W. – Eu acho que a Fundação Getulio Vargas em São Paulo, certamente

tem essa influência, reconhecida e confirmada. O Trubek e o Rosenn

estiveram na Faculdade e deram aulas, fizeram algumas reuniões. Eu me

lembro que o Trubek até jantou comigo na ocasião. Essa influência

também se exerceu em relação à Fundação no Rio, mas não tenho

acompanhado. Há um pouco, também, esse espírito no IBMEC, mas não o

conheço detalhadamente.

G.L. - Agora última pergunta, Wald. Você lembra de algum nome de aluno

que você tenha dado aula aqui no CEPED? A gente está tentando corrigir,

não achamos ainda as pautas com a lista, então estamos recorrendo à

memória do professor. Algum que você se lembra?

A.W. – Seria mais fácil se você tiver a relação dos alunos.

G.L. – Não é isso o que a gente quer. A gente está procurando.

A.W. – É por que se você tiver... Não sobrou documento disso?

G.L. - Há de haver, nós estamos procurando.

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A.W. – Tem muita gente. Mas você relembrar de aluno depois de 40 anos,

não é dado a todos os mortais. Se você pudesse me mandar uma lista, eu

consigo dizer de quem eu me lembro.

[ despedidas ]