fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

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Professor Professor Silvânio barcelos Silvânio barcelos FRONTEIRA. A degradação FRONTEIRA. A degradação do Outro nos confins do do Outro nos confins do humano humano Martins, José de Souza Martins, José de Souza (Uma releitura) (Uma releitura)

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Apresentação da obra FRONTEIRA de José de Souza Martins. POR: Prof. Silvânio Barcelos

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Page 1: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Professor Professor

Silvânio barcelosSilvânio barcelos

FRONTEIRA. A degradação do FRONTEIRA. A degradação do Outro nos confins do humanoOutro nos confins do humano

Martins, José de SouzaMartins, José de Souza(Uma releitura)(Uma releitura)

Page 2: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

O autorO autor

José de Souza Martins é bacharel e licenciado em Ciências Sociais José de Souza Martins é bacharel e licenciado em Ciências Sociais (1964) pela antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da (1964) pela antiga Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da Universidade de São Paulo, onde fez o mestrado (1966) e o Universidade de São Paulo, onde fez o mestrado (1966) e o doutorado (1970) em Sociologia, onde se tornou livre-docente doutorado (1970) em Sociologia, onde se tornou livre-docente em 1992 e onde leciona desde 1965. Foi visiting-scholar do em 1992 e onde leciona desde 1965. Foi visiting-scholar do Center of Latin American Studies da Universidade de Cambridge, Center of Latin American Studies da Universidade de Cambridge, Inglaterra, em 1976 e Visiting Professor da Universidade Inglaterra, em 1976 e Visiting Professor da Universidade da Flórida (EUA), em 1983. Em 1992, foi eleito fellow de Trinity da Flórida (EUA), em 1983. Em 1992, foi eleito fellow de Trinity Hall (quinto colégio mais antigo, fundado em 1350 pelo Bispo Hall (quinto colégio mais antigo, fundado em 1350 pelo Bispo William Baterman de Norwich) e Professor Titular da William Baterman de Norwich) e Professor Titular da Cátedra Simón Bolívar da Universidade de Cambridge para o Cátedra Simón Bolívar da Universidade de Cambridge para o ano acadêmico de 1993/94. Em 1996, o Secretário Geral das ano acadêmico de 1993/94. Em 1996, o Secretário Geral das Nações Unidas nomeou-o membro, pelas Américas, da Comissão Nações Unidas nomeou-o membro, pelas Américas, da Comissão de Curadores do Fundo Voluntário da ONU sobre Formas de Curadores do Fundo Voluntário da ONU sobre Formas Contemporâneas de Escravidão para um mandato de três anos.Contemporâneas de Escravidão para um mandato de três anos.

Page 3: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

José de Souza MartinsJosé de Souza MartinsNascido em São Caetano do SulNascido em São Caetano do Sul

em 24 de outubro de 1938em 24 de outubro de 1938

Page 4: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

A fronteiraA fronteirana visão de José de Souza Martinsna visão de José de Souza Martins

Cenário de intolerância, ambição e morteCenário de intolerância, ambição e morte Esperança: tempo de redenção, justiça, alegria e fartura Esperança: tempo de redenção, justiça, alegria e fartura Espaço e o homem:ponto limite de territórios (dinamismo)Espaço e o homem:ponto limite de territórios (dinamismo) Linha que separa Cultura da Natureza, Homem do Animal, Linha que separa Cultura da Natureza, Homem do Animal,

do Humano e do não humano.do Humano e do não humano. Figura central da fronteira: A vítima (e não o pioneiro)Figura central da fronteira: A vítima (e não o pioneiro) Múltiplas fronteiras: fronteira da civilização, espacial, Múltiplas fronteiras: fronteira da civilização, espacial,

cultural, étnica, histórica e cultural, étnica, histórica e fronteira do humano.fronteira do humano. Fronteira do humano: degradação do outro para viabilizar a Fronteira do humano: degradação do outro para viabilizar a

existência de quem o domina, subjuga e explora.existência de quem o domina, subjuga e explora. Lugar de renascimento e maquiagem dos arcaísmos Lugar de renascimento e maquiagem dos arcaísmos

desumanizadores. (A fronteira está longe de ser o “lugar do desumanizadores. (A fronteira está longe de ser o “lugar do novo”)novo”)

Page 5: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Técnicas utilizadas por Martins nos processos da Técnicas utilizadas por Martins nos processos da pesquisapesquisa

Técnicas artesanais de investigação e pesquisa solitária Técnicas artesanais de investigação e pesquisa solitária (conflitos).(conflitos).

Técnicas de inserção pedagógica temporária nos grupos e Técnicas de inserção pedagógica temporária nos grupos e comunidades estudadas. (professor itinerante).comunidades estudadas. (professor itinerante).

Pedagogia investigativa: diferente da pesquisa participante Pedagogia investigativa: diferente da pesquisa participante (comunidade pesquisa sobre si mesma), a pedagogia (comunidade pesquisa sobre si mesma), a pedagogia investigativa mostra à comunidade o lado oculto dos processos investigativa mostra à comunidade o lado oculto dos processos sociais.sociais.

Mudança de paradigma: O mito do pioneiro X formas arcaicas de Mudança de paradigma: O mito do pioneiro X formas arcaicas de dominação, reprodução ampliada do capital, escravidão. dominação, reprodução ampliada do capital, escravidão.

Percepção de diferentes tempos históricos: Racionalismo e Percepção de diferentes tempos históricos: Racionalismo e modernidade da acumulação capitalista X concepções de mundo modernidade da acumulação capitalista X concepções de mundo e de vida do camponês = família e comunidade rural voltada e de vida do camponês = família e comunidade rural voltada para a subsistência e relações de reciprocidade. (Lógica para a subsistência e relações de reciprocidade. (Lógica perversa) perversa)

Movimentar-se no interior do conflito e da conflitividade: Guerra Movimentar-se no interior do conflito e da conflitividade: Guerra confronta visões de mundo e definições do outro.confronta visões de mundo e definições do outro.

Page 6: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Recursos que possibilitaram a pesquisaRecursos que possibilitaram a pesquisa

FAPESP, CNPq, Caronas com funcionários da SUCAM (malária).FAPESP, CNPq, Caronas com funcionários da SUCAM (malária). 20 anos de envolvimento pedagógico com a C P T (cursos 20 anos de envolvimento pedagógico com a C P T (cursos

sobre situação dos trabalhadores rurais). Aprendizado de sobre situação dos trabalhadores rurais). Aprendizado de mão-dupla.mão-dupla.

““O principal apoio veio, porém, dos próprios trabalhadores. O principal apoio veio, porém, dos próprios trabalhadores. Com sua habitual generosidade, eles me acolheram e me Com sua habitual generosidade, eles me acolheram e me ajudaram. Em nenhum lugar deixei de encontrar quem me ajudaram. Em nenhum lugar deixei de encontrar quem me permitisse armar minha rede num canto da casa, num permitisse armar minha rede num canto da casa, num alpendre, numa latada, num paiol de arroz ou num tijupar de alpendre, numa latada, num paiol de arroz ou num tijupar de roça. E que repartisse comigo a farofa de carne-de-sol com roça. E que repartisse comigo a farofa de carne-de-sol com farinha puba, o prato de arroz com feijão, um pouco de farinha puba, o prato de arroz com feijão, um pouco de alvo beiju, uma lasca de rapadura recém-feita, um alvo beiju, uma lasca de rapadura recém-feita, um punhado de castanha-do-pará, uma porção de laranjas ou um punhado de castanha-do-pará, uma porção de laranjas ou um naco de carne de caça: generosa partilha da fartura simples naco de carne de caça: generosa partilha da fartura simples que quase sempre há entre os pobres do campo”. (pp. 22).que quase sempre há entre os pobres do campo”. (pp. 22).

Page 7: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Capítulo 1Capítulo 1A CAPTURA DO OUTROA CAPTURA DO OUTRO

O rapto de mulheres e crianças nas fronteiras étnicas O rapto de mulheres e crianças nas fronteiras étnicas do Brasildo Brasil

• Realidades sociológicas nas frentes de expansão Realidades sociológicas nas frentes de expansão de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Pará, de Goiás, Tocantins, Mato Grosso, Pará, Maranhão, Rondônia, Acre e do Amazonas:Maranhão, Rondônia, Acre e do Amazonas:

• Concepção dual dos seres humanos: Cristão X Caboclo, Concepção dual dos seres humanos: Cristão X Caboclo, Homens X Pagãos, Humanos X Não-humanos. Homens X Pagãos, Humanos X Não-humanos. (Discurso que se repete desde o Brasil - Colônia e (Discurso que se repete desde o Brasil - Colônia e revela os limites étnicos dos pertencentes e dos revela os limites étnicos dos pertencentes e dos não-pertencentes do gênero humano).não-pertencentes do gênero humano).

• Diferentes tempos históricos: RecenteDiferentes tempos históricos: Recente mudança do mudança do machado de pedra para o de aço dos Kamayurá, machado de pedra para o de aço dos Kamayurá, canibalismo ritual dos Rikbátksa ao mesmo tempo que canibalismo ritual dos Rikbátksa ao mesmo tempo que entram na era do avião, máquina fotográfica e da entram na era do avião, máquina fotográfica e da filmadora.filmadora.

Page 8: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

O rapto na situação de fronteiraO rapto na situação de fronteira

• Indígenas raptados por “civilizados”Indígenas raptados por “civilizados” : Normalmente : Normalmente constituem-se exceções num quadro geral de ataques de constituem-se exceções num quadro geral de ataques de extermínio. Genocida limpeza de áreas cobiçadas para abertura de extermínio. Genocida limpeza de áreas cobiçadas para abertura de novas fazendas. Nesse caso nunca houve incorporação à estrutura novas fazendas. Nesse caso nunca houve incorporação à estrutura das relações sociais dos raptados, sendo eles mantidos à margem das relações sociais dos raptados, sendo eles mantidos à margem como prostitutas (no caso das mulheres) e submetido à condições como prostitutas (no caso das mulheres) e submetido à condições de servidão (no caso dos homens).de servidão (no caso dos homens).

• ““Civilizados” raptados por indígenas: Civilizados” raptados por indígenas: Nesse caso os raptados Nesse caso os raptados são incorporados à estrutura social dos raptores, embora sempre são incorporados à estrutura social dos raptores, embora sempre na condição de “estrangeiro”. Na sua grande maioria os raptos na condição de “estrangeiro”. Na sua grande maioria os raptos destinam-se à suprir uma carência de parceiros para a reprodução destinam-se à suprir uma carência de parceiros para a reprodução da tribo. da tribo.

• Caso Helena Valero: Caso Helena Valero: Raptada pelos Yanoama, recebeu nome de Raptada pelos Yanoama, recebeu nome de Napanhuma (um não-nome: “a estrangeira”). Incorporada como Napanhuma (um não-nome: “a estrangeira”). Incorporada como mãe de filhos de homens yanoama. 20 anos após consegue fugir e mãe de filhos de homens yanoama. 20 anos após consegue fugir e também foi tratada entre os brancos como não-branca.também foi tratada entre os brancos como não-branca.

Page 9: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

A captura do outroA captura do outroO estranhamento e a recusa da alteridadeO estranhamento e a recusa da alteridade

• Definição do raptado como ser “liminar”: Definição do raptado como ser “liminar”: Martins identifica essa condição de Martins identifica essa condição de fronteira onde o raptado é reconhecido fronteira onde o raptado é reconhecido como o outro, o estrangeiro. como o outro, o estrangeiro.

• Tanto de um lado como de outro da Tanto de um lado como de outro da fronteira o “outro” expressa uma fronteira o “outro” expressa uma alteridade problemática: Seria uma alteridade problemática: Seria uma espécie de sala de espera do processo de espécie de sala de espera do processo de humanização na perspectiva do raptor.humanização na perspectiva do raptor.

Page 10: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Capítulo 2Capítulo 2A reprodução do capital na frente pioneira A reprodução do capital na frente pioneira e o renascimento da escravidãoe o renascimento da escravidão

Escravidão por dívida ou peonagem: O arcaico Escravidão por dívida ou peonagem: O arcaico (extrativismo na Amazônia) e o moderno perpetuando (extrativismo na Amazônia) e o moderno perpetuando a prática da super exploração da mão-de-obra. a prática da super exploração da mão-de-obra.

Empresas modernas que utilizam da escravidão: Empresas modernas que utilizam da escravidão: contradição e irracionalidade ? Ou simples lógica da contradição e irracionalidade ? Ou simples lógica da mais valia? (ler nomes das empresas pp. 82)mais valia? (ler nomes das empresas pp. 82)

Martins demonstra que o quadro teórico marxista-Martins demonstra que o quadro teórico marxista-estruturalista só permite uma única temporalidade, a estruturalista só permite uma única temporalidade, a do tempo linear. do tempo linear.

A escravidão temporária não constitui um modo de A escravidão temporária não constitui um modo de produção, mas um dos seus momentos.produção, mas um dos seus momentos.

Page 11: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

O CATIVEIRO NO CAPITALISMO DE FRONTEIRAO CATIVEIRO NO CAPITALISMO DE FRONTEIRA

Programa militar ocupação da Amazônia: “integrar para não Programa militar ocupação da Amazônia: “integrar para não entregar”. GEOPOLÍTICA.entregar”. GEOPOLÍTICA.

Espaços vazios: Ideologia. Índios e população camponesa (XVIII)Espaços vazios: Ideologia. Índios e população camponesa (XVIII) Contradição histórica: ocupar espaços com a agropecuária Contradição histórica: ocupar espaços com a agropecuária

(dispensa mão de obra e esvazia territórios)(dispensa mão de obra e esvazia territórios) Doação de 75% de capital para as oligarquias tradicionais (bases Doação de 75% de capital para as oligarquias tradicionais (bases

de sustentação do próprio regime militar), para empreendimentos de sustentação do próprio regime militar), para empreendimentos na região Amazônica. Política anti-reforma agrária.na região Amazônica. Política anti-reforma agrária.

Diferente da expansão para o Oeste dos EUA, no Brasil definiu-Diferente da expansão para o Oeste dos EUA, no Brasil definiu-se num quadro fechado de ditadura, repressão e falta de se num quadro fechado de ditadura, repressão e falta de liberdade.liberdade.

Nesse contexto o proprietário de terra (importante aliado do Nesse contexto o proprietário de terra (importante aliado do regime) torna-se o “grande senhor” de consciências e de regime) torna-se o “grande senhor” de consciências e de pessoas”.pessoas”.

Os grandes empresários urbanos alimentaram o sistema do Os grandes empresários urbanos alimentaram o sistema do trabalho escravo na figura do capataz (acostumado ao poder trabalho escravo na figura do capataz (acostumado ao poder pessoal). Hoje o executivo que anda em Jatos particulares pessoal). Hoje o executivo que anda em Jatos particulares substitui a figura do Coronel montado no seu cavalo. (grifo meu)substitui a figura do Coronel montado no seu cavalo. (grifo meu)

Page 12: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Acumulação primitiva no interior da Acumulação primitiva no interior da reprodução ampliada de capitalreprodução ampliada de capital

Desenvolvimento desigual do capital: As forças produtivas Desenvolvimento desigual do capital: As forças produtivas se desenvolvem mais depressa do que as relações sociais.se desenvolvem mais depressa do que as relações sociais.

Assimetria entre realidade econômica e social: No capital a Assimetria entre realidade econômica e social: No capital a produção é social, mas a apropriação dos resultados da produção é social, mas a apropriação dos resultados da produção é privada. DESCOMPASSO HISTÓRICO ENTRE produção é privada. DESCOMPASSO HISTÓRICO ENTRE PROGRESSO MATERIAL E PROGRESSO SOCIAL.PROGRESSO MATERIAL E PROGRESSO SOCIAL.

Trabalho escravo utilizado na “formação da fazenda”: 72,7% Trabalho escravo utilizado na “formação da fazenda”: 72,7% dos peões são empregados no desmatamento de florestas, dos peões são empregados no desmatamento de florestas, para formação de pastagens. MOMENTO DO PROCESSO DO para formação de pastagens. MOMENTO DO PROCESSO DO CAPITAL.CAPITAL.

Casos de denúncia de escravidão acompanham o avanço da Casos de denúncia de escravidão acompanham o avanço da frente pioneira: Após a ditadura os casos de denúncia de frente pioneira: Após a ditadura os casos de denúncia de escravidão no Amazonas salta de 9,8 para 17,7 casos anuais, escravidão no Amazonas salta de 9,8 para 17,7 casos anuais, ou seja de 47,8% em 1970/73 para 63,2% em 1990/93. ou seja de 47,8% em 1970/73 para 63,2% em 1990/93. EVIDÊNCIA DE FORMAS DE UTILIZAÇÃO DE TRABALHO EVIDÊNCIA DE FORMAS DE UTILIZAÇÃO DE TRABALHO FORA DO PROCESSO USUAL DE PRODUÇÃO CAPITALISTA. FORA DO PROCESSO USUAL DE PRODUÇÃO CAPITALISTA. ISTO É: ACUMULAÇÃO PRIMITIVA.ISTO É: ACUMULAÇÃO PRIMITIVA.

Page 13: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

EXÉRCITO INDUSTRIAL DE RESERVAEXÉRCITO INDUSTRIAL DE RESERVAFORÇA DE TRABALHO À DISPOSIÇÃO DO CAPITALFORÇA DE TRABALHO À DISPOSIÇÃO DO CAPITAL

Super exploração da força de trabalho: trabalho acima Super exploração da força de trabalho: trabalho acima da jornada normal. da jornada normal.

Privação dos meios de produção como terra e Privação dos meios de produção como terra e ferramentas.ferramentas.

Super exploração introduz dificuldades: doenças, Super exploração introduz dificuldades: doenças, endividamento e morte.endividamento e morte.

Acumulação primitiva: processo histórico mais ou Acumulação primitiva: processo histórico mais ou menos lento.menos lento.

INCORPORAÇÃO DO TRABALHADOR E/OU SUA INCORPORAÇÃO DO TRABALHADOR E/OU SUA FAMÍLIA AO EXÉRCITO INDUSTRIAL DE RESERVAFAMÍLIA AO EXÉRCITO INDUSTRIAL DE RESERVA

Page 14: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Produção de capital no interior do processo de Produção de capital no interior do processo de reprodução ampliada de capitalreprodução ampliada de capital

Conversão de meios não capitalistas em instrumentos de Conversão de meios não capitalistas em instrumentos de produção capitalista: produção capitalista: o que define o processo não é o o que define o processo não é o resultado mas o modo como foi obtido. = resultado mas o modo como foi obtido. = O que a peonagem O que a peonagem tem promovido na frente pioneira é a “produção de fazendas” tem promovido na frente pioneira é a “produção de fazendas” e não de “mercadorias”. e não de “mercadorias”.

EXEMPLOS: 1) utilização de grande quantidade de trabalhadores EXEMPLOS: 1) utilização de grande quantidade de trabalhadores para o desmate de florestas virgens para formação de pastagens. para o desmate de florestas virgens para formação de pastagens. Depois de pronto apenas alguns peões mantinham a rotina das Depois de pronto apenas alguns peões mantinham a rotina das fazendas agropecuárias.fazendas agropecuárias.

EXEMPLOS: 2) Na época da escravidão negra utilizava-se da EXEMPLOS: 2) Na época da escravidão negra utilizava-se da mão de obra livre para formação da fazenda, desmatando mão de obra livre para formação da fazenda, desmatando terrenos e plantando as mudas de café recebendo em troca o terrenos e plantando as mudas de café recebendo em troca o direito de cultivarem nas novas terras gêneros alimentícios. direito de cultivarem nas novas terras gêneros alimentícios. Depois de formada a fazenda era utilizada a mão de obra Depois de formada a fazenda era utilizada a mão de obra escrava.escrava.

Page 15: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

A escravidão atual é, no limite, uma variação extrema A escravidão atual é, no limite, uma variação extrema do trabalho assalariadodo trabalho assalariado

Disseminação da peonagem fora da frente pioneira. Fenômeno Disseminação da peonagem fora da frente pioneira. Fenômeno residual e retardatário da passagem da frente pioneira, em residual e retardatário da passagem da frente pioneira, em áreas já incorporadas à economia nacional.áreas já incorporadas à economia nacional.

ReflorestamentoReflorestamento OlariasOlarias Corte da cana-de-açúcar Corte da cana-de-açúcar Colheita de caféColheita de café Colheita de semente de capim para formação de pastos.Colheita de semente de capim para formação de pastos. ATIVIDADES SAZONAIS QUE EMPREGAM A MÃO DE OBRA ATIVIDADES SAZONAIS QUE EMPREGAM A MÃO DE OBRA

DOS CHAMADOS BÓIAS – FRIAS. DOS CHAMADOS BÓIAS – FRIAS. EXTRAÇÃO DE MAIS-VALIA ALÉM DO LIMITE DETERMINADO EXTRAÇÃO DE MAIS-VALIA ALÉM DO LIMITE DETERMINADO

PELA REPRODUÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO.PELA REPRODUÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO. EXÉRCITO DE RESERVA TORNA O TRABALHADOR EXÉRCITO DE RESERVA TORNA O TRABALHADOR

“SUBSTITUÍVEL E DESCARTÁVEL”.“SUBSTITUÍVEL E DESCARTÁVEL”.

Page 16: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Transição do trabalho do bóia-fria para o Transição do trabalho do bóia-fria para o sistema de peonagemsistema de peonagem

Necessidade de redução adicional do capital variável Necessidade de redução adicional do capital variável (dispêndios de despesas com salários).(dispêndios de despesas com salários).

Acentuação da superexploração do trabalho.Acentuação da superexploração do trabalho. Dificuldades em contratar empregados (baixo salários)Dificuldades em contratar empregados (baixo salários) Escassez de mão de obraEscassez de mão de obra Falta de investimentos na modernização dos meios de Falta de investimentos na modernização dos meios de

produçãoprodução PEONAGEM PEONAGEM ESCRAVIDÃO POR DÍVIDAESCRAVIDÃO POR DÍVIDA

Page 17: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Mecanismos sociais de gestação da escravidãoMecanismos sociais de gestação da escravidão

Trabalhos de curta duração: derrubada de matasTrabalhos de curta duração: derrubada de matas Vendas de peões endividados no término da empreitadaVendas de peões endividados no término da empreitada Mecanismo da dívida: mesmo quando o peão tem liberdade Mecanismo da dívida: mesmo quando o peão tem liberdade

de sair garante o seu retorno. QUESTÃO MORALde sair garante o seu retorno. QUESTÃO MORAL Casos de extremo controle: Fazenda Codeara (peão só saía Casos de extremo controle: Fazenda Codeara (peão só saía

com salvo-conduto).com salvo-conduto). MUNDO DA PEQUENA ACUMULAÇÃO: Traficantes que MUNDO DA PEQUENA ACUMULAÇÃO: Traficantes que

recrutam trabalhadores, donos de prostíbulos (as recrutam trabalhadores, donos de prostíbulos (as prostitutas também são escravizadas), vendedores de prostitutas também são escravizadas), vendedores de roupas e bugigangas, donos de pensões, polícia à serviço roupas e bugigangas, donos de pensões, polícia à serviço dos interesses dos traficantes (peão preso tem que pagar dos interesses dos traficantes (peão preso tem que pagar pelo cárcere), pistoleiros e capatazes utilizados no sistema pelo cárcere), pistoleiros e capatazes utilizados no sistema de repressão.de repressão.

Page 18: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Condições de extremas dificuldades geram Condições de extremas dificuldades geram mão de obra excedentemão de obra excedente

Membros de famílias de pequenos agricultores pobres são Membros de famílias de pequenos agricultores pobres são estimulados a aceitar ocupações temporárias fora do lugar estimulados a aceitar ocupações temporárias fora do lugar onde vivem nos períodos entre o fim da colheita e o início onde vivem nos períodos entre o fim da colheita e o início do plantio. FORMA DE NÃO SOBRECARREGAR A ECONOMIA do plantio. FORMA DE NÃO SOBRECARREGAR A ECONOMIA FAMILIAR NO MOMENTO DE DESOCUPAÇÃO OU FAMILIAR NO MOMENTO DE DESOCUPAÇÃO OU SUBOCUPAÇÃO.SUBOCUPAÇÃO.

Iniciativa própria dos jovens em busca de algum dinheiro Iniciativa própria dos jovens em busca de algum dinheiro próprio que a economia familiar não proporciona. (compra próprio que a economia familiar não proporciona. (compra de pequenos luxos: rádio-portátil, roupa vistosa).de pequenos luxos: rádio-portátil, roupa vistosa).

Momento de ruptura dos vínculos entre pai e filhos: início Momento de ruptura dos vínculos entre pai e filhos: início de uma nova unidade familiar ou busca de novas de uma nova unidade familiar ou busca de novas alternativas de vida, poderosa interferência da necessidade alternativas de vida, poderosa interferência da necessidade de dinheiro para as novas gerações (mídia).de dinheiro para as novas gerações (mídia).

Page 19: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Origem camponesa alimenta o sistema da Origem camponesa alimenta o sistema da peonagempeonagem

Apesar das denuncias de escravidão a peonagem persiste como Apesar das denuncias de escravidão a peonagem persiste como sistema de recrutamento da mão de obra que as fazendas sistema de recrutamento da mão de obra que as fazendas necessitam:necessitam:

Os peões acreditam estar migrando temporariamente para um Os peões acreditam estar migrando temporariamente para um ganho adicional de dinheiro.ganho adicional de dinheiro.

Nem todos os peões se tornam escravos. (norma da exceção).Nem todos os peões se tornam escravos. (norma da exceção). O sistema funciona: nem sempre caem num regime em que se O sistema funciona: nem sempre caem num regime em que se

reconheçam como servis. reconheçam como servis. As relações de trabalho não são piores do que as que conhece As relações de trabalho não são piores do que as que conhece

habitualmente.habitualmente. O peão só se conscientiza como escravo quando perde a liberdade O peão só se conscientiza como escravo quando perde a liberdade

de ir e vir ou quando pistoleiros ostentam armas e/ou torturam os de ir e vir ou quando pistoleiros ostentam armas e/ou torturam os que tentam escapar sem pagar a dívida.que tentam escapar sem pagar a dívida.

Page 20: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Uma questão cultural (mentalidade)Uma questão cultural (mentalidade)

Persistência de antigas relações de trabalho servis ainda Persistência de antigas relações de trabalho servis ainda não superadas, em função também da manutenção das não superadas, em função também da manutenção das condições de reprodução.condições de reprodução.

Cultura da servidão e da dependência pessoal que ainda Cultura da servidão e da dependência pessoal que ainda se difundem entre as populações pobres do campo e da se difundem entre as populações pobres do campo e da cidade. (resquícios da Idade Média = grifo meu)cidade. (resquícios da Idade Média = grifo meu)

Condições da própria sobrevivência do trabalhador o Condições da própria sobrevivência do trabalhador o impede de exigir uma melhor remuneração.impede de exigir uma melhor remuneração.

Caráter lúdico do trabalho fora do lugar (longe da Caráter lúdico do trabalho fora do lugar (longe da vigilância dos pais e esposas). Vulnerabilidade e vigilância dos pais e esposas). Vulnerabilidade e tolerância com as más condições de trabalho, pouco tolerância com as más condições de trabalho, pouco ganho e violações de direitos trabalhistas.ganho e violações de direitos trabalhistas.

Page 21: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Capítulo 3Capítulo 3Regimar e seus amigosRegimar e seus amigos

A criança na luta pela terra e pela vidaA criança na luta pela terra e pela vida

• Trabalho publicado, originalmente, como capítulo do livro de José de Souza Martins (org.), O Massacre dos Inocentes (A criança sem infância no Brasil), Editora Hucitec, São Paulo, 1991, p. 51-80.

Page 22: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

A criança como testemunhaA criança como testemunha• Segundo Martins a informação mais importante que se

pode obter numa entrevista é justamente aquela que não é dita. O Silêncio.

• As ciências sociais cultivam a concepção do homem que está permanentemente disposto a enganar os outros, no jogo da sociedade. No limite a vida social é concebida como uma fraude.

• Trabalho do sociólogo: fazer a vítima contar o que não gostaria de revelar, coisas que só tem sentido dentro de uma matriz interpretativa acessível somente ao pesquisador.

• O interesse se desloca para o informante “central” da pesquisa, e descarta os que não falam.

• MAS, Martins identifica importante “filão sociológico” nos que não falam ou que falam por meio dos silêncios.

Page 23: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

A criança como testemunha (continuação)A criança como testemunha (continuação)

• A pesquisa que originou esse trabalho é um desafio desse tipo: Compreender o silêncio.

• Maioria das entrevistas era realizada com grandes grupos.• No meio da platéia um grupo importante que nunca falava mas

ouvia muito sempre chamou a atenção do Autor: AS CRIANÇAS. Martins resolve entrevistá-las.

• “NESTE TEXTO FALO DA FALA DAS CRIANÇAS, QUE POR MEIO DELA ME FALAM (E NOS FALAM) DO QUE É SER CRIANÇA (E ADULTO) NAS REMOTAS REGIÕES DAS FRENTES DE OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO, EM DISTANTES PONTOS DA AMAZÔNIA.”

• O material utilizado aqui foi recolhido na colônia de Canarana e em dois povoados da Pré-amazônia Maranhense: São Pedro da Água Branca (município de Imperatriz) e Floresta (município de Santa Luzia).

Page 24: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

A criança como testemunha (continuação)A criança como testemunha (continuação)

• Em São Pedro:• combate entre posseiros e um grileiro com seus capanga• Vitória dos posseiros• Posseiros prendem grupo de soldados PM do Pará que agiam

segundo interesses do grileiro.• Os grileiros revidaram: amarraram um posseiro num formigueiro

(formigas-de-fogo). • Grileiros tentam incendiar a aldeia. O vento sopra o fogo na direção

contrária salvando centenas de famílias.• Em Floresta:• Um posseiro (chefe de família) é assassinado pouco depois da

partida de Martins daquela região.• TODA ESSA VIOLÊNCIA FOI PRESENCIADA POR ESSAS

CRIANÇAS.

Page 25: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

““O protagonista coletivo”O protagonista coletivo”

Martins identifica “um protagonista coletivo” , nas falas das crianças, Martins identifica “um protagonista coletivo” , nas falas das crianças, que se expressa na fala e nos atos de cada um, de cada família. (Ex. da que se expressa na fala e nos atos de cada um, de cada família. (Ex. da filha recém-nascida entregue a um casal de posseiros.) = Concepção aldeã filha recém-nascida entregue a um casal de posseiros.) = Concepção aldeã de vida.de vida.

Em cada localidade a fala de cada criança é fragmento de um enredo mais Em cada localidade a fala de cada criança é fragmento de um enredo mais amplo, que protagoniza com os outros.amplo, que protagoniza com os outros.

O espaço de que falam abrangem por vezes centenas de quilômetros. É O espaço de que falam abrangem por vezes centenas de quilômetros. É nesse espaço que circulam idéias sobre “terras livres”, “trabalho”, “lugares nesse espaço que circulam idéias sobre “terras livres”, “trabalho”, “lugares bons para um pobre viver”.bons para um pobre viver”.

Adultos e crianças raciocinam a partir de uma concepção de totalidade de Adultos e crianças raciocinam a partir de uma concepção de totalidade de tempo e de espaço: O tempo se abre na certeza do destino da criança de tempo e de espaço: O tempo se abre na certeza do destino da criança de Canarana e na incerteza do destino das crianças dos povoados do Canarana e na incerteza do destino das crianças dos povoados do Maranhão. O espaço é utilizado pelo agricultor gaúcho para assegurar o Maranhão. O espaço é utilizado pelo agricultor gaúcho para assegurar o futuro dos filhos contrasta com o espaço do posseiro maranhense em sua futuro dos filhos contrasta com o espaço do posseiro maranhense em sua constante “caça do destino”.constante “caça do destino”.

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Localização município de Canarana - MTLocalização município de Canarana - MT

Page 27: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Vista aérea da cidade de CanaranaVista aérea da cidade de Canaranafoto tirada em setembro/2009foto tirada em setembro/2009

http://3.bp.blogspot.com/_rMgrJyH_bZ4/Sb_n7ptXT2I/AAAAAAAAADQ/ywH5AVNKAOo/s1600-h/http://3.bp.blogspot.com/_rMgrJyH_bZ4/Sb_n7ptXT2I/AAAAAAAAADQ/ywH5AVNKAOo/s1600-h/Cidade+Canarana+a%C3%A9rea_+(1).jpgCidade+Canarana+a%C3%A9rea_+(1).jpg

Page 28: Fronteira. a degradação do outro nos confins do humano

Recomeçando a família pelo trabalhoRecomeçando a família pelo trabalho Crianças de Canarana: Infância concebida como Crianças de Canarana: Infância concebida como

preparação para o futuro. preparação para o futuro. O presente em função do futuro. O presente em função do futuro. Discurso das crianças (perspectiva malthusiana): Alencar Discurso das crianças (perspectiva malthusiana): Alencar

Jr. (14 anos): “nós viemos para Canarana atrás de futuro, Jr. (14 anos): “nós viemos para Canarana atrás de futuro, porque lá no Rio Grande do Sul tínhamos pouca terra: porque lá no Rio Grande do Sul tínhamos pouca terra: dava só para viver, mas para ajudar um filho não dava...”. dava só para viver, mas para ajudar um filho não dava...”. Marcos M. (14 anos): “[...] não haveria lugar para todo Marcos M. (14 anos): “[...] não haveria lugar para todo mundo em um pedaço de terra com a quantia de 25 mundo em um pedaço de terra com a quantia de 25 hectares. Como meus pais queriam dar um futuro melhor hectares. Como meus pais queriam dar um futuro melhor aos filhos, viemos para cá”. (pp. 124).aos filhos, viemos para cá”. (pp. 124).

Não havia futuro no lugar antigo: muita gente, terra Não havia futuro no lugar antigo: muita gente, terra insuficiente, secas, geadas. O FUTURO se revelou como insuficiente, secas, geadas. O FUTURO se revelou como preservação de um modo de vida: FAMÍLIA QUE preservação de um modo de vida: FAMÍLIA QUE TRABALHA NA AGRICULTURA, PARA SÍ MESMA, TRABALHA NA AGRICULTURA, PARA SÍ MESMA, QUE NÃO TRABALHA PARA OS OUTROS.QUE NÃO TRABALHA PARA OS OUTROS.

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Recomeçando a família pelo trabalho (continuação)Recomeçando a família pelo trabalho (continuação)

TRABALHO E FAMÍLIA:TRABALHO E FAMÍLIA: Para muitos a emigração destinou-se à manter a família unida e Para muitos a emigração destinou-se à manter a família unida e

próxima.próxima. Maioria das famílias de Canarana são descendentes de Alemães Maioria das famílias de Canarana são descendentes de Alemães

e Italianos: histórico marcado por migrações periódicas desde e Italianos: histórico marcado por migrações periódicas desde finais século XIX.finais século XIX.

O TRABALHO: As próprias crianças admitem que mudaram O TRABALHO: As próprias crianças admitem que mudaram para trabalhar e muitas estudam à noite, para ajudar na lavoura para trabalhar e muitas estudam à noite, para ajudar na lavoura durante o dia. TRABALHO É MISSÃO, E MISSÃO durante o dia. TRABALHO É MISSÃO, E MISSÃO FAMILIAR.FAMILIAR.

Para as crianças melhoria de vida é aumento de condições de Para as crianças melhoria de vida é aumento de condições de trabalho. Trabalho que paga dívidas: financiamentos, máquinas e trabalho. Trabalho que paga dívidas: financiamentos, máquinas e terras.terras.

Em Mato Grosso o trabalho é insuficiente para ocupar toda terra Em Mato Grosso o trabalho é insuficiente para ocupar toda terra existente. O arado e o boi é substituído pela alta tecnologia. existente. O arado e o boi é substituído pela alta tecnologia. EQUILIBRIO.EQUILIBRIO.

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Recomeçando a família pelo trabalho (continuação)Recomeçando a família pelo trabalho (continuação)

O primado do trabalho é o primado da famíliaO primado do trabalho é o primado da família O trabalho reproduz a família na medida em que garante o futuro dos O trabalho reproduz a família na medida em que garante o futuro dos

descendentes com a reserva de terras para o trabalho. (movimento descendentes com a reserva de terras para o trabalho. (movimento cíclico).cíclico).

A riqueza pela riqueza é fator de vergonha, como se fosse ilícita. A riqueza pela riqueza é fator de vergonha, como se fosse ilícita. Pressupões enriquecimento de uma só pessoa e não do grupo o que Pressupões enriquecimento de uma só pessoa e não do grupo o que quebraria o ciclo: a herança deve ser repartida. Uma desacumulação quebraria o ciclo: a herança deve ser repartida. Uma desacumulação cíclica dos bens do camponês.cíclica dos bens do camponês.

A infância é o período da vida em que a criança se prepara para herdar. A infância é o período da vida em que a criança se prepara para herdar. Daí a importância do estudo como forma de preparo para o salto social.Daí a importância do estudo como forma de preparo para o salto social.

O tempo é circular: O herdeiro se move num tempo finito onde o ponto O tempo é circular: O herdeiro se move num tempo finito onde o ponto de chegada ainda é o ponto de partida (o recomeço da agricultura de chegada ainda é o ponto de partida (o recomeço da agricultura familiar do pai provedor). Porém o ponto de chegada já não é o familiar do pai provedor). Porém o ponto de chegada já não é o mesmo: EVOLUÇÃOmesmo: EVOLUÇÃO

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Recomeçando a família pelo trabalho Recomeçando a família pelo trabalho (continuação)(continuação)

Desequilíbrio: empobrecimento das terras do cerrado:Desequilíbrio: empobrecimento das terras do cerrado: Retorno cíclico à uma nova base para a agricultura Retorno cíclico à uma nova base para a agricultura

familiar.familiar. O agricultor de Canarana se concebe como trabalhador O agricultor de Canarana se concebe como trabalhador

que é patrão de sí mesmo. Pensa no salário (fruto do que é patrão de sí mesmo. Pensa no salário (fruto do excedente produzido por seu trabalho) que o capital (a excedente produzido por seu trabalho) que o capital (a terra) lhe proporciona.terra) lhe proporciona.

O salário aqui está presente num tempo e dimensão O salário aqui está presente num tempo e dimensão cósmica singular. Não constitui-se em parcelas mensais cósmica singular. Não constitui-se em parcelas mensais nas relações de produção mas, na subsistência de toda nas relações de produção mas, na subsistência de toda a família e sua permanência na agricultura.a família e sua permanência na agricultura.

Ilusão cruel: apesar do sistema criar a possibilidade da Ilusão cruel: apesar do sistema criar a possibilidade da criança ser “criança” a ocupa com os encargos do criança ser “criança” a ocupa com os encargos do trabalhador e as preocupações do adulto. Uma negação trabalhador e as preocupações do adulto. Uma negação da infância, portanto.da infância, portanto.

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O ADULTO NO CORPO DA CRIANÇA

• As crianças nos povoados de São Pedro da Água Branca e de Floresta no Maranhão vivem uma realidade muito diversa:

• Povoados de posseiros e pequeno agricultores sem o título da terra• Sujeitos ao despejo: ação direta de fazendeiros, pistoleiros via de regra

com anuência da polícia.• Um discurso diferente das crianças de Canarana: mediação do lúdico,

brincadeiras e amizades. (sonhos)• Dura realidade: Antonio P. (11 anos): “nunca fui feliz em minha vida”.

Ariston C. (11 anos): “Eu sou um menino pequeno. Eu passo mal porque aqui não tem as coisas que a gente gosta”. Maria de Fátima R. (13 anos): “é uma vida pensativa. Passa uns tempos bons e outros ruins. Mas, dá da gente viver assim mesmo. Porque ser pobre em todo lugar é ruim”.

• O espaço da brincadeira é circunstancial e se apresenta como um intervalo durante o dia. Primeiro trabalham, depois vão à escola e só após brincam, no fim do dia, na boca da noite. A infância é um resíduo do tempo que está acabando.

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O adulto no corpo da criança (continuação)

• Vida marcada por constantes migrações: A migração, a constante busca é um dado da vida. Aqui a infância não é definida pela condição de herdeiro. Não há o que herdar. Nascimento B.: “Nós vamos embora, aqui, nós não pode trabalhar. O pobre não pode viver onde não pode trabalhar”.

• Cacarecos e bagulhos: A pobreza facilita a migração. Não há o que carregar. A não ser os apetrechos de sobrevivência, opostos aos bens de raiz que dão sentido ao trabalho do homem do campo.

• POBREZA TRANSFORMADA EM CARÊNCIA MORAL: Núcleo problemático do processo = falta de união e o fim das lealdades básicas.

• O dinheiro (instrumento da trapaça) deixa de ser expressão do trabalho, para constituir na sua negação:

• Abertura e venda de posses de terra (muitas vezes ameaçadas)

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O adulto no corpo da criança (continuação)

• A POLARIZAÇÃO QUE INDICA O LUGAR DO POBRE NO MUNDO:

• Inexistência de terra para o pobre botar roça.• Em São Pedro os “donos da terra não deixam trabalhar”. É só

alguém começar uma roça e eles chegam e mandam parar.• “Os polícias não querem deixar os lavradores botarem roça” João.• Em Floresta “os mineiros querem tomar as terras dos lavradores”

Maria N. (13 anos).• O não ter terra para trabalhar não deriva do sentido de propriedade,

deriva do advento do “dono” (que também não é proprietário) que se interpôs entre o “lavrador” e a “livre liberação da terra”. USO DA FORÇA NA IMPOSIÇÃO DA AUTORIDADE DO PODER PESSOAL

• É na violência do “dono” que as crianças se reconhecem como pobres. Uma degradação do homem pela mediação do dono.

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O adulto no corpo da criança (continuação)

• Cercamento das terras para criação de gado: • Terra para cercar é uma negação da terra para trabalhar (na visão

das crianças): “Gado sem arroz ninguem come”.• O arroz é a comida do trabalho. A carne é a comida do ócio, da

festa.• Arroz sem carne tem sentido, Carne sem arroz não o tem.• A comida não é supérflua na vida do posseiro: Ela é também o

limite. O “ter” se reduz ao “ter o que se pode comer”. REALIDADE.• Assim o arroz simboliza a própria vida, recurso do limite da

sobrevivência.• O capital deteriorou as relações no campo: O “ganhar” substitui em

importância a “união de antes”.

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O adulto no corpo da criança (continuação)

• A humilhação e violência como fatores de expulsão dos posseiros:

• Bater e colocar no formigueiro• Uso da palmatória (instrumento de castigo de escravos e crianças)• Forte simbolismo de classe. Da classe que manda, que tem o

poder.• “levar bolos na mão é castigo que se inflige a quem está na

condição de menor e subalterno, a quem não tem direito de ter a própria vontade, a quem está obrigado a obedecer.

• A pequena Regimar F. ao falar de sua vida de adulta e criança demarcou o espaço agora duplicado, o dos pobres e o dos donos, numa carta geográfica imaginária, em que toda a força do mundo que se acaba, e que foi subjugado, ganha contorno de esperança na aventura de uma nova migração. Só que Já não se trata de buscar terra livre, mas de escapar da cerca e da humilhação.

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CONCLUSÕESCONCLUSÕES CRIANÇAS DE CANARANA:CRIANÇAS DE CANARANA: Trabalham para o grande capitalTrabalham para o grande capital Possui título das terras que ocupamPossui título das terras que ocupam Vivem a ilusão da autonomia na coesão da família: Não percebem Vivem a ilusão da autonomia na coesão da família: Não percebem

que o capital transformou a família em capataz de adultos e crianças.que o capital transformou a família em capataz de adultos e crianças. CRIANÇAS DE SÃO PEDRO E FLORESTA:CRIANÇAS DE SÃO PEDRO E FLORESTA: Posseiros não tem a propriedade da terraPosseiros não tem a propriedade da terra Agricultura de subsistência. Sua relação com o capital, apesar de Agricultura de subsistência. Sua relação com o capital, apesar de

tênue, é insidiosa e corrosiva: dívidas e carências que, no limite, tênue, é insidiosa e corrosiva: dívidas e carências que, no limite, forçam os pobres a comer tudo que tem. EXPULSÃO, GRILAGEM E forçam os pobres a comer tudo que tem. EXPULSÃO, GRILAGEM E VIOLÊNCIA.VIOLÊNCIA.

O posseiro é um obstáculo ao uso capitalista da terra. É a reprodução O posseiro é um obstáculo ao uso capitalista da terra. É a reprodução do capital que está em jogo e não a reprodução do trabalhador e da do capital que está em jogo e não a reprodução do trabalhador e da família.família.

EM AMBOS OS CASOS:EM AMBOS OS CASOS: As crianças já nascem para o trabalho. No caso dos colonos a infância As crianças já nascem para o trabalho. No caso dos colonos a infância

já foi incorporada pelo trabalho, no caso dos posseiros, foi já foi incorporada pelo trabalho, no caso dos posseiros, foi marginalizada pelo trabalho.marginalizada pelo trabalho.

Ambas as crianças pensam a vida em termos de futuro, concebido Ambas as crianças pensam a vida em termos de futuro, concebido através do passado como fonte de esperança, a matriz da utopia.através do passado como fonte de esperança, a matriz da utopia.