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FreshWater Watch 2016 RELATÓRIO DE CAMPO ADOTE UM RIO Caros Líderes Voluntários da Ciência do Brasil, Completamos três anos do FreshWater Watch no Brasil. Estamos próximos dos 12.000 dados obtidos em todo o mundo, sendo o Brasil (mais especificamente, vocês) responsáveis por uma relevante fatia de quase 10% desse total. Graças a vocês, começamos a delinear conclusões interessantes, entre elas: Vocês observaram lixo, nos cursos d’água ou em seu entorno, em 41% dos casos em Curitiba, 59% no Rio de Janeiro e em incríveis 66% em São Paulo. A coleta e a destinação adequada do lixo doméstico, industrial, de construção, demolição, etc., são um grande desafio e os rios ainda parecem ser, infelizmente, fiéis depositários e escoadouros desses materiais. Ainda mais alarmante foi a presença de fontes poluidoras, de acordo com o que vocês relataram. Em São Paulo, nove em cada dez líderes observaram algum tipo de lançamento de esgoto no seu ponto de coleta. Além da cobertura deficitária de serviços de saneamento, ligações clandestinas também são, em parte, responsáveis por esse quadro preocupante. Em relação a nitrato, fosfato e turbidez, a situação é menos preocupante em Curitiba. Em São Paulo, os dados indicam presença de fosfato em elevadas concentrações e turbidez média de 79 UNT. A título de comparação, a água potável deve ter entre 0,5-1,0 UNT. As concentrações médias de fosfato em São Paulo e no Rio de Janeiro estão acima de padrões legais de qualidade estabelecidos para proteção da vida aquática e podem levar à proliferação de cianobactérias tóxicas. Em Curitiba, uma bica de água utilizada para consumo apresenta elevadas concentrações de nitrato, com potenciais riscos à saúde. Em São Paulo, os resultados serão apresentados à Companhia Ambiental do Estado de São Paulo em março de 2016. Como se trata de pontos que não são acompanhados pelo poder público, existe potencial interesse de incorporação de alguns pontos monitorados por vocês à rede regularmente avaliada pela companhia. Interações similares também estão em andamento com o Instituto Ambiental do Paraná e o Instituto Estadual do Ambiente (RJ). Artigos científicos estão sendo publicados e apresentados em conferências nacionais e internacionais. A aproximação com prefeituras, associações de bairro e grupos de escoteiros será reforçada. Experiências como a nossa, baseadas no conceito de ciência cidadã, reforçam a relevância da participação da sociedade nas questões ambientais. A necessidade crescente de informações detalhadas (muitas vezes a respeito de rios e córregos não monitorados pelo poder público), aliada à escassez de recursos financeiros, faz com que a participação de voluntários seja uma alternativa promissora e com relação custo/benefício bastante favorável. A respeito das mudanças pelas quais o HSBC Brasil está passando, gostaria de contar com o seu apoio para a continuidade das coletas. Vamos fechar o último ano do projeto com chave de ouro! Muitos dos nossos rios e córregos estão na UTI. Que todos nós nos sintamos co-responsáveis pela saúde deles e dediquemos uma parcela do nosso tempo, por menor que seja, em prol de seu diagnóstico e de sua recuperação. Um grande abraço Dr. Davi Cunha, Universidade de São Paulo: Pesquisador líder do FreshWater Watch no Brasil

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2016 RELATÓRIO DE CAMPOAdote Um rio

Caros Líderes Voluntários da Ciência do Brasil, Completamos três anos do FreshWater Watch no Brasil. Estamos próximos dos 12.000 dados obtidos em todo o mundo, sendo o Brasil (mais especificamente, vocês) responsáveis por uma relevante fatia de quase 10% desse total. Graças a vocês, começamos a delinear conclusões interessantes, entre elas: Vocês observaram lixo, nos cursos d’água ou em seu entorno, em 41% dos casos em Curitiba, 59% no Rio de Janeiro e em incríveis 66% em São Paulo. A coleta e a destinação adequada do lixo doméstico, industrial, de construção, demolição, etc., são um grande desafio e os rios ainda parecem ser, infelizmente, fiéis depositários e escoadouros desses materiais. Ainda mais alarmante foi a presença de fontes poluidoras, de acordo com o que vocês relataram. Em São Paulo, nove em cada dez líderes observaram algum tipo de lançamento de esgoto no seu ponto de coleta. Além da cobertura deficitária de serviços de saneamento, ligações clandestinas também são, em parte, responsáveis por esse quadro preocupante. Em relação a nitrato, fosfato e turbidez, a situação é menos preocupante em Curitiba. Em São Paulo, os dados indicam presença de fosfato em elevadas concentrações e turbidez média de 79 UNT. A título de comparação, a água potável deve ter entre 0,5-1,0 UNT. As concentrações médias de fosfato em São Paulo e no Rio de Janeiro estão acima de padrões legais de qualidade estabelecidos para proteção da vida aquática e podem levar à proliferação de cianobactérias tóxicas. Em Curitiba, uma bica de água utilizada para consumo apresenta elevadas concentrações de nitrato, com potenciais riscos à saúde. Em São Paulo, os resultados serão apresentados à Companhia Ambiental do Estado de São Paulo em março de 2016. Como se trata de pontos que não são acompanhados pelo poder público, existe potencial interesse de incorporação de alguns pontos monitorados por vocês à rede regularmente avaliada pela companhia. Interações similares também estão

em andamento com o Instituto Ambiental do Paraná e o Instituto Estadual do Ambiente (RJ). Artigos científicos estão sendo publicados e apresentados em conferências nacionais e internacionais. A aproximação com prefeituras, associações de bairro e grupos de escoteiros será reforçada. Experiências como a nossa, baseadas no conceito de ciência cidadã, reforçam a relevância da participação da sociedade nas questões ambientais. A necessidade crescente de informações detalhadas (muitas vezes a respeito de rios e córregos não monitorados pelo poder público), aliada à escassez de recursos financeiros, faz com que a participação de voluntários seja uma alternativa promissora e com relação custo/benefício bastante favorável. A respeito das mudanças pelas quais o HSBC Brasil está passando, gostaria de contar com o seu apoio para a continuidade das coletas. Vamos fechar o último ano do projeto com chave de ouro! Muitos dos nossos rios e córregos estão na UTI. Que todos nós nos sintamos co-responsáveis pela saúde deles e dediquemos uma parcela do nosso tempo, por menor que seja, em prol de seu diagnóstico e de sua recuperação.

Um grande abraçoDr. Davi Cunha,

Universidade de São Paulo: Pesquisador líder do FreshWater Watch no Brasil

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PRINCIPAIS DESTAQUESUma das realizações mais significativas de 2015 foi utilizar os dados enviados pelos cientistas cidadãos para desenvolver análises comparativas em colaboração com outros pesquisadores do Observatório da Água Doce (13 cidades, 250 lagos e riachos, mais de 2.000 conjuntos de dados). Uma das nossas principais descobertas foi que os Líderes treinados podem ajudar a identificar a proliferação de algas. Além disso, as suas observações sobre as condições gerais dos ecossistemas e as suas estimativas das concentrações de nutrientes foram úteis para explicar os principais fatores envolvidos no desenvolvimento do fitoplâncton. As medições de densidade de fitoplâncton realizadas no Brasil e na China foram relacionadas com as estimativas de turbidez medida pelos Líderes. Informações como essa, adquirida através da ciência cidadã, tem duas vantagens principais: tem alto nível de detalhamento e um menor custo quando comparado aos métodos convencionais de coleta de dados. Estes resultados são interessantes porque mostram claramente como a participação de voluntários em estudos ambientais pode ajudar a melhorar a nossa compreensão e manejo de ecossistemas aquáticos.

RESULTADOS E PROGRESSOSDoze coletas foram realizadas entre maio de 2013 e dezembro de 2015. Esses diferentes períodos de coleta permitem a avaliação de um interessante espectro de condições hidrológicas: maio, julho e agosto correspondem a meses mais frios e secos; fevereiro, outubro e dezembro são meses mais quentes e úmidos no Brasil. Isto possibilita comparações sazonais e avaliações sobre as alterações de qualidade da água dependendo das características climáticas (por exemplo, precipitação e temperatura do ar). A coleta de dados ao longo de três anos também viabiliza a análise de tendências temporais entre 2013 e 2015.

COMPARAÇÃO ENTRE CIDADESOs corpos de água em Curitiba apresentaram maior concentração de nitrato, mas as condições de qualidade da água foram piores em São Paulo, onde os valores mais elevados de amônia, fosfato e turbidez foram observados.

ANÁLISE DE NUTRIENTES E TURBIDEZ: COMPARATIVO ENTRE CIDADES E MÉDIA GLOBALGlobal Curitiba São Paulo (n: 321) Rio de Janeiro

(n:119)Nitrato 1.78 mg/L 2.4mg/L 1.9mg/L 1.6mg/LFosfato 0.17ml/L 0.09mg/L 0.29mg/L 0.28mg/LAmônia Variável local 1.8 mg/L 2.4mg/L 1.7mg/LTurbidez 40NTU 25NTU 79NTU 41NTU

n: número de conjuntos de dados analisados

1141CONJUNTOS DE DADOS ENVIADOS POR LÍDERES VOLUNTÁRIOS DA CIÊNCIA NO BRASIL ATÉ DEZEMBRO DE 2015

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Os valores de turbidez em São Paulo foram cerca de 3 e 2 vezes maiores em comparação com Curitiba e Rio de Janeiro, respectivamente. Considerando todo o conjunto de dados, não só os valores médios, a turbidez em São Paulo não mostrou conformidade com as normas brasileiras de qualidade da água em 59% dos casos. Altos valores de turbidez diminuem a penetração de luz e podem trazer consequências negativas para as comunidades biológicas nos ecossistemas aquáticos. Além disso, se a água é utilizada para abastecimento público, a menor transparência da água está associada a maiores custos de tratamento.

As elevadas concentrações de amônia e fosfato em córregos de São Paulo estão associadas, provavelmente, com a maior população na cidade e as ainda baixas coberturas de rede de coleta e tratamento de águas residuais. A amônia indica poluição recente e provavelmente está associada a descargas não tratadas de águas residuárias domésticas e industriais. Em relação ao fosfato, as porcentagens de não conformidade com as exigências legais para corpos d’água de referência foram: 17% (Curitiba), 30% (São Paulo) e 35% (Rio

de Janeiro). Estas são informações especialmente úteis para as autoridades locais, que podem, a partir desses dados, estabelecer metas progressivas para melhorar a qualidade da água e reduzir a poluição por nutrientes. Os córregos de São Paulo e do Rio de Janeiro se mostraram, portanto, mais suscetíveis a eutrofização, já que a alta concentração de fosfato pode estimular o desenvolvimento de algas.

O uso do solo nas bacias hidrográficas provavelmente desempenhou um papel importante nos resultados da qualidade da água. A partir da análise dos dados coletados pelos Líderes, foi possível observar que 50% dos pontos de coleta de Curitiba tinham árvores e arbustos em suas margens, enquanto que as respectivas porcentagens para São Paulo e Rio de Janeiro foram de 19% e 45%. Para estas duas últimas cidades, não havia nenhuma cobertura vegetal em 23% e 20% dos pontos monitorados. Portanto, os pontos de coleta de Curitiba parecem ser menos vulneráveis ao aporte de sedimentos e ao assoreamento, pois a vegetação promove uma redução nos processos de erosão e benefícios gerais para a qualidade da água resultante da capacidade de filtragem e amortecimento de matas ciliares. Quando se trata de impactos antropogênicos, a característica mais comum observada pelos Líderes foi lixo (41%, 66% e 59% dos casos em Curitiba, São Paulo e Rio, respectivamente). Outro indicador interessante foi a presença de fontes de poluição (por exemplo, descargas residenciais, industriais ou urbanas). A situação é alarmante em todas as cidades. O líderes observaram uma ou mais fontes de poluição em 70%, 85% e 74% dos casos em Curitiba, São Paulo e Rio, respectivamente.

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TENDÊNCIAS TEMPORAIS E SAZONAIS De 2013 a 2015, em geral, houve uma tendência de aumento na concentração de nutrientes dissolvidos. As concentrações de nitrato, por exemplo, variaram entre 1,35-1,54 mg / L em maio de 2013 e aumentaram para 2,87-3,70 mg / L em outubro de 2015, de acordo com o gráfico a seguir. As linhas identificadas como “Linear” representam linhas de tendência ao longo do tempo.

Nos córregos de São Paulo e do Rio de Janeiro, houve tendência de aumento do teor de fosfato ao longo dos anos, mas os pontos de coleta de Curitiba parecem ter concentrações de fosfato mais estáveis ao longo do tempo (estas variaram entre 0,04-0,14 mg / L em três anos).

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Quanto à variação sazonal, foram considerados dois subconjuntos de dados , um relativo aos meses secos e frios (maio, julho e agosto) e o outro aos meses úmidos e quentes (outubro, dezembro e fevereiro). Curiosamente, formas de nitrogênio (nitrato e amônia, por exemplo) não apresentaram variação sazonal. As médias para os períodos seco e chuvoso foram, respectivamente, 2,3-2,5 mg / L (Curitiba), 1,8-1,9 mg / L (São Paulo) e 1,2-1,8 mg / L (Rio de Janeiro). Uma variação sazonal bem clara foi observada no Rio de Janeiro em concentrações de fosfato, com maiores concentrações durante os meses chuvosos (0,35 mg / L), em comparação com os secos (0,18 mg /L). A hipótese é que o escoamento superficial das águas pluviais no meio urbano esteja influenciando as concentrações de fosfato no Rio. Serão realizadas análises estatísticas para apoiar estas conclusões e os resultados da análise de variância serão apresentados no próximo relatório.

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FITOPLÂNCTON A principal descoberta da última temporada foi que as observações de cor da água, turbidez e presença de algas, realizadas pelos Líderes, coincidiram com os resultados das densidades de fitoplâncton, que foram estimadas por métodos científicos formais, em laboratório da Universidade de São Paulo. As densidades fitoplanctônicas foram maiores (três vezes maiores) em locais sem vegetação, em comparação com aqueles com vegetação na margem (árvores, arbustos, grama, etc). O Fosfato (não o nitrato) parece ser o principal nutriente que tem regulados o crescimento do fitoplâncton nos corpos hídricos estudados.

Outra informação importante é que em 32% dos casos, as densidades de cianobactérias resultaram acima de 20.000 org/mL em São Paulo e Curitiba. Este é um nível de alerta considerado no Brasil para possíveis problemas com a produção de toxinas. As principais cianobactérias encontradas nas amostras analisadas foram Pseudanabaena sp. e Geitlerinema sp. (ver figuras acima), que podem produzir uma variedade de toxinas, incluindo saxitoxinas e anatoxinas.

Próximos passos: uma investigação mais aprofundada de variação temporal e sazonal da qualidade da água com a ajuda de análises estatísticas; comparações intermunicipais completas, usando dados de uso do solo de bacias hidrográficas locais e considerando apenas os pontos de coleta com pelo menos duas medições ao longo de um ano; estudo colaborativo para tentar propor um índice de qualidade ambiental para os córregos com base nas informações detalhadas obtidas pelos Líderes.

Geitlerinema sp.Pseudanabaena sp.

Prof. Steven Loiselle,

Gerente de Pesquisa da Água Doce Global EarthwatchUniversidade de Siena

FreshWaterWatch

RESULTADOS GLOBAISQueridos FreshWater Watchers,

Graças as suas grandes contribuições, chegamos a 12.500 conjuntos de dados sobre a qualidade da água recolhidos de mais de 2.000 corpos de água em todo o mundo. Como esta pesquisa está crescendo os encorajo vivamente a continuarem seus esforços e atualizarem suas habilidades no site do FreshWater Watch.

Suas medições estão abrindo novas perspectivas sobre o estado dos nossos ecossistemas de água doce. Vocês estão ajudando os pesquisadores, agências de água e planejadores a identificarem melhor os corpos de água saudáveis que precisam ser conservados e o grau de degradação que requer mitigação.

Graças as suas medições de concentrações de nutrientes, nossos parceiros e a equipe de pesquisa da Earthwatch estão identificando os condutores da degradação desses ambientes fundamentais. Usando de comum acordo sobre os limiares para a eutrofização, 1 mg de nitrato por litro e 0,1 mg de fosfato por litro, suas medições mostram que em média, 36% das medições de nitratos nos nossos corpos de água excedem o limite, e 27% das medições ultrapassam o limiar do fosfato. Estas mesmas medidas também sugerem que existe uma correlação importante entre as concentrações elevadas de fosfato e o aumento da ocorrência das florações das algas. Isto baseia-se na relação entre a proliferação de algas e nas concentrações de nutrientes que foram publicadas com base em dados de 13 cidades FreshWater Watch em 2015.

Olhando para 2016 e além, continuaremos a publicar os resultados dos estudos que baseiam-se nas medições e observações feitas por você. O manteremos informado e lhe enviaremos cópias e os links destas importantes contribuições para a comunidade científica e política internacional.

À medida que mais e mais pessoas estão descobrindo o FreshWater Watch e suas atividades da ciência cidadã, o programa está sendo usado como um exemplo de organizações privadas, públicas e ONG que trabalham em conjunto para melhorar o ambiente de que todos nós dependemos.

Aguardo ansiosamente notícias suas,

email [email protected]

www.thewaterhub.org/freshwaterwatch

Join our forums and upload your blogs at freshwaterwatch.thewaterhub.org/discuss

Observações das florações das algasMedições acima da média limiar (P-PO4)Medições acima da média limiar (N-NO3)

Percentage 0 10 20 70 60 50 40 30 80