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FOTOPERIODISMO Homero BergamaschiProfessor da UFRGS e bolsista do CNPq

1. Introduo O comprimento de um dia conhecido como fotoperodo e as respostas do desenvolvimento das plantas ao fotoperodo so chamadas fotoperiodismo.(Chang, 1974). H muito tempo, o homem tem conhecimento de respostas dos seres vivos variao na durao do dia. Muitas espcies, tanto vegetais como animais, tm o seu ciclo vital (ou pelo menos parte dele) regulado pelo fotoperodo. Tanto animais ditos inferiores (insetos, por exemplo) como muitos mamferos e outros animais de grande porte manifestam influncias variao na durao do dia. Porm, no estudo da fenologia vegetal que as atenes e as aplicaes do fotoperiodismo sempre foram maiores. Do ponto de vista agronmico, o maior interesse pelo estudo do fotoperiodismo decorre das respostas de muitas espcies importantes variao na durao do dia, no processo de induo ao florescimento, afetando fortemente todo o desenvolvimento fenolgico das plantas. A primeira publicao cientfica importante sobre fotoperiodismo foi feita por Garner & Allard (1920). Ainda em 1906, trabalhando com uma cultivar antiga de fumo Maryland Narrowleaf, eles observaram que algumas plantas cresceram a uma grande altura, produzindo um nmero extraordinrio de folhas. A partir dessas plantas, foi selecionada uma nova cultivar de fumo (Maryland Mammoth), de florescimento muito tardio. As plantas dessa nova cultivar eram mortas pelas geadas de outono, antes que o florescimento ocorresse. Porm, cultivadas em casa-de-vegetao no inverno, elas floresciam e produziam sementes normalmente. Eles tambm descobriram que, mesmo em casa-de-vegetao, as plantas no floresciam se o dia fosse prolongado por luz artificial. O estudo do gigantismo das plantas de fumo despertou o interesse para estudos mais aprofundados, tanto por aspectos relacionados produo de folhas como pelo interesse cientfico. Posteriormente, o mesmo comportamento foi observado em diversas outras cultivares de fumo. Mais tarde, vrias outras espcies vegetais foram estudadas por Garner e Allard. Eles descobriram que, alm do efeito sobre a formao de flores, frutos e sementes, o fotoperodo tem influncia sobre o crescimento vegetativo, a formao de bulbos e tubrculos, o processo de ramificao, a forma das folhas, a absciso e queda de folhas, a formao de pigmentos, pubescncia, desenvolvimento radicular, dormncia e morte de plantas. Verificou-se que fluxo de luz necessrio para provocar resposta fotoperidica to baixo que mesmo o crepsculo, antes do nascer-do-sol e depois do por-do-sol, efetivo (Chang, 1974). Em soja Garner e Allard (1920) observaram que, quando semeadas em pocas sucessivas, certas cultivares mostravam forte tendncia de florescer em datas aproximadas, independentemente de quando haviam sido semeadas. Em outras palavras, quanto mais tarde fosse feita a semeadura mais curto era o perodo de crescimento, at o

florescimento. Em trabalhos feitos com soja no inverno, utilizando diferentes nveis de aquecimento (em estufa) para avaliar o efeito da temperatura sobre a produo de leo, verificou-se que as plantas comeavam a florescer antes que tivessem atingido um crescimento normal, dificultando os estudos. Como no caso do fumo Mammoth, a poca do ano em que as plantas crescem tambm exerce grande influncia sobre o crescimento e a reproduo da soja. Na publicao original de Garner e Allard (1920), maiores destaques so dados aos trabalhos de campo com soja. Foram utilizadas quatro cultivares, com ciclos de maturao distintos: Mandarin (mais precoce), Peking, Tokyo e Biloxi (mais tardia). A Tabela 1 resume os principais eventos fenolgicos dos quatro gentipos, evidenciado as diferentes respostas variao na poca de cultivo. Tabela1. Efeito da data de semeadura sobre a data de florescimento de soja, cultivado no campo em Arligton - Virgina, 1909 (Garner e Allard, 1920). Mandarin Peking Tokyo Biloxi Emergnc Data Dias p/ Data Dias p/ Data Dias p/ Data Dias p/ ia flor. flor. flor. flor. flor. flor. flor. flor. plantulas 02/05 11/06 40 08/07 67 28/07 87 04/09 125 16/05 14/06 29 11/07 56 28/07 73 02/09 109 02/06 28/06 26 28/07 56 11/08 70 04/09 94 16/06 11/07 25 06/08 51 16/08 61 11/09 92 03/07 27/07 24 16/08 44 26/08 56 18/09 77 15/07 06/08 25 22/08 38 31/08 47 22/09 69 02/08 26/08 24 06/09 35 11/09 40 29/09 58 Variao Var. Var. Var. Var. de 92 dias 76 60 dias 45 dias 25 dias dias possvel observar que o efeito do fotoperodo maior na cultivar mais tardia (Biloxi), na qual o perodo entre a emergncia e o florescimento variou apenas em 25 dias, quando as datas de emergncia variaram em 92 dias. Isto devido a que, submetidas a dias progressivamente mais curtos, as plantas das ltimas pocas encurtam o crescimento vegetativo devido induo ao florescimento. A cultivar mais precoce (Mandarin) reduziu menos o perodo vegetativo, demonstrando uma dependncia menor ao fotoperodo do que as demais. 2. Variao astronmica do fotoperodo Sabe-se que a Terra realiza, no decurso de um ano, um giro ao redor do Sol, em um movimento denominado translao. No percurso que descreve, ao longo de sua rbita, o nosso planeta assume quatro posies caractersticas, que determinam o incio de cada estao do ano. Com uma inclinao de 2327 entre o plano equatorial e o plano da eclptica, o eixo de rotao da Terra mantm uma mesma posio em relao sua rbita, como mostra a Figura 1.

As posies da Terra que marcam o incio das quatro estaes do ano consistem em dois solstcios (de inverno e vero) e dois equincios, conforme a Tabela 2.

22/ 09

22/09

21/ 21 /12

21/ 21/06

21/ 21/03 Figura 1. Posies da Terra em ralao ao Sol, ao longo de um ano, nos dois solstcios (21 de junho e 21 de dezembro) e nos dois equincios (21 de maro e 22 de setembro.Em decorrncia da mudana de posio da Terra, em relao ao Sol, a incidncia da radiao solar sobre o nosso planeta altera seu ngulo, conforme sua posio descrita na Tabela 2, tambm representado na Figura 2. A variao no ngulo de incidncia da radiao solar, causada pela alterao da declinao solar, faz variar a quantidade de radiao que chega superficie, por duas razes: pela alterao no fluxo de energia incidente sobre cada unidade de superfcie e pela variao na durao dos dias, ao longo do ano. Neste momento, o interesse se prende variao na durao dos dias (fotoperodo) e seus efeitos sobre as plantas, em termos de processos fotomorfognicos. Conforme pode-se observar na Figura 2, a durao dos dias se altera na medida em que se modifica a posio do nosso Planeta em relao ao Sol. Nos dois equincios o fotoperodo tem 12h em todas as latitudes. Nos dois solstcios a durao do dia atinge seu valor extremo, sendo mximo no vero e mnimo no de inverno. No solstcio de vero do Hemisfrio Sul (21/12) o dia varia de 12h no Equador a 24h a partir do Crculo Polar Antrtico. Ao contrrio, no solstcio de inverno do Hemisfrio Sul (21/06) o fotoperodo vai de 12h no Equador noite de 24h a partir do Crculo Polar Antrtico. Para o

Hemisfrio Norte, invertem-se as estao inverno e vero, ou seja, h uma defasagem de seis meses. Tabela 2. Posies caractersticasdo Sol em relao Terra, no incio das quatro estaes do ano. Data 21/03 21/06 22/09 21/12 Posio Equincio de Solstcio de Inverno Equincio de Solstcio de Vero (Hemisf. Sul) Outono Primavera Sol perpendiEquador Trpico Cncer Equador Trp. Capricrnio cular sobre (latitude 0) (2327N) (latitude 0) (2327S) Sol Polos Crculo Polar Polos Crculo Polar tangenciando ntrtico (meio-dia rtico (meio-dia) Durao Dias com 12 h Dias longos no Dias com 12 h Dias longos no dos dias (todas latitudes) Hemisf. Norte (todas latitudes) Hemisf. Sul

Figura 2. Representao esquemtica (em plano) das posies caractersticas do Sol em relao Terra, no incio das quatro estaes do ano, em decorrncia da mudana na declinao solar. Portanto, na faixa do Equador (latitude de 0) o fotoperodo tem 12h em todo o ano. Nas demais regies, a durao do dia aumenta no vero, medida em que aumenta a latitude, e diminui no inverno pela mesma razo.

A Figura 3 representa a variao do fotoperodo, ao longo do ano, em latitudes entre 0 e 40, no Hemisfrio Sul. Observa-se, mais uma vez, que o fotoperodo igual a 12h em todas as latitudes, nos dois equincios (da decorre a sua denominao). Nos dois solstcios a durao do dia continua em 12h no Equador, mas aumenta com a latitude no vero e se reduz no inverno. Fotoperodo 40

14 h10

30 20 0 0 10 20

12 h

10 h

30 40

22/9

21/12

21/3

21/6

22/9

Figura 3. Variao anual do fotoperodo em diferentes latitudes do Hemisfrio Sul. Para a latitude de 30, por exemplo, que a latitude aproximada de Porto Alegre, o fotoperodo varia de cerca de 10h em 21 de junho a 14h em 21 de dezembro. Nas regies tropicais esta durao menor, enquanto que em maior latitude a amplitude da durao dos dias mais ampla. O efeito da latitude sobre a amplitude de variao do fotoperodo aumenta ainda mais, em grandes latitudes, em virtude da curvatura da Terra naquelas regies. 3. Classificao das plantas quanto ao fotoperiodismo No trabalho original de Garner & Allard (1920) o comprimento relativo do dia foi considerado como um fator de primeira importncia no desenvolvimento das plantas, particularmente na reproduo sexuada. As plantas foram agrupadas considerando que a entrada em florescimento e frutificao se d apenas quando o comprimento do dia est dentro de certos limites, fazendo com que essas fases sejam alcanadas apenas em certas pocas do ano. Por isso, algumas espcies e cultivares respondem a comprimentos

relativos de dias longos, enquanto outras respondem a dias curtos e, ainda outras so capazes de responder a todos os comprimentos de dia. Na ausncia do comprimento de dia favorvel para induzir a expresso dos processos reprodutivos, certas espcies podem continuar em crescimento vegetativo, de forma mais ou menos indefinida, levando ao fenmeno do gigantismo. Ao contrrio, sob influncia do fotoperodo adequado, o florescimento e a frutificao podem ser induzidos mais precocemente. Assim, certas cultivares ou espcies podem ser de maturao precoce ou tardia, dependendo simplesmente do comprimento do dia em que as plantas so expostas. Assim, a partir do trabalho de Garner e Allard (1920), surgiu a primeira classificao das plantas, quanto ao fotoperodo, agrupando-as em trs categorias. A denominao e o significado de cada grupo passou a ser os seguintes: Plantas de dias curtos (PDC). So as espcies que florescem em fotoperodos menores do que um mximo crtico. Plantas de dias longos (PDL). So as espcies que florescem em fotoperodos maiores do que um mnimo crtico. Plantas de dias neutros ou fotoneutras (PDN). So aquelas que florescem em uma ampla faixa de variao do fotoperodo. Allard (1938), citado por Chang (1974) acrescentou um quarto grupo, designado como Plantas intermedirias (IM). Estas florescem a um comprimento de dias de 12 a 14h, mas so inibidas reproduo tanto por fotoperodos acima com abaixo desta faixa. Na caracterizao da resposta fotoperidica das plantas de dias curtos e das plantas de dias longos, feita originalmente por Garner e Allard (1920) fica implcito que o fotoperodo uma condio indispensvel para que haja induo ao florescimento. Entretanto, estudos posteriores mostraram que muito varivel a intensidade de resposta das espcies alterao na durao do dia. Assim que, segundo Vince-Prue (1975), os dois grupos de plantas sensveis ao fotoperodo (PDC e PDL) foram subdivididos em espcies de resposta absoluta ou qualitativa e espcies de resposta facultativa ou quantitativa. O tipo de resposta absoluta ou qualitativa significa que a condio fotoperidica essencial induo floral, sem a qual as plantas no florescem. Ao contrrio, a resposta facultativa ou quantitativa subentende que a condio fotoperidica favorece a induo floral, mas no essencial. A Tabela 2 mostra uma srie de espcies vegetais e seus respectivos grupos, segundo o tipo de resposta fotoperidica. Ao lado das letras que caracterizam o tipo de resposta de cada espcie, apresentado o fotoperodo crtico necessrio para a induo ao florescimento (ltima coluna). Pode-se observar que o critrio de classificao das espcies ou grupos de cultivares, como de dias longos ou de dias curtos, no est relacionado magnitude do fotoperodo crtico exigido. A classificao segue a idia original, de que uma planta de dias curtos necessita fotoperodo de no mximo tantas horas. Em outras palavras, as PDC so induzidas a florescer se a durao do dias for igual

ou inferior quele valor crtico que caracteriza a espcie ou cultivar. Para plantas de dias longos deve-se considerar que elas florescero se o fotoperodo for igual ou superior ao mnimo crtico de sua espcie ou cultivar. Pode-se observar que, de um modo geral, plantas de dias longos so aquelas que crescem na estao fria, florescem durante a primavera, que quando a durao do fotoperodo se alonga, para encerrar o ciclo no final da primavera ou incio de vero. Por sua vez, as espcies de dias curtos so aquelas que iniciam o ciclo na primavera, florescem quando os dias j esto se encurtando, no vero ou incio de outono, e terminam o ciclo no outono ou incio de inverno. Assim, os cereais de inverno e outras espcies de estao fria so (em geral) plantas de dias longos. As espcies de primaveravero so de dias curtos ou fotoneutras. Dentre os cereais de inverno, bem como em outras culturas de clima temperado, h uma subdiviso de cultivares em dois grupos: de primavera e de inverno. Esta subdiviso no segue a exigncia fotoperidica. As cultivares de inverno exigem tratamento de vernalizao no incio do ciclo, portanto, exigem invernos rigorosos, enquanto que as de primavera no necessitam do tratamento de frio. Este aspecto melhor estudado no captulo que trata dos efeitos de baixas temperaturas sobre as culturas. Algumas espcies, graas grande diversidade de cultivares, tm mais de um tipo de exigncia fotoperidica. o caso da soja, do milho e do fumo. Considerando a grande expanso geogrfica destas espcies, o trabalho de melhoramento gentico conseguiu uma grande variabilidade de respostas, de maneira a adaptar os gentipos s disponibilidades de cada regio de cultivo. o caso da soja, que originria de latitudes elevadas, no norte da China e que, progressivamente foi se expandindo para regies mais prxima ao Equador. No Brasil, a soja comeou a se expandir pelo Rio Grande do Sul, em latitude mais prximas s originais, mas foi sendo transferida para outros estados da Regio Sul, da Regio Centro-Oeste e, atualmente, at por regies prximas ao Equador. Isto foi exigindo cada vez menor resposta a dias curtos, chegando-se a cultivares praticamente fotoneutras (insensveis ao fotoperodo). Usando informaes da Tabela 2 possvel formular alguns exemplos de aplicao do fotoperiodismo. Tomando o exemplo da espcie Andropogon gerardii, podese observar que ela tem um fotoperodo crtico de 18h, mas de resposta absoluta a dias curtos. Portanto, em qualquer regio do Brasil ela ter condies fotoperidicas para florescer em qualquer poca do ano, pois o fotoperodo no ultrapassa aquela durao, mesmo nas regies de maior latitude. Por outro lado, plantas de Agrostis palustris, que exigem fotoperodos de 16h ou mais, jamais tero condies naturais para florescer em qualquer regio do Brasil, onde esta durao nunca alcanada. O seu florescimento poder ser obtido atravs de suplementao de luz, alongando o fotoperodo atravs de iluminao artificial. Este o caso de outras espcies ou cultivares que, ao serem introduzidas no cumprem o ciclo, inviabilizando a sua propagao por sementes. Alguns gentipos mais tardios de trevo vermelho (Trifolium pratensis) florescem muito tardiamente no Rio Grande do Sul, devido exigncia de fotoperodo longo, comprometendo a sua ressemeadura e perenizao, quando ocorrem altas temperaturas e dficit hdrico no final da primavera ou incio do vero no final do ciclo do ciclo, sobretudo nas regies mais quentes. Tabela 3. Resposta fotoperidica de algumas espcies cultivadas (Chang, 1974).

Espcie GRAMNEAS Hordeum vulgare Andropogon gerardii Agrostis palustris Poa anua Poa pratensis Bromus inermis Andropogus virginicus Phalaris arundinacea Agrostis nebulosa Zea mays Festuca elatior Alopercus pratensis Avena sativa Dactilis glomerata Oryza sativa Secale cereale Lollium italicum Lollium perene Sorghum vulgare Holcus sudanensis Saccharum officinarum Phleum preatensis Phleum nodosum Triticum aestivum

Grupo cultivares primavera Inverno

Tipo de resposta l L S L N l L s L L N, S L L L L L N l l L L l s s, IM L L l L L

Fotoperodo crtico

>12h 16h >12,5h 12 a 14,5h >12,5h >13h >9h >9h >12h >12h

Vero Inverno Primavera Inverno

>11h >9h 12 a 14h >12h >14,5h >12h >10h

Primavera Inverno

Agropyron smithii LEGUMINOSAS E OUTRAS CULTURAS Medicago sativa Beta vulgaris Trifolium spp. Trifolium pratensis (trevo vermelho) Gossypium hirsutum Lespedeza stipulacea Glycine max Melilotus alba Vicia sativa Nicotiana tabacum

l L l L >12h N, s S