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FORÇA DE TRABALHO MIGRANTE: O CASO DE FORTALEZA
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ERLE CAVALCANTE MESQUITA
FORÇA DE TRABALHO MIGRANTE: O CASO DE FORTALEZA
FORTALEZA 2010
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Estudo realizado pelo Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT) ‐ Organização Social Decreto Estadual nº 25.019, de 03/07/98. Análise e Redação Erle Cavalcante Mesquita Apoio Técnico Arlete da Cunha de Oliveira Diorgia Maria Dias de Carvalho Rosaliane Macêdo Pinto Quezado Editoração eletrônica e layout Raquel Marques Almeida Rodrigues Revisão Regina Helena Moreira Campelo Normalização Bibliográfica Paula Pinheiro da Nóbrega
M578f Mesquita, Erle Cavalcante. Força de trabalho migrante: o caso de Fortaleza
/Erle Cavalcante Mesquita. – Fortaleza: IDT, 2010.
38 p. 1. Força de Trabalho. 2. Trabalho. I. Título. CDD: 331.11 813.1
Correspondência para: Instituto de Desenvolvimento do Trabalho ‐ IDT Av. da Universidade, 2596 ‐ Benfica CEP 60.020‐180 Fortaleza‐CE Fone: (085) 3101‐5500 Endereço eletrônico: [email protected]
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Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT)
Francisco de Assis Diniz Presidente
Antônio Gilvan Mendes de Oliveira Diretor de Promoção do Trabalho
Sônia Maria de Melo Viana Diretora Administrativo‐Financeiro
Leôncio José Bastos Macambira Júnior Diretor de Estudos e Pesquisas
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SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 9 1 A RECENTE DINÂMICA DO FLUXO MIGRATÓRIO PARA FORTALEZA ........................ 11 1.1 Características da População Migrante ............................................................... 15 2 O DESEMPREGO ENTRE OS MIGRANTES ................................................................. 19 2.1 Características pessoais ....................................................................................... 19 2.2 Características do desemprego ............................................................................ 22 3 O MIGRANTE TRABALHANDO: CARACTERÍSTICAS DA POPULAÇÃO OCUPADA ................................................................................................................. 27 3.1 A Trajetória Ocupacional ..................................................................................... 30 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 36 REFERÊNCIAS ............................................................................................................ 38
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INTRODUÇÃO
Ao longo do século XX, o município de Fortaleza atraiu fortes fluxos migratórios,
especialmente daqueles que fugiram dos flagelos das secas do semiárido cearense, seja
pela própria sobrevivência, seja por melhores condições de vida. Assim, a população local,
que era de pouco mais de 48,4 mil habitantes, em 1900, passara para 2,1 milhões de
pessoas, no ano 2000, cujas estimativas já apontam para uma população de 2,5 milhões
de habitantes, para os dias atuais, fato que demonstra claramente o crescimento
demográfico vivenciado pela Capital cearense ao longo desse período.1
Como se sabe, o fenômeno da migração é geralmente associado a diversas
motivações que levam as pessoas a se deslocarem (e residirem) de um lugar para o outro,
tais como: violência, fatores climáticos, conjuntura econômica e/ou de mercado de
trabalho, dentre outras. Notadamente, cabe enfatizar que boa parte da literatura traz
consigo o estigma de que os migrantes são, na maioria das vezes, pessoas em extrema
vulnerabilidade social ‐ conforme já mencionado o exemplo dos retirantes que marcaram
a história e a literatura regional ‐ ou que “tomam os empregos da população.” (PNUD,
2009).
Nessa perspectiva, o presente estudo investiga as características da população
migrante, na cidade de Fortaleza, especialmente às relacionadas à participação desse
segmento populacional no mercado de trabalho local. Ademais, o migrante representa “a
pessoa não‐natural do município e que nele reside a menos de dez anos”, conforme
definição do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Para isso, foram utilizados os acervos informacionais da Pesquisa Desemprego e
Subemprego, realizada pelo Sistema Nacional de Emprego (SINE/CE), e o Instituto de
Desenvolvimento do Trabalho (IDT), ao longo dos anos de 1990 e 2000, o que possibilitou
a investigação desse fenômeno, em longo prazo.2
Assim, foi possível amenizar possíveis influencias sazonais que ocorrem
especialmente no curto prazo, uma vez que o recorte temporal contemplou tanto o
1 Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 2 A Pesquisa Desemprego e Subemprego (PDS), foi realizada até meados de 2008, o que impossibilitou ter um dado mais atual. Ademais, para este último ano da série histórica, levou‐se em consideração os dados acumulados do primeiro semestre.
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período de retração econômica dos anos 1990, como de recuperação e de expansão da
economia nacional, no decênio seguinte.
Os anos 1990, por exemplo, chamados de “década perdida”, são um exemplo
claro dessa discussão, uma vez que fora um período extremamente desfavorável para o
emprego, principalmente com a reestruturação produtiva – tanto no setor público, como
no privado ‐, estabilização da economia nacional (Plano Real) e crise financeira
internacional, que assolou as finanças dos países emergentes (Rússia, Brasil, dentre
outros), entre os anos de 1998‐1999. Por outro lado, o período seguinte vem sendo
marcado por momentos de recuperação e de crescimento econômico, o que tem
proporcionado, dentre outros fatores, maiores oportunidades de trabalho e redução do
nível de desemprego, nas mais diversas localidades do Brasil.
Não obstante essa discussão macroeconômica, destaque‐se também que, a partir
de meados da década de 1990, o Estado do Ceará intensificou suas políticas de atração de
investimentos, sobretudo, através do Fundo de Desenvolvimento Industrial (FDI), cuja
vinda de unidades fabris para o estado fora um dos exemplos mais nítidos dessa ação.
Como se sabe, diversos municípios foram beneficiados com a instalação de novos
empreendimentos, tanto na área metropolitana, como na área não‐metropolitana.
Nesse sentido, os fluxos migratórios ocorridos dentro do próprio estado foram
novamente modificados para os mais variados municípios cearenses (Sobral, Juazeiro do
Norte, Crato, Horizonte, dentre outros), o que, em grande medida, influenciou a pressão
demográfica exercida pelos migrantes na Capital, conforme se apresenta a seguir.
Para esta análise, utilizaram‐se as informações do período entre 1992 e 2008, cujo
intervalo contemplou os mais diversos cenários econômicos, como já mencionado. Assim,
a exposição deste estudo está centrada em três partes, além desta apresentação e das
considerações finais à guisa de reflexão. Na primeira, avalia‐se a recente dinâmica do
fluxo migratório para o município de Fortaleza, especialmente dimensionando a
participação dos migrantes na população local, enquanto os capítulos seguintes avaliam a
presença desse segmento populacional na composição da força de trabalho local, tanto
entre os ocupados (Capítulo 2), como entre os desempregados (Capítulo 3),
proporcionando ao leitor uma ampla radiografia da força de trabalho que migrou para a
Capital cearense.
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1 A RECENTE DINÂMICA DO FLUXO MIGRATÓRIO PARA FORTALEZA
Desde meados dos anos 1990, o Estado do Ceará desenvolveu uma política de
atração de investimentos, especialmente para que fosse possível a descentralização da
economia estadual para o Interior. De acordo com essa política, cuja melhor
representação foi a vinda de unidades fabris, o estado possibilitaria tanto um maior
dinamismo na economia interiorana como diminuiria a forte concentração econômica e
demográfica existente na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF). Entretanto, ao longo
dos últimos anos foi percebida uma maior concentração da economia e da geração de
postos de trabalho na área metropolitana, o que demonstra as dificuldades de se mudar
uma determinada estrutura econômica. Ademais,
Em termos muito gerais, o processo de crescimento econômico poderá necessitar de uma concentração mais elevada de elementos mais fortes da economia: investimentos em regiões com melhores infra‐estruturas, em populações com melhor instrução e habilidades, etc… (BAR‐EL, 2005, p. 14).
Apesar dessa realidade, cabe chamar atenção que a pressão demográfica exercida
pela migração para a Capital cearense vem diminuindo, uma vez que a participação dos
“migrantes”, que era de 11,3% (1992) do total da população local, caiu para 7,8%, em
2000, e atingiu o patamar de 6,4% dos residentes, em 2008. (Gráfico 1). Além disso,
mesmo considerando o “efeito estatístico” de se obter esta representação através de
uma maior base populacional (estimada em 2,5 milhões de pessoas), percebe‐se uma
tendência de diminuição da migração para Fortaleza, visto também o próprio crescimento
populacional de outros municípios cearenses. Na Capital, foram estimadas 163,5 mil
pessoas na condição de migrantes, em 2008.
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Gráfico 1 – Estimativas e Participação dos Migrantes na População Total (em %) – Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
O Gráfico 2 corrobora nessa perspectiva, uma vez que diversos municípios do
estado tiveram um forte crescimento demográfico, especialmente ao longo dos anos
1990, como o exemplo dos municípios com o maior número de postos de trabalho
formalizados no Ceará.3 Registre‐se, no momento, que a pressão demográfica herdada do
passado também proporcionou a consolidação de “novos” municípios na própria área
metropolitana de Fortaleza, como os casos de Maracanaú (1983), Eusébio (1987) e
Horizonte (1987), que se emanciparam em meados dos 1980. A constituição destes
municípios ocorreu, pelo menos, uma década depois da criação formal da RMF.4
Ademais,
pelo intenso processo de migração do interior para a capital, muitas vezes diretamente proveniente das áreas rurais. (ARAÚJO; CARLEIAL, 2001, p. 2).
Na literatura local, encontram‐se diversas opiniões questionando a criação da RMF, argumentando que tal região ainda não estaria plenamente constituída, portanto, não justificando a força de um decreto nesse sentido. Entretanto, esses mesmos estudiosos reconheciam a existência de uma aglomeração urbana, sobre a forma de “macrocefalia”, determinada essencialmente
3 Utilizaram‐se por exemplo aqueles municípios com estoque (celetistas e estatutários) superior a dez mil empregos formais. 4 A Lei Complementar nº14/73 instituiu a Região Metropolitana de Fortaleza através dos municípios de Fortaleza, Caucaia, Maranguape, Pacatuba e Aquiraz. Mais recentemente, foram incluídos os municípios de Cascavel e Pindoretama na Região Metropolitana de Fortaleza.
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Metropolitano
Não‐ metropolitano
Gráfico 2 – Taxa de Crescimento Geométrico, segundo Nível Geográfico – Ceará – 1970 – 2007 Fonte: Elaboração Própria do Autor a partir dos Dados dos Censos Demográficos de 1970‐2000 e Contagem da População 2007 do IBGE.
Essa pressão da migração advinda das áreas rurais do estado para a Capital é
possível de ser visualizada através da Tabela 1, uma vez que quatro em cada dez
migrantes advinham dessas localidades. Recentemente, esta participação caiu para 1/5
da migração para Fortaleza.
Tabela 1 – População Migrante, segundo a Origem ‐ Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Origem 1992 2000 2008
Zona rural do estado 42.9 25.0 20.7 Zona urbana de outros municípios do estado 27.7 40.2 37.0 Região Metropolitana de Fortaleza 2.6 4.2 9.5 Outro estado ou outro país 26.8 30.6 32.8 Total 100.0 100.0 100.0
Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
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Duarte e Fusco (2008) afirmam que existe uma vasta literatura – tanto nacional,
como internacional – sobre as motivações que levam as pessoas a deixarem seus lugares
de origem para outras localidades, cujos “fatores de expulsão” (desemprego, baixos
rendimentos, secas, dentre outros) são apresentados como as causas mais evidentes.
Conforme é bastante conhecido, o flagelo das secas tem sido uma das grandes
motivações para o êxodo rural de boa parte dos nordestinos, cuja saga já fora bastante
retratada por diversas obras literárias.5 Ademais, cabe mencionar que o tempo médio de
residência dos migrantes em Fortaleza é de quatro anos.
Por outro lado, é possível perceber também que, ainda que a pressão da migração
venha diminuindo, elevou‐se a participação das pessoas advindas de outras áreas urbanas
do Ceará, como também de outros estados e países, fato que demonstra claramente uma
tendência de migração “urbana/urbana”. A participação de pessoas chegadas de outros
estados da federação e de outros países já representa 1/3 dos migrantes que residem em
Fortaleza.
A descentralização dos parques produtivos e da economia nacional, que marcou o
contexto da chamada “guerra fiscal nos anos 1990”, associada ao menor ritmo de
crescimento econômico das regiões que marcaram o protagonismo da industrialização
deste país, proporcionou uma reversão de tendência, uma vez que regiões como Centro‐
Oeste, Norte e Nordeste passaram a ser áreas de grande atratividade de populações
migrantes, visto o ritmo de crescimento econômico mais expressivo dessas regiões, nos
últimos anos. (POCHMANN, 2007, 2008).
Cabe também mencionar que a Capital cearense tem sido considerada como um
dos destinos turísticos mais procurados no Brasil, o que, em grande medida, também
contribui para a atração de migrantes ao município, uma vez que muitos visitantes
acabam, posteriormente, fixando residência na cidade. Para se ter uma ideia dessa
dimensão ‐ apesar de nem todo estrangeiro ser “turista”‐, havia 8,6 mil estrangeiros
residindo legalmente em Fortaleza, de acordo com informações da Polícia Federal, em
2008. (MIGRAÇÃO..., 2008).
5 Obras como O Quinze de Raquel de Queiroz, Vidas Secas de Graciliano Ramos, Grande Sertão Veredas de Guimarães Rosa, dentre outras.
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Com efeito, esse conjunto de informações dá um breve panorama sobre a recente
evolução da migração para Fortaleza, cujas características dessa população se
apresentam a seguir.
1.1 Características da População Migrante
Uma vez tratado do fluxo migratório para o município de Fortaleza, pode‐se
avançar para uma identificação das principais características dessa população.
Inicialmente, cabe destacar que as mulheres representam mais da metade da população
migrante (Gráfico 3), embora esta maior participação feminina não seja refletida nos
indicadores de ocupação e desemprego, conforme se vê nos capítulos seguintes, fato que
reforça a assertiva de que as mulheres ainda enfrentam maiores dificuldades de inserção
no mercado de trabalho, independentemente da condição de migrante ou não‐migrante.
Gráfico 3 – População Migrante, segundo o Sexo ‐ Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Outro dado importante é que ainda existe uma maior concentração de migrantes
entre as pessoas com idade até 29 anos, mesmo com o crescimento da participação de
pessoas com mais idade, nos últimos anos. (Gráfico 4). O que motiva a migração dos mais
jovens? Uma possível explicação ainda estaria centrada nas maiores oportunidades de
escolarização e de trabalho encontradas na Capital, mesmo com as iniciativas de
descentralização que ocorreram em ambos os casos, como o exemplo das indústrias,
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escolas técnicas e faculdades, dentre outras. Apesar dessa realidade, é reconhecido que
praticamente metade do Produto Interno Bruto (PIB) e dos empregos formais do estado
ainda está concentrada em Fortaleza, o que, em grande medida, contribui para esse fluxo
migratório.
Gráfico 4 – População Migrante, segundo a Faixa Etária – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Essas informações são relevantes, pois apesar da redução do fluxo migratório nos
últimos anos, o número de migrantes ainda é bastante elevado, o que, em grande parte,
amplia a demanda por oportunidades de trabalho, serviços de saúde e educação,
habitação e infraestrutura, dentre outros. Três estudos realizados pelo Instituto de
Desenvolvimento do Trabalho (IDT) possibilitam uma maior compreensão desse
fenômeno da migração, especialmente entre os mais jovens.
1. A taxa de desemprego dos jovens mais escolarizados é bem elevada em
relação àqueles com menor nível de instrução formal ‐ tal como verificado nos
municípios de Quixadá, Crateús, Crato e Sobral, o que, em grande medida,
sinaliza as dificuldades dos mercados de trabalhos locais em absorver esse tipo
de mão de obra. (IDT, 2006).
2. As políticas de atração de investimento também vêm produzindo alterações na
mobilidade ocupacional dos jovens do Interior, uma vez que, por exemplo,
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diminuiu drasticamente a participação dos mais jovens na ocupação do
trabalho doméstico, na Capital. (IDT, 2007).
3. Apesar das iniciativas de descentralização da economia para o Interior, a
geração de empregos formais ainda está bastante concentrada na Região
Metropolitana de Fortaleza, como o exemplo do ano de 2008, cujo nível
geográfico concentrou 90% do emprego formal do Ceará. (IDT, 2009).
Isto ocorre por ainda existir um maior dinamismo da economia cearense na
Capital, conforme já mencionado, de concentração dos estabelecimentos, dos empregos
e do Produto Interno Bruto (PIB) estadual, o que, em sua maioria, propicia atratividade de
populações migrantes. Como já citado, o perfil dessa população está cada vez mais
relacionado a fluxos migratórios exógenos do estado do que de mobilidade de sua
população interna, como evidenciado nas últimas décadas. Tal realidade pode também
ser compreendida pelo maior dinamismo econômico de outros municípios cearenses,
especialmente os beneficiados pelas políticas de atração de investimentos, que do
mesmo modo absorveram as migrações ocorridas dentro do próprio Estado do Ceará.
Por sua vez, cabe destacar que houve, ao longo dos últimos anos, a melhoria do
nível de escolaridade da população que vem migrando para Fortaleza, sobretudo em
níveis educacionais mais elevados. Mesmo com esta melhoria, cabe salientar que mais da
metade dos migrantes ainda possuem, no máximo, o ensino fundamental, o que ainda
mostra o baixo nível de escolarização da população que já havia migrado para o
município. (Gráfico 5).
Por fim, cabe ressaltar que a menor participação dos migrantes na população
(total) de Fortaleza também influenciou a composição da força de trabalho local, tanto
entre os ocupados, como entre os desempregados, cujos segmentos populacionais são
investigados detalhadamente nos capítulos seguintes.
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Gráfico 5 – População Migrante, segundo o Grau de Instrução – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
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2 O DESEMPREGO ENTRE OS MIGRANTES
A análise da inserção dos migrantes no mercado de trabalho local requer a
compreensão de que a menor presença desse segmento na população total, em grande
medida, foi refletida nos indicadores de ocupação e desemprego. Tal realidade pôde ser
observada pela menor incidência desse segmento na População Economicamente Ativa
(PEA), observada tanto entre os ocupados, como entre os desempregados. (Gráfico 6).
Gráfico 6 – Participação dos Migrantes nas Populações Economicamente Ativa, Ocupada e Desempregada (em %) – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Entre os indicadores mencionados, percebe‐se que essa redução foi menos
suscetível entre os desempregados, fato que sinaliza que uma parcela significativa dessa
população ainda encontra dificuldades em conseguir trabalho. Em 2008, a Capital
cearense agregava 11,7 mil migrantes na situação de desemprego, ou 9,7% do total de
desempregados, cuja população é investigada nos tópicos seguintes.
2.1 Características pessoais
A exemplo do que ocorre para o conjunto de migrantes na composição da
população total, as mulheres representam a maioria entre os desempregados. Como se
sabe, elas ainda enfrentam maiores dificuldades de inserção no mercado de trabalho,
visto que representam mais da metade dos desempregados nos mais diversos mercados
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de trabalho locais. Entre os migrantes que residem em Fortaleza, a presença feminina
atinge 60% da população desempregada (Gráfico 7), ou seja, situação praticamente
análoga ao que acontece com a população não‐migrante.
Gráfico 7 – Migrante Desempregado, segundo o Sexo – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Para a compreensão dessa maior incidência feminina entre os desempregados,
investigou‐se o grau de parentesco dessas pessoas, nos domicílios pesquisados. É
importante notar que os maiores contingentes de migrantes desempregados são
compostos por filhos (as) e de outros parentes (genro, nora, cunhado (a), dentre outros),
fato que evidencia claramente que diversos membros do núcleo familiar – e que residem
no mesmo domicílio – estão se lançando no mercado de trabalho local. (Tabela 2).
Tabela 2 – Migrante Desempregado, segundo o Grau de Parentesco – Fortaleza – 1992, 2000, 2008
Parentesco 1992 2000 2008 Chefe de família 22,9 26,0 18,2 Cônjuge 10,5 15,1 17,6 Filho 37,8 26,4 31,3 Outros parentes 27,0 28,9 29,9 Demais membros 1,8 3,6 3,0 Total 100,0 100,0 100,0
Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Essa realidade também pode ser observada pela maior inserção dos trabalhadores
mais jovens na situação de desemprego, visto que três em cada quatro migrantes
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desempregados estão na faixa etária de 15 a 29 anos. (Tabela 3). Como consequência,
percebe‐se que o perfil predominante dos migrantes na situação de desemprego, em
Fortaleza, é composto por trabalhadores jovens, especialmente por mulheres, cujos
indivíduos, apesar de não estarem chefiando suas famílias, estão se lançando no mercado
de trabalho, seja pela busca de autonomia, seja para auxiliar a composição da renda
familiar.
Tabela 3 ‐ Migrante Desempregado, segundo a Faixa Etária – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Faixa etária 1992 2000 2008 10|‐|14 1.7 0.8 0.4 15|‐|19 22.6 17.2 22.0 20|‐|29 49.1 49.3 52.4 30|‐|39 16.0 21.3 16.3 40|‐|49 6.4 7.6 5.1 >=50 4.2 3.8 3.8 Total 100.0 100.0 100.0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Embora não fosse possível – através do banco de dados existentes ‐ ter
investigado as motivações que levaram os migrantes a fixarem residência em Fortaleza, é
reconhecido que boa parte desse contingente populacional tenha vindo a procura de
melhores condições de vida, tais como: oportunidades de trabalho, escolarização, dentre
outras. Um dado que corrobora com essa assertiva é que a maior parcela dos migrantes
que estão submetidos ao desemprego, no município, é oriunda de fluxos migratórios
internos do Ceará, tanto de suas áreas urbanas, como do meio rural. (Tabela 4).
Tabela 4 – Migrante Desempregado, segundo a Origem – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008 Origem 1992 2000 2008
Zona rural do estado 41,1 23,4 20,6 Zonas urbanas do estado 23,7 34,6 35,5 Região Metropolitana de Fortaleza 2,9 4,4 6,5 Outro estado ou país 32,3 37,6 37,4 Total 100,0 100,0 100,0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Não obstante essa realidade, atente‐se que a maior incidência de migrantes
advindos de outros estados da federação (e em menor proporção de outros países)
também se refletiu na população desempregada, visto que 37,4% dos migrantes
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desempregados vinham dessas localidades, fato que, em grande medida, sinaliza a
atratividade do mercado de trabalho local em termos regional e nacional.
Como se sabe, o ritmo de crescimento econômico mais acelerado de regiões como
Centro‐Oeste, Norte e Nordeste, nos últimos anos, vem proporcionando maiores fluxos
migratórios para os seus estados, o que revela uma reversão de tendência, haja vista que
boa parte de suas populações, tradicionalmente, migravam para outras regiões do país,
especialmente para o Sul e Sudeste.6
No Ceará, cabe chamar atenção que o perfil educacional dos migrantes
desempregados, atualmente, é bem diferente de outrora, especialmente composta por
trabalhadores de ensino médio e superior. (Tabela 5). Com efeito, cabe ressaltar que
houve, ao longo do período investigado, melhorias significativas no sistema educacional
do país (universalização, programas especiais, dentre outros), o que, em grande medida,
elevou o nível de escolaridade da força de trabalho, mesmo com as evidências do
convívio de elevados índices de analfabetismo funcional ainda existentes no país.
Tabela 5 – Migrante Desempregado, segundo o Grau de Instrução – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Instrução 1992 2000 2008 Analfabeto/alfabetizado 15,5 6,5 1,6 Fundamental 59,0 53,1 27,3 Médio 20,6 35,7 60,6 Superior 4,9 4,7 10,5 Total 100,0 100,0 100,0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
2.2 Características do Desemprego
O olhar sobre as características do desemprego entre a população migrante
evidencia que a maior parcela destas pessoas possui experiência de trabalho anterior
(78,9%), cujas vivências advinham, em sua maioria, de empregos particulares (70,6%),
seguidas do emprego doméstico (17,4%), do trabalho autônomo (8,4%), dentre outras
modalidades. Como se sabe, uma característica do mercado de trabalho brasileiro é a
elevada rotatividade dos postos de trabalho, o que, sobremaneira, proporciona a
6 No caso do Ceará, destacam‐se os fluxos migratórios de cearenses para a Região Norte no ciclo da borracha entre 1879 e 1912. Já a partir de meados do século XX, cabe mencionar a fase do nacional desenvolvimentismo que propiciou a construção de Brasília e a maior industrialização da Região Sudeste, que atraíram vários fluxos migratórios para estas localidades.
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constante movimentação de “entrada” e “saída” dos trabalhadores do mercado de
trabalho, ora como ocupado, ora como desempregado. (Tabelas 6 e 7).
Tabela 6 – Migrante Desempregado, segundo a Procura pelo Primeiro Emprego – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Primeiro emprego 1992 2000 2008 Sim 21.4 17.1 21.1 Não 78.6 82.9 78.9 Total 100.0 100.0 100.0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Tabela 7 – Migrante Desempregado, segundo a Função no Trabalho Anterior – Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Função 1992 2000 2008 Empregado público 3.5 4.7 3.1 Empregado doméstico 6.9 12.0 17.4 Empregado particular 79.8 71.7 70.6 Autônomo 9.8 9.3 8.4 Outros ‐ 2.5 0.5 Total 100,0 100,0 100,0
Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Contudo, análogo ao que ocorre com o total da população desempregada, é
reconhecido que a educação e a experiência profissional continuam sendo cada vez mais
necessárias, embora não sejam mais suficientes para garantir o acesso (ou manutenção)
no mercado de trabalho. Como se constata, tal realidade advém da assimetria existente
entre a oferta de vagas e o tamanho da força de trabalho existente (o exército de reserva,
nos termos marxistas), dados os próprios avanços tecnológicos, os ganhos de
produtividade, a terceirização (em muitos casos chamados de “quarteirização”), dentre
outros fenômenos.
Dessa maneira, é interessante perceber quais foram as estratégias de procura por
trabalho empreendidas pelos migrantes desempregados, em Fortaleza. A Tabela 8
demonstra que a ida direta às empresas é a modalidade mais frequente (61,5%), seguida
da consulta a amigos e parentes (18,2%), a busca das Unidades do SINE/IDT (14,4%) ou de
outras agências de emprego (5,4%), dentre outras iniciativas.
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Tabela 8 – Migrante Desempregado, segundo as Formas de Procura por Trabalho – Fortaleza – 1992, 2000, 2008
Formas de procura 1992 2000 2008 Procurou o SINE/IDT 1.0 13.4 14.0 Consultou outras agências de emprego 3.8 2.0 5.4 Consultou empregadores 90.8 69.1 61.5 Consultou parentes e amigos 1.7 11.6 18.2 Outros 2.7 3.9 0.9 Total 100.0 100.0 100.0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Essas iniciativas parecem extremamente interessantes e merecem ser discutidas
mais detalhadamente. Em primeiro lugar, deve‐se reconhecer que existem diversas
possibilidades de procura por trabalho nos mercados de trabalho mais dinâmicos, cuja
busca direta às empresas é uma das modalidades mais frequentes, dado o próprio
número de opções disponíveis. Outra questão que merece ser considerada é que, apesar
das menores evidências de laços de solidariedade ou de conhecimento do próprio
mercado de trabalho local pelos migrantes, os “círculos de amizades” ‐ ou networking,
nos termos dos analistas de mercado‐, configuram‐se como outra opção bastante
utilizada por essa população. É importante assinalar também o papel das agências de
emprego, especialmente o Sistema Público de Emprego ‐ que tem como concepção evitar
este desgaste dos trabalhadores de saírem de “porta em porta” atrás de emprego‐, que
busca conciliar a “oferta” e a “demanda” por trabalho num único local, ou seja, realizando
todas as etapas de intermediação de mão de obra (cadastramento, recrutamento, seleção
e encaminhamento).
Nesse caso, é possível perceber, através dos dados apresentados, que a utilização
dos serviços do Sistema Público de Emprego era uma alternativa pouco utilizada pela
população migrante, no início dos anos 1990, mas que atualmente já atinge 14% desses
desempregados, fato que evidencia claramente a maior participação das agências
públicas de emprego como alternativa de colocação profissional por esta população.
Outra questão importante explorada neste estudo diz respeito à pergunta, feita
aos indivíduos que, estavam submetidos ao desemprego, sobre as causas que
dificultavam a entrada deles no mercado de trabalho: 33,4% dos respondentes atribuíram
que sua qualificação/experiência não atendia aos pré‐requisitos desejados, 14,2% falaram
da busca pelo primeiro emprego e falta de experiência anterior; 13,1%, disseram que
estavam aguardando resposta ou serem chamados para trabalhar; 12,7% afirmaram que
25
começaram a procurar trabalho há poucos dias, dentre outras motivações. A Tabela 9
sintetiza as principais motivações atribuídas pelos migrantes desempregados.
Tabela 9 – Migrante Desempregado, segundo o Motivo de Estar sem Trabalhar ‐ Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Motivos 1992 2000 2008Procura seu primeiro trabalho e não tem experiência de trabalhos anteriores 12.9 8.3 14.2 Sua qualificação/experiência não atende aos pré‐requisitos desejados 7.0 32.6 33.4 Encontra‐se desestimulado para procurar trabalho .. 0.8 1.6 Não consegue financiamento para abrir um negócio próprio 0.6 0.8 0.5 Não encontra trabalho com carteira assinada 0.3 5.7 9.9 Devido a preconceitos diversos 0.3 2.9 3.7 Devido à idade 1.4 4.3 4.2 Devido aos baixos salários pagos e/ou ao tipo de trabalho encontrado 2.2 6.8 4.9 Aguardando respostas ou ser chamado para trabalhar .. 13.1 13.1Começou a procurar trabalho há poucos dias .. 9.2 12.7Está sem trabalhar há muito tempo .. 1.5 0.3 Não existem vagas 69.7 .. .. Outros 5.6 14.0 1.5 Total 100.0 100.0 100.0Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Pode‐se perceber que as motivações mencionadas pelos migrantes na situação de
desemprego não diferem das apresentadas pelo total da população desempregada de
Fortaleza, cuja falta de qualificação e/ou experiência profissional são apontadas como as
principais barreiras para o acesso ao mercado de trabalho local. Em grande medida, cabe
chamar atenção que os desempregados têm mencionado cada vez mais à dimensão
individual de não conseguir um trabalho (experiência e qualificação, por exemplo) do que
a fatores exógenos, tais como questões macroeconômicas, que, muitas vezes, ampliam
ou restringem as oportunidades de trabalho.
Tal realidade pôde ser observada no início dos anos 1990, cujo período fora
extremamente desfavorável ao emprego, com a reestruturação das empresas e a
abertura e estabilização da economia nacional, visto que sete em cada dez migrantes, que
vivenciaram este período, atribuíram a ausência de vagas como a principal motivação do
desemprego. Nota‐se assim uma clara relação de estigmatização e de alteridade de
atribuição do problema para o “outro”, nesse caso, via de regra, o “mercado”, a
“economia”, dentre outros, não tomando para si a excessiva concepção individualizante
que se tem vivenciado nos últimos tempos: “não estou preparado”, “não tenho
26
experiência”, dentre outras colocações. É nessa perspectiva que o próximo capítulo
investiga os migrantes que conseguiram oportunidade de trabalho, em Fortaleza, cujas
características pessoais e ocupacionais são apresentadas a seguir.
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3 O MIGRANTE TRABALHANDO: CARACTERÍSTICAS DA POPULAÇÃO OCUPADA
Em 2008, estimou‐se que 70,5 mil migrantes ocupavam o mercado de trabalho na
Capital cearense, contingente que equivalia a 7,5% do total de sua população ocupada.
Análogo ao que acontece com esta população, nota‐se que a maior parcela dos migrantes
na condição de ocupados é do sexo masculino (54,7%), embora os índices de participação
feminina venham aumentando ‐ de 42,8% (1992) para 45,3% (2008) – nos últimos anos.
(Gráfico 8).
Gráfico 8 – Migrante Ocupado por Sexo – Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
No que se refere ao perfil etário, o mercado de trabalho local apresentou
pequenas variações com relação aos migrantes ocupados, visto que a maior parcela desta
população ainda está concentrada em faixas etárias intermediárias, entre 20 e 39 anos
(67,1%), mesmo com a maior inserção das pessoas de 40 anos ou mais, entre os
ocupados, passando de 16,9%, no inicio dos anos 1990, para 23,6%, em 2008. (Gráfico 9).
28
Gráfico 9 – Migrante Ocupado por Faixa Etária – Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
A pesquisa revela também que boa parte dos migrantes, que possuem ocupação,
chefia suas famílias (40,5%), o que, em grande medida, sinaliza a importância de seu
rendimento para a manutenção familiar. (Gráfico 10). Não obstante essa realidade,
destaque‐se que outros membros da unidade domiciliar também estão engajados no
mercado de trabalho local, na condição de ocupados, tais como: filhos (as), genro, nora,
dentre outros, seja para o auxílio da renda familiar, seja pela busca da própria autonomia.
Nessa perspectiva, cabe chamar atenção para o ingresso de outros membros da
família que ocorre, muitas vezes, de forma precária e antecipada no mercado de trabalho,
especialmente entre os mais jovens e mais pobres, uma vez que essa situação, em grande
medida, ocasiona evasão escolar (ou mesmo perda de rendimento do aprendizado),
constituição precoce de famílias, dentre outras situações que acabam prejudicando a
trajetória ocupacional dessas pessoas, no longo prazo. (POCHMANN, 2000).
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Gráfico 10 – Migrante Ocupado por Grau de Parentesco – Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Este é um fato preocupante, uma vez que o mercado de trabalho vem
demandando por trabalhadores cada vez mais escolarizados, cuja boa parte das vagas
ofertadas vem exigindo, no mínimo, o ensino médio. Entre os migrantes, essa tendência
também é observada, haja vista a maior inserção dos mais escolarizados entre os
ocupados, tanto de ensino médio, como de ensino superior, conforme evidenciado no
Gráfico 11.
Gráfico 11 – Migrante Ocupado por Grau de Instrução – Fortaleza – 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
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Em síntese, percebe‐se que o perfil predominante dos migrantes ocupados é
bastante similar ao da clientela que, de uma forma geral, utiliza os serviços do Sistema
Público de Emprego no país, ou seja, população masculina, com ensino médio e com faixa
de idade entre 20 e 39 anos. Dadas estas semelhanças, nota‐se que o programa Sistema
Nacional de Emprego (SINE) representa uma alternativa viável para a (re)colocação
profissional dessa força de trabalho.
3.1 A Trajetória Ocupacional
Inicialmente, cabe chamar atenção que três em cada quatro migrantes ocupados
já possuíam experiência de trabalho, mesmo que a maioria dessas oportunidades tenha
ocorrido no setor informal da economia. Nesse percurso retrospectivo, destaque‐se que
boa parte dos entrevistados disse que os antigos empregadores se recusaram a assinar a
carteira de trabalho (37,5%), seguido daqueles que buscaram desempenhar atividades
autônomas (16,0%), fato que, em grande medida, sinaliza que a migração pode estar
realmente associada à busca de melhores condições de trabalho. (Tabelas 10 e 11).
Tabela 10 – Migrante Ocupado, segundo a Condição do Primeiro Trabalho – Fortaleza – 1992, 2000, 2008
Primeiro trabalho 1992 2000 2008 Sim ND 30,0 24,9 Não ND 70,0 75,1 Total ‐‐ 100,0 100,0
Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT. ND – Não Disponível.
Dentro desse contexto, é importante enfatizar que a informalização das relações
de trabalho ainda é uma prática bastante latente, mesmo com os esforços de fiscalização
empreendidos pelas instituições competentes, uma vez que a recusa pela formalização
dos vínculos de trabalho cresceu nos últimos anos ‐ de 32,5% (2000) para 37,5% (2008)‐,
segundo relatos dos próprios migrantes que tiveram experiências anteriores de trabalho.
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Tabela 11 – Migrante com Carteira de Trabalho Assinada, segundo o Trabalho Anterior – Fortaleza – 1992, 2000, 2008
Motivos 1992 2000 2008Sim ND 46,1 41,7Não, o empregador recusou‐se a assinar a carteira ND 32,5 37,5Não, autônomo ND 12,8 16,0Não, o empregado optou trabalhar sem carteira ND 3,0 2,3 Não, funcionário público estatutário ND 2,2 0,9 Não, trabalhador familiar ND 1,3 0,7 Não, por outros motivos ND 2,1 0,9 Total .. 100,0 100,0Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT. ND – Não Disponível.
Por sua vez, o Gráfico 12 reforça essa assertiva, uma vez que uma parcela
expressiva desses ocupados ainda está no setor informal da economia (45,1%), no
exercício do trabalho atual.
Gráfico 12 – Migrante Ocupado, segundo a Condição de Carteira Assinada no Trabalho Atual ‐ Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Notadamente, tal condição tem proporcionado a estes trabalhadores um elevado
grau de vulnerabilidade aos direitos trabalhistas e previdenciários, haja vista que mais da
metade desses ocupados não contribuem para a Previdência (57,9%) e, no desempenho
de suas atividades, não recebem nenhum benefício adicional (60,8%), tais como vales
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transportes e alimentação, assistência médica e/ou odontológica, dentre outros. (Gráfico
13 e Tabela 12).
Gráfico 13 – Migrante Ocupado, segundo a Contribuição para o INSS ou Outras Instituições Previdenciárias ‐ Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Tabela 12 – Migrante Ocupado, segundo Outros Benefícios e Vantagens Recebidos ‐ Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Benefícios 1992 2000 2008 Nenhum 76.4 63.6 60.8 Vale transporte ou sistema de condução 15.7 18.5 14.1 Vale refeição ou cesta de alimentos 2.3 5.8 5.9 Vale transporte e vale refeição (ou cesta de alimento) ‐ 8.0 17.2 Vale transporte e assistência médico‐odontológica ‐ 0.8 0.5 Vale refeição e assistência médico‐odontológica ‐ 1.0 1.3 Outros 5.6 2.3 0.2 Total 100,0 100,0 100,0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Como estes trabalhadores não contribuem para o sistema previdenciário,
necessitam estar continuamente ativos no mercado de trabalho para constituição de seus
rendimentos, uma vez que estão desprotegidos quanto a períodos de enfermidades,
acidentes de trabalho e, até mesmo, de atingir uma aposentadoria.
Dessa forma, embora seja perceptível a significativa parcela de migrantes que
atuam em atividades autônomas, conforme já mencionado, buscou‐se investigar mais
detalhadamente a posição da ocupação entre estes trabalhadores. Mais da metade disse
que eram empregados particulares (56,6%), seguido dos autônomos (23,5%), empregados
domésticos (13,6%), empregados públicos (3,8%), dentre outras modalidades. (Tabela
33
13). Todavia, independentemente da posição na ocupação, a maioria dos entrevistados
afirmou que trabalhava em tempo integral (89,5%) e, em menor medida, exercia suas
atividades em jornadas parciais, ou seja, de até seis horas diárias (8,5%), conforme
evidencia o Gráfico 14.
Tabela 13 – Migrante Ocupado, segundo o Trabalho Principal ‐ Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Trabalho principal 1992 2000 2008Empregado público 6.9 4.7 3.8 Empregado doméstico 15.2 16.4 13.6Empregado particular 51.2 53.1 56.6Profissional liberal 0.1 0.2 ‐ Trabalhador familiar 1.6 1.5 1.4 Empregador 0.2 1.7 1.1 Trabalhador autônomo 24.8 22.4 23.5Total 100,0 100,0 100,0
Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Gráfico 14 – Migrante Assalariado por Tipo de Trabalho com seu Empregador (em %)– Fortaleza – 2000 / 2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Nesse contexto, cabe mencionar que, além da significativa presença destes
trabalhadores na condição de autônomos, boa parte dos migrantes exerce suas
atividades em micro e pequenas empresas, ou seja, em estabelecimentos com até
dezenove empregados (42,6%) e aqueles entre vinte e 99 funcionários (16,2%),
respectivamente. Esta é uma realidade claramente demonstrada na Tabela 14 uma vez
que oito em cada dez migrantes estão em uma destas três situações, o que evidencia a
importância dos pequenos negócios para essa força de trabalho.
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Tabela 14 – Migrante Ocupado, segundo o Número de Empregados da Empresa ou Negócio onde Trabalha ‐ Fortaleza ‐ 1992, 2000, 2008
Nº de empregados 1992 2000 2008 Nenhum, trabalha sozinho 1.0 16.9 18.0 Nenhum, trabalha com familiares e/ou sócio(s) 1.0 5.3 4.2 Nenhum, conta com a ajuda eventual de auxiliar(es) ‐ 2.1 2.6 De 1 a 2 empregados 23.5 21.4 16.4 De 3 a 9 empregados 16.6 14.8 14.3 De 10 a 19 empregados 10.1 8.7 11.9 De 20 a 49 empregados 9.6 8.4 10.6 De 50 a 99 empregados 7.4 6.2 5.6 De 100 a 249 empregados 9.3 6.7 6.5 De 250 a 499 empregados 5.2 2.5 2.2 De 500 a 999 empregados 5.5 2.3 1.9 Mais de 999 empregados 10.8 4.7 5.8 Total 100,0 100,0 100,0 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
Dessa maneira, o quadro a seguir mostra as principais ocupações em que estes
trabalhadores estão inseridos, como forma de propiciar ao leitor uma ampla radiografia
do mercado de trabalho local para os migrantes. Entre 2000 e 2007, percebe‐se que a
maior parcela das ocupações exercidas pelos trabalhadores migrantes está relacionada ao
trabalho doméstico, ao comércio varejista, à construção civil (pedreiros e serventes, por
exemplo) e ao setor de serviços (garçom e cozinheiro, por exemplo), cujos postos de
trabalho também são exercidos pela maior parcela da população local,
independentemente da condição de migrante ou não‐migrante.
Ocupações 2000 2008
Doméstica Empregado doméstico nos serviços gerais Vendedor de comércio varejista Vendedor de comércio varejista Comerciante varejista Vendedor ambulante Costureiro em geral (confecções em série) Pedreiro Servente de obras Garçom Auxiliar de serviços gerais Servente de obras Pedreiro, em geral Comércio varejista Auxiliar de produção Costureiro na confecção em série Garçom, em geral Costureiro a máquina na confecção em série Vendedor ambulante Auxiliar de escritório, em geral Entregador de mercadorias (bicicleta) Babá Balconista Vigilante Cozinheiro, em geral Zelador de edifícios Vigilante Cozinhador (conservação de alimentos) Porteiro Operador de caixa Zelador Manicure Caixa, em geral Cozinheiro geral Mecânico de automóveis Cabeleireiro Secretário, em geral Ciclista mensageiro Motorista de caminhão Porteiro de edifícios
Quadro 1 – Principais Ocupações Exercidas pela População Migrante – Fortaleza – 2000 /2008 Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE‐ IDT.
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Por fim, outro dado que reforça essa assertiva é o nível de rendimento obtido no
exercício do trabalho principal, haja vista que são bem similares os rendimentos dos
migrantes e dos não‐migrantes (Tabela 15), fato que sinaliza que as características do
mercado de trabalho se sobressaem aos atributos pessoais dos trabalhadores,
especialmente com relação as suas origens, conforme evidenciado ao longo deste
documento.
Tabela 15 – Nível de Rendimento do Trabalho Principal dos Ocupados, segundo a Origem – Fortaleza – 2008
Faixas de Rendimento (em salários mínimos)
PopulaçãoTotal Migrante Não‐migrante
Até 1 50,6 54,9 50,3 1,01 |‐| 2,0 35,2 33,9 35,3 2,01 |‐| 5,0 10,4 7,9 10,6 > 5 1,9 2,2 1,9 Não informou 1,8 1,1 1,9 Total 100,0 100,0 100,0
Fonte: Pesquisa Direta – SINE/CE ‐ IDT.
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4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste estudo se analisaram informações sobre a situação da população migrante
na cidade de Fortaleza, especialmente em relação a sua participação no mercado de
trabalho local. Esta é uma discussão bastante difundida nos mais diversos locais do
mundo, uma vez que os fluxos migratórios acabam impactando nas demandas por
trabalho, provimento de serviços básicos (saúde e educação, por exemplo), moradia,
dentre outras necessidades presentes na vida cotidiana das cidades. Como se sabe, tal
debate trouxe consigo, na maioria das vezes, o ensejo do preconceito, tanto entre as
nações como entre suas populações subnacionais vez por outra noticiadas pelos meios de
comunicação.
Não obstante essa discussão, cabe mencionar que a cidade de Fortaleza ainda
continua representando o maior centro econômico, político e social do Estado do Ceará,
concentrando a maior parcela da riqueza e dos postos de trabalho formais do estado, o
que sobremaneira influencia os fluxos migratórios para a Capital. Todavia, esta
mobilidade populacional vem declinando nos últimos anos, fato que pode estar associado
ao maior dinamismo econômico de outros municípios cearenses, nas últimas décadas.
Notadamente, tal impacto fora observado na participação dos migrantes na
população economicamente ativa de Fortaleza, com menor incidência deste segmento
populacional tanto entre os ocupados, como entre os desempregados. Apesar disso, o
quadro que se apresentou acerca da inserção ocupacional dos migrantes no mercado de
trabalho local é análogo ao que acontece com a maior parcela da força de trabalho do
município, que se submete, na maioria dos casos, às relações informais de trabalho, ou
seja, sem a devida proteção trabalhista e previdenciária.
Por outro lado, em que pesem os estigmas relacionados aos postos de trabalho
ocupados pelos migrantes, em Fortaleza, estes ainda são bastante evidentes,
especialmente os relacionados ao trabalho doméstico e ao comércio ambulante, cujos
segmentos de atividade econômica são os mais representativas tanto entre os migrantes,
como entre os não‐migrantes.
Outra informação importante é que boa parte da força de trabalho migrante está
inserida nos pequenos negócios, desde a condição de “autônomos” até vinculados às
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micros e pequenas empresas, fato que sinaliza a necessidade do apoio governamental
(crédito e capacitação, por exemplo) para o desenvolvimento dessas iniciativas,
especialmente para que seja possível a formalização dos negócios e dos vínculos de
trabalho, cujos desafios afligem o mercado de trabalho local, independentemente da
condição de migrante ou não‐migrante. Em síntese, este é sem dúvida o grande desafio a
ser trilhado nos próximos anos, especialmente para que a atual trajetória de crescimento
econômico do país seja revertida em melhores benefícios para a classe trabalhadora,
independentemente de suas origens.
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REFERÊNCIAS
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