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Obra repleta de hiperlinks. Amplie sentidos, clique e viaje para além da poesia! Fora da Ordem – Poesias de Vinicius Borba é a primeira publicação do agitador periférico, jornalista e blogueiro do Distrito Federal. Ilustrado por Carlione Ramos, também artista plástica da periferia do DF, o belo livreto traz poesias sobre direitos humanos, direitos dos manos e as lutas populares, amores e retratos da quebrada de Vinicius, construídas numa poesia marginal concreta, divergente e de resistência contra as agruras e desumanidades do capitalismo. Com muita sensibilidade o poeta também fala de seu amor com a esposa, a questão da ditadura militar e dos desaparecidos políticos e @s refugiad@s. Edição do autor e colaboração da Editora SEMIM Gráfica_Pigmento LTDA (DF).

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Fora da OrdemVinicius Borba

Edição do AutorSão Sebastião - Brasília - DF

2015

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Fora da OrdemPoemas de Vinicius Borba

Ilustras de Carlione Ramos2003 - 2015

Dedico esta singela peça de rebeldias aos que resistiram para além de suas capacidades físicas e emocionais aos vícios de poder, que resistiram aos ataques torpes da vida contra seu senso de justiça, aos que decidiram subverter a lógica quando esta demonstrou seu descompaso e absurdo, subvertendo a história e se mantendo Fora da Ordem posta. A tod@s que se consideram e sabem ser Radicais e Livres.

Dedico em especial à minha companheira e filhas, meus dois me-lhores poemas.

À minha mãe, que persistiu Fora da Ordem para me mostrar que o caminho é o amor, e só ele fica ao final, bem como às minhas amadas irmãs.

E a meus / minhas mestr@s da vida e de lutas, pela paciência em ouvir meus desenganos e contradições, incentivando sempre a resistir e furar bloqueios quando a vida assim exige.

Direitos de reprodução autorizados desde que citados autor e fonte.

Fora da Ordem - Poesias e diagramação: Vinicius Borba; Ilustração: Carlione Ramos; Capa: George Gregory - 1ª ed. - São Sebastião - Brasília (DF): Ed. do Autor, 2015. 36 p.; 21x14 cm. 1. Poesia. 2. Literatura Divergente. 3. Resistência rimada.

Apoio e Realização

Fb.com/PoetaViniciusBorbawww.viniciusborbablog.blogspot.com

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Índice

Não me representa...................................................................................................................................................... Proesias In Concert.....................................................................................................................................................Quebrada Nossa...........................................................................................................................................................Pois sou poeta!..................................................................................................................................................................Grito Latino.......................................................................................................................................................................Tempos de Ódio............................................................................................................................................................Com a força de pioneiro.......................................................................................................................................Refugiad@s......................................................................................................................................................................Sarau Enamorados....................................................................................................................................................Candidata.........................................................................................................................................................................Incandeia............................................................................................................................................................................Ode à Spartacus ou: Como precisamos disso!...............................................................................Juventude de Luta...................................................................................................................................................Honestino Eterno.......................................................................................................................................................Elo Fraco ou Elo Forte...........................................................................................................................................Ódio que mata..............................................................................................................................................................

Hipertextualidade e gênero

Este livro contém hipertextualidade, links em alguns pontos e palavras, formas de você ampliar o sentido e entender mais profundamente com outros textos, vídeos, fotos e repor-tagens quais fontes inspiram o artista num determinado ponto. Cheque você mesm@, passe o “mause” com a seta sobre os tí-tulos e palavras destacadas e navegue para além do sentido da poesia, dando milhares de novos sentidos a suas emoções. Ins-piração querida da Arte de Interface proposta pelo Coletivo Pa-lavra, irmão do Radicais em inúmeras correras nos últimos anos.

Este livro teve esforço em buscar alguma linguagem inclu-siva de gênero, aplicando @ em alguns momentos do texto para permitir a leitura do ponto de vista dos diversos gêneros e identi-dades sexuais que a vida, o amor e o respeito ao outro, a outra e a@s outr@s permita. Sabemos que há debates diversos sobre a aplica-ção do @ nestes casos, mas evitando maiores dificuldades para a aplicação do texto e de sua forma poética, não pudemos ser mais preciosos e perfeitos diante das diferentes teses que se apresentam pelos movimentos que realizam este debate. Perdão a quem se ofenda, não foi essa intenção. Mas aprimoraremos nos próximos.

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Não me representa

Não me representa foi o gritoDas ruas de martíriosSob fogo, bombas, tirosUna voz a ecoar

Na difícil unidadeTantas gentes, multidãoManipulada por maldadePromoveu a confusão

Elegeu fruto do medoUm Congresso reaçãoO mais mais desde os milicoMuito menos representativo

Vou dizer o que eu sintoO que não me representaVou lembrar porque griteiEm junho de nosso alerta

Não me representa o pastor que guia lobosQue se diz fiel em CristoEndemoniza o inimigoMantendo conta na SuiçaAbraçado em traficante manda expulsar mãe de santoLavando dinheiro do dízimoManipulando a boa fé, rasgando o LivroE destruindo o que restou da política

Não me representao coronel falso moralistaQue deixou alta patentePor ter grupo de extermínioPor assassinar minha gentePelos becos e vielasDiz que bandido bom, é bandido mortoMas quando defende a indústria da guerraQue lhe paga palanque e verbasNunca fala das seqüelasNunca paga o tanto de velasAcesas por becos e vielasPra velar seus concidadãosMais de 50 mil irmãos,todos os anosGenocídios comandadosPor seus gabinetes Comandos

Não me representao gabinete do DoutorQue aliena minha saúdeQue depois cortameu plano de morteSem pensar em nossa dorQue precariza o público hospitalE perdoa a baita multadas empresas no final

Não me representa o sonegadorQue exige Estado Mínimo

E que se fodamos direitos dignosTerceirizam, precarizam o trabalhadorDesde que seu lucroesteja sempre garantido

Não me representa o coronel de gravatasQue deixa as fazendas e vacasPra pregar que sua produção salva vidasMas por trás forma milíciasPara matar índio inocentePersegue como cães os parentesPra exportar nossas feridas

Não me representa esse ódio raivosoContra as lutas popularesQue há anos promovem justiçaPor direitos basilaresRenegam as nossas conquistasAcusam de terroristasPor termos um idealReclama que paga impostoEnquanto trabalhador rói o ossoDe seu luxo capital

Não me representao jornalista valenteQue ao povo diz que defendeE ao som de gritos fortesDe teatro em frente à câmerae alguns fricotesPromover o ódio pretendePrega alto o olho por olhoE com todo mundo caolhoExige dente por dente

Essa tal plutocraciaEstá mais para inferno astralMas já sei o que tem que acabarQue os ligae destrói toda genteÉ o financiamento empresarialÉ o investimento eleitoralQue compra até o presidenteÉ pensar que empresa votaComo se fosse consciente

Empresa que doasó pensa lucroMas pra quem quermudar isso tudoTá decidido e sustentaJá chega de covardiaQuero mais democraciaHorror às oligarquiasIsso não nos representa

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Poesias de Vinicius Borba

Quebrada Nossa

Agrovila quebrada nossa,Trajetória

Nossa história rima em versosResistência, tuas ruas

Tuas noites de sarauLua ao alto deste morro

Gameleira e OlariaE eu subia, eu subia

Parecia que era o céuEra córgo, bosque, mata

Era um povo lutadorQuebrada nossa, trajetória

Sempre mais com muito amor

E a dor das juventudesTransviadas n’agressão

Muitas mortes e atitudes, Geram ciclos de horror

Mães de LágrimasDesgraças

Nas delegas corredor

Essa quebra que resiste,Esse povo lutador,

Que lutou independênciaQue constrói a capitalDos Areias desta terra

Barro, argila, fundadorDe tijolo, suor e vida

São Sebas nossa queridaQuebrada de sonhador

Fora da Ordem

Proesias In Concert

Sarau é verso, é encantoAula de sabor espantoRara luz, emancipandoAlta corte de favelasUnida ao nó, mas desatando

Sarau é estrondo, trovejandoArgumento explosivo, livre girandoRasgado em versos, recitandoAula de esperança, acalantoUngida pelos mestres deste canto

Sarau é reunião d@s mártiresAssembleia Anti-tiranosResistência em profusãoArmada de desenganosUmoja para meus manos

Sarau é luz e somAgitação de insanosRegime sustenido ao extremoAção Griô, sem meio termoOcupação de verso e prosa, e pronto!

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Pois sou poeta!

Pois sou poeta rapaz,Nunca que ninguém lhe disse?Poeta de rua, poeta da noite,Da favela, da tavernacontra o açoite, de tantos outros como eu

E em tempos de fim de mundoApocalipses pré-colombianosAntes de entrar em paranoiasFiz foi trazer duas joiasPra poder logo com tudo

Trouxe foi duas meninas ao mundoEnquanto covardes diziam:-- Olha a crise! Olha a bolsa?!Lá estava eu fazendo menino, sem medo da calvíciePois sou poeta rapaz, nunca que ninguém lhe disse?

Que se tem coisa melhorQue trazer menino ao mundoNunca que vi, nem to pra essas mesmices

E trouxe logo foi duas gatinhas,Que foi pra passar a réguaManu e Milena, meus dois melhores poemas

Se algo de fato me assusta? Para com o futuro de minhas crias??Hum, vejamos...Pode a bíblia estar certa...?Não!

Podem os Maias estar certos??Não, não, não.Pode o InriCristo estar certo?Nããããoooo!

Tudo que sei é que,Se tenho algum medo por minhas criasPor minha prole queridaÉ que o mundo não mudeÉ que jornalistas não furem seus chefes e ediçõesQue professores não amem suas profissõesQue nós da favela nos matemos, antes de enfrentar os patrões

Que cada poeta em seus coraçõesSe neguem a gritar seus versosSe neguem a riscar verdades cruasQue junto ao povo não invadam as ruasE tomem a unha o que lhe é de DireitoPor que liberdade conquistadaÉ o único caminhoPra quem tem espírito de lutaE se com papel e penaFazemos nossa labutaEntão que se griteE pras novas gerações registre e ensineO peso de nosso fardo, missão, sacerdócio, calvíciePois sou poeta rapaz! Nunca que ninguém lhe disse

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Grito Latino

Eu ouço um gritoUm grito secoNão é gemidoÉ desespero

Eu ouço um gritoUm desapego

ReivindicoNão peço arrego

O que exijoPor desemprego

Menos delitoAlgum lampejo

Não seja a balaQue quando estala

É a esperançaQue aqui nos cala

Em cada autoDe resistência

São mais dois gritosDe indecência

Rajadas secasDe madrugadaConheço bemEssa pegada

A quem resisteEnfrenta a morte

Peço que griteQue seja forte

Vem logo atrásA outra marcha

Vem com escoltaNão tá com nada

Segue incluidaE grita forte

É a guarimbaQuer nossa morte

Essa outra marchaQue grita ódio

Quer mais MaiamiExige o ócio

Seu privilégioMantém minha morte

O seu poder É meu açoite

Abra o ouvidoEntenda o moteMarchando gritoSul é meu norte

Marchando eu gritoE grito forteNorte é o Sul

Sul é meu norte

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Em sua insustentável levezaSeres seguem fazendo estragosE demonstrando sua fraquezaRespeito a vida segue escasso

Eu vejo este ciclo há séculosAinda assusto com as tragédias

E alguns estúpidos flácidosTentam convencer de suas comédias

Vomitam feras de assassínioIdeias fontes de extermínio

Justificam o impossívelCom seus pobres raciocínios

Hoje erguem moralistasAlçam vôo alguns nazi

Mentirosos um tanto loquazesEmbebedam multidões, nojentos vorazes

Lembram daquela Matrix...Que parecem esquecer,

ou se negam a saber?Mister Smith quer poder!

Se seguir essa batidaAssim será e vai feder

Só para alguns, Não se iluda

Não vai ter pra onde correrPobre, negro, gay ou puta

Com deficiência, afrodescendência

De Religião africana, ou fumante da erva bruta,

Militante de esquerda ou progressista de luta

A ilusão moralistaNa verdade não limpa

De sangue lambuza, traumatizaCria monstros, satanizaE iludindo que higienizaA nazi-pocrisia ressucita

Tempos de ódio

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

O povo primeirolutou forte e conseguiu,No prazo que o homem pediu,Mostrar o valor do pioneiro.

A beleza rimada.A silhueta projetada,em palavras sensuaise declamada, em atos rituais.

Assim foi o projeto,Que Juscelino imaginou.Em pleno Planalto,Castelo concreto.Do qual a ditadura dura,O afastou!

Mas hoje a vitória é certa.Aos amigos da vida,Vivendo aquiconcretizam a metados objetivosPostos na vinda.

E vencendo em tudo,Mostramos o valordos calangos,Gigantes mudosQue agora mostram na voz,O amor, a dor e o calor.

As vezes me sinto, Candango verdadeiroQuando sinto o cheiroDe comida caipira e até de cajueiro.

Neste Cerrado indomávelAbrindo caminho talvez.Sigo desbravando a vida,Inabalável!Como pioneiro da primeira vez.Tirando cabaço...Destas terras virgens!Sugando a fruta seca, o sabor.

Soprando a poesia, e a fuligem.Deste atemporal destino,Tirando a dor, fazendo amorPoetando a históriaMe tornando criador.E sem dúvidas da vitóriaMe tornando do destino, mes-tre mor!Vou construindo, com muitos e até sóEste castelo lindo,Que jamais se tornará pó.Minha memória, De pioneiro Cult,Sem dó!

Com a força de pioneiro

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Meu refúgio é minha consciênciaMeu refúgio é minha resistênciaTodo sangue e glória que não me pertençaSe do desespero alheio e da morte dependa

Mais um corpo infantodesembarca nas areias brancasSem vida se arrasta,já não desenganaE ainda que por bênçãose abra a fronteira insanaA foto só choca em escalapois o cadáver não vem do Gana

A guerra violenta que agora abalaFoi mais um movimento comercial YankeEnquanto o povo chora toda essa desgraçaA indústria golp-estado vende mais um tanque

A Síria que sangra lágrimasÉ a mesma Nigéria das meninas sequestradasFilhas do ódio que o ocidente embalaRetratos de um tempo feudal,De colônia e escravidãoAs mesmas falas Cruzadas

As vítimas refugiadasLevando rasteira de jornalista reaçaDecidem entre morrer naufragadas

Ou a morte em vida,no inferno dos campos refugiadas.

Aqui também temos refugiadosVítimas das mesmas violações

Um holocausto diárioMarcad@s por perseguições

Pais de santo agredidos e seus terreiros queimadosHomossexuais também refugiados

Oprimid@s por sua identidadeE predicados

Refugiad@s de seus direitosRefugiad@s da dignidade da vidaResistentes contra a chaga ferida

Da dor que vem dos humanos direitosDa violação que não se contém

Refugiad@s de uma guerra cínica não declarada

Refugiad@s

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

A vejo... no sopé da porta.E penso se peço beijo, Não peço, não posso.Beijo não se pede, se rouba!

A vejo... num Sarau Alternativo.E penso se tento a sorte?Mas olho... Tem macho à roda.E meço palmo a palmo a largura dos ossos...Pois vai que o tal cornose incomode..Hum! Minha vida? O pouco que me resta?Sempre tiveo tal medo da morteE mais vale um covarde vivo,Que o herói presunto besta, no pacote.

A vejo, num Sarau da Tribo.Até que o mosca véio...quase não varejeira...Quase não varejeirava!Mas tava todo no prumo,As tranças trançadas, no rumo,Daquela que então me bicava:

E zóia eu. E zóia ela...E um tal de não sei qual foique inventei de ir na mesa mais perto da dela,E soltar uma piscadelaPara ver se não tinha jeito.

Pra quê!??

Pois começa entãoAquele tal de forró,Bom de agarrare não mais ficar só.Que fui me desavexar..Pois já tava só o pó, Mas não tinha a cara de chegar.

Tumei três quatro goro,Foi que então eu me enfezei:-- Agora eu chego nessa mulher!E a ela me projetei.E a cada passo que eu dava...O intestino soprava (...)E o frio me arrefecia.A menos de um metro e meio do “rela bucho” do amor...Sentei na cadeira outra vez.

O zóin dela chega entristece.Pois não é que num só passe,sua pele se enrubeceEnchendo de indignação

Me pega pela mão Puxa para ralar...E disse: --Bora dançar!! Cabra frouxo!Eu disse: -- Arrocha! Bote a mexer os cachosQue é hoje que eu tiro o atraso!Pra quê?!

Pois foi no Riacho Fundo II,Que fui confirmar minha sina.Duas semanas depois lá estava,Tão linda, tão bela, Dulcineia!Num frevo dos cumpade comum,Que abonam a nossa história.

E desde então é assim,No susto do início,Na certeza do agora,Um sentimento que cresce no peitoE neste frenesiDos acontecimentos é que a genteSe enrosca, se ama, se namora.

E dou gritos a desvairada patuleia:--Moças de meu passado próximo!..Convivas da esbórnia e boemia.A primeira dama... já está de posse!Dulcineia, Dulcineia, Dulcineia!

E que venhamos moinhos de Cervantes!

Sarau Enamorados

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Certa feitaUm poeta me inquiri

Onde andas?Mostra a peita?

Ao que lhe informo o diagnóstico,com cara de Brasília:

-- Burrocratite crônica!Dilema de Behr,

Entre o carimbo e a papelada.

-- Sabe como é poeta...Poesia vivo por amor!Mas de amor mesmo,Nem casamento vive!

Arrumei um ternão bruto, burrocratite!Fui trampar num gabinete eleito, acredite...

Ao que Rego Júnior,Com a Boemia e desfaçatez de poeta

Me retruca com azia:“Tá vendo, tá vendo... Não elegeu a poesia?”

Pois teje eleita!

Candidata

Cada Kaiowá que cai na aldeiaCada canto de Tekoha que queima

Incendeia meu coração

Cada milícia encapuzada que chacina nas favelas

Cada mano meu que morre de quebrada do meu lado

Incendeia meu coração

Cada mãe de santo morta pelo ódio do pastorComo se também não fosse Oxalá nosso senhor

Incendeia meu coração

Como pode num país tão rico em tudoO ódio ser tão maior que a ganância o absurdo

Incendeia Meu coração

Te levanta juventude, pelo justo de responsaDemocrática segue em luta,

de redes e de ruas!Incendeia meu coração

Incandeia

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Quando invado em poesia um baú lotadoQuando invado a fazenda do grileiro safadoQuando ocupo o esqueleto-prédio vazio especuladoQuando invado sua mente e deixo tudo devassadoQuando destruo sua moral inconsequente nesse EstadoQuando invado a casa do corrupto armadoOu apedrejo os seus cães por engolirem caladosQuando invado o sinal e simplesmente faloO que todo o meu povo sente há muito tempo caladoEu não aceito mais tanta desculpa louvávelE vou pro choque, linha de frenteAção direta, eu abalo

Explodo seu esquema, seu gabinete, sua linha editorialPor que não nasci pra ficar de joelhos, nem pra pagar pauA minha luta é das antigasNão renego minhas origensPovo humilde, forte, aguerrido que nunca desiste

Vinicius Borba na guerrilhaPoeta radical livreQuebrada São SebastiãoPerifa DF na resistE não assiste omissoToda essa sacanagemQue vem maquiada, patrocinada Governo, mídia, pilantragem

Minha poesia, é soco na boca do estômago desse sistemaQue se repete, escravizaA maioria nos esquemaAqui no DF “companheiro” que se corrompeu é mato

Sob argumento da revolução em “nova fase”Mó garganta puro descaso

Não enxergam que como orienta o grande GaleanoO pior pecado é o atentado contra a esperança dos manos

Quando eu invado sua menteInconsequente com minha rima

É para lembrar o que nos disse e orientouo primeiro escravo revolucionário um dia

Perguntados sobre com o quePoderiam ajudar na luta, Cada qual se ergueu

Para fazer armas, colaborar na labuta

Mas um garoto ainda jovemCom pena e papéis em baixo do braço

Respondeu com humildadedando a frente um largo passo:

“Guerreiro, eu só sei fazer poesia.Relato minha aldeia, nossa luta, nosso dia-a-dia”

E aquele escravo, forjado a ferro e fogo para batalha,Se ergueu e respondeu, evitando os canalhas:

“Poeta, pra que nossa vitória seja completa, para não esquecermos de onde viemos

e para onde vamos na certaDependemos do sonho e resistência que no peito levas!

Não baixe a guarda! Não aceita corrupção!Não seja omisso. Foste mandado pelos deuses,

como precisamos disso!”

Ode à Spartacus ou: Como precisamos disso!

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Toda vez que te perguntamDe onde vem tua essência

Não se faça aparênciaResponda: Sou Juventude de Luta

Quando nosso tempo afloraE há tempos de turbulência

Quando o mal e a indecênciaTomam conta dos poderes

É hora de assim dizeresSou Juventude de Luta

Enquanto o certo for o certoE houver valor na disputa

Se com quem você combateHonra a saia, a calça e a boina

Responda firme a perguntaSou Juventude de Luta

Se tu sabes qual tua origemDa favela, campo ou asfaltoSe não nega a luta de classes

O teu papel no assaltoDerruba o corrupto no ato

Reage ao pelego de fatoSou Juventude de Luta

Mas se a tentação bate a portaPor emprego, dinheiro, sexo ou

drogaNão te esquece da labuta

Não te entrega na primeira hora

Por que as coisas do mundoA gente consome e passa

Mas nosso compromisso de lutaNossa memória corrupta

Não se apagaEstá todo mundo vendo

E depois não tem remendoQue a consciência refaça

Pra quem vive na trapaçaJá acha até natural

Trai @s própri@s companheir@sAchando que é @ talAcaba no isolamento

Com suas relações compradasCom Maquiavel abraçadas

Mas sem luta no firmamento

Não contavam com minha astúcia?

Se ilude @ anti-heróiVitórias sem qualquer fidúcia

Castelos de areia constróiSendo que ao primeiro vento

Seu poderio se esvai

E a juventude de lutaDe anseios, energia e valores na

disputa?Uma geração se frustra

Os princípios se vão ao léuE a tua balela de: depois passa...

Juventude de Luta

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Deixa marcas indeléveis.Silencia a flor no revés.

Se perde um@ jovem de luta.

Nosso pecado contra a esperançaÉ a morbidez que nos toma

É a traição de si mesm@Pois ser Juventude de Luta

É construção, é disputaÉ descobrir no passo a passo

@s mestres nessa labutaSem amarras para contradições

Enfrentar o mundo em intençõesEntre a incoerência e a loucura

Rompendo com a amarguraDesancando @s canalhas

Se pisar... que aguente a batalhaPois não cabe aliviar.

X9 tem que rodarTraição com inimigo? Vá lá.

Mas entre nós,É mostrar uma marca de caráter.

Não renego a políticaEla é caminho, é trajeto

É meio, não apenas um fim certoA gente tem que lidar

Aprender a disputar e seguirCaráter reto

A vida é feita de lutas

Não há que temer o incerto

Há que temer cabritagemHá que temer trairagemE evitar dar de espert@

Por que quem vai pra disputaRepresenta comunidade,

Se alinha com uma posturaQuem sustenta tem respeitoQuem num guenta esmoreceMas quem luta com responsa

Levanta bandeira da esperançaE se pegam fazendo lambançaMata o sonho, acaba a dança

Tipo som quando dá brek

O que a gente se esquece,É que @ militante comprad@

Agora está do seu ladoMas não dura, se esquece

E o dinheiro pelo dinheiroO poder pelo poder,

O patrão sempre tem maisAo final @ oprimid@

Vira opressor@ contumaz

Se pretender entrar numasTe prepara pro pior

Companheir@ que é companheir@

Nunca corrompe a bancaSe não entendeu o recado

Teje ligad@, escutaSomos Juventude de Luta

E o bicho vai pegar!

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Acabem com essa tortura!A tortura do holocausto, a tortura do silêncio,

A tortura de Honestino, sem destino paradeiro.Acabem com essa tortura!

Libertem almas daqueles que ainda aguardamUm retorno, pura amargura,Um vazio enquanto amam.

Aos que diziam defender o país,amor ao chão, sua raiz,

Esqueceram que é dos jovens o amor nessa construçãoQue se há país, povo, nação,

Isso surge da voz que grita, da voz que diz.

Mas se silenciaram a luta,Não calarão nossa memória.

E que se cale esse cálice, cala-te Cálice!Que se repete, em cada Amarildo,

em cada moleque morto na viela escura.Em cada oprimid@ espancad@ em via pública.Por exigir a letra morta, antes esperança pura.

Levanta de novo essa nossa luta,Nos junta, leva às ruas!

E Honestino revive na W3,Na Rodô, nas UnBs, seus Câmpus e contradições

Renasce, pois Cale-se não posso mais!Não me calo nunca mais.

Guimarães é nosso ontem, nosso hojeMas amanhã, honestamente

Amanhã já é maior.Honestamente Eterno!

Honestino Eterno

Se não há quem ouçaE não há quem leia,

Também não há quem vivaE não há quem creia

Revolta humanaContra o silêncio divino,

Até quando esperar?Gritam de fome os meninos!

Faroeste caboclo ou Distrito Federal?Capitalismo para os loucos,

Comem pasto no curral eleitoral.

A vida não espera.O universo transpõe eras.

Se da quebra a corrente está a mercêJamais esqueça: o elo fraco... pode ser você!

Dizer que não és capaz?Fácil fuga, covardia.Se és forte e audaz

Ao próprio ser desafia

Na simplicidade destes versos,Peço feche essa ferida

Fortalecendo estes elos, Na nossa corrente da vida.

Elo Fraco ou Elo Forte

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Toda vez que ouçoO levantar de tua voz contra @ human@Toda vez que vejo teu calibre levantar contra meus manosSangro com cada um deles

Toda vez que vejosua violência atrozExpressa em palavras sujasDefendendo um estuproToda vez que ouço a sua voz defender mais um abusoSangro com o estupro del@ls

Toda vez que você gritaNossas irmãs, mães, filh@sViolentadas na lógica do algoz“Tava de roupinha curta, olha a roupa da menina!Tava pedindo, botou pilha!”Só que não, vê se escuta.

Toda vez que vejo, Um jovem defender a opressãoComo instrumento de liberdadeFico vendo a falsidade, O horror e a intensidadeA intencionalidadeDo patrão rindo em gargalhas

Por que quando a bala comePor que quando chega os homi,Revistando estourandoos barracoInvade, bate, quebra e tomaSe achar dinheiro? Sombra!Sem registro tudo some.

Porque quando chega os homi,Dificilmente vem proteção,Chega sempre camburão, caveirão e armamentoChega morte, vem mais homiSó não chega solução

O que ouço na sua vozSão os gritos da torturaDo silenciar do debateCabô essa conversa,Assembleia, reunião,democracia?Você grita que é loucuraE com bala quer a curaDa liberdade de pensamento.

Te informo já de prontoCada grito teu, é um tombo,Cada tiro, gera estrondoMas não cria fundamentoTu fica mais violento, burro e sonso, só lamento

Enquanto no debate prontoEncontramos soluçãoBuscamos o firmamentoE seja sonho, seja estrada,Nosso caminho fazemosNa contradição, debatendoBuscando nossa utopiaE o amanhã para todos e todasTraçamos melhores dias

Mas teu ódio ainda acha ecoA vingança e não a justiçaÉ o que busca o desafetoCritica os direitos humanos,Critica os direitos dos manosMas quando estáem maus panosReclama por covardias

Acusa o elemento políticoPor defender o humanoMesmo sendo todos e todas, sujeit@s de desenganosSe erramos, que se faça justiça entãoMas não exija vingança,Exija a lei e a esperançaPorque quem erra pode ter curaE quando a pena é injustaMorrem dois nessa vingança

As masmorras desumanas,Onde a pena se executaNão cura, reeduca, ou enganaTraz a morte e mais ódioE no treinamento pra demoA sociedade sai perdendo E o crime tem mais sóciosEmpurramos nossa gente pro venenoCriando monstros no ócio

Mas o pior de teu ódioQue sai na rede socialQue tu acha que é normalBonito e coragento,cria uma rede de nojentosQue aumentam seu potencial

Na tua frente defendem o bemNas costas praticam o malFalam de boca cheiaem justiça capitalMas nas costas ninguém freia O psicopata marginalEspanca a esposa e os filhosMata homossexualEstupra adolescentes,culpando a vítima afinal

Com revólver mata os negrosDiz que é praga irracional

Ódio que mata

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Fora da Ordem Poesias de Vinicius Borba

Vinicius Borba, poeta, jornalista, agitador cultural e blo-gueiro da periferia do DF é mais um resistente contra as opressões do mundo. Em defesa dos direitos humanos e dos manos, segue rea-lizando saraus como MC, apresentando espetáculos diversos e con-tribuindo como ponte de saberes e fazeres culturais. Resistente da esquerda brasileira, progressista de coração e alma, Vinicius colabo-ra diretamente em manifestações e agitações na cidade, participando da cena política e na rede de saraus das perifas do Distrito Federal, do Brasil e da Pátria Grande, com poesia ácida e de lutas. Sua escrita denuncia as violações de direitos, nossas huma-nidades e desumanidades, amores e contradições, sempre buscando na consciência de classe seu viés condutor das vozes oprimidas rumo à emancipação libertária por meio da palavra. Seguidor de Freire, ouvinte de Gog, apaixonado e inspirado em Galleano, curtidor de Nicolas Behr e resoluto em Buda e Cristo, Vinicius segue debatendo em rima nos palcos da vida sua literatura vivida, e até então não pu-blicada para além dos zines, blogs sujos e mentes insanas das perifas na absurda metrópole. Dentre suas principais participações artísticas estão a produ-ção e coordenação do grupo Radicais Livres S/A, desde 2003, com a realização e participação em mais de 200 saraus Radicais com o gru-po, participações na Feira do Livro de Brasília, XI Jogos dos Povos Indígenas, Noites Culturais do Açougue Cultural T-Bone, Bienal do B- Poesia na Rua, Bienal Internacional em Brasília, Acampamentos do MST, saraus da Cooperifa, do Binho, Su-burbano Convicto, Preto No Branco, dentre outros em SP. Trabalhou e militou nas áreas de proteção à vítimas de violência, direitos indígenas, direitos humanos e da infância, além de sua atuação como repórter em jornais da capital.

Do autorGanha muita grana isentoCom igreja e filial,Demoniza os diferentesAcusa de deliquentesManda matarem nome de CristoComo se o Rei sem castelosNão tivesse amado afinal

Exige uma liberdade absurdaOnde poucos possam tudoCom dinheiro propinae ganânciaMas na frente da galeraDefendende com arrogância Dos políticos má féDiz que é tudo criminosoTem que derrubar, Botar outros.

Mas não diz o que bem querQuer o trono pra você!Tá com sede de poder,Pra fazer igual ou piorAcha que encarna o bemMas não vê nem mais ninguémO interesse o pormenor,O que quer bem lá no fundoÉ matar os ditos vagabundos, Que se oponham a seu poder

Que voem em seus aviõesCursar suas faculdadesDeixas na miséria os milhõesSem viver dignidade

O seu ódio é seletivoEscolhe a dedo o inimigoE encrimina a vontadeQuer de volta o privilégio,a vantagemDe onde vem o coronelQuer de volta sua santidadeQue o negro e o pobre disputaQue o operárioequilibrou na verdadeIsso tudo te preocupa

Mas te informamos de umaEstamos nas ruas, nas lutasSomos classe em disputaSomos frente organizadaSomos entidades mobilizadasPra compor nessa labuta

Não seremos seus bonecosNunca mais vítimas suasSomos irmãos e irmãs de utopiaTemos sonhos e conhecemos a viaQue nos une na disputa

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Da ilustradora

Carlione Ramos é artista plástica autodida-ta, mineira e radicada na comunidade de São Se-bastião (DF) há 15 anos. Encontrou no lixo da própria comunidade suas primeiras referências para produção artística, encon-trando beleza nas cores dos dejetos urbanos. Dali produziu suas primeiras peças reciclando materiais e construindo sua identidade artistíca. Hoje a artista estuda Artes Visuais e design pela Universidade Federal de Brasília (UnB) e desenvolve sua produção no atelier, Me-ridiano, com parceria, orientações e colaboração da mestra e douto-randa em Artes, Leisa Sasso. Realiza em suas instalações e obras o que chama de “arte das coisas”, reunindo conceitos de design e artes visuais atualmente tam-bém em moda, desenhando e criando novos modelos inspirada em sua origem periférica mas também na diversidade de cores, como dito pela arttista, “para vestir o mundo”.

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Fora da Ordem é o caminho d@s que compreendem e vivem o momento crucial de ter atitude, de agir ante as injustiças. Fora da ordem é a resis-tência de quem vive a esperança e utopia que no peito encerra. De quem vive a política com mais fígado que estômago, de quem não espera e faz a hora acontecer.

Neste livro de poesia ácida, encontram-se fórmulas de rebeldia, consensos entre a incoerência e a loucura, sangue nos olhos e o resgate de princípios num mundo marcado pelo obscurantismo, armamentismo extremo, lucro--fruto da desgraça alheia e da intoxicação por todo tipo de químico, num planeta em desencanto.

Com sua poesia, Vinicius Borba expressa sua combatividade, discute incoerências e as enfrenta, sabendo-se imperfeito num mundo transviado. Com a ilustração mágica da artista Carlione Ramos, que tirou do lixo suas inspirações para a busca do belo, o livro traz o resgate das humanidade cada dia mais em risco pelo recrudecimento de conflitos, de valores e visões de mundo.

Ambos vem do coração da perifa do centro nervoso do Brasil, a cidade de São Sebastião (DF), subúrbio de uma das mais contraditórias capitais brasileiras, Brasília, terra de oportunidades e caricatura de um país ainda vítima da própria história de colonialismo, alienação, cultura de opressão e violência civil e estatal.

“Alguma coisa está fora da ordem, fora da nova ordem mundial”, afirmou Caetano. Nada mais justo do que expôr as vísceras destes paradoxos antes que a confusão nos destrua. Se não acredita mais neste mundo, ou acha que não há mais o que esperar, se omitir ou conciliar... vire essa mesa e saia Fora da Ordem.