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1 FLG 0253 – Climatologia I Disciplina Ministrada pelo Prof. Dr. Ricardo Sistemas de Meso Escala – As Trovoadas – 1 – Introdução O presente resumo de aula pretende ensinar os conceitos dos sistemas de meso escala que atuam nas latitudes dos trópicos e sub-trópicos, mostrando como a atmosfera da Terra efetua as trocas térmicas nestas faixas de latitude. A entidade meteorológica principal que atua na escala de tempo/espaço proposta nesta discussão é conhecida por trovoada. A trovoada, um nome genérico para as tempestades, é sugerido pela Língua Portuguesa, de tempos remotos dos antigos navegadores, por um simples motivo: a existência de trovões. Contudo, trovões não são as causas, mas conseqüências de processos que existem dentro das células de trovoadas. Porém, são eles que denunciam a presença da tempestade, ou seja, quando esta alcançou sua fase madura e a partir deste ponto, todos os fenômenos associados à sua existência poderão ocorrer. Veremos detalhadamente estes processos adiante. Nas escala temporal, as trovoadas são definidas como sistemas que têm um tempo de vida dentro da faixa de 7 horas a 2 ou 3 dias e que atuam em um espaço de aproximadamente 20km até 1.000km. Com estas características, estamos delimitando sua existência dentro da meso escala (células de trovoadas isoladas) a sub-sinóptica (Linhas de Instabilidade, por exemplo, com muitas células de trovoadas independentes, mas atuando em conjunto). As características que definem as trovoadas são: Suas células de tempestades podem ter mais de um ciclo de vida, mas obrigatoriamente, pelo menos um ciclo; e Prevalecem características convectivas para a sustentação de vida dos sistemas. 2 – A Convecção Pela Física, a convecção é definida como a forma de transmitir energia, neste caso calor, através da massa, lembrando que a matéria move-se para executar este processo. Em outras palavras, a massa absorve calor de um lugar, move-se e libera esse calor em outro. A direção e sentido do processo não importam.

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FLG 0253 – Climatologia IDisciplina Ministrada pelo Prof. Dr. Ricardo

Sistemas de Meso Escala– As Trovoadas –

1 – Introdução

O presente resumo de aula pretende ensinar os conceitos dos sistemas demeso escala que atuam nas latitudes dos trópicos e sub-trópicos, mostrando como aatmosfera da Terra efetua as trocas térmicas nestas faixas de latitude. A entidademeteorológica principal que atua na escala de tempo/espaço proposta nestadiscussão é conhecida por trovoada.

A trovoada, um nome genérico para as tempestades, é sugerido pela LínguaPortuguesa, de tempos remotos dos antigos navegadores, por um simples motivo: aexistência de trovões. Contudo, trovões não são as causas, mas conseqüências deprocessos que existem dentro das células de trovoadas. Porém, são eles quedenunciam a presença da tempestade, ou seja, quando esta alcançou sua fase madurae a partir deste ponto, todos os fenômenos associados à sua existência poderãoocorrer. Veremos detalhadamente estes processos adiante.

Nas escala temporal, as trovoadas são definidas como sistemas que têm umtempo de vida dentro da faixa de 7 horas a 2 ou 3 dias e que atuam em um espaço deaproximadamente 20km até 1.000km. Com estas características, estamosdelimitando sua existência dentro da meso escala (células de trovoadas isoladas) asub-sinóptica (Linhas de Instabilidade, por exemplo, com muitas células detrovoadas independentes, mas atuando em conjunto).

As características que definem as trovoadas são:

• Suas células de tempestades podem ter mais de um ciclo de vida, masobrigatoriamente, pelo menos um ciclo; e

• Prevalecem características convectivas para a sustentação de vida dos sistemas.

2 – A Convecção

Pela Física, a convecção é definida como a forma de transmitir energia, nestecaso calor, através da massa, lembrando que a matéria move-se para executar esteprocesso. Em outras palavras, a massa absorve calor de um lugar, move-se e liberaesse calor em outro. A direção e sentido do processo não importam.

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Mas no nosso estudo em questão, que trata das trovoadas, precisamos utilizarum conceito mais específico dado pela Meteorologia. Nesta ciência, a convecção édefinida exatamente como a da Física, porém limita a sua atuação para a direçãovertical, em ambos os sentidos (de cima para baixo e, principalmente de baixo paracima). Os transportes horizontais de energia pela massa recebem o nome deadvecção.

Cristalizando este conceito importante, veremos agora como a região tropicaldo planeta procede para se livrar de um superávit de energia que recebeu do Soldurante o percorrer de um longo tempo. Note que o processo das trovoadas,utilizando a ferramenta convecção, é apenas um deles, porém de longe, é o maisimportante nesta faixa das latitudes intertropicais. Existem outros processos queserão discutidos na aula de Frentes e Ciclones Extratropicais.

O primeiro instante da convecção é dado quando a energia de insolação(aquela que conseguiu atravessar toda a atmosfera e seus obstáculos) começa aaquecer a superfície, convertendo ondas curtas (alta energia) em ondas longas (calorinfravermelho). Uma pequena parcela de calor remanescente do saldo positivo doBalanço Radiativo da Atmosfera também contribui para o processo. A partir desteponto, as primeiras lâminas de ar, que estão em contato direto com a superfície,começam a se aquecer violentamente. Dependendo do tipo de superfície, atemperatura poderá variar de 40 a 86ºC. A transferência de energia térmica, nesteinstante, é obviamente por condução, molécula a molécula, podendo-se assim dizer,mas que gera uma extrema instabilidade na superfície laminar. Qualquer efeitomecânico que perturbar a área, como uma leve brisa ou o passar de um automóvel,será suficiente para disparar o processo convectivo (Fig.1a). Se nenhum efeitoocorrer, a própria convecção, pelo grande acúmulo de energia, acaba se auto-iniciando.

Fig.1a – Superfície extremamente aquecida gera um diferencial de temperatura nas primeiraslâminas de ar. Este processo é a semente da convecção térmica.

Após a ação desta forçante inicial (vamos chamá-lo vulgarmente como “chuteinicial”) o levantamento convectivo se fecha, por propriedades moleculares daMecânica de Fluidos, onde a tensão superficial da bolha consegue mantê-la intacta.Estando formada, a bolha, ou térmica, ou parcela de ar consegue se manter

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praticamente estável e se eleva, nestes instantes iniciais, em uma razão de subida de10 m/s ou +/- 36km/h (Fig.1b).

Fig.1b – A bolha térmica se fecha, mantendo suas propriedades isoladas do meio ao redor. Talprocesso é descrito como adiabático, pois a parcela de ar mantém suas propriedades sem seenvolver com o meio por onde transita. Um exemplo é a sua temperatura interna.

Conforme sobe, a bolha se expande, pois a pressão externa é cada vez menor.Essa expansão da bolha, ora causada pela energia térmica interna, ora pela reduçãoexterna da pressão, vai fazer com que a pressão interna à bolha também reduza, poisela é considerada um sistema aberto. Ao se reduzir a pressão interna, a temperaturacomeça a cair (Fig.1c).

Fig.1c – A parcela de ar vai subindo, expandindo-se e ao mesmo tempo resfriando-se internamente.Note que, pela propriedade da continuidade, o ar atmosférico entorno e na periferia, vêm ocupar oespaço livre, em movimento compensatório. Se a parcela sobe, o ar ao seu redor desce.Imediatamente a seguir, inicia-se um novo processo de formação de uma nova parcela.

A temperatura da parcela vai se reduzindo, porém devemos lembrar queexistem duas temperaturas distintas: a temperatura do ar e a temperatura do ponto deorvalho (essa é a temperatura que uma dada parcela de ar precisa ter para saturar, ouseja, formar gotas de água). A temperatura do ar interno da parcela se reduz maisrapidamente, a uma taxa de 1ºC/100m enquanto que sua correspondente temperaturado ponto de orvalho varia apenas 0,2ºC/100m. Ora, a dado momento as temperaturasdo ar interno da parcela e sua temperatura do ponto de orvalho serão iguais! Nesteexato instante, a parcela de ar satura, pois quando essas temperaturas são iguais,

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significa que a sua pressão de vapor atingiu a saturação, ou, se preferir pensar emrelação à umidade relativa, atingiu-se 100% de UR, ou seja, deve-se formargotículas de água, conforme haja umidade disponível. Quando estas temperaturassão iguais, dizemos que a parcela de ar ascendente chegou ao seu Nível deCondensação por Levantamento – NCL (Fig.1d).

Fig.1d – Parcela se elevou pela forçante inicial até atingir seu NCL. Neste nível, a temperatura doar interno da parcela é igual à sua temperatura do ponto de orvalho. Quando isso ocorre, o ar satura,formando gotículas de água, precursoras de nuvens. O NCL também é conhecido, no caso detrovoadas, como Nível de Condensação Convectiva – NCC.

Lembrando que a parcela, ao iniciar seu processo de levantamento,transportou, em seu interior, o calor existente na superfície em forma de calorsensível e latente. No início, a energia é considerada calor sensível, pois estavaaquecendo o ar ao seu redor. Enquanto aquecia, uma parte dela foi utilizada paraevaporar água que estivesse disponível em superfície, como rios, lagos,evapotranspiração etc. Ao ceder energia de calor sensível para evaporar água, partedesta energia foi armazenada na parcela em forma de calor latente. Pode-seimaginar que calor latente é um empréstimo de energia, solicitado pela matéria,quando esta precisa mudar de estado físico. Com isto, temos dois sentidos distintosde calor latente:

• Quando a matéria passa de um estado físico de menor energia para um demaior, armazena calor latente internamente, solicitando-o do meio em que seencontra (sólido líquido ou líquido gasoso); e

• Quando a matéria passa de um estado físico de maior energia para um demenor, libera calor latente para o meio em que se encontra (gasoso líquidoou líquido sólido).

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Atingindo o NCL, a parcela resfriou-se a ponto de permitir condensação. Peloprocesso inverso, o seu vapor (alta energia) condensa em forma de gotas (baixaenergia) liberando seu calor latente internamente à parcela. A manifestação destaentrada de energia se dá em forma de calor sensível que começa a aquecer a parcela.Note que este ganho de calor interno será um grande complemento para se decidir sea troposfera estará estável, instável ou neutra.

A grande importância disto é que boa parte da energia que estava emsuperfície foi removida para níveis mais altos, sendo liberada em altitude.

Com isto, notamos que a troposfera, a primeira camada da atmosfera e quecomporta quase que 90% de toda a sua totalidade, permanece com um perfil detemperatura onde a superfície é mais quente que os níveis altos, ou seja, a variaçãoda temperatura é para menor conforme se ganha altitude. Esta variação negativa detemperatura com ganho de altitude recebe o nome particular de Lapse Rate,aportuguesado para Taxa de Resfriamento por Altitude. O processo deaquecimento por baixo define a troposfera como uma camada climatologicamenteinstável.

Para saber mais:Calor Sensível: é a forma de energia térmica que se manifesta na matéria pela alteração de suatemperatura, ou seja, pode ser medida com termômetro.Calor Latente: é a forma de energia térmica que se manifesta pela mudança de estado físico da matéria,onde não há alteração de sua temperatura, ou seja, não pode ser medida com termômetro.

Para saber mais:Pode-se calcular a altura do NCC facilmente com uma fórmula bem simples:

H = 125 x (T – Td)

Onde T é a temperatura do ar e Td a temperatura do ponto de orvalho, ambas em superfície. O resultado édado por H, em metros. Exemplos didáticos:

Temp. Ar (ºC) Temp. Ponto Orv. (ºC) Cálculos Altura da Base NCC (m)

32 20H = 125 x (T – Td)

H = 125 x (32 – 20)H = 125 x 12

1500

20 15 H = 125 x (20 – 15)H = 125 x 5 625

0 -3H = 125 x (0 – (–3)

H = 125 x (0 + 3)H = 125 x 3

375

18 18 H = 125 x (18 – 18)H = 125 x 0

0(Nevoeiro em SFC)

Nota: este método não poderá ser aplicado à todos os tipos de nuvens, pois trata-se de apenas processosconvectivos. Porém, nos dois últimos exemplos, ele poderá ser uma eficaz estimativa na obtenção daaltura onde ocorre a saturação do ar, mesmo em nuvens estratiformes.

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3 – Estabilidade Atmosférica

Os processos de estabilidade atmosférica recorrem ao equilíbrio de suascamadas. Na Física, o equilíbrio de um corpo pode ser caracterizado em 3 situações:estável, neutro ou instável. Quando todas as forças que atuam sobre um corpo seequivalem, dizemos que o mesmo está em repouso. Como comparamos o equilíbriode um corpo em relação à superfície da Terra, dizemos que, se não houverem forças,ele está em repouso. Vejamos as definições de equilíbrio pela Física, fazendo umaanalogia com as parcelas de ar atmosférico:

Estável: Equilíbrio estável é aquele em que um corpo, perturbado por uma força,voltará à sua posição original imediatamente após a atuação da força. Naatmosfera, quando uma parcela é impulsionada por uma força, tenderá aretornar a sua posição original. Este caso caracteriza a estabilidade do ar,dificultando ou amortecendo os movimentos verticais (Fig.2a);

Neutro: Equilíbrio neutro ou indiferente é aquele em que um corpo, perturbado poruma força, permanecerá no mesmo equilíbrio na nova posição, após aatuação da força. Na atmosfera, quando uma parcela é impulsionada poruma força, tenderá a se mover só durante a atuação da força. Quando elacessar, a parcela estaciona, permanecendo no lugar, não tendendo a voltarpara a posição original, nem tampouco seguir a diante, mas poderá estarcom um potencial maior, ou menor, conforme foi seu deslocamento(Fig.2b);

Instável: Equilíbrio instável é aquele em que um corpo, perturbado por uma força,tenderá a se afastar cada vez mais da sua posição original, mesmo após aatuação da força. Na atmosfera, quando uma parcela é impulsionada poruma força, tenderá a se afastar cada vez mais da sua posição original. Estecaso caracteriza a instabilidade do ar, auxiliando os movimentos verticaise acelerando as parcelas (Fig.2c).

Fig.2a – Situação estável, força-da à mover-se;

Fig.2b – Neutro, mas commaior potencial.

Fig.2c – Situação instável eliberação do potencial guardado.

Dependendo da taxa de resfriamento do ambiente (Lapse Rate), as parcelas dear que estão subindo podem adquirir tendências de estabilidade absoluta,estabilidade condicional ou instabilidade absoluta. A definição da tendência daparcela levará em conta a sua temperatura interna, quando esta é comparada àtemperatura do ar ao seu redor (do ambiente) no mesmo nível. Com isto, temos trêscasos distintos:

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Situação TendênciaA parcela tem temperatura maior, portanto mais quente queo ar ambiente no mesmo nível; Subir

A parcela tem temperatura igual ao ar ambiente no mesmonível;

Estática (só se move soba ação de forçantes).

A parcela tem temperatura menor, portanto mais fria que oar ambiente no mesmo nível. Descer

E como vimos anteriormente, a parcela poderá subir (ou descer) contendovapor d’água em seu interior. Neste caso, a energia ainda permanece armazenada emforma de calor latente e é definido como processo Adiabático Seco. Quando o caloré liberado (ou solicitado) para a mudança de fase da água, o processo é chamadoAdiabático Úmido. Na prática:

Adiabático Seco: É o processo no qual a temperatura da parcela de ar varia comose fosse um ar seco, conforme sobe/desce, na taxa de 1ºC/100m(Ex. da superfície à base da nuvem, no NCL);

Adiabático Úmido: É o processo no qual a temperatura da parcela de ar varia comose fosse um ar saturado, conforme sobe/desce, na taxa de0,6ºC/100m (Ex. no interior da nuvem, da sua base ao topo).

Os exemplos a seguir são bem ilustrativos, pois mostram a aplicação dos doisconceitos. Lembre-se que, enquanto a parcela se eleva sem condensar seu vapord’água interno, o processo é adiabático seco. A partir do NCL, se a parcela continuara subir, o processo será adiabático úmido. Neste último, a parcela recebe o calorlatente liberado do vapor que está se condensando.

Exemplo de Estabilidade Absoluta:

Dizemos que as parcelas estão em estabilidade absoluta quando, a partir daelevação inicial por uma forçante, as parcelas se resfriam a uma taxa maior que ogradiente térmico do ar ambiente (Lapse Rate). Note que a estabilidade permanecetanto na razão da adiabática seca, quanto na razão da adiabática úmida, quando aparcela atingiu o NCC e inicia-se a condensação. Percebe-se que a liberação de calorlatente após o NCC não contribuiu em nada para o fomento da convecção de formacumulativa.

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ESTABILIDADE ABSOLUTA

ParcelaAltura (m) GT Ar Ambiente

(5ºC/1000m) Adiabática Seca(10ºC/1000m)

Adiabática Úmida(6ºC/1000m)

Equilíbrio / Tendência

5000 -5 - -18 Estável / ⇓4000 0 - -12 Estável / ⇓3000 5 - -6 Estável / ⇓2000 10 0 - Estável / ⇓

NCC

1000 15 10 - Estável / ⇓SFC 20 20 - Atuação da Forçante

GT – Gradiente Térmico, ou Lapse Rate.

Nestes casos, a nebulosidade é estratiforme (Fig.3a).

Fig.3a – Exemplo de Estabilidade Absoluta. A parcela se resfria mais rápido que o ambiente. Sópermanece subindo devido à inércia causada pela forçante inicial que vai se amortecendo, pois aparcela tem a tendência de descer.

Exemplo de Instabilidade Condicional:

Este tipo de estabilidade ocorre sempre quando o gradiente térmico do arambiente estiver no intermédio entre os valores da razão adiabática seca e da razãoadiabática úmida, ou seja, o equilíbrio será estável enquanto o ar for seco, passandopara instável, quando o ar for saturado. Um exemplo clássico é o resfriamento pelogradiente térmico de 0,8ºC/100m, visto a seguir:

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INSTABILIDADE CONDICIONAL

ParcelaAltura (m) GT Ar Ambiente

(8ºC/1000m) Adiabática Seca(10ºC/1000m)

Adiabática Úmida(6ºC/1000m)

Equilíbrio / Tendência

6000 -8 - -4 Instável / ⇑5000 0 - 2 Instável / ⇑4000 8 - 8 Neutro / ⇔3000 16 - 14 Estável / ⇓2000 24 20 - Estável / ⇓

NCC

1000 32 30 - Estável / ⇓SFC 40 40 - Atuação da Forçante

Nestes casos, a nebulosidade é estratiforme durante a ascensão estável fria,passando para cumuliforme quando a ascensão torna-se instável e quente (Fig.3b).

Fig.3b – Exemplo de Instabilidade Condicional. A parcela se resfria mais rápido que o ambiente.Também só permanece subindo devido à inércia causada pela forçante inicial. Após o NCC (ouNCL) a parcela recebe um incremento de energia devido ao vapor estar se transformando emgotículas de água. Tal incremento passa a ser vital para a formação convectiva, a partir dos 4.000m.

Exemplo de Instabilidade Absoluta:

Dizemos que as parcelas estão em instabilidade absoluta quando, a partir daelevação inicial por uma forçante, as parcelas se resfriam a uma taxa menor que ogradiente térmico do ar ambiente. Note que a instabilidade permanece tanto na razãoda adiabática seca, quanto na razão da adiabática úmida, quando a parcela atingiu o

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NCC e inicia-se a condensação. Este tipo de instabilidade ocorre quando há fortesgradientes térmicos do ar ambiente, ou seja, dias muito aquecidos em superfície,típicos de verão.

INSTABILIDADE ABSOLUTA

ParcelaAltura (m) GT Ar Ambiente

(12ºC/1000m) Adiabática Seca(10ºC/1000m)

Adiabática Úmida(6ºC/1000m)

Equilíbrio / Tendência

4000 -8 - 8 Instável / ⇑3000 4 - 14 Instável / ⇑2000 16 20 - Instável / ⇑

NCC

1000 28 30 - Instável / ⇑SFC 40 40 - Atuação da Forçante

Nestes casos, a nebulosidade é cumuliforme ou de grande desenvolvimentovertical (Fig.3c).

Fig.3c – Exemplo de Instabilidade Absoluta. A parcela se resfria mais devagar que o ambiente emambas as taxas de resfriamento. Estas situações são as típicas representações da atmosfera propíciapara a formação de trovoadas severas.

Existem casos em que taxa de instabilidade absoluta do Lapse Rate alcançamvalores de 3,42ºC/100m. Estes são chamados de gradientes autoconvectivos.

Entenda como forçantes qualquer perturbação que auxiliou o início daconvecção, seja uma brisa, a passagem da massa de ar por orografia, um incêndio namata e até mesmo a própria lâmina de ar da superfície quando está superaquecida.

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4 – Ciclo de Vida da Trovoada

A trovoada nada mais é que a existência de células ou super células de chuvaconvectiva em estágio maduro, onde a nuvem-mãe, o Cumulonimbus está presente,sozinho, como célula isolada, ou em grupo de células, abertas ou fechadas. Porém,existe todo um processo evolutivo para isto ocorrer (Fig.4).

Fig.4 – Esquema pictórico do ciclo evolutivo de uma única célula de trovoada, conforme passam ashoras, contendo seus três estágios: Cumulus, Maduro e Dissipativo. No início, a troposferaencontra-se em uma situação totalmente instável. A trovoada, após a fase dissipativa, deixa atroposfera estabilizada.

Estágio Cumulus: as parcelas de ar são elevadas por efeitos convectivos e assim, vãoformando a nuvem quando o ar atinge o Nível de Condensação por Levantamento –NCL. Mas tal processo é contínuo e o crescimento da célula de tempestade vaiatingindo altitudes elevadas. Em uma fase bem inicial, aparecem os Cumulushumilis (ou humilde) ou Cumulus de bom tempo (Fig.5). Alguns vão crescer,passando para a fase de Cumulus mediocris (de médio, Fig.6). Estes conseguemmaior desenvolvimento formando os Cumulus congestus, aparecendo como grandestorres fofas (em aviação, são conhecidos como Tower Cumulus - TCU). Têmdiâmetro oscilando entre 3 a 8 km e altura de 5 a 8 km (Figs. 7a e 7b);

Fig.5 – A fase inicial do estágio Cumulus émarcada pela presença dos primeiros Cumulushumilis, bem na altura do NCL.

Fig.6 – Cumulus mediocris preenchem todo océu. Bases escuras denunciam maior acúmulo degotas de água.

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Fig.7a – Nuvem Cumulus congestus comgrandes protuberâncias indicando alta convecçãodentro da nuvem

Fig.7b – Fotografia de grande altitude indicandoCumulus congestus de desenvolvimento verticalacentuado. Note uma nuvem Cumulus em formade torre no centro inferior da imagem.

Estágio Maduro: Como o levantamento atinge grande altura, várias das parcelas seresfriam e mergulham de volta por dentro da própria nuvem. Neste processo,diversas correntes descendentes (de parcelas resfriadas) e correntes ascendentes (denovas parcelas levantadas e aquecidas) vão carregando gotas de água, gelo ediversos particulados. As velocidades das correntes atingem 200km/h e as colisõesentre elas podem chegar aos impressionantes 400km/h. Tais colisões são asresponsáveis pelo surgimento de carga estática dentro da nuvem. Nesta fase, osmodelos tentam explicar o que pode acontecer a seguir, porém, as comprovações sãomais difíceis de serem concretizadas. São várias situações que podem ser esperadas.A precipitação severa de saraiva, a precipitação de fenomenal aguaceiro, a formaçãode tornados ou de uma micro-explosão. Para quase todos, têm-se a certeza de quehouve perda de sustentação dentro da nuvem por levantamento. Classifica-se anuvem como Cb, imediatamente ao ser avistado um eletrometeoro (relâmpagos, porexemplo) ou ouvido um trovão (no caso, um fonometeoro). Seu diâmetro médio,como célula isolada é pouco maior que 10km, com topo entre 8 a 20km, dependendoda latitude (Fig.8);

Fig.8 – Encerra-se o estágioCumulus ao ser avistado oprimeiro relâmpago e/ou ouvido oprimeiro trovão. A partir desteinstante, a trovoada alcançou seuestágio maduro, com a presença danuvem Cumulonimbus (Cb)conhecida como nuvem-mãe. Notea aparência de bigorna no topo doCb. Este formado é característicopelo espalhamento da nebulo-sidade próximo à tropopausa.

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Estágio de Dissipação: Nesta fase, a maior parte das correntes é descendente, pois ofluxo ascendente passou para uma outra região, onde há um avanço e propagação dacélula de tempestade. Há fragmentação total da tempestade na retaguarda, comseparação do topo gelado, com Cirrus isolados (Fig.9a) e chuva leve, contínua e asvezes gelada causada por Altostratus (Fig.9b) e Altocumulus (Fig.9c) onde é maisrara. Diz-se que a atmosfera está estável, pois o NCL se elevou e alcançou o Nívelde Estabilidade Máxima – NEM, que por sua vez, desceu.

Fig.9 – Estágio de dissipação, da esquerda para a direita temos nuvens Cirrus (a) Altostratus (b) eAltocumulus (c). A troposfera estabilizou-se após o ciclo da trovoada.

Em resumo, a célula de trovoada tem a função de estabilizar a troposferaterrestre. Parte de uma condição altamente instável (ar quente embaixo e ar frio emcima) para uma situação favoravelmente estável (ar frio resfriado desceu ao perdercalor em altitude, tanto latente como sensível). Esta é conhecida como GrandeMáquina Térmica da Terra (Fig.10).

5 – Tipos de Trovoadas

As trovoadas podem ser classificadas conforme ocorrem dentro de umamesma massa de ar ou por motivo do encontro de duas massas de característicasdiferentes e, neste caso, há processos dinâmicos envolvidos (Fig.11):

Instável

Estável

Fig.10 – Esquema pictórico da Máquina Térmica da Terra. A situação instável da troposfera étransformada em uma situação estável pelo agente Trovoada. Com o passar do tempo, aestabilidade será convertida em instabilidade devido ao aquecimento e o ciclo recomeça.

Page 14: FLG 0253 – Climatologia I...Condensação por Levantamento – NCL (Fig.1d). Fig.1d – Parcela se elevou pela forçante inicial até atingir seu NCL. Neste nível, a temperatura

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5.1 Trovoadas de Massas de Ar: São as trovoadas que ocorrem dentro de umamesma massa de ar, causados por algum agente:

5.1.1 Convectivas:

Também chamadas de termais, são as trovoadas formadas por convecçãolocal devido ao forte aquecimento diurno da superfície. O ar aquece-se por contatomolecular e dispara a convecção, emanando calor por turbulência convectiva(Fig.12).

Fig.12 – Esquema pictórico e fotografia de uma trovoada térmica isolada. Note que há apenas atempestade com um ciclo de vida, dentro de uma massa de ar praticamente estático.

TROVOADAS

MASSAS DE AR DINÂMICAS

FRONTAIS

MULTI-CÉLULAS

LINHAS DEINSTABILIDADE

COMPLEXOSCONVECTIVOS DE

MESO ESCALA

CONVECTIVASOU TERMAIS

OROGRÁFICAS

ADVECTIVAS

Fig.11 – Tabela com a classificação das trovoadas, segundo os processos de formação. Seocorrem internamente às massas ou se possuem desenvolvimento por agentes dinâmicos, comciclos próprios (Multi-células, LI e CCM). As frontais são consideradas um caso especial dasdinâmicas devido somente ao encontro entre massas de ar distintas.

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5.1.2 Orográficas:

São as trovoadas que surgem pelo escoamento forçado do ar em direção àuma montanha ou serra. O movimento mecânico, forçando o ar a subir as escarpas,forma nuvens à barlavento da montanha, ocasionando forte precipitação einstabilidade. Turbulência é esperada à sotavento da montanha (Fig.13).

Fig.13 – Esquema pictórico e fotografia de uma trovoada orográfica. As células de tempestade seformam à barlavento da montanha, sentido do fluxo ascendente.

5.1.3 Advectivas:

Ajudam a formar as trovoadas quando o ar pouco mais frio desloca-se porbaixo de ar mais aquecido. Este processo apenas inicia a convecção. Ocorreprincipalmente quando o ar passa sobre águas oceânicas aquecidas. A parte inferiorserá aquecida por contato e dispara a convecção, extremamente úmida. Ocorremnormalmente no período noturno, em madrugadas de inverno, mais fracas que astermais e mais raras que as outras trovoadas (Fig.14).

Fig.14 – Esquema pictórico e fotografia de uma trovoada advectiva. A célula de tempestade seformou pelo deslocamento horizontal do ar sobre uma grande massa de água em superfície. Afotografia é interessante pelo fato de conseguir mostrar todos os estágios desta célula ocorrendo natroposfera, partindo de uma situação instável (à direita da fotografia) para uma estável (à suaesquerda) mostrando a característica de nuvem-mãe deste Cb.

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5.2 Trovoadas Dinâmicas: São as trovoadas que se formam pelo encontro demassas de ar diferentes. Normalmente estão associadas à sistemas frontais,ocorrendo em qualquer época do ano, já que os sistemas operam em todas asestações. Também podem surgir em qualquer horário, independendo das condiçõesde aquecimento em superfície. As vezes são disparadas por circulação de ventossecundários, como brisas vale-montanha, terrestre e do mar e ventos anabáticos (quesobem montanhas) e catabáticos (que descem montanhas).

5.2.1 Frontais:

Trovoada associada diretamente ao avanço da região frontal. Muito fortequando o avanço é da Frente Fria e mais fraco quando o avanço é da Frente Quente(Fig.15).

Fig.15 – Esquemas pictóricos das trovoadas frontais. As células de tempestade se formam pelodeslocamento da massa de ar frio por baixo da massa de ar quente, forçando a sua ascensão. Quantomais abaulada for a região frontal fria, mais severas serão as trovoadas associadas ao deslocamento.

5.2.2 Dinâmicas Separadas da Região Frontal:

5.2.2.1 Multi-células:

Sistema de trovoadas onde existem células de tempestade em estágios diferentes deevolução, mas conectados de alguma maneira. Normalmente não passam de 3 a 4células em estágios distintos (Fig.16).

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Fig.16 – Esquema pictórico e fotografia de uma trovoada multi-células. Note que há umainterconexão na base das células distintas da trovoada. Na fotografia, vemos uma das células noestágio maduro, ao centro.

5.2.2.2 Linha de Instabilidade – LI:

Sistema organizado de células de tempestade em forma de linha. Ocorrecomo pré-frontal devido ao rápido avanço da Frente Fria, algumas ondasatmosféricas caminham mais rápido na vanguarda e desencadeiam sistemasconvectivos intensos, alinhados e que surgem a qualquer hora. São as trovoadasmais violentas, ainda piores que as causadas pela Frente Fria (Fig.17). Temdeslocamento próprio, normalmente como batedores da frente e mais de um ciclo devida, podendo permanecer por dias. As suas células de chuva são normalmenteindependentes, mas com deslocamento perfilado (Fig.18).

Fig.17 – Esquema pictórico e fotografia de nave espacial de uma Linha de Instabilidade. Esta é umalinha causada pelo deslocamento frontal. Na fotografia, pode-se notar uma sombra (parte inferior daLI) causada pelos topos dos Cb’s, em forma de bigorna, presentes em sua composição.

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Fig.18 – Uma Linha de Instabilidadenão causada pelo deslocamentofrontal, mas por ventos Alíseos quesopram de Leste, região Norte doBrasil. A LI estudada perdurou porquase dois dias e se deslocou mais de2.000km, com penetração profundana Amazônia. Estes sistemas sãomuito comuns na região.

5.2.2.3 Complexo Convectivo de Meso Escala – CCM:

São aglomerados circulares, compostos por sistemas organizados de célulasde tempestade severa, as vezes chamados de super-células (Fig.19). Suas células têmmais ciclos de vida que as demais células de tempestade. Possuem uma área tãoextensa que podem cobrir estados inteiros ou mais (Fig.20) principalmente seestiverem imersos em um meso ciclone, onde as células de chuva ficam bempróximas, em um processo de retroalimentação contínuo e severo.

Fig.19 – Um CCM com super-células detrovoadas se aproxima de uma cidade. Note queneste tipo de tempestade, praticamente não háespaço entre as suas células, identificando umprocesso extremamente conectado de seusestágios de evolução.

Fig.20 – Imagem de satélite com filtro dedestaque colorido para pixels (picture cell oupicture element – pontos digitais da imagem)com grande brilho. Uma das características dastrovoadas é terem topos brilhantes e basesescuras, já que a luz não consegue passar portamanha massa de gotas e gelo. Estacaracterística é uma ferramenta que auxilia naidentificação das tempestades severas. Nestecaso, um CCM que cobre vários estados, nosE.E.U.U.

No Brasil, o surgimento de CCM’s ocorre principalmente pelo efeito dosAndes, na região Sul e Sudeste e pelos ventos Alíseos, na região Norte (Fig.21).

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Fig.21 – Climatologia dinâmica dos ComplexosConvectivos de Meso Escala que atingem aAmérica do Sul. Note que as principaisocorrências estão intimamente ligadas à presençada cordilheira dos Andes, pois esta cria umagrande perturbação em forma de onda, quando oescoamento básico de Oeste transpõe asmontanhas.

6 – Agentes da Trovoada

Uma trovoada não existe enquanto não surgir a nuvem Cumulonimbus,portanto, esta é a principal agente da trovoada. A partir deste instante, quando anuvem-mãe está formada, todos os outros fenômenos são possíveis, com maior oumenor severidade.

6.1 Precipitações: São fortes, principalmente na retaguarda da trovoada, quandoesta se desloca, causando fenomenal aguaceiro, perda de visibilidade e ocorrênciasde granizo (Fig.22). As precipitações vão diminuindo conforme a trovoada passa,terminando com chuva leve na área dissipativa.

Fig.22 – Precipitação líquida, considerada chuva forteacompanha do centro à retaguarda da trovoada. Podeestar acompanhada de granizo ou outros fenômenosderivados de ventos.

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6.1.1 Chuva:

A quantidade de água que precipita em uma trovoada é suficiente para esgotara taxa de absorção de qualquer tipo de solo. Em superfícies impermeabilizadas,como as encontradas nas cidades, provocam grande vazão no escoamentosuperficial. Esta vazão, correndo para regiões rebaixadas, formará enchentesdurante a chuva ou ulteriormente próximo à elas (Fig.23a). Níveis de rios que sobemhoras ou dias depois de chuvas intensas são considerados inundações (Fig.23b).

Fig.23a – Exemplo de enchente. A chuva malterminou e a superfície não dá vazão à águaprecipitada, acumulando-se nos rebaixos dorelevo.

Fig.23b – Exemplo de inundação. A chuva jáencerrou-se há tempo ou nem ocorreu sobre aregião, mas a vazão da bacia hidrográfica foiacumulando a água com o tempo para a várzea.

6.1.2 Granizo:

Formado pelas gotas que se congelam, primeiramente na sua superfície, comobordeados de gelo, chamados embriões de granizo (Fig.24). Conforme ficam sob ainfluência das correntes ascendentes e descendentes, conseguem ter umcongelamento mais profundo e até mesmo agregar-se a mais gotas ou sublimarvapor. Serão granizos se os precipitados tiverem até 5mm. Acima disto sãoconsiderados saraiva (Fig.25). Começam a se formar sempre acima da linha decongelamento em altura (linha do zero graus Celsius).

Fig.24 – Esquema pictórico da formação dogranizo. Normalmente iniciam-se por umcongelamento superficial em forma de bordeadosde gelo que, conforme permanecem mais tempoacima da linha de 0ºC, congelam-se emprofundidade. A dado momento, ou sãoarrastados pelas correntes descendentes ou caempelo próprio peso. Neste último caso, vencem asustentação dada pelas correntes ascendentes.

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Fig.25 – Fotografia de uma pedra de saraiva (grande granizo). À direita vemos a mesma fotografiasob filtro azul para enfatizar os diversos níveis de congelamento que este precipitado sofreu durantesua trajetória dentro da trovoada (anéis). Ao final, quando caiu, ainda arrastou gotas que podem serobservadas agregadas na casca da saraiva. A maior saraiva registrada tinha massa de 1.800g.

6.2 Ventos: São muito intensos na trovoada e causam diversos fenômenosassociados à grande destruição em superfície e geração de eletricidade atmosférica,dentro do Cb. As térmicas, no início, sobem na razão de 10m/s ou 36km/h. Essarazão cresce absurdamente com a intensificação da convecção, podendo chegar aimpressionantes 200km/h. Ao atingir a tropopausa, as parcelas estão extremamentefrias e secas (pois perderam toda a sua umidade para formar gotas e cristais de gelo).A dado momento, iniciam-se também as correntes descendentes dentro da célula detempestade. A associação das duas correntes formarão fenômenos particulares dastrovoadas:

6.2.1 Frentes de Rajadas:

São ventos das correntes descendentes que, ao invés de descerem pela regiãocentral, com destino à retaguarda da trovoada, fazem exatamente o oposto: avançampara a região de vanguarda, muito próximos à superfície, pois são mais frios que ascorrentes ascendentes quentes, que alimentam o processo convectivo na região devanguarda da trovoada. São contínuos e sopram de maneira moderada, dificilmenteacompanhados de chuva (Fig.26). A região de inversão entre as duas correntes quese cruzam abaixo da linha da nuvem, formam cisalhamentos perigosos (ventos comdiferentes velocidades em diferentes alturas). A nuvem rolo, que se forma navanguarda da trovoada é um exemplo da onda gerada devido ao cisalhamento(Fig.27).

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Fig.26 – Esquema pictórico da frente de rajada.Note como a corrente descendente desvia-se, emsuperfície, para a vanguarda do sistema. Aperturbação entre as duas correntes forma anuvem rolo.

Fig.27 – Exemplo de nuvem rolo em céutempestuoso. Esta região da trovoada tem fortecisalhamento horizontal dos ventos, comdiferentes velocidades em diferentes alturas.

6.2.2 Downbursts – Microbursts e Macrobursts:

Foram consideradas teoricamente a partir de 1970 por Fujita (ver Tornadosneste texto). Embora os meteorologistas ortodoxos da época não aceitassem suasteorias, mais tarde elas foram comprovadas. As Downbursts são conhecidas pelosúbito desabamento de ar frio pelo interior da nuvem Cb que se acumulou no seutopo. Este ar frio pertencia às parcelas de ar ascendentes que foram resfriando eperdendo sua umidade durante o processo ascensional. A dado momento, asustentação desta enorme massa de ar fica impraticável e daí, despenca em direção àsuperfície (Fig.28). Elas podem ser pequenas, denominadas de micro-explosões(microbusrts) ou grandes, macro-explosões (macrobursts). São diferentes das frentesde rajadas porque têm um tempo de existência curto, de poucos segundos, não maiorque um minuto. Suas velocidades também são muito maiores.

Fig.28 – Esquema pictórico da micro-explosão.A velocidade de descida pode alcançar 400km/h,dependendo do tamanho da massa fria e seca. Aoaproximar-se da superfície, o desabamento de arvira, normalmente para um dos lados, destruindotudo que estiver à sua frente, suscetível à forçada velocidade exercida pela massa de ar. Carros,casas, árvores e muros são derrubados. Osdestroços ficam alinhados em um único sentido.Sua ocorrência pode ser extremamentelocalizada.

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As micro-explosões podem ser úmidas, quando carregam gotas de chuva(Fig.29), ou secas, quando ocorrem sem nenhum traçador durante a queda (Fig.30).Os danos em superfície são grandes, normalmente muito localizados (Fig.31).

Fig.29 – Exemplo de uma micro-explosãoúmida. As gotas de água servem como traçadordo fenômeno, ajudando a identificar suaocorrência.

Fig.30 – Diferentemente da micro-explosãoúmida, a seca não pode ser identificada, nemmesmo a curto intervalo de tempo. Só pode servista quando já está ocorrendo, como neste caso,no aeroporto John F. Kennedy, E.U.A., 1984.

Fig.31 – Fotografias de micro-explosão ocorrida na represa do Guarapiranga, região Sul da cidadede São Paulo, 1999. Diferentemente dos tornados, que deixam os destroços espalhados em círculospela superfície, as micro-explosões mantêm o rastro da destruição alinhados, em uma única direção,identificando a área atingida e sentido do deslocamento do desabamento de ar.

6.2.3 Windshears:

Conhecidas como cortante de vento ou tesouras de vento, os windshearsocorrem próximos das trovoadas, mas sem uma área pré-definida. Sua característicaé de alto cisalhamento do vento (semelhante às frentes de rajadas), porém, além devariar a velocidade dos ventos, variam-se também sua direção e sentido. Ofenômeno é particularmente perigoso para as aeronaves, principalmente emoperações de decolagem e pouso, pois provocam a perda de sustentação nas asas,causando a sua queda abruptamente (Fig.32).

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Fig.32 – Esquema pictórico de um windshearocorrendo próximo ao solo. Ao receber vento depopa (cauda) qualquer aeronave, nesta situação,perde sustentação e terá queda balística, nãoimportando a potência que solicite aos motores.A maior tragédia registrada na aviação ocorreuem 1991, com quase 200 vítimas fatais.

6.2.4 Tornados:

Fenômeno que varia da micro até meso escala, os tornados são dutos desucção, gerados por altíssimos gradientes de baixa pressão no interior e base danuvem. Os processos que disparam os tornados ainda não são completamenteentendidos. Muitos tornados são gerados por alto cisalhamento vertical entre ascorrentes ascendentes e descendentes. Outros podem ser gerados pela deriva demicro-explosões. Há também os grandes tornados que estão associados aos mesociclones. O que pode-se afirmar com mais certeza é que o alto gradiente de pressãogera um ponto de singularidade na atmosfera (lembrar da explanação sobre osburacos negros, Astronomia). Como a pressão é muito baixa no seu centro(aproximadamente 800mb), o ar atmosférico ao redor (+/-1000mb), tende a supriresta deficiência, tentando dar uma continuidade mais aceitável ao campo de pressão.Neste instante, toda a massa de ar circula o núcleo, “aguardando” a sua vez decontribuir para a extinção do alto gradiente. Enquanto isto não ocorre, tudo queestiver ao seu alcance será deslocado, conforme variar a força do vento. Por se tratarde um fenômeno ciclostrófico (os agentes gradiente de pressão e centrífugo sãomajestosamente maiores que Coriolis ou qualquer outra componente) o giro dotornado poderá ser horário ou anti-horário, independentemente do hemisfério.Podem ser até mesmo contra-rotores, em caso de gêmeos. Só são consideradostornados quando tocam o solo. Até lá, são denominados nuvem funil, pois abaixíssima pressão permite com que o vapor se condense imediatamente.Normalmente ocorrem na base da nuvem, conhecida como nuvem parede (Fig.33).

Fig.33 – Esquema pictórico do surgimento deum tornado na base da trovoada. Normalmenteocorrem da área central até a retaguarda dacélula de tempestade, onde o cisalhamento dovento ou gradientes de baixíssima pressão geramum ponto de singularidade atmosférica. O ar, aoredor, tende a soprar no sentido do seu núcleopara tentar estabelecer um gradiente aceitável.Enquanto não toca o solo, é considerado apenasnuvem funil. Podem surgir também de nuvensrotoras e de meso ciclones.

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O maior estudioso de tornados foi o Dr. Tetsuya Theodore Fujita, japonêsnaturalizado norte-americano após a Segunda Guerra Mundial, falecido em 1998.Prof. Ted, como era conhecido, fez inúmeros trabalhos, tanto teóricos comoexperimentais no campo das trovoadas, furacões e aviação. É dele a famosa escalaFujita que classifica os tornados pelo seu poder destrutivo em superfície, nãoconsiderando o tamanho dos dutos como uma fonte confiável de determinação desua força, já que muitos tornados podem variar de diâmetro, sendo da mesma força.Fujita determinou que a atmosfera da Terra teria energia no seu estado básico paragerar, no máximo, um tornado F5 (sua escala vai de 0 a 12, porém limita-se ao F6,sendo este, inconcebível). Diferentemente de atmosferas de outros planetas, como osgigantes gasosos Jovianos: Júpiter, Saturno, Urano e Netuno (este último temnuvens supersônicas). A denominação da sua escala é dada na tabela a seguir:

ESCALA FUJITA DE FORÇA DOS TORNADOS (1971)

Descritivo Força Fujita Veloc. Inicial (M/h) Veloc. Final (M/h)

Leve F0 40 73Moderado F1 73 112Considerável F2 113 157Severo F3 158 206Devastador F4 207 260Incrível F5 261 318Inconcebível F6 319 379

A tabela registra valores em milhas por hora. Para se obter os valores emkm/h, basta multiplicar os números por 1,852.

Para saber mais:No final da década de 1970 e início da década de 1980, Dr. Pearson fez uma avaliação estatística,observando diversos tornados para tentar relacionar a força Fujita com a espessura dos seus dutos. Porém,avaliar tornados por Pearson gera grandes dificuldades: 1º) Precisa-se filmar ou pelo menos tomar váriasfotografias para se avaliar qual categoria o tornado atingiu. 2º) As superfícies possuem tipos diferentes demateriais, uns serão suspensos mais facilmente que outros e isso poderá alterar a precisão da avaliação.3º) Há a necessidade de um observador. A própria escala surgiu por comparações do que se via com o que sedestruiu após o evento. Além destes problemas, a Natureza não segue regras e estabelecer medidas para adefinição da força Fujita pode ser interpretado como mera especulação, sendo apenas uma estimativapróxima da realidade. A escala Fujita é, sem dúvida, a única que avalia precisamente a força que ofenômeno alcançou, observando-se a destruição em superfície. Abaixo segue o complemento de Pearson:

Fujita Pearson Mínima Largura (m) Máxima Largura (m)F0 P0 --- Menor que 15F1 P1 15 50F2 P2 51 160F3 P3 161 500F4 P4 501 1.500F5 P5 1.501 5.000

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Alguns exemplos de tornados aparecem nas Figs. 34 e 35. É importantelembrar que os ventos ao redor do tornado estão girando, mesmo que não aparentem,já que ainda têm pouca velocidade e não elevam grandes objetos. Suas velocidadesaumentam conforme se aproximam do núcleo.

Fig.34 – Tornado F2 despedaça uma estrutura,E.U.A.. Note a presença da nuvem parede, notopo do tornado.

Fig.35 – Tornado F5 arranca tudo que estiver nasuperfície, incluindo o próprio asfalto derodovias.

Para saber mais:Tornados, quando ocorrem sobre massas de água (lagos ou oceanos) são chamados de Trombas D’água. Suacomposição é feita pela sucção do líquido na base. Este efeito faz com que ele se movimente menos, pois aágua é muito mais densa e pesada para ser elevada em grande quantidade, consumindo boa parte da suaenergia cinética. Na superfície do líquido pode-se notar o giro do ar ao redor do núcleo (esquerda).

Alguns fenômenos conhecidos por Dust Devils, Diabinhos ou Sacis não são tornados! São simplesmenterodamoinhos que ocorrem por elevação brusca do ar convectivo ou efeitos do deslocamento do ar sobreobstáculos. Ocorrem mesmo dentro de um quintal de residência, onde as paredes ou muros forçam acirculação do ar (direita).

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6.3 Eletrometeoros: São os fenômenos meteorológicos de natureza elétrica. Quase atotalidade deles está associada à presença da nuvem Cb ou condições tempestuosas.

6.3.1 Relâmpagos:

Ocorrem quando o ar atmosférico perde suas propriedades isolantes. Nesteinstante, uma emanação de elétrons tenta vencer o isolamento e se isto ocorrer, umraio precursor, invisível, será lançado do centro negativo para o centro positivo, nãoimportando se os centros estão dentro da própria nuvem, se estão em nuvensdiferentes ou se um está na nuvem e outro no solo, por efeito de indução da nuvem àsuperfície (Fig.36). Quando este raio precursor completar o circuito (emnanossegundos) uma fenomenal quantidade de carga elétrica será lançada. Adiferença de potencial (D.D.P.) chega a milhares e até milhão de Volts e a correntepode alcançar 100.000 Ampères. A temperatura do relâmpago está na ordem de 15 a25 mil graus Celsius (cinco vezes mais quente que a superfície do Sol). Fenomenalcalor gera um pulso mecânico no ar, por dilatação. O estrondo é chamado Trovão,possuindo todas as freqüências sonoras, sendo que as mais agudas são ouvidas noslocais próximos da descarga e as mais graves, ao longe, por propriedades mecânicasdo deslocamento das ondas na atmosfera. São essenciais à manutenção da vida naTerra, pois geram quantidades colossais de bases nitrogenadas que servirão, aoprecipitar com a chuva, como adubos naturais.

Fig.36 – Esquema pictórico do sentido de propagação das descargas elétricas. Note que são oselétrons que se movem. Centros positivos são formados pela ausência de elétrons. 1 – Direção dofluxo de Elétrons; 2 – Descargas difusas do topo da nuvem para a Estrato/Ionosfera (Sprites e BlueJets); 3 – Nuvem para nuvem, do Centro (-) Centro (+); 4 – Centro da nuvem, Base (-) Topo(+); 5 – Descargas contra o céu; 6 – Relâmpago típico contra o solo; 7 – Centro da nuvem contraum Ponto (+); 8 – Fogo-de-Santelmo; 9 – Relâmpago do solo contra as nuvens.

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Ocorrem, em média 100 descargas por segundo, em todo o planeta. Os tiposprincipais são zigue-zague (Fig.37), ramificado (Fig.38) e lampejo (Fig.39). Existemoutros mais raros de se observar, como o relâmpago esférico (chamado bola,ilustrado na Fig.40), torpedo e perolado, amplamente estudados, com registros deocorrências, testemunhos e em alguns casos, até fatais.

Fig.37Relâmpago Zigue-zague.

Fig.38Relâmpago Ramificado.

Fig.39Relâmpago Lampejo.

Fig.40 – Esquema pictórico dos relâmpagos bola. O tamanho pode variar de 10cm a 1 metro.Podem surgir inclusive dentro de residências. Suas cores características são: A – Vermelho;B – Amarelo; C – Laranja e D – Azul claro, este último, o mais brilhante e explosivo.

6.3.2 Fogo-de-Santelmo:

Diferente dos relâmpagos, o Fogo-de-Santelmo é uma emanação elétrica,com barulho chispóreo, que se propaga pelo ar em situações de tempestadeseminentes ou sob a base das nuvens de trovoadas. Por algum motivo, o aratmosférico está mais condutivo à eletricidade, portanto, ao invés da superfície secarregar, como um capacitor e depois faiscar em forma de relâmpago, ela vaiemanar (ou receber) os elétrons de forma contínua. Ocorrem com mais freqüênciano mar, nos mastros dos navios, daí o seu nome, Saint Elme, padroeiro dosmarinheiros, que evocavam seu nome, durante as tempestades. Como os relâmpagos,ocorrem pelo poder das pontas. A coloração normalmente é azul, descarga negativa,porém pode ser vermelha, neste caso, recebendo carga (Fig.41).

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Fig.41 – Esquema pictórico do Fogo-de-Santelmo. Emanações de elétrons são azuis, emforma de fogo e recebimento, vermelhos, emforma de pincel.

Surgem em superfícies metálicas, pontas de árvores coníferas, mastros ecumes de montanhas pontudas (Fig.42).

Fig. 42 – Esquema pictórico de ocorrências deFogo-de-Santelmo. Podem circular, como oexemplo, em torres metálicas (I, II e III) ou ficarestáticos (IV).

6.3.3 Sprites e Blue Jets:

Recentemente descobertos, com o advento dos imageadores modernos desatélites, os Sprites e Blue Jets são descargas que ocorrem do topo da nuvem Cb,caminhando pela estratosfera, em sentido à ionosfera baixa. Pelo observado até opresente momento, ocorrem imediatamente após um relâmpago, interno ou na baseda nuvem. Pela coloração, Sprites são vermelhos (devem receber elétrons) e BlueJets, como o próprio nome sugere, são azuis e devem emanar elétrons. A aparênciade um Sprite, é literalmente de um espirro, semelhante ao lançar de uma rolha degarrafa de champagne e o Blue Jet, um espalhamento azul em forma de bolha,surgindo bem no topo da nuvem Cb (Fig.43).

Fig.43 – Rara fotografia de ocorrência de Sprites com Blue Jets.

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7 – Considerações Finais

Nosso estudo das trovoadas objetivou mostrar a importância deste fenômenopara a região tropical e sub-tropical do planeta, onde os processos térmicos ocorrempela troca de energia na vertical em grandes proporções, por uma entidade quedissipa a energia recebida pelo Sol, transportando esta carga da superfície para otopo da troposfera. Em resumo, vimos:

A entidade meteorológica que faz esse papel chama-se trovoada, composta pelanuvem Cumulonimbus (Cb) ou nuvem-mãe. Ela possui um ciclo de vida de trêsestágios: Cumulus, Maduro e Dissipativo;

As trovoadas existem devido a convecção, portanto, são responsáveis pelotransporte de grande quantidade de energia térmica da superfície para a tropopausa;

Durante este processo, literalmente fazem a troposfera “borbulhar”; Surgem pela instabilidade da troposfera, com ar quente embaixo e ar frio em

cima. Durante o processo, vão dando estabilidade nesta camada atmosférica e, aofinal, deixam-na totalmente estável, pronta para um novo ciclo;

A atuação das trovoadas vai se reduzindo, conforme se aumentam os graus delatitude (Fig.44). Nas latitudes médias e além destas, começam a surgir outrosfenômenos, abordados na aula sobre ciclones extratropicais;

Por necessitarem de grandes gradientes térmicos locais para fomentar aconvecção, as trovoadas ocorrem mais, climatologicamente, sobre os continentes doque sobre os oceanos (Fig.45);

Uma grande quantidade de energia é transformada em eletrometeoros. Estaquantificação ainda está em estudo e é desconhecida (Fig.46).

Os processos de dissipação de energia de uma explosão nuclear, uma pluma deerupção vulcânica e um Cumulonimbus são idênticos para a troposfera. Só hámudança no tempo de dissipação, dada a forma como a energia é liberada naatmosfera (Fig.47).

Para saber mais:• Os relâmpagos são emanações de elétrons que tentam vencer o isolamento do ar. Para isto, procuram

a menor distância possível e os melhores condutores que encontrarem pelo caminho. Todas assuperfícies pontudas auxiliam nesta tarefa, bem como as que estiverem mais elevadas, em relação aoredor próximo. Portanto, abrigar-se embaixo de árvores não é uma boa idéia, já que elas serão pontosfavoráveis de indução da carga elétrica;

• O mito de que um relâmpago não cai no mesmo lugar é totalmente falso! Precisamente o oposto, poiscomo a área atingida pelo relâmpago está fortemente ionizada, terá preferência em ser atingida pelapróxima descarga;

• O faiscar do relâmpago não é único. Normalmente varia de 1 a 4, com recorde registrado de 16. Napróxima tempestade, note o cintilar de alguns relâmpagos do tipo Zigue-zague;

• Estando desabrigado, durante uma tempestade, livre-se de objetos metálicos presos ao corpo eescolha regiões mais baixas para aguardar. Se estiver muito desabrigado, monte seu próprio pára-raios e mantenha-se relativamente afastado.

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Fig.44 – Exemplo de observaçõesde trovoadas ao redor do mundo.Note que o número de ocorrências émaior nas latitudes baixas,reduzindo conforme se aumentam aslatitudes. Na faixa tropical doplaneta, a troposfera é muito maisconvectiva. Tais observações sãofeitas pelos novos sensores derelâmpagos embarcados nasplataformas espaciais, como o OTD(esquerda, abaixo).

Fig.45 – Outro exemplo deobservações de trovoadas,neste caso, enfatizando omaior número de ocor-rências sobre os conti-nentes. Sensores como oLIS (abaixo) embarcadosem satélites, são ótimasferramentas para localizaras células de tempestades,medindo a densidade derelâmpagos pelo seu brilho.

Entrada de100 %

de EnergiaTérmica

Elétrica Mecânica

Fig.46 – Esquema pictórico do Balanço de Energia e as transformações ocorridas após atrovoada. A nuvem Cumulonimbus é um agente que dissipa 100% da entrada de energia inicialem outras energias, como a térmica (em altos níveis ou outros processos), a mecânica, a elétricaetc. A quantificação da “fatia do bolo” de cada uma destas transformações é aindadesconhecida.

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Ricardo Augusto FelicioB.Sc. Meteorologista – USPM.Sc. Meteorologia Antártica – INPEDr. Climatologia Antártica – FFLCH – DGF – USP

Correio eletrônico: [email protected]

Fonte:Meteorologia Operacional para Pilotos – 2005Ricardo Augusto FelicioRegistro na Fundação Biblioteca Nacional n. 360.744 livro 666 folha 404

0,1s 1s 1min 1h 5h 7hFig.47 – Esquema pictórico dos processos de dissipação de energia de uma explosão nuclear,plumas de erupções vulcânicas e um Cumulonimbus. Todos são idênticos para a troposfera,mudando apenas o tempo de dissipação, dada a forma como a energia é liberada na atmosfera.