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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ (UNIOESTE) CAMPUS DE TOLEDO CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS PROGRAMA STRICTO SENSU EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL E AGRONEGÓCIO FLÁVIO DE MATOS ROCHA CONSÓRCIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E DESENVOLVIMENTO LOCAL (CONSAD): ANÁLISE DE MÚLTIPLOS FLUXOS DO CONSAD IGUATEMI-MS TOLEDO - PR 2012

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO OESTE DO PARANÁ

(UNIOESTE)

CAMPUS DE TOLEDO

CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS

PROGRAMA STRICTO SENSU EM

DESENVOLVIMENTO REGIONAL E AGRONEGÓCIO

FLÁVIO DE MATOS ROCHA

CONSÓRCIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E

DESENVOLVIMENTO LOCAL (CONSAD): ANÁLISE DE

MÚLTIPLOS FLUXOS DO CONSAD IGUATEMI-MS

TOLEDO - PR

2012

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FLÁVIO DE MATOS ROCHA

CONSÓRCIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E

DESENVOLVIMENTO LOCAL (CONSAD): ANÁLISE DE

MÚLTIPLOS FLUXOS DO CONSAD IGUATEMI-MS

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em

Desenvolvimento Regional e

Agronegócio da Universidade Estadual do

Oeste do Paraná – Campus de Toledo,

como requisito parcial à obtenção do

título de Mestre.

Orientadora:

Profª. Drª. Zelimar Soares Bidarra

TOLEDO – PR

2012

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Catalogação na Publicação elaborada pela Biblioteca Universitária

UNIOESTE/Campus de Toledo.

Bibliotecária: Marilene de Fátima Donadel - CRB – 9/924

Rocha, Flávio de Matos

R672c Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento

Local (CONSAD) : análise de múltiplos fluxos do CONSAD

Iguatemi-MS / Flávio de Matos Rocha. – Toledo, PR : [s. n.],

2012.

156 f.

Orientadora: Profa. Dra. Zelimar Soares Bidarra

Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento Regional e

Agronegócio) - Universidade Estadual do Oeste do Paraná.

Campus de Toledo. Centro de Ciências Sociais Aplicadas

1. Segurança alimentar – Iguatemi-MS 2. Política

alimentar – Iguatemi-MS 3. Nutrição – Aspectos políticos 4.

Políticas públicas 5. Desenvolvimento regional EI. Bidarra,

Zelimar Soares, Orient. II. T

CDD 20. ed. 338.198171

363.8098171

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FLÁVIO DE MATOS ROCHA

CONSÓRCIO DE SEGURANÇA ALIMENTAR E

DESENVOLVIMENTO LOCAL (CONSAD): ANÁLISE DE

MÚLTIPLOS FLUXOS DO CONSAD IGUATEMI-MS

Dissertação apresentada ao Programa de

Pós-Graduação Stricto Sensu em

Desenvolvimento Regional e

Agronegócio da Universidade Estadual do

Oeste do Paraná – Campus de Toledo,

como requisito parcial à obtenção do

título de Mestre.

COMISSÃO EXAMINADORA

Orientadora: Drª. Zelimar Soares Bidarra Universidade Estadual do Oeste do Paraná/

Campus de Toledo

Dr. Antonio César Ortega

Instituto de Economia/Universidade Federal de Uberlândia

Dr. Jefferson Andronio Ramundo Staduto Universidade Estadual do Oeste do Paraná –

UNIOESTE/ Campus de Toledo

Toledo, 24 de maio de 2012

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À família e aos amigos,

por acreditarem nos meus sonhos e

mostrar que isto é tudo que preciso

para realizá-los.

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Agradecimentos

À professora orientadora Zelimar Soares Bidarra, pela construção deste trabalho, pois

não se resumiu a orientações, mas sim, diálogos e aprendizados que me acompanham.

A CAPES e ao Programa de Desenvolvimento Regional e Agronegócio da Universidade

Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Toledo, pelo auxílio financeiro.

Aos amigos da 8ª turma de mestrado, pela convivência, troca de experiência e

aprendizado, por que: “Só existem duas maneiras de uma pessoa aprender: lendo, ou se

relacionando com pessoas mais inteligentes.”.

Aos amigos de caminhada, Bruno Astolphi Montagnhani e Ricardo de Lemos Dutra, há

alguns anos nessa estrada.

Aos amigos que me apoiam mesmo distante: Lucas Cogo Araújo, Gabriel

Gualhanone Nemirovsky e Paulo Vinícius da Silva Raimundo.

Aos amigos que de perto me apoiaram, incentivaram e proporcionou bons momentos:

Nelinho Graef, Vanessa Sala e Alessandra Caumo.

Aos professores do Programa de Desenvolvimento Regional e Agronegócio da

Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de Toledo, não só pelo

aprendizado, mas pelas inspirações e diálogos realizados. Em especial Jandir F. de

Lima, Jefferson A. R. Staduto e Mirian B. S. Braun.

Ao professor Pery F. A. Shikida, que além das contribuições relativas à academia, nos

auxiliou em momentos que precisamos.

À Clarice Theobald Stahl, secretária/assistente do Programa de Desenvolvimento

Regional e Agronegócio da Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus de

Toledo, pela prestatividade de sempre.

Aos integrantes do CONSAD Iguatemi – MS, pela colaboração na pesquisa, em

especial à Hilva Aparecida Silva, que mesmo em face de problemas de saúde viabilizou

a pesquisa.

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“A alma da fome é política”

(Betinho)

"Se a miséria de nossos pobres

não é causada pelas leis da natureza,

mas por nossas instituições,

grande é o nosso crime"

(Charles Darwin - A Viagem do Beagle)

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ROCHA, F. M. Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local

(CONSAD): análise de Múltiplos Fluxos do CONSAD Iguatemi - MS. 2012. 156 f.

Dissertação (Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, Mestrado e Doutorado em

Desenvolvimento Regional e Agronegócio) – Centro de Ciências Sociais Aplicadas,

Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus Toledo.

RESUMO

O Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD) tem

recebido demasiada ênfase política e acadêmica por ser tratar de uma “novidade” no

campo das políticas setoriais. O CONSAD é caracterizado por uma institucionalidade

diferenciada, se apresenta na interseção da política de segurança alimentar com o

desenvolvimento local e o desenvolvimento territorial, e estabelece como um de seus

princípios a participação institucionalizada da sociedade civil. E não se pode descartar o

potencial destes consórcios como agentes de mudança de estruturas locais arcaicas,

concentradoras de renda e com processos de desenvolvimento excludente. O objetivo

desta dissertação é analisar como surgiu e se institucionalizou o CONSAD enquanto

política pública no contexto da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

(PNSAN). Organizou-se o trabalho em três perspectivas. A teórica, através do modelo

de Múltiplos Fluxos, abordando o processo de construção e formação da PNSAN. A

temática, situando a emergência do CONSAD numa perspectiva institucional,

analisando os mecanismos que possibilitaram a consolidação desta Política e de seu

formato - consórcio público que funciona através da estrutura de um conselho gestor. E

a empírica, realizando um estudo de caso do CONSAD Iguatemi - MS. Dentro dos

resultados encontrados tem-se que o alcance dos objetivos do CONSAD Iguatemi - MS

fica sujeito às restrições operacionais, vinculadas à falta de recursos, aos problemas

organizacionais encontrados, alguns advindos da própria estrutura imposta pelo desenho

institucional do programa. A ausência de efetividade da atuação dos seus membros, a

falta de experiência e qualificação dos conselheiros para assumirem funções de controle

e proposição de políticas no Fórum, são consideradas os problemas centrais. Como

conclusão, para enfrentar esses obstáculos faz-se necessário dotar membros e

conselheiros do CONSAD Iguatemi – MS de capacitação para os processos

participativos, de capacitação para entender os mecanismos institucionais do

funcionamento de um Consórcio, de instruí-lo para buscar parcerias e financiamento

para as ações do Consórcio. Outra constatação relevante revela que a ausência do MDS

quer na articulação entre governos estaduais e o Consórcio, quer na liberação de

recursos, limita o desenvolvimento desta política, e se esta ausência se perpetua, corre-

se o risco de se esvaziar esta política.

Palavras-chave: CONSAD, Políticas Públicas, Modelo de Múltiplos Fluxos

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ROCHA, F. M. Consortium for Food Security and Local Development (CONSAD):

Multiple Stream analysis of the CONSAD Iguatemi -MS. 2012. 156 f. Dissertation

(Program of Pos-Graduate Stricto Sensu, Master in Regional Development and

Agribusiness) - Center of Applied Social Sciences, State University of West of

Paraná – Campus Toledo.

ABSTRACT

The Consortium for Food Security and Local Development (CONSAD) has received

too much emphasis in academic and policy environment as it´s "novelty" in the field of

sectoral policies. The CONSAD is characterized by different institutions, presenting

itself as an intersection between food security policy, local and territorial development,

so that one of its principles includes the participation of civil society. And one cannot

dismiss the potential of these consortia as agents of change in local archaic structures

which concentrates income and development processes. In this way, the objective of

this dissertation is to analyze the origin and the institutionalization of the CONSAD as a

public policy in the context of the National Food and Nutrition Security (PNSAN).

Therefore, this work was organized into three perspectives. The theoretical approach

trough the model of the Multiple Streams, addressing the process of building and

developing PNSAN. The thematic approach, situating the emergence of CONSAD with

an institutional perspective, analyzing the mechanisms that allowed the consolidation of

this policy and its format as a public consortium that runs through the structure of a

management council. And the empirical approach, performing a case study of

CONSAD Iguatemi - MS. Among the research findings is that the achievement of the

objectives of CONSAD Iguatemi – MS is surrounded by operational constraints, related

to lack of resources, organizational problems, some coming from the very structure

imposed by the institutional design of the program. The lack of effectiveness by the

actions of its members, the lack of experience and qualifications of directors to take

control functions, and policy proposals at the Forum, are considered the key problems.

In conclusion, to address these barriers found in this research is necessary to provide

the members and advisors from CONSAD Iguatemi - MS adequate training for

participatory processes, training to understand the institutional mechanisms of the

consortium, training to instruct them how to seek partnerships and funding for the

Consortium. Another relevant observation argues that the absence of MDS both for the

interaction between governments and the Consortium and the release of resources

implicate the risk of limiting the development of this policy.

Key-words: CONSAD, Public Policy, Multiple Stream Model

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LISTA DE FIGURAS

FIGURA 01 – DIMENSÕES E TEMAS ABORDADOS PELO

QUESTIONÁRIO........................................................................................................................27

FIGURA 02 – ESTRUTURA DO PROGRAMA FOME ZERO.................................................66

FIGURA 03 - CONFIGURAÇÃO DO MODELO REFERENCIAL DE ESTRUTURA

ORGANIZACIONAL..................................................................................................................72

FIGURA 04 – FLUXOGRAMA DE FORMAÇÃO DO CONSAD............................................86

FIGURA 05 – MAPA DOS TERRITÓRIOS DO CONSAD IGUATEMI..................................87

LISTA DE QUADROS

QUADRO 01 – TIPIFICAÇÃO DOS MODELOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS......................38

QUADRO 02 – DIRETRIZES DA POLÍTICA NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR

E NUTRICIONAL.......................................................................................................................68

QUADRO 03 – ESTRUTURA DAS RESPOSTAS DA DIMENSÃO

COMPOSIÇÃO.............................................................................................................................98

QUADRO 04 – CLASSIFICAÇÃO DAS ENTIDADES CIVIS SEGUNDO A FINALIDADE

DA ASSOCIAÇÃO....................................................................................................................103

QUADRO 05 – ESTRUTURA DAS RESPOSTAS DA DIMENSÃO

ORGANIZAÇÃO.........................................................................................................................108

QUADRO 06 – ESTRUTURA DAS RESPOSTAS DA DIMENSÃO DINÂMICA

....................................................................................................................................................117

LISTA DE TABELAS

TABELA 01 – POPULAÇÃO E ÁREA DOS MUNICÍPIOS DO CONSAD

IGUATEMI..................................................................................................................................89

TABELA 02 – PRODUTO INTERNO BRUTO DOS MUNICÍPIOS DO CONSAD

IGUATEMI..................................................................................................................................90

TABELA 03 – PRODUTO INTERNO BRUTO DOS MUNICÍPIOS DO CONSAD

IGUATEMI POR SETORES.......................................................................................................90

TABELA 04 – NÚMERO DE ESTABELECIMENTOS AGROPECUÁRIOS POR GRUPO DE

ÁREA......................................................................................................................................91

TABELA 05 – PRODUÇÃO DE 2008 EM TONELADAS DOS PRINCIPAIS PRODUTOS

AGROPECUÁRIOS DOS MUNICÍPIOS DO CONSAD IGUATEMI......................................93

TABELA 06 – IDH-M, ÍNDICE DE GINI E INCIDÊNCIA DA POBREZA DOS

MUNICÍPIOS DO CONSAD IGUATEMI................................................................................94

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CONSAD Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local

PNSAN Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

CONSEA Conselho Nacional de Segurança Alimentar

MESA Ministério Extraordinário de Segurança Alimentar

MDS Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

IBAM Instituto Brasileiro de Administração Pública

CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

UFMS Universidade Federal de Mato Grosso do Sul

CONDELIS Consórcios de Desenvolvimento Local, Integrado e Sustentável

DLIS Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável

DNOCS Departamento Nacional de Obras Contra a Seca

CAP Comissariado de Alimentação Pública

SAPS Serviço de Alimentação da Previdência Social

STAN Serviço Técnico de Alimentação Nutricional

CNA Comissão Nacional de Alimentação

COFAP Comissão Federal de Abastecimento e Preços

SUNAB Superintendência Nacional de Abastecimento

INAN Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição

PRONAN Programa Nacional de Alimentação e Nutrição

FAO Organizações das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação

FMI Fundo Monetário Internacional

ONU Organização das Ações Unidas

SAN Segurança Alimentar e Nutricional

SISAN Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

EIR Entidades Implementadoras Regionais

PNAD Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios

IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

AGRAER Agência de Desenvolvimento Agrário e Extensão Rural

PAIS Produção Agroecológica Integrada e Sustentável

SIMTED Sindicato Municipal dos Trabalhadores em Educação

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Sumário

1. INTRODUÇÃO .................................................................................................................. 14

2. POLÍTICAS PÚBLICAS .................................................................................................... 32

2.1. CAMPO DE ESTUDO E O ESTADO DA ARTE NO BRASIL ................................ 33

2.1.1. Modelos de análise de políticas públicas ................................................................ 36

2.2. O MODELO DE MÚLTIPLOS FLUXOS .................................................................. 42

2.2.1. Fluxo de problemas – a entrada de um tema na Agenda ........................................ 45

2.2.2. Fluxo de soluções – a especificação de Alternativas .............................................. 46

2.2.3. Fluxo político – a tomada de decisão...................................................................... 48

3. OS MÚLTIPLOS FLUXOS NA CONSTITUIÇÃO DA POLÍTICA NACIONAL DE

SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL (PNSAN) ................................................... 51

3.1. A FOME COMO PROBLEMA PÚBLICO: Fluxo de Problemas ............................... 52

3.2. POLÍTICAS DE COMBATE À FOME: Fluxo de Alternativas ................................. 55

3.2.1. Construção do conceito de segurança alimentar: a formação de uma solução para o

problema ................................................................................................................. 58

3.3. O RETORNO DA FOME À AGENDA GOVERNAMENTAL: Fluxo Político ........ 61

3.4. CONVERGÊNCIA DOS FLUXOS: a vontade política .............................................. 63

3.4.1. Projeto Fome Zero .................................................................................................. 64

3.4.2. Estrutura da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN) .. 67

3.4.3. Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD) .......... 69

3.4.4. Consórcios públicos ................................................................................................ 73

3.4.5. Conselhos gestores.................................................................................................. 79

4. ESTUDO DE CASO DO CONSAD IGUATEMI .............................................................. 85

4.1. CARACTERIZAÇÃO E PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO .................................... 85

4.2. PROJETOS .................................................................................................................. 94

4.3. ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS, ENTREVISTAS E OBSERVAÇÃO NÃO-

PARTICIPANTE ......................................................................................................... 96

4.3.1. Composição: legitimidade, representatividade e qualificação ................................ 96

4.3.2. Organização: funcionamento e interação .............................................................. 106

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4.3.3. Dinâmica: formação da agenda, processo deliberativo e impacto ........................ 112

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 122

REFERÊNCIAS ........................................................................................................................ 129

APÊNDICE A: QUESTIONÁRIO ........................................................................................... 139

ANEXO A: ESTATUTO DO CONSAD IGUATEMI ............................................................. 144

ANEXO B: TERMO DE COMPROMISSO PARA USO DE DADOS EM ARQUIVOS....... 155

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1. INTRODUÇÃO

Este trabalho se propôs estudar a formação do Consórcio de Segurança

Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD). O ponto de partida reside na

organização do trabalho em três perspectivas e sua análise através de um recorte

específico1. Na primeira perspectiva tem-se o recorte teórico da Análise de Políticas

Públicas, precisamente com a utilização do modelo denominado Multiple Streams

(Múltiplos Fluxos), tendo em vista abordar o processo de construção e formação da

Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN) a partir das seguintes

questões: fatores, atores e instituições que influenciaram o processo.

Na segunda faz-se uso de um recorte temático, no qual se buscou situar a

emergência do CONSAD numa perspectiva institucional, analisando os mecanismos

que possibilitaram a consolidação desta Política e de seu formato. Na última tratou-se

de analisar um caso específico de CONSAD, via recorte empírico.

Através destas perspectivas, teve-se por objetivo analisar como surgiu e se

institucionalizou o Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local

(CONSAD) no contexto de dada política pública, o da Política Nacional de Segurança

Alimentar e Nutricional (PNSAN).

De antemão, faz-se necessário uma abordagem sobre os temas tratados nos

recortes utilizados. Apresenta-se uma visão geral sobre o campo de estudo das políticas

públicas, ponto essencial para se entender o modelo de análise utilizado no caso de um

dos programas da Política de Segurança Alimentar: o CONSAD.

O Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD)

constitui programa que consta na Política Nacional de Segurança Alimentar e

Nutricional (PNSAN). É consórcio público que visa à integração entre municípios, isto

é, a interação entre poder público e sociedade civil. O CONSAD está assentado numa

proposta de política permanente, de cunho territorial/local, na busca de ações conjuntas

no que se refere aos problemas locais relacionados à promoção da segurança alimentar.

O conceito de segurança alimentar é amplo, passou por um longo processo de

mudança, embora sua origem esteja relacionada com o problema da fome. Grosso

modo, a mudança do conceito (de fome à segurança alimentar) relaciona-se com as

1 A utilização desses recortes foi inspirada na tese de doutoramento de Caldas (2007). Nela, o referido

autor utiliza-se de tais recortes para dar maior organicidade ao tema tratado, além de, através destes

recortes, almejar a realização de seu objetivo de pesquisa e solucionar a problemática levantada.

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mudanças da forma como se assimilou a questão da fome enquanto problema público.

Considerando esta mudança conceitual levantou-se uma hipótese para esta dissertação,

qual seja: conforme se muda o diagnóstico do problema da fome, muda-se a visão para

o seu enfrentamento.

É necessário esclarecer que a mudança do diagnóstico de determinado problema

certamente suscita mudanças nas políticas propostas para seu enfrentamento. No

entanto, não foi a mudança em si que moveu esta pesquisa, e sim como ela ocorreu,

como aconteceu este processo. Desse modo, como problema de pesquisa buscou-se

esclarecer: quais fatores ou processos condicionaram a construção do CONSAD

enquanto política pública?

Para responder ao problema e alcançar o objetivo da pesquisa utilizou-se o

recorte teórico da Análise de Políticas, que pode ser considerada como um processo de

produção de conhecimento acerca de processos políticos que norteiam a tomada de

decisão. Para o quê foca-se nas inter-relações existentes no âmbito de uma política

pública. (FREY, 2000; SOUZA, 2006).

A Análise de Política se insere no campo de pesquisa das políticas públicas,

entendida como uma subdisciplina da Ciência Política, das Ciências Sociais. Cabe

ressaltar que embora esteja aí alojada, desde sua criação se constitui num programa de

pesquisa interdisciplinar, criado por cientistas sociais e estudiosos da administração

pública. Depois, desenvolvida por analistas de sistema, físicos, biólogos e economistas,

cada vez mais este campo de pesquisa se constitui numa disciplina compartilhada entre

diversas áreas do conhecimento. Por conta de sua multidisciplinaridade têm-se amplas

possibilidades de abordagens teóricas, modelos ou tipologias de análise advindas de

diversas áreas. (GUERRERO, 1993).

Enquanto se utilizava das técnicas de pesquisa de várias áreas, houve, entre os

estudiosos do campo das políticas públicas, um esforço para criar uma sistematização de

técnicas e métodos próprios, como observa Guerrero (1993, p. 35-36). Dentre as várias

abordagens, pautou-se nesta dissertação em uma vertente analítica que forneceu os

elementos capazes de responder ao problema de pesquisa e possibilitou o alcance do

objetivo proposto.

Propôs-se, assim, a utilização do modelo Multiple Streams (Múltiplos Fluxos), o

qual possibilitou identificar os fatores determinantes que circundaram o modo como as

decisões políticas foram tomadas. Através dele pode-se ter uma dimensão do processo

político que englobou as decisões. A análise processual de uma política, a que se propõe

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este Modelo, implica em averiguar quais as condições iniciais e como essas condições

se refletem nos resultados esperados de uma política.

Considerando que a estrutura de uma política pública contém um processo

político, a sua análise implica em identificar possibilidades, restrições e distorções que a

afetaram. Verificar as condições institucionais, os movimentos políticos e a interação

entre sociedade e o Estado, permite entender o contexto em que as políticas são geradas

e quais as razões para elas serem efetuadas através de determinados desenhos

institucionais, em detrimento de outros.

Quais situações, eventos, grupos sociais ou políticos foram responsáveis pelo

processo de formação da política analisada? Estes questionamentos perpassaram o

Modelo utilizado e foram com as respostas a tais questionamentos que se espera ter

alcançado enquanto resultado da pesquisa.

O recorte temático visa proporcionar uma compreensão sobre o papel dos

Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD) no contexto

da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), além de discutir o

desenho institucional dos CONSADs.

A Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN)

compreende um conjunto de ações para o combate dos problemas relacionados à

insegurança alimentar. A segurança alimentar é vista como a garantia de acesso aos

alimentos, por parte de todos, durante todo o tempo e em quantidade e qualidade

suficiente, de modo que proporcione uma vida ativa e saudável ao indivíduo, como

mostram Takagi (2006) e Hirai & Dos Anjos (2007). Assim, tratar da segurança

alimentar consiste em se ater a quatro dimensões: quantidade, qualidade, regularidade e

dignidade. Esta última se relaciona ao fato de se tratar a questão da alimentação como

um direito universal de todo ser humano.

Tendo por base essas quatro dimensões, foi elaborado e executado o Programa

Fome Zero, que repercutiu na reestruturação do Conselho Nacional de Segurança

Alimentar e Nutricional (CONSEA), na criação do Ministério Extraordinário de

Segurança Alimentar (MESA), em 2003, e com ele lançaram-se as bases e os elementos

da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN) (TAKAGI, 2006).

Esta Política está estruturada em três vias: ações estruturais, específicas e locais.

As ações estruturais focam-se na garantia e aumento da renda, incentivos à reforma

agrária e agricultura familiar. As específicas dão conta de ações direcionadas, como:

merenda escolar, preocupação com gestantes e recém-nascidos e, também com a

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dimensão da qualidade da alimentação. As ações locais centram-se na construção de

restaurantes populares e bancos de alimentos, ações de incentivo à construção de uma

“agricultura urbana”, incentivo a produção para autoconsumo e etc. (CONSEA, 2004;

DA SILVA, TAKAGI, 2004).

Os CONSADs surgiram no contexto das ações estruturais e, embora não

constasse no projeto inicial do Fome Zero, foram acoplados à Política Nacional de

Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN). Tais Consórcios basicamente consistem

em associações entre municípios e dentro delas estabelecem-se vínculos entre governo

local e sociedade civil, que buscam a promoção da segurança alimentar, através da

geração de oportunidades de trabalho e de renda. Por essa razão, se institucionaliza a

ação dos Consórcios através da criação de conselhos deliberativos, nos quais os

municípios integrantes do Consórcio são representados pelo poder público e sociedade

civil (IBAM, 2004).

Assim, os CONSADs se apresentam no campo das políticas públicas com um

desenho institucional diferenciado: o de ser um consórcio público e adotar o

funcionamento de um conselho gestor. Mediante este desenho institucional pretende

implementar a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional de modo

descentralizado e democrático, possibilitando a participação da sociedade com vistas ao

controle social.

A discussão sobre o processo de descentralização das políticas públicas e dos

mecanismos institucionais pelos quais tal processo ocorre, assim como os apontamentos

acerca dos consórcios públicos e de conselhos gestores, como elementos constitutivos

dos CONSAD são importantes para a compreensão do objeto desta pesquisa.

Enfim, com este recorte temático buscou-se situar a emergência dos CONSAD,

sua perspectiva institucional e os mecanismos que possibilitaram a consolidação deste

formato de PNSAN. Após estabelecer as bases do desenho institucional procedeu-se a

análise de um caso específico de funcionamento de uma unidade do CONSAD.

Com o recorte empírico observou-se questões relacionadas ao funcionamento de

consórcios de segurança alimentar, como: processo de implementação; canais

institucionais por meio do qual foi efetivado; se as práticas e realizações estão de acordo

com as diretrizes apontadas no projeto CONSAD; participação dos agentes dentro do

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Consórcio, principalmente o papel da sociedade civil, de acordo com o Guia do

CONSAD (2004) 2.

A partir de 2004, foram implantados pelo Ministério do Desenvolvimento Social

e Combate à Fome (MDS) cerca de quarenta Consórcios de Segurança Alimentar e

Desenvolvimento Local (CONSAD), abrangendo aproximadamente quinhentos e

oitenta e cinco municípios brasileiros. Cada consórcio deveria congregar de cinco a

vinte municípios, dependendo dos desenhos e pactos territoriais existentes nas regiões

contempladas com o Programa. Para a escolha das regiões foram consideradas as

deprimidas, marginalizadas dos pólos de crescimento e, portanto, excluídas do processo

de geração de riqueza (ORTEGA, 2008).

Essa escolha foi efetuada com base num levantamento feito pelo Instituto

Brasileiro de Administração Pública (IBAM), para atender a outro programa que não

tinha sido concretizado.3 O programa Fome Zero serviu-se de tal estudo para efetuar o

programa CONSAD. Neste sentido, dentro da proposta de pesquisa desta dissertação,

escolheu-se a unidade territorial do CONSAD Iguatemi, situado no estado de Mato

Grosso do Sul.

O CONSAD Iguatemi - MS, originalmente, foi composto por onze municípios.

Está previsto que a coordenação do Consórcio deva ser realizada por um Fórum, e este,

com status de conselho gestor. Para a composição do Fórum cada município do

Consórcio conta com seis representantes, exceto o município sede do Consórcio, no

caso a cidade de Iguatemi, que fica com cinco representantes. Das vagas de

representantes, estabeleceu-se que dois terços pertencem à sociedade civil, cabendo o

restante para indicados pelos governos municipais ou estadual. O presidente do

Consórcio deve ser eleito no espaço do Fórum e passa a responder pelas ações do

Consórcio.

Ao proceder a uma revisão na literatura sobre consórcios públicos não se

encontrou qualquer outro caso em que um consórcio funcionasse com o status de

conselho gestor, como no caso do CONSAD. Argumenta-se que um dos fatos pode ter

contribuído para tal situação relaciona-se com a aprovação da Lei dos Consórcios

Públicos (Lei 11. 107/05) quando se retirou um artigo que, constava no projeto inicial e,

2 O Guia do CONSAD é um documento oficial elaborado pelo Instituto Brasileiro de Administração

Pública (IBAM) a pedido do programa Fome Zero, como um instrumento para orientar a formação e

organização dos CONSAD. 3 Tal programa era o CONSIDELIS, elaborado pelo governo de FHC, em 2002.

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instituía a forma de conselho deliberativo ao fórum dos consórcios (BORGES, 2006, p.

6).

Considera-se uma experiência nova este formato institucional adotado pelo

CONSAD, por isso resolveu-se fazer proveito da literatura existente no âmbito dos

conselhos gestores ou conselho de políticas públicas, com geralmente é abordado.

Tenta-se esclarecer as condições institucionais dos consórcios públicos e seu

funcionamento através de uma estrutura próxima ou semelhante a um conselho gestor;

já que, a princípio, é o Fórum, com status de conselho gestor, que orienta as decisões do

CONSAD.

A execução da PNSAN, do ponto de vista dos CONSAD, tem sua eficácia e

efetividade relacionada às condições de funcionamento e organização do Fórum

(conselho). Isto significa que as condições de deliberação (proposição de políticas) do

Fórum (conselho) é que dirigem o CONSAD, porque torna possível a gestão

(democrátiva e descentralizada) do programa e, consequentemente, o alcance dos

objetivos que se pretende atingir.

Tratar sobre políticas públicas é relevante porque diz respeito à intervenção do

Estado na sociedade, isto é, a forma e o instrumento pelo qual o governo efetua ações

visando alterar, regular ou conter determinadas situações perante a sociedade. A

mediação ou intervenção governamental pode ser parte de uma política pública.

Geração de oportunidades de trabalho, controle de pragas e doenças, seguro desemprego

e auxílio doença, sistema de saúde, sistema gratuito de ensino e defesa do espaço

nacional são formas de ação pública, através da instituição governo, que representam a

ação do Estado e são conhecidas por políticas públicas.

Tais políticas são capazes de alcançar qualquer esfera da vida social, por conta

do “contrato social”, típico de Rousseau4, pacto firmado por legislação, no caso

brasileiro recente, a Constituição Federal de 1988, na qual se inscrevem os direitos e

deveres da sociedade e do Estado. Entretanto, várias são as formas de ação do Estado,

mesmo para uma política específica, pode-se citar a política econômica como exemplo,

há sempre alternativas que concorrem entre si para serem tomadas como decisão do

governo. Nisso reside a importância não só da análise de políticas públicas, mas do

estudo sobre os processos de escolhas desenvolvidos pelos governos.

Para Reis (2003, p. 11), este campo de estudo:

4 Filósofo, escritor e teórico político, o suíço Jean Jacques Rousseau publicou a obra Do Contrato Social

em 1762.

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(...) é uma das especializações que responde mais diretamente ao imperativo

da relevância na prática das ciências sociais. Seja analisando a formulação, a

implementação ou os resultados de policies, os especialistas podem ver de

maneira bastante clara e imediata como suas análises interpelam situações

concretas, examinam tecnicamente problemas empíricos específicos e podem

servir para legitimar ou deslegitimar as escolhas políticas efetivas.”.

Outro fator que denota a importância desta área de estudo é a necessidade de

subsidiar o processo de planejamento com relação às políticas efetuadas pelos governos.

Análise do processo decisório, da tomada de decisão, da implementação e da avaliação

pertencem a uma perspectiva válida, quando se trata de melhorar as formas de

intervenção do Estado.

Dado o potencial do CONSAD de fazer avançar o tema da segurança alimentar,

pois a alimentação se constitui em um dos direitos básicos do ser humano, assegurado

pela Emenda Constitucional nº 64, de 04 de fevereiro de 2010, que modificou o art. 6º

da Constituição Federal, que introduziu a alimentação como direito social.

Além da importância da análise de políticas e do direito social à alimentação, o

CONSAD recebeu atenção por ser tratar de uma “novidade” no campo das políticas

setoriais. É caracterizado por uma institucionalidade diferenciada, se apresenta na

interseção da política de segurança alimentar com o desenvolvimento local e o

desenvolvimento territorial, e estabelece como um de seus princípios a participação

institucionalizada da sociedade civil (IBAM, 2004; DE JESUS, 2006).

O CONSAD objetiva promover a segurança alimentar e o desenvolvimento local

através da geração de oportunidades de emprego e renda. Visa atingir regiões

consideradas excluídas do processo de crescimento econômico, regiões deprimidas. O

que constitui cerca de 40 consórcios deste tipo em todo o país (ORTEGA, 2008).

A perspectiva escolhida para analisar os CONSAD não foi encontrada em

nenhum outro estudo, quando da revisão de literatura. Não se identificou estudo que

analisa aspectos de desenho institucional do CONSAD. A maior concentração dos

trabalhos se assenta na abordagem do viés territorial, são os casos de Dos Anjos (2005)

e Dresth (2011); outros aplicam uma análise institucional baseada na teoria da Nova

Economia Institucional; o trabalho realizado por De Jesus (2006) aborda boa parte do

processo de criação e foca na apresentação e caracterização socioeconômica desses

territórios, com viés de análise territorial, assim como o trabalho de Ortega (2008).

Nota-se que não significa que estas questões tenham sido esquecidas nos

trabalhos citados, mas que não foi preocupação central de suas pesquisas. Nos artigos de

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Dos Anjos (2005), Ortega (2007) e Dos Anjos e Caldas (2007) algumas questões

chegaram a ser pontuadas, e propostas para se desenvolverem em outras pesquisas.

Esta pesquisa se justifica pela necessidade de se estudar os processos de escolha

feitos pelos governos que, com o atual formato dos CONSAD, contêm a possibilidade

de melhorar a forma de intervenção do Estado no que se refere a segurança alimentar e

ao desenvolvimento local. Como se trata de um estudo exploratório, o principal residiu

em levantar questões e aspectos que possibilitassem o entendimento da

operacionalização destes Consórcios, assim como dos fatores que podem limitar o

desenvolvimento deste tipo de política.

Apontamentos metodológicos

Este trabalho se propôs estudar a formação dos Consórcios de Segurança

Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD), para tanto, adotou-se uma estratégia

de organizar o trabalho em três perspectivas: recorte teórico, recorte temático e recorte

empírico. Embora, no conjunto, sirvam ao propósito de responder ao problema da

pesquisa.

A pesquisa caracteriza-se pela investigação qualitativa face os tipos de dados

coletados e o próprio processo de coleta, as dificuldades para generalizações (uma vez

que nem sempre é o objetivo de uma pesquisa qualitativa), o papel e o envolvimento do

pesquisador em todo o processo da pesquisa até a interpretação dos resultados

(SAMPIERI, FERNÁNDEZ-COLLADO, LUCIO 2006; RICHARDSON, 2008).

Na perspectiva de alguns autores, o que caracteriza a pesquisa como qualitativa é

o fato de ela não se basear num rígido conceito teórico e metodológico, tendo como

premissa subjacente a (re) construção da realidade, isto é:

(...) a realidade estudada pela pesquisa qualitativa não é uma realidade

determinada, mas sim construída por diferentes “atores”: a definição sobre

qual é o ator considerado crucial para essa construção depende da postura

teórica adotada para o estudo desse processo (Flick, 2009, p. 76-77).

Assim, no recorte teórico, utiliza-se um modelo de análise de políticas, como o

Multiple Streams. Por meio dele pressupôs-se a tarefa de agregar conhecimento ao

processo de formulação e implementação, intervindo no chamado processo decisório da

política pública. Assim, a análise recair sobre uma gama de atores e instituições que

conformam a política alvo da pesquisa.

Esse tipo de pesquisa, embora possa ser modelada matematicamente de acordo

com a perspectiva da teoria da “Public Choice” (Andrews, 2005), requer uma

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abordagem ligada ao método qualitativo, por focar-se no processo político, no processo

decisório. Este objetivo torna-se mais perceptível com a utilização da pesquisa

qualitativa, que melhor corresponde às tentativas de desvendar leis de comportamento

social (ANDREWS, 2005).

Atento às observações de Andrews (2005, p. 27-28):

(...) A simplificação necessária ao equacionamento matemático da realidade

social exige a introdução de abstrações fixas, reduzindo a ação social – e toda

a sua complexidade – a um modelo de comportamento adaptado ao método

de mensuração.

(...) para que um modelo matemático ‘dê certo’, é necessário que o

comportamento dos atores sociais permaneça estável ao longo do tempo.

(...), pois a precisão do modelo matemático depende da continuidade dos

pressupostos do modelo por um tempo indefinido. E se o modelo não é capaz

de captar a regularidade dos fenômenos sociais, então é preciso que seja

substituído por outro que seja capaz disso.

Dadas as considerações supracitadas, escolheu-se a pesquisa qualitativa por

conta das relações subjacente ao objetivo da pesquisa. Pois não se busca testar a teoria

do Multiple Streams e sim empregá-la como uma ferramenta para desvendar a

construção do CONSAD. Ao analisar uma política específica não se expande os

resultados alcançados a outras políticas, uma vez que para cada arena de políticas, há

construção de realidades distintas. Para isto adotou-se estudo de caso para abordar

aspectos e questões que esclareçam o entendimento quanto a operacionalização do

CONSAD.

Ao empregar a teoria do Multiple Streams teve-se o desafio de criar uma

sustentação e não incorrer nos erros apontados por Souza (2003, p. 17) e Reis (2003, p.

12), que neste tipo de estudo no Brasil, há: falta de parâmetros teóricos que modelam as

análises e leveza metodológica exagerada (ausência de modelos ou tipologias de

políticas públicas).

A revisão de literatura nos trabalhos estudados5, em geral, a coleta dos dados

para esclarecer o processo decisório e a tomada de decisão foi realizado via entrevistas e

questionários. Visto que o objetivo era coletar informações sobre os atores que

potencialmente participavam dos processos, além de identificar seus papéis no processo

abordado.

Neste presente trabalho buscou-se responder ao problema de pesquisa, numa

fase inicial, através da realização de pesquisa bibliográfica e documental. As respostas

5 Pinto (2004); Caldas (2007); Domingues (2007); França (2007); Brito (2009); Czcrmainski (2009).

Neste último trabalho citado, há uma revisão ampla dos trabalhos realizados no Brasil utilizando esse

modelo.

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almejadas foram baseadas numa interpretação do processo histórico levantado pela

pesquisa bibliográfica e documental, seguido de pontos de vistas dos atores-

participantes da construção da política abordada, por meio de resposta a questionário e

observação não-participante.

Um ponto decisivo considerado foi a dificuldade de acesso às pessoas que de

alguma forma se constituíram em personagens para a construção da PNSAN. A

suposição preliminar de que a construção da PNSAN (que deu origem aos CONSADs)

ter como ponto de partida a fome enquanto problema público, apontou-se para a

necessidade de construir uma narrativa dentro de uma perspectiva histórica, uma vez

que a emergência da fome como problema público é antiga. Por isso se optou pela

análise documental e bibliográfica.

Este tipo de procedimento pode ter deixado lacunas com relação à narrativa

histórica, mas como se trata de pesquisa qualitativa, “não é possível evitar

interpretações pessoais”, mas certamente se pode atentar-se para evitar enviesamentos

inadequados (CRESWELL, 2007, p. 187).

Na pesquisa bibliográfica abordaram-se os aspectos relativos aos conselhos

gestores; processo de descentralização; consórcios públicos, e na documental a lei do

consórcio público; orientações normativas para a consolidação dos CONSADs.

O objetivo do recorte empírico foi efetuar um estudo de caso sobre as condições

de operacionalização do CONSAD Iguatemi, em Mato Grosso do Sul. Procedeu-se à

análise de um caso específico procurando estabelecer alguns parâmetros e levantar

questões sobre o funcionamento dos consórcios de segurança alimentar, seu processo de

implementação, bem como se as práticas e realizações dos consórcios estão de acordo

com as diretrizes apontadas no projeto CONSAD, além de verificar as condições e a

participação dos agentes dentro do consórcio, etc..

O estudo de caso pode ser visto como uma investigação empírica sendo utilizado

para análise de eventos ditos contemporâneos e, para tal feito, vale-se da observação

direta dos eventos estudados, seja por entrevistas ou outros meios (YIN, 2010).

Ao adotar o método de estudo de caso optou-se pelo caso único. A escolha não

ocorreu por premissas teórico-metodológicas, mas por restrições externas à pesquisa,

como a limitação de recursos financeiros, a necessidade de tempo mais extenso e a

dificuldade de acesso, tanto em relação aos atores envolvidos (conselheiros do

consórcio), quanto aos documentos. Mesmo com a estratégia de caso único, apresentou-

se um grau muito baixo de acessibilidade com relação a essas questões.

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Como exemplo, pode-se informar a respeito do processo de liberação de alguns

documentos. Não foi concedido o acesso às atas do Fórum. E foi “custoso” o processo

de obtenção da cópia do Estatuto do Consórcio, necessitando sucessivos pedidos, não-

atendidos, além de meses de espera. Em nenhum momento negaram oficialmente o

acesso ao Estatuto do CONSAD Iguatemi - MS, caso contrário das atas. Mas, também

não disponibilizaram o acesso. De Setembro de 2011 a Fevereiro de 2012 pediu-se

constantemente uma cópia do Estatuto, que só foi disponibilizada via correio no dia 07

de março de 2012.

Ao escolher um caso único em detrimento de casos múltiplos perde-se, em

termos analíticos, o poder de generalização. O argumento é que o caso único oferece

pouca sustentação para efetuar generalizações, dificultando o processo de replicação da

pesquisa. Um caso único é considerado como uma “aposta” única e pode levar a

redução das chances de sucesso na aplicação do método (YIN, 2010).

A dificuldade do ponto de vista metodológico reside na ausência de parâmetros,

no âmbito de fóruns com poder deliberativo em consórcios públicos, para sustentar a

análise pretendida. A busca por parâmetros ocorreu, por analogia, na literatura sobre

conselhos gestores, pelo seguinte motivo: a inovação institucional atribuída à

operacionalização de um consórcio público mediante o imperativo da participação da

sociedade civil.

Adotou-se uma tentativa de esclarecer as condições institucionais dos consórcios

públicos, seu funcionamento, através de uma estrutura próxima ou semelhante a um

conselho gestor. Em princípio o fórum do CONSAD tem status de conselho gestor que,

por sua vez, orienta as decisões do Consórcio.

A delimitação da unidade de análise escolhida não foi aleatória. Há por parte do

pesquisador uma aproximação com o objeto de pesquisa. A Universidade Federal de

Mato Grosso do Sul (UFMS) foi escolhida mediante Edital Josué de Castro, lançado em

2008 em parceria entre CNPq e MDS, para elaborar diagnósticos e planejamentos locais

para os territórios do CONSAD. Nesta época, o pesquisador integrava o quadro de

discentes da instituição e, mesmo não fazendo parte do projeto, tinha contato de forma

indireta.

Esta situação levou ao interesse pelo tema. Dentro dos três CONSAD existentes

em Mato Grosso do Sul, optou-se pelo CONSAD Iguatemi dada a proximidade

territorial do pesquisador com este. Assim, a escolha da unidade para efetuar o estudo

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de caso foi intencional pelo fato de o pesquisador ter tido contato com a região em

outras ocasiões.

Na revisão da literatura verificou-se poucos trabalhos desenvolvidos acerca dos

CONSAD, sendo que não se encontrou outro que abordava a sua relação de semelhança

com a dinâmica dos conselhos gestores.6 Segundo Martins et al. (2008), existe pouco

conhecimento acumulado nessa área. Através da reflexão de Teixeira e Tatagiba (2008),

destaca-se a co-relação entre produção das políticas públicas e a ação dos conselhos

gestores. De um modo geral, as autoras apresentam ressalvas quanto à maioria dos

trabalhos sobre o tema, posto que demonstram expectativas excessivas quanto aos

efeitos de um sobre outro.

Nesta dissertação procurou-se realizar uma abordagem que retrata o ponto de

vista dos sujeitos da pesquisa, neste caso, os conselheiros que representam seus

respectivos municípios no consórcio analisado. O nível de análise se situa na interação

dos conselheiros no contexto do Fórum (conselho) do CONSAD Iguatemi - MS.

Buscou-se identificar o processo de interação entre os conselheiros e a forma de

operação do “conselho”.

Os resultados obtidos com tal abordagem são apresentados da seguinte forma: a

realidade “obtida”, que se refere às informações coletadas pelo pesquisador através da

análise dos questionários aplicados, portanto trata-se de uma realidade com relação à

percepção dos pesquisados. Também se tem a realidade “observada”, que se constitui

das informações coletadas através da percepção do pesquisador, que ocorreu via

participação do pesquisador nas reuniões e entrevistas. Por fim, comparam-se as duas

realidades, para compor um posicionamento acerca do funcionamento do CONSAD.

Os meios utilizados para se chegar a tais resultados foram: pesquisa

bibliográfica, documental e pesquisa de campo, utilizada para o processo de coleta dos

dados, no espaço de funcionamento do CONSAD Iguatemi - MS. A coleta dos dados foi

realizada através da aplicação de questionário semi-estruturados7 (Apêndice A), para

6 Dos Anjos (2005) aponta apenas algumas situações de disputas políticas nos conselhos dos CONSAD,

mas não aborda a temática dos conselhos, além de focalizar o CONSAD apenas no contexto de uma

política de desenvolvimento territorial, e não no escopo de uma política muito mais ampla, como de fato

é, preconizada pelos conceitos que sustentam a noção de Segurança Alimentar. Esta é a abordagem desta

dissertação e, por isso, se justifica seu caráter exploratório. 7 Para formulação do questionário apreendeu-se diversos aspectos presentes na literatura analisada,

buscando identificar que dimensões deveriam ser analisadas, além de se ater aos aspectos que tornam o

conselho do CONSAD diferente da maioria dos conselhos, frequentemente, abordados pela literatura

pesquisada. Também se utilizou questões presentes nos trabalhos de Tonella (2003), Santos Júnior,

Azevedo e Ribeiro (2004), Lorenzo (2008) e Moura (2009), em grande parte adaptadas para o presente

estudo.

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identificar as seguintes dimensões: Composição, Organização e Dinâmica. Para cada

dimensão utilizou-se de alguns temas, para deles extrair indicadores, que constam nas

perguntas do questionário.

A dimensão Composição compreende os temas da Legitimidade, da

Representatividade e da Qualificação. A legitimidade trata da independência e

autonomia dos representantes da sociedade civil em relação ao poder público, no

tocante às influências políticas. Essa situação implica em dar maior credibilidade aos

representantes, uma vez que o processo de escolha dos representantes versa sobre o fato

deles “representarem” a sociedade civil ou as entidades às quais pertencem

(TATAGIBA, 2002; TONELLA, 2003; SANTOS JÚNIOR, AZEVEDO, RIBEIRO,

2004; LORENZO, 2008; MARTINS et al., 2008).

A representatividade preocupa-se em argumentar se eles representam, de fato,

quem devem representar. Além de ater-se a forma como ocorre essa representação, seja

de modo ativo, apresentando propostas e participando das decisões de forma crítica, e

não passiva. No tema da qualificação busca-se apreender a capacidade técnica dos

conselheiros e sua a incidência no processo de formulação de políticas através de

conselhos. A qualificação está diretamente relacionada à capacidade para formular,

coordenar e fiscalizar uma política, atribuição dos conselhos (TATAGIBA, 2002;

TONELLA, 2003; SANTOS JÚNIOR, AZEVEDO, RIBEIRO, 2004; MARTINS et al.,

2008).

A dimensão da Organização compreende os temas: Funcionamento e Interação.

Com relação ao funcionamento procurou-se analisar os pontos de estrangulamento no

Fórum, além de o modo como ele se estruturou para operar como conselho. Tem-se

clareza que esse tema necessita do levantamento de informações documentais para

melhor averiguação, contudo pode-se contar apenas com o auxílio do Regimento

Interno do CONSAD Iguatemi - MS. No tema sobre a interação, ateve-se à análise das

relações existentes entre os conselheiros, as entidades e os municípios que compõem o

Consórcio (TATAGIBA, 2002; TEIXEIRA, TATAGIBA, 2008; MOURA, 2009).

A dimensão da Dinâmica compreendeu os temas: Formação da Agenda,

Processo Deliberativo (tomada de decisão) e Impacto. Na formação de agenda buscou-

se analisar o processo de proposição dos temas abordados nas deliberações do Fórum

(conselho). Sobre a definição da pauta discutida considerou-se o potencial de se

promover ou vetar temas, operando-se o controle, a manipulação. Mediante a pauta

pode-se deliberar a respeito das políticas, a partir disto empreendeu-se a análise do

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processo decisório. Reconhece-se que para ter condições de deliberar, tem-se a

necessidade da qualificação e precisa-se de mecanismos que auxiliam o processo de

tomada de decisão (TATAGIBA, 2002; TONELLA, 2003; SANTOS JÚNIOR,

AZEVEDO, RIBEIRO, 2004; LORENZO, 2008).

Por último, destacou-se o tema do Impacto, procurou-se captar o impacto das

políticas efetuadas pelo CONSAD na região, bem como se elas estão de acordo com as

diretrizes de uma política de segurança alimentar, com as bases da PNSAN que são

reafirmadas no documento Guia do CONSAD (IBAM, 2004).

FIGURA 01 - DIMENSÕES E TEMAS ABORDADOS PELO QUESTIONÁRIO

Fonte: elaborado pelo próprio autor, baseado em Lorenzo (2008).

O universo inicial da pesquisa, baseado no levantamento inicial e no próprio

sítio do MDS8, situa o CONSAD Iguatemi - MS como sendo composto por onze

municípios9. Dos quais, dez municípios contavam com seis representantes cada, tendo o

município sede do CONSAD cinco representantes no conselho, totalizando sessenta e

cinco conselheiros.

Considerando estas informações iniciais adotou-se a estratégia de um

delineamento que visava estratificar a amostra sob o critério da intencionalidade,

conveniência e acesso10

. Selecionou-se uma amostra que abrangesse um número

representativo dos conselheiros que integravam o CONSAD Iguatemi - MS. Entretanto,

no decorrer da pesquisa de campo surgiram algumas questões que requereram alterações

no planejamento inicial, as quais são apresentadas oportunamente.

8 Ver: <http://www.mds.gov.br/segurancaalimentar>.

9 Eldorado, Mundo Novo, Iguatemi, Tacuru, Ponta Porã, Naviraí, Coronel Sapucaia, Itaquiraí, Japorã,

Sete Quedas e Paranhos. 10

HILL E HILL (2009).

Representatividade

Composição Legitimidade

Qualificação

Funcionamento

Organização Interação

Formação da Agenda

Dinâmica Processo Deliberativo

Impacto

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Como primeiro passo da pesquisa de campo, marcou-se uma entrevista com o (a)

responsável legal pelo CONSAD Iguatemi-MS. Este contato realizou-se via correio

eletrônico com a, atualmente, Secretária do Consórcio, todavia seu nome constava no

site do CONSAD Iguatemi - MS como presidente. Informa-se que o site encontra-se

desativado desde maio de 2011, quando se teve acesso a ele pela última vez.

Num intervalo de tempo de aproximadamente dois meses (de maio/2011 a

julho/2011) foram feitas algumas trocas de informações com a citada profissional, a

partir de então este pesquisador solicitou permissão para realizar uma entrevista com

representante legal do CONSAD. Entretanto, nesse período houve uma descontinuidade

do contato e da comunicação com o CONSAD Iguatemi. Por iniciativa do pesquisador

buscou-se informações sobre o Consórcio nas prefeituras que o integravam. Descobriu-

se que durante esse intervalo houve o processo de mudança da sede do CONSAD

Iguatemi - MS, que passou a se instalar na cidade de Tacuru.

Constatou-se, também, que esse processo foi desencadeado pela eleição de

novos representantes para o Fórum (conselho). A atual representante legal, Srª Hilva

Aparecida da Silva, presidente eleita pelo Fórum do CONSAD Iguatemi - MS, no mês

de maio de 2011, residia na cidade de Tacuru.

Com a constatação da mudança de instalação física do CONSAD Iguatemi - MS,

a estratégia adotada foi buscar levantar, junto à Presidente, informações que pudessem

nortear um novo delineamento da pesquisa. Solicitou-se a nova presidente do CONSAD

Iguatemi - MS a possibilidade de marcar uma entrevista, que foi concedida no dia 16 de

setembro de 2011.

Após esta entrevista com a Presidente do CONSAD detectou-se uma diminuição

do número de municípios congregados no Consórcio. De onze reduziu-se a seis, bem

como o número de representantes, que de sessenta e cinco, caiu para trinta e cinco.

Apurou-se, na entrevista, que a saída de alguns municípios ocorreu em virtude

do desinteresse de alguns prefeitos de fazerem parte do CONSAD e, também, pelo não

pagamento da contrapartida financeira que recai sobre cada ente federado consorciado.

Este fato implicou na revisão das estratégias de pesquisa de campo, dada a

impossibilidade de manter a abordagem inicial.

Durante a entrevista com a Presidente, e responsável pelo CONSAD Iguatemi,

pediu-se a lista com os contatos dos representantes de cada município integrante do

Consórcio. Houve uma sinalização de que o pedido seria atendido, mediante anuência

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dos conselheiros, e que o pesquisador seria comunicado. A negativa do acesso a essa

lista de contatos veio por correio eletrônico.

Dada a impossibilidade de abordar diretamente cada conselheiro do CONSAD

Iguatemi – MS buscou-se, junto à Presidente do Consórcio, uma alternativa que

viabilizasse a pesquisa. Estipulou-se, então (de comum acordo) a participação do

pesquisador no Fórum do CONSAD que se realizou em outubro de 2011.

Diante desta realidade, estruturou-se o processo de abordagem aos conselheiros

da seguinte forma: aplicação dos questionários e entrevistas quando da ocorrência da

reunião do Fórum. O universo e a amostra da pesquisa, então, definidas a partir do

acesso e das entrevistas realizadas no dia do Fórum. Portanto, a amostra seria aleatória,

mas o essencial era assegurar a representatividade da mesma.

Entretanto, a Presidente do CONSAD, durante o citado período teve de lidar

com problemas de saúde, fato que impediu a convocação do Fórum, cuja data foi

prorrogada indeterminadamente. Mas, depois de superada tal questão de saúde,

agendou-se a reunião do Fórum no mês de dezembro de 2011.

Na verdade, na data estabelecida, não se realizou um Fórum, e sim uma reunião

dos membros da Diretoria, conforme foi dito pela Presidente um dia antes do evento,

através de correio eletrônico. Tal fato, certamente, impactou a estratégia prevista para a

coleta de dados, mas preservou-se a condição de realizar as entrevistas e aplicar os

questionários.

Este fato demandou um posicionamento não previsto, inicialmente, na estratégia

de pesquisa, que foi a condição dada ao pesquisador também realizar a pesquisa de

campo utilizando-se do recurso da observação não-participante. Isto possibilitou um

diálogo entre pesquisador e indivíduos pesquisados, no curso da reunião da Diretoria do

CONSAD Iguatemi – MS.

Acrescido da recusa da entidade em não liberar alguns documentos para a

consulta, como as atas do CONSAD Iguatemi e o Estatuto do próprio Consórcio.

Mediante a entrega de “Termo de Compromisso para uso de Dados em Arquivo”

(Anexo B) tenteou-se a liberalização do Estatuto, mas até mesmo uma resposta

negativa, quanto ao impedimento do acesso não foi comunicada ao pesquisador. O

acesso às atas foi vetado e comunicado por correio eletrônico.

Tais ocorrências demonstram, a princípio, uma barreira à concretização do

estudo de caso pretendido, vez que se nega o acesso a documentos de natureza pública,

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30

tendo-se em vista que o conselho do CONSAD Iguatemi funciona como conselho

gestor.

Diante desta situação, o pesquisador viu-se impelido a “trabalhar com o

silêncio”, face às inúmeras barreiras impostas aos procedimentos desta pesquisa. Assim,

o presente estudo de caso pauta-se, muito mais, na oralidade presente, isto é: nos

diálogos travados e observados durante as entrevistas e a reunião da diretoria do

CONSAD Iguatemi, em 20 de dezembro de 2011.

Ao ser permitida a participação do pesquisador na reunião da Diretoria do

CONSAD Iguatemi, a estratégia foi abordar os conselheiros presentes, para compor a

amostra do estudo de caso. Isto ocorreu diante da constatação de que não havia

frequência e nem regularidade quanto às reuniões do Fórum, dado que a última reunião

havia ocorrido no mês de março, segundo relato da Presidente do CONSAD Iguatemi -

MS, e que as reuniões eram marcadas “conforme a necessidade”.

O quórum da reunião da Diretoria do CONSAD foi de seis indivíduos11

, dos

quais uma conselheira respondeu o questionário prontamente; outro conselheiro deixou

a reunião antes do término, de modo que não se pode abordá-lo; outras duas

conselheiras pediram os questionários para responder posteriormente e enviar

digitalizados; e outras duas se negaram a responder, e pediram para encaminhar depois

os questionários por meio eletrônico.

Assim, ficou-se refém da amostra encontrada na reunião da Diretoria, com a

aplicação do questionário a cinco conselheiros. Embora não seja representativa

estatisticamente, ela não impede alcançar os objetivos propostos, vez que se trata de

uma pesquisa qualitativa e como se tem pretensões exploratórias12

, essas dificuldades de

acesso aos dados não inviabilizaram a pesquisa.

Adotou-se a observação, enquanto técnica do processo de pesquisa científica,

dada sua possibilidade de também ser empregada conjuntamente com outras técnicas de

coleta de dados, que neste trabalho foram representadas por questionários e entrevistas

(Richardson, 2008). Para Flick (2009, p. 203): “(...) as entrevistas e as narrativas

somente tornam acessíveis os relatos das práticas e não as próprias práticas”, e “(...) a

11

Propôs-se aos conselheiros abordados que assinassem o “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido

(TCLE)”, para legitimar o processo da pesquisa, no entanto, se esquivaram de assinar o termo, e apenas

responderam o questionário. 12

Segundo Cooper e Schindler (2003), a pesquisa exploratória ocorre quando o pesquisador não tem uma

ideia clara dos problemas que irá enfrentar durante o percurso do estudo, mas é a partir do processo

exploratório que se obtém maiores informações sobre o problema a ser estudado.

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observação permite ao pesquisador descobrir como algo efetivamente funciona ou

ocorre”.

Espera-se, nesta perspectiva, ter apreendido os processos e a realidade

subjacente ao estudo de caso empreendido. A observação não-participante é utilizada,

segundo Richardson (2008, p. 260): quando “(...) o investigador não toma parte nos

conhecimentos objeto de estudo como se fosse membro do grupo observado, mas

apenas atua como espectador atento”.

Esta acentuação é importante porque clarifica e situa o pesquisador, em sua

relação com o objeto de estudo. Estando o pesquisador em posição de compreender o

que lhe é estranho, obtendo dados, seja de perspectivas, ações ou opiniões que de outro

modo não teria acesso.

Assim, a observação não-participante coloca o pesquisador em lugar

privilegiado para entender o descompasso entre discurso e prática. Ela tem a vantagem

de não o colocar em progressiva interação no cotidiano e atividades de determinado

grupo, pois isto envolve o “risco” de se apropriar de ideias e discursos deste grupo.

A (re) construção dos processos e do modo de operação do CONSAD Iguatemi -

MS não pode deixar de atestar a precária estrutura de organização do Consórcio que,

embora tenha sede própria, não é utilizada para as reuniões (dada sua limitação físico-

espacial).

De antemão, deparou-se com a precariedade do funcionamento dessa

Organização, pois não há reuniões periódicas do denominado Fórum. A ausência de

regularidade de encontros e a precária organização do CONSAD comprometem a

finalidade de participação e descentralização, inscritas na concepção política da PNSAN

e do CONSAD.

Assim, para tratar dos resultados obtidos nesse processo de estudo a dissertação

foi divida em cinco partes além desta Introdução. O segundo capítulo versa sobre

Políticas Públicas, explorando o campo de estudo e o estado da arte no Brasil, além de

discutir o modelo dos Múltiplos Fluxos, que permeia a análise desta dissertação. O

terceiro capítulo aplica o modelo dos Múltiplos Fluxos na construção da Política

Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN). O quarto capítulo realiza um

estudo de caso sobre o CONSAD Iguatemi - MS, analisando seu processo de

implementação, as entrevistas e os questionários aplicados. E, por fim, as Considerações

Finais.

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2. POLÍTICAS PÚBLICAS

O objetivo do recorte teórico é situar a formação dos CONSAD no âmbito da

PNSAN através de uma análise do processo decisório. Para isso dividiu-se este capítulo

em duas partes. A primeira se refere à apresentação do modelo teórico e a segunda à

utilização do modelo para elucidação do surgimento e institucionalização dos

Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local (CONSAD), no contexto

da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN).

Na primeira parte atem-se a área teórica em que se situa o presente estudo: a área

das políticas públicas. Aborda-se o que se estuda nessa área, delineando seu campo de

estudo e sua divisão enquanto subdisciplina das ciências sociais e da ciência política.

Apresenta-se um rápido panorama sobre os modelos de análise existentes para

situar o campo de pesquisa de políticas públicas. Justifica-se tal fato devido à área ser

diversificada por conta de sua interdisciplinaridade, assim, em muitos estudos, há

divergências no corpo teórico e metodológico. Adiante, expõe-se o modelo teórico

adotado para o presente estudo, o Multiple Streams. A segunda parte do capítulo

envolve o uso do modelo teórico para a discussão da PNSAN.

A análise que pretende verificar uma etapa do processo de formulação de uma

política pública, o processo decisório, deve delinear-se no campo de estudo das políticas

públicas. Como mostra a literatura13

, para compreender a verdadeira natureza das

políticas públicas é necessário depurar o termo política. Em linhas gerais, o termo

política congrega uma relação conflituosa entre interesses variados. Fazer política

significa buscar os consensos possíveis.

Esta relação conflituosa nasce da própria essência da convivência social, em que

se têm conjuntos distintos de indivíduos vivendo em coletividade. Para assegurar uma

convivência pacífica atua-se sobre os conflitos, que nascem dessa “convivência entre

diferentes”, por meio de uma instituição que representa a sociedade como um todo – o

Estado. O papel desta instituição é o de construir e mediar consensos, de modo que se

solucione um conflito de modo pacífico.

Na perspectiva da literatura estudada, essa construção de uma solução pacífica é

o que se chama de política: uma arena de conflitos alimentada por ações e decisões, de

13

Dagnino (2002); Trabada (2003); Parada (2006); Souza (2006); Pereira (2008); Rocha (2009).

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conjuntos diferentes de indivíduos, que envolve as disputas e as preferências

particulares de cada indivíduo.

O papel do Estado é o de mediar a política, isto é, os conflitos emergentes da

política. Qual seria o mecanismo de ação do Estado para essa mediação? A resposta está

vinculada ao que se entende por Políticas Públicas. De modo sintético, política pública é

a ação do governo com vistas a solucionar um conflito.

Dye (1976 apud Dagnino, 2002) descreve uma política pública a partir da

explicação das causas e consequências da ação do governo, em suma, a preocupação

com o que o governo faz. Para Guerrero (1990, p. 42), políticas públicas são padrões de

ações que visam resolver disputas, conflitos, sendo essas ações realizadas mediante

programas de governos: “... actos específicos de gobierno, instrumentados dentro de

uma prática general.”.

Portanto, se define políticas públicas como uma forma de comportamento

governamental, sendo que falar em políticas públicas implica sempre falar em

intervenção do Estado, como diz Pereira (2008, p. 96). É preciso ter em mente que o

processo de mediação do governo que resulta numa ação que visa resolver conflitos,

está, em si mesmo, impregnado de conflitos.

Se política pública é ação do governo com vistas a solucionar um conflito, resta

saber qual é a natureza e a causa do conflito que se tornam premissas dessa ação. Para

alguns autores14

a existência de uma política pública está condicionada à existência de

um conflito ou de uma demanda por parte da sociedade, que exige uma solução. Assim,

as possíveis soluções tornam-se o objeto da análise, isto é, um campo de estudo.

O estudo de Políticas Públicas pode ser definido como aquele que analisa as

ações do governo e os efeitos que essa ação produzir. Qualquer estudo sobre políticas

públicas deve, necessariamente, se preocupar com o produtor genuíno destas: o governo

(GUERRERO, 1997; GONZÁLEZ, 2006; SOUZA, 2006).

2.1. CAMPO DE ESTUDO E O ESTADO DA ARTE NO BRASIL

Para um entendimento conciso desse campo de estudo é preciso entender três

dimensões do estudo sobre políticas: (a) polity – se refere ao estudo sobre as instituições

políticas; (b) politics – aborda os processos políticos; (c) policy – foca-se no conteúdo

14

Guerrero (1990), Trabada (2003), González (2006), Parada (2006), Subirats (2006), Montecinos-

Montecinos (2007), Aguilar (2008), Vargas (2009).

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da política. Essas palavras são consagradas na literatura anglo-saxônica, mas não

encontraram vocábulos com semelhante significado para idiomas como o português e o

espanhol. Esse fato acarreta muita confusão pois, para o idioma espanhol, o termo

policy não tem tradução “adequada”, e no português o termo “política pública”

geralmente se refere às três dimensões (FREY, 2000, p. 216-217; GUERRERO, 1993,

p. 30-32).

Todavia, a distinção se faz necessária para evitar confusões quanto ao que

realmente se coloca como foco do estudo, e pede a necessidade de se delinear

exatamente o que se estuda. Falar apenas em estudo de políticas públicas não é o

suficiente para dizer o que se pretende. Daí a necessidade do uso das definições

expostas pelas palavras: polity, politics, policy.

De modo resumido, o estudo de políticas públicas, o processo de produzir

conhecimento em relação às ações do governo, centra-se na dimensão Politics (em que

se situa a análise do processo político, o caráter conflituoso, sobre conteúdos, decisões e

aplicações da ação do governo) e na dimensão Policy (preocupa-se com os conteúdos

concretos da política, a configuração e os problemas técnicos dos programas, assim

como o conteúdo material das decisões políticas) (FREY, 2000, p. 217).

Entretanto, a dimensão Polity (estudo das instituições políticas, ordem do

sistema político, jurídico e político-administrativo) não é desprezada. As três dimensões

são frequentemente entrelaçadas, com condições de influências mútuas. As estruturas

políticas (polity) refletem no processo de negociação de conflitos políticos (politics) e

este, por sua vez, afeta o resultado concreto de uma polítca (policy) (FREY, 2000, p.

219).

Para efetuar estudos e análises, costuma-se usar modelos explicativos. Ao

proceder assim, geralmente se atribui a dimensão polity (estudo das instituições) o papel

de variável independente, como uma estrutura “dada”. Aliás, o uso dos modelos é que

determinam a condição de dimensão analisada: pode-se partir de estruturas

institucionais não dinâmicas; estruturas políticas dadas; ou considerar todas as três

dimensões como reflexivas.

Assim, o objeto de pesquisa em uma análise de políticas públicas (o que se

estuda) depende do modelo teórico-metodológico adotado e do que se propõe a estudar.

A área de políticas públicas é um campo multidisciplinar, um território de diversas

disciplinas, o que acarreta múltiplos olhares. Dentro de uma das subáreas do estudo da

política pública, há a avaliação de política, a qual costuma ser mais desenvolvida pela

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economia, cujo uso de técnicas quantitativas tende a limitar o número de variáveis

explicativas, tornando algumas análises estáticas, considerando dimensões “dadas”

(constantes), e focando seu poder explicativo para apenas algumas dimensões.

Em relação a pesquisa pode se afirmar que os estudo sobre políticas públicas

estão subdivididos em: formulação, implementação e avaliação de políticas. A

formulação se foca mais sobre o processo decisório e o de tomada de decisão. A

implementação fixa-se no exame das estratégias adotadas pelo governo para executar as

decisões tomadas. A avaliação é um conjunto de procedimentos que visa examinar o

conteúdo, o resultado e a qualidade da ação governamental (GUERRERO, 1995;

AGUILAR, ANDER-EGG, 1995).

Cada subárea realiza estudos específicos, focalizados em determinados aspectos.

Para a análise destes aspectos, o campo de estudo sobre políticas públicas se serve de

modelos analíticos. Pesquisas sobre o processo decisório e tomada de decisão recebem

atenção há mais tempo, enquanto que os estudos sobre avaliação e implementação

vieram depois15

.

Há de se ressaltar que cada modelo é utilizado para explorar determinados

aspectos. A área de formulação pode ser considerada como a de maior robustez teórico-

metodológica, a da implementação é marcada pela “quase inexistência de análises mais

sistemáticas” e a avaliação pela “notória carência de estudos dedicados aos processos e

às metodologias de avaliação de políticas”, segundo Faria (2003, p. 22).

Cabe lembrar que os primeiros modelos acerca da análise de políticas tinham a

pretensão de entender as ações do governo e as consequências dessas ações, logo, estas

análises procuram abranger tanto a implementação quanto a avaliação. Mas, conforme

evoluiu a disciplina, surgiram modelos alternativos que buscavam a compreensão de

aspectos considerados negligenciados pelos modelos voltados ao processo decisório

(SIMAN, 2005).

15

Harold Lassswel é considerado o pai das políticas públicas, ao introduzir a expressão “policy analysis”

em seu livro: “Politics: Who Gets What, When, How” - 1936. Até meados dos anos 1980, houve

crescimento da utilização de métodos próprios dentro da análise de políticas, isto é, a criação de modelos

analíticos cujo objetivo é analisar ação do governo. A partir desses estudos, no decorrer do

desenvolvimento da disciplina de análise de políticas, se empregava tais modelos, no entanto suas

abordagens, ao passo que não eram totalmente suficientes para se entender todo o complexo conjunto da

ação governamental, exigiam outros tipos de estudos. Como a área é marcada pela interdisciplinaridade,

algumas áreas como a administração pública e a economia, por exemplo, começaram a desenvolver

análises do tipo avaliação e, mais tarde, implementação das políticas. Pode-se dizer que o timing do

desenvolvimento das tipologias de análise são diferentes com relação às sub-áreas de pesquisa

(GUERRERO, 1993; SIMAN, 2005).

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Houve a divisão em subáreas e um crescimento de estudos setoriais, justificados

tanto pela emergência do economicismo, advindo das reformas da administração

pública (o que impulsionou as análises de avaliação – eficácia e eficiência) quanto das

limitações para se desvendar o mistério de como a intenção (decisão política) se

traduzia em ação (a decisão posta em prática, efetivada – análises de implementação)

(GUERRERO, 1995).

2.1.1. Modelos de análise de políticas públicas16

Para a análise de políticas públicas, assim como de outras áreas de estudo, faz-se

uso de modelos, que nada mais são do que uma “representação simplificada de algum

aspecto do mundo real” que se pretende analisar. São mapas que pretendem conduzir o

esforço de um pesquisador para a identificação de aspectos relevantes sobre o estudo de

políticas e auxiliar no processo de proposição e de explicações sobre o funcionamento

destes “aspectos” (Dye, 2009, p. 99).

Os modelos voltados para o chamado processo decisório e para o processo de

tomada de decisão são os que atraíram, ao longo dos anos, a atenção dos estudiosos de

políticas públicas. Portanto, concentram a maior parte dos modelos existentes. Tenta-se

aqui, de modo sucinto, citar alguns dos modelos existentes17

. Amparado em Dye (2009,

p. 100-101), ressalta-se que:

Esses modelos não são competitivos, no sentido de que algum deles possa ser

julgado o ‘melhor’. Cada um focaliza um aspecto distinto da vida política e

pode nos ajudar a entender coisas diferentes das políticas públicas. (...), esses

modelos são utilizados, isolada ou conjuntamente, para descrever e explicar

políticas específicas. (...)

o Modelo Institucionalista: observa a política como produto institucional. Uma decisão

política só se transforma em política pública depois de adotada e implementada, o

que ocorre via instituições governamentais. Estas instituições facilitam ou obstruem

determinadas políticas, o que leva a considerar que a estrutura das instituições

governamentais acarreta significativas consequências políticas. Pouca atenção é

atribuída à ligação entre a estrutura das instituições políticas e o conteúdo da política.

o Modelo Elitista: a política é o resultado de preferências e valores da elite. Parte-se da

premissa de que a sociedade é apática e mal informada sobre políticas públicas e que

16

Retirado do mapeamento efetuado por Dye (2009), Rua (2009) e Siman (2005). 17

Para conhecimento de mais modelos, ver Dye (2009), Souza (2006), Frey (2000), Rua (2009) e Siman

(2005).

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os agentes que formam a opinião pública são da elite. Todo o processo de tomada de

decisão é determinado pela elite, restando às instituições apenas um valor simbólico,

vez que são apoderadas pela elite. Visando a preservação do sistema em favor das

elites, as mudanças em políticas públicas raramente ocorrem e, quando ocorrem, são

incrementais. Quando ocorrem mudanças na natureza do sistema político são para

preservar o sistema e a posição das elites nele. Isso não significa que as políticas

públicas sejam contra as massas, mas que a responsabilidade pelo bem-estar das

massas fica sob os ditames das elites.

o Modelo Racional: a política pública é racional quando a diferença entre os benefícios

que ela produz é maior que qualquer outra proposta. O racionalismo envolve o

cálculo de todos os valores sociais, políticos e econômicos sacrificados ou

alcançados por uma política pública, não apenas aqueles que podem ser medidos em

termos monetários. Essa racionalidade pressupõe que as preferências valorativas da

sociedade possam ser conhecidas e ponderadas, assim como o cálculo dos custos

versus benefícios, para depois se escolher a proposta mais eficiente.

o Modelo Incremental: a política pública é uma continuação das atividades

governamentais anteriores com apenas algumas modificações incrementais.

Restrições de tempo, de informações e de recursos impedem a identificação de

alternativas às políticas já existentes, o que leva os formuladores de políticas a

optarem por acréscimos às políticas existentes, por ser mais seguro manter

programas conhecidos quando as consequências de novos programas não podem ser

previstas. Isto serve para diminuir conflitos, manter a estabilidade e preservar o

próprio sistema político, uma vez que acordos são mais prováveis ao situar mudanças

incrementais do que grandes mudanças.

o Modelo de Processo: pretende descobrir padrões identificáveis de atividades ou

“processos”, agrupando várias atividades com base em sua relação com as políticas

públicas. Visualiza-se o processo político através da identificação de problemas,

organização de agenda, formulação, legitimação, implementação e avaliação. Ao se

ater a esses processos evitam-se análises sobre o conteúdo das políticas. Através

desse modelo não se analisa o conteúdo da política pública e sim, o processo por cujo

intermédio elas são desenvolvidas, implantadas e mudadas.

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QUADRO 01 - TIPIFICAÇÃO DOS MODELOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Tipificação dos modelos de políticas públicas18

Modelo Processos que analisa Foco

Institucional Formulação,

Implementação Instituições governamentais

Elitista Formulação Poder da elite

Racional Formulação, avaliação Avaliação de propostas

Incremental Formulação Poucas propostas

Teoria dos

Jogos Formulação

Jogo racional

(modelagem matemática; econometria)

Escolha

Pública Formulação

Grupos de interesses; lobbies

(modelagem matemática; econometria)

Processo Formulação,

implementação, avaliação

Processo pelo qual são desenvolvidas,

implementadas e mudadas Fonte: adaptado de Winkler pós-fácil de Dye (2009, p. 129).

Como disposto no quadro 01, nem todos os modelos se preocupam com todas as

“fases” de uma política pública. Assim, desenvolvem-se “Tipos” de análises que visam

instrumentalizar áreas pouco abordadas ou abordadas de modo incipiente pelos modelos

expostos, sendo eles:

Tipos de Implementação

Usa-se o termo “tipos” no lugar de “modelos” por dois motivos. O primeiro se

relaciona à falta de acordo conceitual quanto ao processo de implementação, que leva a

uma imprecisão conceitual, vez que em determinado aspecto se mistura com uma parte

do processo de avaliação. O segundo, e este é mais contundente, se trata do

“reconhecimento da falta de uma teoria sobre a implementação.” (Siman, 2006, p. 65).

Cabe argumentar, de acordo com Sabatier (apud Siman 2005, p. 60) que “os

estudos de implementação ainda carecem de uma abordagem que dê conta de explicar o

por quê da distância entre o que se pensa e o que se faz”. Mesmo após tais

considerações, é possível relacionar alguns padrões de análise para o processo de

implementação.

Para Perez (apud Siman 2006, p. 65), há três visões sobre o que trata a

implementação: (a) a primeira, refere-se a todo o processo - da tomada de decisão,

execução e impacto de uma política; (b) a segunda, argumenta que: a implementação

não se confunde com seu produto, portanto não envolve a tomada de decisão e sim a

execução desta; (c) a terceira, trata da operacionalização da decisão, separada entre um

momento pós-decisão e outro pré-execução, em que se define metas, objetivos e

recursos.

18

Alguns modelos expostos nesta tabela não foram desenvolvidos ao longo do texto, pelo fato de não se

pretender realizar uma extensa exposição dos modelos existentes.

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Dentre os tipos de implementação os que tiveram maior repercussão foram as

estruturas propostas para analisar o processo de implementação, pelo padrão Top-Down

(Forward) e o padrão Bottom-up (Backward). No Top-Down a análise se efetiva

mediante separação entre o processo de formulação da política e o processo de

execução. Julga ser possível medir o sucesso/fracasso mediante a contraposição entre

meta e objetivo. Os problemas da implementação decorrem do controle e da

organização de quem toma as decisões. As decisões dos formuladores de política são

capazes de garantir a execução da decisão tomada, desde que o desenho da política

proposto dê conta dos procedimentos, metas, recursos, enfim, tenha considerado todo o

complexo de normas e atores para a realização da implementação (SIMAN, 2005).

Este tipo centra-se na apuração da eficiência de programas governamentais, na

passagem da decisão política para sua materialização. Pressupõe-se que há separação

entre as questões políticas e questões administrativas, residindo nesta última a

neutralidade política (ausência de conflitos), restando à implementação ser realizada por

critérios técnicos, profissionais, com a busca por resultados de modo otimizado,

impessoal. Estas considerações são, de modo geral, o alvo de muitas críticas com

relação aos processos de implementação e à sua construção analítica, fazendo emergir

outro padrão de análise que se julga capaz de superar estas deficiências.

O tipo Bottom-up não se preocupa com a realização de metas ou objetivos e sim,

em desvendar como ocorre a interação entre os atores que executam a decisão tomada.

Busca conhecer quais são suas estratégias, porque supõe que os responsáveis (a

burocracia) por executar a política promovem distorções no processo. Rejeita idéia de

separação entre universo político e o administrativo, pois reconhece as dimensões

políticas ligadas à implementação das políticas, dado que se travam áreas de conflitos

dentro da própria burocracia. (Siman, 2005).

Siman (2005, p. 62, apud Sabatier, 1986) fez uma proposta para sintetizar estes

modelos, para ele caberia analisar a implementação através do processo de decisão

política, considerando-a como uma etapa da tomada da decisão.

Tipos de Avaliação19

O aspecto mais controverso da avaliação deve-se ao fato de ser algo corriqueiro

que as pessoas fazem constantemente: uma ponderação baseada em valores. A avaliação

é algo que realizamos cotidianamente, mas não dispomos de informações adequadas,

19

O desenvolvimento desse item baseia-se nos livros de Aguilar e Ander-Egg (1994) e Cohen e Franco

(2004).

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objetividade e nem precisão do que estamos a julgar. Por isso, deve-se separar a

avaliação em: a avaliação informal e a sistemática (AGUILAR, ANDER-EGG, 1994).

A informal e a sistemática compartilham do mesmo objetivo, só se distinguem

quanto aos métodos, pois a sistemática se apoia no uso de procedimentos e métodos

científicos, utiliza informações para julgar o valor de um fenômeno, de modo que esse

julgamento seja justificável. O que contrasta com a informal justamente, pois esta não

se preocupa em fundamentar, de maneira explícita, o juízo pelo qual se emite o valor de

algo (AGUILAR, ANDER-EGG, 1994).

A avaliação é entendida como um processo que visa emitir um juízo de valor,

através da estimação ou apreciação, seja de objetos, processos ou situações. O conceito

de emitir um juízo de valor deve sempre ser considerado, pois é isto que o separa da

simples medição de um fenômeno (“determinar a extensão e/ou quantificação de

alguma coisa”) do “ato ou processo de determinar o valor dessa coisa”, isto é, separar

uma informação (processo de medição) do processo de valoração da informação, que é

o ato de emitir um parecer sobre o objeto avaliado20

.

Há diversas definições sobre o que é uma avaliação, Aguilar e Ander-Egg (1994,

p. 24-31) citam por volta de 20 definições, estabelecendo uma definição própria após

considerar todas as demais: avaliar é identificar de maneira válida e confiável,

informações para efetuar um juízo de valor a diferentes componentes de um programa,

que já se realizou, estão sendo realizados ou se realizarão. É contribuir, através desse

processo, para a tomada de decisão na solução de problemas e, também, ajudar no ato

de estabelecer a compreensão dos fatores que levam ao fracasso ou sucesso dos

resultados alcançados por uma política.

Tomando a avaliação por esses termos, o estudo de avaliação pode ser

classificado de diferentes maneiras: de acordo com o momento em que é realizada a

avaliação, segundo a função da avaliação, conforme a procedência dos avaliadores e de

acordo os aspectos dos programas alvo de avaliação.

Atendo-se ao momento em que é realizada, pode-se ter: (a) avaliação ex-ante:

feita no curso do planejamento, observando a adequação do projeto à realidade, sua

viabilidade (meios/recursos e objetivos; diagnósticos e proposições); (b) avaliação

durante a execução: realizada durante o processo de implementação para verificar se o

20

Aguilar e Ander-Egg (1994, p. 19) argumentam que se pode medir sem valorar e o contrário também é

válido. Única observação a ser feita é a contribuição que a medição dá à tarefa de avaliar, isto é, emitir

um juízo sobre algo.

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41

cumprimento da política está de acordo com a proposta inicial, para decidir a

continuação, o encerramento ou modificações; (c) avaliação ex post: feita depois de

encerrada a execução da política. Não se trata de avaliação após a política ter sido

implementada, e sim, depois de extinguido a política, com a finalidade de medir o

impacto desta. Mede-se basicamente a eficiência, a eficácia e a efetividade (AGUILAR,

ANDER-EGG, 1994; COHEN, FRANCO, 2004).

De acordo com as funções, avaliação, pode ser somativa: estudos dos resultados

ou efeitos de um programa, investigam-se os efeitos comparando-os com as

necessidades dos beneficiários da política. Pode ser formativa: estudos para ajudar a pôr

em andamento ou melhorar o que está sendo executado.

Conforme a procedência dos avaliadores, a avaliação pode ser externa

(avaliadores não são vinculados à instituição executora da política em avaliação),

interna (feita com a participação de pessoas que pertencem à instituição promotora ou

gestora da política, sem necessariamente serem os próprios executores).

Traçando uma visão panorâmica sobre os estudos de políticas, a quase uma

década atrás, Souza (2003, p. 15-18) apontou algumas preocupações quanto ao estágio

desses estudos no Brasil, sendo: (a) a escassa acumulação de conhecimento na área,

advinda da falta de diálogo entre pesquisadores quanto ao conhecimento e o debate

sobre o que se pesquisa21

; (b) o problema do crescimento horizontal excessivo (estudos

voltados a áreas específicas: agricultura, educação) vesus a falta de fortalecimento

vertical (voltados para uma “ciência das políticas públicas”: desenvolvimento analítico

de teorias e metodologias).

Esta dissertação se situa na abordagem teórica que presume a utilização do

modelo Múltiplos Fluxos, de utiliza-lo como um aparato que auxilia na análise do

objeto proposto. Este trabalho não compromete com o “fortalecimento vertical” do

21

Acrescentaria que a confusão terminológico-conceitual, ou mesmo a falta de delimitação clara da

dimensão que se estuda (polity, politics ou policy) também está presente. Muito do que é produzido,

estudado e classificado como estudos sobre “políticas públicas” não demonstram clareza do instrumento

analítico utilizado. Talvez necessite de maior diálogo quanto aos conceitos e grande esforço para difundir

maior sistematização da disciplina sobre políticas públicas. Tal sistematização deve tentar situar os

pesquisadores dentro do amplo campo de estudo que este se insere, pois não é o que ocorre em grande

parte dos trabalhos encontrados com títulos sobre “políticas públicas” nos periódicos brasileiros.

Ainda acrescentam-se as considerações de Reis (2003, p. 12): “É evidente que não se exige de ninguém

que, cada texto ou cada discussão, se detenha na consideração das pressuposições analíticas que

sustentam sua análise. Tampouco se espera uma confissão de fé em determinado paradigma teórico ou

uma explicitação recorrente de preferências normativas. Mas, deve-se esperar sim que o cientista

político tenha claro em que campo teórico se inscreve seu trabalho e quais os principais competidores

desse marco. Isso é condição básica para que o diálogo intelectual seja frutífero.”.

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42

campo de pesquisa em políticas, como aludido por Souza (2003), porque para isto, teria

que “testar” o modelo.

2.2. O MODELO DE MÚLTIPLOS FLUXOS

Com vista a instrumentalizar a análise pretendida, Jonh Kingdon22

desenvolveu

um modelo (Multiple Streams) para analisar políticas do governo norte-americano. O

modelo consistiu numa variação do desenvolvido por Michael Cohen, James March e

Johan Olsen (em 1972 no livro: Democratic Governance). O modelo de Kingdon

(Multiple Streams) buscou identificar a existência de correntes que agem influenciando

e mudando as políticas públicas (CAPELLA, 2006; CALDAS, 2007; PINTO, 2008).

O Multiple Streams, de acordo com Capella (2006), constitui-se em importante

ferramenta para a análise do processo de formulação de políticas, pois, através dele, se

observam as dinâmicas dos processos políticos, as quais mostram como os problemas

são encarados e absorvidos pelo governo, e se chegam a se transformar, de fato, em

objeto de intervenção do Estado.

Com o Multiple Streams pode-se elucidar as formas como são constituídas as

decisões acerca das políticas públicas. Kingdon considerou as políticas públicas como

que compostas de quatro fases: formação de uma Agenda de políticas públicas, as

ponderações acerca das Alternativas para a Formulação de políticas, a Escolha de uma

alternativa e sua respectiva Execução. A Agenda pode ser definida, inicialmente, como

um conjunto de preocupações dos formuladores de políticas que devem suscitar

soluções (CAPELLA, 2006, p. 25).

O processo de formação dessa Agenda contém a pauta das decisões sobre as

intervenções realizadas. Assim, explicar os condicionantes da sua formação é o mesmo

que explicar como as ações do governo são tomadas: “... por que alguns problemas se

tornam importantes para um governo? Como uma ideia se insere no conjunto de

preocupações dos formuladores de políticas, transformando-se em uma política

pública?” (KINGDON, 2003 apud CAPELLA, 2006, p. 25).

Na perspectiva de Kingdon, a Agenda é definida mediante três fluxos: fluxo de

problemas (problems stream), fluxo de soluções ou alternativas (policies stream) e

fluxo político (politics stream). Quando ocorre a convergência desses fluxos, muda-se a

22

Em um livro de 1984: Agendas, alternativas, and public policies.

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Agenda, propiciando que uma nova questão se estabeleça. A partir da fixação de um

problema na Agenda e a decisão de resolvê-lo, mediante uma política pública, passa-se

às considerações sobre sua elaboração (CAPELLA, 2006).

Portanto, a análise de políticas públicas deve reconstruir o processo social e

político que esteve na origem de tal política pública. Quais fatores deram origem à

demanda por essa política e quais ações foram efetuadas para atender a essa demanda.

São questões que requerem a reconstrução do processo de formação da Agenda do

governo, pois é ele que leva à descoberta dos erros, omissões e imposições com relação

às políticas adotadas (AGUILAR, 2008).

Desse modo, a análise das condições institucionais, dos movimentos políticos e

da interação entre a sociedade e o Estado, permite entender o contexto em que as

políticas são geradas e quais as razões para que elas sejam efetuadas através de

determinados desenhos institucionais, em detrimento de outros.

A existência de uma política pública está subordinada à existência de um

conflito, isto é, de um problema, de uma demanda por parte da sociedade. Mas como os

problemas chegam ao governo? Através da formação da Agenda, definida a partir de

uma lista de assuntos que estão na ordem do dia.

A Agenda contém numa lista de dificuldades23

ou temas que chamam a atenção

da sociedade e do governo. Mas como explicar a predileção do governo por alguns

assuntos? Qual a razão para que determinados assuntos sejam alvos de intervenção em

detrimento dos demais?

Para responder esse questionamento Kingdon desenvolveu o modelo dos

Múltiplos Fluxos (Multiple Streams). Esses Fluxos seriam constituídos pelos problemas

(problemas stream), soluções (policies stream) e a política (politics stream). A interação

entre estes Fluxos é o que pode gerar as mudanças na lista de assuntos relevantes para a

sociedade e governo. É o que pode promover o deslocamento de um tema, tanto para

dentro quanto para fora da Agenda.

A Agenda pode ter os seguintes formatos: sistêmica, governamental e decisional.

A Sistêmica se refere às dificuldades e questões que requerem a atenção da sociedade e

do Estado sem, necessariamente, suscitar maiores preocupações por parte do governo. A

Governamental é formada pelo conjunto de temas que o governo assume e monitora de

23

Para Pinto (2008, p. 33) Kingdon faz distinção entre dificuldades e problemas. A primeira seriam os

temas importantes que estão em pauta para a sociedade e governo, mas só se tornam problemas caso as

pessoas acreditem que é necessária alguma ação para resolvê-lo.

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perto. A decisória alude a um subconjunto da governamental, que abarca os temas a

serem decididos pelo governo, pois são problemas que se tornaram “públicos” e exigem

uma intervenção (VIANA, 1988; CALIFE, 2005; CAPELLA, 2005; MONTECINOS-

MONTECINOS, 2007).

Os temas que ascendem à Agenda decisional recebem a conotação de

“problemas públicos”. São entendidos como assuntos necessários para se fazer uma

intervenção, uma vez que não podem mais ser ignorado pelo governo, pois acarretam

grandes dificuldades ou conflitos.

A forma como se constrói cada Agenda e o entendimento do modo como os

temas migram de um formato para outro, isto é, o caminho que uma dificuldade

percorre para ascender ao status de problema público (a ser resolvido pelo governo)

pode ser explicado através da convergência dos Múltiplos Fluxos. E, também, através

da atuação dos vários segmentos da sociedade e do Estado (KINGDON, [2003] (1984)

apud CAPELLA, 2006; PINTO, 2008).

Os segmentos da sociedade e do Estado são chamados de “participantes ativos”,

sendo eles: agentes, atores ou organizações que atuam influenciando a formação da

Agenda, ainda são classificados como grupos visíveis ou invisíveis.

Entre os agentes governamentais que fazem parte do grupo visível, ou seja, os

que recebem atenção por parte da imprensa, do governo e da sociedade, estão: o poder

legislativo, o poder executivo, principalmente através dos ministros de cada área do

governo. Esses agentes são considerados vitais para a construção da Agenda, pois

através do exercício de suas funções estabelecem padrões de relacionamentos entre o

governo e os grupos de pressão. Além de obterem condições de definir quais questões

serão resolvidas e se entrarão ou não na pauta do governo (VIANA, 1988; FRANÇA,

2007).

No grupo de agentes governamentais intitulados como “invisíveis”, que não tem

muita exposição frente ao governo e sociedade, estão os integrantes da administração

pública (cargos de carreira) que podem, pelas experiências acumuladas, influenciar na

especificação de alternativas e no processo de execução das políticas.

Outro grupo que influencia na Agenda são os não-governamentais, também

classificados entre agentes invisíveis e visíveis. No primeiro grupo estão os

especialistas, os pesquisadores e os acadêmicos (a chamada policy communities), cuja

maior influência reside na especificação de alternativas. No segundo grupo situam-se a

mídia, os partidos políticos e os grupos de interesses organizados, agindo na formação

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da agenda. A mídia influencia a opinião pública e por isso tem “poderes” de construir

uma agenda, já os partidos políticos e os grupos de interesses (lobbies) agem mais

através do bloqueio de temas do que na inserção. A atuação desses atores ocorre dentro

dos processos, de Múltiplos Fluxos (VIANA, 1988; FRANÇA, 2007).

2.2.1. Fluxo de problemas – a entrada de um tema na Agenda

Esse Fluxo busca explicar o processo pelo qual um assunto se constitui em um

problema e se fixa na Agenda governamental. Definir o que é um “problema” revela-se

um desafio, dado que nessa “descoberta” estão os caminhos por onde se desenvolve a

ação do Estado.

Há três mecanismos que são capazes de alçar um tema à condição de problema,

capazes de chamarem a atenção dos formuladores de políticas para atentarem para um

evento. Para Viana (1988), os mecanismos que “tornam os assuntos proeminentes”, são:

Indicadores, Crises e Feedback.

O papel dos Indicadores reside em sua capacidade de gerar diagnósticos, apontar

para a necessidade de mudanças numa realidade. Eles são utilizados para retratarem

realidades sociais e apontar situações que causam preocupações à sociedade e/ou ao

governo. Como exemplo destaca-se: a emergência do desemprego, da pobreza e da

violência, as quais são frequentemente retratadas através da divulgação de estatísticas

públicas.

Variações drásticas nessas estatísticas normalmente levam a uma reação por

parte da mídia, da população e do meio político, frente ao que se querem mudanças. O

que acaba por elevá-los ao status de problemas públicos.

Conforme Capella (2006, p. 27):

[...] Indicadores, no entanto, não determinam per si a existência concreta de

um problema, antes são interpretações que auxiliam a demonstrar a existência

de uma questão. Assim, contribuem para a transformação de questões em

problemas, principalmente quando revelam dados quantitativos, capazes de

demonstrar a existência de uma situação que precisa de atenção. [...]

As Crises são acontecimentos capazes de atrair a atenção imediata para

determinadas questões. Eventos que tomam a proporção de uma Crise não podem mais

ser ignorados, sob pena de aumentarem, se propagarem ou saírem do controle. As

epidemias e os desastres representam bem esse mecanismo. Como exemplifica Pinto

(2008, p. 18):

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[...] homicídios chamam a atenção para questões de segurança pública;

desastres rodoviários podem apontar para a deterioração das rodovias. A

ocorrência de alguma crise, no âmbito do sistema de serviços de saúde, por

exemplo, na área hospitalar, contribui para dar visibilidade a um problema

que pode ser o ponto de partida da formulação da política.

O Feedback ocorre através da avaliação sistemática dos órgãos públicos, por

gestores e administração pública, que através das experiências sobre questões

enfrentadas ou políticas executadas, identificam novas demandas, questões ou

dificuldades que tem potencial para se tornarem problemas. A aproximação entre esses

gestores com os canais de implementação e operacionalização das políticas coloca-os

frente às reivindicações de diversos agentes (CAPELLA, 2006; PINTO, 2008).

Mesmo que Indicadores, Crises e Feedback apontem para dificuldades, eles não

são suficientes para transformarem assuntos em problemas públicos, os quais, para

Capella (2006, p. 27), “são construções sociais, envolvendo interpretações”. Tal

percepção é corroborada por Subirats (2006), para quem os problemas são “artificiais” e

são construídos mediante os interesses dos envolvidos24

na questão em foco.

Assim, o modo como cada questão é tratada, isto é, a forma como são percebidos

os assuntos, as causas e razões de existência; assim como, o que seu agravamento pode

acarretar são construções que partem de interpretações nem sempre consensuais. A

emergência ao status de problema público depende muito mais da coalizão dos

participantes ativos, principalmente daqueles que centram seus esforços entorno do

fluxo político.

2.2.2. Fluxo de soluções – a especificação de Alternativas

O Fluxo soluções é constituído pelas possíveis alternativas para os problemas.

Sua importância reside no fato que após a entrada de um assunto na Agenda decisória

(seu reconhecimento como um problema público) define-se qual estratégia para o

enfrentamento de tal problema.

Considera-se que a escolha de alternativas está intrinsecamente ligada à

definição do problema. O diagnóstico do problema precisa estar bem delineado, antes

que se proponham ações para a sua solução, sob o risco de se agravarem os problemas

que se pretendiam resolver. Para Subirats (2006), oferecer uma definição errada para um

24

Lobato (2006) aborda a representação de interesses e seus efeitos sobre a formulação de políticas

públicas.

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problema produz muito mais erros do que oferecer uma má solução para um problema

bem delineado, diagnosticado.

Depreende-se que o mundo das soluções está ligado ao mundo dos problemas.

Embora, Capella (2006) argumente que no Múltiplos Fluxos as ideias geradas não estão,

necessariamente, relacionadas à percepção de problemas específicos. Posto que as

questões colocadas na Agenda governamental não surgiam em par com uma solução:

“as pessoas não necessariamente resolvem problemas. [...] Em vez disso, geralmente

criam soluções e, então, procuram problemas para os quais possam apresentar suas

soluções” (Kingdon, 2003, p. 32 apud Capella, 2006, p. 27)25

.

A noção de que as ideias geradas (Alternativas propostas) não se assemelham

aos problemas, sugere a que problemas e soluções pertençam a fluxos diferentes e,

portanto, são criados por processos e arenas diferentes. Mas, isso não retira a

necessidade de convergência entre o diagnóstico e a definição exata e precisa de um

problema, como pressuposto para a especificação de alternativas adequadas e eficientes

para solucioná-lo.

Daí a relevância de a dinâmica do Fluxo de Soluções estar relacionada ao

conjunto dos participantes ativos, dos que são responsáveis por gerar as alternativas

para os problemas. Nesse grupo se encontram os pesquisadores, os acadêmicos,

funcionários públicos, analistas de grupos de interesses, mídia e membros do legislativo

(VIANA, 1988, CAPELLA, 2006; PINTO, 2008).

A produção de Alternativas está associada à seleção das alternativas e de ideias,

cuja resolução do problema requer um processo de seleção em que “as melhores” se

sobressaem. As ideias e soluções são geradas pelos participantes ativos, uma parcela

dos atores invisíveis, compostos pelos cientistas, comunidades acadêmicas,

pesquisadores, burocracia e etc.

Nessa dinâmica de produção de soluções e propostas, alguns indivíduos aceitam

alguma alternativa como viável e iniciam a difusão da proposta, buscando sensibilizar

pesquisadores, acadêmicos, formuladores de políticas e o público em geral, através da

persuasão. Este aspecto, cunhado de soften up por Kingdon, é importante, pois sem a

sensibilização que ele agrega dificilmente são aceitas as alternativas apresentadas. No

25

Capella (2006, p. 47) coloca em notas finais o texto no original: ”people do not necessarily solve

problems. [...] Instead, what they often do is generate solutions, and then look for problems to which to

hook their solutions”.

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final, as alternativas que se mostram mais viáveis, técnica e politicamente, se

sobressaem e são apresentadas aos formuladores de políticas (CAPELLA, 2006).

Nas palavras de Subirats (2006, p. 203 – tradução própria):

De fato, ao vincular de maneira clara a definição ou a abordagem do

problema com o processo de tomada de decisão (“eu decido que este é o

problema”), nos aproximamos de uma visão “labiríntica” do tema. Em um

labirinto existem diferentes vias, cuja única diferença reside no que vemos ao

fim: prêmio ou beco sem saída.

Toda construção do Fluxo de Soluções requer que a alternativa esteja ligada a

uma conjuntura que lhe seja favorável, ao ponto de ela se sobressair no espaço dos

conflitos de interesses envolvidos na escolha. Dentre as vias do labirinto, apenas uma é

a estrada correta. A definição do problema, juntamente com a análise das limitações das

alternativas existentes, considerando o que se admite possível de ser realizado é a

resposta para encontrar o prêmio, ao invés do beco sem saída.

2.2.3. Fluxo político – a tomada de decisão

Este Fluxo que age influenciando a Agenda é composto pela dimensão da

política, no sentido de conflitos e negociações presentes nos processos de barganha. Ele

tem conexão com os fatores relacionados ao “clima nacional”, às forças políticas

organizadas e a mudanças no interior do próprio governo.

O “clima nacional” é uma espécie de “humor nacional”, caracterizado através de

uma situação em que grande número de pessoas compartilham as mesmas preocupações

ou ideias, em um dado momento. Não se trata da opinião da nação como um todo, mas

sim, da percepção de alguns setores, mais representativos da sociedade, que através de

diversos recursos de comunicação (vários tipos de mídia; eventos e encontros

científicos; eventos e encontros setoriais e etc.) passam o estado do “clima ou humor”

nacional (BRITO, 2009).

O “clima” ou “humor nacional” é um elemento que sinaliza a recepção da

sociedade em relação a determinados temas, bem como a possível receptividade para

determinadas soluções. A aceitação e o veto podem ocorrer de acordo com a percepção

do “clima favorável” a uma ideia. Essa dinâmica explica como algumas questões

emergem em detrimento de outras (CAPELLA, 2006).

As forças políticas organizadas interferem na dimensão política deste Fluxo, e

faz-se através dos grupos de pressão. Caso exista consenso entorno de uma questão,

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constata-se “ambiente propício” para o desenvolvimento desta, e se existe veto por parte

de algum grupo de interesses, sabe-se haver custos relevantes para o processo ser levado

adiante (CAPELLA, 2006; BRITO, 2009).

Uma forma de identificar mudanças na agenda está relacionada ao papel de

setores governamentais em eleger temas como relevantes. Indivíduos em posições

hierárquicas mais altas, dentro da estrutura governamental, podem influenciar a escolha

de temas e elegê-los como prioritários. Do mesmo modo ocorre no legislativo e em

empresas públicas. Quando há mudanças no quadro administrativo, nos quadros de

representação política (executivo e legislativo), nos mandatários dos órgãos públicos

(ministérios, secretarias e qualquer instituição pública), potencializa-se o processo de

mudança na agenda.

A passagem de um governo para outro propicia grandes mudanças na agenda,

considerando as propostas políticas de cada governo, compromissos assumidos, assim

como os atores que apoiaram e fazem parte de uma coalizão. Nessa coalizão, há grupos

de pressão, opinião pública e movimentos sociais, assim como a pressão do legislativo e

das agências administrativas agindo para determinar o clima político para a mudança da

agenda, influenciando o processo de obstrução ou favorecimento de uma questão

(CAPELLA, 2006).

No processo de constituição da Agenda, o modelo de Múltiplos Fluxos

argumenta que em determinadas circunstâncias os três fluxos convergem e geraram

oportunidade de mudança na agenda. O momento de convergência ocorre quando há um

problema público, gerado pelo fluxo de problemas; uma solução disponível, emergida

do fluxo de soluções; e condições políticas que propiciam essa ocorrência. A interação

entre estes Fluxos é o que promove o deslocamento de um tema, tanto para dentro

quanto para fora da Agenda.

Esse processo de confluência dos fluxos é denominado como Coupling, e ocorre

mediante determinadas circunstâncias chamadas de Policy Windows. Para que ocorra a

junção dos fluxos (coupling) em determinados momentos propícios, é preciso que se

tenha as chamadas “janelas políticas” (policy windows) e nelas se destaquem os Policy

Entrepreneurs (empreendedores da política). O coupling ocorre quando as policy

windows estão abertas e mediante a ação dos policy entrepreneurs ocorrem as mudanças

na agenda (CAPELLA, 2006; BRITO, 2009).

As policy windows, as oportunidades para mudanças, surgem mediante a

interação entre o Fluxo de Problemas e o Fluxo Político. Quando se constata a

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emergência de um problema, quando há “clima nacional” ou mudanças no interior do

governo abrem as janelas de oportunidade para emergirem novas questões na agenda. O

Fluxo de Soluções, não gera a abertura de uma policy windows e não exerce influência

direta sobre alterações na agenda, vez que as soluções são posteriores à definição da

Agenda (CAPELLA, 2006).

Isto não significa que a convergência ocorra sem o Fluxo de Soluções, dado que

este se integra no momento em que formuladores de políticas se deparam com os

problemas. A partir do Fluxo de Problemas e Fluxo Político se se abrem as janelas, e da

mesma forma, também se fecham. O “fechamento” de uma janela deve-se ao não

alinhamento dos fluxos, à sua desarticulação. Assim, para ocorrer mudanças na agenda

é necessário esperar a próxima “abertura” de uma janela política, de uma janela de

oportunidade.

Não basta a existência de uma janela aberta para que ocorram mudanças na

agenda. É necessária a atuação de policy entrepreneurs, indivíduos com habilidade de

transmitir e representar ideias de grupos ou demais indivíduos entorno de uma

determinada questão. Estes indivíduos podem estar dentro do próprio processo

decisório, e agem promovendo a união entre soluções e problemas, consolidando

propostas a momentos políticos (CAPELLA, 2006, p. 31).

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3. OS MÚLTIPLOS FLUXOS NA CONSTITUIÇÃO DA POLÍTICA

NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E NUTRICIONAL

(PNSAN)

Nesta dissertação, com o modelo de Múltiplos Fluxos busca-se analisar o

surgimento e a institucionalização dos Consórcios de Segurança Alimentar e

Desenvolvimento Local (CONSAD), enquanto estrutura integrante de Política (pública)

Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN). Nesse percurso, discute-se o

fluxo de problemas através de “A fome como problema público”, o fluxo de alternativas

com as “Políticas de combate à fome” e o fluxo político via “O retorno da fome à

agenda governamental”.

Com o primeiro fluxo demonstra-se a emergência do problema da fome, que

alçado a condição de política pública, se caracteriza como a resposta a um problema,

qual seja: o da insegurança alimentar que por muito tempo foi tratado como sinônimo

do problema da fome. O presente trabalho de pesquisa não se foca na questão da fome e

nem da segurança alimentar, e sim no processo de construção de uma política e de um

de seus programas - o CONSAD.

Com o segundo fluxo, “Políticas de combate à fome”, a perspectiva adotada está

assentada na questão do diagnóstico sobre o problema fome/insegurança alimentar, que

contribuiu para uma evolução sobre a percepção do problema.

Com o fluxo o político examina-se “O retorno da fome à agenda

governamental”. As condições que alçaram o problema à agenda nacional e como se

desenvolveu o processo que o elevou ao status de “problema público”, colocando-o na

agenda decisória. A discussão sobre “redescoberta da fome” abrem o caminho para

discussão do Coupling, o encontro dos três fluxos, a “janela política” que possibilitou a

implementação da PNSAN.

Em síntese isto culminou na criação do Programa Fome Zero, uma etapa de

materialização da construção da PNSAN. O Programa Fome Zero, que procedeu a

criação do CONSAD, está tratado no âmbito do recorte temático, assim como as

diretrizes da PNSAN.

A Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional foi constituída após

os anos 80. As preocupações que levam à construção dessa Política têm raízes históricas

longas, datadas do início do século XX. A despeito de a fome, enquanto problema que

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assola a humanidade, sempre tenha existido. O novo foi a forma como ele passou a ser

encarado: segurança alimentar (NASCIMENTO, 2009).

A evolução do tratamento da questão da fome constitui o cerne das políticas

voltadas para sua superação, considerando o modo como governo e sociedade atuam

para enfrentá-lo. Conforme mudam os diagnósticos sobre tal questão, mudam-se as

arenas nas quais são tratados.

A transformação da problemática da fome em uma problemática de segurança

alimentar reflete trajetória (não linear) da transformação dos diagnósticos, uma vez que

a simples mudança de nome muda a perspectiva de atuação das políticas públicas

brasileiras.

Bonfim (2004) analisou a mudança de termos, de fome à segurança alimentar, e

mostrou os conteúdos ideológicos presentes nos tratamentos desses termos. Partiu da

ideia de que a fome é uma cicatriz social de que todos se envergonham, enquanto alguns

tentam escancará-la para chamar a atenção para a situação, outros tentam amenizá-la.

A análise de Bonfim (2000) mostra os diálogos entre especialistas e jornalistas

sobre o tema da fome. Os discursos contêm a luta entre aqueles que buscam a mudança

da estrutura socioeconômica para a solução do tema e aqueles que contestavam essa

alternativa.

A discussão justifica, no caso brasileiro, o mundo dos conflitos em que se situa a

constituição da fome enquanto problema público e a delimitação da Política Nacional de

Segurança Alimentar, para o qual se percorreu um extenso caminho que se iniciou na

metade da década de 1940, quando a fome entrou na agenda das políticas públicas

brasileiras (BONFIM, 2000).

3.1. A FOME COMO PROBLEMA PÚBLICO: Fluxo de Problemas

No Brasil, a fome como problema público só entrou na agenda pública no início

do século XX. Até então, a fome era vista como um fenômeno decorrente de grandes

catástrofes, como a seca, a perda de colheitas ou a guerra (NASCIMENTO, 2009).

Foi com a obra clássica de Josué de Castro, em 1946, intitulada de “Geografia da

Fome”, que a questão entrou na agenda pública. Nesse estudo, o autor desmistificou a

forma como se produz a fome e como ela se transforma em um problema de grandes

proporções sociais, econômicas e políticas. Fundamentando-se numa perspectiva

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multidisciplinar, que agregou a medicina, a geografia e a sociologia, demonstrou que a

natureza da fome se revelava muito mais como fenômeno econômico-social do que

biológico (BATISTA FILHO, 2003; BONFIM, 2004).

Ao afirmar que “a fome não se pode explicar a base de fenômenos naturais”,

Castro (1980, p. 114) fez um esquadrinhamento das razões da existência da fome nas

regiões brasileiras e as compôs conforme sua incidência e causas.

Antes de estabelecer a distribuição geográfica da fome, Josué de Castro definiu

as áreas de fome como endêmica e epidêmica. As áreas endêmicas seriam aquelas

marcadas por presença permanente de manifestações carenciais no estado de

desnutrição. As epidêmicas seriam aquelas marcadas por circunstâncias transitórias, no

estado de desnutrição. As áreas de fome foram definidas pela extensão numérica do

fenômeno, sendo consideradas aquelas em que pelo menos a metade da população

estivesse apresentando deficiências no estado nutricional (CASTRO, 1980, p. 59).

Com esta categorização estabeleceu como áreas de fome endêmicas, a Região

Amazônica, a Região da Mata e a Região do Sertão Nordestino. E áreas de fome

epidêmicas, as Regiões Centro-Oeste e Extremo Sul. Assim, passou a explicar os fatores

que levaram a fome e as condições que estabeleciam a qualidade alimentar de cada

região (CASTRO, 1980, p. 59-60).

A Região Amazônica com baixa densidade demográfica, grande extensão de

terra, ausência de recursos técnicos, meio geográfico impenetrável (florestas

amazônicas) e a pobreza natural da floresta equatorial para a produção de alimentos,

formava a tragédia geográfica da fome. No entanto, a fome estava assentada na ausência

de ações governamentais para atenuar a situação (CASTRO, 1980, p. 62-79).

Para o Nordeste adotou a seguinte subdivisão: Região Açucareira e Região do

Sertão. A primeira era caracterizada pelo solo fértil, clima tropical adequado para

produção de uma variedade de alimentos e uma floresta nativa abundante em árvores

frutíferas, fornecendo condições ao cultivo e ao consumo de uma infinidade de

alimentos. Entretanto, devido a ação colonizadora e a chegada da cana-de-açúcar houve

a degradação dos recursos naturais, o que contribuiu para a incidência das endemias na

região (CASTRO, 1980, p. 115-169).

Ao examinar a fome que assolava a Região Açucareira, constatou-se que a

exploração da cana-de-açúcar, aliada à estrutura socioeconômica que a atividade

estabelece, acarretava uma ação destrutiva sobre “... a estrutura biológica dos grupos

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humanos que aí se fixaram e se desenvolveram...” (Castro, 1980, p. 115). Essa foi a

“nova” fome denunciada por Josué de Castro, a fome provocada pelas estruturas sociais.

A Região do Sertão foi caracterizada pelo tipo de fome, não-permanente. Nos

casos em que as secas assolavam a região, surgiam surtos agudos de fome e estes se

alternavam com períodos de abundância. Excetuando o quadro deplorável que

produzido pela seca, a Região do Sertão não se figuraria entre áreas de fome, entretanto,

como salienta Castro (1980, p. 175), essas secas, mesmo periódicas, desorganizam toda

a economia da região:

[...] São epidemias de fome global quantitativa e qualitativa, alcançando com

incrível violência os limites extremos da desnutrição e da inanição aguda e

atingindo indistintamente a todos, ricos e pobres, fazendeiros abastados e

trabalhadores do eito, homens, mulheres e crianças, todos açoitados de

maneira impiedosa pelo terrível flagelo das secas.

Como atingem a todos, as razões da prevalência da fome pareciam ser

“naturais”. Mas, Josué de Castro demonstra exatamente o contrário:

Muito mais do que a seca, o que acarreta a fome no Nordeste é o pauperismo

generalizado, a proletarização progressiva de suas populações, cuja

produtividade é mínima e está longe de permitir a formação de quaisquer

reservas com que seja possível enfrentar os períodos de escassez — os anos

das vacas magras, mesmo porque no Nordeste já não há anos de vacas

gordas. Tudo é pobreza, é magreza, é miséria relativa ou absoluta, segundo

chova ou não chova no sertão. Sem reservas alimentares e sem poder

aquisitivo para adquirir os alimentos nas épocas de carestia, o sertanejo não

tem defesa e cai irremediavelmente nas garras da fome. (CASTRO, 1980, p.

260)

Dessa forma, Josué de Castro colocou a fome em outra categoria que não a de

fenômeno natural. A razão da persistência da fome na Região do Sertão estava

assentada na natureza das estruturas socioeconômicas e não nas causas naturais. A

estrutura agrária concentrada, na visão do autor, era a responsável pelo desemprego que

assolava os trabalhadores.

Na Região Centro-Sul, área de fome epidêmica, em que se manifestavam apenas

desequilíbrios e carências alimentares que atingiam grupos reduzidos, a tragédia da

fome atingia a população pobre dos centros urbanos, principalmente nos bairros

operários e nos subúrbios, que não tinham condições de aquisição alimentar adequadas

tanto em termos de quantidade com de qualidade (CASTRO, 1980).

Desse modo tem-se uma nova construção para o problema da fome, que o

delimita como um fenômeno social. Pois, em regiões em que há fatores que propiciam o

cultivo de alimentos, não se justifica a existência da fome. Em regiões assoladas pela

seca, como o Sertão Nordestino, a fome é causada pela estrutura agrária concentrada e

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pelo desemprego. E nas regiões Centro-Sul, a pobreza de boa parte da população é a

responsável por esse quadro de fome.

Com a referida obra de Josué de Castro, o tema da fome foi alçado à agenda

governamental, posto que demonstrou de forma clara, despida de constrangimento

político ou econômico, as razões pelas quais parte da população era atormentada pelo

flagelo da fome 26

. Segundo Pedro (2006), dizer que as pessoas passam fome porque não

se alimentam não passa de um truísmo, pois a fome possui história. A busca para

elucidar as razões pelas quais muitos não se alimentam seria a verdade a ser encontrada.

Ao denunciar a fome enquanto resultado de um processo histórico excludente e

do descaso produzido pelas políticas de desenvolvimento, que só agravaram o processo

de exclusão, Josué de Castro colocou na agenda governamental a necessidade de

políticas de combate à fome. Políticas que diminuíssem as desigualdades sociais, – a

pobreza generalizada em um país com imensas áreas cultiváveis e de grandes riquezas

naturais – que construíam o pano de fundo do retrato da fome (SOARES, 2003;

BATISTA FILHO, 2003).

3.2. POLÍTICAS DE COMBATE À FOME: Fluxo de Alternativas

Embora a obra de Josué de Castro tenha trazido importantes considerações a

respeito do problema da fome, bem como de seus efeitos maléficos que corroem a

estrutura social brasileira, Pinheiro e Carvalho (2010) afirmam que por muitas décadas

esse problema foi incapaz de mobilizar as forças políticas necessárias para enfrentá-lo.

As ações públicas foram iniciadas em 1909 com o Departamento Nacional de

Obras Contra a Seca (DNOCS). Estas se voltavam para o atendimento da região do

semi-árido nordestino. Não era ação exclusiva de combate à fome, era associada à seca,

mas tinha como finalidade o combate à fome. Outras ações foram a criação do

Comissariado de Alimentação Pública (CAP), em 1918, decorrente de greves operárias

ocorridas em 1917. Ele visava a regulação de gêneros alimentícios de primeira

necessidade (TAKAGI, 2006; NASCIMENTO, 2009).

26

No prefácio do livro Geografia da Fome (1980, p. 30), Josué de Castro fala sobre a falta de diálogos

públicos, tanto da sociedade quanto do governo, sobre um tema tão importante: “preconceitos de ordem

moral, política e econômica que tornaram a fome um tema proibido, ou pelo menos pouco aconselhável

de ser abordado publicamente”.

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O marco para as políticas públicas de combate à fome foram ações efetuadas

após a publicação dos inquéritos sobre as condições de vida dos trabalhadores. O

primeiro inquérito desse tipo foi realizado por Josué de Castro em 1932, versando sobre

a classe operária do Recife. Na sequencia surgiram em São Paulo e Rio de Janeiro. A

partir das informações geradas por estes inquéritos formou-se a legislação que criou o

salário mínimo, em 1938, e o regulamentou em 1946, na Constituição27

(SILVA 1995;

BARROS, TARTAGLIA, 2003; BOMFIM, 2004; MACEDO et al., 2009;

NASCIMENTO, 2009).

A criação do Serviço de Alimentação da Previdência Social (SAPS), em 1940,

foi a primeira ação governamental decorrente da divulgação dos inquéritos sobre as

condições de vida dos trabalhadores. Este Serviço teve o escopo de prestar assistência

alimentar e nutricional aos trabalhadores formais. Dentre as medidas estavam:

obrigatoriedade das empresas com mais de 500 funcionários construírem refeitórios;

criação de restaurantes populares; comercialização de produtos alimentares (a preço de

custo para trabalhadores com família numerosa); provimento de alimentação para

estudantes e auxílio doença (SILVA, 1995; BARROS, TARTAGLIA, 2003;

NASCIMENTO, 2009).

O SAPS se constituiu no embrião dos atuais programas de alimentação do

trabalhador, dos programas de alimentação escolar e dos restaurantes populares

(implementados, décadas depois pelo programa Fome Zero), hoje tutelados pelo

Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome (NASCIMENTO, 2009).

Depois do SAPS surgiu o Serviço Técnico de Alimentação Nutricional (STAN),

para orientar a produção agrícola e a produção industrial de alimentos, bem como

fornecer assistência técnica à indústria, através de laboratórios de tecnologia de

alimentos. Dessa experiência constitui-se a Comissão Nacional de Alimentação (CNA),

em 1945 que teve a responsabilidade de realizar estudos sobre a alimentação do povo

brasileiro e promover a educação alimentar (SILVA, 1995; NASCIMENTO, 2009;

BARROS, TARTAGLIA, 2003).

As ações do Estado eram vinculadas a propostas de educação alimentar dos

trabalhadores e adequação técnica das indústrias e da agricultura, não preconizando

ações que representassem transformações sociais ou auxílio às pessoas assoladas pela

27

De acordo com BARROS E TARTAGLIA (2003), “a instituição do Salário Mínimo, pela Lei 185 de

14/01/36, regulamentada pelo Decreto-Lei 399 de 30/04/38 considerava que ele deveria garantir, entre

outros itens, uma ração essencial mínima, teoricamente capaz de prover o aporte nutricional necessário

ao trabalhador”.

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fome, à exceção do SAPS, que deu início as primeiras ações de auxílio alimentar a

trabalhadores e alguns estudantes. Para Barros e Tartaglia (2003, p. 118), essas ações

foram adotadas porque precediam de soluções apontadas pelo “saber da nutrição” que

na época dominavam as prescrições para as políticas de alimentação e combate à fome.

Nessa perspectiva, iniciam-se, a partir dos anos de 1950, programas de

distribuição de alimentos, mas a preocupação central estava voltada para políticas de

abastecimento. A criação de estruturas de armazenagem, distribuição de alimentos e

administração de estoques, são exemplos dessas iniciativas. A criação da Comissão

Federal de Abastecimento e Preços (COFAP), anos 50, e da Superintendência Nacional

de Abastecimento (SUNAB), em 1960, norteou as ações do governo para a produção e

distribuição dos alimentos (TAKAGI, 2006).

Em 1952, através da Comissão Nacional de Alimentação (CNA), criou-se um

plano de ação que buscou mitigar os efeitos da fome, chamado de Conjuntura Alimentar

e Problemas de Nutrição no Brasil. Este Plano continha diretrizes que abarcaram a

expansão da merenda escolar, a assistência alimentar a jovens e assistência técnica para

indústria de alimentos. Com ele, buscou-se a assistência alimentar a grupos específicos

(SILVA, 1995; BARROS, TARTAGLIA, 2003).

A criação do Instituto Nacional de Alimentação e Nutrição (INAN), 1972,

demarcou um novo tipo de ação política, mesmo sendo criado com os mesmos objetivos

de políticas anteriores (subsidiar e orientar o governo para tomada de decisão em

políticas de alimentação e nutrição, além de fomentar pesquisas científicas). As políticas

criadas a partir do INAN buscaram a articulação entre instituições de diversos

ministérios na execução dos seus programas. O Programa Nacional de Alimentação e

Nutrição (PRONAN), 1973, foi um dos expoentes por essa busca de intersetorialidade

entre programas. Mas, o I PRONAN, de 1973/1974, não funcionou devido a problemas

administrativos, como salienta Silva (1995).

O II PRONAN (1976/1979) foi responsável por ampla gama de ação na área da

alimentação. Dentre os programas que ficaram sob a responsabilidade do INAN,

tivemos Nutrição em Saúde, Abastecimento de Alimentos em Áreas de Baixa Renda,

Racionalização da Produção de Alimentos Básicos, Incentivo ao Aleitamento Materno,

Combate às Carências Nutricionais Específicas e Sistema de Vigilância Alimentar e

Nutricional. Sob a responsabilidade de outros ministérios ficaram os programas de

Complementação Alimentar (Ministério da Saúde), Alimentação do Trabalhador

(Ministério do Trabalho), Alimentação Escolar e dos Irmãos do Escolar (Ministério da

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58

Educação), Leite para Crianças Carentes e Programa de Alimentação Popular (SILVA,

1995).

3.2.1. Construção do conceito de segurança alimentar: a formação de

uma solução para o problema

No caso brasileiro, a exceção das políticas efetuadas pré-Geografia da Fome (de

Josué de Castro) que estiveram preocupadas com a educação nutricional, as demais

políticas se voltaram para as recomendações e parâmetros concebidos por organismos

internacionais, como Banco Mundial e Organização das Nações Unidas para a

Agricultura e Alimentação (FAO) (BARROS, TARTAGLIA, 2003, p. 118).

A incorporação holística do problema, o olhar multidisciplinar sobre a fome,

enquanto problema complexo e dependente de uma matriz político-econômica, só foi

incorporado à construção de políticas públicas a partir dos anos 1990, mediante

orientações das citadas instituições internacionais.

Na origem, o conceito de Segurança Alimentar esteve vinculado a uma noção da

questão da fome enquanto problema esporádico, que assolava a Europa em tempos de

crise. Queda na produção devido a problemas climáticos, guerras e pestes, eram as

causas da fome. Nesse contexto dos efeitos da Primeira Guerra Mundial surgiu o

primeiro conceito de Segurança Alimentar.

No fim dessa Guerra constatou-se que a alimentação era utilizada como arma,

pois, quando se privava uma nação do acesso aos alimentos sua subjugação se tornava

mais fácil. Emergiu daí a noção de segurança alimentar vinculada à segurança nacional,

subsidiária do entendimento de estratégia militar. Sua implicação imediata foi a

elaboração de políticas voltadas para a produção e o abastecimento (VALENTE, 2002;

HIRAI, DOS ANJOS, 2007).

A insuficiência de alimentos provocada pela desestruturação e estagnação da

agricultura, após a Primeira Guerra Mundial, levou os países a se preocuparem com

uma questão de soberania, pautada pela necessidade de auto-produção de modo que

pudesse garantir internamente o fornecimento de alimentos, diminuindo a dependência

com relação aos demais (HIRAI, DOS ANJOS, 2007; CHEHAB, 2010).

Novamente, a fome atingiu a Europa no fim da Segunda Guerra Mundial e

tornou-se pauta da constituição de organizações internacionais que procuravam regular

uma nova ordem mundial, como a Organizações para as Nações Unidas (ONU) e o

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Fundo Monetário Internacional (FMI). Discutiu-se a criação de um organismo que

reorganizasse e incentivasse a agricultura e a alimentação, essa foi a proposta da reunião

mundial em Hot Springs, Arkansas – EUA, em 1943, considerada a I Conferência

Internacional sobre a agricultura e alimentação (HIRAI, DOS ANJOS, 2007).

Dessa Conferência criou-se, em 1945 na cidade de Quebec, no Canadá, a

Organização das Nações Unidas para a Agricultura e Alimentação (FAO), com a

responsabilidade de articular a ajuda alimentar aos países nos quais os sistemas

produtivos agrícolas estivessem estagnados, visando dotá-los de condições de produção

(TAKAGI, 2006; HIRAI, DOS ANJOS, 2007; CHEHAB, 2010).

Para tal, ressalta-se o desenvolvimento da questão do direito à alimentação como

uma das bases para esse novo conceito. Segundo Chehab (2010), em 1948, na

Declaração Universal dos Direitos Humanos, promulgada pela ONU, estabeleceu-se a

alimentação como um direito (Artº 25). Nos ano de 1966, o direito a alimentação se

consolidou no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais,

(através do Artº 11). Diversos países passaram a ser signatários dessa Declaração e

Pacto, ficando a responsabilidade de cada um a garantia desse direito.

Com a FAO fixou-se a ideia de segurança alimentar como questão de segurança

nacional, por isso relacionada com políticas de produção e de abastecimento. Esse

conceito balizou as políticas brasileiras de armazenagem e distribuição de alimentos. A

necessidade da mudança conceitual foi explicitada e ratificada na I Conferência

Mundial de Segurança Alimentar, promovida pela FAO em 1974 (VALENTE, 2002;

TAKAGI, 2006).

As crises alimentares que ocorrem na década de 70, devido à queda dos estoques

alimentares, provocadas por adversidades climáticas nos principais países produtores de

alimentos, conjuntamente com as secas que assolaram a África, fortaleceram a

concepção de segurança alimentar, enquanto produção estratégica. Isso condicionou um

apoio político e conceitual às propostas com foco produtivista (MALUF, MENEZES,

2000; TAKAGI, 2006; BORGES, 2007).

O argumento, até então utilizado, era de que o aumento da produção agrícola

seria suficiente para acabar com a fome no mundo. Partindo disso, estabeleceu-se a base

para a ideia da Revolução Verde28

e sua vinculação com a segurança alimentar. Tal

28

Emprego maciço de insumos químicos, como fertilizantes e pesticidas, e a utilização de novas matérias-

primas e de inovações tecnológicas capazes de aumentar exponencialmente a oferta de alimentos

(BORGES, 2007; GOMES JÚNIOR, 2007; HIRAI, DOS ANJOS, 2007).

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concepção norteou não só as políticas no âmbito da segurança alimentar, como também

direcionou as políticas econômicas dos países subdesenvolvidos, voltando-as para a

geração de excedentes agrícolas capazes de recompor os estoques mundiais de

alimentos (GOMES JÚNIOR, 2007).

Entretanto, tais de cunho produtivista não alcançaram o propósito de acabar com

a fome. No Brasil, a ideia produtivista da segurança alimentar gerou a transformação do

campo e das cidades através da “modernização conservadora”, que deslocou para as

cidades um contingente de pessoas despossuídas de trabalho e de renda. A partir desse

quadro, iniciou-se uma guinada no conceito de segurança alimentar deslocando a ideia

de produção para um segundo plano (MALUF, MENEZES, 2000; GOMES JÚNIOR,

2007).

Na década de 1980 tratou-se de formular um novo conceito de Segurança

Alimentar, para o que se resgataram as ideias de Josué de Castro, o qual “denunciava a

fome por ser injusta”, ser consequência da estrutura produtiva e de problemas sociais e

políticos. Surgia, com novos autores, uma abordagem que atribuía ao acesso aos

alimentos um fator fundamental causador da fome. Embora Castro seja pioneiro nessa

análise, as ideias de Amartya Sen sobre os “intitulamentos” 29

ganharam força e

influenciaram o processo de mudança do conceito de segurança alimentar (TAKAGI,

2006; BORGES, 2007; GOMES JÚNIOR, 2007).

Em 1983, a FAO, através da 8ª Sessão do Comitê Mundial de Segurança

Alimentar, apresentou um novo conceito de Segurança Alimentar baseado em três

premissas, sendo elas: a oferta adequada de alimentos, a estabilidade da oferta e do

mercado de alimentos e a segurança no acesso aos alimentos ofertados. Assim, se

consolidou uma definição de segurança alimentar, como a expressada pelo Banco

Mundial, desde 1986, como: “segurança alimentar é a garantia do acesso de todos

durante todo o tempo e em quantidade suficiente, de modo que proporcione uma vida

ativa e saudável” (TAKAGI, 2006; HIRAI, DOS ANJOS, 2007, p. 44).

No início da década de 1990 incorporou-se uma nova dimensão ao conceito de

Segurança Alimentar, a da qualidade dos alimentos. Essa foi estabelecida na

Conferência Internacional de Nutrição, realizada em 1992, organizada pela FAO e

29

Desenvolvimento como Liberdade, Amartya Sen (2000). O conceito de “Intitulamentos” foi

desenvolvido em 1981, e coloca a ideia de pobreza, estritamente relacionada com a fome, como a

privação das capacidades dos indivíduos de acesso a diversos bens, seja renda, serviços públicos, cultura

e etc.. São essas privações que levam o indivíduo à fome. O cerceamento das “capacidades individuais”

ocorreria por conta das estruturas institucionais e socioeconômicas. Daí a ligação com a abordagem de

Josué de Castro (TAKAGI, 2006; BORGES, 2007).

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Organização Mundial da Saúde (OMS). Questões nutricionais, biológicas e sanitárias

passaram a integrar as preocupações entorno da segurança alimentar, a qual recebeu a

nova denominação de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) (TAKAGI, 2006).

A consolidação desse termo vem desde a Conferência Mundial da Alimentação

de 1996, responsável pela Declaração de Roma, que estabeleceu as bases de atuação

sobre a questão da SAN, cujo objetivo é erradicar a fome. Depois dessa Conferência

realizou-se a Cúpula +5, com o objetivo de fazer um balanço das ações e dos resultados

contra a fome no mundo. Como destaque dessa Cúpula aponta-se a identificação da falta

de “vontade política” de se resolver o problema da fome por parte dos governantes das

nações (TAKAGI, 2006).

3.3. O RETORNO DA FOME À AGENDA GOVERNAMENTAL: Fluxo

Político

No Brasil, ao final da década de 1980 e início de 1990, transitou nos círculos

políticos governamentais a ideia de que os problemas oriundos da produção,

abastecimento e distribuição, estavam resolvidos. Tanto pela via do aumento da

produção, abastecimento ou assegurados pelas políticas agrícolas, assim como pela

introdução de grandes redes privadas de supermercados que garantiam a

comercialização dos alimentos. Entretanto, a fome persistia, o que levou o Ministério da

Agricultura, em 1985, a constatar que a fome era um problema que para ser resolvido

devia-se considerar não apenas o problema específico do setor agrícola (TAKAGI,

2006).

Essa constatação está expressa no documento de proposição da política de

abastecimento do Ministério da Agricultura (1985). A elaboração desse documento foi

subsidiada por um conjunto de especialistas da área agrícola e agrária. Propôs-se a

criação de um Conselho Nacional de Segurança Alimentar, cuja responsabilidade era

formular planos nacionais de políticas de segurança alimentar que congregasse várias

ações envolvendo diversos setores reiterou-se a ideia da intersetorialidade das políticas

no âmbito da segurança alimentar (TAKAGI, 2006).

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Também influenciou para que a questão da fome volta-se à agenda

governamental a atuação de movimentos sociais. Em 1991, o Governo Paralelo30

lançou

uma proposta de política nacional de segurança alimentar, de autoria de Lula e José

Gomes da Silva, a qual resgatava a proposta do Ministério da Agricultura de 1985

(TAKAGI, 2006; MACEDO et al. 2009).

Embora o Governo Paralelo tivesse pautado a necessidade de uma política de

segurança alimentar que combatesse à fome, essa discussão só tomou maiores

proporções com a publicação do Mapa da Fome (em 1993) pelo Instituto de Pesquisa

Econômica Aplicada (IPEA). Essa publicação suscitou a discussão sobre o tema na

sociedade brasileira, agora com a dimensão de calamidade e crise social (BONFIM,

2004).

Uma das vozes contra essa calamidade foi a “Ação da Cidadania Contra a Fome,

a Miséria e Pela Vida”, que capitaneou aspirações e mobilização de parte da sociedade,

mediante ações solidárias. Esse Movimento influenciou o Programa de Combate à

Fome e à Miséria do governo Itamar Franco e culminou com a criação do Conselho

Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA), em 1993, ao qual se atribui a

consolidação da Segurança Alimentar na agenda política brasileira (VALENTE, 2002;

TAKAGI, 2006; BORGES, 2007).

As ações do CONSEA são embasadas na ideia da integração intersetorial das

políticas, tanto vertical quanto horizontal, isto é, tanto entre ministérios quanto níveis de

governo (federal, estadual ou municipal). Ele representou a integração entre governo e

sociedade civil na proposição e execução de políticas de combate à fome,

comprometendo-se com a prática da gestão compartilhada de políticas públicas

(VALENTE, 2002).

Embora considerado como um marco da política nacional de segurança

alimentar, o CONSEA foi deixado de lado no governo de Fernando Henrique Cardoso e

cedeu espaço para o Comunidade Solidária31

. Nesse período houve mudança no

30

O Governo Paralelo era um grupo de pessoas que atuaram na campanha de candidato a presidente de

Luiz Inácio Lula da Silva em 1989, e que após a derrota nas urnas, decidiram acompanhar e fiscalizar a

gestão do Presidente Fernando Collor de Mello (TAKAGI, 2006). 31

O Programa Comunidade Solidária foi instituído pelo governo FHC enquanto estratégia de combate à

fome e à miséria. Sua instituição substituiu o CONSEA, embora tivesse uma proposta de continuidade de

algumas diretrizes do CONSEA. A crítica a esse Programa reside nas formas de participação ensejada no

âmbito do conselho do Comunidade Solidária. Embora tenha inovações na forma de participação da

sociedade civil e dado abertura a participação de organizações não-governamentais como uma nova forma

de institucionalizar políticas sociais, a legitimidade dos conselheiros que participavam do conselho do

Comunidade Solidário era alvo de muitas críticas. Ver Silva (2001) e Peres (2005).

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direcionamento da política de Segurança Alimentar e interrupção das diretrizes,

inicialmente propostas pelo CONSEA (VALENTE, 2002).

Com o esvaziamento das políticas sociais e o agravamento dos problemas

sociais, o governo FHC formulou o Programa Comunidade Ativa com a proposta de

enfrentamento da pobreza e da fome, baseado na perspectiva de desenvolvimento local.

Tal Programa partia da premissa de que políticas de combate à fome, de cunho

compensatório e assistencialista, geravam mais pobreza e dependência, e que uma

solução para combater à fome devia estar assentada na perspectiva de promover o

desenvolvimento local (VALENTE 2002).

3.4. CONVERGÊNCIA DOS FLUXOS: a vontade política

Em 2001, o Instituto Cidadania (organização não-governamental criada pelo

Governo Paralelo) elaborou o projeto Fome Zero que foi coordenado por José Graziano

da Silva e elaborado por um conjunto de especialistas sobre Segurança Alimentar. Na

sequencia, esse Projeto transformou-se na plataforma inicial de governo do Presidente

Lula (eleito em 2003) e acabou considerado como bandeira política pessoal do

Presidente, que colocou o combate à fome na agenda decisória do governo.

A partir desse momento pode-se dizer que a articulação entre o problema da

fome e seu diagnóstico, junto com a evolução do conceito sobre Segurança Alimentar,

ganhou fluxo político capitaneado pela figura de Lula. A execução do Programa Fome

Zero, a reinstalação do CONSEA e a criação do Ministério Extraordinário de Segurança

Alimentar (MESA), em 2003, lançaram os componentes da Política Nacional de

Segurança Alimentar (PNSA) (DA SILVA, TAKAGI, 2004).

A mudança na estrutura do executivo nacional, ocorrida através da troca de

presidente da república, conjuntamente com o “clima nacional” propiciado pela

ascensão da figura de Lula à Presidência da República brasileira, representou uma

Policy Windows (janela de oportunidade), que levou ao processo de convergência dos

fluxos. Como destacado pelo modelo dos Múltiplos Fluxos, também é necessário que no

momento em que exista uma janela de oportunidade aberta, exista a ação de um Policy

Entrepreneurs (empreendedor político).

Retoma-se novamente a figura de Lula como este empreendedor político, no

momento em que levanta a bandeira da luta contra a fome. Em resumo: da emergência

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do problema da fome e do “clima nacional” representado pela ascendência de Lula à

presidência, abriu-se uma janela de oportunidade para a emergência da fome à Agenda

Decisória. Com Lula enquanto empreendedor político, tem-se a execução de uma

PNSAN, inicialmente materializada com o Projeto Fome Zero.

3.4.1. Projeto Fome Zero

O diagnóstico sobre a fome, na perspectiva da SAN, permeou a formulação do

Fome Zero. Nele, o conceito de SAN vincula-se a uma distinção entre a fome e a

insegurança alimentar, que no fundo apenas desloca o eixo de análise de um problema

“específico” para uma condição mais “ampla”.

Monteiro (1995), (2003a) e (2003b), em diversos trabalhos, estabeleceu uma

distinção entre fome, desnutrição e pobreza. O que clarifica a distinção ente fome e

insegurança alimentar apresentada dentro da proposta de política feita pelo Projeto

Fome Zero. Pobreza é a não satisfação das necessidades humanas básicas; desnutrição

ou deficiências nutricionais são doenças decorrentes da ingestão alimentar inadequada

ou insuficiente. Distingue a fome em duas perspectivas: a aguda, decorrente do apetite,

da urgência de se alimentar e a fome crônica, decorrente de quando “a alimentação

diária, habitual não propicia ao indivíduo energia suficiente para a manutenção do seu

organismo e para o exercício de suas atividades cotidianas” (MONTEIRO, 2003a, p. 9).

Valendo-se dessas compreensões o projeto Fome Zero estabeleceu a diferença

entre fome e insegurança alimentar. A insegurança alimentar engloba as dimensões da

fome aguda, crônica e da desnutrição. Sua relação com a pobreza se situa na constatação

de ser esta uma das causas da persistência do problema da fome.

A Segurança Alimentar no projeto Fome Zero é compreendida através de quatro

dimensões: quantidade, qualidade, regularidade e dignidade. A primeira vincula-se a

quantidade de consumo mínimo de alimentos necessários para uma vida saudável e de

possibilidade de exercer atividades cotidianas. Está ligada a fome enquanto

manifestação crônica. A segunda, a dimensão da qualidade, versa sobre a necessidade

de consumo de alimentos com qualidades nutricionais e biológicas, e que permite um

alimento livre de contaminações de qualquer natureza. Essa dimensão associa-se à

desnutrição (DA SILVA, TAKAGI, 2004, p. 44).

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A terceira dimensão é a da regularidade, em que se estabelece a necessidade de

uma alimentação regular, no sentido de ser realizada em um determinado número de

vezes ao dia, além da alimentação ininterrupta, independente da razão ou circunstância.

A última dimensão, a da dignidade, estabelece a ideia de não dependência do indivíduo

quanto à situação de alimentação e, mesmo, as circunstancias dessa alimentação,

citando como exemplo: “Uma pessoa que se alimenta de restos de restaurantes ou de

lixões não possui segurança alimentar, embora possa até não se enquadrar na categoria

de subnutridos pelo critério biológico.” (DA SILVA, TAKAGI, 2004, p. 44).

Com o objetivo principal de “propor um conjunto integrado de políticas com o

objetivo de garantir a segurança alimentar” (Instituto Cidadania, 2001:83) e tentar

enfrentar as causas estruturais da fome, o projeto Fome Zero apresentou um diagnóstico

que abarcou um conjunto de fatores específicos e, ao mesmo tempo, relacionados.

O diagnóstico da fome apresentado pelo projeto Fome Zero foi baseado em três

dimensões: insuficiência de demanda32

, descompasso entre os níveis de preço dos

alimentos e o nível de renda da população, e a exclusão de parte da população do

mercado de alimentos. Pela via desse diagnóstico a relação entre a fome e falta de renda

é uma constante. No projeto Fome Zero, descartava-se qualquer relação entre a fome e

as questões relacionadas à oferta insuficiente de alimentos33

, bem como da distribuição

e acesso aos alimentos.

Partindo desse diagnóstico, propuseram-se três eixos de ação: a) ampliação da

demanda efetiva de alimentos; b) barateamento dos preços dos alimentos; c) programas

emergenciais de atendimento aos excluídos do mercado de alimentos. Percebe-se a

necessidade de articulação ente políticas de natureza estruturais (no caso da ampliação

da demanda efetiva e do barateamento dos preços) e de políticas emergenciais (como de

assistência aos excluídos). Esse foi o elemento que enxergou nas políticas de geração de

emprego e de renda uma forma de aumentar a demanda efetiva, e viu no incentivo à

produção de pequenos produtores um modo de colocar nos mercados locais produtos

32

A insuficiência de demanda é relativa à história do próprio desenvolvimento brasileiro, e não está

circunscrita apenas ao setor de alimentos. A discussão acerca de o mercado interno brasileiro ser pequeno,

embora tenha potencial de expansão, vem desde as obras de Celso Furtado. E a ideia apresentada pelo

projeto Fome Zero se baseia, de modo implícito, as ideias levantadas por Celso Furtado [2000, p. 245 e

270-271(1ª edição: 1959)]: a falta de renda da população não estimula ao aumento da oferta de alimentos

e uma das razões dessa falta de renda é o padrão de desenvolvimento brasileiro, concentrador de renda e

com níveis elevado de desemprego e subemprego. 33

Fundamenta-se em um estudo realizado pela FAO que mostra que em 98 países analisados, somente 6

não tinham quantidade de alimentos suficiente para abastecer sua população, e estes situam-se em grande

parte no continente Africano (Instituto Cidadania, 2001, p. 18-19).

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com preços baixos, e ao mesmo tempo aumentar a oferta de alimentos (INSTITUTO

CIDADANIA, 2001, p. 81).

FIGURA 02 - ESTRUTURA DO PROGRAMA FOME ZERO

Fonte: Projeto Fome Zero – Instituto Cidadania (2001) e Rosa (2004).

Nessa perspectiva, as políticas implementadas precisariam situar dentro de

políticas estruturais, específicas e locais. As estruturais se empenhariam em aumentar a

renda e diminuir a desigualdade, promover a universalização da previdência social,

incentivar a reforma agrária e a agricultura familiar. As políticas específicas teriam

ações de ampliação da merenda escolar, de atendimento a grupos específicos como

gestantes e recém-nascidos e preocupações quanto à dimensão qualitativa da segurança

alimentar. Por último, nas políticas locais se situariam as políticas que atendessem às

especificidades locais, e promovidas em parceria entre estados e municípios. Dentre

elas, as ações para regiões metropolitanas, como restaurantes populares, banco de

alimentos e parcerias com o varejo de alimentos; ações para o urbano não

metropolitano, principalmente via incentivo a “agricultura urbana”, propiciando a

produção agroalimentar local; e as ações para áreas rurais que consistem no apoio a

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agricultura familiar e na produção para autoconsumo (INSTITUTO CIDADANIA,

2001, p. 84-98).

No campo das políticas estruturais e específicas conciliam-se as atuações de

vários Ministérios para a garantia da geração de emprego e renda, universalização

previdenciária, incentivos a agricultura familiar e reforma agrária, como competências

de diferentes ministérios. Entretanto, colocadas como eixos de atuação de uma

estruturante Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), tendo

como principal articulador o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à fome

(MDS). No campo das políticas locais, houve um avanço no sentido de incentivar a

construção de sistemas locais de segurança alimentar, com a interferência de estados e

municípios. A coordenação das ações, entre os diferentes ministérios e as distintas

esferas de governo, que constitui a intersetorialidade da PNSAN, é representada pelo

Fome Zero (INSTITUTO CIDADANIA, 2001; BORGES, 2007). Conforme figura 02.

No campo das políticas locais, embora não conste na visão inicial do projeto

Fome Zero, surgiram os Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local

(CONSAD).

Uma das visões estratégicas do Projeto Fome Zero é fortalecer a noção de

que a segurança alimentar e nutricional está indissoluvelmente associada ao

lugar onde a família vive, à sua proximidade da oferta local e regional de

alimentos e à disponibilidade de equipamentos públicos e privados existentes

no seu entorno: daí que a segurança alimentar e nutricional tem que ser

garantida de forma territorial, valorizando a dinamização da economia local e

regional (TAKAGI, 2006, p. 57).

Nessa perspectiva, os Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento

Local (CONSAD) foram criados no âmbito de uma política permanente de Segurança

Alimentar, dotada de um caráter territorial e de cunho local.

3.4.2. Estrutura da Política Nacional de Segurança Alimentar e

Nutricional (PNSAN)

A atual Política de Segurança Alimentar começou a ser construída pela Medida

Provisória 103, de 1º de janeiro de 2003, depois transformada na Lei nº 10.683, de 28 de

maio de 2003. Este foi o primeiro ato do presidente Lula empossado, ao dispor sobre a

organização da Presidência da República e dos Ministérios. Reeditou o CONSEA,

ligado ao gabinete da Presidência da República, e criou-se o Ministério Extraordinário

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de Segurança Alimentar e Combate à Fome (MESA) para cuidar do planejamento das

políticas vinculadas à segurança alimentar (TAKAGI, 2006).

Do MESA aproveitou-se a estrutura física, de pessoal e orçamentária da

Secretaria Executiva do programa Comunidade Solidária. O encarregado do MESA foi

José Graziano da Silva, um dos idealizadores do projeto Fome Zero que nesse momento

assumiu o caráter de programa governamental (TAKAGI, 2010).

O fortalecimento dessa Política veio com a Lei nº 11.346, de 15 de setembro de

2006, que criou e estabeleceu os princípios, diretrizes e composição do Sistema

Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN), e a Emenda Constitucional nº

64, de 4 de fevereiro de 2010, que modificou o art. 6º da Constituição Federal, e

introduziu a alimentação como direito social.

As ações da PNSAN podem ser resumidas no quadro a seguir.

QUADRO 02 - DIRETRIZES DA POLÍTICA NACIONAL DE SEGURANÇA ALIMENTAR E

NUTRICIONAL

Diretrizes da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

Na área de Produção de

Alimentos

• Sistema Agroalimentar Mundial, Organismos e Acordos

Internacionais;

• Componentes de Segurança Alimentar e Nutricional em um Plano

Nacional de Reforma Agrária;

• Políticas de Apoio e Fortalecimento da Agricultura Familiar e do

Agroextrativismo;

• Recursos Genéticos, Sementes e a Questão dos Transgênicos;

• Acesso e Uso dos Recursos Naturais e da Água.

Na área do Acesso aos Alimentos

• Abastecimento Alimentar e Agricultura Urbana;

• Programas de Complementação de Renda e de Suplementação

Alimentar;

• Mutirões, Coleta e Doação de Alimentos e Ações em Situações

Emergenciais.

No campo das ações de

Alimentação e Nutrição

• Ações de Promoção e Vigilância em Saúde e Nutrição

• Alimentação e Educação Nutricional nas Escolas e Creches

• Cultura Alimentar

• Alimentação e Promoção de Modos de Vida Saudáveis

Questões institucionais

• Indicadores de Segurança Alimentar e Nutricional;

• Participação Social nas Políticas de Segurança Alimentar e

Nutricional;

• Institucionalidade das Políticas de Segurança Alimentar e

Nutricional.

Fonte: elaborado pelo autor com base em CONSEA (2004).

As ações da PNSAN devem ser implementadas de forma transversal, a partir da

interação entre diversos Ministérios. Desse modo, os eixos propostos acima, da

produção de alimentos às questões institucionais, devem ser alvos de programas e ações

específicas, e executadas com viés intersetorial, aliando diversos setores e ministérios.

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Dentre estes projetos e programas, têm-se os Consórcio de Segurança Alimentar e

Desenvolvimento Local (CONSADs).

3.4.3. Consórcio de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local

(CONSAD)

No bojo do Fome Zero, os CONSAD foram criados em 2004, como uma

iniciativa que visa à promoção da Segurança Alimentar através de uma política

territorial que atue via a promoção de ação de geração de emprego e de renda. Para

compor ações integradas seguindo as especificidades de cada região, esses Consórcios

contém um desenho institucional diferenciado, envolvendo tanto as esferas federal,

estaduais e municipais quanto à sociedade civil (DE JESUS, 2006).

Os CONSAD decorrem de práticas de associações entre municípios e tem a

missão de efetuar ações conjuntas no que se refere aos problemas locais relacionados à

promoção da segurança alimentar. A articulação intermunicipal deve ser permanente e

institucionalizada, entre o poder público municipal e a sociedade civil. Por essa razão,

se institucionaliza a ação dos Consórcios através da criação de conselhos deliberativos,

nos quais os municípios integrantes do Consórcio são representados pelo poder público

e sociedade civil (IBAM, 2004).

Sua atuação na promoção da segurança alimentar ocorre através da geração de

emprego e renda para a população local, visando a criação de um ambiente

socioeconômico propício para a garantia da segurança alimentar, através do incentivo à

ações sustentáveis que garantam a essa população certa independência socioeconômica.

Em suma, a proposta de um CONSAD é fortalecer a esfera local, mediante uma política

permanente de geração de emprego e renda, garantindo assim o acesso a uma

alimentação regular e adequada, corroborando com a noção de segurança alimentar

inserida no programa Fome Zero.

Para atuar nessa direção, as estratégias de desenvolvimento local promovidas

pelos Consórcios seriam as seguintes: formação de capital social local; formação de

capital humano local; agregação de valor nas cadeias produtivas sub-regionais, e

modernização do setor público local (IBAM, 2004, p. 10). Juntamente com essas

estratégias, as ações para o desenvolvimento local devem estar voltadas para as

seguintes linhas: arranjos sócio-produtivos locais; agricultura familiar; economia

solidária; oferta de microcrédito; inclusão digital (IBAM, 2004, p.12-13).

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A definição dos municípios para integrar cada Consórcio ocorreu mediante a

realização do Estudo de Localização Territorial de Potenciais Consórcios de

Desenvolvimento Local, Integrado e Sustentável, em 2002, chamado de CONDELIS34

.

Em 2003 foram propostas algumas alterações, através de uma “avaliação crítica dos

processos de Desenvolvimento Local Integrado e Sustentável (DLIS) por meio das

experiências e propostas vivenciadas pela sociedade civil, que terminaram com uma

proposta chamada CONDELIS” (DE JESUS, 2006, p. 57).

A proposta do CONDELIS, incorporada pelo CONSAD, consente no combate à

pobreza e às desigualdades mediante incentivos aos processos de desenvolvimento

endógenos. Por isso, os territórios alvos desse tipo de Política são regiões

economicamente deprimidas, com baixa estrutura socioeconômica, com alta incidência

de pobreza e baixa organização social (ORTEGA, 2007).

Buscando propiciar boa funcionalidade e uma representatividade adequada, do

ponto de vista da participação democrática no âmbito dos CONSAD, limitou-se o

número de municípios integrantes em cada Consórcio. Geralmente de 5 a 20

municípios, cuja integração de cada município a um determinado consórcio se pauta

pela identificação territorial35

entre eles (IBAM, 2004; ORTEGA, 2007).

A escolha da sede do Consórcio deve ser estabelecida na cidade melhor

localizada entre as integrantes. Exceto se esta for a melhor estruturada e com maior

condição de exercer protagonismo e sobrepor as demais (IBAM, 2004).

Os critérios de representatividade adotados pelo CONSAD são ancorados em

dois pressupostos. O primeiro é o da pluralidade, que busca representar através do

CONSAD as diversas categorias e segmentos sociais existente nos territórios,

propiciando a que todos os atores sociais estejam, de modo legítimo, representados no

processo de tomada de decisão do consórcio. O segundo é o da representação

majoritária da sociedade civil, visando estimular e fortalecer a participação da sociedade

34

O CONDELIS foi realizado pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM), ainda em

2002, a pedido da Secretaria Executiva do Comunidade Solidária (DE JESUS, 2006, p. 57). 35

A abordagem de território no contexto dos consórcios aqui abordados situa-se na perspectiva de

território enquanto o local em que ocorrem as relações sociais, em que há interações sócio-políticas e

práticas sociais, baseadas na identidade sociocultural, em que se constitui a população de um determinado

território. Essa identificação ocorre num plano espacial chamado de local, lugar em que ocorrem as

interações sócio-políticas e as práticas sociais, ancoradas pela perspectiva da identidade sociocultural, em

que se constitui a população de um determinado território. O desenvolvimento territorial pode ser

enxergado enquanto local: “lócus da vida social, o lugar onde os acontecimentos, fenômenos e práticas

sociais adquirem visibilidade” (Fragoso, 2005, p. 63).

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71

local nas decisões, levando ao empoderamento acerca das ações efetuadas pelo

CONSAD (IBAM, 2004, p.17).

Os CONSAD são modalidades de Consórcio Público que combinam as

premissas de funcionamento dos conselhos gestores de políticas públicas. O CONSAD

segue uma estrutura de funcionamento proposta no Guia do CONSAD, feito pelo

Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM) em 2004, chamada de

Estrutura Decisória36

, composta por:

Nível Deliberativo Máximo

Nesta instância tem-se uma modalidade de atuação dos consorciados que se

assemelha às características de Fórum, na medida em que pressupõe a participação de

membros dos segmentos sociais e econômicos que atuem no território em que se

implementa programas geridos pelo CONSAD local.

Importa esclarecer que o Fórum tem poder de deliberação e expressa as decisões

sobre políticas, linhas de ação e prioridades. Nele constitui-se a orientação geral e as

opções da condução dos programas. Desta forma, o equipara-se a um conselho

deliberativo37

do CONSAD, sendo composto por até seis representantes de cada

município que integra o consórcio.

Contudo, em razão de sua característica de Fórum deve observar o princípio da

representação majoritária da sociedade civil (2/3 dos representantes devem ser

provenientes dela) ficando o restante para o poder público municipal (Prefeitura,

Câmara de Vereadores).

Nível Decisório Gerencial

Instância responsável pelos aspectos gerenciais do CONSAD, que tem a

característica de uma comissão, comitê ou similar. Cuida da elaboração, execução e

acompanhamento do planejamento realizado no CONSAD, além de articular e

concretizar pactos e parcerias necessários para a viabilização dos programas.

Esta instância é composta por uma Comissão Executiva integrada por três

representantes, sendo um de órgão público municipal e dois de entidades da sociedade

civil.

36

O texto que se segue corresponde a um resumo do Guia do CONSAD, IBAM (2004, p. 14-19). 37

O Guia do CONSAD (IBAM, 2004, anexo B, p. 12) denomina de Fórum, o conselho gestor do

CONSAD, e lhe atribui as mesmas prerrogativas deliberativas de um conselho gestor.

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Nível Operacional

Instância encarregada do apoio logístico às ações do CONSAD. Pode ter o

formato de uma secretaria executiva, secretaria geral ou outro órgão, cujo responsável

gerencia as ações e o funcionamento cotidiano da entidade garantindo a fluência e

supervisão na execução das tarefas. Nessa instância o posto de secretário e os

profissionais que integram a equipe são de contratados diretamente pelo CONSAD ou

cedidos pelas Prefeituras que integram sua composição.

Visando a preservação da transparência, para o controle das ações do CONSAD

constitui-se um órgão com características de Conselho Fiscal, o qual se incumbe da

fiscalização financeira e contábil da movimentação dos diferentes tipos de recursos

obtidos.

FIGURA 03 - CONFIGURAÇÃO DO MODELO REFERENCIAL DE ESTRUTURA

ORGANIZACIONAL DO CONSAD

Fonte: IBAM (2004, p.16)

Para a sustentação e legitimação institucional, bem como para representar a

cooperação entre um conjunto de atores, seja de natureza pública e os de natureza não-

pública, a estrutura é formalizada por uma Associação Civil. A partir dela caminha-se

para a institucionalização do CONSAD mediante a assinatura de um Acordo de

Programa, que permite a legalização da participação dos municípios. A esta Associação

dá-se o nome da sigla CONSAD e se estabelece um Estatuto, com objetivos,

competências, tendo ainda suas regras de funcionamento estabelecidas em um

Regimento Interno (IBAM, 2004, p. 19).

A interação entre poder público e sociedade civil, no CONSAD, está presente

desde o início, e sua implementação se realiza através do Ministério do

Desenvolvimento Social (MDS). Para o funcionamento inicial, o MDS selecionou

Entidades Implementadoras Regionais (EIR) para apoiar os CONSAD na formulação de

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seus Planos de Ação. Esses Consórcios apoiados pelo governo Federal recebem apoio

técnico e recursos. Também se sustentam através de parcerias entre governos estaduais

e municipais na implantação de ações que são pactuadas entre o poder público e a

sociedade civil (ORTEGA, 2007, p.288).

3.4.4. Consórcios públicos

Dentro das inovações institucionais apresentadas como mecanismos de

coordenação e cooperação entre esferas intergovernamentais, estão os Consórcios

Públicos. Institucionalizados via proposta de Emenda Constitucional nº 19 de 1998 que

modificou o Art. 241da Constituição brasileira de 1988.

Entende-se por Consórcios Públicos, a partir da Lei nº 11.107/05, segundo Mello

(2006: 656):

[...] contratos realizados entre as pessoas de Direito Público de capacidade

política, isto é, entre União, Estados, Distrito Federal e Municípios, em vista

da realização de atividades públicas de interesse comum, e dos quais resultará

uma pessoa jurídica que os congregará.

Define-se ainda, segundo Cunha (2004, p. 21), que Consórcios Públicos são “...

a associação pública formada por dois ou mais entes da Federação, para a realização de

objetivos de interesse comum”. Logo, suas possibilidades residem na:

“[...] ampliação do alcance e da efetividade das políticas e dos recursos nelas

aplicados, uma vez que poderão permitir ação cooperada e maior

racionalidade na execução de serviços em áreas como saúde, saneamento,

geração de renda, infra-estrutura, entre outras políticas de responsabilidade

partilhada entre os entes federativos.” (Cf.: 21-22).

Esta inovação institucional foi mais um passo à frente no processo de

descentralização das políticas. Ela possibilitou novas formas de gestão de políticas

públicas por parte das diferentes esferas governamentais ao proporcionar a busca por

melhor eficiência através da execução conjunta de serviços públicos. Com os consórcios

construiu-se um instrumento de atuação integrada entre os entes federados, com a

justificativa de se obter melhor o provimento dos bens públicos (CUNHA, 2004).

Inicialmente, os Consórcios foram utilizados de modo horizontal, isto é, por

entes federativos da mesma natureza, como os consórcios intermunicipais. Nas relações

verticais, entre entes federativos de natureza diferentes, a relação intergovernamental

ocorre via convênios. Isto se tornou possível com a Emenda Constitucional nº 19/1998,

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ao art. 241 da Constituição Federal, e a Lei Federal nº 11. 107/05, que estabelece a

articulação entre entes federados através de Consórcios Públicos.

Esclarece-se que a diferença entre consórcio e convênio é da seguinte ordem: o

primeiro é realizado entre entes federados de direito público, da mesma natureza, como

municípios com municípios, estados com estados; o segundo entre entes de natureza

diferentes como municípios e união. Os convênios são caracterizados como acordos

voluntários, não contratuais e, portanto, não assumem personalidade jurídica.

Consórcios, a partir da Lei nº 11.107/05, passam a ter personalidade jurídica, de direito

público ou de direito privado (CUNHA, 2004; DI PIETRO, 2005).

Ao assumir personalidade jurídica os consórcios assumem obrigações e

adquirem direitos. Podem dispor de estrutura administrativa própria e, adquirem a

possibilidade de executar políticas públicas em nome dos entes consorciados. Ao

assumir personificação jurídica deixam de ser simplesmente um instrumento de

organização e prestação de um serviço específico (como seriam os convênios). A partir

da Lei nº 11.107/05 os integrantes dos consórcios públicos têm igualdade jurídica, no

sentido de que não há hierarquia entre os consorciados. Todos têm a mesma

competência e responsabilidade, e sem obter natureza contratual38

(BORGES, 2006).

Dentre as possibilidades de realização de um Consórcio Público está a de poder

assumir a forma de cooperação para a execução de serviços diversos. E não apenas

aqueles que, tradicionalmente, existiam antes da promulgação da Lei 11.107/2005.

Antes, os Consórcios eram constituídos para a realização de serviços pré-determinados,

como os voltados à saúde, ao saneamento básico, ao tratamento do lixo e etc. Deste

modo não havia a necessidade de dotar os consórcios com personalidade jurídica, uma

vez que um instrumento de natureza contratual (como convênios) era o suficiente para a

realização destes determinados empreendimentos.

Quando dotado de personalidade jurídica de direito público, os Consórcios

Públicos passam a ser caracterizados enquanto parte da administração indireta dos entes

federados, conforme se observa através da Lei nº 11.107/05, art. 6º, §1º. Ao omitir uma

caracterização como esta - a de integrar a administração indireta - para os Consórcios

38

A natureza contratual dos Consórcios Públicos, do ponto de vista jurídico, reside no documento

assinado pelos entes federados quando criam o consórcio. Ao efetuar o “contrato de consórcio” eles

assumem responsabilidades quanto à consecução de um objetivo comum. Esta seria a natureza

“contratual” dos consórcios públicos, sendo que este “contrato” necessita de uma pessoa jurídica que dê

suporte à prática de atos e negócios jurídicos (SILVA, 2005).

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75

Públicos de direito privado, cria-se um impasse quanto à situação jurídico-institucional

destes.

Mas, conforme argumenta Di Pietro (2005), qualquer instituição criada pelo

poder público com a finalidade de desempenhar funções administrativas do Estado,

deverá fazer parte da administração direta ou indireta, pois não há possibilidade de

qualquer ente da federação constituir pessoa jurídica para desempenhar suas próprias

atividades administrativas sem considerá-la como parte do Estado. Caso contrário se

incorre em deixar atividade típica do Estado para a execução da iniciativa privada.

Os Consórcios Públicos podem ser classificados como Consórcios

Administrativos, Consórcios Públicos de Direito Privado e Consórcios Públicos de

Direito Público39

Os Consórcios Administrativos são considerados os constituídos antes

da Lei 11.107 (06/04/2005) – a chamada Lei dos Consórcios Públicos. Antes desta lei,

os consórcios públicos eram destituídos de personalidade jurídica, e sua existência se

dava via instrumento jurídico em que pessoas de diferente natureza jurídica ajustavam

direitos e obrigações.

Os Consórcios Públicos de Direito Privado são considerados pessoas jurídicas

instituídas por entes federativos, para a realização de objetivos de interesses comum,

mas personificadas sob o direito privado. Geralmente adotam a forma de associações ou

fundações. Os Consórcios Públicos de Direito Público são definidos como associações

públicas, sendo, pois, equiparados a autarquias, Nesse sentido incorporam o status de

membros do que se conhece por administração indireta (CUNHA, 2004).

Os Consórcios Administrativos de acordo com o Decreto nº 6.017 (17/01/2007),

podem se transformar em Consórcios Públicos. O incentivo para isso pode ser

encontrado no Art. 39, o qual dispõe que só celebra convênios com a União os

Consórcios Públicos de Direito Público. Percebe-se que em tal Decreto está posto o

impasse quanto à existência dos três tipos de consórcios, uma vez que mesmo os

Consórcios de Direito Privado não poderão celebrar convênios com a União.

Outro aspecto a ser ressaltado é o fato de que mesmo sendo de direito privado,

tal modalidade de Consórcio devem seguir as mesmas normas dos de direito público

39

A denominação de Consórcios Administrativos é puramente interpretativa, não se configura como outra

modalidade de Consórcio Público, como o de direito privado e o de direito público. Era assim

denominado por juristas todos os consórcios existentes antes da Lei 11.107/05. Desde a Constituição de

1937 se permite associações intermunicipais, mas estas eram regidas pela legislação civil, uma vez que os

municípios só se constituíram como entes federados a partir da Constituição de 1988. Assim, eram

realizados contratos entre entes privados, por isso de se chamarem Consórcios Administrativos, pois não

passava de atos da administração pública a realização desses acordos e, não havia a necessidade de

autorização legislativa para sua constituição (DI PIETRO, 2005; SCALABRINI, 2011).

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(Art. 6º, 2º parágrafo, inciso II). Em síntese, mesmo se tendo três modalidades político-

jurídicas, apenas os Consórcios Públicos de direito público estão autorizados a

receberem recursos públicos para desempenharem atividades de Estado.

A finalidade dos consórcios públicos é a de promover a gestão associada dos

serviços públicos entre os diferentes entes da Federação. Mas, antes de se constituir

como consórcio público, há a necessidade, conforme o Art. 3º da Lei 11.107/05 e o Art.

4º do Decreto nº 6.017/07, de prévia celebração de um protocolo de intenções, aprovado

pelos representantes dos entes que pretendem se consorciar. Em seguida, procede-se a

celebração do “contrato de consórcio público” precedido por lei que ratifica o protocolo

de intenções. A referida lei deve obter a aprovação do legislativo de cada ente40

.

Pela Lei 11.107/05 e pelo Decreto nº 6.017/07, o consórcio público deve ser

organizado por estatutos, aprovados por assembleia geral do consórcio. Nota-se que, ao

se constituir como personalidade jurídica de direito público, os entes federados

consorciados criam, neste processo, em suas próprias estruturas administrativas (uma

vez que aprovado pelo protocolo de intenções e pelo contrato de consórcio público) uma

administração indireta, representada por uma Associação Pública (BORGES, 2006).

A Associação Civil é regida pela legislação civil, exceto quando da realização de

licitações, celebração de contratos, prestação de contas e admissão de pessoal (esta se

rege pela CLT) que seguem as normas de direito público (Art. 6º, §2º da Lei 11.107/05).

A Lei 11.107/05, no Art.13º, trata das obrigações dos entes da Federação ao se

vincularem em consórcios públicos. Neste caso as obrigações devem estar constituídas e

reguladas por “contrato de programa”, como condição de sua validade. O contrato de

programa deve estar previsto no protocolo de intenções e no contrato de constituição do

consórcio. 41

O CONSAD, ao constituir-se em consórcio, passou a agregar não só os entes

Federados, mas parte da sociedade civil42

. Adotou como forma de existência uma

personalidade jurídica de direito privado, a associação civil. O que lhe é apropriado

40

Depois de ratificado, o protocolo de intenções passa a ser denominado como Contrato de Consórcio

Público (DI PIETRO, 2005; SILVA, 2005; BORGES, 2006). 41

Contrato de programa, de acordo com Di Pietro (2005, p. 11): “... obrigações que um ente da

Federação constitui para com outro ente da Federação ou para com consórcio público no âmbito da

gestão associada em que haja a prestação de serviços públicos ou a transferência total ou parcial de

encargos, serviços, pessoal ou de bens necessários à continuidade dos serviços transferidos”. 42

No documento utilizado como referência para a constituição dos CONSAD, o campo da denominada

sociedade civil é integrado e definido assim: (...) Por entes privados entende-se as organizações de direito

privado e as organizações da sociedade, tais como: associação de produtores, de empresários, de

comerciantes, entidades sociais, cooperativas, sindicatos, organizações não governamentais, organização

da sociedade civil de interesse público, e outros (Guia do CONSAD, IBAM, 2004, p. 17).

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77

para: “... utilizar-se a figura do Acordo de Programa como instrumento formalizador da

convergência de interesse na execução de atividades voltadas a segurança alimentar e o

desenvolvimento local.” (IBAM, Anexo B, p. b3).

A associação civil formada tem a responsabilidade de gerir as atividades que

constam no Acordo de Programa (“contrato”), ratificado através do protocolo de

intenções, no momento da constituição do consórcio. Desta forma, pode firmar

convênios, contratos, receber e fazer doações financeiras. Segundo o IBAM (2004,

anexo, p. b6), dentro da sua área específica de atuação, o CONSAD está apto para

fomentar atividades voltadas para a promoção da segurança alimentar e o

desenvolvimento local, para o que deve buscar parcerias com outros entes públicos e

privados.

Para o financiamento das atividades e dos serviços efetuadas através do

consórcio, os recursos podem vir de doações, através da prática da atividade econômica

(desde que não ocorra partilha dos ganhos entre os entes associados e sim, aplicados nas

atividades efetuadas pelo consórcio), via convênios com as esferas governamentais,

abertura de crédito especial, desde que autorizado pelos entes que constituem o

consórcio e via dotações financeiras advindas dos consorciados.

Os problemas da estrutura jurídica se mostram por meio do ato de assunção de

personalidade jurídica. Ao adquirir personalidade jurídica, consórcios públicos

assumem obrigações e direitos e, entre demais atribuições, adquirem a possibilidade de

executar políticas. A escolha do modelo jurídico (direito público ou privado) gera

alguns pontos emblemáticos.

O primeiro se pauta pela discussão da possibilidade dos consórcios públicos se

revestirem tanto do direito público (associações públicas) quanto do direito privado

(associações civis). Segundo o Art. 6º, §2º da Lei nº 11.107/05, mesmo sendo de direito

privado os consórcios públicos deverão respeitar algumas normas de direito público.

No entanto, pode-se argumentar que o CONSAD foi pensado para congregar o

poder público e a sociedade civil, conforme o Guia do CONSAD (IBAM, 2004). E a

escolha do formato de Consórcio está associada às possibilidades que a personalidade

de direito privado possibilita. Por definição, de acordo com o Art. 2º inciso I do Decreto

nº 6.017/2007, Consórcio Público é:

(...) pessoa jurídica formada exclusivamente por entes da Federação, na

forma da Lei nº 11.107, de 2005, para estabelecer relações de cooperação

federativa, inclusive a realização de objetivos de interesse comum,

constituída como associação pública, com personalidade jurídica de direito

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público e natureza autárquica, ou como pessoa jurídica de direito privado sem

fins econômicos; (grifo nosso).

Partindo dessa consideração, entende-se que a Lei nº 11.107/2005, assim como o

Decreto nº 6.017/2007, não aventa a possibilidade de se configurar enquanto Consórcio

Público um agregado de entidades de natureza jurídica distinta, como entes federados e

sociedade civil. Isso se evidencia através do trecho supracitado e grifado. Tal fato

demonstra que a consolidação do CONSAD articulando poder público e sociedade civil

só é permitida via sua caracterização jurídica de direito privado.

Entende-se que o CONSAD, com sua premissa de articulação permanente e

institucionalizada entre o poder público e a sociedade civil, só pode encontrar o

caminho de existência através da personificação de direito privado. Entretanto, seu

hibridismo, uma vez que responde tanto a normas de direito público quanto de direito

privado, cria uma situação controversa.

Enquanto ente de natureza pública, não há qualquer contrariedade no sentido de

se contestar sua existência, pois se entende que adotando o regime de direito público se

garante a forma adequada de se proceder na busca do interesse público, uma vez que

essa deveria ser a finalidade dos consórcios públicos.

Mas adotando natureza de direito privado eles se tornam administração indireta

dos entes públicos consorciados. Decorre que na defesa dos interesses públicos, não se

espera procedência adequada quando se está diante de um ente privado, que atua com

base em premissas de mercado. Então como admitir a realização de atividades típicas de

Estado por entes privados? O que assegura que entes privados terão o mesmo

comprometimento com a justiça e a equidade social?

Salienta-se que adotando a forma de direito privado, através de uma associação

civil, se possibilita que parte da sociedade civil integre o consórcio43

. Tal fato

potencializa maior participação e controle social rumo à maior democratização e

descentralização dos serviços que deverão ser ofertados, assim como melhoram a

definição do escopo desses serviços a serem realizados.

43

Uma vez pensado para conciliar poder público e sociedade civil, a única forma que possibilitaria isso

seria um consórcio de direito privado. Pois nele se congrega pessoas de direito privado, ao contrário de

um consórcio de direito público, em que só deve congregar internamente pessoas de direito público.

Através da figura do “Acordo de Programa”, se institui o consórcio com entes federados e parte da

sociedade civil (SILVA, 2005; SCALABRINI, 2011).

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3.4.5. Conselhos gestores

A constituição de 1988 regulamentou os conselhos gestores como espaços para a

prática da participação popular, colocando-os na situação de co-gestores das políticas

públicas. Para Martins et al. (2008), o canal de participação social constituído pelos

conselhos modificou a relação entre Estado e sociedade, na medida em que eles se

constituírem na estratégia privilegiada e com melhores condições de alcançar níveis

avançados de democratização.

Para Bonfim (2004, p. 80-81), os conselhos foram:

[...] Concebidos para funcionar enquanto instrumentos capazes de promover

uma interlocução permanente entre governo e cidadãos, colocando-os frente a

frente para a deliberação sobre os rumos das políticas sociais e a aplicação e

uso de verbas públicas, procurando assim modificar as relações entre estado e

sociedade, no geral caracterizadas pela verticalidade e autoritarismo.

Complementando a análise acerca do papel dos conselhos nesse desenho

institucional, Costa (2008) lembra que os conselhos foram incorporados à estrutura do

governo, em todas as suas instâncias - do central até o local - visando garantir a

descentralização político-administrativa e o fortalecimento do papel da participação da

população no âmbito das políticas públicas, quer seja na formulação ou no

monitoramento destas.

Mas numa perspectiva história, os conselhos emergiram no contexto de críticas à

democracia representativa e às organizações políticas, em que se buscava a criação de

novas formas de luta em prol da gestão democrática. Nessa perspectiva, as primeiras

experiências de conselhos surgiram buscando a emancipação econômica, política e

social de operários que lutavam contra a opressão. Como exemplo tem-se a Comuna de

Paris, os sovietes russos e os Conselhos de Fábrica italianos (GOHN, 1990).

Os conselhos operários tinham por objetivo a criação de um novo poder estatal.

Um poder paralelo que tomasse as decisões sobre o setor produtivo visando minar o

poder do Estado, pautado na criação de um conselho da classe operária que buscava

formas de organização que fossem autônomas, e representasse uma base de poder

popular na construção de um novo Estado. Essa visão pode ser assimilada quando se

observa a emergência desses conselhos, que para Gohn (1990, p. 71), ocorreram “... em

períodos de crises revolucionárias ou mudanças institucionais profundas e, nesse

processo, os conselhos foram elementos importantes de construção de uma nova

hegemonia política...”.

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Pode-se observar, a partir da consideração acima, que a Comuna de Paris foi um

governo feito por trabalhadores na França (1871). Este conselho funcionava baseado

numa democracia popular em que a participação dos trabalhadores era organizada em

comitês. Esse governo democrático era constituído de membros da sociedade civil que

não participavam da sociedade política, porém interferiam nela através da participação

da população na gestão das cidades e na gestão dos processos de produção (GOHN,

1990).

Outras experiências de conselhos, os denominados conselhos de cidadãos,

surgiram nos Estados Unidos enquanto formas de inserir as pessoas na dinâmica da vida

associativa local, visando lutas por direitos e o combate aos atos contrários à

coletividade. A diferenciação em relação aos conselhos de operários se deve à sua

organização em prol da criação de grupos e comunidades de interesses, na forma de

associações e movimentos (GOHN, 1990).

A intenção dos conselhos de cidadãos era a de deslocar o lugar do processo

decisório para perto das bases das comunidades, lugar em que os governos (federal,

estadual e municipal) atentariam para as demandas desses grupos. As aspirações se

assentavam na perspectiva da co-gestão, na possibilidade de corrigir e aperfeiçoar a

gestão vigente e não questionar a ordem estabelecida. Já os conselhos de operários se

constituíram enquanto instrumentos de poder com projetos de mudança social que

buscava a transformação da sociedade (GOHN, 1990).

O surgimento dos conselhos gestores de políticas se dá no Brasil na década de

1970 e início da década de 1980. No entanto, tais conselhos tinham como características

“o caráter opinativo, fiscalizador e consultivo”. Esses eram os conselhos populares,

comunitários, representados pelos movimentos sociais. Destacaram-se na estratégia de

ampliar e alargar a democratização do Estado na luta pela redemocratização

(PETRARCA, 2008, p. 33).

No Brasil, a temática dos conselhos trazia uma proposta de democracia

participativa estruturada a partir dos movimentos sociais e da sociedade civil.

Buscavam-se canais de participação, apoiando-se numa estratégia de organização de um

poder popular. Havia a necessidade de espaços de articulação dos interesses da

população, que tinham sido suprimidos pelo estabelecido naquela época (GOHN, 2007;

MARTINS et al., 2008).

Os conselhos existentes nas décadas de 1970-80 tinham como escopo a criação

de espaços em que se apresentavam demandas das comunidades junto às elites políticas

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locais. Alguns conselhos que tinham certo grau de formalização e institucionalização

denominavam-se conselhos comunitários. Outra modalidade de conselhos eram os

vinculados aos movimentos sociais. Estes criavam espaços públicos para interlocução

entre Estado e partidos políticos visando à defesa de sua autonomia, e foram conhecidos

como conselhos populares. Havia ainda os conselhos administrativos vinculados a

hospitais, creches e escolas, entre outras autarquias administrativas, embora estes

fossem destituídos de autonomia alguma para influenciar políticas (TATAGIBA, 2002).

A partir da Constituição de 1988, surgiram os conselhos gestores

institucionalizados, com a finalidade de serem interlocutores ente o Estado e a

sociedade civil. A inovação se apresenta nas características e possibilidades de alguns

deles terem deixado de ser apenas de caráter consultivo e passarem a ter prerrogativas

de determinar e decidir sobre as políticas públicas. Criaram-se condições de reordenar

as políticas rumo a práticas mais democráticas, através do caráter deliberativo (GOHN,

2007; PETRARCA, 2008).

Conforme Martins et al. (2008, p. 159):

Quanto ao seu poder de decisão, os conselhos podem ser deliberativos ou

consultivos. O conselho deliberativo é aquele que possui o poder de discutir e

decidir sobre os rumos das políticas públicas executadas pelo governo, e o

consultivo tem como função emitir pareceres e dar sugestões sobre as

políticas, não possuindo poder decisório.

Os conselhos podem ser classificados, basicamente, em três tipos: a) conselhos

de programas, que são atrelados aos programas governamentais existentes, estando suas

prerrogativas no âmbito dos respectivos programas (conselhos municipais de

desenvolvimento rural, emprego, habitação e alimentação escolar); b) conselhos de

políticas, vinculados a políticas públicas amplas. Estruturado em sistemas nacionais,

com fóruns públicos, utilizados como canais de intermediação de interesses específicos

dos diversos grupos sociais. Tendo como função ampliar a participação dos segmentos

com menos acesso ao aparelho de Estado (conselhos de saúde, educação e assistência

social); c) conselhos temáticos, ligados a uma área/tema sem legislação e existente na

esfera local (conselhos municipais de direitos da mulher, de cultura, de esportes, de

carnaval) (TATAGIBA, 2002, p. 49; MARTINS et al., 2008).

Para Tatagiba (2002, p. 55), a novidade histórica dos conselhos gestores, entre

outras características, é que surgem como instrumentos privilegiados de resolução dos

conflitos. Espera-se que neles haja uma construção de acordos que não seja pautada pela

“troca de favores ou práticas clientelistas ou mesmo de cooptação”. A condição de

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instância deliberativa lhe garante a competência jurídica para influenciar no processo de

elaboração das políticas públicas, controlando orçamentos, partilhando o poder e

redefinindo as prioridades.

Para Tatagiba (2002, p. 55) “... A competência legal de deliberar sobre as

políticas públicas é a principal força dos conselhos enquanto espaços potencialmente

capazes de induzir à reforma democrática do Estado.” Por terem, relativa, autonomia em

relação ao governo, abrem novas possibilidades concernentes à participação popular nas

decisões acerca das políticas públicas. Essa participação é denominada por alguns

autores como governança democrática, por concretiza a democratização dos processos

de escolha das políticas realizadas pelos governos.

Para Santos Júnior, Azevedo e Ribeiro (2004, p. 19), os conselhos são a

personificação da governança democrática, sendo esta:

[...] padrões de interação entre as instituições governamentais, agentes do

mercado e atores sociais que realizem a coordenação e, simultaneamente

promovam ações de inclusão social e assegurem e ampliem a mais ampla

participação social nos processos decisórios em matéria de políticas públicas.

[...].

Esse padrão de interação se modifica conforme as arenas em que se processam

as disputas, estando então, dependente da organização dos arranjos institucionais para

promover diferentes níveis de interação entre Estado e sociedade:

[...] Os conselhos constituem canais de participação e representação das

organizações sociais na gestão de políticas públicas específicas. Obrigatórios

por lei federal em diversos setores (saúde, educação, criança e adolescente,

assistência social e trabalho), os conselhos se diferenciam de acordo com o

município: (i) pelo poder de decisão, deliberativo ou consultivo; (ii) pelos

critérios de representação dos diferentes segmentos sociais, amplos ou

restritos; e (iii) pela dinâmica e pelas condições de seu funcionamento, isto é,

os instrumentos e a estrutura à sua disposição. Nesse sentido, entendemos

que os conselhos municipais são a maior expressão da instituição, pelo menos

no plano legal, do modelo de governança democrática no âmbito local.

(SANTOS JÚNIOR, AZEVEDO, RIBEIRO, 2004, p. 21).

A partir dessas considerações do papel da descentralização, nota-se que a

participação dos municípios tem-se ampliado, tornando-o instância local

implementadora de políticas. Esse processo se constitui mediante o modelo de

descentralização dos recursos da união, que exige a instituição dos conselhos

municipais para o recebimento de repasses financeiros. Nesse caso, os conselhos

tornam-se necessários como espaços públicos institucionalizados de participação

(CÔRTES, 2005).

Como aponta Petrarca (2008, p. 33): “os conselhos municipais tornaram-se

ferramentas-chave na descentralização e na ampliação do papel político dos governos

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municipais, uma vez que a composição e criação dos conselhos são definidas pelas leis

orgânicas municipais.”. Acresce-se conforme ressalta Abranches e Azevedo (2004, p.

164), “... a responsabilidade deliberativa, que aliada a situações normativas e

controladoras, possibilita aos conselhos um significativo papel na construção do

exercício da democracia participativa.”.

A democracia participativa constitui-se por meio da participação dos atores do

governo e da sociedade civil. Para tal finalidade, nos fóruns dos conselhos deveram ter

representantes:

(1) governamentais, (2) de instituições: públicas ou privadas, produtoras ou

provedoras de benefícios, bens e serviços, as quais, freqüentemente, recebem

recursos financeiros públicos ou isenções fiscais; (3) de profissionais ou de

trabalhadores da área; (4) patronais, no caso de trabalho. (CÔRTES, 2005a,

p. 150).

Para isso os representantes não-governamentais devem ser eleitos em fóruns dos

próprios segmentos aos quais representam, e sem a ingerência do Estado, pois a

autonomia da sociedade civil, perante o Estado, deve ser resguardada como um direito.

Dado que os conselhos permitem a participação da sociedade nas discussões sobre a

formulação e a gestão de políticas, com isso imprime um caráter essencial de controle

da sociedade sobre as políticas (MARTINS et al., 2008).

Para assegurar a participação efetiva dos consorciados no processo que envolve

as decisões, o CONSAD, conforme Art. 4º, VII da Lei nº 11.107/2005 e do Art. 5º, VII

do Decreto nº 6.017/2007, deve contar com o foro de uma assembleia geral, enquanto

instância máxima do Consórcio. Nesse aspecto encontra-se diferença de proposição

entre o guia formulado pelo IBAM que organiza a concepção do CONSAD e a

definição expressa no texto da lei.

Na proposta do IBAM (2004), o CONSAD tem como órgão deliberativo

máximo o Fórum, com prerrogativas deliberativas de um conselho gestor, e com

representatividade para os entes consorciados, seguindo uma proporcionalidade de

conselheiros por cada município representado, além de estabelecer a proporcionalidade

da representação entre poder público e sociedade civil.

Para isto no Guia do CONSAD:

Preconiza-se a necessidade da existência de um órgão que atue como

instância máxima deliberativa, com características de Fórum e com ampla

participação dos diferentes segmentos sociais e econômicos atuantes no

território em consideração (IBAM, 2004, p. 15).

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Nesta perspectiva, o fórum do CONSAD é composto por até seis representantes

de cada município, observado o princípio da representação majoritária da sociedade

civil (ter 2/3 dos representantes). Assim, o CONSAD conta, por município, com: 2 entes

provenientes do setor público (Prefeitura, Câmara de Vereadores) e 4 membros da

sociedade civil, eleitos de forma independente do poder público.

A princípio, mantêm-se a estrutura similar a de um conselho gestor de políticas

públicas, todavia com a visível limitação de que não há alternância de poder entre as

entidades que representam a sociedade civil, uma vez que só participa do Fórum aquelas

entidades que são consorciadas. Em tese, somente os consorciados tem a prerrogativa de

serem representados no conselho do consórcio44

.

Mesmo assinaladas tais limitações, o Guia do CONSAD (IBAM, 2004, p. 17),

estabelece que: “(...) o processo decisório participativo e democrático é o caminho

adequado para opções mais realistas e pertinentes e para o comprometimento com as

decisões tomadas.”. Nele, deve resguardar o pluralismo como um dos pressupostos de

um processo decisório participativo, das categorias que fazem parte das atividades

econômicas e sociais dos territórios.

44

Essa questão não aparece no Guia do CONSAD, entretanto, se for observado que o consórcio se

constitui, enquanto pessoa jurídica, de uma associação civil, e que nela são integrantes os que

participaram de sua criação. Logo, são estas entidades que se fazem representar no conselho do consórcio.

Ora, vê-se, portanto, que a representação da sociedade civil é restringida no ato de criação da Associação

Civil.

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4. ESTUDO DE CASO DO CONSAD IGUATEMI

O estudo de caso foi dividido em duas partes: a primeira têm-se uma

caracterização geral dos CONSADs, seus processos de implementação, assim como o

processo de implementação específico do CONSAD Iguatemi - MS. Discutiu-se

algumas das ações desenvolvidas por este CONSAD.

Na segunda parte, através da análise de questionários, entrevista e da observação

não-participante, fez-se análise das práticas e realizações do CONSAD Iguatemi - MS,

verificando as condições de participação dos agentes dentro do Consórcio,

principalmente o papel da sociedade civil.

4.1. CARACTERIZAÇÃO E PROCESSO DE IMPLANTAÇÃO

O programa CONSAD foi originado dentro da proposta do “Estudo de

Localização Territorial de Potenciais Consórcios de Desenvolvimento Local, Integrado

e Sustentável (CONDELIS)”, segundo De Jesus (2006, p. 57). Sua elaboração foi feita

em 2002 pelo IBAM, a pedido da Secretaria Executiva do Comunidade Solidária.

Através de uma avaliação do CONDELIS feita pelo recém-criado Ministério

Extraordinário de Segurança Alimentar e Combate à Fome (MESA) em 2003, elaborou-

se o projeto final intitulado “CONSAD – Formação de Consórcios de Segurança

Alimentar e Desenvolvimento Local”, e o integrou à Política de Segurança Alimentar

sustentada pelo Programa Fome Zero (MANCE, 2004, p. 82).

Identificaram-se através desse Projeto, sessenta e oito territórios com potencial

para serem transformados em consórcios, entretanto foram implementados apenas

quarenta CONSADs no Brasil. Os Consórcios foram distribuídos entre as cinco grandes

regiões brasileiras, abrangendo vinte e seis Estados. Na região Norte do país foram

instalados sete CONSADs, envolvendo sessenta e oito municípios. No Nordeste, doze

CONSADs e cento e cinquenta e nove municípios, enquanto que no Sudeste foram oito

CONSADs, beneficiando cento e cinquenta e quatro municípios. A região Sul contou

com oito CONSADs, cento e cinquenta e cinco municípios, assim como a região

Centro-Oeste, onde foram instalados cinco CONSADs que abrangeu quarenta e nove

municípios (MDS, 2012).

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Estes Consórcios atingem quinhentos e oitenta e cinco municípios e perto de

onze milhões de pessoas, cerca de 10% dos municípios brasileiros e 5% da população

brasileira. Estes números demonstram a importância dessa política pública, apontando

para seu caráter estrutural, vez que, olhando para os critérios estabelecidos para a

escolha dos arranjos territoriais nos quais se inserem os municípios integrantes dos

CONSADs, nota-se sua proposta emancipatória.

O processo de formação e implementação de um CONSAD ocorre em três

etapas, que constam na proposta de desenho metodológico de implantação do

CONSAD: a) sensibilização e mobilização; b) implantação; c) consolidação. Nesta

proposta é prevista a participação de instituições denominadas de Entidades

Implementadora Regional - EIR, que se tornam responsáveis pelo processo de

implementação de cada CONSAD (IBAM, 2004).

Na fase de Sensibilização e Mobilização, a sociedade é convidada e motivada

para a proposta de formação do CONSAD. Esta fase se encerrara ao se proceder a

escolha dos representantes municipais do CONSAD. Na fase de Implantação, o

CONSAD se constitui enquanto pessoa jurídica e elabora um planejamento para sua

atuação, mediante o chamado Plano de Ação. Inicia-se o processo de capacitação dos

membros do CONSAD. A Consolidação surge com a formalização do Consórcio em

Associação Civil e a pactuação do Plano de Ação entre os consorciados (IBAM, 2004).

FIGURA 04 - FLUXOGRAMA DE FORMAÇÃO DO CONSAD

Fonte: Guia do CONSAD (IBAM, 2004).

O CONSAD Iguatemi - MS teve sua implantação vinculada à Milênio

Consultoria. Os trabalhos de sensibilização e mobilização começaram depois da

assinatura de contrato entre MDS e o governo de Mato Grosso do Sul, em fevereiro de

2004. A EIR responsável, a Milênio Consultoria, visitou os municípios e realizou

oficinas e fóruns com a presença do poder público e da sociedade civil, mas como

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aponta De Jesus (2004, p. 89) havia a presença, sobretudo, de indivíduos envolvidos

com o poder público. Procedeu-se a escolha dos representantes de cada município.

A 2ª e a 3ª fase do processo de implantação foram realizadas ao longo de 2004.

Tal processo levou à construção do Plano de Ação do CONSAD Iguatemi, em que

foram selecionados doze projetos, a priori, depois, no âmbito do Fórum, reduziram-se

para três projetos: apicultura regional, lavouras comunitárias e criação de animais de

pequeno porte (DE JESUS, 2004).

O CONSAD Iguatemi - MS foi formado inicialmente por onze municípios45

:

Coronal Sapucaia, Eldorado, Iguatemi, Itaquiraí, Japorã, Mundo Novo, Naviraí,

Paranhos, Ponta Porã, Sete Quedas e Tacuru. Juntos abrangem uma população de

241.662, com uma densidade demográfica média de treze habitantes por km² e com uma

população residente rural que se destaca: média de 36%, com destaque para Japorã

(81,90%), Tacuru (63,10%) e Itaquiraí (59,20%) 46

.

FIGURA 05 - MAPA DOS TERRITÓRIOS DO CONSAD IGUATEMI

Fonte: elaborado pelo próprio autor.

O território do CONSAD Iguatemi - MS faz fronteira com o Paraguai e divisa

com os estados de São Paulo e Paraná. O território foi recentemente organizado do

ponto de vista administrativo (elevados à condição de municípios). Alguns municípios

surgiram no circuito de produção de erva-mate (Coronel Sapucaia; Tacuru; Ponta Porã).

45

Atualmente fazem parte apenas seis municípios: Iguatemi, Tacuru, Japorã, Ponta Porã, Paranhos e

Mundo Novo. 46

Dados retirados pelo autor no site do IBGE Cidades:

<http://www.ibge.gov.br/cidadesat/topwindow.htm?1>.

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88

Outros foram criados através de incentivos como projetos de colonização, é o caso de

Itaquiraí, através de doação de terras a imigrantes (DRESCH, 2011).

Mundo Novo e Sete Quedas se constituíram através de projeto de colonização do

governo federal. Naviraí se formou através da responsabilidade de empresas

colonizadoras. Iguatemi surgiu no lugar de um entreposto militar destruído na guerra

contra o Paraguai. Eldorado foi povoado pela indução de grandes proprietários de terras

locais. Paranhos e Japorã foram emancipados mais recentemente pelo governo estadual

(DRESCH, 2011).

Segundo dados do Censo Demográfico de 2010, com exceção Ponta Porã que

têm 77.866 habitantes, os municípios do CONSAD Iguatemi têm uma população

inferior a 20 mil habitantes. O conjunto dos seis municípios possui 5,72% dos

habitantes de Estado e 3,44% da área, constituindo-se em municípios pequenos tanto em

número de habitantes quanto em área. Isso pode ser observado pela leitura da tabela 01.

Tabela 01 – População e área dos municípios do CONSAD Iguatemi

Municípios do CONSAD Iguatemi População em Habitantes Área em Km²

Iguatemi 14.887 2.947

Japorã 7.645 419

Mundo Novo 17.035 478

Paranhos 12.355 1.309

Ponta Porã 77.866 5.330

Tacuru 10.215 1.785

Mato Grosso do Sul 2.449.341 357.145

Fonte: Censo Demográfico 2010 - primeiros resultados

A tabela 02 apresenta o PIB e o PIB per capita dos municípios pertencentes ao

CONSAD Iguatemi. Em termos absolutos Ponta Porã é o município com o maior PIB,

aproximadamente 726,5 milhões de reais. O Município de Japorã é o que possui o

menor PIB, tanto em valores absolutos como per capita, chegando a ser três vezes

menor que o valor per capita do estado de Mato Grosso do Sul. O somatório do PIB de

todos os municípios do CONSAD Iguatemi é responsável por 7% do PIB de Mato

Grosso do Sul e nenhum dos municípios do CONSAD tem o PIB per capita maior que

o do Estado.

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89

Tabela 02 – Produto Interno Bruto dos municípios do CONSAD Iguatemi

Municípios do CONSAD

Iguatemi PIB (em mil reais de 2008)

PIB per capita (em reais de

2008)

Iguatemi R$ 196.025,00 R$ 12.994,72

Japorã

R$ 35.513,00 R$ 4.667,86

Mundo Novo

R$ 154.357,00 R$ 9.388,54

Paranhos

R$ 68.609,00 R$ 5.998,84

Ponta Porã

R$ 726.502,00 R$ 9.738,50

Tacuru

R$ 88.697,00 R$ 9.353,22

Mato Grosso do Sul R$ 33.145.000,00 R$ 14.188,00

Fonte: IBGE 2008

Em geral, os municípios do CONSAD Iguatemi são municípios com baixa

densidade populacional, PIB per capita baixo, inclusive menor do que a média estadual,

em todos os seis municípios. Isso caracteriza o estado de pobreza desses municípios,

mas não surpreende, pois esta foi uma das variáveis levadas em conta para a escolha

desses municípios enquanto alvos de uma política de desenvolvimento territorial.

Para Lima-Filho (2011, p.92) os piores índices de renda de Mato Grosso do Sul

encontram-se nessa região, que “é uma região pobre cercada por pobres e índios”. A

região do CONSAD Iguatemi é região pobre de um Estado com pouca presença em

termos de geração de renda no país. Mato Grosso do Sul participa com apenas 1,3% da

geração da renda nacional.

Na tabela 03 o PIB foi divido em setores, assim é possível identificar os setores

mais importantes na constituição do PIB de cada município. Ponta Porã apresenta o

maior valor adicionado bruto absoluto na agropecuária, na indústria e nos serviços. O

município de Japorã apresenta o menor valor adicionado bruto em termos absolutos dos

três setores.

Tabela 03 – Produto Interno Bruto dos municípios do CONSAD Iguatemi por setores

Municípios do

CONSAD Iguatemi

Produto Interno Bruto dos Municípios em mil reais de 2008 (VAB =

Valor Adicionado Bruto)

VAB da Agropecuária VAB da Indústria VAB dos Serviços

Iguatemi R$ 50.535,00 R$ 41.125,00 R$ 83.443,00

Japorã R$ 7.429,00 R$ 3.177,00 R$ 23.161,00

Mundo Novo R$ 11.555,00 R$ 28.324,00 R$ 90.719,00

Paranhos R$ 17.839,00 R$ 5.487,00 R$ 40.941,00

Ponta Porã R$ 123.458,00 R$ 66.173,00 R$ 433.731,00

Tacuru R$ 29.737,00 R$ 6.133,00 R$ 43.906,00

Fonte: IBGE 2008

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Ao se dividir o valor do PIB de cada setor pelo valor total do PIB, se encontra a

participação relativa de cada setor na composição do PIB. Realizando essa operação

percebe-se que o setor de serviços é o que tem maior participação na composição do

PIB dos municípios do CONSAD Iguatemi, em média 55%. O município de Iguatemi é

o que o setor serviço tem menor participação 42,5. Já o município de Japorã é o que o

setor serviços tem maior participação 65,2. Vale lembrar que o PIB absoluto deste

município é o menor apresentado no CONSAD.

O valor adicionado bruto da agropecuária é o segundo em importância na

constituição do PIB para todos os municípios, com exceção Mundo Novo, onde o valor

adicionado bruto relativo da indústria é maior que o da agropeucária. O VAB da

Agropecuária é de 7,5% para Mundo Novo, em média o VAB da agropecuária é

responsável por 22% do PIB dos Municípios do CONSAD Iguatemi. Nos municípios de

Iguatemi e Mundo Novo o VAB da Indústria gira em torno de 18,3 e 25,6% do PIB.

Enquanto nos demais municípios do CONSAD esse valor não ultrapassa 10%.

Ao analisarmos o valor adicionado bruto (VAB), viu-se que o setor serviços é o

mais representativo dentro do PIB desses municípios. Essas cidades não possuem

dinâmica econômica expressiva de outros setores, como o agropecuário e industrial. O

setor industrial não tem expressividade nesses municípios. Já o setor agropecuário,

embora esteja em segundo plano com relação ao VAB, ele é representativo – no que diz

respeito à participação percentual no PIB municipal – em três dos seis municípios.

Tabela 04 – Número de estabelecimentos agropecuários por grupo de área

Municípios do Consad

Iguatemi

Número de Estabelecimentos Agropecuários

menos de 50

(ha)

de 50 a menos de

500 (ha)

mais de 500

(ha) Total

Iguatemi 563 135 123 825

Japorã 658 73 14 747

Mundo Novo 503 99 10 618

Paranhos 235 41 47 323

Ponta Porã 3.210 323 161 3.697

Tacuru 106 64 86 260

CONSAD Iguatemi 5.275 735 441 6.470

Fonte: Censo Agropecuário 2006

Na tabela 04 é possível observar o número de estabelecimentos agropecuários e

sua distribuição segundo grupos de área. O município de Ponta Porã conta com o maior

número de estabelecimentos agropecuários, cerca de 60% do total da região. Os

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municípios com menor participação em relação ao CONSAD são Paranhos (4,99%) e

Tacuru (4,02%).

Os estabelecimentos estão divididos em três grupos de área, menor que 50

hectares, de 50 a menos de 500 e mais de 500 hectares. Observa-se que os

estabelecimentos estão concentrados em sua grande maioria no primeiro grupo, que

poderia ser caracterizado como grupo pequenas propriedades. De um total de 6.470

estabelecimentos, 5.275 possuem área inferior a 50 hectares, em termos relativos isso

representa 81,53% do total.

Através da análise do número de estabelecimentos agropecuários, buscou-se

analisar a concentração do número de produtores rurais. Observa-se uma concentração

em Ponta Porã, com quase 60% do total dos municípios. Por outro lado, nota-se a

predominância de pequenos estabelecimentos agropecuários para o CONSAD Iguatemi,

cerca de 80,% com áreas inferiores a 50 hectares, caracterizando um perfil de pequenas

propriedades agropecuárias.

Nesta área, são trinta e seis projetos de assentamentos rurais. Terras distribuídas

para oito mil, oitocentos e quarenta e seis famílias. Assim, 7,4% da área do CONSAD

Iguatemi - MS são destinadas a projetos de assentamentos. Japorã têm 17,7% de sua

área ocupada com projetos de assentamento rurais (LIMA-FILHO, 2011).

Na maioria dos municípios predomina a produção de subsistência e os produtos

que são destinados às indústrias não têm dado o retorno esperado pelo produtor do

território. A cadeia produtiva do leite tem se apresentando como alternativa para o

produtor familiar já que ela representa um incremento a sua renda (LIMA-FILHO,

2011).

A principal atividade econômica do território do CONSAD Iguatemi - MS é a

pecuária de corte, que ocupa 88,7% da área do território. A estrutura de transformação e

comercialização no território está quase toda voltada para atender a esta atividade. Para

a produção de carne é necessária a utilização de uma grande extensão territorial, mesmo

quando há a utilização do sistema de confinamento (GARBIN, 2005).

A segunda atividade que mais ocupa área no território é a lavoura temporária

(4,8%), com os produtos soja, milho e cana de açúcar. Propriedades rurais que tem

como atividades a pecuária e lavouras temporárias ocupam juntas, 93,5% do território.

A soja é a principal agricultura de Mato Grosso do Sul e movimenta grande parte da

economia estadual. A produção de soja é intercalada com a produção de milho, no

período de entressafra. O milho representa a segunda maior produção em hectares e

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toneladas. A mandioca que aparece com a terceira maior área plantada é destinada

principalmente às indústrias de fecularia (GARBIN, 2005).

Tabela 05 – Produção de 2008 em toneladas dos principais produtos agropecuários dos

municípios do CONSAD Iguatemi

Municípios do

CONSAD Iguatemi

Produtos Agropecuários

Arroz Café cana-de-

açúcar Feijão Mandioca Milho Soja Trigo

Iguatemi - 12 572.700 - 3.600 24.000 27.200 58

Japorã 30 - - - 7.300 7.725 6.913 31

Mundo Novo - 34 - 93 15.000 14.834 10.200 95

Paranhos 144 6 8.500 9 14.400 8.670 10.215 504

Ponta Porã 7.632 - 4.200 2.718 12.000 213.000 403.200 10.500

Tacuru 30 6 360 171 12.800 25.800 26.640 114

Fonte: SEMAC

Na tabela 05 está listada a produção em toneladas dos principais produtos

agropecuários dos municípios do CONSAD Iguatemi. No município de Ponta Porã o

principal produto é a soja, com 403.200 toneladas produzidas, seguida pelo milho. Em

Tacuru, assim como em Ponta Porã, o principal produto é a soja seguida pelo milho e a

mandioca.

No município de Japorã a cultura que teve maior quantidade produzida em 2008

foi o milho com 7.725 toneladas. Em Japorã a segunda maior produção foi de mandioca.

Já nos municípios de Mundo Novo o principal produto produzido em 2008 foi a

mandioca com 15.000 toneladas.

Observa-se que Mandioca, Milho e Soja representam grande parte de produção

dos municípios do CONSAD Iguatemi. Porém, Iguatemi fugiu a essa situação, pois

nesse local o produto que teve maior produção em toneladas foi a cana-de-açúcar. Cabe

salientar, que além da existência de usinas de álcool, há indústrias de transformação

para aves e suínos que utiliza uma cadeia de produção na qual grande parte dos

produtores da agricultura familiar está buscando viabilizar sua renda.

Recentemente a produção de cana de açúcar conheceu um grande crescimento

no Estado, com a entrada de várias usinas. Mato Grosso do Sul possui vinte e uma

usinas em operação. Há mais dez unidades em fase final de implantação. O potencial de

crescimento da produção no Estado é bastante elevado, com possibilidade de

concorrência com a produção agrícola e de gado (LIMA-FILHO, 2011).

A produção de soja, milho e gado de corte são importantes para Mato Grosso do

Sul, mas são mais adaptadas para grandes produtores. A agricultura familiar necessita

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de outras soluções, entre elas a produção de leite e a mandioca. A suinocultura em Mato

Grosso do Sul abrange menos municípios e regiões do que a bovinocultura e a

agricultura. A produção de suínos está localizada nas mesmas áreas que as de milho e

soja. O Estado possui treze frigoríficos com capacidade de abate de suínos. Apenas

cinco são especializados em suínos e estão nas regiões próximas à produção de animais

(LIMA-FILHO, 2011).

Existe uma pequena produção de suínos na maioria dos municípios do CONSAD

Iguatemi - MS, mas esta se encontra localizada essencialmente em pequenos produtores

para consumo próprio e comercialização, principalmente clandestina, do excedente.

A presença de unidades processadoras é um fator relevante para o crescimento

da agropecuária, principalmente para a agricultura familiar. Essas unidades limitam-se,

essencialmente, a fecularias, usinas de açúcar e etanol a frigoríficos para bovinos, e

frigorífico para peixe em Mundo Novo. O aumento das unidades de processamento é

fator imprescindível para aumentar as opções de produção na região.

A falta de infraestrutura logística e de apoio de produção, o baixo dinamismo

econômico da região, as cadeias produtivas desestruturadas, a concentração de terras e

rendas são grandes entraves para o desenvolvimento dessa região. Além da alta

concentração de terras, da predominância da bonivicultura de corte como atividade

motriz e da baixa ocupação da terra com atividades ligadas à lavoura.

Tabela 06 – IDH-M, Índice de Gini e Incidência da Pobreza dos municípios do

CONSAD Iguatemi

Municípios do CONSAD

Iguatemi

Índice de Desenvolvimento

Humano Municipal, 2000

Índice de Gini,

2000

Incidência da

Pobreza (%)

Iguatemi 0,731 0,59 35,49

Japorã 0,636 0,56 37,64

Mundo Novo 0,761 0,54 40,08

Paranhos 0,676 0,55 47,24

Ponta Porã 0,780 0,63 39,61

Tacuru 0,662 0,53 41,12

Mato Grosso do Sul 0,778 0,46 34,23

Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano

A tabela 06 mostra alguns indicadores sociais dos municípios do CONSAD

Iguatemi. Observa-se que o município de Ponta Porã é o que apresenta o maior IDH e

único, entre os municípios do CONSAD Iguatemi, que possue o IDH maior que o do

Estado. No ranking estadual ocupa a 10ª posição. Somente Mundo Novo possuim IDH

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superior a 0,75. Dos municípios selecionados três apresentam IDH inferior a 0,7 sendo

eles: Paranhos, Tacuru e Japorã, justamente os três últimos no ranking estadual.

Os dados apresentados até agora dos municípios do CONSAD Iguatemi

apresentam um padrão, o município de maior porte como Ponta Porã apresenta maiores

índices enquanto Japorã apresenta indíces menores. A tabela 6 mostra que os

indicadores de concentração de renda e pobreza não seguem esse padrão.

O índice de Gini mostra a concentração de renda, quanto mais próximo da

unidade, maior é a concentração. Nos municípios do CONSAD Iguatemi a concentração

pode ser classificada como alta, pois todos os municípios apresentam o índice superior a

0,5 enquanto o índice do estado de Mato Grosso do Sul é 0,46. No município de Ponta

Porã o índice chega a ser maior que 0,6. O caso de Ponta Porã é interessante porque é o

o município que apresenta o maior PIB absoluto e também a maior concentração de

renda.

O indicador incidência da pobreza mostra o percentual da população que está

abaixo da linha da pobreza, sendo esta linha fixada em menos de dois dolares norte-

americanos por dia por pessoa. Assim como no índice de gini esse indicador foge o

padrão encontrado nos demais dados. O município com maior incidência de pobreza é

Paranhos com 47,24% de sua população em situação de pobreza. A média da região do

CONSAD Iguatemi é 40,3%, maior que a íncidência da pobreza no estado de Mato

Grosso do Sul 34,2%.

4.2. PROJETOS

Utilizando-se do estudo de Dresch (2011) e Lima-Filho (2011), traz-se uma

listagem dos projetos levados a cabo pelo CONSAD Iguatemi - MS. A execução de tais

projetos foi confirmada durante entrevista com a Presidente do CONSAD Iguatemi –

MS e pelos demais entrevistados/pesquisados na reunião da Diretoria Executiva.

CONSAD em Ação (malharia e panificação)

Único projeto em que os recursos não são provenientes do poder público. A

Petrobrás doou (via edital e seleção de propostas) R$ 409.000,00 visando à criação de

oito empreendimentos sócio-produtivos (malharias comunitárias) nas municipalidades

que compõem o território. E o “Pão na Mesa” que se consistiu a partir da instalação de

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cinco padarias comunitárias, além de reformar a já existente no município de Mundo

Novo.

Público-alvo: Famílias de baixa renda selecionadas pelas secretarias municipais

de assistência social.

Atividades desenvolvidas: Produção e comercialização de produtos diversos

oriundos das malharias ou das panificadoras.

Municípios que abrigam projetos: Iguatemi; Itaquiraí; Tacuru; Naviraí;

Paranhos; Japorã; Ponta Porã e Mundo Novo.

Apicultura Regional

É um projeto com grande abrangência, incluindo trezentas famílias beneficiadas,

e articula, além do aspecto produtivo, a comercialização. O projeto “Apicultura

Regional” tem o objetivo de incentivar a expansão da apicultura, a preservação

ambiental, garantir alternativa para diversificação da produção, oferecendo à população

um produto de comprovada qualidade nutricional e promover a geração de renda às

famílias vulnerabilizadas socioeconomicamente. Dessa maneira, combater a pobreza e

reduzir os efeitos da desigualdade social.

Público-alvo: Famílias de produtores com baixa renda.

Atividades desenvolvidas: Treinamento e distribuição de “kits” para a produção

de mel.

Fontes de recursos: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome

(MDS).

Municípios que abrigam projetos: Coronel Sapucaia; Iguatemi; Itaquiraí; Japorã;

Naviraí; Ponta Porã.

Ambos os projeto atendem 300 famílias. Para efeito de estimativa de impacto,

considerou-se o tamanho da família média sul-mato-grossense, conforme dados PNAD

2006, e índices de população indigente do Atlas do Desenvolvimento Humano (PNUD),

relacionado com a população estimada IBGE (2009), obtendo-se 930 beneficiários

dentre uma população indigente de 36.331 e 88.761 de uma população considerada

probre. Fez uma estimativa da cobertura do programa que chegaria a 2,56% da

população no nível de renda considerado indigente e a 1,05% da população no nível de

renda considerado pobre (DRESCH, 2011).

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4.3. ANÁLISE DOS QUESTIONÁRIOS, ENTREVISTAS E

OBSERVAÇÃO NÃO-PARTICIPANTE

Nesta dissertação procurou-se realizar uma abordagem que retrata o ponto de

vista dos sujeitos da pesquisa, neste caso, os conselheiros que representam seus

respectivos municípios no consórcio analisado. O nível de análise se situa na interação

dos conselheiros no contexto do Fórum (conselho) do CONSAD Iguatemi - MS.

Buscou-se identificar o processo de interação entre os conselheiros e a forma de

operação do Conselho.

Dado as obstruções relatadas nas questões metodológicas, posicionou-se pela

utilização do recurso da observação não-participante que permite um diálogo entre

pesquisador e indivíduos pesquisados. Impelido pela falta de acesso aos documentos,

como salientado nos apontamentos metodológicos, o pesquisador intentou “trabalhar

com o silêncio”, isto é, pauta-se, muito mais, na oralidade, nos diálogos travados e

observados durante as entrevistas e a reunião da diretoria do CONSAD Iguatemi.

A análise estabeleceu-se mediante a orientação da análise da realidade “obtida” e

da realidade “observada”. A primeira se refere às informações coletadas pelo

pesquisador através da sistematização dos questionários aplicados, e está estruturada de

acordo com as três dimensões do questionário: composição, organização e dinâmica.

Trata-se de uma realidade entendida pela percepção dos entrevistados, através do

questionário (em apêndice).

A segunda, a realidade “observada”, guia-se pela pesquisa observação não-

participante, e se constitui de informações coletadas através da percepção do

pesquisador, que ocorreu via participação do pesquisador nas reuniões e entrevistas.

Para nortear algumas comparações, utilizou-se o Estatuto do CONSAD Iguatemi

- MS e o comparou ao modelo sugerido pelo Guia do CONSAD (IBAM, 2004). Fez-se

contraponto com as respostas dos questionários, da entrevista e das observações feitas

pelo pesquisador.

4.3.1. Composição: legitimidade, representatividade e qualificação

Através do Guia do CONSAD, documento que orienta a construção e formação

destes Consórcios, tem-se algumas dimensões do que se espera quanto à composição e

representatividade dos integrantes do Fórum, com característica de conselho. A

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legitimidade é um critério utilizado para comparar a independência e autonomia dos

representantes da sociedade civil em relação ao poder público. A representatividade

busca argumentar se eles representam ou não quem eles devem representar. Já a

qualificação se preocupa com a capacidade para formular, coordenar e fiscalizar uma

política, atribuição típica dos conselhos gestores.

Para a discussão da dimensão da composição, informa-se que o próprio conceito

de Sociedade Civil não está bem delineado no Guia do CONSAD. Na página 17,

quando dá explicitação dos critérios de representação do Fórum do CONSAD, ele

apresenta o termo “entes privados”, para tratar, suponha-se, do que anteriormente ele

denota como sociedade civil: “na composição dos órgãos de representação (...) exista

uma participação majoritária de entes privados”.

Nessa confusão de termos, que têm significados distintos, o Guia do CONSAD

apresenta como entes privados:

... as organizações de direito privado e as organizações da sociedade, tais

como: associações de produtores, de empresários, de comerciantes, entidades

sociais, cooperativas, sindicatos, organizações não governamentais,

organizações da sociedade civil de interesse público, e outros.

No Estatuto do CONSAD Iguatemi (anexo A), também se estabelece a utilização

do termo “entes privados”, quando se dirigi à formalização da Associação Civil

Consórcio de Segurança Alimentar e de Desenvolvimento Local – CONSAD Iguatemi -

MS, logo na primeira página. Quando normatiza a composição e constituição do Fórum,

reafirma o termo “entes privados” (Estatuto do CONSAD Iguatemi, p. 03).

Notou-se que a escolha dos representantes que compõem o Fórum do CONSAD

Iguatemi - MS é ambígua. Têm-se representantes escolhidos por parte da entidade a que

este vem representar, assim como outros que foram escolhidos em negociação da

entidade que representa com o poder público.

No primeiro caso, há maior legitimidade quando se trata da independência dos

conselheiros quanto ao poder público, pois este não teve interferência no processo de

escolha do indivíduo. Deixa-se claro, também, que essa legitimidade não se refere

apenas ao processo de escolha, mas, também, às propostas e ao modo como se comporta

o conselheiro quanto à proposição de projetos, bem como sobre a forma que se coloca

quando da participação no Fórum: de modo ativo ou passivo quanto às deliberações e ao

embate de forças que ocorre.

No segundo caso, quanto aos escolhidos em negociação da entidade que

representa com o poder público, há menor legitimidade destes representantes, pois este

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98

ato poderia demonstrar tanto a ingerência do poder público na organização da sociedade

civil quanto uma influência sobre o representante escolhido. Por um lado, diminui-se a

legitimidade e por outro, mina-se a representatividade deste conselheiro.

QUADRO 03 - ESTRUTURA DAS RESPOSTAS DA DIMENSÃO COMPOSIÇÃO

Perguntas Entrevistado

A

Entrevistado

B

Entrevistado

C

Entrevistado

D

Entrevistado

E

Composição

Legitimidade *** *** *** *** ***

1) Como foi a forma

de escolha para sua

participação no

CONSAD?

Da entidade

que

represento

Da entidade

que

represento

Em

negociação

da entidade

que

represento

com o poder

público

Em

negociação

da entidade

que

represento

com o poder

público

Da entidade

que

represento.

2) Quanto tempo faz

parte do CONSAD? 07 anos 05 anos

06 anos 02 anos 05 anos

3) Quanto tempo sua

entidade faz parte do

CONSAD?

07 anos 05 anos

06 anos 06 anos 05 anos

Representatividade *** *** *** *** *** 4) Você leva para o

CONSAD questões

que são debatidas na

sua entidade?

Não Sim Sim Sim Sim

5) Quais são os canais

utilizados por você

para consultar os

membros se sua

entidade?

- Conferências

ou reuniões Informativos Informativos

Sim.

Reuniões

6) Há alguma entidade

que deveria ser

representada no

CONSAD? Mas que

não participa?

Não, pois há

rotatividade

Não saberia

informar

Não saberia

informar

Não saberia

informar Sim. Não

saberia

informar.

Qualificação *** *** *** *** *** 7) Qual seu grau de

escolaridade?

Pós-

graduação Ensino médio

Nível

superior

Nível

superior Ensino médio

8) Participa ou

participou de cursos

de

qualificação/formação/

capacitação?

Sim. Voltado

para a função

de

conselheiro

do CONSAD

Sim. Voltado

para a função

de

conselheiro

do CONSAD

Sim. Voltado

para a função

de

conselheiro

do CONSAD

Não

Sim. Voltado

para outras

funções.

9) Participa ou

participou de outras

organizações?

Sim Não Sim Sim Sim.

Fonte: dados da pesquisa.

Há que se ressaltar que o processo de escolha das entidades, assim como dos

conselheiros passou por um processo semelhante ao que a literatura nos mostra como

uma falha do processo de mobilização das entidades da sociedade civil (nota-se que a

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99

literatura sobre o CONSAD Iguatemi trata como sociedade civil, embora o Guia do

CONSAD estabeleça “entes privados” e o Estatuto do CONSAD Iguatemi - MS ratifica

isso).

Tal mobilização foi relativa ao processo de constituição do CONSAD, quando

da escolha das Entidades Implementadoras Regionais (EIR). No caso do CONSAD

Iguatemi - MS a EIR foi a Milênio Consultoria, sediada na capital do estado de Mato

Grosso do Sul. Ficou sob a responsabilidade de a EIR convidar, convocar ou estabelecer

fóruns próprios no âmbito da sociedade civil, para escolher as organizações integrantes

do CONSAD.

Conforme mostra De Jesus (2006, p.96-97), dentro desse processo, foram

excluídos importantes segmentos sociais e, houve predominância de representantes do

setor público no Fórum. Mas, segundo o Guia do CONSAD (p. B13), e conforme o

próprio Estatuto do CONSAD Iguatemi - MS (Art. 10, II e III) a sociedade civil deveria

ter 2/3 de representantes. Então como é possível uma predominância do setor público no

Fórum?

Existem dois fatores a serem considerados. O primeiro é quanto à afirmação

feita por De Jesus (2006), ao analisar a composição do Fórum do CONSAD Iguatemi -

MS. Se constatado que existem mais integrantes do setor público, viola-se um dos

pressupostos fundamentais dessa política, ensejada via a participação da sociedade civil

que deveria ter a representação de 2/3.

Na pesquisa para esta dissertação, não se obteve o acesso a lista atualizada dos

integrantes do CONSAD Iguatemi47

, logo não é possível encerrar de vez essa questão.

Mas de acordo com o Estatuto do CONSAD Iguatemi, de 15 de março de 2005, não há

o descumprimento a essa norma (ver Quadro 04, que mostra as organizações, poder

público ou sociedade civil, p. 103). A não ser que o referido por De Jesus (2006) se

refira à presença nos fóruns.

Sendo assim, restou o segundo fator: a cooptação dos membros da sociedade

civil pelo poder público. Alguns conselheiros do CONSAD foram indicados em

negociação da entidade que representa com o poder público. Essa ingerência por si só,

poderia denotar cooptação. No entanto, nota-se também, que há membros que fazem

47

Eles não têm esse controle, ou então nos omitiu. Foi pedido a eles o Estatuto, o Regimento Interno e o

acesso às atas, assim como esse controle. Só foi disponibilizado o Estatuto, e sem estar anexo o “Acordo

de Programa” e as leis autorizativas que permitem aos municípios se associarem. No modelo de Acordo

de Programa que conta no Guia do CONSAD, consta no item 3.2 (p. B10) que A direção do CONSAD

deverá ser informada de quaisquer alterações na representação estabelecida na formalização do acordo de

programa, em que conta os representantes do governo estadual, municipal e dos entes privados.

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100

parte da sociedade civil, como a entrevistada “C” que representa o Clube de Mães, e que

ao mesmo tempo, exerce cargo na prefeitura do município que ela visa representar.

A existência da cooptação tem potencial para obstruir o processo democrático

caracterizado pelo controle social da formulação e gestão de uma política pública. Mas,

no caso analisado esse processo de cooptação não é perceptível, ao menos do ponto de

vista da observação do pesquisador. Primeiro, porque a presença do poder público é

praticamente inexistente, tanto do ponto de vista dos recursos quanto do envio de

representantes.

Segundo que, a mobilização para as ações ou reuniões do Consórcio parte

sempre da Presidente ou da Diretoria Executiva. Terceiro, para fins de deslocamentos e

estrutura física para o CONSAD Iguatemi - MS, conselheiros não dependem do poder

público. Em relação aos representantes da sociedade civil, os recursos disponíveis do

próprio CONSAD Iguatemi são destinados aos deslocamentos destes conselheiros.

Quanto à estrutura física, esta não está alojada na sede da prefeitura ou no

interior de alguma secretaria, tanto quando funcionava na cidade de Iguatemi, como

depois que migrou para a cidade de Tacuru. Embora fosse (ainda é) prédio cedido pela

prefeitura, o mesmo se encontra isolado do ambiente administrativo da prefeitura.

Segundo a entrevista com a Presidente do CONSAD Iguatemi, na maioria dos

municípios, as prefeituras e os respectivos legislativos “não ajudam e nem atrapalham”.

A percepção do pesquisador atribui tal fato ao volume de recursos envolvidos nos

projetos implantados, já que a “cota” de participação paga pelos municípios ao

CONSAD é irrisória: dois salários mínimos por mês, segundo a entrevista com a

Presidente. Por serem recursos pequenos para os municípios, não se constata

intromissão do poder público sobre as ações do CONSAD Iguatemi - MS. Entretanto,

segundo se percebeu na reunião da Diretoria, há uma exceção quanto ao que ocorre no

município de Japorã.

No que se refere ao CONSAD Iguatemi - MS, não há uma centralização

organizacional. Os fóruns que deveriam ser realizados trimestralmente, conforme rege

seu Estatuto (p. 04, Art. 15), não ocorrem desde o mês de março de 2011, quando da

posse da atual Presidente. E a reunião da qual o pesquisador teve acesso e participou, foi

uma reunião da Diretoria Executiva, no dia 20 de dezembro de 2011.

Isso denota falta de articulação, organização e diálogo do Consórcio, fora o

descumprimento do Estatuto. Além da perda de legitimidade dos conselheiros, vez que

não estão participando do processo de controle e deliberação do CONSAD Iguatemi -

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101

MS – isto aceitando a plausibilidade de que, de fato, ocorra um processo de controle

social e deliberação por parte do Fórum.

Resulta que, em relação ao funcionamento do CONSAD Iguatemi, os

municípios tomam decisões isoladas quanto à gestão dos projetos e programas

implementados pelo Consórcio, sem nem ao menos ter um direcionamento geral. Esta

situação foi constatada na reunião da Diretoria Executiva, quando os representantes da

cidade de Japorã apresentaram ações, até então desconhecidas pelos demais

conselheiros.

As ações do município de Japorã são incentivadas pelo poder público municipal,

o que demonstra um diferencial quanto aos demais municípios do Consórcio. Se por um

lado seria o município em que se apresentariam problemas de cooptação por parte do

poder público, em que ocorrem interpolações da prefeitura, por outro, é o lugar onde há

maior mobilização e interação entre poder público e sociedade civil. Lembrando que,

parte dos representantes da sociedade civil deste município também tem vínculo

empregatício com a prefeitura.

Neste caso, especificamente, a cooptação se caracteriza como “benéfica”, pois

possibilita o desenvolvimento de ações consideradas de maior êxito dentro das ações

pulverizadas dos municípios do Consórcio. Também se pode atribuir tal fato ao

engajamento do prefeito do município, que mobiliza a prefeitura (com recursos

econômico e pessoal) para o desenvolvimento do projeto de malharia, instalado no

município, que integra o CONSAD Iguatemi - MS. Essa disponibilidade de recursos e

de pessoal não ocorre nos demais municípios.

Um fator interessante dentro da dinâmica da legitimidade dos conselheiros situa-

se no envolvimento ao longo do tempo, tanto do indivíduo quanto da organização que

representa. Praticamente todos os conselheiros abordados estão no CONSAD Iguatemi -

MS desde seu processo de fundação, exceto a entrevistada “D”, que faz parte do poder

público, e que se tornou conselheira a dois anos. E todas as organizações representadas

por estes conselheiros estão no CONSAD Iguatemi - MS desde o início.

Há duas preocupações quanto a esta questão. Demonstra a não rotatividade dos

conselheiros, e se existe, é baixa. Por um lado, a falta de renovação dos indivíduos

contribui para dar maior maturidade e experiência conselhista para o desempenho de

suas funções, como o controle, a organização e a proposição de políticas. Por outro,

inibi a existência da pluralidade. Se há problemas quanto ao cumprimento por parte dos

conselheiros de suas atribuições de fiscalizar, ponderar, propor, enfim, participar do

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102

processo exercendo o protagonismo que lhe é atribuído, então, certamente a falta de

rotatividade acarreta numa falha da estrutura conselhista de que foi provido o Fórum do

CONSAD Iguatemi48

.

A outra preocupação é quanto à não alternância das entidades integrantes do

Consórcio. O fato de serem sempre as mesmas inibe a entrada de novas ideias ou visões,

de novas contribuições, pois limita a pluralidade. Esta preocupação está presente em

Luchmann (2011), quando analisa tais condições e argumenta que a representação de

cada entidade está vinculada ao fato de que cada organização ter uma visão, um objetivo

e um papel do ponto de vista da representação de um grupo específico.

A alternância ou até mesmo ampliação do conjunto de organizações que

integram o Consórcio poderia ser benéfica, desde que apresentasse novas abordagens e

contribuições no âmbito das políticas propostas, e também no que tange à dinâmica

conselhista: processo deliberativo do Fórum do CONSAD, representatividade e

participação efetiva dos membros do conselho.

De Jesus (2006) argumenta que importantes segmentos sociais, com relação à

situação de segurança alimentar, foram excluídos do CONSAD Iguatemi - MS, e que

entidades com grande representatividade e abrangência foram incluídas, mas que, no

entanto, seus objetivos não contribuem muito do ponto de vista dos objetivos de gerar

processo de desenvolvimento, geração de emprego, renda e formação de capital social.

No primeiro caso, comunidades indígenas ficaram de fora, e na segunda, a Pastoral da

Criança e da Saúde integram o Consórcio.

Não se trata de dimensionar importância a determinado grupo, e sim, de

identificar qual teria mais potencial para contribuir para a orientação das decisões acerca

dos objetivos traçados pelo projeto e grupos que, necessariamente, devem ser alvos das

políticas do Consórcio, dado suas condições de insegurança alimentar.

Neste caso, no Estatuto do CONSAD Iguatemi há predominância de entidades

ligadas aos setores produtivos (11 entidades), seguido das entidades religiosas (6

entidades)49

e das associações de moradores (5 entidades). Assim, pode-se relativizar o

48

Problemas quanto ao não cumprimento, por parte dos conselheiros, de suas atribuições, remete à uma

discussão sobre a prestação de contas dos indivíduos para com as entidades que esse se faz representar. Miguel (2011) e Luchmann (2011) cunham o termo “responsabilização”, e atribuem a este um ponto

crucial quanto à representativade dos conselheiros frente à suas entidades. 49

As entidades categorizadas como outras associações têm relações com diversos setores segmentados,

que não conseguem, aparentemente, se unir entorno de uma temática. Lembrando que a “união” envolta

de uma temática se restringe à visão que dá origem à associação, e não à suas preferências por assuntos

debatidos no Fórum.

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103

peso dos setores, em tese, ligados ao objetivo de geração de emprego e renda, pois são

minorias.

QUADRO 04 - CLASSIFICAÇÃO DAS ENTIDADES CIVIS SEGUNDO A FINALIDADE DA

ASSOCIAÇÃO

Tipo de Organização Civil Nome da Organização

Associação de Moradores Altos da Glória

AMBJAQUE – Atlética dos moradores do bairro Jardim Aeroporto e

Conjunto Habitacional Quedas D’ Água

ASSOCIAÇÃO DE MORADORES UNIFIG – União dos Moradores Físicos de Iguatemi

Associação de Moradores da Vila Nova Amorila

ASSOMORÃ – Associação de Moradores do Conjunto Iporã

AHFE – Associação dos moradores do Distrito do Morumbi de Eldorado

COOPERSUL – Cooperativa dos Suínos de Itaquiraí

COOPISC – Cooperativa dos Piscicultores

Associação dos Agricultores do Assentamento Santa Renata

Associação dos Pequenos Produtores do Assentamento Guaçu

Associação dos Pequenos Produtores de Leite

ASSOCIAÇÕES LIGADAS

As ATIVIDADES PRODUTIVAS Associação dos Hortifrutigranjeiros

Associação dos pequenos produtores do Assentamento Floresta Branca

Associação Hortifrutigranjeiro de Eldorado

Associação de Produtores de Leite

Associação de Produtores Hortifrutigranjeiros

Associação dos Produtores do Assentamento Indianápolis

Sindicato dos Trabalhadores Rurais (Tacuru)

SINDICATO DOS

TRABALHADORES RURAIS Sindicato dos Trabalhadores Rurais (Paranhos)

Sindicato dos Trabalhadores rurais (Eldorado)

ASSOCIAÇÕES LIGADAS

À EDUCAÇÃO SIMTED

Escola Família Agrícola

Igreja Batista

Fraternidade Espírita Allan Kardec

Igreja Batista do Calvário

ASSOCIAÇÕES RELIGIOSAS Igreja Luterana

Paróquia Imaculada da Conceição

Pastoral da Família

Associação de Amigos da Vila Rosa

Rotary Club

Partido dos Trabalhadores

Associação de Dedicação Voluntária à Infância e Adolescência Casa de

Davi

Associação Radiofônica Cultural

OUTRAS ASSOCIAÇÕES Loja Maçônica Fraternidade e Justiça

Clube de Mães

Associação Reviver

Associação Boas Vindas da P. A Sul Bonito

SODEMA (Associação de Defesa do Meio Ambiente)

Lar São Francisco de Assis (Casa do Idoso)

Corporação dos Patrulheiros Mirins

Fonte: elaborado pelo autor com base no Estatuto do CONSAD de 2005.

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104

A percepção que se têm, através de entrevista com a Presidente do Consórcio, é

que não há uma espécie de “assentos fixos” das entidades, tanto é que ela aponta que

algumas entidades estaduais que integravam o Consórcio deixaram de fazer parte, e

foram desvinculadas por conta da não participação nos Fóruns. O mesmo ocorreu com

algumas prefeituras, que também deixaram de efetuar a contribuição financeira que lhes

eram atribuídas. Exemplos é a empresa estadual de extensão rural, a AGRAER, e as

cidades de Naviraí e de Itaquiraí.

No decorrer da reunião da Diretoria aventou-se a hipótese de afastamento de

mais um município que estava com a contribuição financeira atrasada, por alguns

meses. No caso dos municípios de Naviraí e de Itaquiraí, o desligamento foi devido à

devolução dos equipamentos do projeto de malharia que existia. A prefeitura e os

integrantes do CONSAD Iguatemi - MS destas cidades não viabilizaram o

aproveitamento das máquinas e dos equipamentos disponibilizados. Atualmente a

cidade de Iguatemi também passa por esse problema.

O fato de algumas cidades se desvincularem do Consórcio em razão do não

aproveitamento dos equipamentos demonstra preocupação quanto à atuação dos

conselheiros, com relação à perda de projetos. Isso mostra o não protagonismo da

sociedade civil em alguns municípios, e também, uma falha estrutural do programa

CONSAD.

O município fica de mãos atadas frente ao dirigente do poder público municipal,

pois se este não cumprir sua cota de contrapartida, ou mesmo não quiser dar destinação

aos equipamentos e máquinas, não há força institucional que obrigue que se cumpra a

vontade da sociedade civil, por exemplo. O processo deliberativo é debilitado quando se

pulveriza as decisões por município. Há uma contradição interna ao próprio mecanismo

de execução das ações pactudas: não há força institucionalizada que consiga fazer valer

a vontade soberana da maioria dos conselheiros quando o poder municipal se recusa a

cumprir as decisões tomadas.

As atribuições de cada município constam no Acordo de Programa que é

ratificado via protocolo de intenções. Seguindo o Guia do CONSAD e analisando o

Estatuto do CONSAD Iguatemi - MS, não se encontrou nenhuma condição que obrigue

ou responsabilize os municípios. O município, através de seu representante no Fórum,

autoriza a execução de determinada ação, mas no momento de executar esta ação, pode

se abster, e não é punido de outra forma, a não ser sua expulsão do Consórcio.

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105

Ora, tal mecanismo, no fundo, pune a população que deveria ser beneficiada.

Para a falta de responsabilização dos dirigentes municipais, nota-se uma brecha

institucional no acordo jurídico do Consórcio, pois a entidade se compromete a executar

políticas conjuntas e, no entanto, se abstém. Resta saber se cabem modificações nas

cláusulas do contrato ou se a natureza não especificada das ações do CONSAD é que

permite esta falha. Nos demais tipos de consórcios públicos, as ações na provisão de um

bem são específicas. No Estatuto do CONSAD Iguatemi – MS (p. 02), apenas se diz

“executar ações de segurança alimentar e nutricional e de promoção humana e

desenvolvimento local dos Municípios que o integram, mediante a prestação de serviços

públicos” 50

.

Quanto à representatividade, notou-se que os entrevistados normalmente levam

para o CONSAD Iguatemi - MS questões debatidas no âmbito de suas entidades.

Através do questionário observou que usam basicamente informativos, reuniões ou

conferências para criar um canal de diálogo com suas organizações de origem. Único

entrave a essa representatividade diz respeito ao efeito que essa ação pode exercer no

interior do CONSAD Iguatemi, vez que sendo entidades com objetivos dos mais

diversos, as questões levadas pelas organizações para o Consórcio podem ser

controversas.

Necessariamente, estas organizações devem tratar de ações específicas para a

contribuição do objetivo e das metas do próprio CONSAD. Se efetivamente, como

apontado pelos entrevistados, ocorre esse canal de comunicação demonstra-se haver,

potencialmente, sinergia entre as entidades e o CONSAD Iguatemi - MS, o que só traria

benefícios para a definição das metas e o alcance dos objetivos propostos. Entretanto,

dada a falta de projetos e as dificuldades de proporem novos projetos, de conseguirem

recursos e, até mesmo, de gerenciar os existentes, essa sinergia não existe ou não

funciona como poderia funcionar.

Tal aspecto se relaciona com a terceira e última linha da dimensão da

Composição: a qualificação. Não se pode expandir a amostra encontrada, mas se

contrapormos o resultado desta pesquisa com a literatura revisada, como Santos Júnior,

Azevedo e Ribeiro (2004) e Tonella (2003), vê-se similaridades. No CONDAD

50

Mesmo a definição de “contrato de programa” é frágil para obrigar que os municípios sejam

responsabilizados por não cumprirem com o acordado. Contrato de programa, de acordo com Di Pietro

(2005, p. 11): “... obrigações que um ente da Federação constitui para com outro ente da Federação ou

para com consórcio público no âmbito da gestão associada em que haja a prestação de serviços públicos

ou a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal ou de bens necessários à continuidade

dos serviços transferidos”.

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106

Iguatemi, dentre os entrevistados, tem-se um com especialização, dois graduados e dois

com ensino médio completo. Nas pesquisas apontadas pela literatura, há grande

participação nos conselhos de pessoas com alta escolaridade (ensino superior) à

escolaridade média (ensino médio).

Dada a região em que se encontra o CONSAD Iguatemi, região pobre e provida

de raras instituições de ensino superior (uma Universidade e uma Faculdade, que distam

até 200 km de alguns municípios), seria normal o padrão de qualificação encontrado na

reunião da Diretoria (cargos que aparentemente exigiriam mais dos ocupantes).

Entretanto, não é o esperado que tal padrão se repetisse para os demais conselheiros.

Em geral, a qualificação estaria relacionada às condições de deliberação no

Fórum, que atua como conselho gestor, e com as condições e capacidades para

formular, coordenar e fiscalizar as políticas e as ações efetuadas pelo Consórcio. No

entanto, embora os membros da Diretoria tenham alta escolaridade, esta não se tem

refletido dentro do que se espera, basta ver as considerações anteriormente abordadas

quanto à falta de projetos e as dificuldades de proporem novos projetos, conseguirem

recursos e gerenciar os existentes.

Mesmo com membros que realizaram cursos de qualificação voltados para

exercer a função de conselheiros, e a maioria ter participado de outras organizações, não

foi suficiente para promover melhoras nas atribuições conselhistas que o CONSAD

Iguatemi exige. Aventa-se com uma hipótese de que dada a situação peculiar do

CONSAD, a precariedade organizacional e a fragilidade institucional (de fazer valer as

decisões no âmbito de todos os municípios), a qualificação por si só, não tem condições

de exercer papel preponderante quanto às condições de deliberação do Fórum.

É necessário dotá-los, no quesito de qualificação, de capacitação para

participarem de processos participativos, de capacitação para entenderem os

mecanismos institucionais do funcionamento de um Consórcio, de instruí-los a

buscarem parcerias e financiamento para as ações do Consórcio e qualificá-los para

processos de gestão dos seus projetos.

4.3.2. Organização: funcionamento e interação

A dimensão da Organização compreende os temas funcionamento e interação.

Com relação ao funcionamento buscou-se analisar o modo como o Consórcio se

estruturou para operar como conselho e, eventualmente, seus pontos de

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107

estrangulamento. Para o tema interação focou-se na análise das relações existentes entre

os conselheiros, as entidades e os municípios que compõem o Consórcio.

O formato de estruturação, que permite a forma de funcionamento do CONSAD

Iguatemi - MS, se estrutura pela existência do Fórum (nível deliberativo máximo

definido pelo Guia do CONSAD), Diretoria Executiva (nível decisório gerencial) e

Conselho Fiscal (acompanhamento de contas), conforme Estatuto do CONSAD

Iguatemi (Art. 8, p. 3). O funcionamento do CONSAD deve pautar-se por essa

organização reproduzida em seu próprio estatuto, assim como pelas atribuições e

mecanismos estabelecidos por este.

Dentre as atribuições do Fórum, consta a deliberação em última instância sobre

as políticas, estratégias e o conteúdo do Plano de Ação do consórcio e a prestação de

contas, entre demais atribuições. O que chama atenção, não quanto à sua inserção no

Estatuto, mas sim quanto ao descumprimento, é a realização de Assembleia Geral

Ordinária, trimestralmente.

Outro apontamento importante, novamente fruto da observação do pesquisador,

foi da substituição da reunião do Fórum pela reunião da Diretoria Executiva. Pelo

Estatuto, a diretoria executiva é responsável pela supervisão e acompanhamento das

ações gerenciais e finalísticas do CONSAD Iguatemi. O presidente da diretoria

executiva é o responsável por dirigir o Fórum, sendo a escolha da diretoria executiva

feita pelo Fórum. Esta diretoria deve se reunir mensalmente, de acordo com o Estatuto

do CONSAD Iguatemi (Art. 20, p. 6).

A substituição do Fórum pela Diretoria Executiva abre precedente perigoso. Há

a supressão das atribuições do Fórum, perda da representação democrática, violação e

negligenciamento do Estatuto. Isto do ponto de vista normativo, da formalidade

estabelecida pelo Estatuto. Pelo lado da representação democrática e da existência de

um canal de participação da sociedade civil, se rompe com a possibilidade de controle

social da política pública, e isto, é uma das atribuições do Fórum, enquanto órgão de

deliberação máxima, uma instância deliberativa. Sem isto, não se permite o

empoderamento das ações locais pela sociedade civil.

Na reunião do qual o pesquisador participou, um dos assuntos levantados pela

Presidente foi que deveria se realizar mais reuniões da Diretoria Executiva, e esta

determinar as ações e orientações do CONSAD Iguatemi, ao invés de levar tudo ao

Fórum. A argumentação pautou-se sobre a falta de diálogos construtivos nas reuniões

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108

do Fórum, e que “não se decidia nada que era importante”, e outras questões de suma

importância acabavam ficando sem discussão e votação.

QUADRO 05 - ESTRUTURA DAS RESPOSTAS DA DIMENSÃO ORGANIZAÇÃO

Perguntas Entrevistado

A

Entrevistado

B

Entrevistado

C

Entrevistado

D

Entrevistado

E

Organização

Funcionamento *** *** *** *** ***

10) Qual o

principal entrave

para o

funcionamento do

conselho?

Falta de

capacitação dos

membros do

conselho; Falta de

comprometimento

com as decisões

tomadas; falta de

informação

Falta de

capacitação dos

membros do

conselho; Falta de

comprometimento

com as decisões

tomadas; Falta de

recursos

Falta de

comprometimento

com as decisões

tomadas; Falta de

recursos.

Falta de

comprometimento

com as decisões

tomadas; Falta de

recursos.

Falta de interesse

dos conselheiros

do setor

governamental;

Falta de recursos.

11) Existem

mecanismos de

acompanhamento

das decisões

tomadas?

Sim. Outros (não

especificou)

Sim.

Comunicado,

informativo.

Sim. Comissões

internas;

audiências

públicas abertas à

sociedade.

Sim. Comissões

internas;

audiências

públicas abertas à

sociedade.

Sim. Prestação

de contas ao

conselho;

Comissões

internas. 12) Qual a

regularidade

desses

mecanismos?

No Fórum do

CONSAD;

trimestrais

Quando ocorre

Fórum

Quando

necessário.

Quando

necessário.

Quando ocorre

Fórum.

Interação *** *** *** *** *** 13) Como é a sua

relação com as

outras entidades

que participam do

conselho do

CONSAD ou

com os outros

conselheiros?

Em trabalhos

conjuntos/apoio a

temas comuns

Em trabalhos

conjuntos/apoio a

temas comuns

Em trabalhos

conjuntos/apoio a

temas comuns

Em trabalhos

conjuntos/apoio a

temas comuns

Em trabalhos

conjuntos/apoio

a temas comuns

14) Você percebe

que existe

conselheiros de

maior

importância?

Quem são? Por

quê?

Conselheiros

governamentais

são mais visíveis

Não Não Não Sim. Sociedade

Civil

15) Como você

observa a relação

dos conselheiros

e dos municípios

aos quais

representam?

Estão de acordo

freqüentemente

Às vezes estão de

acordo Às vezes estão de

acordo

Às vezes estão de

acordo

Estão de acordo

frequentemente

16) Como você

observa, através

do conselho, a

relação entre os

municípios do

território que

forma o

CONSAD?

Relação de

apoio/cooperação Nenhuma relação

Relação de

apoio/cooperação

Relação de

apoio/cooperação

Relação de

apoio/cooperação

17) Através do

conselho você

observa alguma

sobreposição de

um município

sobre os demais?

Não Não Não Não Não

Fonte: dados da pesquisa.

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109

Ora, independente das obstruções que ocorriam/ocorreram nos Fóruns, usurpar-

lhe seu poder, sua prerrogativa de deliberação, não é admissível, nem sobre a premissa

de dar maior efetividade ao sistema. O que se pode tentar é melhorar o sistema

participativo, qualificando e orientando os conselheiros. Quanto à pauta levantada, não

deve ser colocada pela reunião da diretoria executiva, vez que está para além de suas

atribuições estatutárias. Cabe ao Fórum deliberar sobre o Regimento Interno.

Não estava ocorrendo nem reuniões da Diretoria Executiva (mensais), e nem a

convocação de Fórum (atribuição do presidente da diretoria executiva) que deve ser

feito trimestralmente. A impressão que passa é que a desarticulação, a baixa

organização e quase ausência de institucionalidade do CONSAD Iguatemi - MS, o leva

a graves problemas de funcionamento. Dito isto, passa-se a analisar agora através da

percepção dos questionários como anda o funcionamento do Consórcio.

Perguntou-se qual o principal entrave para o funcionamento do Fórum, através

de pergunta fechada, mas podendo ser assinalada mais de uma opção. A maioria

respondeu “falta de comprometimento com as decisões tomadas”, seguida da “falta de

recursos” e de “falta de capacitação dos membros do conselho”. Esta última foi

abordada no item relativo à qualificação dos conselheiros, em que se dimensionou o

grau de escolaridade e sua influência no processo de deliberação como um todo.

Cabe salientar que a qualificação, mesmo sendo relativamente alta quando se

depara com o grau de formação dos conselheiros entrevistados, pode ser um ponto de

entrave para o próprio processo de acompanhamento e participação dos indivíduos nas

decisões tomadas. O nível educacional não necessariamente garante o “saber” para

contribuir com o processo deliberativo.

O fator falta de recursos também impõe sérios entraves ao funcionamento do

CONSAD Iguatemi - MS. A não existência de fontes de recursos, facilmente acessíveis,

e as obstruções de natureza técnica ou mesmo jurídica impedem melhor funcionamento

do Consórcio. A principal origem de recursos para o CONSAD Iguatemi - MS é via o

projeto de malharias financiado pela Petrobrás. Da mesma forma, a principal fonte

acaba sendo editais públicos ou privados.

A carência de qualificação dos membros atua como obstáculo para a busca

desses recursos, fato relatado nos questionários aplicados, e pela presidente. A questão

da qualificação está para além da formação escolar, por isso é importante considerar a

necessidade de conselheiros (ou mesmo funcionários cedidos ao CONSAD Iguatemi –

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110

MS) capazes de exercer as atribuições discutidas, além de terem condições gerenciais

sobre os projetos existentes.

Quanto à falta de comprometimento com as decisões tomadas, apontada como

principal entrave, foi demonstra claramente, bem como aludida a falta de mecanismos

ou institucionalidades capaz de fazer valer as deliberações feitas pelo Fórum. O que

vem emergindo como pano de fundo para os problemas encontrados.

Para a pergunta da existência de mecanismos de acompanhamento das decisões

tomadas, esperava-se descobrir sobre o funcionamento do processo de prestação de

contas e sobre a existência de canais de acompanhamento e responsabilização internos

no Consórcio. Com as respostas de que existiam esses mecanismos e eles se reduziam a

comissões internas ou a comunicados, percebeu-se o quão precário é esse canal, pautado

pela informalidade.

O entrevistado “E” ainda respondeu que esse mecanismo ocorria via prestação

de contas ao Fórum/conselho do CONSAD Iguatemi. Se assim fosse o ter-se-ia criado

um interessante, importante e institucionalizado canal de prestação de contas.

Entretanto, ante a ausência de reuniões do Fórum e da Diretoria Executiva, dificilmente

existe esse mecanismo, ou ele funciona raramente.

Para a pergunta relativa à regularidade desses mecanismos, todos remetem à

quando ocorre Fórum ou “quando necessário”. O “necessário” deveria ser sempre

quando se tem por obrigação, dado papel de conselheiro de fiscalizar e orientar as ações

do CONSAD Iguatemi. Entretanto, como não ocorrem Fóruns com a frequência

estabelecida pelo Estatuto do Consórcio, e nem reunião da diretoria executiva,

praticamente não existem tais mecanismos, e se existem, são precários e informais.

De acordo com Santos Júnior; Azevedo e Ribeiro (2004), esses mecanismos

dizem respeito à condição de efetividade do conselho, de sua possibilidade de afetar as

decisões tomadas pelo Consórcio.

Na discussão do tema interação, abordado por Teixeira e Tatagiba (2008), pode-

se chegar ao grau de deliberação - ou incidência, como estas autoras preferem, para

atenuar um possível “excesso de expectativas” quanto às condições de deliberação. O

grau e até mesmo a natureza destas interações é que dão a medida de incidência do

conselho sobre o resultado da política.

Ao perguntar qual a relação do entrevistado com as outras entidades que

participam do conselho do CONSAD ou com os outros conselheiros, todos, sem

exceção, responderam “em trabalhos conjuntos/apoio a temas comuns”. Isto indica

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111

sinergia entre os representantes, na busca por resolver questões de forma pactuada.

Porém, implicaria, não necessariamente, que tivessem compartilhando as mesmas

visões e interesses quanto aos assuntos tratados.

Quanto à existência de conselheiros de maior importância, se eles percebiam

dessa forma, a maioria afirma que não, enquanto que o entrevistado “A” considera que

os conselheiros governamentais tem maior visibilidade, já o entrevistado “E” considera

que os conselheiros da sociedade civil tem maior importância. Tradicionalmente, os

representantes do poder público se apresentam com maior “propriedade” e

“importância” nos assentos dos conselhos de políticas, seja pela proximidade das

esferas de execução das políticas, ou pela recusa de partilha de poder por parte do poder

público, como mostra a literatura51

.

Entretanto, como abordado nos quesitos legitimidade e representatividade, há

maior protagonismo da sociedade civil do que do poder público no CONSAD Iguatemi

- MS. Corrobora essa afirmação a ausência dos representantes do poder público e a não

ingerência destes na maioria dos municípios. Argumenta-se que essa não ingerência se

deve ao tamanho dos recursos envolvidos, relativamente pequeno e, também, quanto à

falta de perspectiva para a manipulação política dos projetos, vide o abandono do

Consórcio pelos municípios de Naviraí e Itaquiraí52

.

Pensando na dinâmica de distribuição destes recursos, o dinheiro, no caso das

malharias (único grande projeto em vigor) entra pela conta do CONSAD Iguatemi -

MS, já que provém de convênio feito, via edital, com a Petrobrás. O dinheiro não é

repassado às prefeituras, mas compram-se os equipamentos de forma centralizada e

depois os distribui para os beneficiários do projeto, previamente selecionados pelo

CONSAD e pelas prefeituras. Pode ocorrer interferências nos municípios, mas não no

âmbito das decisões do Fórum53

.

A ingerência dos municípios sobre as ações do CONSAD Iguatemi depende da

reafirmação da sociedade civil dentro do Fórum. Se ocorrer o esvaziamento da

51

Tatagiba (2002); Dagnino (2002). 52

Estes municípios abandonaram, segundo informação da Presidente do CONSAD Iguatemi, devido à

não aceitação de que a posso das máquinas do projeto malharia ficasse sobre o controle do CONSAD

Iguatemi. Por este motivo, a não posse, alegaram não ter benefício algum fazendo parte do Consórcio. 53

A fragilidade do ponto de vista da continuidade deste programa pode ser um fator preponderante

quanto à participação do poder público. Fora este projeto da Malharia, não há outros projetos em

andamento, e se não fosse este projeto, possivelmente o CONSAD Iguatemi estaria desamparado quanto à

execução de políticas. O caso do projeto PAIS, do MDS, que não se viabilizou pela recusa do governo

estadual de Mato Grosso do Sul a repassar a verba, foi um dos poucos projetos direcionados do governo

federal, que deveria ser o maior financiador desta política, porque era o maior incentivador e apoiador da

política, tanto que a criou.

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112

participação do poder público, como relatado através da ausência de alguns

representantes aos Fóruns, tem-se uma fragmentação do bloco do poder público,

diminuindo-se a dicotomia entre poder público e sociedade civil.

A dinâmica do Fórum do CONSAD Iguatemi, com representantes por

municípios, acaba por pulverizar a tradicional correlação de forças entre poder público e

sociedade civil, enfraquecendo também a sobreposição de poder por parte dos

municípios, quer dizer, a sociedade civil acaba por aparentar ter mais poder, e pode se

dizer que por conta dela conseguir congregar uma “identidade” e apresentar uma

unidade, mesmo atuando em municípios diferentes. Ao contrário do poder público que é

normalmente caracterizado como “município A” e “município B”. A sociedade civil, a

princípio, seria mais coesa, não dividida ou segmentada como o poder público.

Se atendo ao questionário, quando perguntado sobre a relação dos conselheiros

com os municípios que representam, as respostas mostraram sintonia entre os interesses

dos conselheiros e dos municípios, embora se espere que os conselherios tenham

independência quanto às decisões tomadas. Para observar a relação existente entre os

municípios que integram o Consórcio, perguntou-se qual a relação entre os municípios:

a maioria respondeu existir relação de apoio/cooperação, exceto a entrevistada “B” que

alega não haver nenhuma relação.

Na última questão, que envolveu a interação interrogou-se sobre a existência de

alguma sobreposição de um município sobre os demais. Preocupação presente desde o

início do projeto CONSAD, por conta da existência de disparidades econômicas e

sociais entre os municípios, como era o caso do município de Naviraí e de Ponta Porã.

Entretanto, dentro da percepção dos conselheiros, não há ocorrência deste fato, pois

foram unânimes em dizer que não existe sobreposição.

4.3.3. Dinâmica: formação da agenda, processo deliberativo e

impacto

Nesta dimensão tentou-se discutir alguns temas, como a formação da agenda, o

processo deliberativo (ou a tomada de decisão) e o impacto. Na formação de agenda

buscou-se analisar o processo de proposição dos temas tratados nas deliberações do

conselho. A literatura54

aborda amplamente como o controle sobre a pauta de reuniões é

54

Tatagiba (2002); Tonella (2003); Santos Júnior, Azevedo e Ribeiro (2004); Lorenzo (2008).

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113

usado enquanto mecanismo de exclusão de alguns temas e promoção de outros, ou

mesmo enquanto canal de exclusão de demandas de setores minoritários, ou de setores

da sociedade civil.

Quando se constata que há monopólio quanto à definição das pautas, rompe-se

uma pré-condição para o processo de deliberação dos conselhos, é deliberado aquilo que

consta na pauta, na agenda. Ao controlar a pauta, controla-se o conteúdo do que se

delibera.

No referencial dos Múltiplos Fluxos a agenda é definida como um conjunto de

preocupações dos formuladores de políticas que suscita soluções. Assim, a agenda passa

a ser o lócus da organização e orientação sobe o que se pretende fazer enquanto política,

isto é, ela é o ponto do qual se parte para analisar as ações do CONSAD Iguatemi - MS,

pois, pauta as decisões sobre as ações realizadas. Desse modo, explicar os

condicionantes da sua formação é o mesmo que explicar como as ações do Consórcio

foram tomadas55

.

A análise dos Múltiplos Fluxos considera que a agenda é formada pela junção de

três fluxos (problemas, soluções e político). Tentou-se observar a existência destes

fluxos para o CONSAD Iguatemi – MS. Primeiro fator a se considerar é sobre a

existência das três partes da agenda, como assinalado por Kingdon: a sistêmica, a

governamental e a decisional.

O referencial proposto por Kingdon aborda políticas empreendidas pelo governo

a nível Federal e, não apenas para um colegiado de agentes, tanto públicos como

privados, que se encontram numa esfera local. Deve-se ter claro que a dinâmica que

ocorreu na formação da Política de Segurança Alimentar, que culminou na criação dos

CONSADs, pode não ser a mesma encontrada num consórcio específico. A política

aqui, ou as ações empreendidas pelo CONSAD Iguatemi, não é, a priori, atribuição do

poder público representado por uma secretaria ou pasta, e sim, do Fórum. Este deve

envolver tanto poder público como sociedade civil em um espaço diferente56

.

55

Ao não ter acesso às atas do CONSAD Iguatemi, dificulta-se a análise a respeito do conteúdo das

pautas discutidas no Fórum do Consórcio. 56

Deve-se ter claro que os Conselhos Gestores estão inseridos dentro de estruturas administrativas, e se

constituem em espaços públicos, mesmo que dentro de órgãos públicos. O que concede ao Fórum do

CONSAD (ao funcionar como Conselho) um foro diferente é o fato de não funcionar sob a tutela de

nenhuma secretaria ou pasta dentro dos municípios ou do governo estadual – estes que são parte do

Estado que integram o Consórcio. Na realidade, o CONSAD se constitui em uma forma híbrida na

perspectiva dos Conselhos Gestores e também na concepção dos Consórcios Públicos, pois nem é

tutelado pelos poderes públicos e nem tem autonomia suficiente para agir como consórcios públicos

típicos.

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114

A busca de um “problema” a ser solucionado e as discussões quanto às

alternativas devem ocorrer de modo distinto, assim como as decisões políticas. Não há

aqui três tipos de agendas, ou melhor, a única agenda existente é a decisional, composta

das propostas sumariadas pelo Fórum.

O CONSAD Iguatemi nasceu estruturado a resolver um problema: o da ausência

de segurança alimentar no território. Esta condição inibiu a existência ou a “busca” por

um problema público, alterando, assim, a formação do primeiro fluxo de forma

autônoma dentro da dinâmica do CONSAD.

Por outro lado, deslocou a existência desse problema para novas esferas. Quanto

às políticas do Consórcio, quais ações foram escolhidas? Que segmentos foram

atendidos? Que projetos foram elaborados? Volta-se ao controle da agenda como ponto

crucial para direcionar essas questões, dado que se modifica a correlação (e a atuação)

de forças dentro do fluxo das alternativas.

Nos Múltiplos Fluxos a escolha de alternativas está intrinsecamente ligada à

definição do problema. Se o CONSAD é a resposta do governo para solucionar

determinado problema, então é sensato afirmar que o problema já é conhecido. Ao

admitir que o problema é conhecido e que o CONSAD é a solução para tal problema,

basta ver quais as atribuições do CONSAD Iguatemi - MS para se ter noção das

alternativas a serem executadas.

Segundo o Guia do CONSAD, que norteia o CONSAD enquanto política

pública, e também expressa as metas e objetivos desta política, as atribuições dos

CONSADs estariam em: “discutir, planejar, decidir e implantar ações voltadas para a

segurança alimentar e a melhoria das condições de vida das populações envolvidas” (p.

08). Além de “construções de bases sólidas que permitam à populações mais pobres

obterem trabalho e renda, além de viabilizar a produção familiar de alimentos, gerando

com isso um ambiente socioeconômico propício para a garantia de segurança alimentar”

(p. 09).

Através destes objetivos, propõem-se a induzir ações que incentivem o

desenvolvimento local, através da atuação em quatro áreas: a) formação de capital

social local; b) formação de capital humano local; c) agregação de valor nas cadeias

produtivas sub-regionais e; d) modernização do setor público local. Com o

fortalecimento destas áreas esperava-se compor um grande eixo de atuação dos

CONSADs, sendo tal eixo integrado pelo fortalecimento da agricultura familiar, da

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115

economia solidária, dos arranjos sócio-produtivos locais, além de gerar a inclusão

digital e o aumento do microcrédito (GUIA DO CONSAD, 2004, p. 10).

O Estatuto do CONSAD Iguatemi (p. 02) traz a seguinte perspectiva:

Art. 6º. Constituem objetivos básicos do CONSAD Iguatemi

I- Planejar e executar atividades destinadas a instituir e ampliar as ações de

segurança alimentar e nutricional e de promoção humana e desenvolvimento

local dos Municípios que o integram, mediante a prestação de serviços

públicos ou o incentivo às atividades de outras entidades, buscando atuar em

cooperação com os demais entes públicos e privados, mediante a celebração

de parcerias;

O Estatuto do CONSAD Iguatemi não aborda de forma direta as atribuições que

o Guia do CONSAD lhe delega. No entanto, tal Estatuto é compatível com o modelo

sugerido pelo Guia do CONSAD. O problema não se encontra em listar todas aquelas

atribuições no Estatuto, e sim, em garantir que estes objetivos se transformem em metas

a serem alcançadas pelos CONSADs em geral.

Voltando ao processo de escolhas de alternativas, e atendo-se à lógica do modelo

de Múltiplos Fluxos, existiria dentro do CONSAD Iguatemi a mesma dinâmica quanto

ao processo de escolha das alternativas, só mudando o fato de se ter previamente

diretrizes básicas a serem seguidas. Entretanto, tais diretrizes abrem um leque de opções

a serem discutidas, formuladas e implementadas.

Da escolha de alternativas no âmbito do modelo de Múltiplos Fluxos para o

momento de escolhas dentro do Fórum do CONSAD Iguatemi, verificou-se

deslocamentos quanto aos agentes que atuam nesse processo. Dado que devem se inserir

dentro de propostas, cujos eixos foram previamente estabelecidos.

Por exemplo, a disputa entre soluções para a agricultura familiar, ou mesmo para

o fortalecimento das cadeias produtivas sub-regionais estaria entorno de se incentivar a

produção de leite, de mandioca ou de mel. As decisões deveriam estar voltadas para a

valorização das cadeias produtivas sub-regionais e/ou a agricultura familiar, conforme

Guia do CONSAD.

Do ponto de vista das disputas políticas e da correlação de forças, são as

preferências dos setores, melhores articulados que levam vantagem. Para De Jesus

(2006), a marcante presença de projetos “agraristas” deixava de lado diversas outras

iniciativas, como as voltadas para o urbano, por exemplo.

Obviamente, quando algum segmento era excluído de ser representando, suas

possíveis contribuições também foram deixadas de lado, acarretando, desse modo, até

mesmo sua exclusão enquanto beneficiários das ações efetuadas pelo Fórum.

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116

O fluxo político abrangeu a dimensão da política propriamente dita, isto é, os

conflitos e negociações que envolveram processos de barganha, ante a escolha de uma

alternativa. Este fluxo ocorreu através de dinâmica própria, sem ter conexão com os

demais fluxos. Esta dinâmica se relaciona com o “clima” ou “humor nacional”, ante as

forças políticas organizadas e as mudanças de cargos ou secretarias no interior dos

governos.

A dimensão política está presente na dinâmica do Fórum do CONSAD Iguatemi

– MS com nuances diferentes. O “humor nacional” deve ser aproximado como uma

espécie de termômetro do “humor” ou “clima da população local”, e evidentemente os

conselheiros teriam que respaldar essa vontade. O ponto emblemático é quanto à ideia

de que esse “clima” não se trata da opinião da população como um todo, e sim de

setores mais “representativos”, com acesso à mídia, por exemplo, a ponto de conseguir

expressar sua vontade (ou humor) como vontade do povo, como no modelo de Kingdon.

Para que o “humor local” tenha impacto nas ações ou formulações de políticas

do CONSAD Iguatemi, há de considerar se as ações do CONSAD, assim como sua

existência, são bem difundidas entre a população residente no território. Pois, não

havendo ciência das ações ou do papel deste, o “clima local” deixa de existir ou passa a

ter impacto reduzido.

Necessário, também, que esse clima seja o mesmo emitido tanto pela população

de um município quanto de outros. Pois, pouco adianta influenciar apenas os

conselheiros de um determinado município, sendo que as deliberações do Fórum são

tomadas pela maioria, e isto inclui os conselheiros dos seis municípios que integram o

CONSAD Iguatemi.

O papel das forças políticas reflete o processo de barganha presente em qualquer

estrutura de poder. Este papel reforça o conflito quanto à representatividade, a

legitimação e os processos de cooptação. Mas aqui, a cooptação não deve ser observada

somente em relação ao poder público, e sim, em relação às vozes de grupos melhores

estruturados.

Aqueles grupos com amplo acesso ao poder local, grupos tradicionais com

acesso aos recursos públicos, com proximidade ao poder ou mesmo aqueles com

história ou experiências participativas, se sobressaíam frente aos grupos menos

organizados e excluídos. Com isso, acabam “conquistando” legitimidade para promover

ou vetar ideias. Considerando a estrutura do CONSAD aqueles grupos melhor

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117

organizados agem através do discurso e tentam advogar entorno de uma ideia, tentando

influenciar os demais setores a votarem com eles.

Pela diversidade existente com relação às entidades congregadas no Consórcio,

admite-se que várias são as ideias, os planos e os projetos que podem ser sugeridos

enquanto propostas de ações efetuadas pelo Fórum.

Mesmo que as ações devam estar voltadas para projetos de geração de emprego

e renda têm-se entidades que representam piscicultores, apicultores, produtores de leite,

movimentos urbanos como associação de moradores, produtores de suínos e etc. Cada

grupo, e seria legítimo isto, tenta promover ações que beneficiem sua atividade, por

exemplo.

QUADRO 06 - ESTRUTURA DAS RESPOSTAS DA DIMENSÃO DINÂMICA

Perguntas Entrevistado

A

Entrevistado

B

Entrevistado

C

Entrevistado

D

Entrevistado

E

Dinâmica

Formação da

Agenda *** *** *** *** ***

18) Quem proprõe

os temas/pauta das

reuniões?

Comissão

executiva/diretoria

Comissão

executiva/diretoria

Presidente do

conselho

Presidente do

conselho

Comissão

executiva/diretoria

19) As políticas

executadas pelo

CONSAD estão de

acordo com os

princípios

orientadores sobre

Segurança Alimentar

e Desenvolvimento

Local?

Sim. Formação de

capital social

local; agregação

de valor nas

cadeias produtivas

sub-regionais.

Sim. Formação de

capital social

local.

Agregação de

valor nas

cadeias

produtivas sub-

regionais

Agregação de

valor nas

cadeias

produtivas sub-

regionais

Sim. Formação de

capital social

local; agregação

de valor nas

cadeias produtivas

sub-regionais.

20) As políticas

executadas pelo

CONSAD estão de

acordo com as ações

orientadoras sobre

Segurança Alimentar

e Desenvolvimento

Local?

Sim. Agricultura

familiar;

economia

solidária; arranjos

sócio-produtivos

locais.

Sim. Agricultura

familiar.

Sim. Arranjos

sócio-

produtivos

locais

Sim. Arranjos

sócio-

produtivos

locais

Sim. Agricultura

familiar; Inclusão

digital; Economia

solidária; arranjos

sócio-produtivos

Processo

deliberativo *** *** *** *** ***

21) Qual o processo

de aprovação das

propostas?

Houve posições

divergentes e

votações em

menos da metade

das propostas

Todas foram

aprovadas com

posições

divergentes e

votações

Todas foram

aprovadas com

posições

divergentes e

votações

Todas foram

aprovadas com

posições

divergentes e

votações

Consenso.

22) Você considera

que as

discussões/propostas

do conselho do

CONSAD estão de

acordo com o seu

ponto de vista ou o

ponto de vista da

Sim Sim Sim Sim Sim

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118

organização/entidade

que você representa?

23) Há fornecimento

de informações por

parte do CONSAD

para a tomada de

decisão dos

conselheiros?

Sim. Baixo Sim. Baixo Sim. Médio Sim. Médio Sim. Alto

24) Qual o grau de

acessibilidade dessas

informações?

Baixo Médio Médio Médio Ato

25) Qual a natureza

dessas informações? Adequadas Adequadas Adequadas Adequadas Adequadas

26) Qual a

quantidade dessas

informações?

Baixa Baixa Baixa Baixa Baixa

Impacto *** *** *** *** *** 27) Qual o impacto

das políticas

executadas pelo

CONSAD na região?

Médio Baixo Médio Médio Alto

28) A que você

atribui o impacto

dessas políticas?

(listar até 3)

Forma como

foram formuladas;

forma como foram

implementadas; a

obtenção de

parcerias na

execução.

Forma como

foram

implementadas.

Forma como

foram

implementadas;

a obtenção de

parcerias na

execução.

Forma como

foram

implementadas;

a obtenção de

parcerias na

execução.

Forma como

foram

implementadas;

existência de

parcerias/apoio

das prefeituras.

29) Qual a

importância que

você atribui ao

CONSAD quanto ao

desenvolvimento

local da região?

Médio Médio Médio Médio Alta

30) Com relação ao

poder público

municipal, como

você observa a sua

participação no

consórcio com

relação à execução

das políticas

elaboradas pelo

conselho?

Pouca disposição Pouca disposição Pouca

disposição

Pouca

disposição Muita disposição

Fonte: dados da pesquisa.

As mudanças no interior do próprio governo, considerado o terceiro eixo que

afeta o fluxo político, também sofre outra conotação no plano do CONSAD. No modelo

de Kingdon, mudanças no quadro administrativo, nos ministérios, legislativo, executivo,

enfim, potencializam processos de mudanças. Para o CONSAD, levando em conta o

caso de Japorã, em que o prefeito se torna um forte aliado das ações do CONSAD

Iguatemi - MS dentro de seu município, e os casos em que os prefeitos abandonaram o

Consórcio (Naviraí e Itaquiraí), pode-se aceitar que as mudanças no executivo

potencializam o desenvolvimento das ações do Consórcio.

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A mudança do quadro interno de representação do Fórum talvez seja o fator que

possa provocar maior mudança e incentivar o surgimento do fluxo político. A troca de

Presidência, eleição de nova Diretoria Executiva, participação de novas entidades e

conselheiros tem potencial para promover mudanças. Resta saber, que condições

provocam o encontro dos fluxos dentro da dinâmica do CONSAD Iguatemi – MS?

Quanto aos resultados obtidos através do questionário aplicado, no tema

Formação da Agenda, perguntou-se “quem propõe os temas/pauta das reuniões?”. A

intenção era localizar mecanismos de obstruções, fossem normativos ou informais. Na

formação da agenda verificou-se que a pauta era proposta pela Diretoria Executiva ou

pelo presidente do Consórcio.

Vê-se obstrução quanto ao processo democrático diante da não participação

ativa dos conselheiros neste processo e ausência de controle social sobre a política. Para

frisar isso de outra forma, na pergunta em questão, havia também a alternativa

“qualquer membro do conselho”, justamente para verificar o processo democrático no

que se refere a este tema.

É certo que não se pode admitir este domínio da diretoria executiva ou da

presidência sobre a pauta, como uma ação direcionada, com a finalidade de obstrução

intencional. Este fato pode ocorrer devido ausência de conhecimento sobre as

atribuições, deveres, possibilidade e competência que cada conselheiro pode assumir

dentro do conselho. Talvez possa se atribuir à ausência de experiências participativas.

Entretanto, não se justifica a obstrução de um meio que se propõe garantir maior

participação e controle social sobre a política, nem mesmo se for pra atingir maior

efetividade das ações. Uma proposição adequada é a de melhorar o sistema

participativo, organizando comissões para temas, grupos de trabalhos, a fim de melhorar

a funcionalidade do Conselho.

Considerando as diretrizes propostas para as ações do CONSAD, tentou-se

identificar como era composta a pauta do CONSAD Iguatemi. Sobre os princípios e as

ações para as quais o CONSAD estava voltado, identificou-se para a formação de

capital social local, fortalecimento de arranjos sócio-produtivos locais e, a agregação de

valor das cadeias produtivas sub-regionais e agricultura familiar.

Tentou-se dimensionar o grau de conflito existente com relação às decisões

tomadas, embora se espere que o espaço propiciado pelos conselhos nos remeta a um

espaço de negociação e busca pelo consenso, também é esperado que existissem

divergências.

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Sobre o processo de aprovação das propostas, obteve-se pela maioria (três dos

cinco entrevistados) que “todas as propostas foram aprovadas com posições divergentes

e votações”, outro salienta que “houve posições divergentes e votações em menos da

metade das propostas”, o último argumenta que sempre há consenso. Quanto ao

consenso, sempre é esperado, embora não signifique que deixe de existir posições

divergentes apenas porque no fim, se buscou o consenso.

As demais posições refletem o diálogo e a troca de ideias. A confrontação de

propostas contribui para o aprofundamento e aperfeiçoamento de processos

democráticos e tem potencial para melhorar a efetividade das ações executadas pelo

Consórcio. Perguntou-se também se as discussões ou propostas do Conselho do

CONSAD Iguatemi estão/estavam de acordo com o ponto de vista do conselheiro ou da

entidade ao qual ele representa, tentou-se levantar os conflitos existentes.

Não se encontrou nenhum grau de conflito. Os conselheiros foram unânimes em

dizer que as discussões ou propostas do conselho do CONSAD Iguatemi estavam de

acordo com seu ponto de vista ou do ponto de vista da entidade que ele diz representar.

Portanto, ou não existem conflitos ou estes estão sendo suprimidos/silenciados.

Os conflitos não apareceram, segundo a percepção dos entrevistados. Quais os

motivos para tal? A partir de Miguel (2011), tem-se uma consideração importante: a

presença de grupos excluídos ou subalternizados nos espaços decisórios não garante sua

participação e sua voz e, muitas vezes, estes espaços reproduzem formas de exclusão,

pois se constituem em um espaço social que acabam estruturando práticas e discursos

daqueles que nele adentram.

Desse modo, o espaço decisório do Fórum promove um enquadramento das

vozes e supre as vozes dissonantes, tirando a autenticidade dos discursos dos excluídos.

Estes, ao não terem voz, se limitam a escolher entre as propostas ofertadas por grupos

dominantes, diminuindo o ganho democrático de se ter pluralidade dentro dos

representantes do Fórum.

Para a tomada de decisão, se faz necessário o acesso as mais variadas formas de

informações e documentos, pois não se pode ter um bom processo de deliberação sem

ter conhecimento sobre o que se delibera, ou sobre o espaço sobre o qual se pretende

atuar. Desse modo, investigou-se sobre o processo de fornecimento de informações,

acessibilidade e adequação destas. Constatou-se a existência das informações, de baixo

a médio grau, assim como a acessibilidade. Tais informações foram consideradas

adequadas, embora de baixa a média com relação à quantidade delas.

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Com informações adequadas, com médio grau de acessibilidade e em média

quantidade é de se supor que a condição de deliberação não é boa. Entretanto, mesmo

que se tenham acesso e condições de se tomar boas decisões, através de um conjunto de

informações, é necessário ter condições de processar tais informações, ao mesmo

tempo, e conseguir ter voz dentro da dinâmica do Fórum.

Com relação ao impacto do CONSAD Iguatemi nas políticas executadas pelo

CONSAD na região, foram consideradas de médio impacto. Sendo este impacto

atribuído à forma como foram implementadas as políticas, muitas vezes através da

obtenção de parcerias.

Traçando um paralelo entre esta colocação sobre o impacto das ações serem de

médio alcance, vê-se o quão insuficientes são as parcerias das prefeituras. O alcance não

foi maior justamente pela ausência das prefeituras nesse processo.

Em meio aos desafios apresentados, desarticulação e a baixa organização, o

CONSAD Iguatemi - MS demonstra grandes possibilidades do ponto de vista da

participação social e da deliberação das ações efetuadas pelo programa. Olhando para

alguns dos resultados do Consórcio, e tendo em mente que o propósito desta dissertação

não foi mensurá-los, um impacto aceitável pode ser explicitado, dado todas as restrições

e entraves encontrados.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O surgimento dos Consórcios de Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local

(CONSAD), e sua institucionalização no contexto da PNSAN, está atrelado à figuração

da fome enquanto problema público. Os fatores que o posicionaram na ótica de uma

política pública, vinculam-se à necessidade de uma abordagem holística do problema da

segurança alimentar. O enfrentamento de tal problema depende de uma política que

concilie ações estruturais, específicas e locais. O CONSAD pauta-se, precisamente, na

ideia de ação estrutural, voltada para as especificidades de cada região em que se

instala.

Através do modelo de Múltiplos Fluxos demonstrou-se o processo de construção

da entrada da Fome na Agenda Pública (sistêmica) a partir de 1946, com a obra

“Geografia da Fome” de Josué de Castro, que colocou a fome em outra categoria que

não a de fenômeno natural e sim, como fenômeno social.

Ao denunciar a fome como resultado de um processo histórico excludente e do

descaso produzido pelas políticas de desenvolvimento, que só agravaram o processo de

exclusão, Josué de Castro colocou na Agenda Governamental a necessidade de políticas

de combate à fome. Este foi basicamente o Fluxo de Problemas, representado pela

emergência do tema Fome no cenário político brasileiro.

Embora a citada obra tenha trazido importantes considerações a respeito do

problema da fome, bem como de seus efeitos maléficos que corroem a estrutura social

brasileira, por muitas décadas esse problema foi incapaz de mobilizar as forças políticas

necessárias para enfrentá-lo. No contexto das políticas executadas, não se conseguiu

sequer atenuar seus efeitos.

Este processo, considerado como o Fluxo de Alternativas, capitaneado pelas

políticas de combate à fome, foi marcado, num primeiro momento, por propostas de

educação alimentar, adequação técnica das indústrias e da agricultura, sem preconizar

ações que representasse transformações econômico-sociais. Há de se ressaltar que Josué

de Castro havia apontado a necessidade de mudanças sociais e estruturais!

As políticas brasileiras voltadas para o combate à fome, agora tratada a partir do

conceito de Segurança Alimentar, estiveram atreladas às recomendações e parâmetros

emitidos pelos organismos internacionais, como o Banco Mundial e a FAO. Após 1996,

depois da Cúpula +5, quando da realização de um balanço das ações efetuadas contra a

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fome em nível mundial, foi apontado que a resolução ou atenuação do problema estaria

vinculada a uma “vontade política”, ou seja, a falta de vontade política por parte dos

governantes é responsável pela ausência de avanço nos resultados esperados quanto ao

combate do problema.

Esta colocação abriu um precedente para o seguinte entendimento: para se

resolver o problema da Fome através de uma política pública é necessária tal “vontade

política”. De modo que os governos devem assumir de vez a responsabilidade de

reverter uma estrutura econômico-social excludente, apontando para novas práticas de

desenvolvimento econômico.

Com a evolução do conceito de segurança alimentar surge, também, a

necessidade de políticas com escopo mais abrangentes, tanto nos objetivos a serem

alcançados, no público a ser atingido, como na estrutura de política a ser adotada. Para

pensar política de segurança alimentar abrangente, é preciso incorporar a garantia do

acesso, a regularidade, a quantidade suficiente e a qualidade dos alimentos.

Nesse lastro estão sendo tematizados as propostas de políticas para a segurança

alimentar no Brasil, a partir de 1985. Com a constatação do Ministério da Agricultura

(em 1985) de que a fome era problema a ser resolvido desde que se considerando

aspectos além do setor agrícola, além da atuação de movimentos político-sociais. Como

o Governo Paralelo (1991) observou-se a construção do Fluxo Político.

Através da publicação do Mapa da Fome (1993) teve-se a emergência

(renascimento) da fome enquanto problema público através de uma espécie de

indicador que demonstra a gravidade de uma situação social, que tomou o aspecto de

crise social na sociedade brasileira. Aqui, imposta destacar o papel da mídia como

participante ativo e no dimensionamento da crise que o tema abrangia. No contexto dos

participantes que atuaram no fluxo de problemas, tiveram-se os movimentos sociais

convergindo para a “Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e Pela Vida”.

Nesse período deu-se a criação do CONSEA (1993), ao qual se atribuiu a

consolidação da Segurança Alimentar na agenda política brasileira. O CONSEA

congregou a ideia de integração intersetorial das políticas, verticalmente ou

horizontalmente (entre ministérios ou entre esferas governamentais - federal, estaduais e

municipais). Representou também a integração entre governo e sociedade civil na

proposição e execução de políticas de combate a fome, comprometendo-se com a

prática da gestão compartilhada, característica que foi levada para a experiência do

CONSAD.

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Fechando o recorte teórico, chegou-se na convergência dos fluxos, com a

chamada “vontade política”. No processo de convergência dos fluxos ocorreram

momentos propícios para mudanças. A convergência ocorreu quando o problema

público (a fome) gerado pelo fluxo de problemas encontrou uma solução disponível

(uma PNSAN materializada inicialmente pelo programa Fome Zero) emergida do fluxo

de soluções, entrelaçou-se com condições políticas que propiciaram essa ocorrência

(eleição de Luis Inácio Lula da Silva à presidente da república).

Essa convergência ocorreu mediante a janela de oportunidade, aberta pela troca

de presidentes (entrada de Lula) alimentada pela ação de um empreendedor político e de

um “clima nacional” entorno da ideia de combate à fome.

O Fome Zero teve como objetivo principal propor um conjunto integrado de

políticas que visassem a garantia da segurança alimentar, tentava-se enfrentar as causas

estruturais da fome. Com essa finalidade, articularam-se políticas estruturais e

emergenciais. Estes elementos deram origem a políticas que enxergaram na geração de

emprego e renda formas de aumentar a demanda efetiva e, ao mesmo tempo, incentivar

a produção de pequenos produtores, produzindo alimentos mais baratos e aumentando a

oferta de alimentos.

Do Fome Zero procedeu-se à criação dos CONSADs, uma política territorial

com vistas a atenuar os problema da insegurança alimentar através do incentivo ao

desenvolvimento local, pela ótica da geração de emprego e renda.

Os CONSADs se apresentam, no campo das políticas públicas, com um desenho

institucional diferenciado: o de ser um consórcio público e adotar o funcionamento de

um conselho gestor. Mediante este desenho institucional tem-se implementado a

Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional de modo descentralizado, e com

a intenção de que seja democrática.

A execução da PNSAN, do ponto de vista dos CONSAD, tem sua eficácia e

efetividade relacionada às condições de funcionamento e organização do Fórum

(conselho). Isto significa que as condições de deliberação (proposição de políticas) do

Fórum (conselho) é que dirigem o CONSAD, porque torna possível a gestão do

programa e, consequentemente, o alcance dos objetivos estipulados.

Ao atentar-se para estrutura de um consórcio público, é de se questionar se o

CONSAD consegue cumprir com a função de completar o processo de descentralização

de políticas públicas. No caso analisado, observou-se uma fragilidade financeira do

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CONSAD Iguatemi - MS. Esta advinda de alguns fatores limitadores da própria

estrutura imposta pelo desenho institucional do programa.

Consórcios públicos só celebram convênios com a União se forem de direito

público. Como os CONSADs são de direito privado e se constituem mediante

associações civis, eles não recebem recursos diretamente da União. Logo, para receber

tais recursos, é necessário que a parceria seja intermediada pelo governo estadual, o que

para o CONSAD Iguatemi - MS não teve muito sucesso, haja vista o não

direcionamento dos recursos da Produção Agroecológica Integrada e Sustentável

(PAIS) para o Consórcio. Dinheiro que acabou retornando aos cofres públicos sem ser

destinado para seus propósitos.

A alternativa de captação de recursos, via editais de empresas, fundações,

depende de capacitação para tal fim, e isto é um grande entrave. Assim, a solução deve

ser a transformação dos CONSADs em direito público, criando uma associação pública.

No entanto, tal transformação implica em excluir o papel de interferência da sociedade

civil desse programa, o que se choca com um dos pilares da própria Política Nacional de

Segurança Alimentar e Nutricional.

Ao delegar ao próprio Consórcio a tarefa de gerar fundos, seja via os entes

integrantes ou via financiamento de projetos, fica-se limitado às captações e

capacidades financeiras e técnicas dos entes consorciados. Os municípios são na

maioria, pobres, com altos índices de pobreza, exclusão social e baixo poder de

financiamento de políticas, tanto é que exatamente por estes motivos eles integram o

programa do CONSAD. Quanto às capacitações técnicas: esbarra-se no grau de

qualificação profissional encontrado no CONSAD Iguatemi – MS no qual se têm

poucas propostas e projetos, além das grandes dificuldades de gestão dos projetos em

andamento.

Assim, o alcance dos objetivos do CONSAD Iguatemi - MS fica sujeito às

restrições operacionais, vinculadas à falta de recursos. Além do mais, esta não é a única

condição que limita o impacto do CONSAD, enquanto programa de governo. Suas

ações também se restringem por conta dos problemas organizacionais encontrados.

Estes se baseiam em duas coisas. A primeira é a falta de experiência e qualificação dos

conselheiros para assumirem funções de controle e proposição de políticas no Fórum.

Além da falta de efetividade da atuação dos membros do CONSAD Iguatemi - MS,

verificada pela ausência prolongada de Fóruns, num claro descumprimento do Estatuto.

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Se a qualificação se relaciona com as condições de deliberação do Fórum, ante

as condições e capacidades para formular, coordenar e fiscalizar as políticas e as ações

efetuadas pelo Consórcio, então ela deve ser considerada um dos problemas chaves do

CONSAD Iguatemi - MS.

Com relação ao funcionamento do Consórcio não há uma centralidade das

decisões quanto aos projetos em andamento, cada município toma as decisões isoladas

quanto à gestão dos projetos e programas. Ora, para que então a figura de um consórcio

público? A gestão dos bens ou serviços não deveria ser pensada e planejada em

conjunto?

No CONSAD Iguatemi - MS, não existe interlocução entre as esferas públicas

dos entes consorciados. Tampouco parece haver articulação ou diálogo entre as demais

entidades. Isto se observa pela baixa organização e coordenação de ações do programa,

em que cada município cria seus próprios critérios de ação. Essa ausência de

organização social é um dos pontos fracos desta experiência de Consórcio.

É necessário dotá-lo, no quesito de qualificação, de capacitação para os

processos participativos, de capacitação para entender os mecanismos institucionais do

funcionamento de um Consórcio, de instruí-lo para buscar parcerias e financiamento

para as ações do Consórcio. Ou seja: qualificá-lo para os processos de gestão dos

projetos.

A substituição da reunião do Fórum pela da Diretoria Executiva leva à supressão

das atribuições do Fórum, perda da representação democrática e a violação e

negligenciamento do Estatuto. Rompe-se com a possibilidade de controle social da

política pública. Não se permite o empoderamento da sociedade civil no caso estudado

está desarticulada e com baixa organização.

A falta de mecanismos ou institucionalidade capaz de fazer valer as deliberações

do Fórum aponta para outro ponto fraco: impede-se que o Fórum funcione efetivamente

como conselho gestor. Logo o município fica imobilizado pelo poder público municipal.

Se este não cumprir sua parte no Acordo de Programa não há mecanismo institucional

que o obrigue a cumprir a vontade da sociedade civil.

Não há força institucionalizada que consiga fazer valer a vontade soberana da

maioria dos conselheiros quando o poder público municipal se recusa a cumprir as

decisões tomadas. Este ponto talvez venha a ser um dos mais emblemáticos do ponto de

vista do desenho institucional do CONSAD e de seu potencial de descentralização de

políticas.

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O que transparece é que a desarticulação, a baixa organização e quase ausência

de institucionalidade do CONSAD Iguatemi - MS, o leva a graves problemas de

funcionamento. A dinâmica do Fórum do CONSAD Iguatemi - MS acaba por pulverizar

a tradicional correlação de forças entre poder público e sociedade civil, culminando na

sobreposição do poder público. Todavia, a sociedade civil, quando organizada tem

potencial para ação mais coesa.

Não obstante aos desafios apresentados, o CONSAD Iguatemi - MS apresenta

grandes possibilidades do ponto de vista da participação social e do controle das ações

efetuadas pelo programa. Observando-se alguns dos resultados do Consórcio, embora

esta dissertação não tenha buscado mensurá-los, tem-se explicitado um impacto

aceitável, dado todas as restrições e entraves encontrados.

A análise empreendida nesta dissertação visou criticar o Programa na

perspectiva de suscitar aprendizados, necessários ao aperfeiçoamento do processo de

implementação e avaliação de uma política inovadora e, portanto, diferenciada, como o

CONSAD. Ainda que esta pesquisa não tenha a finalidade de produzir generalização,

algumas considerações gerais são pertinentes a outros casos dadas as condições da

estrutura institucional.

Na medida em que o CONSAD tem por objetivo promover a segurança

alimentar, o desenvolvimento local, com base numa institucionalidade diferenciada,

como articular a esfera pública com a sociedade civil (ou entes privados), a partir da

busca de geração de emprego e renda? Para responder a este questionamento é

importante considerar as seguintes preocupações:

a) uma política pública federal que visa promover estratégia de

desenvolvimento, através de um processo de indução que complete o

desenho federativo brasileiro, tem que ter presente como indutor o

governo federal. A ausência do MDS quer na articulação entre governos

estaduais e o Consórcio, quer na liberação de recursos, limita o

desenvolvimento de uma política, da qual o MDS foi o principal

motivador;

b) a falta de capacitação e as dificuldades de implementação dos projetos

por parte dos consórcios (considerando que se possa expandir o

encontrado aqui para demais consórcios), é um ponto crucial para à

eficácia do Programa.

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Se não forem revistas as situações levantadas, a fim de que se repense o desenho

institucional adotado, corre-se o risco de se esvaziar esta política. Caso tal situação

persista poderá haver o esvaziamento do programa, por parte do próprio governo

federal.

Mudar o formato do consórcio pode ser uma alternativa, passando-o de direito

privado para público, com o risco de suspensão de um dos pressupostos básicos tanto do

CONSAD quanto da PNSAN. Se esta alternativa for a escolhida, o compromisso

político com o empoderamento da sociedade civil sobre as políticas locais e com o

próprio desenvolvimento fica apenas na intenção, no discurso.

A tarefa não é fácil, e não se pode descartar o potencial destes consórcios como

agentes de mudança de estruturas locais arcaicas, concentradoras de renda e com

processos de desenvolvimento excludente, opressores. Políticas estruturantes, com

potencial de gerar autonomia aos entes locais e integrar diversos atores excluídos de

circuitos de produção, como pequenos agricultores e assentados agrários, numa região

dominada pelo gado de corte, sofrem diversos embates, pois se chocam com interesses

múltiplos.

O papel do Estado, como mediador de conflitos, é o de buscar o consenso

possível, não de modo a perpetuar situações estabelecidas. Mas, sim, modificar

estruturas não mais aceitas do ponto de vista da busca de diminuir as desigualdades. É

preciso uma política permanente de segurança alimentar que se comprometa com a

garantia e o respeito da dignidade humana.

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139

APÊNDICE A: QUESTIONÁRIO

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140

QUESTIONÁRIO

Nome:

Entidade/Cidade:

COMPOSIÇÃO

Legitimidade

(01) Como foi a forma de escolha para sua participação no CONSAD?

( ) da entidade que represento; ( ) do presidente do conselho; ( ) do poder público;

( ) em negociação da entidade que represento com o poder público; ( ) em eleição da

entidade que represento; ( ) outros.________________________________________.

(02) Quanto tempo faz parte do CONSAD?

R:_____________________________________________________.

(03) Quanto tempo sua entidade faz parte do CONSAD?

R:_____________________________________________________.

Representatividade

(04) Você leva para o CONSAD questões que são debatidas na sua entidade?

( ) sim; ( ) não.

(05) Quais são os canais utilizados por você para consultar os membros de sua

entidade?

( )Nenhum; ( ) conferências ou reuniões; ( ) informativos; ( ) outros, quais?

R:_____________________________________________________.

(06) Há alguma entidade que deveria ser representada no CONSAD, mas que não

participa?

R:_____________________________________________________.

Qualificação

(07) Qual o grau de escolaridade?

R:_____________________________________________________.

(08) Participa ou participou de cursos de qualificação/formação/capacitação?

( ) Não; ( ) sim, voltado para a função de conselheiro do CONSAD; ( ) sim, voltado

para outras funções.

(09) Participa ou participou de outras organizações?

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R:_____________________________________________________.

ORGANIZAÇÃO

Funcionamento

(10) Qual o principal entrave para o funcionamento do conselho? (Listar mais de

uma)

a) Falta de capacitação dos membros do conselho;

b) Falta de comprometimento com as decisões tomadas;

c) Falta de informação;

d) Ausência de diálogo com o poder público;

e) Falta de recursos;

f) Falta de interesse dos conselheiros do setor governamental;

g) Falta de interesse dos conselheiros do setor da sociedade civil;

h) Falta de propostas;

i) Outros;____________________________________________;

j) Não houve entraves.

k) Não tenho opinião formada.

(11) Existem mecanismos de acompanhamento das decisões tomadas? a) ( ) Sim. Quais são?

( ) publicação da deliberação em diário oficial; ( ) prestação de contas ao conselho; ( )

panfletos; ( ) comissões internas; audiências públicas aberta à sociedade; ( ) outros.

b) ( ) Não.

(12) Qual a regularidade desses mecanismos? (se a resposta da anterior for letra b,

pular esta).

R:_____________________________________________________.

Interação

(13) Como é a sua relação com as outras entidades que participam do conselho do

CONSAD ou com os outros conselheiros?

( ) em trabalhos conjuntos/apoio a temas comuns; ( ) somente com alguns existe

trabalho conjunto, citar: _______________________. ( ) não mantém muita relação,

explicar:_______________________________________________________.

(14) Você percebe que existem conselheiros de maior importância? Quem são? Por

quê?

R:_________________________________________________.

(15) Como você observa a relação dos conselheiros e dos municípios aos quais

representam?

( ) estão de acordo freqüentemente; ( ) estão de acordo raramente; ( ) as vezes estão de

acordo; ( ) não tenho opinião formada.

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(16) Como você observa, através do conselho, a relação entre os municípios do

território que forma o CONSAD?

( ) relação de conflito; ( ) relação de apoio/cooperação; ( ) nenhuma relação; ( )

outra.________________________________________________________.

(17) Através do conselho você observa alguma sobreposição de um município sobre

os demais?

( ) Sim. Qual ___________;

Por quê?/ de que forma?________________.

( ) Não.

DINÂMICA

Formação da Agenda

(18) Quem propõe os temas/pauta das reuniões?

( ) representante do governo; ( ) presidente do conselho; ( ) comissão

executiva/diretoria; ( ) qualquer membro do conselho; ( ) outros.

_______________________________________________.

(19) As políticas executadas pelo CONSAD estão de acordo com os princípios

orientadores sobre Segurança Alimentar e Desenvolvimento Local?

a) ( ) Sim. Quais? (podem ser mais de uma opção e ordenados)

( ) formação de capital social local; ( ) formação de capital humano local;

( ) agregação de valor nas cadeias produtivas sub-regionais; ( ) modernização do setor

público local.

b) ( ) Não.

(20) As políticas executadas pelo CONSAD estão de acordo com as ações

orientadoras sobre Segurança Alimentar e do Desenvolvimento Local?

a) ( ) Sim. Quais? (podem ser mais de uma opção e ordenados)

( ) microcrédito; ( ) agricultura familiar; ( ) inclusão digital; ( ) economia solidária;

( ) arranjos sócio-produtivos locais.

b) ( ) Não.

Processo deliberativo (Tomada de decisão)

(21) Qual o processo de aprovação das propostas?

( ) consenso; ( ) houve posições divergentes e votações em menos da metade das

propostas; ( ) houve posições divergentes e votações em mais da metade das propostas;

( ) todas foram aprovadas com posições divergentes e votações; ( ) não é possível

avaliar. (Por quê? – do consenso ou da falta dele, por exemplo.___________).

(22) Você considera que as discussões/propostas do conselho do CONSAD estão de

acordo com o seu ponto de vista ou o ponto de vista da organização/entidade que

você representa?

( ) Sim; ( ) não. Por quê?_______________.

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(23) Há fornecimento de informações por parte do CONSAD para a tomada de

decisão dos conselheiros?

a) ( ) Sim. Qual o grau de fornecimento de informações?

( ) baixo; ( ) médio; ( ) alto.

b) ( ) Não.

(24) Qual o grau de acessibilidade dessas informações?

( ) alto; ( ) médio; ( ) baixo.

(25) Qual a natureza dessas informações?

( ) adequadas; ( ) inadequadas; ( ) muito adequadas; ( ) muito inadequadas.

(26) Qual a quantidade dessas informações?

( ) baixa; ( ) alta; ( ) média.

Impacto

(27) Qual o impacto das políticas executadas pelo CONSAD na região?

( ) nenhum; ( ) baixo; ( ) médio; ( ) alto.

(28) A que você atribui o impacto dessas políticas? (listar até 3)

a) ( ) forma como foram formuladas;

b) ( ) forma como foram implementadas;

c) ( ) a obtenção de parcerias na execução;

d) ( ) a não obtenção de parcerias na execução;

e) ( ) falta de recursos;

f) ( ) falta de parcerias/apoios, de quem?______________________________;

g) ( ) existência de parcerias/apoios, de quem?_________________________;

h) ( ) outros, ____________________________________________________.

(29) Qual a importância que você atribui ao CONSAD quanto ao desenvolvimento

local da região?

( ) pouca; ( ) média ( ) alta.

(30) Com relação ao poder público municipal, como você observa a sua

participação no consórcio com relação à execução das políticas elaboradas pelo

conselho?

( ) muita disposição; ( ) pouca de disposição; ( ) indiferente

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ANEXO A: ESTATUTO DO CONSAD IGUATEMI

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ANEXO B: TERMO DE COMPROMISSO PARA USO DE DADOS EM

ARQUIVOS

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