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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL DISCIPLINA: SEMINÁRIOS APLICADOS FIBRA PARA VACAS LEITEIRAS: CONCEITOS, CONSUMO E EXIGÊNCIAS José Tiago das Neves Neto Orientador: Juliano José de Resende Fernandes Goiânia 2011

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS ESCOLA DE VETERINÁRIA E ZOOTECNIA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIA ANIMAL

DISCIPLINA: SEMINÁRIOS APLICADOS

FIBRA PARA VACAS LEITEIRAS: CONCEITOS, CONSUMO E EXIGÊNCIAS

José Tiago das Neves Neto Orientador: Juliano José de Resende Fernandes

Goiânia 2011

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JOSÉ TIAGO DAS NEVES NETO

FIBRA PARA VACAS LEITEIRAS: CONCEITOS, CONSUMO E EXIGÊNCIAS

Revisão apresentada junto à Disciplina Seminários Aplicados do Programa de Pós-Graduação em Ciência Animal da Escola de Veterinária e Zootecnia da Universidade Federal de Goiás.

Área de Concentração: Produção Animal

Linha de Pesquisa:

Metabolismo nuitricional, Alimentação e forragicultura na produção animal.

Orientador:

Prof. Dr. Juliano José de Resende Fernandes – UFG

Comitê de orientação: Prof. Dr. Milton Luiz Moreira Lima – UFG

Dr. Rafael Canonenco de Araujo - GRASP

Goiânia 2011

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 1

2 CONSUMO DE MATÉRIA SECA ............................................................................................. 3

3 CONCEITOS E CARACTERIZAÇÃO DE CARBOIDRATOS .............................................. 6

3.1 Carboidratos não-estruturais .............................................................................................. 8

3.2 Carboidratos estruturais..................................................................................................... 10

3.3 Principais métodos analíticos para determinação de fibra ....................................... 12

3.3.1Fibra bruta (FB) ................................................................................................................... 12

3.3.2 Fibra insolúvel em detergente ácido (FDA) ................................................................ 12

3.3.3 Fibra insolúvel em detergente neutro (FDN) .............................................................. 13

4 FIBRA: CARACTERÍSTICA QUÍMICA vs CARACTERÍSTICA FÍSICA .......................... 15

4.1 Efetividade da fibra .............................................................................................................. 16

4.2 Avaliação da efetividade da fibra nos alimentos ........................................................ 18

4.2.1 Avaliações biológicas para efetividade da fibra ....................................................... 18

4.2.2 Avaliações laboratoriais para efetividade da fibra ................................................... 28

5 EXIGÊNCIAS DE FIBRA EFETIVA ........................................................................................ 32

5.1 Recomendações de FDN .................................................................................................... 34

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................................... 39

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................................... 40

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1 INTRODUÇÃO

Na formulação de dietas para bovinos, a qualidade e a quantidade de

forragens é o primeiro fator a ser analisado no atendimento das exigências

nutricionais e de fibra. Os componentes concentrados são usados para

complementar as contribuições nutricionais das forragens. A importância das

forragens como alicerce das dietas de bovinos leiteiros foi ilustrada em uma

pirâmide de alimentação (FIGURA 1).

FIGURA 1. Pirâmide da alimentação.

EE – extrato etéreo, PNDR – proteína não degradada no rúmen, CNE – carboidrato não estrutural, PDR – proteína degradada no rúmen.

Fonte: Adaptado DE LINN & KUEHN (1997).

Diversas estratégias de alimentação têm sido propostas ao longo da

história para a obtenção de melhor desempenho e manutenção da saúde de

animais ruminantes. Dessa forma, a fibra tem sido utilizada como parâmetro para

caracterizar alimentos e pesquisas têm tentado estabelecer limites mínimos de

seu uso em rações.

Alterações na dieta com a utilização de novos ingredientes, com o objetivo

de prover mais energia, proteína, minerais e vitaminas tem resultado na redução

no uso de fontes de fibra provenientes de forragens. Entretanto, novas pesquisas

têm mostrado que embora exigências em fibra pelos animais sejam importante,

esta muitas vezes não precisa ser representada por fontes de forragens. O

aumento no uso de subprodutos fibrosos na alimentação tem sido uma alternativa

bastante estudada e apresenta resultados satisfatórios. Diversos autores

destacam que o ponto mais importante no uso de fibra está relacionado à

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qualidade e seu tamanho de partícula, sua importância em manter a atividade de

mastigação, fermentação ruminal ideal e a porcentagem de gordura do leite.

Outro fator estudado é o conceito de efetividade e de FDN fisicamente efetivo

(peFDN) e sua relação com as exigências mínimas em fibra e as alterações

com o uso de fontes não-forragem.

Objetivou-se com este trabalho apresentar os principais conceitos em

relação ao conhecimento em consumo, exigências e sistemas de avaliação de

fibra para vacas leiteiras, mostrando os principais conceitos e teorias utilizadas e

sua importância para a nutrição animal.

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2 CONSUMO DE MATÉRIA SECA

O consumo de matéria seca (CMS) é de fundamental importância na

nutrição animal, pois estabelece a quantidade de nutrientes que estarão

disponíveis para o animal, tanto para manutenção da saúde quanto para

produção. De acordo com o NRC (1996) os diversos fatores que afetam e

regulam o CMS em ruminantes são complexos e não compreendidos

completamente. No entanto, estimativas acuradas de consumo são importantes

na predição de taxas de ganho e diversas equações têm sido desenvolvidas e

sugeridas ao longo dos anos.

Segundo o NRC (1996), pesquisas têm tentado estabelecer relações entre

a concentração de energia da dieta e o consumo por bovinos de corte, baseados

no conceito de que o consumo de dietas com baixa digestibilidade e baixa energia

(alta fibra) é controlado por fatores físicos como enchimento e passagem e o

consumo de dietas altamente digestíveis e com alta energia (baixa fibra e alto

concentrado) é controlado pela demanda energética do animal e por fatores

metabólicos.

O NRC (2001) destaca que diversas teorias têm sido propostas para

determinar e predizer o consumo baseadas em fatores como o enchimento físico

do retículo-rúmen (ALLEN, 1997), fatores metabólicos (MERTENS, 1997), ou o

consumo de oxigênio (KETELAARS & TOLKAMP, 1996). De acordo FORBES,

(1996), cada teoria pode ser aplicada sob certas condições, entretanto, é provável

que os vários efeitos estimulem e regulem o consumo em conjunto.

A primeira teoria trabalha com a hipótese de que alimentos com baixa

digestibilidade podem se tornar obstáculos para um CMS favorável,

principalmente devido à sua lenta passagem no rúmen e no trato digestório. Neste

caso, segundo MERTENS (1997) a fração fibra em detergente neutro (FDN),

devido a sua baixa taxa de digestão, é considerada o constituinte primário da

dieta associado com o efeito de enchimento.

Uma teoria alternativa à teoria metabólica é a teoria proposta por

KETELAARS & TOLKAMP, (1996), que propõe que a ingestão em ruminantes é

sujeita a um controle metabólico, envolvendo a taxa de oxigênio consumido para

disponibilizar energia líquida. Além da complexidade e da interação entre fatores

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físicos, metabólicos e quimiostáticos regulando o consumo, fatores psicológicos e

sensoriais também são importantes. Segundo os autores, uma predição acurada

do CMS em ruminantes é dificultada devido a um complicado e complexo

entendimento de uma série de estímulos regulatórios.

Um grande número de tentativas têm sido realizadas com o objetivo de

predizer o consumo de matéria seca em ruminantes. INGVARTSEN (1994) citado

por TAMMINGA & HOF (2000), listou cerca de 40 equações de predição para

gado leiteiro e cerca de 20 para gado de corte em sua revisão, sendo que as mais

complexas incluíam fatores animais, como a produção de leite e peso corporal,

além da qualidade do alimento, fatores como digestibilidade da matéria seca ou

fatores de representem o enchimento ruminal, como variáveis na predição do

consumo.

MINSON (1990) citado por TAMMINGA & HOF (2000), apresentou um

grande número de variáveis que podem influenciar o consumo de forragem,

considerando fatores como prenhez, lactação e condição corporal como fatores

animais e estresse por calor ou frio como principais fatores ambientais. Fatores

para forragens incluíam espécie, cultivar, estágio de crescimento, fertilidade do

solo, condição climática e método de conservação, para no caso de animais

confinados. Para animais em pastejo, essencialmente, os mesmos fatores foram

considerados, além da seleção pelos animais e a disponibilidade (densidade) da

forragem.

VAN SOEST (1994) sugeriu que a regulação do consumo é a integração de

vários fatores no sistema metabólico do animal. De acordo com o NRC (2001),

fatores mais específicos observados como limitantes para o consumo estão

relacionados ao enchimento e distensão do rúmen (VAN SOEST, 1994; FORBES,

1996); a quantidade de material inerte no rúmen (DADO & ALLEN, 1995);

concentrações ruminais de acetato (FORBES, 1996); osmolaridade ruminal e

concentrações de propionato no fígado (FORBES, 1996). FORBES (1996)

também apresentou evidências de que muitos destes fatores podem estar

relacionados. O consumo diário é a soma da quantidade consumida em refeições

individuais e pode ser determinado pelo comportamento alimentar (Gill & Romney,

1994 citado por NRC, 2001). O tamanho do bocado, taxa de bocado e tempo de

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consumo podem também ser fatores limitantes da ingestão diária, particularmente

sob condições de pastejo.

Neste contexto, o NRC (1996) destaca que devido aos fatores que atuam

regulando o consumo por ruminantes não serem completamente compreendidos,

os modelos de predição são muitas vezes empíricos. Fatores fisiológicos como

composição corporal, porcentagem de gordura, sexo, idade e maturidade são

algumas das variáveis que muitas vezes dificultam a obtenção de equações

precisas. Além disso, fatores relacionados ao ambiente e ao tipo e manejo da

dieta também devem ser considerados.

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3 CONCEITOS E CARACTERIZAÇÃO DE CARBOIDRATOS

Os carboidratos são as maiores fontes de energia da dieta de ruminantes e

geralmente compreendem entre 60 a 70% do total da dieta, com função principal

de promover energia para a microbiota ruminal e o animal hospedeiro. Uma

característica secundária, porém essencial, está relacionada à função de alguns

carboidratos em manter o trato gastrointestinal de ruminantes saudável. A

natureza e concentração dos carboidratos estruturais da parede celular são os

principais determinantes da qualidade dos alimentos volumosos, especialmente

de forragens (MERTENS, 1997).

Os carboidratos são definidos quimicamente como poliidroxialdeídos ou

poliidroxicetonas cíclicos, ou substâncias que liberam esses compostos por

hidrólise. Muitos carboidratos, mas nem todos, têm formulas empíricas (CH2O)n,

e alguns também contêm nitrogênio, fósforo ou enxofre (DIETRICH ET AL., 1988).

São constituídos basicamente de açúcares simples e polissacarídeos. Os

açúcares simples são formados por monossacarídeos e oligossacarídeos. Os

monossacarídeos (moléculas de três a oito carbonos que diferem quanto ao

grupamento aldeído ou cetona e a posição das hidroxilas nas moléculas) são

constituídos principalmente pela glicose, frutose, galactose, manose, xilose,

ramnose, arabinose e fucose. Os oligossacarídeos (combinações de dois a dez

monossacarídeos) são constituídos principalmente pela sacarose (dissacarídeo),

rafinose (trissacarídeo) e estaquiose (tetrassacarídeo) (DIETRICH ET AL., 1988).

Os polissacarídeos são combinações de mais de dez monossacarídeos e

estão presentes como homopolímeros não amiláceos como os galactanos

(significa um polímero constituído de galactose), frutanos, mananos, glucanos

(significa um polímero constituído de glicose) e celulose, ou heteropolímeros

como os xiloglucanos (hemicelulose), galactomananos (pectinas) e amido. Alguns

polissacarídeos podem ter estrutura ramificada indicando um nome composto, por

exemplo, glucoronoarabinoxilano que apresenta uma estrutura básica de xilano

(constituída de subunidades de xilose) com ácido glucurônico e cadeias laterais

de arabinose (DIETRICH ET AL., 1988).

Os polissacarídeos devem ser degradados em açúcares simples para

serem utilizados. A pectina é o principal polissacarídeo estrutural não fibroso.

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Apresenta taxa de degradação rápida, ao contrário dos polissacarídeos fibrosos,

que são lentamente degradados. Por exemplo, a degradação da celulose de

forrageiras situa-se entre 25% e 90% e a da hemicelulose, entre 45% e 90%

(MOORE & HATFIELD, 1994).

A fermentação de carboidratos no rúmen produz os ácidos graxos voláteis

que representam a principal fonte de energia para ruminantes, atendendo até

80% das exigências diárias. Além disso, o uso de carboidratos pelos

microrganismos do rumem é um fator crítico para maximização da síntese de

proteína microbiana e manutenção da função ruminal (MERTENS 1997).

As características dos carboidratos como composição química e física

afetam o consumo voluntário de matéria seca (CMS) pelo animal, a cinética da

digestão e, conseqüentemente, a utilização dos nutrientes da ração (ALLEN,

1997). Entretanto, deve-se ressaltar que ainda não há consenso definitivo quanto

a nomenclatura, a separação de frações e aos procedimentos metodológicos

empregados nas análises de carboidratos, embora esses aspectos representem

passo importante para definições de exigências destes nutrientes para os

animais (NRC,2001).

MERTENS (1997) sugere que a classificação dos carboidratos

estabelecida como estruturais (CE) e não-estruturais (CNE), refere-se unicamente

a função desempenhada nas plantas e não deve ser confundida com o papel dos

carboidratos na nutrição animal. Conceitualmente, CE estão relacionados com a

parede celular (PC) dos vegetais (sendo a PC composta por celulose,

hemicelulose, lignina, pectina, compostos fenólicos e proteínas) fornecendo o

suporte físico, necessário para o crescimento da planta. Já os CNE, estão

localizados no conteúdo celular e são encontrados em maiores concentrações

nas sementes, folhas e raízes e representam reservas energéticas utilizadas para

crescimento, reprodução e sobrevivência durante períodos de estresse.

Embora inúmeras vezes usados como sinônimos, os termos PC e fibra

não representam frações idênticas dos carboidratos, tanto em definição quanto

em composição. Em relação à composição de ingredientes, fibra é um termo

utilizado para estabelecer o conceito exclusivamente nutricional, ou seja, a fibra é

definida como sendo a fração indigestível ou de digestão lenta do ingrediente e

que ocupa espaço no trato gastrintestinal (TGI) (VAN SOEST, 1994). Assim, a PC

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não pode ser considerada como uma medida acurada de fibra, pois pode conter

pectina, uma fonte de carboidrato de alta digestibilidade que exerce efeito limitado

como fonte de fibra (MERTENS, 1997).

Em termos nutricionais, a classificação dos carboidratos em fibrosos (CF) e

não fibrosos (CNF) parece mais apropriada porque é dependente de

características nutricionais do animal e não necessariamente de funções

exercidas na planta. Nesta classificação, os CNF representam as frações

degradadas mais rapidamente e incluem amido, açúcares e pectina. Já os CF,

principalmente a celulose e a hemicelulose, ocupam espaço no TGI e exigem

mastigação, ruminação e degradação microbiana para redução do tamanho de

partículas, fermentação, liberação de nutrientes e passagem pelo TGI

(MERTENS, 1997).

De acordo com NUSSIO et al. (2006), vários são os fatores que afetam

a concentração de fibra das rações de vacas em lactação, como o teor e o tipo de

carboidrato (estruturais e não estruturais), o tamanho de partícula e a

porcentagem de fibra proveniente de forragem, a forma de fornecimento da ração

(componentes separados ou ração total) e a quantidade e freqüência de

fornecimento de concentrados. Com base nestas informações, os diferentes

sistemas, como o NRC (2001), têm proposto teores mínimos desta fração na dieta

de animais ruminantes, visando o cumprimento das exigências dos animais, com

o menor prejuízo no desempenho.

3.1 Carboidratos não-estruturais

A fração carboidratos não-estruturais (CNE), obtida através de métodos

enzimáticos laboratoriais, é formada por açúcares, amido, ácidos orgânicos e

outros carboidratos de reserva e correspondem a maior fonte de energia para

animais de alta produção. Por outro lado, nutricionalmente, os carboidratos

podem ser classificados como não-fibrosos (CNF), sendo obtidos pelo simples

cálculo por diferença através da formula: CNF = 100 – (%FDN + %PB +

%Gordura + %Cinzas) (MERTENS, 1997).

De acordo com MERTENS (1988) citado pelo NRC (2001), as

concentrações de carboidratos não-fibrosos e de não-estruturais são diferentes

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para alguns alimentos, e muitas vezes resultam em erros durante comparações,

dependendo da nomenclatura adotada, conforme mostra a TABELA 1.

TABELA 1- Carboidratos não estruturais (CNE) e carboidratos não fibrosos

(CNF) em alguns ingredientes utilizados para alimentação animal. FDN CNFa CNEb

Ingredientes % MS Silagem de alfafa 51,4 18,4 7,5 Feno de alfafa 43,1 22,0 12,5 Silagem de milho 44,2 41,0 34,7 Milho moído 13,1 67,5 68,7 Polpa beterraba 47,3 36,2 19,5 Caroço de algodão 48,3 10,0 6,4 Cevada 23,2 60,7 62,0 Farelo glúten de milho 7,0 17,3 12,0 Farelo de soja (48 %) 9,6 34,4 17,2 a CNF (%) = 100 – (%FDN + %PB + %Gordura + %Cinzas); b CNE = carboidratos não-estruturais determinados de acordo com métodos enzimáticos laboratoriais. Adaptado de NRC (2001).

HALL (2000) desenvolveu métodos de fracionamento dos carboidratos

solúveis, realizando a partição e proporcionando o conhecimento dos constituintes

dos carboidratos solúveis em detergente neutro dos alimentos. O método é

baseado em diferenças de solubilidade entre os constituintes, separando em

ácidos orgânicos, carboidratos solúveis em etanol, amido e fibra solúvel em

detergente neutro, possibilitando um melhor conhecimento dos constituintes da

fração carboidratos não fibrosos dos alimentos.

O NRC (2001) destaca que a concentração ótima de CNE ou CNF na dieta

de vacas leiteiras ainda não está bem definida, sendo seu uso em doses altas

comumente relacionado com distúrbios metabólicos, como a acidose.

De acordo com PIWONKA & FIRKINS (1996) muitos trabalhos têm

mostrado que a digestão da fibra é inibida quando concentrações moderadas de

CNE são incluídas na dieta. A redução da digestão de fibra resulta em uma

menor eficiência de utilização de energia em vacas leiteiras devido ao aumento no

incremento calórico e perdas fecais devido à fibra não digerida. Os autores

sugerem que embora o baixo pH (<6,0), resultado da rápida fermentação de

CNE, possa ser um dos maiores fatores na redução da digestão, outros fatores

parecem estar envolvidos no processo. Segundo os autores, estudos in vitro

mostraram que a adição de glucose (25mM) resultou em decréscimo na taxa de

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digestão de FDN e da atividade da carboximetil celulase em culturas mantidas

com pH acima de 6,2. KHALILI & HUHTANEN (1991) observaram redução na

taxa de digestão de FDN e na atividade da enzima carboximetil celulase

com ou sem a infusão de sucrose no rúmen. Alguns autores sugerem que

açúcares, amido e CNE podem decrescer a digestão de fibra por afetar a

colonização da fibra por organismos celulolíticos ruminais, entretanto, os efeitos

do baixo pH não podem ser excluídos.

3.2 Carboidratos estruturais Para a determinação de rotina, existem limitações sobre a escolha do

método a ser usado na determinação da fibra, tais como: acurácia analítica, alta

repetibilidade e baixos custos. De acordo com MERTENS (1997), o objetivo de

qualquer esquema rotineiro de análise de alimentos é detectar diferenças

nutricionais entre fontes de alimentos para fornecer informações úteis aos

nutricionistas de ruminantes e a fibra deveria separar a fração lentamente e não

totalmente digerida, daquela rapidamente ou quase totalmente digerida.

O sistema de Weende foi o primeiro método de avaliação de alimentos

utilizados na alimentação dos animais domésticos. Desenvolvido na estação

experimental de Weende, na Alemanha por HENNEBERG & STHOMANN (1860),

tem sido aprimorado em laboratórios e é nos dias de hoje, o mais utilizado na

determinação da qualidade imediata de alimentos volumosos, principalmente

através das análises dos teores protéicos e de fibra deste tipo de alimento.

Em 1960, pela precariedade em análise alimentos, foi ativado o programa

de pesquisa de Peter Van Soest no United States Department of Agriculture

(USDA) unidade Beltsville (MD, USA) e posteriormente o Cornell University em

Ithaca (NY, USA), que levou ao sistema detergente de análise de alimentos.

Durante vários anos, Van Soest convenceu a comunidade científica a substituir o

sistema de análise de Weende ou Proximal, pelo sistema de detergentes.

Substituindo a fibra bruta (FB) e extrato livre de nitrogênio, por solúveis em

detergente neutro (SDN), fibra em detergente neutro (FDN), fibra em detergente

ácida (FDA) e lignina, tornou-se possível explicar as respostas nutricionais em

termos de ingestão e digestibilidade dos alimentos.

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A fibra bruta (FB), a fibra em detergente ácido (FDA) e a fibra em

detergente neutro (FDN) são as medidas de fibra mai comuns utilizadas em

análises laboratoriais de rotina, entretanto nenhum destes fatores apresenta

uniformidade química. A fibra em detergente neutro representa a maioria dos

componentes estruturais das células vegetais, como a celulose, hemicelulose e

lignina. A fibra em detergente ácido não inclui a hemicelulose e a fibra bruta não

quantifica hemicelulose e lignina. Dessa forma, segundo o NRC (2001), o método

FDN é o que melhor separa a fração carboidrato estrutural de não-estrutural e

compostos químicos incluídos como fibra.

De acordo com o NRC (2001), a quantidade máxima de FDN que pode ser

incluída em dietas é função das exigências em energia liquida de lactação (ELL)

da vaca, da quantidade mínima de carboidratos não fibrosos necessários para

uma boa fermentação ruminal e os efeitos potenciais negativos do FDN no

consumo de alimento. Na maioria dos casos, a máxima concentração de FDN

pode ser determinada pela exigência em ELL de vacas.

Mertens (1994) citado pelo NRC (2001) realizando um sumário de diversos

trabalhos publicados observou que a concentração de FDN pode não alterar o

CMS quando as dietas foram formuladas de acordo com as exigências em ELL.

Segundo o autor, o consumo pode ser limitado quando vacas produzindo

aproximadamente 40 kg de leite por dia foram alimentadas com mais de 32 %

de FDN. Para vacas produzindo cerca de 20 kg de leite por dia, o consumo não é

restringido mesmo em dietas contendo 44 % de FDN. O NRC (2001) destaca que

a fonte de FDN, especialmente a taxa e a extensão de digestão deste FDN, é que

pode influenciar no resultado esperado.

Uma quantidade mínima de FDN na dieta é requerida para a manutenção

de um ambiente ruminal saudável. A concentração de FDN está correlacionada

positivamente com o pH ruminal, devido a menor e mais lenta degradabilidade

quando comparado com fontes de CNF. Outro ponto importante relaciona o

conteúdo de FDN da dieta, principalmente oriundo de forragem, em estimular a

mastigação e a produção de saliva. Trabalhos de Clark & Armentano (1993) e

Depies e Armentano (1995) citados pelo NRC (2001) demonstraram que dietas

com menos de 25% de FDN total e menos que 16% de FDN de forragem estariam

relacionadas com depressão na porcentagem de gordura do leite.

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3.3 Principais métodos analíticos para determinação de fibra

3.3.1Fibra bruta (FB)

A determinação de Fibra Bruta (FB) envolve o uso de ácidos e bases fortes

para isolá-la. A extração ácida remove amidos, açúcares e parte da pectina e

hemicelulose dos alimentos. Já a extração básica retira proteínas, pectinas e

hemicelulose remanescentes e parte da lignina (MERTENS, 1997). Tipicamente a

FB consiste principalmente de celulose com pequenas quantidades de lignina e

hemicelulose. A solubilização da lignina, em proporções variáveis, é uma séria

limitação do método (VAN SOEST et al., 1967). A lignina solubilizada torna-se

parte dos extrativos não nitrogenados (ENN), o qual deveria ser o componente

mais digestível do alimento. A inclusão da lignina nos ENN resulta, no caso de

volumosos, em digestibilidades do ENN freqüentemente menores do que as

digestibilidades da FB.

Desta maneira, a FB vem sendo abandonada na análise laboratorial dos

alimentos. Pesquisadores da área de nutrição de ruminantes, passaram a

determinar fibra, como FDA e/ou FDN. Atualmente, são praticamente inexistentes

trabalhos de pesquisa usando FB para identificar a fração fibrosa dos alimentos

para ruminantes.

3.3.2 Fibra em detergente ácido (FDA) Para evitar a solubilização da lignina que ocorre no método da FB, um

método que não utiliza álcali para isolar a fibra foi desenvolvido. O método

também pode ser usado como um passo preparatório para a determinação da

lignina, nitrogênio insolúvel em detergente ácido (NIDA), cinzas insolúveis em

detergente ácido (CIDA), celulose e sílica (VAN SOEST et al., 1991). O método

para FDA usa ácido sulfúrico 1N para solubilizar os açúcares, amidos,

hemiceluloses e algumas pectinas, e detergente (Brometo de Cetil Trimetil

Amônio, CTAB ou Cetremide = C19H42BrN) para remover proteínas. A FDA isola

principalmente celulose e lignina, com alguma contaminação por pectina, minerais

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(cinzas) e compostos nitrogenados (principalmente produtos da reação de

escurecimento não-enzimático = Reação de Maillard).

A FDA embora seja um método rápido e de grande confiabilidade, não é

válido para uso nutricional ou para a estimativa da digestibilidade (VAN SOEST et

al., 1991).

3.3.3 Fibra insolúvel em detergente neutro (FDN) O procedimento original foi desenvolvido no início da década de 60, com a

clássica referência publicada por GOERING & VAN SOEST (1970). Desde então,

várias modificações ao longo do tempo foram realizadas (VAN SOEST et al.,

1991) devendo-se, portanto, tomar cuidado ao se fazer comparações de valores.

Os reagentes usados para análise de FDN (VAN SOEST & WINE, 1967) não

dissolvem as frações indigestíveis ou lentamente digestível dos alimentos,

sugerindo que esse método mede com mais acurácia as características

nutricionais associadas à fibra.

As soluções tampões a base de borato e fosfato são usadas para manter o

pH próximo de 7,0 para se evitar a solubilização da hemicelulose e da lignina. O

sulfato laúrico de sódio (detergente) e o sulfito de sódio são usados para remover

as proteínas, o ácido etilenodiaminotetracético (EDTA) para quelatar cálcio, o que

auxilia na solubilização das proteínas e pectinas. Embora a pectina faça parte da

parede celular da planta, esta é facilmente extraída e também rápida e quase

completamente digerida (GAILLARD, 1962).

Nos métodos iniciais o éter monoetil etileno glicol era usado para auxiliar

na solubilização dos amidos, entretanto, por ser teratogênico, foi substituído pelo

trietileno glicol. A FDN recupera celulose, hemicelulose e lignina, com alguma

contaminação por proteína e pectina (VAN SOEST et al., 1991).

A contaminação com minerais pode variar de 0 a 4% na composição da

FDN (WEISS, 1993). Também tem sido recomendado que a FDN seja

determinada em base livre de cinzas (VAN SOEST et al., 1991). A contaminação

por amido pode ser significativa em alguns alimentos, como grãos, por exemplo,

superestimando, desta forma, os valores de FDN, mas a utilização de alfa amilase

termo-estável e/ou uréia 8M em amostras que contenham quantidades

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consideráveis de amido reduzem substancialmente essa contaminação e facilitam

a filtração (VAN SOEST et al., 1991).

A contaminação com proteína parece contrabalançar a perda da pectina

imediatamente solúvel fazendo da FDN uma estimativa aceitável da parede

celular (MERTENS, 1997), o que não ocorre em alimentos aquecidos, como

resíduos de cervejaria e destilaria, por exemplo, os quais segundo WEISS et al.

(1993) mencionam que esta contaminação pode chegar até a 40%. A adição de

sulfito de sódio reduz essa contaminação por proteína, mas não totalmente, nesse

sentido, WEISS et al. (1993) propuseram os métodos de proteína insolúvel em

detergente neutro (PIDN) e proteína insolúvel em detergente ácido (PIDA).

As modificações efetuadas no método, ao longo dos anos, resultaram em

diferentes procedimentos de determinação com valores diferentes de FDN, os

quais dependem da metodologia empregada e do alimento analisado, são eles: o

método original de VAN SOEST & WINE (1967) que emprega decalina (como

antiespumante, mas remove a lignina), éter monoetil etileno glicol (teratogênico) e

sulfito para remover a contaminação por proteína; o método de ROBERTSON &

VAN SOEST (1981) que não usa sulfito, mas amilase para remover o amido; o

método de VAN SOEST et al. (1991) que não usaram decalina, trocaram o

monoetilenoglicol pelo tri etileno glicol, usaram amilase e uréia 8 molar para

remover o amido e o sulfito é opcional; o método que usa sulfito e amilase

recomendado por e MERTENS (1997).

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4 FIBRA: CARACTERÍSTICA QUÍMICA vs CARACTERÍSTICA FÍSICA A quantidade de fibra presente na ração fornecida aos animais está

relacionada com o consumo do alimento. Já este fator associa-se com produção

de leite, porcentagem de gordura no leite, desempenho em ganho peso e por fim

com a saúde dos animais. Por este motivo, existe uma constante busca para a

elucidação dos fatores envolvidos nestas características produtivas. Neste

contexto, procurou-se determinar como a fibra da dieta influenciava a dinâmica

metabólica e cinética ruminal e como isso poderia alterar a resposta animal

MERTENS (1997).

Um grande passo foi dado quando conseguimos quantificar e qualificar as

fibras do alimento, através da solução detergente neutro, o uso de sulfito e da

amilase, proposto por VAN SOEST (1991). No entanto, somente a quantidade

desta fração não explica diferentes respostas no animal em dietas que a mesma

quantidade de fibra é ofertada na ração.

Isso acontece porque a fibra detergente neutro (FDN) é apenas uma

característica química do alimento, e neste contexto as características físicas

inerentes a esta fração, como tamanho de partícula e densidade, não estão sendo

avaliados. Isso se torna mais evidente principalmente em duas situações

específicas: quando a fonte de fibra que está sendo ofertada passou por

diferentes processos físicos como a moagem e quando são utilizadas fontes de

FDN oriundos de subprodutos. Em ambas as situações, o FDN presente possui

poucos atributos físicos capazes de estimular a atividade mastigatória, salivação e

motilidade ruminal (ARMENTANO & PEREIRA, 1997).

Estas características físicas da fibra influenciam a saúde do animal, a

fermentação ruminal e a utilização dos metabólitos produzidos, metabolismo

animal e produção de gordura no leite, independentemente da quantidade ou da

composição química avaliada no FDN. É interessante ressaltar que a

quantificação destas características físicas são mais relevantes quando são

utilizados fontes de FDN oriundos de forragens finamente picadas ou quando

este FDN é proveniente de fontes não fibrosas. Quando são ofertados fibras de

forragens grosseiramente picadas, o valor de FDN servirá apenas para sabermos

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qual a quantidade mínima de volumoso que podemos oferecer, já que nestas

condições o FDN já possui alta efetividade (MERTENS, 1997).

Assim, na tentativa de avaliar fisicamente a porção fibrosa do alimento,

autores sugeriram avaliar o tempo de mastigação como sendo uma medida

biológica para este parâmetro (min/ kg MS). Para isso, vários alimentos foram

avaliados, como casca de caroço de algodão, feno e silagem de alfafa. Na

tentativa de padronizar o uso destes valores, MERTENS (1986) citado por

MERTENS (1997), sugeriu que as rações a serem avaliadas deveriam ter a

mesma quantidade de FDN, para que assim as características físicas fossem a

principais diferenças e assim mais claramente evidenciadas. Para que esta teoria

de padronização fosse possível, o mesmo autor sugeriu um sistema de avaliação

da porção fibrosa dos alimentos baseado em um padrão teórico, observando que

a atividade mastigatória foi correlacionada a FDN (característica química) e

tamanho de partícula (propriedade física), propôs o termo unidade de valor

forrageiro (UVF) para definir a efetividade dos alimentos em estimular a atividade

de mastigação. O máximo UVF para um alimento é 100 que representa um

alimento hipotético que contém 100% de FDN em uma forma física que estimula o

máximo de atividade mastigatória/kg de FDN (feno de gramínea de fibra longa

que contenha 100% de FDN). Neste sistema, o UVF de um alimento seria

diretamente proporcional a sua concentração de FDN multiplicada por um fator de

ajuste forrageiro (0 a 1) que é baseado no tamanho de partícula do alimento.

4.1 Efetividade da fibra

Quando forragens finamente picadas ou não são ofertadas a ruminantes,

alterações no padrão fermentativo e depressão na gordura do leite podem ser

facilmente observadas sem que a relação volumoso:concentrado seja alterada.

Estas observações sugerem que assim como o teor de FDN e de carboidratos

não fibrosos, as características físicas inerentes à porção fibrosa do alimento,

também são fundamentais para uma ótima fermentação ruminal (MERTENS,

1997).

Existe uma terminologia que precisa ser bem compreendida quando se

avalia efetividade ou função física da fibra na dieta. A porção fibrosa pode ser

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classificada como fisicamente efetiva (peFDN) ou simplesmente efetiva

(eFDN). A fibra fisicamente efetiva (peFDN), está relacionada com características

físicas do alimento (principalmente tamanho de partícula) que influenciam a

atividade mastigatória e a forma bifásica natural do conteúdo ruminal,

denominada “mat ruminal, (partículas longas mais superficiais e partículas

pequenas diluídas no fluído mais ao fundo). O valor de peFDN é resultado da

multiplicação do teor de FDN por um fator de efetividade física (pef). Este fator

baseia-se na atividade mastigatória e pode variar de 0 (quando o FDN não é

capaz de estimular a atividade mastigatória) a 1 (quando o FDN possui grande

capacidade de estimular a atividade mastigatória) (MERTENS, 1997).

A fibra efetiva (eFDN), está relacionada com a habilidade total que a fibra

possui em manter o teor de gordura do leite da vacas alimentadas com esta fonte.

O eFDN também possui um fator, que varia de 0 (quando a fibra não consegue

manter o teor de gordura no leite) a 1 (quando a fibra mantém inalterado o teor de

gordura no leite). Uma das principais diferenças entre eFDN e peFDN está no fato

que o eFDN inclui fontes de carboidratos não fibrosos que influenciam no teor de

gordura do leite, como os açúcares, mas o peFDN não. Portanto, o eFDN pode

ser um valor maior que o FDN da ração, porém o mesmo não pode ocorrer

com o peFDN (MERTENS, 1997), como ilustrado na FIGURA 2.

FIGURA 2. Ilustração das relações existentes entre FDN, eFDN (fibra efetiva) e peFDN (fibra fisicamente efetiva). (MERTENS, 2001 citado por BIANCHINI et al., 2007).

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Como os valores de eFDN podem ser maiores do que os valores de peFDN

(como ilustrado na figura acima) e o fato da concentração de gordura do leite

poder manter-se inalterada quando dietas diferentes forem fornecidas, sugere-

se que o eFDN é menos sensível que o peFDN para indicar diminuição do

consumo de matéria seca, acidose, laminite e deslocamento de abomaso em

vacas leiteiras (MERTENS, 1997).

4.2 Avaliação da efetividade da fibra nos alimentos

Diversos trabalhos têm demonstrado que a atividade mastigatória (tempo

de alimentação mais o tempo de ruminação) é uma característica que reflete as

propriedades físico-químicas dos alimentos (FDN, tamanho de partícula,

fragilidade intrínseca e umidade). Ela também pode estar associada ao tipo,

tamanho, idade e consumo de matéria seca do animal. Embora ela esteja

relacionada com todos estes fatores, ainda não está claro como ela pode ser

usada como valor em um sistema quantitativo unificado (MERTENS, 1997).

Basicamente existem duas formas de avaliação da efetividade da fibra em

alimentos. A primeira chamada de avaliação biológica, que compreende análises

estatísticas de ensaios biológicos de comportamento ingestivo e outra chamada

laboratorial, que envolve a avaliação da estratificação de partículas dos alimentos

(NUSSIO et al, 2006).

4.2.1 Avaliações biológicas para efetividade da fibra

MERTENS (1986) citado por MERTENS (1997) buscou padronizar os

efeitos de atividade mastigatória através de equações de regressão que

utilizassem como base o teor de FDN da ração e o tempo em minutos de

atividade mastigatória por quilograma de MS ingerida ou quilograma de FDN

ingerido. Para que esta equação fosse possível, precisava estabelecer alguns

parâmetros base. Então ele sugere que feno de forragem picado grosseiramente

contêm 100% de FDN e o fator de efetividade física igual a 1, tendo como

resultado uma fibra com 100% de peFDN. Este tipo de fibra em média deveria

proporcionar um tempo de atividade mastigatória de 240 minutos por quilograma

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de MS ou FDN ingeridos por vacas secas. Portanto, esta teoria diz que a variação

da atividade mastigatória está em função do teor de FDN da ração, conferindo

assim as seguintes equações:

Mastigação (min)/kg de MS = -91,1 + 3,10 [%FDN] (r2 = 0,95)

Mastigação (min)/kg de FDN = 1,5 + 2,37 [%FDN] (r2 = 0,88)

O efeito do FDN no tempo de mastigação avaliado estatisticamente usando

as fórmulas acima, podem ser observados na TABELA 2. Para validar estas

equações, MERTENS (1997) utilizou vários trabalhos que compreendiam

diferentes alimentos e respectivos teores de FDN.

TABELA 2 - Relação entre atividade mastigatória por quilograma de MS ou FDN em relação à concentração total de FDN de fenos grosseiramente picados ofertados para vacas secas.

Alimento FDN1 Atividade mastigatória total Referências % da MS min/kg MS Min/kg FDN Alfafa 49 61 125 Sudweeks et al., 1979 Grama seca 51 63 123 Campling et al, 1966 Forragem de centeio

65 90 139 Freer et al., 1965

Grama 65 103 158 Freer et al., 1962 Forragem de centeio

68 104 152 Freer et al., 1965

Grama 65 107 165 Freer et al., 1962 Palha de aveia 78 163 209 Freer et al., 1962 Palha de aveia 79 143 181 Freer et al, 1965 Palha de aveia 84 164 195 Campling et al., 1966 FDN1 calculado a partir da concentração de fibra bruta; Fonte: Adaptado de MERTENS (1997).

Segundo o autor, quando esta atividade mastigatória foi corrigida para a

quantidade de matéria seca consumida em diversos experimentos, o tempo de

mastigação por quilograma de FDN de forragens grosseiramente picadas foi

reduzido para 150 minutos.

MERTENS (1997) observou através de equações de regressão que

conforme o tamanho de partícula das forragens ia diminuindo a atividade

mastigatória também decrescia. Quando forragens eram picadas e o tamanho

médio de partículas era em torno de 40 mm, isso poderia corresponder a uma

atividade mastigatória equivalente a 80% da atividade mastigatória de uma

forragem grosseiramente picada. O autor assumiu que partículas finamente

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moídas diminuem a atividade mastigatória, e que partículas com tamanho em

torno de 40, 20, 5, 1 mm, proporcionam 80, 70, 50 e 25% da atividade

mastigatória pertencentes a forragens grosseiramente picadas, respectivamente

(TABELA 3).

TABELA 3 –Efeito do tamanho de partículas de forragens na atividade mastigatória de vacas

1 Diâmetro da abertura da peneira; 2 FDN calculado a partir da concentração de fibra bruta; Compr. Teórico = Comprimento teórico do corte calculado por sistema de peneiras; Fonte: Adaptado de MERTENS (1997).

É importante ressaltar que vários destes teores de FDN citados nas tabelas

anteriores são calculados a partir de equações com base no teor de fibra bruta ou

fibra detergente ácido. MERTENS (1997) destaca que alguns dados de FDN

podem estar superestimados pelo fato de que na época em que foram realizados,

o uso de α-amilase ainda não era difundido. Todos estes fatores podem ser

considerados como fontes de variabilidade para as equações realizadas.

Após o estabelecimento de um tempo médio de mastigação e considerar o

grau de moagem como um fato relevante, o que precisava ser estabelecido era

um padrão da forma física do alimento baseado no tamanho da partícula. Assim,

vários trabalhos foram avaliados, e as especificações distribuídas como sendo a

média observada de cada fonte.

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Até agora temos várias informações envolvendo atividade mastigatória, tipo

de processamento da forragem envolvendo o tamanho de partícula e um tempo

padrão para mastigação corrigido para o consumo de matéria seca dos animais.

Todas estas informações relacionadas com o teor de FDN de fontes de forragens.

No entanto, após visualizarmos a existência de correlação entre estes fatores,

agora podemos saber como estes dados são utilizados para fornecer um número,

denominado fator de efetividade física (pef). Por sua vez, este fator será

multiplicado pelo teor de FDN da amostra e fornecerá o valor da fibra fisicamente

efetiva (peFDN), ou seja, o quanto de FDN da amostra é capaz de promover a

atividade mastigatória (NUSSIO et al, 2006).

O fator de efetividade física foi estimado através da divisão do valor

observado de tempo de mastigação (min/kg) por 150 min/kg de peFDN (tempo de

mastigação médio observado para feno grosseiramente picado). Em seguida,

realizou-se uma regressão entre os valores de observados nesta variável

calculada versus o consumo de FDN para cada fonte de alimento e sua respectiva

forma física, sendo que a regressão tinha como variável o consumo de FDN. Os

valores de pef de diversos alimentos podem ser observados na TABELA 4

(MERTENS 1997).

Quanto aos valores de r2 terem sido baixos, em média 0,50 , os mesmos

outliers foram retirados (dados de 9 experimentos), assim o r2 passou a ser em

média 0,78, com um total de 265 experimentos avaliados. É interessante

ressaltar que estes valores que foram retirados da avaliação, estão associados a

algumas falhas inerentes a este sistema de avaliação, principalmente como: 1) os

dados utilizados referem-se a vacas lactantes, não lactantes, com sistema de

alimentação restrito ou ad libitum, com concentrado sendo ofertado

separadamente ou em rações totais; 2) a avaliação da atividade mastigatória foi

realizada por métodos diferentes, sendo ajustadas pelas vezes que os animais

não estavam sendo avaliados durante a ordenha e pelas diferenças de consumo

observadas no dia da avaliação; 3) foram realizadas comparações entre

experimentos que utilizaram diferentes alimentos, animais, sistemas de

alimentação e instalações (MERTENS 1997). Estes valores, agora padronizados,

apresentaram boa relação entre a atividade mastigatória observada e a predita

pelas equações (FIGURA 3).

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pef do FDN arranjado

pef do FDN padronizado

1.00 1.0 0.95 0.9

0.80 0.8 0.40 0.4

1.00 0.9 0.95 0.9 0.90 0.8 1.00 0.9 0.95 0.8 0.90 0.8

0.85 0.9 0.80 0.9 0.75 0.8 0.60 0.7 0.40 0.4

0.85 0.8

0.80 0.8 0.75 0.7 0.30 0.4 0.70 0.7

0.80 0.8

0.50 0.6 0.30 0.4

0.30 0.4 0.25 0.3 0.50 0.4 0.14 0.1 0.76 0.7 0.10 0.1

TABELA 4 - Fatores de efetividade física (pef) para o FDN dos alimentos em diferentes formas físicas, com base nos dados obtidos de atividade mastigatória de feno de capim grosseiramente picados.

Alimento e forma física pef do FDN Feno de capim Longo 1.00 Grosseiramente picado 0.72 Medianamente picado Seco 0.80 Moído ou peletizado 0.24 Silagem de capim Grosseiramente picada 1.04 Medianamente picada 0.96 Finamente picada 0.90 Silagem de milho Grosseiramente picada 1.09 Medianamente picada 0.93 Finamente picada 0.93 Feno de alfafa Longo 0.82 Grosseiramente picado 0.77 Medianamente picado 0.72 Finamente picado 0.60 Moído ou peletizado 0.54 Silagem de alfafa Grosseiramente picada 0.87 Medianamente picada 0.81 Finamente picada 0.75 Fonte de fibra de não forragem 0.25 Dietas a base de cevada Laminada 0.69 Milho com alta umidade Laminado 0.80 Dietas a base de milho Grosseiramente moído ou laminado 0.94 Medianamente moído 0.40 Misturas complexas Moida 0.22 Peletizada 0.77 r2 com outliers 0.54 Erro padrão 0.14 r2 sem outliers 0.81 Erro padrão corrigido 0.09

Fonte: Adaptado de MERTENS (1997).

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FIGURA 3. Relação entre tempo de atividade mastigatória predito, através do uso dos valores padronizados de fibra detergente neutro fisicamente efetiva (peFDN), comparados com os valores observados. (quanto mais próximos os valores estão da linha central, mais o predito aproxima-se do observado). Adaptado de MERTENS(1997).

Existem outros sistemas biológicos de avaliação da efetividade física da

fibra, com princípios semelhantes deste proposto por NORGAARD (1986) citado

por MERTENS (1997) propôs um sistema de avaliação da estrutura física do

alimento baseando-se no tempo de mastigação, no grau de moagem na ração e

no teor de fibra bruta da ração. Neste sistema, os alimentos são separados em

dois grupos: 1) compreendendo grãos, concentrados e alimentos peletizados; 2)

forragens e fontes de fibra de não forragens. Os valores de tempo de mastigação

são padronizados. Para os alimentos do grupo 1, são gastos 4 a 10 min/kg de MS

(esta variação deve-se ao tamanho das partículas) e para o grupo 2 são gastos

300 min/kg de fibra bruta consumida de um alimento que não foi picado, sendo

este valor multiplicado por um fator. O tempo de mastigação em minutos dividido

pelo consumo de matéria seca em kg é então chamado de índice de fibrosidade.

Existem algumas questões que podem ser levantadas no sistema de

avaliação de NORGAARD (1986), como o uso de fibra bruta e não o de FDN e o

uso de fatores, que por sua vez possuem várias regras.

A avaliação da fibra em detergente neutro efetiva (eFDN) é mais complexa

que a determinação da peFDN, pois seu sistema de avaliação inclui mais

características e responde mais a variações entre os animais e as fontes de

ingredientes presentes na matéria seca da ração ofertada.

ARMENTANO & PEREIRA (1997) apresentam um sistema de avaliação

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biológica de valores de eFDN para fontes de forragens e não forragens. Também

usaram equações onde variáveis como pH ruminal e teor de gordura no leite

foram avaliados, no entanto, uma maior ênfase foi dada ao comportamento

ingestivo dos animais. Na avaliação dos experimentos, todos os coeficientes de

regressão para os alimentos concentrados foram negativos, podendo sugerir que

as fontes de FDN com origem de alimentos concentrados diminuem a

porcentagem de gordura no leite. No entanto, existe certa dificuldade para

analisar dados inerentes a fontes de FDN de concentrados, pois a maioria dos

experimentos possui apenas um tipo de nível de inclusão e uma só fonte de

concentrado no experimento todo. Uma situação ideal seria proporcionada se

existisse um tratamento controle, onde o mínimo de FDN fosse fornecido com o

intuito de manutenção da saúde animal.

Para utilizar bem o conceito de fibra efetiva é bom compreender como os

valores de ef são calculados para cada alimento. O fator de efetividade de um

alimento é medido em experimentos com dietas, segundo metodologia proposta

por ARMENTANO & PEREIRA (1997).

Nestes experimentos se formula uma dieta com teor adequado de forragem

(controle positivo CP). Também se formula uma dieta acidogênica com baixo

conteúdo de forragem (controle negativo CN). Na dieta teste, com subproduto ou

outra fonte de forragem que se quer avaliar, é incluída quantidade suficiente deste

alimento para elevar o conteúdo de FDN desta dieta para teor similar ao teor na

dieta controle (FIGURA 4).

A forragem padrão, da qual a FDN de forragem (FDNF) se origina, nos

Estados Unidos da América, é a silagem de alfafa, por ser uma forrageira típica

do meio-oeste norte americano. Qualquer variável resposta poderia ser avaliada

(mastigação, pH ruminal, mat, perfil de AGCC, etc). A resposta em % de gordura

no leite tem sido utilizada para definição do ef do alimento, pois a resposta animal

em % de gordura no leite ocorre tanto à variação na FDN dietética oriunda de

forragem quanto a variação da FDN oriunda de concentrados (FIGURA 5).

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FIGURA 4 – Fator de efetividade da FDN. Adaptado de ARMENTANO & PEREIRA (1997).

FDNF – FDN forragem

FIGURA 5 – Cálculo do fator de efetividade da FDN. Adaptado de ARMENTANO & PEREIRA

(1997).

LIMA (2003), comparou a efetividade da fibra de volumosos (silagem de

milho, a cana-de-açúcar, cana-de-açúcar tratada com NaOH e feno de alfafa), a

composição química e distribuição de partículas por tamanhos do volumosos é

apresentada na TABELA 5. A dieta com porcentagem baixa de FDNF foi a

silagem de milho baixa (SMB) foi balanceada com 14% de FDN proveniente de

silagem de milho e 22% de FDN toral. A dieta com porcentagem alta de FDNF

silagem de milho alta (SMA) foi balanceada com 22% de FDNF de silagem de

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milho e 28% de FDN total. Estas dietas representavam os controles negativo

(SMB) e positivo (SMA) e foram comparadas à três dietas que incluíam 14% de

FDN de silagem de milho e 8% de FDN proveniente de cana-de-açúcar “in atura”

(cana), cana-de-açúcar tratada com NaOH (canaNaOH) ou feno de alfafa

(f.alfafa), totalizando 22% de FDNF. Estas dietas também foram balanceadas

para 28% de FDN total.

TABELA 5 - Composição química e distribuição de partículas por tamanhos dos volumosos,

Composição Silagem de milho Cana-de-açúcar Cana-de-açúcar + NaOH

Feno de Alfafa

MS, % 28,2 31,7 36,7 91,7 MO, % MS 93,8 95,0 93,2 88,9 MM, % MS 6,2 5,0 6,8 11,1 FDA, % MS 23,9 32,2 33,6 25,9 FDN, % MS 44,5 57,1 58,9 38,5 Lignina, % MS 2,0 4,6 4,5 6,0 Lignina, % FDN 5,2 8,9 8,2 17,0 CNF, % MS 37,5 35,0 31,1 26,0 FDNI, % MS1 16,0 31,7 26,4 19,4 FDAI, % MS 8,4 18,6 14,3 12,7 FDNpd, % FDN2 64,0 44,5 55,2 49,7

TMP, mm3

13,9

12,6

12,6

5,3 < 8 mm 21,5 19,4 18,1 61,2 8 a 19 mm 51,8 66,0 67,3 24,5 > 19 mm 26,7 14,6 14,6 14,3

1FDNI= FDN indigestível. FDN residual após incubação de amostras “in vitro” por 144 horas. 2FDNpd= FDN potencialmente digestível. FDND=[(FDN-FDNI)/FDN]*100 3Distribuição de partículas por tamanhos determinada de acordo com LAMMERS ET AL. (1996). Adaptado de LIMA (2003)

Neste trabalho a produção e composição do leite não diferiram entre

tratamentos (TABELA 6). Como não houve efeito de tratamentos sobre a

porcentagem de gordura no leite, foi possível concluir que a FDN das forragens

testadas apresentaram efetividades de FDN equivalentes à efetividade de FDN

da silagem de milho.

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TABELA 6 - Produção e composição do leite em dietas onde parte da FDN de silagem milho foi substituída por cana-de-açúcar e feno de alfafa

Adaptado de LIMA (2003)

Na TABELA 7 são apresentados os coeficientes de efetividade da fibra da

cana-de-açúcar, cana tratada com NaOH e feno de alfafa. Para efeito de

comparação entre forragens, foi atribuido coeficiente de efetividade igual a 1,0

para silagem de milho, pois ela representou, neste tabalho, a forragem referência

contra a qual todas as demais foram comparadas. Considerando os erros padrões

das estimativas e os intervalos de confiança calculados para estes coeficientes,

conclui-se que as efetividades da FDN não diferiram entre as forragens.

TABELA 7 - Coeficientes de efetividade da FDN da cana-de- açúcar e feno de alfafa

Forragem Coeficiente EP1 IC2 Cana-de-açúcar 1,71 0,35 0,59 – 2,82

Cana tratada

1,29

0,35

0,17 – 2,40

Feno de alfafa

1,10

0,29

0,48 – 1,90

1. EP= Erro padrão do coeficiente 2 Intervalo de confiança do coeficiente Adaptado de LIMA (2003)

A partir dos resultados de teor de gordura no leite e comportamento

ingestivo, o autor conclui que as amplitudes no tamanho de partículas e

composição de FDNF utilizadas neste trabalho não afetaram os coeficientes de

efetividade física da FDN estimados para as forragens.

A formação de uma camada flutuante de partículas grandes no rúmen é

fundamental para reter partículas de fibra potencialmente digestível, regular a

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passagem de alimentos e estimular à ruminação. A espessura e compactação

desta camada, denominada de “mat”, também está sendo usada como medida

auxiliar para avaliar a efetividade da fibra (WEIDNER & GRANT, 1994, citados por

LIMA, 2003). A metodologia para avaliar a consistência do “mat”, baseada na

ascensão de um peso inserido no saco ventral do rúmen e submetido à força

constante de um peso externo. O tempo de ascensão polongado deste peso é

indicativo de espessura maior e empacotamento mais rígido (compactação) da

camada flutuante de digesta ruminal. Por outro lado, um tempo reduzido de

ascenção é indicativo de espessura menor e empacotamento menos rígido desta

camada. Assim associada à outras medidas (teor de gordura no leite e tempo de

mastigação), a consistência do “mat” ajuda à explicar melhor variações de

efetividade da fibra (WELCH 1982, citado por LIMA 2003) .

4.2.2 Avaliações laboratoriais para efetividade da fibra

A avaliação laboratorial de eFDN e peFDN para alimentos individuais é

possível. Um sistema simples para estimar o peFDN, na metodologia proposta por

MERTENS (1997), onde as partículas são separadas por diâmetro e o

desenvolvimento da metodologia teve como base o experimento conduzido por

POPPI et al, (1985), que avaliaram a distribuição das partículas por tamanho na

digesta e nas fezes de ovinos e bovinos e concluíram que as partículas da digesta

ruminal, retidas na peneira de 1,18mm, apresentavam alta resistência à

passagem para os intestinos. A avaliação proposta por MERTENS (1997) pode

ser realizado quando se tem o teor de FDN da fonte de alimento e a porcentagem

de partículas retidas na peneira de 1,18 mm (TABELA 8).

Esta teoria baseia-se na passagem das fibras pelo trato digestório, pois as

partículas de fibra encontradas nas fezes dos ruminantes são inferiores a 1,18

mm, e portanto, somente as partículas que possuem maior dificuldade em

transitar pelo rúmen são as que induzem a atividade mastigatória (MERTENS,

1997).

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TABELA 8 - Estimativa de peFDN de alimentos usando medidas químicas e físicas em laboratório.

a Fatores efetivamente físicos padronizados baseados na atividade de mastigação b Foi feita uma movimentação vertical para separação das partículas. Fonte: Adaptado de MERTENS (1997).

A proposta para avaliação da efetividade física do FDN utilizando métodos

laboratoriais baseia-se em três considerações principais: 1) o FDN é

uniformemente distribuído por toda a partícula; 2) a atividade mastigatória é

equivalente a todas as partículas retidas na peneira de 1,18 mm; 3) a fragilidade

da partícula (facilidade com que a mesma reduz seu tamanho) não é diferente

entre as fontes de FDN (MERTENS, 1997).

É conveniente ressaltar que a efetividade física das partículas de alimento

está relacionada com vários outros fatores além do consumo de matéria seca e o

tamanho da mesma, como: formato da partícula, fragilidade, umidade, tipo de

conservação e a proporção entre o tempo de alimentação e o tempo de

ruminação (MERTENS, 1997).

Segundo NUSSIO et al, (2006), outra metodologia para avaliação da

distribuição do tamanho de partículas em forragens e dietas completas utilizando

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o sistema de peneiras chamado PSPS (Penn State Particle Separator)

desenvolvida por LAMMERS et al. (1996) foi desenvolvida baseada na padrão de

determinação do tamanho de partícula de forragens, sendo um método rápido,

barato e aplicável em condições de campo, para avaliação da distribuição da

partícula por tamanho dos alimentos (principalmente forragens e rações

completas). Neste caso, as partículas são separadas pelo comprimento, e o uso

dessa metodologia tem como resultado maior tamanho médio de partícula. Os

autores descrevem que a peFDN pode ser mensurada como uma proporção da

MS retida nas peneiras de 19 e 8 mm, multiplicando pela porcentagem de FDN da

dieta, obtendo-se assim a peFDN>8, de acordo com a fórmula:

peFDN>8 = (% MS retida 19-8mm) x % FDN dieta

Segundo NUSSIO et al, (2011) uma nova versão do PSPS (Kononoff et al.

2003) é construída a partir de 3 peneiras com aberturas de 19, 8 e 1,18 m e uma

bacia sólida no fundo, permitindo a estimativa da peFDN>1,18 conforme a

metodologia de Mertens (1997). De acordo com Zebeli et al. (2006) a quantidade

de peFDN em uma dieta foi maior quando estimada como peFDN>1,18 do que

quando estimada como peFDN>8. Isto ocorre porque peFDN>1,18 contém um

maior pool de partículas retidas nas peneiras menores (e.g. partículas maiores do

que 1,18 mm e menores do que 8 mm). Resultados de pesquisas (Kononoff et al.,

2003) mostraram que a proporção deste pool pode variar de 30 a 50% na dieta

completa. Beauchemin et al. (2003) reportaram uma peFDN 50% maior na dieta

completa quando estimada como peFDN>1,18 comparada com peFDN>8, já que

esta não considera partículas menores que 8 mm ou concentrados floculados,

diferentemente da peFDN>1,18.

Em adição a avaliação da efetividade física da fibra (peFDN), os métodos

laboratoriais utilizados para avaliar a efetividade da fibra (eFDN), incluem

os seguintes fatores: 1) capacidade intrínseca de tamponamento ou capacidade

de neutralização; 2) habilidade de abaixamento do pH; 3) tipo e padrão dos

produtos finais que serão proporcionados para absorção; 4) taxa e extensão da

fermentação associada a compostos de baixa ou alta fermentabilidade. Como a

principal diferença entre o peFDN e o eFDN em forragens é o tamanho de

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partícula e não a composição química, fica evidente a alta correlação entre essas

duas avaliações, e uma simples equação de regressão é suficiente para

predizer eFDN a partir de peFDN. Uma exceção a esta colocação se faz

necessário quando tratamos de leguminosas (devido seu alto poder tampão) e

fontes de fibra originadas de não forragens e subprodutos. Um fator que deve ser

associado é a quantidade de gordura presente na dieta e a proporção

acetato:propionato após a fermentação, pois estes também são fatores que

podem alterar a porcentagem de gordura no leite (SWAIN E ARMENTANO,1994).

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5 EXIGÊNCIAS DE FIBRA EFETIVA

A necessidade de fibras na dieta para ruminantes está relacionada com a

prevenção de acidoses, erosão no epitélio ruminal, abscessos hepáticos,

depressão na gordura no leite, laminites e alterações no padrão de fermentação

ruminal. Destes fatores, a manutenção da porcentagem de gordura do leite tem

sido o fator mais utilizado para avaliação, devido a seu impacto econômico nos

sistemas de produção. Entretanto, a baixa quantidade de fibra na dieta pode

afetar o desempenho animal sem diminuir significativamente a produção de

gordura no leite, podendo outros fatores como relação acetato:propionato, pH

ruminal e atividade de mastigação, serem utilizados para definição de

exigências de fibras para vacas leiteiras (NUSSIO et al, 2006).

MERTENS (1997), sumarizou 213 combinações de tratamentos em 36

citações tentando estabelecer uma relação entre mastigação e exigência de

peFDN para manter a porcentagem de gordura no leite (FIGURA 6) e a partir

destes dados esse autor estabeleceu que o teor mínimo de peFDN necessário

para teor de gordura no leite em 3,4% seria 19,7% da MS.

FIGURA 6. Relação entre fibra em detergente neutro fisicamente efetiva (peFDN) e porcentagem de gordura no leite observados.

(Fonte: Adaptado de Mertens, 1997).

O autor demonstra que para fatores biológicos, como porcentagem de

gordura no leite e pH ruminal (FIGURA 7), o aumento não ocorre indefinidamente,

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mas alcança um plateau relacionado principalmente ao estado fisiológico e ao

potencial genético do animal.

FIGURA 7. Relação entre pH ruminal observado ajustado para os

efeitos da fibra em detergente neutro fisicamente efetiva (peFDN). (Fonte: Adaptado de Mertens, 1997).

Os dados de pH ruminal compilados na Figura 4 resultam de 114

observações provenientes de 26 citações reunidas por Mertens (1997), para

determinar as exigências em fibra fisicamente efetiva pelo pH ruminal. O resultado

das equações sugere que o consumo de 4,4 kg/dia de peFDN ou a concentração

de 22,3 % na matéria seca da ração é necessária para manter o pH médio em

torno de 6.

Com base também nesta proposta, MERTENS (2000) citado por NUSSIO

et al, (2006) sugeriu que a formulação de rações para vacas leiteiras que visam o

pH ruminal e teor de gordura no leite deve conter, no mínimo, 21% de peFDN,

admitido-se uma amplitude de 19 a 23% de peFDN na MS da ração. O

deslocamento do ponto médio em direção a um dos extremos depende de fatores

que afetam a atividade de mastigação, da produção de ácidos no rúmen, das

variações na composição das rações, do manejo, da capacidade natural dos

alimentos para o tamponamento do rúmen e/ou da suplementação com

tamponantes.

Em uma compilação de 45 experimentos, ZEBELI et al. (2008) encontraram

resultados semelhantes a MERTENS (1997) (FIGURA 8).

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FIGURA 8 Adaptado de ZABELI et al, 2008.

5.1 Recomendações de FDN

De acordo com o NRC (2001), a recomendação de FDN total na dieta de

vacas leiteiras para dietas com alfafa ou silagem de milho como forragem

predominante e milho moído como fonte principal de amido é de 25% da matéria

seca da dieta, com uma condição de 19% da MS sendo FDN de forragem. Outro

ponto destacado pelo NRC (2001) sugere que embora vacas possam apresentar

habilidade para tolerar bem este tipo de dieta, estas recomendações são para

situações bastante específicas (dietas de vacas em lactação quando o tamanho

de partícula da forragem é adequado, o milho é a principal fonte de amido e as

rações são fornecidas em mistura total).

Dietas com tamanho de partícula de forragem reduzido, com fontes de

amido com alta disponibilidade ruminal, com menos de 19% de FDN de forragem

e não fornecidas em mistura total podem requerer concentrações mínimas de

FDN mais elevadas. Portanto, segundo o NRC (2001) a recomendação mínima

pode não ser considerada como a concentração ótima. NUSSIO et al. (2006)

apresenta um esquema resumindo os principais fatores relacionados às

concentrações de FDN de forragem em rações, compilando dados propostos por

três trabalhos (Allen, 1997; NRC, 2001), conforme mostra a FIGURA 9.

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FIGURA 9 - Porcentagens de ajuste de FDN de forragem em função do manejo da alimentação

e composição das rações (NRC, 2001). (Adaptado de Nussio et al., 2006)

Da mesma forma, o NRC (2001) decidiu sugerir ajustes para as

recomendações de FDN total baseadas nas concentrações de FDN de forragem

das rações. A TABELA 7 apresenta os valores recomendados para ajustes com

teores de FDN de forragem abaixo de 19% da MS. De acordo com o sistema, o

teor de FDN de forragem pode ser reduzido para 15% da MS total somente em

condições quando a fonte de forragem é substituída por fontes de FDN não

forragem (subprodutos fibrosos) como caroço de algodão ou farelo de glúten de

milho (Refinazil®), com a condição de se elevar o teor de FDN total da dieta.

De acordo com GRANT (1997), a origem da fonte de fibra, forragem ou não

forragem, resulta em diferenças consideráveis quanto à efetividade e atividade de

mastigação, principalmente devido a diferenças no tamanho de partículas e

retenção ruminal da fibra. ARMENTANO & PEREIRA (1997) verificando a

interação entre fontes de fibra oriunda de forragens e não forragens observaram

que, em média, as concentrações de FDN e CNF nas dietas apresentam

correlação negativa.

Segundo os autores, se os outros nutrientes forem mantidos constantes,

exceto o FDN e CNF, uma mudança na concentração de FDN de 33 para 28% da

MS (redução de 15%) aumentaria em média os CNF de 40 para 45% da MS da

ração (aumento de 11%). Entretanto, devido à variações nas concentrações de

PB e gordura na dieta, esta correlação nem sempre é perfeita.

Outro ponto importante é que a maioria das fontes de FDN não forragem

são significativamente menos efetivas em manter a porcentagem de gordura no

leite que forragens. Baseado em três estudos (ALLEN, 1997; MERTENS, 1997), o

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NRC (2001) concluiu que o valor médio de efetividade de fontes de FDN não

forragem era em torno de 50% daquela apresentada de fontes oriundas de

forragem. Com base nestes estudos, para cada decréscimo em uma unidade

percentual de FDN de forragem (como porcentagem da MS) abaixo de 19%, a

concentração de FDN total na dieta recomendado aumenta 2 unidades

percentuais e a concentração de CNF máxima reduz uma unidade percentual,

conforme mostra a TABELA 9.

TABELA 9 - Concentrações mínimas recomendadas (% MS) de FDN total e de forragem e concentrações máximas recomendadas de carboidratos não fibrosos (CNF) para dietas de vacas em lactação quando o tamanho de partícula da forragem é adequado, o milho é a principal fonte de amido e as rações são fornecidas em mistura totala

FDN forragem mínimob

FDN dieta mínimo

CNF dieta máximoc

FDA dieta mínimod

19 e 25 e 17 e 44 e 18 27 18 42 17 29 19 40 16 31 20 38 15 33 21 36

a valores nesta Tabela são baseados na suposição de que a composição atual dos alimentos foi avaliada; os valores podem não ser apropriados quando dados de tabelas de composição de alimentos são utilizadas; b todos os alimentos contendo quantidades consideráveis de material vegetativo foram consideradas forragens; c CNF foram calculados por diferença: 100 – (%FDN + %PB + %Gordura + %Cinzas); d Recomendações mínimas de FDA na dieta foram calculadas com base nas concentrações de FDN; e Rações que contém menos fibra (FDN de forragem, FDN total, FDA total) que os valores mínimos apresentados e mais que 44% de CNF não devem ser fornecidas (Fonte: NRC, 2001).

Segundo o Professor Dr. MARCOS NEVES, da Universidade Federal de

Lavras, em texto não publicado, o grande problema das recomendações de

carboidratos do NRC (2001) são o fato das dietas preconizadas não conterem o

mesmo teor de eFDN (TABELA 7). Este cálculo assume que o ef da FDNF seria

1,0 e o ef da FDN em concentrados seria 0,5. Como as dietas não são iso-FDN

dificulta a incorporação destes dados em uma planilha computadorizada.

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TABELA 7 - Cálculo da concentração eFDN nas recomendações de carboidratos do NRC(2001) – Assume ef=0,5 para FDNC e ef=1,0 para FDNF

Tabela 10 – Adaptado de MARCOS NEVES.

De acordo com o mesmo autor uma solução para tornar útil a

recomendação de carboidratos do NRC (2001) seria por redução de ef da FDN

dos concentrados. Apesar do texto do livro admitir que o valor 0,5 para a ef da

FDN em concentrados é condizente à literatura publicada no assunto, a utilização

deste valor de efetividade para a FDN torna a utilização do conceito de eFDN

inviável, pelo exposto acima (TABELA 10). A adoção de um valor de efetividade

de 0,33 em vez de 0,5 torna idêntico o conteúdo de eFDN nas dietas

recomendadas (TABELA 11). Neste caso o conteúdo de eFDN nas dietas seria

21% da MS, e não 22%. Apesar desta ser uma atitude empírica, esta parece ser a

única maneira viável para que o conceito de fibra efetiva seja adotado.

Segundo o mesmo autor, o fator 0,33 é uma estimativa conservadora da ef

em subprodutos fibrosos (TABELA 12). Como o efeito de dietas com baixo

conteúdo de FDN oriundo de forragens e alto nível de FDN oriundo de

concentrados sobre a incidência de distúrbios digestivos, como torção de

abomaso, ainda é incerto, a atitude conservadora na formulação pode ter

vantagens. O menor valor de ef induz uma maior inclusão de FDN oriunda de

concentrados na dieta e reduz o teor de CNF, o que torna a dieta menos

acidogênica e, portanto, mas segura para o animal.

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TABELA 11 Conteúdo de eFDN nas dietas preconizadas pelo NRC (2001). Assume que a efetividade da FDN em concentrados é 33% da efetividade da fibra em forragens, a última definida como 1.

Tabela 11 – Adaptado de MARCOS NEVES

TABELA 12 Valores de ef baseados em % de gordura no leite.

Tabela 12 – Adaptado de MARCOS NEVES

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As recomendações de exigências de fibra para ruminantes são baseadas

na atividade mastigatória, pH ruminal e manutenção da porcentagem de gordura

no leite proporcionados pela fonte de fibra. Embora isso tenha sido quantificado,

as fontes de fibra de não forragens podem apresentam padrões diferentes de

comportamento químico e físico, portanto podem fugir a regra.

Métodos laboratoriais foram desenvolvidos para estimativas de peFDN,

sendo os dados de eFDN apenas baseados em vacas em lactação. Tanto o

peFDN como o eFDN, são usados para determinar o mínimo de forragem que

pode ser fornecido para o animal sem que isso provoque desaprovações

de caráter econômico. No entanto, isso pode ser alterado quando fontes de fibra

de não forragens, como subprodutos, são utilizadas. Quanto a avaliação

laboratorial de eFDN, mais pesquisas devem ser realizadas visando quantificar

as variáveis proporcionadas pelos métodos in vitro de avaliação.

Os dados utilizados para a elaboração de fatores de efetividade física são

em parte baseados no tamanho de partícula das rações, sendo assim necessário

fixar uma metodologia padrão para este tipo de avaliação.

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