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FACULDADE MERIDIONAL - IMED FACULDADE DE DIREITO Gustavo Coltro ASSÉDIO MORAL E A POSSIBILIDADE DE RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO Passo Fundo 2012

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FACULDADE MERIDIONAL - IMED FACULDADE DE DIREITO

Gustavo Coltro

ASSÉDIO MORAL E A POSSIBILIDADE DE RESCISÃO INDIRET A

DO CONTRATO DE TRABALHO

Passo Fundo

2012

1

Gustavo Coltro

ASSÉDIO MORAL E A POSSIBILIDADE DE RESCISÃO INDIRET A

DO CONTRATO DE TRABALHO

Monografia apresentada ao curso de Direito, da

Faculdade de Direito do Instituto Meridional -

IMED como requisito parcial para obtenção do grau

de Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais, sob

orientação do Professor Me. Júlio César de Carvalho

Pacheco.

Passo Fundo

2012

2

RESUMO

O assédio moral e o assédio sexual nas relações laborais são considerados um problema recente no âmbito da justiça do trabalho, muito embora não seja novidade no mundo jurídico. Por esta razão, aborda-se a rescisão indireta do contrato de trabalho por assédio moral. Embora, o assédio moral não encontre tipificação no ordenamento jurídico trabalhista, existe e vêm sendo coibido em detrimento da dignidade da pessoa humana, elencada como fundamente da República Federativa do Brasil, no artigo 1º, III da Constituição Federal de 1988. Ainda, são considerados espécies do gênero danos morais, sendo possíveis de serem indenizados na justiça do trabalho. Portanto, o que se demonstrou foi a legislação pertinente a rescisão indireta do contrato de trabalho por assédio moral, a fim de coibir a prática de tais atos pelos colegas de trabalhou ou preposto, bem como pelo empregador, indicando a reparação do ato lesivo através de indenizações por danos morais.

Palavras-chave: Assédio Moral. Contrato de Trabalho. Dignidade da Pessoa Humana.

Rescisão.

3

ABSTRACT

Bullying and sexual harassment in employment relations are considered a recent problem in

the labor courts, although not new in the legal world. For this reason, we address the indirect

termination of employment by bullying. While bullying can not find typing in labor law, and

there have been restrained at the expense of human dignity, elencada as justifying the

Federative Republic of Brazil, in Article 1, III of the Constitution of 1988. Still, are

considered species of moral damages, which allows you to be compensated in the labor

courts. So what was shown was the relevant legislation indirect termination of employment by

bullying in order to curb the practice of such acts by co-worked or representative, as well as

by the employer, indicating compensation for the harmful act through compensation for moral

damages.

Keywords: Moral Harassment. Contract of Employment. Dignity of the Human Person.

Termination

4

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO....................................................................................................... 05

1 DIREITO DO TRABALHO E CONTRATO DE TRABALHO............................... 07

1.1 Direito do trabalho........................................................................................... 07

1.1.2 Princípios do Direito do Trabalho................................................................. 08

1.2 Do contrato de trabalho................................................................................... 12

1.3 Da formação e término do contrato de trabalho.............................................. 14

2 O ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO............................................................... 18

2.1 Assédio moral no ambiente de trabalho.......................................................... 18

2.2 Requisitos do assédio moral........................................................................... 21

2.3 Aspectos legais que envolvem o assédio moral............................................. 24

3 RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO

POR ASSÉDIO MORAL........................................................................................ 31

3.1 Caracterização da rescisão indireta................................................................ 31

3.2 Rescisão indireta: justa causa do empregador............................................... 34

3.3 Assédio moral na legislação trabalhista.......................................................... 36

CONCLUSÃO........................................................................................................ 40

REFERÊNCIAS..................................................................................................... 43

5

INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por finalidade abordar a rescisão indireta do contrato de

trabalho por assédio moral, bem como os danos morais no ambiente de trabalho frente ao

princípio da dignidade da pessoa humana.

A escolha do tema se deve ao fato de que o abuso moral vem se propagando de forma

crescente no âmbito da justiça do trabalho. Este que deveria ser marcado pela cordialidade e

solidariedade torna-se insuportável, transformando-se num ambiente hostil, em um cenário de

verdadeira tragédia, sendo que o presente estudo objetiva demonstrar as consequências de

praticas abusivas no ambiente de trabalho, de ordem moral, psicológica e física.

Para tanto, através do presente estudo objetiva-se juridicamente demonstrar a

configuração que assuma forma de assédio moral enquanto fundamento para a rescisão

indireta do contrato de trabalho.

Pois, além do resguardo dos direitos e garantias fundamentais, é uma maneira de evitar

que o ofensor persista com tal atitude, especialmente quando o empregador deseja excluir

estrategicamente determinado empregado que considera indesejável e incômodo para a

empresa ou quando pretende gratificá-lo ou mantê-lo no emprego através de favorecimentos

que violam preceitos constitucionais e ferem o princípio da dignidade da pessoa humana.

A problemática do estudo concentra-se na discussão acerca da existência do assédio

moral como espécie de danos morais no ambiente de trabalho no campo do emprego estável e

estabelecendo um elo entre a conduta agressora e o dano causado, tanto psíquico quanto

emocional, o qual vem sendo estudado pela doutrina. Portanto, o questionamento abrange se a

configuração de assédio moral é fundamento para a rescisão indireta do contrato de trabalho.

Entende-se que há indivíduos no ambiente de trabalho que sofrem algum tipo de

humilhação, repressão, perseguição, ofensa em sua honra e saúde. Portanto, vítima de assédio

6

moral no trabalho, devendo, ter resguardado os seus direitos em virtude do princípio da

dignidade da pessoa humana.

Desta forma, o primeiro capítulo irá deter-se em abordar sobre o contrato de trabalho,

seus elementos e requisito; de forma sucinta aborda-se também alguns princípios do Direito

do Trabalho. No segundo capítulo aborda-se a dignidade da pessoa humana como princípio

basilar do ordenamento jurídico trabalhista, tratando de forma breve este princípio e o

relacionado ao assédio moral e aos danos morais.

Por conseguinte, o terceiro e último capítulo tratam os aspectos legais inerentes ao

assédio moral no ambiente de trabalho e a rescisão indireta do contrato de trabalho.

Procura-se ainda, evidenciar a responsabilidade do empregador em decorrência de tais

atos dentro do ambiente de trabalho, bem como a possibilidade de despedida com justa causa.

O método de investigação utilizado é o indutivo, pois é este o que mais se adapta ao

campo jurídico, enquanto que o método de procedimento é o bibliográfico, que melhor se

aplica às pesquisas efetivadas na área do direito, pois se pode recorrer à doutrina, artigos,

periódicos, documentos eletrônicos, legislações, dentre outros, os quais fornecem subsídios

para melhor compreensão do desenvolvimento de estudo monográfico.

7

1 DIREITO DO TRABALHO E CONTRATO DE TRABALHO

Aborda-se nesta seção sobre o Direito do Trabalho, princípios informadores e contrato

de trabalho.

Segundo Plá Rodriguez (1978, p. 9-10), ao se afirmar a autonomia do Direito do

Trabalho, tem-se por base os princípios próprios diferentes dos que inspiram outros ramos do

direito. Para que uma disciplina jurídica tenha autonomia, são exigidas três condições, “[...]

que possua um domínio suficientemente vasto, que possua doutrinas homogêneas presididas

por conceitos gerais comuns, distintos dos de outros ramos do direito, e que possua método

próprio”.

Desta forma, faz-se uma abordagem sobre o Direito do Trabalho, comentando também

sobre princípios, antes de adentrar no contrato de trabalho, sua concretização e extinção.

1.1 Direito do trabalho

Tem-se que “Direito” significa um conjunto de normas da vida em sociedade que

buscam expressar e também alcançar um ideal de justiça, traçando as fronteiras do ilegal e do

obrigatório, enquanto que “trabalho” é atividade profissional regular, remunerada ou

assalariada; assim, ao unirem-se os termos “Direito + Trabalho” tem-se um conjunto de

normas que visam alcançar um ideal de justiça a todos que exercem uma atividade

profissional remunerada ou assalariada.

Para Plá Rodrigues (1978, p. 11), mesmo que todos os especialistas não discordem

sobre a existência de princípios próprios do Direito do Trabalho, são poucos os que se

preocupam em expô-los e em estudar os problemas relacionados a ele. O autor defende a

8

importância do tema “Princípios de Direito do Trabalho” por acreditar tanto na função

fundamental que eles exercem em toda disciplina, como na sua permanente evolução.

Portanto, “[...] o Direito do Trabalho necessita apoiar-se em princípios que supram a

estrutura conceitual, assentada em séculos de vigência e experiência possuídas por outros

ramos jurídicos”, como diz Real (apud Plá Rodrigues, 1978, p. 11).

A colocação do autor remete ao entendimento que o Direito do Trabalho é um direito

em constante formação, em razão das evoluções sociais, culturais, econômicas e também das

relações de trabalho que se transformam dia-a-dia.

1.1.2 Princípios do Direito do Trabalho

O Direito do Trabalho, como disciplina autônoma, possui princípios próprios, sem

excluir a aplicação dos princípios gerais de direito, nos termos do artigo 8°1 da Consolidação

das Leis do Trabalho (CLT), que servem de instrumentos de interpretação e integração dos

variados institutos que remetem às relações trabalhistas.

A propósito, Martins destaca que:

Os princípios têm várias funções: informadora, normativa e interpretativa. A função informadora serve de inspiração ao legislador e de fundamento para as normas jurídicas. A função normativa atua como uma fonte supletiva, nas lacunas ou omissões da lei. A função interpretativa serve de critério orientador para o intérprete e aplicadores da lei. (2005, p. 95)

1 Art. 8º. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, e, ainda, de acordo com os usos e costumes, o direito comparado, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público. Parágrafo único. O direito comum será fonte subsidiária do direito do trabalho, naquilo em que não for incompatível com os princípios fundamentais deste.

9

Plá Rodrigues (2000, p. 63) elenca os seguintes princípios próprios do direito do

trabalho: princípio da proteção; princípio da irrenunciabilidade; princípio da primazia da

realidade; princípio da continuidade; princípio da razoabilidade e princípio da boa-fé.

O princípio da proteção tem por fundamento a própria razão de ser do Direito do

Trabalho. A legislação do trabalho é voltada para a proteção do trabalhador, por se encontrar

em posição de desigualdade perante o empregador. Desiguala-se no plano jurídico,

justamente, para atingir-se uma igualdade inexistente no plano concreto; se a intenção da lei é

a de proteger o hipossuficiente, neste diapasão deve seguir o intérprete. (PLÁ RODRIGUES,

1978, p.30)

Este princípio se expressa de três formas: nas regras in dubio, pró-operário, aplicação

da norma mais favorável e permanência da condição mais benéfica. A primeira indica que o

juiz ou intérprete diante de várias interpretações possíveis de uma norma deve optar pela que

seja mais favorável ao trabalhador. A segunda, regra da aplicação da norma mais favorável

determina que, no caso de existir mais de uma norma aplicável, ambas válidas e eficazes,

deve-se optar por aquela que seja mais favorável ao trabalhador, ainda que se subvertam os

critérios clássicos de hierarquia das normas. Por último, a regra da permanência da condição

mais benéfica significa que uma norma não pode vir a diminuir as condições mais favoráveis,

que até então eram asseguradas ao trabalhador. (MARTINS, 2005, p. 97)

A importância do princípio da proteção para o Direito do Trabalho, é inquestionável e

deve nortear a interpretação das normas jurídicas trabalhistas.

Segundo Plá Rodrigues (2000, p. 68-69), o princípio da irrenunciabilidade de direitos,

refere-se ao que não pode ser renunciado. Ou seja, este princípio deve ser entendido como a

não-possibilidade de privar-se voluntariamente, em caráter amplo e por antecipação, dos

direitos concedidos pela legislação trabalhista. Entende o autor, que a noção deve abranger

tanto a privação ampla como a restrita, tanto a que se realize por antecipação como a que se

efetue posteriormente, apresentando a sua definição sobre a irrenunciabilidade: “a

impossibilidade jurídica de privar-se voluntariamente de uma ou mais vantagens concedidas

pelo direito trabalhista em benefício próprio.” E, ainda:

A renúncia equivale a um ato voluntário pelo qual uma pessoa se desliga de um direito reconhecido a seu favor e o abandona. A proibição de renunciar importa em excluir a possibilidade de poder realizar-se, de maneira válida e eficaz, o

10

desligamento voluntário dos direitos, no âmbito alcançado por aquela proibição. (PLÁ RODRIGUES, 2000, p. 68)

O princípio da irrenunciabilidade fundamenta-se tanto no princípio da

indisponibilidade, como no caráter imperativo das normas trabalhistas. E, independente de seu

fundamento, os direitos trabalhistas entendidos de uma forma ampla são irrenunciáveis por

parte do trabalhador, que tem a sua disposição um meio efetivo para preservá-los e,

conseqüentemente, anular qualquer ato que disponha em contrário, regra do artigo 9°2 da

CLT.

O princípio da primazia da realidade significa que tudo aquilo que se sucede no

terreno dos fatos prevalece sobre o documentado. Explica Caldera (apud PLÁ RODRIGUES,

2000, p. 76-78) que: “é, pois, o fato real que apareça das relações verdadeiramente existentes,

o que se deve procurar sob a aparência, muitas vezes simulada, de contratos de direito

comum, civil ou comercial.”

Por sua vez, segundo Martins, o princípio da continuidade da relação de emprego, leva

a presumir:

[...] que o contrato de trabalho terá validade por tempo indeterminado, ou seja, haverá a continuidade da relação de emprego. A exceção à regra são os contratos por prazo determinado, inclusive o contrato de trabalho temporário. A ideia geral é a de que se deve preservar o contrato de trabalho do trabalhador com a empresa, proibindo-se, por exemplo, uma sucessão de contratos de trabalho por prazo determinado. (2005, p. 99)

Observa-se a importância do vínculo de trabalho duradouro, garantia de estabilidade,

consequência do progresso social, econômico, político e cultural, viabilizando uma base mais

sólida e digna, inclusive no aspecto do bem-estar físico, mental e social do trabalhador. Pois,

no caso do Direito do Trabalho, os princípios próprios deste ramo especial do direito são

fundamentais para a interpretação de suas normas, considerando ainda o conteúdo fortemente

humanista do Direito do Trabalho e o princípio da dignidade da pessoa humana como

postulado máximo.

2 Art. 9º. Serão nulos de pleno direito os atos praticados com o objetivo de desvirtuar, impedir ou fraudar a aplicação dos preceitos contidos na presente Consolidação.

11

Em relação ao princípio da razoabilidade, Camino argumenta que não é peculiar ao

Direito do Trabalho, porém,

[...] adquire importância também nessa área do direito porque, de certa forma, constitui o contrapeso necessário do princípio da proteção, uma espécie de seu redutor ou de fator de contenção. Isso porque a ideia de proteção do hipossuficiente, levada às últimas consequências, pode consagrar absurdos que acabam por negar o próprio princípio, “virar o fio”, romper o ponto de equilíbrio necessário à sustentação de todo o arcabouço doutrinário do direito do trabalho. (2003, p. 118)

Há possibilidade de estabelecer algumas premissas sobre o princípio da razoabilidade,

ou seja, reforça o princípio protetivo, vem em favor da realidade concreta, correlaciona-se

com o que é razoável e o que é real, e, é provavelmente o menos rígido dentre os princípios

juslaborais. E, ainda, remete ao entendimento de que o ser humano, em suas relações

trabalhistas, deve proceder conforme a sua razão. Embora não seja um princípio exclusivo do

Direito do Trabalho, trata-se de um princípio geral de direito. (CAMINO, 2003, p. 118)

Em última análise, sobre princípios aborda-se, o princípio da boa-fé, o qual explica

Camino é identificado por doutrinadores como,

[...] princípio do rendimento ou da colaboração segundo o qual conclamam-se empregados e empregadores a despender o máximo de seus esforços e da capacidade profissional dos primeiros e de empreendimentos dos segundos com o fito de impulsionar a produção e o progresso nacional. Em determinado momento histórico, tal princípio presidiu as relações entre o Estado nazi-facista e o capital e o trabalho, quando se erigiu a empresa à instituição nacional, na qual se desenvolvia uma relação de colaboração entre empregado e empregador, com vista ao engrandecimento do Estado. (2003, p. 119)

Para Plá Rodriguez (1978, p. 269), o princípio da boa-fé enquanto princípio específico

do Direito do Trabalho deriva-se do que é ou foi o princípio do rendimento. Para o autor,

quando se acredita que há obrigação de ter rendimento no trabalho, é porque se parte da pré-

suposição de que o trabalhador deve cumprir seu contrato de boa-fé e entre as exigências da

mesma se encontra a de colocar o empenho normal na concretização da tarefa determinada.

Desta forma, pode-se dizer que a importância dos princípios gerais do direito

apresenta-se para firmar os fundamentos do Direito. Assim, os princípios gerais de direito se

apresentam, com a função de importante fonte subsidiária do Direito.

12

1.2 Do contrato de trabalho

Por contrato, de forma abrangente, tem-se que se trata de um pacto entre duas ou mais

pessoas, que se obrigam a cumprir o que foi entre elas combinado sob determinadas

condições; juridicamente é o acordo de vontades entre as partes, com o fim de adquirir,

resguardar, transferir, modificar, conservar, ou extinguir direitos. Quando se trata de contrato

individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso entre o empregado e o empregador, que

constitui uma relação de emprego.

Segundo Oliveira (1993, p. 64-65), o contrato de trabalho tem origem na prestação

efetiva dos serviços e não no acordo abstrato de vontades. Ganha o elemento objetivo

intensidade sobre o elemento subjetivo.

Afirma Plá Rodriguez (1978, p. 80), que a existência de uma relação de trabalho

depende, não do que as partes tiverem pactuado, mas a situação real em que se encontra o

trabalhador. Salienta, portanto, que a aplicação do direito do trabalho depende menos de uma

relação jurídica subjetiva do que de uma situação objetiva cuja existência é independente do

ato que condiciona sua origem.

Para Martins: (2005, p. 114), o contrato de emprego é espécie do contrato de trabalho,

distinção importante no Direito do Trabalho:

Contrato de trabalho é gênero, e compreende o contrato de emprego. Contrato de trabalho poderia envolver qualquer trabalho, como o do autônomo, do eventual, do avulso, do empresário etc. Contrato de emprego diz respeito à relação entre empregado e empregador e não a outro tipo de trabalhador. Daí por que se falar em contrato de emprego, que fornece a noção exata do tipo de contrato que estaria sendo estudado, porque o contrato de trabalho seria o gênero e o contrato de emprego, a espécie. (2005, p. 114)

Contudo, a denominação dominante é contrato de trabalho, como expressa, inclusive

os artigos3 da CLT.

3 Art. 442 - Contrato individual de trabalho é o acordo tácito ou expresso, correspondente à relação de emprego. Parágrafo único - Qualquer que seja o ramo de atividade da sociedade cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados, nem entre estes e os tomadores de serviços daquela.

13

Carrion (1999, p. 440-443) enfoca que para conceituar o contrato de trabalho a

doutrina vincula-se aos elementos caracterizadores da noção de empregado, os que constam

no artigo 3°4 da CLT.

Segundo Moraes Filho (1971, p. 206), não se pode negar a origem contratual da

relação do trabalho. É verdade que se aceitam relações de emprego que não se originaram de

um acordo de vontades. Pode ocorrer até na prestação de trabalho desconhecida pelo

empresário, mas cuja organização usufrui o esforço desenvolvido.

Há que se acrescentar de um lado que tais situações pertencem à patologia, de outro se

vê certas hipóteses sendo assimiladas ao contrato de trabalho, sem sê-lo; em outras, há um ato

legislativo, decretado com a finalidade de que a vontade estatal substitua a vontade de um dos

contratantes. O contrato de trabalho é de direito privado, consensual, sinalagmático (bilateral),

comutativo (equivalência das prestações), de trato sucessivo, oneroso e subordinativo.

Magano conceitua contrato de trabalho como, “[...] o negócio jurídico pelo qual uma

pessoa física se obriga, mediante remuneração, a prestar serviços, não eventuais, a outra

pessoa ou entidade, sob a direção de qualquer das últimas” (apud MARTINS, 2005, p. 116).

Assim, verifica-se que contrato de trabalho é negócio jurídico entre uma pessoa física,

empregado, e uma pessoa física ou jurídica, empregador, formadores então, do negócio

jurídico, constituída da relação trabalhista, onde a discussão envolve as condições de trabalho

a ser aplicadas à relação entre empregado e empregador; já que o contrato representa um

pacto de atividade, neste há comprometimento com a continuidade na prestação de serviços,

os quais devem ser remunerados e dirigidos por aquele que obtém a referida prestação;

Art. 442-A. Para fins de contratação, o empregador não exigirá do candidato a emprego comprovação de experiência prévia por tempo superior a 6 (seis) meses no mesmo tipo de atividade. (Incluído pela LEI 11.644 de 2008) Art. 443 - O contrato individual de trabalho poderá ser acordado tácita ou expressamente, verbalmente ou por escrito e por prazo determinado ou indeterminado. § 1º - Considera-se como de prazo determinado o contrato de trabalho cuja vigência dependa de termo prefixado ou da execução de serviços especificados ou ainda da realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada. § 2º - O contrato por prazo determinado só será válido em se tratando: a) de serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo; b) de atividades empresariais de caráter transitório; c) de contrato de experiência. 4 Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. Parágrafo único - Não haverá distinções relativas à espécie de emprego e à condição de trabalhador, nem entre o trabalho intelectual, técnico e manual.

14

características que evidenciam a existência de um acordo de vontades. (MARTINS, 2005, p.

116)

Compreende-se, assim que tecnicamente, contrato de trabalho é definido como um

acordo de vontades pelo qual uma parte coloca à disposição de outra seus serviços pessoais,

não eventuais e subordinados, mediante contraprestação de natureza salarial. Porém cabe

abordar algumas diferenciações referentes a contrato, bem como, os requisitos e

características do contrato de trabalho.

1.3 Da formação e término do contrato de trabalho

O contrato de trabalho não se confunde com outros contratos de natureza civil. A

propósito, Nascimento (2001, p. 153) argumenta que: “o contrato de trabalho não deve ser

confundido com outras figuras. Por isso, é útil precisar a sua diferença de outros contratos não

regidos pela CLT”.

Como, por exemplo, a distinção entre contrato de trabalho e contrato de sociedade, que

se faz através dos sujeitos e do objeto. Ou seja, no contrato de trabalho, os sujeitos são o

empregado e o empregador; no contrato de sociedade são os sócios. No primeiro, o objeto é a

prestação de serviço em troca de remuneração, enquanto que no segundo, o objeto é a

obtenção do lucro pelos sócios, pessoas que entre si não mantêm uma relação de

subordinação, mas, sim, de igualdade. (NASCIMENTO, 2001, p. 153)

Complementa Martins, que um traço importante do contrato de trabalho é a

inexistência do risco da atividade ou do empreendimento, que é característica do contrato de

sociedade:

[...] No contrato de sociedade, os sócios podem ter prejuízos; no contrato de trabalho, não, pois os riscos da atividade econômica devem ser do empregador. O trabalhador pode, entretanto, receber lucros, mas essa não é a regra. No contrato de trabalho, há uma relação de credor e devedor entre as partes, pois o empregado deve prestar serviços, sendo credor do salário fixado; o empregador deve remunerar o empregado para receber a prestação de serviços. Na sociedade não existe essa relação de devedor e credor, que pode haver em relação aos sócios com a sociedade. (2005, p. 117)

15

Há também distinção entre contrato de trabalho e contrato de empreitada, e também

está relacionado ao sujeito e objeto. Pois, na empreitada, empresa, firma, organização da qual

se contratam obras por empreitada, o sujeito é o empreiteiro, pessoa física ou jurídica e o

objeto é o resultado do trabalho, a obra a ser produzida, além de que o empreiteiro não é um

trabalhador subordinado, mas, um trabalhador autônomo que concretiza sua atividade

profissional por conta própria. (NASCIMENTO, 2001, p. 154-155)

E, ainda pode-se destacar a distinção entre contrato de trabalho e contrato de mandato,

sendo que este “[...] é a representação que o mandatário faz em relação aos poderes que lhe

foram outorgados pelo mandante” (MARTINS, 2005, p. 117). O mandato é o contrato que

designa duas vontades, uma que dá a outra uma incumbência, outra que a recebe e aceita. Ele

pode ser gratuito, enquanto que o contrato de trabalho é sempre oneroso.

Pode-se inferir que a liberdade contratual é a soma de várias liberdades, relacionadas a

liberdade de contratar ou deixar de contratar, a de eleger as pessoas com quem se contratar, a

de determinar o contrato a ser celebrado e de negociar o seu conteúdo. Portanto, não se

confundir com a obrigatoriedade ou vinculatividade, a qual consiste na vinculação das partes

contraentes ao estipulado no contrato. É a regra de que o contrato é lei entre as partes.

Uma vez celebrado o contrato com todos os pressupostos e requisitos necessários à sua

validade, ele deve ser executado pelas partes como se suas cláusulas fossem preceitos legais

imperativos, pacta sunt servanda, entendida como os acordos devem ser cumpridos.

Pelo exposto até o momento, identifica-se um caráter fortemente contratual na relação

de emprego, o qual lhe confere a natureza jurídica de um contrato. A caracterização da relação

empregatícia é reconhecida como procedimento primordial ao direito do trabalho, tendo em

vista que delimita seu espaço de aplicação, sendo assim compreendida sempre que estiverem

presentes os requisitos trazidos pelos artigos 2º e 3º5 da CLT.

De acordo com Nascimento (2001, p. 160-163), são cinco os requisitos legais que

caracterizam o contrato de trabalho:

5 Art. 2º - Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço. [...] Art. 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário. [...]

16

- Pessoa física: pessoa física ou natural, a proteção da lei destina-se ao ser

humano que trabalha e aos seus direitos como: saúde, integridade física, lazer e à sua

vida;

- Continuidade: exercer atividade de modo permanente;

- Subordinação: o empregado é um trabalhador que exerce sua atividade sob

dependência de outrem para quem essa atividade é dirigida. Caso não seja

subordinado, a lei entende que é um trabalhador autônomo. As leis trabalhistas são

voltadas aos trabalhadores subordinados;

- Salário: remuneração ajustada pela prestação de serviços, em razão de contrato de

trabalho; ordenado, vencimentos, remuneração do trabalho prestado, quantia paga diretamente

pelo empregador, requer onerosidade e reciprocidade, deveres das partes;

- Pessoalidade: o contrato é ajustado em função de determinada pessoa, é

intuitu personae.

Como se observa, está presente o requisito da existência de pessoalidade, entendida

como a prestação pessoal de serviços por parte de um trabalhador, o qual não pode se fazer

substituir em suas atividades. Por isto, o contrato de trabalho é classificado como intuito

personae, tendo caráter de infungibilidade no que se refere ao empregado. Portanto, quando o

empregador celebra o contrato de trabalho, objetiva a prestação de serviços daquele

determinado empregado. (NASCIMENTO, 2001, p. 162)

O referido requisito não se estende ao tomador de serviços, pois a redação celetista

adotou o princípio da despersonalização do empregador, na medida em que permite alterações

subjetivas do contrato de trabalho, como ocorre, por exemplo, na sucessão de empregadores.

O elemento constitutivo fático-jurídico é a não-eventualidade que expressa a noção de

permanência típica do contrato de trabalho, pois o mesmo caracteriza-se justamente por ser

um contrato de trato sucessivo. Portanto, a prestação de serviços pessoais somente comporá o

conteúdo do contrato de trabalho se a mesma tiver caráter de continuidade, não se

enquadrando como trabalho esporádico.

Quanto a forma, o contrato de trabalho, como expressa o artigo 443 da CLT, já citado,

pode ser concretizado por escrito ou verbalmente, bastando haver o ajuste entre as partes.

(MARTINS, 2005, p. 137)

17

Explica Nascimento sobre a forma do contrato de trabalho, que:

A lei [...] indica os modos pelos quais se forma essa relação jurídica. [...] o ajuste expresso escrito, quando há contrato por escrito de trabalho. [...] Não há essa exigência legal como princípio. É praxe a forma escrita dos contratos a prazo determinado, mas não há exigência legal. [...] o ajuste expresso verbal, quando entre empregado e empregador há simples troca oral de palavras sobre alguns aspectos e que, por se tratar de um acordo de vontades produzirá efeitos jurídicos, obrigando reciprocamente os interlocutores. (2001, p. 150)

Cabe destacar também a forma entendida como ajuste tácito, que se caracteriza pela

inexistência dos requisitos citados, verbais e escritos. O vínculo empregatício fica

subentendido, envolve a prestação de serviço de alguém sem oposição daquele a quem é

dirigida à ação, levando a deduzir que se trata de vínculo de emprego, geralmente tal forma é

encontrada nos casos denominados de subemprego, são situações onde nada é formalizado,

embora existam elementos tipificadores da relação laboral.

Aborda-se também a distinção, relacionada à duração do contrato do trabalho que

segundo Russomano podem ser por prazo determinado ou por prazo indeterminado:

A diferença substancial entre esses dois tipos de contratos está na previsão de seu término, existente no primeiro e inexistente no segundo caso. O art. 443, da Consolidação das Leis do Trabalho, admite – como realidade histórica – a celebração do contrato por prazo determinado. E mais ainda: seu § 1° amplia (de certo modo exageradamente) o conceito do contrato por prazo determinado, admitindo-o em três hipóteses distintas. (2000, p. 121)

Observa-se que o autor refere-se ao que preleciona a CLT, sobre quando há termo

certo, data prefixada para o término do contrato, quando este está condicionado à execução de

serviços específicos, como, por exemplo, construção de determinada obra ou quando o

término está na dependência de acontecimento futuro, suscetível de previsão aproximada,

como por exemplo, trabalho por safra.

Sustenta Martins (2005, p. 139), que a regra no Direito do Trabalho é a contratação

por tempo indeterminado, em razão do princípio da continuidade do contrato de trabalho,

sendo o prazo determinado uma exceção, de acordo com as determinações legais vigentes.

Desta forma, entende-se que o contrato de trabalho é o instrumento apto a concretizar

a dignidade humana, princípio basilar do ordenamento constitucional, motivo pelo qual, se

passa a tratar na próxima seção, sobre o assédio moral no contrato de trabalho.

18

2 O ASSÉDIO MORAL NO TRABALHO

Atualmente, pode-se dizer que conceitualmente a violência no ambiente de trabalho

encontra-se em plena evolução no mundo jurídico, no sentido de que a importância dos

comportamentos psicológicos equipara-se a mesma que se dá aos comportamentos fiscos.

Pois, é reprovável qualquer comportamento que seja praticado contra o moral do indivíduo,

independentemente do ambiente aonde venha ocorrer já é possível exigir legalmente

reparação por danos morais.

2.1 Assédio moral no ambiente de trabalho

Considerados uma espécie do gênero dano moral, o assédio moral na Justiça do

Trabalho é matéria, de certa forma nova no mundo jurídico laboral e já toma forma através de

discussões e estudos em âmbito nacional e internacional. O assédio moral pode se referir à

hipóteses que não possuem natureza sexual.

Tendo por base a dignidade da pessoa humana, o combate a essas práticas vem

gradativamente surgindo na Justiça do Trabalho, sendo que a solução vem se dando através de

inúmeras indenizações por danos contra quem os pratica.

Os termos assédio e moral têm um amplo significado no meio jurídico. Para fins de

bem defini-los, destaca-se que assédio abrange a insistência impertinente, perseguição,

sugestão ou pretensão constante em relação a alguém. Já, moral envolve um conjunto de

valores inerentes ao ser humano, como honestidade, bondade, virtude, dentre outros,

considerados norteadores das relações sociais e da conduta dos homens.

Hirigoyen (2001, p. 65) define o assédio moral como condutas abusivas, as quais se

manifestam, através de comportamentos, palavras, atos, gestos, escritos que causam dano à

19

personalidade; à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa, pondo em risco

seu emprego ou degradando o ambiente do trabalho.

Pontua Barreto (2002, p. 2), que assediar moralmente, significa efetivar uma

exposição prolongada e repetitiva a condições de trabalho que, deliberadamente, vão sendo

degradadas. Tem origem e propagação nas relações hierárquicas assimétricas; compreendidas

como desumanas e sem ética; marcada pelo abuso de poder e manipulações perversas,

geralmente, concretizada em razão da posição ocupada pelo agressor, o qual se sente seguro,

para manifestar opiniões e efetivar atitudes que causam sentimentos inóspitos.

Moçouçah reforça o exposto, da seguinte forma:

O assediado, não suportando a hostilidade do ambiente de trabalho, vê-se obrigado a pedir demissão ou acaba, nesse sentido, motivando uma dispensa por parte do empregador. […] também em outras ocasiões, o sadismo poderá ensejar o assédio moral, sem necessariamente a intenção de eliminar a vítima do ambiente de trabalho. A tortura psicológica dar-se-ia, portanto, no intento de alimentar a personalidade do assediador. (2009, p. 5)

Verifica-se, assim, que o abuso do poder, de forma repetida e sistematizada durante

um período longo de tempo, constitui a principal característica do assédio moral,

configurando a prática da perversidade no local de trabalho. Entretanto, em se tratando de

assédio moral, o abuso de poder não se dá de uma forma clara e sim subentendida.

De acordo com Nascimento: o assédio moral tem íntima relação com os direitos

personalíssimos:

O assédio moral é uma das formas de dano aos direitos personalíssimos do indivíduo. Dessa maneira, um ato violador de qualquer desses direitos poderá configurar, dependendo das circunstâncias, o assédio moral, o assédio sexual ou a lesão ao direito de personalidade propriamente dita, através da lesão à honra, à intimidade, à privacidade e à imagem. A diferença entre eles é o modo como se verifica a lesão, bem como a gravidade do dano. (2009, p. 1)

20

A perversidade do abuso do poder, de uma maneira simples de interpretar, pode-se

dizer que é a forma reiterada de atitudes humilhantes praticadas contra uma pessoa, que

muitas vezes pode se dar através de pequenos e contínuos ataques.

A não explicitação do conflito é um elemento fundamental, se existe assédio moral, é

justamente porque nenhum conflito pôde ser explicitado. No conflito, as recriminações são

faladas, a guerra é aberta, enquanto que por trás de todo procedimento de assédio moral existe

o não falado o não dito. “Não são expressos em tom de cólera, e sim em tom glacial, de quem

enuncia uma verdade ou uma evidência”. (HIRIGOYEN, 2001, p. 135)

O agressor é frequentemente, mas não necessariamente, o chefe; explica Hirigoyen

(2001), que o assédio moral pode provir do comando hierárquico (vertical), de colegas da

mesma hierarquia funcional (horizontal), da omissão do superior hierárquico diante de uma

agressão (descendente), ou caso raro, quando o poder, por alguma razão, não está com o

comando superior e sim nas mãos do subalterno (ascendente). Mas, quem detém o poder pode

mais facilmente abusar dele, sobre tudo quando se trata de chefes considerados medíocres

profissionalmente, com baixa auto-estima e, conseqüentemente, necessidade de ser admirado

e destacado.

As pessoas mais susceptíveis de se tornarem vítimas do assédio moral são aqueles

empregados que apresentam algumas diferenças com respeito aos padrões estabelecidos

socialmente, culturalmente ou ainda economicamente, que não se enquadram nos grupos já

formados no ambiente de trabalho.

E, neste sentido, Hirigoyen (2001, p. 145) complementa definindo algumas

discriminações comumente observadas; assédio moral por motivos raciais ou religiosos;

assédio em função de deficiência física ou doença; assédio em função de orientações sexuais;

assédio discriminatório de representantes de funcionários e representantes sindicais.

Também pessoas “atípicas”, “excessivamente competentes ou que ocupem espaço

demais”, aliadas à grupos divergentes da administração; “improdutivas” ou temporariamente

fragilizadas por licenças de saúde tornam-se o alvo das perseguições por assédio moral.

Barreto (2002) tipifica os seguintes empregados passíveis de violência no local de

trabalho, da seguinte forma: os adoecidos, os sindicalizados, os acima de 40 anos, os

criativos, os sensíveis à injustiça e ao sofrimento alheio, os questionadores das políticas de

metas inatingíveis e da expropriação do tempo com a família, àqueles que fazem amizades

facilmente e dominam as informações no coletivo.

21

As colocações dos autores demonstram que os efeitos das agressões sofridas pelos

trabalhadores no ambiente de trabalho podem gerar inúmeras consequências, dentre as quais,

distúrbios físicos e psíquicos que podem desencadear o desenvolvimento de doenças, as quais

podem levar a atitudes extremas, inclusive ao suicídio, pois o assédio moral desestrutura

emocionalmente, a vítima, a qual passa a se sentir ameaçada em suas necessidades básicas

como: segurança no trabalho, auto-estima, realização, dentre outras que motivam o

trabalhador em um ambiente de trabalho saudável.

E, sem dúvida, nesse sentido é que o assédio moral é uma conduta perversa, pois acaba

desequilibrando o assediado, no caso o trabalhador.

2.2 Requisitos do assédio moral

O assédio moral é um fenômeno que atinge as relações de trabalho em vários países do

mundo, não sendo um produto apenas de origem nacional, como já dito, além da denominação

de assédio moral, identifica-se também pelas expressões terror psicológico, tortura

psicológica ou humilhações no trabalho. (PAMPLONA FILHO, 2006).

Apesar de reconhecer que a expressão mais dramática do assédio moral está

relacionada ao trabalho subordinado, Pamplona Filho (2006, p. 1079) observa que esse

fenômeno é passível de ocorrência em qualquer ambiente que mantenha uma coletividade

(escolas, corporações militares, entre outros). Por tal motivo, ao formular seu conceito,

prefere delineá-lo de maneira mais abrangente como “uma conduta abusiva, de natureza

psicológica, que atenta contra a dignidade psíquica do indivíduo, de forma reiterada, tendo

por efeito a sensação de exclusão do ambiente e do convívio social”.

Enfatizando a idéia de que o assédio moral se origina não de um caso isolado, mas de

comportamentos repetitivos, Piovesan e Rodrigues salientam que:

Assédio moral é todo comportamento abusivo (gesto, palavra, atitude) que ameaça, por sua repetição, a integridade física ou psíquica de uma pessoa. São microagressões, pouco graves se tomadas isoladamente, mas que, por serem sistemáticas, tornam-se destrutivas. (apud DARCANCHY, 2007, p. 2)

22

Observa-se, assim alguns requisitos indispensáveis ao assédio moral. O primeiro se

refere à conduta abusiva, que tem ligação com a idéia de abuso de direito, de abuso de poder,

e é observado pela atitude do assediador que extrapola os limites aceitáveis, e de alguma

forma procura subjugar outra pessoa no ambiente de trabalho.

O segundo requisito diz respeito à necessidade de repetição e reiteração da conduta

ofensiva e humilhante por tempo prolongado: “[...] o arco temporal deve ser suficientemente

longo para que cause um impacto real e de verdadeira perseguição pelo assediador”.

(NASCIMENTO, 2007, p. 5)

Darcanchy (2007) comenta que, a ação de assédio moral repete-se e prolonga-se, em

razão da vitimização que o agressor busca concretizar, ou seja, no sentido, de “minha vítima

favorita”. Para tanto, é uma agressão pontual, não tem o condão de caracterizar essa forma de

assédio, entretanto, caso este ato isolado represente agressão à honra da pessoa, será

admissível o manejo de uma ação de indenização para reparação dos respectivos danos

morais.

Em relação à reiteração da conduta ofensiva, Guedes informa que:

O terror psicológico não se confunde com o excesso, nem a redução de trabalho, a ordem de transferência, a mudança do local de trabalho, a exigência no cumprimento de metas e horários rígidos, a falta de segurança e obrigação de trabalhar em situação de risco, pouco confortável ou ergonomicamente desaconselhável. O mobbing não é a agressão isolada, a descompostura estúpida, o xingamento ou a humilhação ocasional, fruto do estresse ou do destempero emocional momentâneo, seguido de arrependimento e pedido de desculpa. Cada uma dessas atitudes pode ser empregada pelo agressor para assediar moralmente uma pessoa, mas o que caracteriza o terror psicológico é a freqüência e repetição das humilhações dentro de um certo lapso de tempo6. (2004, p. 2)

A natureza psicológica do ataque também é elemento do assédio moral, pois a conduta

abusiva acaba agredindo os direitos da personalidade, a dignidade e a integridade psíquica do

indivíduo (PAMPLONA FILHO, 2006). O que não é unânime na doutrina, entretanto, é a 6 O mobbing ou terror psicológico não é uma violência restrita do ambiente do trabalho, mas se verifica igualmente na família e na escola. [...] a Psicanálise não tem ajudado as vítimas a se defenderem, levando-as, muitos vezes, a se considerarem cúmplices e culpadas pela situação humilhante, afirma a vitimóloga francesa Marie-France Hirigoyen. (GUEDES, 2004, p. 19)

23

necessidade da presença de dano psíquico-emocional como pressuposto para a ocorrência do

fenômeno.

Pamplona Filho entende não ser necessário o dano psíquico para configurar o assédio

moral. Para corroborar seu posicionamento, argumenta:

[...] a doença psíquico-emocional, como patologia, pode advir do assédio, mas não necessariamente ocorrerá, nem é elemento indispensável, pois o que é relevante, na caracterização do mobbing, é a violação do direito da personalidade, cuja materialização ou prova dependerá do caso concreto. (2006, p. 1082)

Podendo-se, então estabelecer uma relação de assédio moral, com base na sujeição do

trabalhador, neste ponto, abre-se um adendo para auferir que a interpretação jurídica ainda

dominante, afere a ilicitude dos atos pelo primado da autonomia privada pacta sunt servanda,

a intimidade dos trabalhadores está sempre em risco. (GUEDES, 2004, p. 33) Desta forma,

diversas situações de flagrante desrespeito são relativizadas como aspecto normal do contrato

de trabalho em nome do patrimônio do empregador, assunto que será tratado no terceiro

capítulo.

Retoma-se a tratativa sobre os requisitos do assédio moral, que conforme Fonseca

(2007, p. 37), o dano efetivo à integridade psíquica da pessoa é pressuposto para o assédio

moral e deve ser deduzido “[...] tão objetivamente quanto possível, do potencial ofensivo do

fato lesivo”.

Para Nascimento (2007, p. 07), a existência do assédio moral está vinculada à prévia

constatação de dano psíquico-emocional na vítima, por meio de perícia feita por psiquiatra ou

outro especialista da área. Entretanto, faz uma advertência sobre a não configuração do

assédio moral pela falta de dano psíquico, o que “[...] não exime o agressor da devida punição,

pois a conduta será considerada como lesão à personalidade do indivíduo, ensejando o dever

de indenizar o dano moral daí advindo”.

Para completar o conjunto de requisitos que integram o assédio moral, exige-se o

pressuposto da finalidade de exclusão, pois o objetivo principal desse tipo de ação é a

exclusão da vítima do ambiente de trabalho. Nesse sentido, entende Nascimento que:

24

[...] o objetivo principal do assédio moral é a exclusão da vítima, seja pela pressão deliberada da empresa para que o empregado se demita, aposente-se precocemente ou ainda obtenha licença para tratamento de saúde, bem como pela construção de um clima de constrangimento para que ela, por si mesma, julgue estar prejudicando a empresa ou o próprio ambiente de trabalho, pedindo para ausentar-se ou para sair definitivamente. (2007, p. 6)

Refletindo sobre tais requisitos, Fonseca (2007, p. 36) argumenta que o assédio moral

pressupõe ato doloso do agente, ou seja, a “[...] intenção manifesta de excluir ou discriminar

um indivíduo no ambiente de trabalho”.

Da mesma forma, Dallegrave Neto (2004, p. 120) afirma que o assédio moral, só pode

ser admitido na forma dolosa.

Verifica-se que para os autores, não é possível falar em assédio moral quando a

conduta for meramente culposa.

E, ainda, o assédio moral é exteriorizado, geralmente, de maneira sutil, por meio de

um processo que culmina com a exposição da vítima, escolhida por suas qualidades ou

fraquezas, a situações incômodas e constrangedoras, degradando o ambiente de trabalho e

afetando sua produtividade. Na maioria dos casos o assediador o faz de forma não verbal, por

meio de suspiros, sorrisos, trocadilhos, indiferença, olhares de desprezo, tudo para dificultar o

revide da vítima e a percepção por terceiros. (PAROSKI, 2007, p. 06)

Observa-se que se trata de um problema sério que causa danos tanto a saúde física,

como mental do indivíduo, afrontando princípios como o da dignidade da pessoa humana,

quanto à saúde do meio ambiente laboral, desestabilizando o equilíbrio emocional do

indivíduo, através de atitudes que se poderia denominar como “malignidade velada”.

2.3 Aspectos legais que envolvem o assédio moral

Pode-se afirmar que o “assédio moral desvaloriza o trabalho, retira dele toda a sua

dignidade” (FERREIRA, 2004, p. 88), em visível afronta ao ordenamento jurídico vigente,

tanto interno como externo.

25

Com esse entendimento, faz-se mister adentrar no princípio da dignidade da pessoa

humana. Para tanto, faz-se uma distinção entre os termos direitos fundamentais e direitos

humanos:

[...] não obstante tenha também ocorrido uma confusão entre os dois termos, confusão esta (caso compreendida como um uso indistinto dos termos, ambos designados o mesmo conceito e conteúdo) que não se revela como inaceitável em si considerando o critério adotado. Neste particular, não há dúvidas de que os direitos fundamentais, de certa forma, são também sempre direitos humanos, no sentido de que seu titular sempre será o ser humano, ainda que representado por entes coletivos (grupos, povos, nações, Estado). (SARLET, 2007, p. 35).

Sobre a distinção dos termos, interpreta-se que os direitos fundamentais se aplicam aos

direitos inerentes ao ser humano. Portanto, o princípio da dignidade da pessoa humana é um

dos mais importantes, por fazer parte da Declaração Universal dos Direitos Humanos. De

acordo com Stern:

[...] a dignidade, como qualidade intrínseca da pessoa humana, é irrenunciável e inalienável, constituindo elemento que qualifica o ser humano como tal e de não pode ser destacado, de tal sorte que não se pode cogitar na possibilidade de determinada pessoa ser titular de uma pretensão a que lhe seja concedida a dignidade. [...] compreendida como qualidade integrante e irrenunciável da própria condição humana. (apud SARLET, 2007, p. 42-43).

Considera Sarlet (2007, p. 74) que foi a partir do reconhecimento dos direitos do

homem e do cidadão, Revolução Francesa de 1789, que se legitimaram a dignidade da pessoa

humana. Ainda, o autor destaca o vínculo que relaciona o princípio da dignidade da pessoa

humana aos valores de igualdade, liberdade e justiça social no “direito constitucional positivo

vigente”.

26

No Brasil, exigido como fundamental na Constituição Federal de 1988, no artigo 1º,

inciso III7, o princípio da dignidade da pessoa humana impõe a elevação do ser humano ao

ápice de todo o sistema jurídico.

Interpreta-se, assim, que envolve o respeito à integridade física e psíquica das pessoas,

a admissão da existência de pressupostos materiais mínimos para viver e o respeito às

condições fundamentais de liberdade e igualdade.

Sarlet explica que, ao consagrar terminantemente, no título dos princípios

fundamentais, a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do Estado

Democrático de Direito, o constituinte de 1988 ,

[...] além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade e da justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu categoricamente que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não ao contrário, já que o ser humano constitui a finalidade precípua, e não meio

Para Dallari (1998, p. 9), o princípio da dignidade da pessoa humana abrange a preservação da dignidade, dos direitos, contemplando a todos os seres humanos de forma igualitária. Por isso, “deve existir sempre, em todos os lugares e de maneira igual para todos”. Tanto é assim que “o crescimento econômico e o progresso material de um povo têm valor negativo se forem conseguidos à custa de ofensas à dignidade de seres humanos”.

Verifica-se tratar-se de um princípio basilar, por envolver os direitos fundamentais do

ser humano para uma vida digna, portanto, nitidamente ligado ao trabalho, ao respeito, a tudo

que envolve o ser humano.

Afirma Sarlet (2007), que é um “valor guia” de todo o sistema jurídico, de tal modo

que vincula não apenas o administrador e o legislador, mas também o julgador e o operador

do direito. E, ainda:

[...] para a jurisdição constitucional, quando provocada a intervir na solução de determinado conflito versando sobre as diversas dimensões da dignidade, não existe a possibilidade de recusar a sua manifestação, sendo, portanto, compelida a proferir

7 Artigo 1°, Inciso III – “a dignidade da pessoa huma na”. (BRASIL, Constituição Federal, 1988).

27

uma decisão, razão pela qual já se percebe que não há como dispensar uma compreensão (ou conceito) jurídica da dignidade da pessoa humana, já que desta – e à luz do caso examinado pelos órgãos judiciais – haverão de ser extraídos determinadas conseqüências jurídicas. (apud SARLET, 2007, p. 44).

Assim, como atributo intrínseco da pessoa humana, expressando seu valor próprio, a

dignidade não pode ser desconsiderada, razão por que há a proibição de pena de morte, tortura

e aplicação de penas corporais. Pode-se dizer, também que qualquer tratamento que

desequilibre emocionalmente ou psicologicamente o ser humano é indigno e viola preceitos

constitucionais e morais.

Uma vez que a dignidade da pessoa humana conduz a que se reconheça que é o

elemento balizador do Estado Democrático de Direito, o qual concede unidade aos direitos e

garantias fundamentais inerentes à pessoa tão só por ter a condição de ser humano.

Para Sarlet, a dignidade da pessoa humana serve como guia não só dos direitos

fundamentais, mas também de toda a ordem jurídica, nos seguintes termos:

[...] a qualificação da dignidade da pessoa humana como princípio fundamental traduz a certeza de que o artigo 1º, inciso III, de nossa Lei Fundamental não contém apenas (embora também e acima de tudo) uma declaração de conteúdo ético e moral, mas que constitui norma jurídico-positiva dotada, em sua plenitude, de status constitucional formal e material e, como tal, inequivocamente, carregado de eficácia, alcançando, portanto [...] a condição de valor jurídico fundamental da comunidade. Importa considerar, neste contexto, que, na sua qualidade de princípio fundamental, a dignidade da pessoa humana constitui valor guia não apenas dos direitos fundamentais mas de toda a ordem jurídica (constitucional e infraconstitucional), razão pela qual, para muitos, se justifica plenamente a sua caracterização como princípio constitucional de maior hierarquia axiológica-valorativa. (2001, p. 71-72)

Para Ferreira (2004, p. 93), o referido princípio abrange de forma explícita o direito a

“condições dignas de trabalho, mediante um ambiente de trabalho que seja física e

mentalmente sadio [...], o que é, preconizado pela própria Carta Política com o objetivo de

assegurar os direitos conquistados pelos trabalhadores”.

28

Também, disposto na Constituição Federal de 1988, em seu artigo 2258, o meio

ambiente do trabalho, integra o meio ambiente global, como um todo, de forma genérica. O

legislador constituinte atento à saúde e qualidade de vida do trabalhador, estabelecendo

relação direta entre meio ambiente do trabalho equilibrado e saúde do trabalhador, no artigo

2009, inciso VII, afirmou que ao Sistema Único de Saúde – SUS, além de outras atribuições,

compete “colaborar com a proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho”.

Salienta-se que, ainda, de forma indireta, também contemplando a proteção ao meio

ambiente do trabalhador, no artigo 7º10, inciso XXII, da Carta Magna estabeleceu como

direito social dos trabalhadores urbanos e rurais “redução dos riscos inerentes ao trabalho, por

meio de normas de saúde, higiene e segurança”.

A CLT nos artigos 155 e 19911, também cuida da proteção do meio ambiente do

trabalho, versando sobre segurança e medicina do trabalho, além de estabelecer disciplina

legal protetora através das Normas Regulamentares.

A Portaria n. 3.214/78, alterada por meio da Portaria 3.751/90, tem natureza de

conteúdo imperativo mínimo, sendo tuteladas mediante fiscalização do Ministério do

Trabalho e Emprego, através das Delegacias Regionais do Trabalho, Comissão Interna de

Prevenção de Acidentes (CIPA), além de outros órgãos que visem a preservação e melhoria

do ambiente de trabalho, tais como: Serviço Especializado em Engenharia de Segurança e

Medicina do Trabalho (SESMT), Programa de Prevenção de Riscos Ambientais (PPRA) e do

Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO). (ALKIMIN, 2006, p. 26-27)

No que se refere à proteção pública, o Ministério Público do Trabalho, tem

legitimidade para intentar Ação Civil Pública para proteger o meio ambiente do trabalho, ante

8 Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do

povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações. 9 Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: [...] VII

- participar do controle e fiscalização da produção, transporte, guarda e utilização de substâncias e produtos psicoativos, tóxicos e radioativos; [...] 10 Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua

condição social: ... XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança; [...] 11 Art. 155 - Incumbe ao órgão de âmbito nacional competente em matéria de segurança e medicina

do trabalho: (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977) Art . 199 - Será obrigatória a colocação de assentos que assegurem postura correta ao trabalhador, capazes de evitar posições incômodas ou forçadas, sempre que a execução da tarefa exija que trabalhe sentado. (Redação dada pela Lei nº 6.514, de 22.12.1977)

29

a inobservância dos preceitos voltados para a questão de saúde e segurança do trabalho, por

tratar-se de interesse coletivo. (ALKIMIN, 2006, p. 27)

O legislador constituinte, com base nos direitos fundamentais e sociais, assegurados

nos artigos 5º e 7º, elegeu o meio ambiente, artigo 225, à categoria de bem de uso comum do

povo, impondo ao empregador a obrigação de assegurar ao trabalhador um ambiente de

trabalho sadio. Assegura-se, ao trabalhador, ao ser demitido, o direito a encontrar-se nas

mesmas condições de saúde física e mental em que se encontrava quando da admissão,

plenamente apto à absorção pelo mercado de trabalho, atualmente tão seletivo, já que só conta

com sua força de trabalho para obter o salário, a remuneração necessária à sua subsistência.

(ALKIMIN, 2006, p. 28)

Portanto, o assédio moral configura-se, no dizer de Cahali em dano moral, pois,

Tudo aquilo que molesta gravemente a alma humana, ferindo-lhe gravemente os valores fundamentais inerentes à sua personalidade ou reconhecidos pela sociedade em que está integrado, qualifica-se, em linha de princípio, como dano moral; não há como enumere-los exaustivamente, evidenciando-se na dor, na angústia, no sofrimento, na tristeza pela ausência de um ente querido falecido; no desprestígio, na desconsideração social, no descrédito à reputação, na humilhação pública, no devassamento da privacidade; no desequilíbrio da normalidade psíquica, nos traumatismos emocionais, da depressão ou no desgaste psicológico, nas situações de constrangimento moral. (1998, p. 20-21)

Com a base no artigo 5º12, incisos V e X da Constituição Federal, que garante a

reparação do dano moral, sendo que o Código Civil no artigo 18613 conceitua o ato ilícito

como sendo aquele que provoca um dano ainda que, exclusivamente moral. E, em seu artigo

12 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] V - é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem; VI - é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias; [...] X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação; 13 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

30

92714 manda repará-lo, depreendendo que as conseqüências advindas do assédio moral

deverão ser indenizadas.

Também se pode levar em consideração a responsabilidade contratual do empregador

quando pratica o assédio moral, pois seria fruto do manifesto inadimplemento da obrigação

contratual, logo, além de gerar o dever trabalhista, produz o dever de reparar o dano moral e

material se for o caso.

A responsabilidade civil pelo fato de outrem, é regulada pelo artigo 93215, inciso III,

do Código Civil. Verifica-se tal situação no mobbing, referindo-se ao empregador pelos atos

dos empregados, serviçais e prepostos quando agem no exercício do trabalho que lhes

competir ou por ocasião dele. (GUEDES, 2004, p. 119)

Desta forma, entende-se que o empregador ou o indivíduo a quem é delegado poder,

como gerente, administrador, chefe de setor, dentre outros, no uso do poder jurídico sobre o

empregado, deve zelar de igual forma pela dignidade do trabalhador, fiscalizando, prevenindo

condutas ou procedimentos que atentem contra bens jurídicos de outrem, devendo adotar

medidas necessárias para tutelar a integridade psicofísica do empregado, assegurando assim

seus direitos.

Como forma de responder ao objeto do estudo passa-se a tratar, no terceiro e último

capítulo, sobre a rescisão do contrato de trabalho por assédio moral.

14 Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem. 15 Art. 932. São também responsáveis pela reparação civil: [...] III - o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele; [...]

31

3 RESCISÃO INDIRETA DO CONTRATO DE TRABALHO POR

ASSÉDIO MORAL

O assédio moral ocorrido no âmbito da relação de emprego, caracteriza

inadimplemento contratual, além de violação ao “dever jurídico” traçado pelo ordenamento,

pois é uma violação das normas de proteção inseridas na CLT, como também viola garantias

fundamentais do trabalhador previstas como já visto na Carta Política. Eis que o trabalhador

vítima de assédio moral, além de pleitear a indenização por dano moral, procura, também,

formas de proteger-se do processo destruidor ao qual está exposto.

3.1 Caracterização da rescisão indireta

As práticas de assédio moral podem ser perfeitamente enquadradas em várias alíneas

do artigo 48316 da CLT (como rigor excessivo, perigo manifesto de mal considerável,

16 Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; c) correr perigo manifesto de mal considerável; d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

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descumprimento de obrigações legais ou contratuais, serviços superiores às forças do

trabalhador, ofensa à honra e à boa fama), capazes de autorizar a rescisão indireta, além de

indenização por dano moral e/ou material. (BARROS, 2005, p. 874)

Como já dito, maus-tratos, ofensas e humilhações dirigidas contra o empregado,

desqualificando-o e degradando o ambiente de trabalho, quando o empregador exceder no

poder de organização e atribuir metas de produtividade inatingíveis, com claro intuito de

atingir o empregado em sua auto-estima pessoal e profissional, na intenção de afastá-lo da

organização do trabalho, ou também quando o empregador desviar a finalidade do poder

disciplinar e aplicar penalidades incompatíveis com as faltas cometidas e as características do

empregado; quando exceder nos meios de fiscalização e controle do empregado, através de

circuitos internos, revistas pessoais, de modo a afetar a privacidade e intimidade do

empregado, e, consequentemente, ferir a dignidade e direitos de personalidade do empregado,

enquadram-se na figura do artigo 483, da CLT.

O “rigor excessivo”, ou seja, perseguição, por parte do empregador ou superior

hierárquico, que conduz ao abuso do legítimo poder de direção e hierárquico, caracteriza-se a

figura da dispensa indireta. (ALKIMIN, 2006, p. 95)

Rigor excessivo praticado pelo empregador ou por superior hierárquico, como dispõe

o artigo 483, b, engloba os maus-tratos, ofensas e humilhações dirigidas contra o empregado,

desqualificando-o e degradando o ambiente de trabalho portanto se enquadram nesse

dispositivo, ou seja, perseguição por parte do empregador ou superior hierárquico, que conduz

ao abuso do legítimo poder de direção e hierárquico. (ALKIMIN, 2006, p. 95)

Observa-se, assim, que o empregador tem a obrigação de garantir um meio ambiente

de trabalho saudável, visando garantir e preservar a saúde do empregado. Assim, qualquer

tipo de comportamento, atitude, gesto sistemático conduzirá para a caracterização de assédio

moral, com base no artigo 483, da CLT, que expressa não apenas o dano físico e psíquico ao

empregado, mas também o dano moral.

§ 1º - O empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço. § 2º - No caso de morte do empregador constituído em empresa individual, é facultado ao empregado rescindir o contrato de trabalho. § 3º - Nas hipóteses das letras "d" e "g", poderá o empregado pleitear a rescisão de seu contrato de trabalho e o pagamento das respectivas indenizações, permanecendo ou não no serviço até final decisão do processo.

33

E, habilita uma reação do trabalhador, como a rescisão indireta do contrato de trabalho

e conseqüente obrigação do empregador de pagar as verbas rescisórias e indenizatórias

devidas por causa dessa modalidade de rescisão contratual. (ALKIMIN, 2006, p. 95)

A rescisão indireta caracteriza-se ainda quando o empregador ou seus gestores,

funcionários que detém o poder, praticarem contra o trabalhador que estiver subordinado a

eles ou a pessoas de sua família ato lesivo da honra do trabalhador, como a ofensa física, por

exemplo, como disposto no artigo 483, e e f.

Barros (2005, p. 874) sustenta que o empregador deve procurar manter a tranquilidade

no local de trabalho; dispensando aos trabalhadores tratamento respeitoso, evitando

comportamentos capazes de lesar, emocionalmente, o trabalhador. A lesão atitudinal ou

comportamental é capaz de sujeitar o trabalhador ao desprezo ou a situações que o

ridicularizem, ofendendo o princípio da dignidade.

Barros destaca que:

[...] o legislador referiu-se a ofensa física e não a lesão corporal. Logo, um pontapé ou um tapa poderá caracterizá-la, pois traduzem agressão. A legítima defesa própria ou de outrem justificam a falta, excluindo-a do elenco responsável pela rescisão indireta. (2005, p. 875)

Pode-se verificar que no que se refere a caso de agressão, a CLT abrange a “agressão

física”, que atenta contra a integridade corporal e não à agressão psicológica na qual está

inserido o assédio moral. Porém, a agressão física reiterada poderá gerar desordem psíquica

na vítima. (ALKIMIN, 2006, p. 97)

Portanto, o empregador ou seus gestores não têm o direito de atingir a dignidade, nem

tampouco o respeito do trabalhador ou daqueles que lhe prestam serviços. Sem embargo das

sanções penais e consequentemente civis de uma eventual investida empresarial contra a

honra do trabalhador e de seus familiares, estará a empresa sujeita, ainda, à possibilidade de

uma rescisão indireta, com os ônus indenizatórios trabalhistas. (SANTOS, 1997, p. 288)

A prática de assédio moral que precede a demissão do empregado caracterizará um

típico caso de despedida abusiva ou mesmo injuriosa, e, como não existe no ordenamento

jurídico pátrio tutela específica, não se pode pensar sobre a nulidade absoluta conseqüente

direito de reintegração ao emprego. Há proteção jurídica e previsão legal apenas para o

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ressarcimento dos danos e prejuízos experimentados, além da indenização trabalhista

pertinente. (ALKIMIN, 2006, p. 101)

Tratando-se de assédio discriminatório, Alkimin (2006, p. 101), com base no artigo 4º

da Lei 9.029/9517 , entende que o empregado teria direito ao de optar entre a readmissão ao

emprego ou indenização em dobro pelo período do afastamento.

Paroski (2006, p. 115), seguindo a linha de pensamento de Alkimim, entende que

confere ao empregado o direito de ver declarada nula a rescisão, com a consequente

reintegração ou optar pela percepção em dobro das remunerações do período de afastamento.

Caso o assédio moral, ao desrespeitar o trabalhador, provoque sequelas ao ponto de

incapacitá-lo para o trabalho, na eventual despedida Alkimin (2006, p. 101), lembra com base

no artigo 118 da Lei 8.213/9118; que isso poderá configurar abuso de direito do empregador, e

consequentemente, ensejar a nulidade da dispensa e o consequente direito de reintegração. E,

conforme o caso, a reparação do dano de natureza civil, se a demissão ocorrer dentro do

período de 12 meses após a cessação do auxílio-doença.

3.2 Rescisão indireta: justa causa do empregador

A rescisão indireta ou dispensa indireta, é uma forma de cessação do contrato de

trabalho. Ocorre quando o empregador comete ato grave contra o empregado, que devido a

essa falta, pode pedir a rescisão do contrato.

17 BRASIL. LEI nº 9.029, DE 13 DE ABRIL DE 1995. Proíbe a exigência de atestados de gravidez e esterilização, e outras práticas discriminatórias, para efeitos admissionais ou de permanência da relação jurídica de trabalho, e dá outras providências. [...] Art. 4º O rompimento da relação de trabalho por ato discriminatório, nos moldes desta lei, faculta ao empregado optar entre: I - a readmissão com ressarcimento integral de todo o período de afastamento, mediante pagamento das remunerações devidas, corrigidas monetariamente, acrescidas dos juros legais; II - a percepção, em dobro, da remuneração do período de afastamento, corrigida monetariamente e acrescida dos juros legais. [...] CLT. Coleção RT Mini Códigos. Constituição Federal – Consolidação das Leis do Trabalho – Legislação Trabalhista e Previdenciária. 18 Dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social e dá outras providências. [...] Art. 118. O segurado que sofreu acidente do trabalho tem garantida, pelo prazo mínimo de doze meses, a manutenção do seu contrato de trabalho na empresa, após a cessação do auxílio-doença acidentário, independentemente de percepção de auxílio-acidente. [...].

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Ao tratar-se do rigor excessivo na alínea b, do artigo 482, o legislador se refere como sendo atos de perseguição e intolerância ao empregado, através de repressões, medidas disciplinares sem causa ou desproporcionais ao ato cometido. O “Mal Considerável” tratado na alínea c, é a exposição do empregado a riscos a saúde, sua vida e integridade física, em virtude da falta de cumprimento das normas de higiene e segurança do trabalho. (GARCIA, 2007, p. 28-29)

A alínea d se refere ao descumprimento das cláusulas do contrato de trabalho, bem

como de todas as normas legais; Constituição Federal de 1988, CLT, normas coletivas de

trabalho. Na alínea e expõe o legislador: “praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele

ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama”. O ato lesivo da honra e boa fama

são atos de acusações de calúnia, injúria ou difamação contra o empregado ou entes

familiares. (GARCIA, 2007, p. 29)

O empregado poderá considerar rescindido o contrato, ainda, conforme a alínea f: “o

empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa,

própria ou de outrem”. As ofensas físicas tratadas neste são atos de agressão física contra o

empregado, pelo empregador, superior hierárquico ou mesmo outrem a mando do empregador

ou superior hierárquico. (GARCIA, 2007, p. 29)

E, por fim, a alínea g que trata da redução do trabalho, dispõe “o empregador reduzir o

seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos

salários.” Nesse caso, trata-se do ato de deixar propositadamente o empregado na ociosidade,

quando percebe por comissões ou tarefa, ou mesmo afastado do trabalho com percepção de

salários, afetando sensivelmente sua dignidade humana e deixando-o frustrado por receber

sem trabalhar. (GARCIA, 2007, p. 29)

Procedente destacar que, estabelece o parágrafo 1º do artigo 483 da CLT que:

“empregado poderá suspender a prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver

de desempenhar obrigações legais, incompatível com a continuação do serviço”.

Para o reconhecimento da Justa Causa do Empregador e a consequente rescisão

indireta do contrato de trabalho, o empregado deve ajuizar reclamação trabalhista perante a

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Justiça do Trabalho, podendo ou não se manter trabalhando, porém se sair do emprego, deve

comunicar o motivo ao empregador, caso contrário poderá caracterizar abandono de emprego.

3.3 Assédio moral na legislação trabalhista

Como visto, neste estudo, o assédio moral é um fato que coloca em aflição os

trabalhadores, ainda mais, em razão da falta de vagas de emprego, fazendo com que muitos

trabalhadores sobre essa justificativa, se sujeitem a trabalhar em situações desumanas e

indignas, como forma de manter sua subsistência. Entretanto, nada justifica o assédio moral,

embora ocorra um aumento do seu índice, visto que as vítimas do assédio não denunciam seus

assediadores.

Veja-se a seguinte decisão, sobre a temática:

A 12ª Turma do TRT-SP reformou decisão de primeira instância para reconhecer hipótese de rescisão indireta do contrato de trabalho pela prática de assédio moral contra empregada, caracterizado pela fiscalização excessiva de sua rotina e utilização de práticas classificadas pelos julgadores como sendo gestão por constrangimento. (DIREITO VIVO, 2009, s/p)

Em comento à decisão, na qual teve o desembargador Davi Furtado Meirelles, como

Relator, em seu voto enfatizou que a prova produzida não deixou dúvidas a respeito do

assédio moral do qual foi vítima a reclamante. Em razão da evidência do terror psicológico

adotado diariamente, caracterizando gestão de pessoal por constrangimento. Motivo que

conduziu a comprovação da hipótese de rescisão indireta do contrato de trabalho. (DIREITO

VIVO, 2009)

E, ainda, que as decisões judiciais não apenas reconhecem a lesão pretérita de direitos,

como também moldam as relações de trabalho, tanto as novas como aquelas em curso, por

intermédio da consolidação da jurisprudência. Humaniza-se, assim, os departamentos pessoais

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de grandes, médias e pequenas empresas, em prestígio ao princípio da dignidade da pessoa

humana, um dos fundamentos da República, insculpido no artigo 1º da Carta Política.

Foi descrito também pelo Relator que:

[...] não se há falar em ausência de imediatidade do empregado em relação à conduta faltosa do empregador, pois o assédio moral se materializa, geralmente, por intermédio da atitude reiterada do empregador ou seus prepostos, bem assim que a tolerância do empregado quanto ao assédio moral do empregador não configura perdão tácito, eis que motivada pela impossibilidade de o trabalhador prescindir, ainda que temporariamente, da relação de emprego, fonte de renda própria e da família. (DIREITO VIVO, 2009, s/p)

Entretanto, compreende-se ser de suma importância uma legislação específica sobre o

assunto, já que não há uma legislação específica sobre assédio moral. Mas, como se verifica

mesmo na sua ausência, não há impedimentos para que os tribunais do trabalho reconheçam a

gravidade do tema e com os meios que a legislação vigente oferece julgar acerca do assunto e

tentar coibi-lo.

Em relação à indenização por dano moral, esta já é reconhecida constitucionalmente,

porém entende-se que devam coexistir outras maneiras de proteger o trabalhador das afrontas

a que é exposto, ainda em vigência do contrato de trabalho.

Ferreira (2004, p. 106) faz referência que o trabalhador ao buscar a tutela jurídica do

assédio moral de forma indenizatória teria duas opções, sendo o pedido de demissão, diante

da insuportável situação que se desencadeia no ambiente de trabalho com o processo do

assédio moral, ou então, arcar com o aumento das práticas abusivas, arriscando a sua saúde

por temer o desemprego.

E, se ainda estiver em vigor o contrato de trabalho, ainda que não possua legislação

vigente sobre o tema, é na Consolidação das Leis do Trabalho que deverá ser procurada a

solução, já que existe uma solução jurídica para a questão. Ou seja, a rescisão indireta do

contrato de trabalho, ou dispensa indireta.

Comenta Menezes sobre as penas decorrentes da rescisão por dispensa indireta:

38

No Brasil, o assédio, além da nulidade da despedida e da reintegração no emprego (art. 4º, I, da Lei 9029/95), pode dar nascimento à pretensão de contratuais (art. 483, a e b, da CLT). No art. 483 da CLT, estão elencadas todas as hipóteses em que o empregado pode pedir a extinção do contrato de trabalho por descumprimento das obrigações por parte do empregador. Hipóteses que tratamos anteriormente quando falamos das consequências do assédio moral para o empregador. (2002, p. 140)

Portanto, pode-se averiguar que os atos faltosos do empregador surgem da violação de

três direitos fundamentais do trabalhador, o direito ao respeito a sua pessoa física e moral,

compreendendo nesta última o decoro e o prestigio; à tutela das condições essenciais do

contrato; e à inobservância pelo empregador das obrigações que constituem a contraprestação

da prestação do trabalho. (FERREIRA, 2004, p. 104)

O assédio moral viola o respeito à pessoa física do trabalhador. Argumenta Ferreira

(2004, p. 104) que outras condutas para ser envolvida dependerão da conduta abusiva que for

utilizada pelo assediador.

Desse modo, o processo de assédio moral, no qual o superior hierárquico constrange o

seu empregado, expondo-o ao ridículo e a vexame, afrontando a sua dignidade, dá ao

trabalhador assediado moralmente a prerrogativa de pleitear a rescisão indireta do contrato de

trabalho.

Entende-se que cabe destacar que tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei

Federal n. 5970/01, que tem como finalidade alterar o artigo 483 da CLT, inserindo mais uma

alínea, o que vem a tratar sobre a coação do assédio moral. O referido projeto prevê inserir no

artigo 483, uma nova alínea, h, a qual prevê que praticar o empregador ou seus prepostos,

contra o empregado, coação moral, através de atos ou expressões que tenham por objetivo ou

efeito atingir sua dignidade ou criar condições de trabalho degradantes, abusando da

autoridade que lhe conferem suas funções, será considerado assédio moral. (GARCIA, 2007,

p. 43-44)

E, ainda, a inserção do artigo 484-A, o qual se interpreta da seguinte forma: se a

rescisão do contrato de trabalho tiver motivação pela prática de coação moral do empregador

ou de seus prepostos contra o trabalhador, o aplicador do direito, aumentará o valor da

indenização, dobrando-a, se comprovado culpa exclusiva do empregador. (GARCIA, 2007, p.

30)

39

Depreende-se que o projeto está prevendo as mesmas hipóteses em que já se entende

caber a rescisão indireta, ou seja, não inova sobre a matéria, repetindo o artigo 483, não há de

se falar nas formas de assédio e sim nas suas conseqüências nas relações trabalhistas, quando

estas violam direitos conquistados e consagrados na legislação em vigor no Brasil.

Por fim, aborda-se o entendimento de Cavalcanti (2009, s/p), para quem as situações

legais da justa causa do empregador estão previstas no artigo 483 da CLT. E, nas hipóteses de

não cumprimento das obrigações contratuais pelo empregador, artigo 483, alínea d, da CLT, e

redução do trabalho artigo 483, alínea g, é facultado ao empregado, quando pleitear a

rescisão indireta do contratual e o pagamento das verbas devidas, permanecer no serviço até o

final do processo, conforme artigo 483, parágrafo 3º.

Ao limitar as hipóteses nas quais o empregado possa ficar trabalhando, mesmo após o

ajuizamento da ação, para alguns significa prejuízo ao trabalhador. O correto, então, é a

interpretação sistemática. A opção deve ser válida para todas as hipóteses legais previstas no

artigo 483 da CLT. As hipóteses previstas nas alíneas d e g refletem situações de menor

gravidade, logo, mais fáceis de serem aceitas e suportadas pelo empregado, portanto, a

autorização é expressa. Nas demais, a opção é implícita, pois seria um violar regras e

condições estabelecidas exigir o afastamento quando o salário é elemento vital para a

subsistência do empregado. (CAVALCANTI, 2009, s/p)

Bem como, inclusive, arcando com os riscos de eventual improcedência da alegação

em juízo. Comprovados os motivos da dispensa indireta, o empregado fará jus ao recebimento

do saldo de salário; aviso prévio; décimo terceiro salário; férias vencidas e proporcionais,

acrescidas de um terço, liberação do fundo de garantia, multa de 40% e entrega da guias do

seguro desemprego. Se a ação for julgada improcedente, o empregado não terá direito às

verbas rescisórias, recebendo somente o saldo de salário e as férias vencidas.

(CAVALCANTI, 2009, s/p)

E, em caso do empregado continuar trabalhando após a propositura da ação, a decisão

judicial que reconhecer a dispensa indireta, poderá considerar o contrato rescindido na data do

trânsito em julgado ou no momento do ajuizamento da demanda. (CAVALCANTI, 2009, s/p)

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CONCLUSÃO

Pode-se dizer que as relações de emprego são tuteladas por direitos e garantias

mínimas propostas pelo Estado. As quais visam não só a proteção de uma das partes do

contrato de trabalho, mas também o bem-estar social, pois um problema entre duas ou mais

pessoas, pode se exteriorizar alcançando proporções impensáveis, tornando-se um conflito

social.

Ao empregado é facultado, pelo legislador, a ruptura da relação de emprego que

mantém com o empregador, e vice-versa, uma vez que a autonomia da vontade é princípio

basilar das relações modernas, embora existam condições em que tal autonomia é limitada.

Ao existir uma relação de emprego, por ser ela de mútua dependência de obrigações

num contrato, consensual e bilateral, ambas as partes têm obrigações e o descumprimento

pelo empregador de suas obrigações e deveres, desrespeitando a dignidade do empregado que

lhe presta os serviços, faculta a este o término da relação, de forma definitiva, por ato faltoso

daquele.

Assim, o trabalhador rompe o vínculo de emprego, embora o empregador resista à

pretensão apresentada pelo primeiro. E, pela relação de obrigar-se à contraprestação, e por

praticar ato injusto ensejador à rescisão do contrato, o empregador deve remunerar o

empregado de todos os valores pendentes do contrato, como se a relação tivesse se extinguido

imotivadamente. Ou seja, o aviso prévio, as férias e o 13º salário, integrais e proporcionais, o

saldo dos salários, as verbas rescisórias, as horas-extras, o FGTS, a multa de 40% sobre o

saldo do FGTS, o descanso semanal remunerado, eventuais abonos ou prêmios, e outros

valores devidos.

Também, foi possível verificar que o legislador no artigo 483 da CLT previu casos

abertos, ou seja, que comportam dilação interpretativa, que em suas ocorrências o empregado

está autorizado a resolver o contrato, mesmo sem a intervenção jurisdicional, salvo quando

necessitar de provas ou ocorrer os casos das alíneas d e g do referido dispositivo.

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Quanto a justa causa para a ruptura do contrato há de ser grave. E, como demonstrado,

novas formas de lesão à parte ex adversa da relação contratual vem surgindo, dentre elas a

discriminação e outras.

O trabalhador na relação de emprego, está numa situação de vulnerabilidade em

relação à auto-suficiência do empregador. Desta forma, o Estado equipara-o àquele, por

intermédio de normas protetivas, as quais são aplicadas quer em face de pessoas jurídicas ou

físicas, pois, o que importa é uma das partes da relação ser detentora do poder econômico e a

outra não ser, existindo assim, uma desigualdade considerável, expondo este último à

vulnerabilidade, qualquer que seja, econômica, técnica, jurídica ou social, em relação ao

primeiro.

Quanto aos danos ocasionados pelo exercício arbitrário, abusivo, ilícito, ou imoral do

direito, a própria norma protetiva, impõe que o causador de danos os repare, bastando que os

mesmos sejam oriundos de uma relação de emprego, e exista vulnerabilidade entre as partes,

possibilitando inclusive a inversão do ônus da prova.

Do que se depreende que o contrato de trabalho é necessário para a continuidade da

sociedade estruturada e fundada no método capitalista de produção, pois o cerne do sistema é

o aumento da produção, possibilitando maior consumo e gerando renda para este. E, isso se

dá, impreterivelmente, por intermédio do trabalho.

Atualmente, sob o manto do avanço tecnológico, da transformação da sociedade. E, da

não menos citada em vários estudos de várias áreas do conhecimento, a globalização, social e

econômica, as relações de emprego deixam de ter a pessoalidade como característica, pois o

empregador não mantém com o empregado contato imediato, uma vez que se utiliza de meios

eletrônicos para exercer seu poder de direção, subordinado àquele, isso tem se tornado uma

tendência.

Porém, não é por essa falta de contato que o empregador deixará de praticar atos

faltosos, pelo contrário, o distanciamento das pessoas envolvidas na relação, o que possui

maior poder tende ratificá-lo em detrimento ao mais fraco, o trabalhador. Já, que as relações

humanas se tornam impessoais, dando ensejo, cada vez mais, há atos faltosos.

Sem dúvida, a tipificação dos casos que ensejam falta grave pelo empregador devem

continuar como tipos abertos, pois as relações modernas, ao evoluírem, farão surgirem novas

figuras, que deverão ser adotadas pela Lei.

42

A tendência é uma mudança gradativa na Legislação Trabalhista, trazendo do direito

comum algumas figuras, e protegendo o empregado de novos abusos que o poder econômico

vem concretizando.

O que leva ao entendimento de que toda a legislação deve ter por escopo a dignidade

da pessoa humana, que inclusive é apontada pelo Legislador Constituinte, como norte do

ordenamento pátrio, onde o trabalhador deve ser respeitado, na sua condição de cidadão.

Desta forma, conclui-se que o empregador tem obrigação de fiscalizar o ambiente de

trabalho para que o mesmo seja um local sadio, respeitado, que tenha por escopo proteger a

dignidade do trabalhador, sob pena de ser este considerado responsável pelos atos de seus

empregados ou prepostos e conseqüentemente obrigado a ressarcir os prejuízos ocasionados

pelas atitudes destes. Além do mais, é possível a ocorrência da rescisão indireta do contrato de

trabalho, bem como indenização por danos morais pelos detrimentos sofridos em decorrência

de tal atitude. Ou seja, as atitudes que configuram o assédio moral encontram-se na própria

origem da expressão rescisão indireta.

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