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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DO PIAUI – FAESPI
CURSO DE BACHARELADO EM PSICOLOGIA
ÉRIKA REGINA LOPES LEAL
O MEU EXCESSO DE AMOR TE ADOECE?
UMA CONTRIBUIÇÃO PSICANALÍTICA SOBRE MATERNAGEM
TERESINA – PI
2018
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ÉRIKA REGINA LOPES LEAL
O MEU EXCESSO DE AMOR TE ADOECE?
UMA CONTRIBUIÇÃO PSICANALÍTICA SOBRE MATERNAGEM
Monografia apresentada à Faculdade de Ensino Superior do Piauí – FAESPI, como requisito para a obtenção do título de Bacharel em Psicologia. Orientadora: Profª. Me. Odete Guimarães Cajueiro da Silva Neta.
TERESINA – PI
2018
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ÉRIKA REGINA LOPES LEAL
O MEU EXCESSO DE AMOR TE ADOECE?
UMA CONTRIBUIÇÃO PSICANALÍTICA SOBRE MATERNAGEM
Monografia apresentada à Faculdade de Ensino Superior do Piauí – FAESPI, como requisito para a obtenção do título de Bacharel em Psicologia.
Aprovada em: _____ / _____ / 2018.
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________ Profa. Me. Odete Guimarães Cajueiro da Silva Neta
Orientadora Faculdade de Ensino Superior do Piauí – FAESPI
________________________________________________________ Profº. Esp. Alderon Marques Cantanhede Silva
1º Examinador Faculdade de Ensino Superior do Piauí – FAESPI
________________________________________________________
Profª. Me. Poliana Marques Maton 2ª Examinadora
Faculdade de Ensino Superior do Piauí – FAESPI
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Dedico este trabalho a minha mãe Regina Célia, ao Marcos Wallêrrir, e a minha orientadora Odete Cajueiro.
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AGRADECIMENTOS
Primeiramente agradecer a Deus por não me deixar perder a fé e desistir,
em segundo lugar a meus pais, Eloi Lopes e Regina Célia, minha mãe peça
fundamental para que eu concluísse essa etapa, me deram todo apoio incondicional
e incentivo necessário para eu chegar ao fim do curso.
Serei eternamente grata ao Marcos Wallêrrir vulgo (Dey) sempre esteve ao
meu lado quando mais precisei, me ajudou, não me deixou desistir e fez o que pôde
para me ver chegar aqui.
A minhas irmãs Erilane e Ennya e a toda minha família, em especial minha
vozinha Raimunda.
A todo meu corpo docente, e a minha orientadora Odete Cajueiro (foi Deus
que a colocou no meu caminho) pelo empenho dedicado à elaboração
deste trabalho.
Durante essa jornada fui ajudada por pessoas que sempre serão especiais
para mim, Tia Lita, Dona Socorro, Suzane, Carlos Eduardo (Trem Bala), e não
poderia deixar de lembra do meu primo querido Antonio Neto (in memorian).
Meus colegas de turma, em especial ao grupo “Vassourinhas”, que com
todas nossas diferenças ajudamos umas às outras.
E a todos que acreditaram em mim, muito obrigado mesmo.
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Sou totalmente coração, sinto, toco, gosto, sofro, choro, amo, cuido, zelo, mas não me prendo a emoção alguma ao ponto de me perder da razão. Tenho meus surtos, aquele que me deixam meio sem lugar, com vontade de correr atrás, brigar, gritar, dizer que tudo que estou sentindo, mas ao mesmo tempo sou lucida ao ponto de me entender, e conseguir me barrar. Me desapego dizer tudo que estou sentindo, mas ao mesmo tempo sou lúcida ao ponto de me entender, e conseguir me barrar e conseguir me barrar. Me desapego rápido do que me faz sofrer, retomando minha direção, recomeçando do lugar onde cai, e caminho sem olhar para traz, certa de que amanhã será diferente e o que me causou dor se transformou em experiências. Se me permite Caio F. de Abreu, sem apego, sem melancolia, sem saudades a ordem é desocupar lugares, filtrar emoções.
(Cecilia Sfalsin)
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RESUMO
Esta monografia tem o intuito de discutir questões relacionadas aos direitos femininos, a feminilidade, de como a mesma se constitui e progride, de como maternidade e a maternagem são vistas e como se desenvolve, tem como objetivos verificar os recursos psíquicos necessários para que uma mulher se constitua como mãe, desenvolvendo uma maternagem saudável, a partir do seu desejo de tornar-se mãe, algo que é bastante relevante para que essa bebê se constitua e se desenvolva psiquicamente de forma benéfica. Havendo possibilidades do não desejo de ser mãe, de exercer a maternagem, podendo existir a possibilidade do adoecimento de forma significativa nesse bebê, com o despertar de doenças psicossomáticas, chegando a psicose.
Palavras-chave: Feminino. Maternagem. Relação mãe-bebê. Psicossomática. Psicose.
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ABSTRACT
This monograph has the intention of discussing, to question and to understand the subjects that are related to the feminine rights, the femininity, of as the same it is constituted and it progresses, in the way as the maternity and the maternity are seen and as they grow, taking into account the harms that can be unchained and implanted in the baby by the non desire of the maternity, he/she has as objectives to verify the necessary psychic resources so that a woman is constituted and be noticed as mother (caretaker), developing a healthy maternity, starting from his/her desire of turning mother, something that is quite relevant so that that baby is constituted and grow psychically in a beneficial way. Having possibilities of the non desire to be mother, and of exercising the maternity, could exist a space for the sicken in a significant way in that baby, with the awakening of psychosomatic diseases, arriving to the psychosis. Keywords: Feminine. Maternity. Relationship mother-baby. Psychosomatic. Psychosis.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .............................................................................................. 9
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .................................................................... 12 2.1 O UNIVERSO FEMININO ............................................................................. 12 2.2 MATERNAGEM ............................................................................................ 15 2.3 A CONSTITUIÇAO DA MATERNAGEM ....................................................... 19
3 A RELEVÂNCIA DA MATERNAGEM NA SAÚDE PSÍQUICA DO SUJEITO ....................................................................................................... 24
4 METODOLOGIA ........................................................................................... 30 4.1 CRITÉRIOS DE INCLUSAO E EXCLUSAO ................................................. 30 4.2 COLETA DE DADOS .................................................................................... 31 4.3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS .................................. 31 4.4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ............................................................... 31
5 RESULTADOS E DISCUSSÃO .................................................................... 32
6 CONSIDERAÇOES FINAIS .......................................................................... 35
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 37
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1 INTRODUÇÃO
A presente monografia visa aprofundar e entender como o excesso de afeto
pode ser adoecedor em uma relação mãe-bebê. O psicólogo pode ter relevância no
não adoecimento deste bebê, orientando a mãe em relação aos cuidados psíquicos
emitidos para com esse bebê. Sendo assim possivelmente não exista um não
desenvolvimento da estrutura psicótica por conta do excesso de afeto, e de como o
excesso de afeto pode contribuir para desencadear doenças psicossomáticas.
O objetivo desta monografia é esclarecer a relevância da maternagem na
saúde psíquica do sujeito adulto, como também uma tentativa de compreensão da
estrutura desse vínculo mãe-bebê, percebendo como o mesmo pode provocar uma
estrutura psicótica. Busca também compreender como o excesso de maternagem
provoca o adoecimento e como a linha de pensamento psicanalítico pode contribuir
para o abrandamento desse excesso de afeto e consequentemente podendo evitar
doenças psicossomáticas.
. Compreendendo como esse excesso de amor investido pela mãe poderá
desenvolver estruturação psíquica divergente desse sujeito, e ainda as
consequências deixadas por esse excesso como doenças psicossomáticas e a
estruturação psicóticaque, segundo Zimerman (1999):
“As psicoses "implicam um processo deteriorativodas funções do ego, a tal ponto que haja, em graus variáveis, algum sério prejuízo do contato com a realidade”. (ZIMERNAN,1999)
Portanto, a psicose tem como núcleo estruturante central a prevalência do
princípio do prazer sobre o princípio da realidade. Dessa forma, as funções do ego
são prejudicadas, caracterizando o contato do indivíduo psicótico com seu mundo
externo como um ambiente restrito ao seu universo Inter psíquico, ou seja, um
mundo só seu.
A maternidade e a maternagem são vistas como decorrentes de relações
biológicas e afetivas estabelecidas entre mãe e filho. De modo geral, observa-se que
o desejo pela maternidade pode ocorrer antes mesmo da existência de um corpo
grávido, com as brincadeiras de bonecas na infância. (GRADVOHL; OSIS;
MAKUCH, 2014)
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Segundo Kitzinger (1978) existe uma diferenciação entre maternidade e
maternagem, a maternidade se dá pela relação consanguínea e biológica da relação
mãe e filho, enquanto que a maternagem é um processo estabelecido por um
vínculo afetivo do cuidado e acolhimento que a mãe supre as necessidades não
mais biológicas, mais sim emocionais.
De acordo com Winnicott (2000) as condições necessárias para uma boa
função materna assim como uma mãe suficientemente boa são as capazes de
atender as necessidades do seu bebê, não só em cuidados físicos e necessidades
básicas, mas também em aspectos psíquicos e afetuosos que contribuirão para a
formação da estrutura psíquica do sujeito, no entanto:
Quando a mãe não é suficientemente boa, a criança não é capaz de começar a maturação do ego, ou então fazê-lo, o desenvolvimento do ego ocorre necessariamente distorcido em certos aspectos vitalmente importantes. (WINNICOTT, 1983, p.56)
Sendo que existe uma pressão social e cultural construída desde a
antiguidade que impõe a maternagem e a maternidade como o principal papel social
feminino. Com base nas leituras de Gutierrez, Castro e Pontes (2011) a maternagem
é um processo sócio histórico que se constrói e se modifica de acordo com tempo,
espaço, cultura e ainda por fatores psíquicos necessários para que uma mulher se
constitua como mãe.
E os autores citados a cima perceberam nessa pesquisa que nem todas as
mulheres precisam se tornar ou terem o desejo de serem mães, ou mesmo para
provar que são capazes de serem independentes para se constituírem como
mulheres.
Para se construir a maternagem e o vínculo mãe e filho é necessário que
essa mãe possua o desejo e preparo, porque irá ser fundamental no
desenvolvimento psíquico e social do sujeito, que ao ser um vínculo excessivo
oudoentio, que venha a ser a construção de uma relação que ultrapasse a interação
saudável entre mãe e filho, como a de tomar o filho como algo de posse sua, que
faça com que esse bebê não tenha a percepção de realidade por conta de uma
superproteção, e a partir disso a identidade e a autonomia do bebê que se tornará
futuramente um adulto sucumbirão a personalidade, e acarretará em um indivíduo
com estruturas psíquicas tendenciosas e na construção de um falso-self.
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A estrutura psicótica pode ser desenvolvida por conta do excesso de afeto,
pelo fato de que a relação mãe- bebê, não se sustenta por si só para a constituição
de um sujeito na criança. É preciso ser realizada a intervenção que possibilite a ela
ser retirada desta fusão imaginária que foi constituída inicialmente com a mãe. A
entrada de um terceiro, ou seja, do pai, permite que a criança saia da alienação
diante dos significantes maternos, assim se podendo se referenciar em outros
significantes.
Nesse sentido Jerusalinsky (2002):
A função paterna marca o atravessamento de uma legalidade no exercício da maternidade- dado que o bebê não pode ficar situado como um simples objeto da satisfação da mãe, ele tem um responder ao sobrenome que carrega que o situa em família, em uma cultura. (JERUSALINSKY, 2002, p. 121).
A chegada do pai castra e interdita a mãe quanto à possibilidade da lei
primordial da proibição do incesto, a entrada do pai representa simbolicamente uma
metáfora estruturada pelo psiquismo, comportando uma espécie de substituição do
pai como símbolo colocado no lugar da mãe. Desse modo a figura paterna protege a
criança de sucumbir à mãe, possibilitando a separação que é essencial para que a
criança se constitua como sujeito. A negação dessa terceira figura tanto pelo filho
como pela mãe poderá ocasionar em adoecimento como a formação de uma
estrutura psicótica e doenças psicossomáticas.
De acordo com Coriat (1997):
O pai é aquele que, desde as proibições do Édipo, encarna a função de operar a separação criança-mãe e seu papel revela-se aprés-coup, estando presente nesse outro que, desde o início, estabelece uma situação estruturalmente triangular e, em consequência uma distância entre a criança e a mãe. (p. 106)
A monografia será composta por três capítulos, que enfatizaram a
construção da relação mãe- bebê em um caráter que prejudica a estrutura psíquica
do bebê.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO
2.1 O UNIVERSO FEMININO
Ser mulher, fazer escolhas, desde o início do mundo é algo bastante difícil,
simplesmente pelo fato de ser mulher, de sermos vistas como pessoas frágeis,
sensíveis, sem capacidade de chefiar um negócio, de poder ganharmos nosso
próprio sustento, tomarmos nossas próprias decisões do que queremos ou não. As
diversas formas de violência e da mesma forma suas expressões não podem sem
considerados como processos que não são históricos e sem composição de
subjetividade.
Desde os tempos mais antigos a sociedade vem se desenvolvendo e se
construindo com o envolvimento de traços de violência, algo que eram utilizados
para demonstrar poder sobre o outro.
Para Souza (2008) as mulheres são violentadas de várias maneiras que até
passam despercebidas por serem violências cometidas por pessoas próximas, como
o marido, o irmão, que é a violência doméstica, sendo um dos ambientes mais
corriqueiros que se é praticado o ato, e a violência de gênero, que se enquadra em
contextos sociais no qual a mulher está inserida e também compreende as
diferenças socioculturais presente entre o sexo feminino e o masculino, as quais
foram historicamente construídas
Segundo Souza (2008):
“[...] não obstante as pesquisas realizadas sob o manto das nações unidas indicarem que no seio do grupo familiar que a mulher mais sofre violência, praticada principalmente pelo seu marido, companheiro, ou convivente, pai e irmão [...]”. (SOUZA, 2008, p. 35- 36)
As sociedades patriarcas produziram uma noção de que o homem, se
constitui como tal a partir do falo, com uma educação voltada para ser o provedor
tanto no lar como no seu serviço. E com a mulher a rotulação de mulher se dar pela
vagina, com o aprendizado direcionado para a manutenção do lar e da família. E
essa relação situada por diferenças de gênero faz com que o homem seja o oposto
para a mulher, categorizando de forma bem objetiva com um discurso colonizador o
papel do homem e da mulher, ele como racional e forte, e ela alguém emocional e
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emotiva. E pela teoria sexista com base nos discursos racionalistas, o chefe da casa
(homem) é que decide e sabe o que é melhor para a dona de casa (mulher).
(BOURDIEU,2005)
A sociedade possui uma estrutura, em classe social, raça e a sexualidade, e
assim acontece com o gênero, e um fator determinante para a violência contra a
mulher é a desigualdade de gênero, algo implantado pela sociedade patriarcal e
perpetuado por fatores socioculturais, que tem como suporte a hegemonia e a
subordinação. Essa violência vai além de algo físico, mas que provoca danos
psicológicos, sexual, moral, ferindo a dignidade da mulher independente do
ambiente da agressão ou mesmo de quem a violenta. (SAFFIOTI, 2004)
Segundo Teles (2002) uma referência no Brasil para a constatação do
reconhecimento da total cidadania da mulher e aos seus direitos humanos foi a
Constituição Federal de 1988, esse documento supõe a igualdade de todos diante
da lei, sem preconceitos quanto a raça, sexo, origem, idade e cor ou qualquer outro
tipo de discriminação, além de dispor que homens e mulheres são iguais em direitos
e obrigações.
Outro ponto importante considerado na Constituição Federal de 1988 foi a
proteção a maternidade e da infância, colocando-as como direitos sociais, onde as
gestantes possuem o direito a licença gestacional de quatro meses, podendo se
ausentar do trabalho sem nenhum prejuízo, com todos os seus direitos
resguardados, e em contemplação para a família, tanto o homem quanto a mulher
têm direitos igualmente estabelecidos considerando igualmente as famílias que se
constituírem sem matrimônio, dessa forma a Constituição contribui de forma
significativa a respeito dos direitos do ser mulher e da luta feminista. (TELES, 2002)
De acordo com Saffioti (2004) o papel desempenhado pelas mulheres como
a maternidade, não era empecilho para trabalharem com a caça, desenvolverem
instrumentos, e muito menos para a submissão ou fragilidade da mulher. Ao invés
disso as mulheres eras criaturas capazes de dar à luz, consideradas mágicas e
cheias de força.
“Os filhos não eram uma propriedade como os demais artigos de propriedade privada, nem eram estranhos uns aos outros, de acordo com sua riqueza, classe ou raça de suas famílias. Todos os adultos de um clã se consideravam pais sociais de todas as crianças, e se preocupavam com todos, igualitariamente [...] Na sociedade comunitária, em que ainda não existia a família como núcleo isolado,
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era inútil saber quem era o pai biológico, ou inclusive a mãe biológica”. (SAFFIOTI, 2004, P. 59)
Neri (2002) traz a diferença entre os dois sexos:
O feminino (weiblich) se refere à posição feminina na dialética fálica que instaura a diferença masculino-fálico-atividade / feminino-castrado-passividade, a sexualidade feminina (weiblich Sexualitat) designa o destino da sexualidade da mulher na lógica fálica e a feminilidade (weiblichkeit) indica um erotismo não mais regulado pela lógica fálica, deixando à mostra um eixo de subjetivação, erotização e sublimação que inaugura novas possibilidades de inscrição do sujeito na cultura como singularidade e diferença. (NERI, 2002, p. 29 e 30)
Algo que não se pode descartar é a importância do contexto sócio histórico,
filosófico e cultural em ralação aos pontos de vista que forma realizadas pela
psicanalise sobre a figura feminina, a partir disso, então Freud daria início a sua
teoria sobre a histeria, uma patologia atribuída especificamente para as mulheres
que demonstravam algo incomum como cegueira, paralisia em alguma parte do
corpo, má formação física, e devaneios não tolerados pela época, causando como
consequência uma vida marcada repressão social e psíquica, por não poder ter
poder de expressão. (DEMES; CHATELARD; CELES, 2011).
Neri (2002) diz que:
A relevância do feminino no psiquismo e na obra freudiana está diretamente ligada à entrada do feminino na cena social, já que o interesse dos médicos pela histeria se deu num momento em que a mulher saiu dos bastidores para se tornar objeto de investigação. NERI, 2011 (p. 18)
Segundo Neri (2002) com essa ascensão da mulher, que recebia um espaço
essencial para poder ser ouvida e vista, o sexo masculino que era tido como
absoluto, tinha seu momento de desamor e desapontamento, onde com essa
inversão de lugares, as mulheres ocuparam uma superfície sobre um novo
paradigma vienense em que iram ser objetos de estudos pela metafísica e pela
ciência.
E a partir da teoria da histeria criada por Freud, que a patologia se relaciona
diretamente com a mulher, e ver no seu corpo o lugar perfeito para se instalar, onde
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é representada pelo primeiro caso que foi estudado o de Anna O, e através da
mesma que a histeria tem seu ápice no discurso e no tratamento psicanalítico, que
se dar pela fala. (NERI, 2002)
O despertar não se dava somente a mulher, mas também ao acesso para a
feminilidade que se configuravam com outros conceitos psicanalíticos como histeria,
sexualidade feminina, sexo feminino, mas que passaram por incoerência teóricas até
se firmarem na teoria. (DEMES; CHATELARD; CELES, 2011)
Outro ponto que Freud postulava ser importante desde a obra Os Três
Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, era a relevância da figura materna por trás
da mulher que esse fato contribuiria para a compreensão do sujeito, sendo o período
pré-edípico, que seria uma fase anterior da história de vida da constituição da
mulher, trazendo uma nova formulação para o feminino na teoria, que seria
explicitado pelo psiquismo, que surge anteriormente a subjetividade implicada pelo
falo. (DEMES; CHATELARD; CELES, 2011).
A partir de novas concepções e problematizações formadas a respeito da
mulher, da feminilidade, da sexualidade feminina, por diversas correntes teóricas,
são formadas as evoluções, levando em consideração a subjetividade do sujeito,
sua história, suas fantasias, que assim como evolui pode retroceder, edificando suas
manifestações na Psicanálise. (DEMES; CHATELARD; CELES, 2011)
2.2 MATERNAGEM
Antes de citar o conceito de maternagem, é necessário trazer o corpo
feminino, que desde os tempos da criação do mundo eram considerados temidos
por conseguirem gerar vidas, ter períodos sangrentos e sobreviverem e por isso
eram vistos como detentores de poderes sobrenaturais de natureza boa ou má.
No livro do Gênese diz que:
[…] o Senhor Deus chamou Adão e perguntou-lhe: “Comeste da árvore que te proibi de comer?” E então o homem retrucou: “A mulher que me deste por companheira me deu da árvore e eu comi”. E disse o Senhor Deus à mulher: “… Multiplicarei tuas dores e as tuas concepções; com dor terás os teus filhos, e o teu desejo será para o teu marido, que te dominará”. (Bíblia Sagrada. O livro do Gênesis, cap. 3)
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Então a partir da citação a cima, é possível pensar nas inúmeras
representações e desafios de várias naturezas como ser bruxa, santa, símbolo da
luxuria e submissão, a qual a mulher precisa enfrentar até os dias atuais.
Para Lapanche e Pontalis (2001) a maternagem consiste em uma técnica de
psicoterapias das psicoses, e particularmente da esquizofrenia, que procura
estabelecer entre o terapeuta e o paciente, de um modo ao mesmo tempo simbólico
e real, uma relação análoga à que existiria entre uma “boa mãe” e seu filho. Que na
verdade se trata de uma técnica da Psicanálise que pode ou não acontecer entre o
paciente e o analista no setting terapêutico, a contratransferência.
Mas com o passar dos tempos surgiram estudos mais complexos a respeito
do corpo feminino, demonstrando a anatomia e a fisiologia do corpo feminino que de
fato é preparado paras a gestação, desmistificando e ideia de sexos iguais para
homens e mulheres. É nessa época que surge o mito do instinto materno, segundo o
qual a maternidade era uma tendência feminina inata, assim como a maternagem,
pois somente as mulheres poderiam gestar, eram elas as pessoas mais apropriadas
para criar os bebês. (BANDINTER, 1985)
Historicamente por meados do século XV e XVI somente a maternidade era
exercida pelas mulheres daquela época, não era de costume a mãe biológica cuidar
da criança, que eram mulheres de famílias ricas, mas sim “amas de leite”, que
exerciam esse papel de cuidar das crianças de famílias ricas até uma certa idade,
provocando consequências irreversíveis, como o aumento das taxas de mortalidade,
por conta da ausência da maternagem pela mãe, e também pela falta de cuidados
afetivos, havendo uma desvalorização da maternagem e da maternidade.
(BANDITER, 1987). O amor materno não era um sentimento especifico a condição
da mulher, mais sim algo que precisava ser concebido, sendo resultado da evolução
sociocultural de casa época. (BANDITER, 1987)
De acordo com Winnicott (1956), a maternagem é o modo como a mãe cuida
e protege de seu bebê. Esses cuidados precisam ser em todos os contextos,
fisiológico, afeto, afago, o desejo por essa criança que vai ser cuidada. Se a figura
materna for desejada, a mesma investirá esse desejo e o prazer em cuidar do bebê,
que mesmo não tendo consciência de seus desejos, reconhecerá a satisfação de
suas necessidades.
Segundo Badinter (1987) o amor materno ganhou uma nova denominação
no final do século XVIII, uma época onde a função materna, a importância e a
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imagem da mãe, tiveram sua figura alterada, passando a partir desse período
chamado pela autora de “revolução das mentalidades” a cuidar de seus filhos, a
amamenta-los e as obrigando a serem manes antes de qualquer outro papel, não
querendo insinuar que antes revolução das mentalidades o amor materno não
existia, mas o trazendo como um patrimônio social e natural, que favorecia tanto o
ser cuidado como a sociedade.
Outro aspecto considerado por Badinter (1987) é a forma com a sociedade
julga e absolve essa mãe que tenta desenvolver seu papel de cuidadora, que
socialmente falando não tem o direito de falhar, pelo fato de se tratar de um papel
estruturado socialmente, e as que consegue desenvolver de forma eficiente suas
funções maternas são enaltecidas, acontecendo o inverso com as mulheres que não
conseguem, sendo que não pode abrir mão de suas obrigações como mãe.
Entre os séculos XVII e XIX ouve a valorização da maternidade devido a
acontecimentos no capitalismo e da burguesia, assim a forma de criação das
crianças passaria a ser de responsabilidade dos pais, afirmando a diferenciação dos
papeis sociais entre homem e mulher o da mulher seria cuidar das tarefas de casa e
da família e do homem a função de levar o sustento para casa. (SCAVONE, 2001)
E ainda no contexto de transformações sobre os cuidados da mãe com a
criança, no início do século XIX, percebeu-se gradualmente a aprovação social da
maternidade e da maternagem. A mulher pode conquistar uma maior admiração
social, passando a ser a responsável pelo lar e pela criação dos novos cidadãos, ou
seja, cuidar de modo efetivo seus filhos biológicos, não mais os entregando para
outas mulheres cuidar. (MOURA, 2004)
De acordo com Costa (2004) a chegada da modernidade e a constituição da
família nuclear e valoração do infantil, veio com esses modelos a mãe cuidadora,
que ao não exercer esse papel essencial, faria com que despertassem pensamentos
a respeito de sua conduta, como algo maldoso ou patológico, correspondendo ao
não desejo de exercer a maternagem.
Mas segundo Roudinesco (2003) a contemporaneidade dar lugar a novas
situações, de como as famílias estão se formando atualmente, dando lugar para a
desagregação de maternidade e feminilidade, fazendo com que o feminino se
destaque, e a função paterna seja menos percebida.
Durante um longo período, a maternagem foi pensada como uma
característica relacionada à maternidade, como uma função exclusivamente
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feminina por excelência, referente à natureza da mulher, embora perceba-se que o
empenho da mulher ao papel materno dar-se mais por uma imposição social e
cultural que impostas pela cultura de que somente a figura feminina, teria a missão
de dar à luz e amamentar. (CHODOROW, 1990)
Essa mulher ao ser colocada como a responsável pela perpetuação da
espécie, recebe uma enorme quantidade de responsabilidade, que em uma
considerável parcela é sob obrigação, tanto socialmente como culturalmente, sendo
assim seu desejo de ser ou não mãe, e mais ainda a de exercer a maternagem
passa despercebido.
O papel materno geralmente se dar início a partir da gestação, uma
passagem repleta de inúmeras representações, podendo que uma boa parte dessas
representações podem não fazer parte de um desejo de ser mãe. Algo que perdurou
por muito tempo foi a alegação de que as mulheres possuem uma vocação inata
para a função materna, consideravam-nas como reprodutoras de filhos, um
fenômeno de caráter exclusivamente biológico. (CORSO; CORSO, 2011)
Já em dias atuais a figura materna é colocada de uma forma mais emotiva e
carinhosa na sociedade, tendo e dando mais cuidados afetivos, amor, liberdade e
renúncia. Comportamentos agressivos não serão permissíveis e justificáveis pela
sociedade, e de negação ao bebê, praticado pela figura materna, pelo fato de que
comportamentos dessa natureza são atribuídos para as mulheres barbaras,
desconsiderando por completo o sofrimento de ambivalência que possa existir por
parte da mulher de efetivar ou não a maternagem. (RODRIGUEZ; CARNEIRO,
2013).
Winnicott (1956/2000) traz um conceito de mãe suficientemente boa, onde a
partir desse conceito estabelece as condições indispensáveis para um bom
desempenho da função materna, como aquela capaz de atender as necessidades
do seu bebê em todos os aspectos. Onde cuidado não se limita ao manuseamento
físico, mas também suprir as necessidades básicas, mas a uma disponibilidade
psíquica da mãe para com o seu bebê, às palavras ditas a este filho, e ao
investimento de desejo. (Catão, 2004)
Segundo Winnicott (1956/2000) após o parto a mãe passa por um estado
peculiar que chamou de estado de preocupação primária, onde essa mãe volta-se
exclusivamente sua atenção e afeto para o bebe, o que se torna um perigo para a
mãe, por deixar em suspensão sua existência, assim como outras relações, a
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profissional, social, de esposa, deixando o filho como única prioridade, esse estado
também caracteriza uma regressão emocional que a mãe faz a sua fase da infância,
recordando o momento que era cuidada pela mãe, desse modo a percepção pelo
bebê torna-se mais fácil, para atender as necessidades afetivas e básicas desse
filho.
Gradualmente, esse estado passa a ser o de uma sensibilidade exacerbada durante e principalmente ao final da gravidez. Sua duração é de algumas semanas após o nascimento do bebê. Dificilmente as mães o recordam depois que o ultrapassaram. Eu daria um passo a mais e diria que a memória das mães a esse respeito tende a ser reprimida. (WINNICOTT, 1956: p. 401)
Portanto, a maternagem, foi uma concepção dos cuidados maternos
considerados necessários e imprescindíveis para um filho, que foi desenvolvida e
evoluindo ao longo do tempo, que a cada período ganhava novas responsabilidades,
conceitos e afazeres, de como exercer a função materna.
2.3 A CONSTITUIÇÃO DA MATERNAGEM
A maternagem inicia sua constituição com o desejo de ser mãe, do desejo
de cuidar do seu bebê, de forma que contribua na construção de sua subjetividade,
de fatores emocionais, das necessidades básicas como banho, amamentar, dar
colo, trocar fraldas. Um desejo que pode ser despertado desde a primeira infância
ao simplesmente brincar de bonecas, de cuidar de um irmão, anseios que serão
revividos com a chegada de uma criança sua. Como também pode vir de forma
perversa pela experiência com a sua figura materna anterior não ter sido satisfatória,
e assim tornar-se uma mãe que não consiga promover a maternagem
saudavelmente, causando adoecimento psíquico, psicossomático nessa criança.
Com base nas leituras de Gutierrez, Castro e Pontes (2011) a maternagem é
um processo sócio histórico que se constrói e se modifica de acordo com tempo,
espaço, cultura e ainda por fatores psíquicos necessários para que uma mulher se
constitua como mãe.
Ainda sobre os autores citados a cima os mesmos perceberam nessa
pesquisa que nem todas as mulheres precisam se tornar ou terem o desejo de
serem mães, ou mesmo para provar que são capazes de serem independentes, e
ainda se tem a possibilidade da maternidade e da maternagem sem relações
biológicas e os papeis de gênero em ralação aos cuidados do bebê.
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Para a Psicanalise o desempenho da função materna, é algo fundamental
para que a estruturação e o desenvolvimento do psiquismo do bebê, e esse papel
não necessita ser praticado somente pela mãe biológica, pode ser exercido por
qualquer outra pessoa que assuma a responsabilidade do cuidar materno, o pai, tia,
avó porque o bebê ao nascer precisará de um alguém responsável que supra suas
necessidades básicas, higiene, alimentação, proteção.
Segundo Badinter (1987) a intensidade e o modo como essa gravidez será
vivenciada dependerá diretamente do momento e das influências culturais do meio
em que essa mulher está inserida, levando em consideração a sua história pessoal e
afetiva.
De acordo com Freud (1914) para uma mulher o fundamento para tonar-se
mãe vem desde a infância e suas lembranças mais arcaicas, e com a gravidez essa
mulher regride, mesmo que inconscientemente relembrando na pessoa que exerceu
a função materna, carregadas de fantasias e expectativas a respeito da gestação, do
bebe, do parto, podendo ser prazeroso ou frustrantes, e como consequência essa
mãe terá prazer ou não pela maternidade, amando ou não a criança.
Já para Lebovici (2004) a gravidez pode ser positiva para essa futura mãe
que de início desperta o narcisismo primário, que ao poder gerar o filho e tê-lo com
vigor, reproduz lembranças de como foi uma criança admirada de forma narcisista
pelo pais, e chegando na fase adulta recorda sentimentos que poderá investir
positivamente nos filhos, que se tornam o objeto de desejo da mãe.
Para se construir a maternagem e o vínculo mãe e filho é necessário que
essa mãe possua o desejo e preparo de ser mãe, porque irá ser fundamental no
desenvolvimento psíquico e social do sujeito que irá chegar, que ao ser um vínculo
excessivo ou doentio, a identidade e a autonomia do bebê que pode tender a ser
futuramente um adulto que sucumbirá a personalidade, e acarretará em um sujeito
com estruturas psíquicas tendenciosas que contribuíram na construção de um falso-
self.
De acordo com a visão de Winnicott (1983) é o nome de uma ‘pseudo-
personalidade’. A personalidade se desenvolve segundo ele, a partir das
experiências que vão sendo armazenadas na memória do indivíduo.
Winnicott (1983) ver a figura da mãe como um ego auxiliar para esse bebê,
com a função de ajudar o mesmo a se organizar e adaptar-se ao mundo, porque
essa criança chega necessitando ser auxiliado para aprender a lidar com suas
21
pulsões, instintos, coordenação motora e perceptiva, estímulos ambientais, para
integrar-se consigo e com o mundo externo.
Nos primeiros meses de vida é o momento que se estabelece a base da
saúde mental, a partir de cuidados realizados por uma mãe suficientemente boa,
com tempos específicos do desenvolvimento da criança a integração e
personificação, adaptação à realidade e crueldade primitiva. (WINNICOTT, 1982)
Esse bebê em desenvolvimento necessita além de cuidados corporais, de
elementos que desenvolvam o seu psiquismo, que se completa com três funções
exercidas pela figura materna, sendo elas o holding, handling e apresentação do
objeto.
O termo holding está ligado ao suporte materno, sendo a fase que o bebê
de forma inconsciente, necessita de forma exclusiva da mãe, a figura materna irá
ajudar seu bebê na fase de dependência, que vem antes do ego integrar-se. O
handling é relacionado ao cuidado de manipulação das necessidades da criança por
parte da mãe, que deve proteger o bebê de agentes externos, promovendo um bem-
estar físico e pôr fim a apresentação do objeto outra etapa executada pela mãe que
tem a função de apresentar e entregar o objeto desejado ao bebê, a forma como a
mesma apresenta corrobora com a relação objetal, que geralmente se instaura na
primeira infância, da mesma forma deve ser feito com o seio. (WINNICOTT, 1983)
Bowlby (2001) traz que:
Os estudos diretos são os mais numerosos. Eles deixam claro que quando uma criança é privada dos cuidados maternos o seu desenvolvimento é quase sempre retardado – física, intelectual e socialmente – e que podem aparecer sintomas de doença física e mental. (BOWLBY, 2001, p. 12)
Na citação a cima o autor exalta a influência da figura materna no progresso
da organização psíquica e subjetiva do sujeito.
Essa mãe ao deparar-se com tantos deveres e obrigações com esse ser
totalmente dependente de você para o seu desenvolvimento corporal, psicológico,
cognitivo e do ambiente familiar, desenvolve a “ preocupação materna primaria”.
(WINNICOTT, 1983).
... Um estado de sensibilidade aumentada, no qual a mãe volta-se inteiramente para seu bebê, um adoecer do qual se recuperará
22
progressivamente quando o desenvolvimento do filho a for dispensando. Para viver esse momento, todavia, a mãe necessita ter um desenvolvimento sadio e um ambiente protetor que a sustente. (WINNICOTT, 1983, p. 491)
O modo como as marcas iniciais são instituídas e organizadas
inconscientemente no corpo do bebê, pela mãe, são essenciais para a sua
existência, sendo essas marcas não constituídas de desejo pode desencadear
fenômenos psicossomáticos, pelo não retorno da mãe com o desejo do bebê.
A relação dos primeiros anos de vida da criança com seus cuidadores é
primordial para o desenvolvimento da consciência do sujeito, seus pais são modelos
seguidos pelo ego da criança, que reprime ou não seus instintos pulsionais,
colaborando para o desenvolver saudável da personalidade. (KLEIN, 1996)
Klein (1996) e Winnicott (2006) concordam que a criança no início de sua
vida, é um ser desprovido de maturidade e de independência, que está passando
por experiências, não tendo consciência, mas que é possuidor da anatomia e da
fisiologia, que o ajudará na constituição da personalidade.
Outro ponto considerado por Winnicott (2006) é a forma da mãe (cuidador)
pegar no colo e sustentar suficientemente bem o bebê, não deixando essa criança
sozinha a seus próprios cuidados, influencia no seu desenvolvimento dos primeiros
meses de vida, assim como no emocional e na sua personalidade. E ainda
considera importante que o ambiente se torne confiável ou não para essa criança,
que a partir das experiências ali vivenciadas, absolvem as memorias, contribuindo
para o psiquismo infantil. (WINNICOTT, 2006)
O autor citado a cima acredita que:
[...]. No início, o bebê ainda não estabeleceu uma divisão entre aquilo que constitui o não-EU e o EU, de tal forma que, [...] o comportamento do meio ambiente faz parte do bebê da mesma forma que o comportamento de seus impulsos hereditários para a integração, para a autonomia e a relação com objetos, e para uma integração psicossomática satisfatória. (WINNICOTT, 2006, p. 79)
Dessa forma, fica evidente que a figura materna tem papel fundamental no
desenvolvimento do psiquismo, de forma satisfatória e saudável do seu bebê,
promovendo experiências positivas em um ambiente confiável, atendendo as
23
necessidades básicas dessa criança nos primeiros anos de vida. (WINNICOTT,
2006)
24
3 A RELEVÂNCIA DA MATERNAGEM NA SAÚDE PSÍQUICA DO SUJEITO
O manejo, a intenção com que a mãe (cuidador) irá investir seu afeto no
sujeito, implicará de maneira positiva ou negativa na organização do psiquismo, na
integração do ego, e diretamente na sua saúde mental do indivíduo, podendo
provocar patologias de ordem psicossomáticas, seguindo até mesmo para uma
estrutura psicótica, assim percebe-se a suma importância que a figura materna
abrange diante da saúde mental do sujeito que lhe será cuidado.
Essa relação díade mãe e filho perdura somente entre os dois por um
determinado tempo, até acontecer a entrada da figura paterna, O Complexo de
Édipo que Laplanche e Pontalis (2001), conceitua como:
Conjunto organizado de desejos amorosos e hostis que a criança sente em relação aos pais. Sob a sua forma dita positiva, o complexo apresenta-se como na história de Édipo-Rei: desejo da morte do rival que é a personagem do mesmo sexo e desejo sexual pela personagem do sexo oposto. Sob a sua forma negativa, apresenta-se de modo inverso: amor pelo progenitor do mesmo sexo e ódio ciumento ao progenitor do sexo oposto. Na realidade, essas duas formas encontram-se em graus diversos na chamada forma completa do complexo de Édipo. Segundo Freud, o apogeu do complexo de Édipo é vivido entre os três e os cinco anos, durante a fase fálica; o seu declínio marca a entrada no período de latência. É revivido na puberdade e é superado com maior ou menor êxito num tipo especial de escolha de objeto. O complexo de Édipo desempenha papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo humano. Para os psicanalistas, ele é o principal eixo de referência da psicopatologia. (LAPLANCHE; PONTALIS, 2001,p. 77)
O ponto de partida se dar pelo Complexo de Édipo e de castração que é um
conceito trazido por Freud onde ele o coloca como uma relação conflituosa, na qual
o bebê disputa com o seu pai o desejo pela mãe e o momento para a elevação da
sexualidade tanto para meninos como para meninas, pelo fato de ambos terem a
mãe como seu primeiro objeto de amor, onde se constitui um vínculo muito forte, no
entanto o destino desse amor assume direções opostas para os dois eixos.
Freud escreve que:
O amor nasce da capacidade do Eu de satisfazer uma parte de suas moções pulsionais de maneira auto erótica, obtendo o prazer do órgão. É originalmente narcísico, depois passa para os objetos que foram incorporados ao Eu ampliado e expressa então os esforços motores do Eu em direção a esses objetos que são fontes de prazer.
25
O amor se conecta estreitamente com o exercício das futuras pulsões sexuais e, quando a síntese delas tiver se completado, passará a coincidir com o todo da vertente sexual (...). Entretanto, enquanto as pulsões sexuais ainda estiverem percorrendo seu complicado desenvolvimento, algumas das etapas preliminares do amar já emergirão como metas sexuais provisórias. (FREUD, 2004, p. 161)
Freud 1932 (1976) analisa o ponto fundamental dessa desarmonia que se
dar entre mãe e filho, ou seja, a filha faz uma troca de seu objeto de amor, tirando a
figura materna dessa posição. Não se trata de uma simples troca de objeto devido
às inúmeras frustrações, sendo que o menino passa pelas mesmas frustrações da
mesma forma que a menina, e nem por isso deixa de tomar a mãe como objeto de
amor. A troca feita pelos filhos não é somente pelos objetos amorosos mãe e pai,
mas também por zonas erógenas do corpo, como falo, clitóris, vagina. Trata-se,
então, diz Freud, de “um passo que acompanhada de hostilidade; a vinculação à
mãe termina em ódio”. (FREUD, 1932).
Dessa forma Freud (1996) diz que:
Existem, num dado momento, uma escolha objetal, uma ligação da libido a uma pessoa particular; então, devido a uma real desconsideração ou desapontamento proveniente da pessoa amada, a relação objetal foi destroçada. O resultado não foi o normal &– uma retirada da libido desse objeto e um deslocamento da mesma para um novo &–, mas algo diferente (...) a libido livre não foi deslocada para outro objeto; foi retirada para o ego. Ali, contudo, não foi empregada de maneira não especificada, mas serviu para estabelecer uma identificação do ego com o objeto abandonado. Assim a sombra do objeto caiu sobre o ego, e este pôde, daí por diante, ser julgado por um agente especial, como se fosse um objeto, o objeto abandonado (...) A identificação narcisista com o objeto se torna, então, um substituto da catexia erótica, e, em consequência, apesar do conflito com a pessoa amada, não é preciso renunciar à relação amorosa. Essa substituição da identificação pelo amor objetal constitui importante mecanismo nas afecções narcisistas (...) Ele representa, naturalmente, uma regressão de um tipo de escolha objetal para o narcisismo original. (FREUD,1996, pp. 254-255)
E a partir desse conceito desenvolveu-se a teoria da sexualidade, onde ele é
o ponto culminante da sexualidade infantil e influência de forma significativa na
sexualidade adulta.
Freud 1911(1969) dar como um estado de onipotência infantil “sua
majestade o bebê”, que essa visão somente se torna possível na consideração da
26
existência de uma mãe, que é marcada pela importância da figura materna para se
abicar no desenvolvimento infantil, assim impedindo que o bebê se perceba imergido
no desespero de seu desamparo e dependência.
A respeito do Complexo de Édipo Winnicott discorda de Freud em alguns
pontos, ele o acha correto, mas insuficiente (LOPARIC, 2002). E assim foi mantido
como um conceito Freudiano. Por essa insuficiência encontrada por Winnicott na
teoria tradicional que minimiza a valorização do complexo edipiano por entender que
o bebê não existe fora da relação com a mãe, fez com que ela se atentasse a
relação inicial mãe-bebê, que se torna um novo paradigma, para ele é onde se
constrói as bases de uma vida saudável do ponto de vista do desenvolvimento
emocional do sujeito (bebê) considerando não somente aspectos psicológicos, mas
também o contexto, o ambiente no qual o indivíduo estaria inserido ajudando ou
prejudicando no amadurecimento psíquico, que a partir dessa percepção o sujeito
ter condições de reconhecer o que lhe satisfaz ou nega suas necessidades. Ele
ainda acrescenta que os sofrimentos psíquicos dos indivíduos surgem de suas
necessidades, mas não do ambiente. (LOPARIC, 2002)
E com essa nova teoria revoluciona a Psicanálise pelo fato de modificar toda
uma estrutura interna, que surge a partir da constituição e do desenvolvimento da
entidade da relação dois em um (relação inicial mãe-bebê) que substancialmente é
uma relação posterior a entrada de um terceiro ente (pai) que representa uma
ameaça a essa relação simbólica.
De acordo com Winnicott (2002) a maternagem suficientemente boa é
construída a partir da formação do estado de preocupação materna primária que
corresponde a um estado natural de sensibilização que se desenvolve durante os
últimos meses da gravidez, que serve com uma preparação para o exercício da
função materna, seguindo gradualmente para o nascimento.
Ela também já foi um bebê, e traz com ela as lembranças de tê-lo sido; tem, igualmente, recordações de que alguém cuidou dela, e estas lembranças tanto podem ajudá-la quanto atrapalhá-la em sua própria experiência como mãe. (WINNICOTT, 2002, p. 4)
Winnicott (2002) postula que uma mãe saudável geralmente
é suficientemente boa para seu bebê. O estado de preocupação materna
primária garante sua identificação e reconhecimento com o filho, facilitando que ela
possa compreender e atender as necessidades dele, além de biológicas, onde o
27
meio social é outro aspecto que pode auxiliar garantindo à genitora um entorno
seguro e não a perturbando no exercício de seu papel.
A mãe suficientemente boa, que cumpre satisfatoriamente as funções acima
descritas, permite ao bebê que ele usufrua de uma continuidade de ser, ou seja, que
se perceba como um ser completo, único e, sobretudo, real.
De acordo com Winnicott 1988 (1990), o ego materno auxilia a organização
do ego do bebê. Ainda que bastante imaturo esse bebê conta com uma integração
inicial, que o permite sentir-se como ser humano. A estabilidade concreta e afetiva
proporciona oportunidade para que ele se desenvolva.
Winnicott 1988 (1990) teorizou sobre os processos de maturação do ego,
enfatizando que o desenvolvimento se dar partindo do mais simples para o mais
complexo. Assim, a constituição inicial do ser humano é pré-requisito para as
aquisições posteriores. E a participação constante e afetiva do cuidador tem papel
fundamental nesse processo:
A existência psicossomática é uma realização, e, embora sua base seja uma tendência hereditária, de desenvolvimento, ela não pode tornar-se um fato sem a participação ativa de um ser humano que segure o bebê e cuide dele. (WINNICOT, 1990, p.10)
O autor citado ainda postula:
Na melhor das hipóteses, o bebê que está se tornando uma criança ou um adulto leva consigo a memória latente de um desastre ocorrido com o seu eu, e muito tempo e energia são gastos em organizar a vida de tal forma que esta dor não volte a ser experimentada. Na pior das hipóteses, o desenvolvimento da criança como pessoa é distorcido para sempre, e em consequência a personalidade é deturpada, ou o caráter é deformado. (WINNICOTT, 2006, p. 77)
Para Melanie Klein (1937), há um verdadeiro relacionamento amoroso da
mãe com seu bebê, na mulher que conseguiu atingir um caráter maternal. Desde
criança, a menina tem fantasias inconscientes de que o corpo de sua mãe está cheio
de bebês, colocados lá pelo pênis do pai. Os desejos experimentados durante a
infância persistem na idade adulta e influenciam o amor que a mulher grávida tem
pelo filho, o que a restitui da frustração por não ter podido receber um filho de seu
28
pai, na infância. Por ter realizado este desejo, a mulher intensifica sua capacidade
de amar o filho.
Melaine Klein diverge de Freud na implicação da relação do objeto que a
mesma considera que são significantes desde o início da vida pós-natal sejam eles
interno ou externos. (KLEIN, 1952)
Entretanto Freud vincula o objeto ao autoerotismo e narcisismo, sendo uma
pulsão erótica e exclui a relação do objeto, mas Klein não desconsidera na integra a
teoria de Freud. Na evolução de sua teoria Klein observou a relação dos sujeitos
com seus objetos internos, cercado por qualidades, características singulares e os
mesmos possuem papel fundamental na construção da subjetividade e na
constituição psiquismo do sujeito.
Segundo Melaine Klein (1952) os objetos internos e as fantasias
inconscientes são processos ativos desde o nascimento, assim como a cisão,
projeção e introjeção, que colaboram na dinâmica das relações de objeto e na
formação das instancias psíquicas como ego, superego e id, por outro lado essas
instâncias irão lidar com os conflitos ou angústias primitivas evitando ou liberando as
experiências de desprazer, e para que essa cisão não ocorra os mecanismos de
defesa atuam recalcando, essas possíveis angústias em defesa do ego. (KLEIN,
1946)
A consciência do indivíduo é resultante da sua relação e interação inicial
com os pais (ou cuidadores). O indivíduo, de certa forma, internaliza seus pais nos
primeiros anos de vida, sendo que eles se tornam parte de seu ego, mais
especificamente seu superego, que impõe ao resto do ego certas exigências,
reprimindo os instintos pulsionais da criança. Este é um fator importante tanto na
doença mental quanto no desenvolvimento da personalidade normal da mesma
(KLEIN, 1996).
O bebê, tendo incorporado seus pais, sente como se eles fossem pessoas vivas dentro de seu corpo, da mesma maneira com que profundas fantasias inconscientes são vividas – na sua mente, eles são ‘objetos internos’, como passei a chamá-los. Assim se constrói um mundo interior na mente inconsciente da criança […]. (KLEIN, 1946, p.388)
De acordo com a teoria Kleiniana, o vínculo da criança com o corpo da mãe
caracteriza o suporte do processo de formação simbólica e proporciona as
29
condições psíquicas para a ligação inicial com um mundo externo (SEGAL, 1975).
Podendo se perceber que com as contribuições de Klein se avançou na teoria
psicanalítica em relação a observação da vida emocional, instigando as estruturas
futuras dentro da teoria psicanalítica.
Além disso, de acordo com Phillips (2006) as ideias de Klein inspiraram as
formulações de Winnicott, que, no entanto, integra e critica constantemente o
trabalho da psicanalista. O momento dessa ruptura é devido a importância dos
estágios de desenvolvimento adiantado, partindo de como cada um constitui seus
olhares, preferindo lugar preenchido pela mãe nas primeiras ligações.
E essa ruptura é o momento em que as patologias podem se desencadear,
pelo não racionalismo do sujeito, sendo alguém no qual a estruturação psíquica não
foi integrada saudavelmente pelo seu ego auxiliar, a figura materna.
De acordo com Spitz (2000) a relação mãe bebê pode provocar patologias
durante a primeira infância. O autor enfatiza que a cuidadora pode realizar
comportamentos não benéficos para o bem-estar seu filho, um deles sendo a
“rejeição primária manifesta, [...] oscilação entre mimo e hostilidade, oscilação clínica
de humor da mãe, hostilidade conscientemente compensada” (SPITZ, 2000, p. 211).
O autor citado anteriormente acredita que, quando esses comportamentos
maternos são manifestos, a criança pode manifestar uma privação de algo vital para
sua sobrevivência. Ainda de acordo com Spitz (2000) onde as relações da díade
mãe e filho forem insatisfatórias, a personalidade duvidosa da figura materna, será o
causador de patologias, dando o nome a essas doenças de psicotóxicas da primeira
infância às consequências psicossomáticas que se dão pela relação objetal. (SPITZ,
2000)
De início Freud (1905) trouxe a expressão complacência somática, onde
acreditava que a neurose faria a conversão do conteúdo traumático que estava
recalcado no inconsciente, para um órgão ou aparelho do corpo, se manifestando
através de sintomas fisiológicos, onde acontecia o retorno do recalcado. A partir da
ideia de Freud, surgiu um novo termo para as doenças causadas por conteúdos
psicológicos, ou sem aparente causa fisiológica, o denominado psicossomático, que
só depois de séculos para se estruturar, veio o Heinroth, com a nova denominação
de psicossomática. MELO, 1992)
Assim, observa-se que esse bebê pode se desenvolver saudável ou não.
30
4 METODOLOGIA
A metodologia utilizada foi bibliográfica, nesse sentido, Vanti (2002) define a
bibliografia como conjunto de métodos de pesquisa utilizados para mapear a
estrutura do conhecimento em um campo científico através de uma abordagem
quantitativa e estatística de diversos dados bibliográficos. Dessa forma a partir do
tratamento de informações referentes aos autores das pesquisas, aos veículos de
publicação, às instituições de pesquisa e às palavras-chave podem-se avaliar as
tendências e o comportamento da produção científica desenvolvida sobre um tema
específico.
Esta pesquisa tem o caráter Narrativo, tendo como objetivo buscar e analisar
a literatura de maneira crítica. A busca pelos estudos não precisa esgotar as fontes
de informações. A seleção dos estudos e a interpretação das informações podem
estar sujeitas à subjetividade dos autores.
Segundo Clandinin e Connely (2000), a pesquisa narrativa mais comum
pode ser descrita como uma metodologia que consiste na coleta de histórias sobre
determinado tempo onde o investigador encontrará informações para entender
determinado fenômeno. É adequada para a fundamentação teórica de artigos,
dissertações, teses, trabalhos de conclusão de cursos.
O levantamento da pesquisa tem como finalidade aprofundar o
conhecimento sobre as questões relacionadas ao adoecimento psíquico causado
pelo excesso de afeto investido pela figura materna, e como a linha de pensamento
psicanalítico pode contribuir para ajudar esse bebê adoecido psiquicamente. Para se
chegar aos resultados formaram divido em quatro etapas, a saber:
4.1 CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO
Foram utilizados livros, que abordassem a temática sobre o tema
pesquisado sendo divido, a relação mãe-bebê, em idioma português, o outro livro
utilizado foi do autor Vanti (2002), da bibliometria à webometria. Os livros
selecionados são entre os anos de 1905 a 2006. Após os critérios de inclusão e
exclusão foram selecionados artigos nacionais, disponíveis online em textos na
integra, entre os anos de 2004 a 2018. A respeito dos critérios de exclusão, foram
excluídos artigos que não se enquadraram nos objetivos da pesquisa, aquelas cujos
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textos não estavam disponíveis na íntegra, além de cartas, teses, editoriais e
comentários.
4.2 COLETA DE DADOS
Adotou-se como fontes de informações as bases de dados eletrônicas:
Lilacs, Scielo, e Pepsic, utilizando as seguintes palavras chaves: Feminino.
Maternagem. Relação mãe-bebê. Psicossomática. Psicose. Em seguida, fez-se a
leitura na integra, sendo seletiva e aprofundada das partes que realmente
interessam para a pesquisa nos artigos selecionados. A seguir, foram excluídos os
artigos que não contemplavam o tema que estava em pesquisa, ou com conteúdo
irrelevante para os resultados. E, por fim, como terceira etapa, os artigos
selecionados foram reavaliados, feita a síntese dos mesmos e a interpretação dos
dados. As buscas foram realizadas no período de março a abril de 2018.
4.3 ANÁLISE E INTERPRETAÇÃO DE RESULTADOS
Nesta etapa foi realizada uma leitura analítica com as informações contidas
nas fontes utilizadas, tendo como objetivo ampliar os conhecimentos acerca da
temática discutida, e responder o problema da pesquisa.
4.4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Nessa etapa os resultados foram descritos de maneira qualitativa, sendo
feita uma ligação entre os conteúdos apresentados durante a pesquisa, e
comparando com os novos resultados encontrados. E tendo a conclusão das
informações e se comparações de dados obtidas sendo assim respondendo a
demanda da monografia.
32
5 RESULTADO E DISCUSSÃO
Diante a coleta de dados foi necessária compreender a relação mãe-bebê,
compreender quem é essa mulher, compreender a mulher com o desejo ou não de
ser mãe, a importância da função materna na constituição psíquica do bebê,
abordando como se desenvolvem as patologias que se estruturam a partir de uma
problematização desta função.
Todo ser humano precisa passar pelo processo de constituição psíquica
para que possa se constituir enquanto sujeito. A função materna aparece como
suporte fundamental para a estruturação do sujeito e para o desenvolvimento a
construção da afetividade e da subjetividade da criança.
Para Winnicott (1994) a função materna se faz necessária e presente antes
mesmo do bebê físico estar presente, que já é um desejo latente do casal pelo filho,
já explicito pelo casal. Outro ponto primordial para que a constituição psíquica desse
bebê se desenvolva de forma saudável no ambiente que ele irá ser gerado, é o
entrosamento do casal que pretende ter o filho, o equilíbrio do lar, que serão
fundamentais para o desenvolvimento da criança e para o desempenho da função
materna.
Outro aspecto que é necessário atentar-se, é a chegada do bebê de forma
física em encontro com referências simbólicas como o pai e a mãe, que irão
contribuir para o desenvolvimento desse corpo totalmente dependente de cuidados e
de proteção, e destituído de sentidos.
Em vista disso ao se concretizar a função materna, que acontece com a
inserção do bebê em um laço imaginário, a mãe produz uma previsão imaginária
com referência de como o bebe será, e o que ele irá desejar. Dessa forma essas
manifestações por parte da figura materna, com tentativa de descobrir o que o bebê
anseia, de forma que essa criança não consegue ainda se manifestar, fazendo com
que surja um sujeito, e supõe-se que seja a figura materna, que se expressa através
do desejo do bebê.
Segundo Winnicott (1956/2000) isso acontece pelo fato de que a mãe depois
de receber o bebê em seus braços, ela passa por um período em que pode voltar a
vivenciar de forma regressiva sua infância, projetando seus desejos no seu filho,
podendo assim facilitar na maneira como a mãe irá saciar as necessidades
fisiológicas e afetivas do bebê, onde esse período o Winnicott denomina
33
preocupação primária.
Da mesma forma Melanie Klein (1937), considera que a mulher desde
criança possui fantasias inconsciente em relação aos bebês que sua mãe possui,
esses desejos se perpetuam da infância até a vida adulta, implicando na relação da
mãe com o bebê ainda na gravidez, elaborando uma habilidade acentuada de amar
seu filho, podendo essa relação ser comparada a um caso de amor de forma
maternal.
A partir dessa relação que se inicia entre mãe e bebê de forma não mais
somente simbólica, mas já concretizada, poder emergir desejos não-saudáveis da
mãe, que implicará de forma negativa no desenvolvimento psíquico dessa criança,
que podem vir a ser por conta do não anseio pela maternagem, como também pela
falta de condições psíquicas dessa mulher que passou pela maternidade, havendo
assim a eventualidade de se instaurar futuramente patologias a nível psíquicas ou
fisiológicas nesse sujeito, sendo uma delas o sintoma psicossomático, que surgem
como consequências de uma maternagem frágil e instável.
Portanto, a psicossomática segundo Baseggio (2012):
Consiste na dificuldade de resolução de conflitos internos que estão latentes e que ganham simbolismo e significado através do corpo. Quando se fala em crianças, a compreensão deste simbólico torna-se ainda mais fundamental, pois estas ainda não desenvolveram a capacidade total de expressar-se por meio da linguagem verbal, [...] incumbindo o outro e o corpo de desvendar o que está sendo dito”. BASEGGIO (2012, p.636)
As experiências traumáticas sofridas na infância que dão origem aos
sintomas psicossomáticos são resistentes e dolorosas, pelo fato do sujeito não
suportar ter consciência desse trauma, o conteúdo não emerge no consciente e fica
recalcado no inconsciente, sentimentos como angustia, perdas.
Para Klein (1981) as crianças ao adoecerem estão simbolizando
sentimentos traumáticos, como a angústia, culpa, que trazem aflição em uma certa
idade, sendo em parte sugeridas por neuroses, e ainda evidencia que o papel
exposto pelos fatores psicológicos nas disfunções orgânicas a que as crianças estão
sujeitas.
Levando em consideração os argumentos apresentados, a intenção dessa
34
pesquisa foi de enriquecer e contribuir para um melhor esclarecimento da
importância da dinâmica da função materna na constituição psíquica da criança a
partir do desejo da mãe (cuidador). Dessa forma foi permitido também compreender
de forma mais clara e aprofundada o modo como as patologias, podem serem
desenvolvidas e despertadas quando se há um desequilíbrio na estruturação
psíquica da mãe.
Portanto, esse estudo é uma breve pesquisa que teve o respaldo teórico em
uma linha de referência da abordagem Psicanalítica, com citação de autores
clássicos da Psicanálise, como Freud, Melaine Klein, Winnicott, entre outros que
contribuíram.
35
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao realizar a seguinte pesquisa pude perceber o quanto é relevante o
contexto feminino, e como ele foi construído, desenvolvido e imposto a esse ser
mulher, que não tinha direito a impor suas escolhas e desejos, a classe masculina
predominava em todos os ambientes, de trabalho, do lar, com a famílias, isso na
época patriarcal, na qual a figura feminina estava sucumbida e nadificada de
desejos.
A mulher não tinha o direito nem mesmo de alimentar sua cria, era função
de mulheres com condições menos favoráveis financeiramente chamadas “amas de
leite”, acarretando no aumento da mortalidade infantil, pelo fato de que essa criança
era suprida somente em suas necessidades básicas (fisiológicas, alimento) o afeto e
amor da mãe não eram investidos.
A partir da Constituição Federal de 1988, junto com a mesma veio os direitos
humanos, que visa direitos igualitários para homens e mulheres, mas sabemos que
não funciona assim, mas é um contexto que já está conquistando novas
expectativas. Na maternidade isso já é possível, a mãe ter o direito de cuidar do seu
filho.
E aí então se inicia a questão, o que deseja essa mulher? Ser mãe, ser
somente mulher. Isso influenciará diretamente no modo como essa mulher iria
realizar os cuidados maternos, porque a maternidade é uma questão social, cultural
e histórica, que consideram que só se é mulher se tiver um bebê, algo bem diferente
da maternagem, pelo fato de que essa mulher terá seu bebê por desejo próprio e
não por imposição e irá cuidar do seu filho por com amor, realizando os desejos do
bebê, suprindo suas necessidades emocionais, cognitivas, afetivas e básicas.
E a partir desse desejo a Psicanálise trouxe sua contribuição na implicação e
no investimento desse amor por parte da figura materna. Levando em consideração
a estruturação psíquica dessa mulher, como a sua infância foi desenvolvida, a
relevância da sua figura materna anterior, sendo satisfatória ou não, e como a mãe
pode adoecer psiquicamente sua criança.
A mãe com seu ego desorganizado, pode confabular a partir desse desejo
pelo filho, investido esse afeto de forma doentia, ou mesmo pelo não desejo de
tornar-se mãe, adoecendo psicologicamente esse bebê que está sob seus cuidados
maternos de forma efetiva, podendo a mesma na fase adulta desencadear doenças
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psicossomáticas, e possivelmente uma estrutura na Psicose.
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