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compilações doutrinais VERBOJURIDICO ® EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA: O DIREITO DE REVERSÃO ___________ Maria Elisabete Almeida Rocha

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compilações doutrinais

VERBOJURIDICO ® 

EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA:

O DIREITO DE REVERSÃO

___________

Maria Elisabete Almeida Rocha

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 2

ÍNDICE

Introdução 4

1.As principais garantias dos particulares face à expropriação. 6

1.1. A garantia geral e as garantias específicas 6

2.A garantia específica: o direito de reversão 6

2.1.Noção de direito de reversão 6

2.2.Fundamento do direito de reversão 7

2.3. A natureza jurídica do direito de reversão 7

3. Pressupostos do direito de reversão 8

4. Cessação do direito de reversão 9

5.Caducidade do direito de reversão. 10

6.Garantias do direito de reversão e preferência 10

7. A aquisição pela via do direito privado e o direito de reversão 11

8. O procedimento do direito de reversão 13

8.1Sub – procedimento administrativo 13

8.2.Sub – procedimento judicial 13

9Análise de Jurisprudência relacionada com o direito de reversão 14

9.1Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo. 14

9.1.1.Matéria de facto 14

9.1.2.Conclusões / parecer do T.A.F.L. 15

10.Comentário ao presente acórdão 15

10.1. O direito de reversão pelo desvio da cedência da finalidade pública 16

10.2.O exercício do direito de reversão 17

10.3 Data do exercício do direito de reversão e respectivo prazo de caducidade. 17

10.4. O direito de reversão e a aquisição pela via do direito privado 18

11.Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (cessação do direito de reversão) 19

11.1.Matéria de facto 19

11.2.Conclusões 21

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 3

PRINCIPAIS ABREVIATURAS

A-----Autora

ART----Artigo

CC------Código Civil

CRP----Constituição Portuguesa da República

CE------Código das Expropriações (Lei nº 168/99 de 1 de Setembro)

CJA-----Cadernos de Justiça Administrativa

CPA-----Código de Procedimento Administrativo

DL------Decreto de Lei

DR-------Diário da República

DUP------Declaração de utilidade pública

LPTA----- Lei de Processo dos Tribunais Administrativos, aprovada pelo Decreto

-Lei nº 167/85, de 16 de Julho.

MCOTA--Ministério das Cidades e do Ordenamento do Território e Ambiente

PER------Programa Especial de Realojamento

PROC----Processo

STA-----Supremo Tribunal Administrativo

TAFL----Tribunal Administrativo e Fiscal de Lisboa

TC--------Tribunal de Círculo

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 4

Expropriações por Utilidade Pública O Direito de Reversão

———

Maria Elisabete Almeida Rocha

Introdução

Neste pequeno trabalho de investigação e análise de jurisprudência, que se insere na cadeira

de Jurisprudência do Ordenamento do Território e Urbanismo, iremos analisar uma das garantias

do particular na Expropriação por Utilidade Pública, nomeadamente, uma garantia específica, ou

seja, o direito à reversão dos bens expropriados. Podemos definir este instituto como um direito

que, embora decorrente do acto expropriativo, é próprio do expropriado como forma de neutralizar

o efeito daquele acto e que só se subjectiva depois de consumada a expropriação, e de se verificar

que o bem que dela foi objecto não foi aplicado ao fim para que foi expropriado ou que cessou a

sua aplicação a esse fim. Traduz no poder de aquele primeiro titular o fazer voltar à sua esfera

jurídica, por força da desnecessidade da expropriação do bem ao fim de utilidade pública que se

visava prosseguir.

A temática central deste trabalho é a análise nos fundamentos do Direito de Reversão, e

vincar as suas causas de cessação e a sua caducidade, ou seja, explicitar que a cessação e a

caducidade são dois conceitos jurídicos diferentes, muitas vezes na prática confundidos, mas que

em relação ao direito de reversão têm pressupostos de exigibilidade e actuação diferentes.

Mas antes de analisar em concreto os acórdãos sobre este tema, veremos então a tramitação

prática deste direito de reversão, começando por referir e delimitar este conceito, como sendo uma

garantia específica dos particulares para poderem fazer face à expropriação, delimitando a sua

natureza jurídica, não esquecendo os seus pressupostos, e a sua não aplicação ao fim, e a sua

cessação de aplicação ao fim, e ainda o problema da aquisição dos bens pela via do direito privado,

e descortinando os seus trâmites processuais.

O que realmente pretendemos com este trabalho é vincar a diferença prática e jurídica de

algumas causas da cessação e caducidade do direito de reversão, recorrendo ao enquadramento

geral deste direito, e à análise destes dois últimos conceitos, através da exposição teórica e

consequente análise prática de acórdãos.

De acordo com o C.E. de 1991, no seu art. 5º n 4 refere que o direito de reversão cessa

quando tenham decorrido 20 anos sobre a data da adjudicação; quando seja dado aos bens outro

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 5

destino, mediante nova declaração de utilidade pública; quando haja renúncia expressa do

expropriado. Já no nº6 do mesmo preceito, a reversão deve ser requerida no prazo de dois anos a

contar da ocorrência do facto que a originou, sob pena de caducidade, sem prejuízo de assistir ao

expropriante, até ao final do prazo, de 20 anos, o direito de preferência na alienação dos bens para

fins de interesse privado. O artigo 5º nº1 do C.E. de 91 considerava como factos constitutivos do

direito de reversão; a não aplicação dos bens ao fim que determinou a expropriação no prazo de

dois anos a contar da adjudicação; e ter cessado a aplicação dos bens ao fim que determinou a

expropriação.

No que respeita ao C.E. de 1999, mantém como factos constitutivos do direito de reversão

(art. 5º nº1,a) e b)), as mesmas situações práticas do art. 5º nº1 do C.E. de 1999, no que concerne à

cessação do direito de reversão a situação entre os dois códigos é a mesma, havendo uma pequena

alteração é em relação ao prazo de caducidade do direito de reversão, que no actual C.E. de 99 era

de 3 anos a contar da ocorrência do facto que a originou, sob pena de caducidade.

É então sobre estas diferenças e semelhanças práticas da caducidade e cessação do direito de

reversão que nos iremos debruçar ao longo do trabalho, sem primeiro fazermos um apanhado geral

de todos os requisitos e condições deste instituto.

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 6

1.As principais Garantias dos Particulares face à expropriação1

1.1. Garantia geral e garantias específicas

A primeira garantia de que os particulares dispõem face à expropriação é uma garantia de

carácter geral. Com o efeito, sendo o acto de declaração de utilidade pública um acto

administrativo, o particular por ele lesado dispõe, tal como acontece em relação a qualquer acto

administrativo, de direito à impugnação contenciosa, com fundamento em ilegalidade (art. 268º,

nº4 da CRP). Mas o C.E. prevê ainda algumas garantias específicas dos particulares perante a

expropriação, tais como, a caducidade da D.U.P, a indemnização e o direito de reversão, este

último que analisaremos de seguida.

2. Garantia específica: o direito de reversão

2.1. Noção

Podemos definir direito de reversão como aquele direito que tem por base os bens

expropriados que não sejam aplicados ao fim cuja utilidade pública justificou a expropriação, que

dele tenham sido desviados ou que tenham sobrado das obras (parcelas sobrantes), devem reverter

ao primitivo proprietário a requerimento deste ou dos seus herdeiros. Mas a reversão não existe se

os bens ou direitos expropriados tiverem sido ou, antes da decisão sobre o respectivo pedido,

vierem a ser destinados a outros fins de utilidade pública ou permutados com outros afectados a

qualquer destes fins2.

Por outro lado, podemos também dizer que a reversão é um direito que, embora decorrente

do acto expropriativo, é o próprio do expropriado como forma de neutralizar o efeito daquele acto e

que só se subjectiva depois de consumada a expropriação e de se verificar que o bem que dela foi

objecto não foi aplicado ao fim para que foi expropriado ou que cessou a aplicação a esse fim.

Traduz-se no poder de aquele primeiro titular o fazer voltar à sua esfera jurídica por força da

necessidade da expropriação do bem ao fim de utilidade pública que visava prosseguir3.

De forma concreta, quando o beneficiário da expropriação der aos bens expropriados uma

utilização diferente da prevista no acto da D.U.P, quando não utilize o bem expropriado no prazo

1 Fernando Alves correia, “ As Garantias do Particular na Expropriação por Utilidade Pública”, Coimbra, 1982,

Coimbra, cit., pág.. 114. 2 João Melo Franco/ Herlânder Antunes Martins, “Dicionário de Conceitos e Princípios Jurídicos”, 3ªed., rev. e act.,

Coimbra, Almedina, 1993,cit., pág. 771. 3 Podemos seguir a fundamentação deste entendimento no Ac. do TAF de Coimbra de 26-04-2007.

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 7

de 2 anos a contar da adjudicação ou quando a aplicação ao fim previsto da DUP tiver cessado, o

expropriado tem o direito de requerer a reversão ou retrocessão dos bens (art. 5º do C.E.) 4.

2.2.Fundamento do direito de reversão

A reversão traduz-se na possibilidade que o expropriado tem de reaver a propriedade do

prédio expropriado, quando lhe tenha sido dada outra utilidade, ou destino que não o previsto na

declaração de utilidade pública, ou, ainda, se tiver cessado a aplicação a esse fim. Os factos

jurídicos constitutivos da reversão são, assim a inércia da expropriante e a alteração do fim

expropriativo5.

Este direito encontra fundamento na garantia conferida pela constituição ao direito de

propriedade, nomeadamente no art. 62º da C.R.P.: “ A todos é garantido o direito à propriedade

privada e à sua transmissão em vida ou por morte, nos termos da constituição”. Se a finalidade da

expropriação não se realizar dentro do prazo que se considera aceitável, ou se se verificar

posteriormente que o imóvel não é necessário à realização daquele fim, deixa de estar legitimada a

violação do direito de propriedade. O que na prática significa, é que a expropriação está sujeita à

condição resolutiva de a entidade expropriante dar ao bem expropriado o destino específico de

utilidade pública que fundamentou a aquisição6.

O direito de reversão consiste, ainda, num afloramento do princípio da proporcionalidade,

pois surge quando se constata, ou se depreende com elevado grau de certeza, que o fim de utilidade

pública já não exige a lesão daquele bem particular.

2.3. Natureza jurídica do direito de reversão

Com o este direito estabelece-se uma importante garantia do particular e, ao mesmo tempo,

um importante instrumento de moralização da actividade expropriativa. Daqui decorre que o

interesse público ou a causa de utilidade pública que constitui a causa da expropriação acompanha-

a mesmo para além da sua consumação. É neste sentido, que Alves Correia, refere que existem

várias teses quanto à natureza jurídica da reversão, designadamente a que a considera como um

direito legal de compra conferido ao expropriado e a que a vê como uma condição resolutiva7.

4 Fernanda Paula Oliveira, “Direito do urbanismo”, CEFA, Coimbra, 2001, cit., pág. 108 e 109. 5 Cfr., Pedro Elias da Costa, “ Guia de expropriações por Utilidade Pública”, 2ª ed., rev. e act.; Nov. 2003,

Almedina, pág. 245. 6 Fernando Alves Correia, “As Garantias do Particular………………..”, cit.,pág. 166. 7 Cfr., José Osvaldo Gomes, “ Expropriações por utilidade pública”, Texto Editora, 1997, pág. 397…...Este autor

relativamente à natureza jurídica do direito de reversão, refere ainda outra tese, a de que a reversão constitui um direito de preferência na reaquisição do bem expropriado.

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 8

Em relação à primeira tese, os defensores desta tese encaram a reversão como um direito

reconhecido pela lei aos antigos proprietários dos bens expropriados, de comprar os bens não

utilizados ao fim de utilidade pública específica que justificou a expropriação. Esta posição

maioritária merece-nos algumas reservas, na verdade considerar a reversão como um direito legal

de compra pressupõe que o expropriado ao manifestar a sua pretensão de readquirir total ou

parcialmente os bens que lhe tinham sido retirados e que não foram aplicados ao fim de utilidade

pública previsto no acto declarativo se apresente como o animus de um qualquer comprador, o que

não nos parece correcto, já que ele pretende fazer valer um direito que lhe assiste na qualidade de

sujeito passivo da expropriação.

De acordo com última tese relativa à natureza jurídica do direito de reversão, que parece ser

a que melhor exprime a verdadeira natureza jurídica da expropriação, o acto expropriativo tem a

sua justificação no facto de os bens serem necessários para a realização de uma finalidade

específica, pelo que a expropriação está condicionada pela efectiva subsistência da causa. Se tal

causa desaparecer, o expropriado passa a ter o direito de reaver o bem, o que demonstra que a

consistência da transferência da propriedade dos bens decorrente da expropriação para a entidade

beneficiária da mesma está sujeita à condição resolutiva de esta dar ao bem expropriado o destino

específico de utilidade pública. Deste modo, estando a transferência do bem dependente de uma

condição resolutiva, tal significa que se desaparecer, por qualquer motivo, o fim público que foi a

causa da expropriação, os efeitos cessam, impondo a repristinação das coisas no “status quo ante”,

restituindo ao ex – proprietário o preço que tinha recebido na indemnização e recuperando a

propriedade do bem8.

3. Pressupostos do direito de reversão

O artigo 5º do C.E. fixa os pressupostos do exercício do direito de reversão. Conforme o

disposto neste artigo, no seu nº1, o direito de reversão nasce, na situação de 2 anos após a data de

adjudicação, se os bens expropriados não forem aplicados ao fim que determinou a expropriação, e

ainda quando tiverem cessado as finalidades da expropriação, nomeadamente, se a entidade

expropriante decidir dar outro destino económico ao bem expropriado, depreende-se que as

finalidades da expropriação cessaram.

Resumindo o direito de reversão dos bens expropriados mostra-se previsto em duas

situações: a primeira não serem aplicados ao fim que determinou a expropriação no prazo de dois

anos após a adjudicação, na segunda situação, ter cessado a aplicação a esse fim. Enquadram-se na

primeira todas as situações em que os bens expropriados não foram utilizados para o fim que

8 Fernando Alves Correia, “ As Garantias do Particular……………….”, cit., págs. 351 a 353..

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 9

determinou a expropriação e, portanto, quer aquelas situações em que os bens não foram aplicados

pelo expropriante a qualquer fim, quer aquelas em que os bens foram aplicados a fim diferente

daquele a que se destinavam, em face da declaração de utilidade pública. Por sua vez enquadram-se

na segunda situação os casos em que o bem expropriado foi aplicado ao fim que determinou a

expropriação, mas essa aplicação cessou posteriormente.

4. Cessação do Direito de Reversão

Constituem causas de cessação do direito de reversão as seguintes situações:

a) Decurso de 20 anos sobre a data da adjudicação (art. 5º nº4, al. a))9;

b) Se uma nova D.U.P. der outro destino aos bens expropriados, ou seja, se os afectar à

realização de uma obra diversa daquela para a qual foram expropriados (art. 5º, nº4, al.b));

c) Renúncia do expropriado ao direito de reversão (art. 5º nº4, al.c)). Por regra, a renúncia,

deve ser expressa, exceptuando-se dois casos previstos no n.ºs 6 e 7 do art. 5º, em que são

interpretadas como renúncia as seguintes condutas do expropriado:

O acordo entre a entidade expropriante e o expropriado, ou demais interessados, sobre

outro destino a dar ao bem expropriado, ou sobre o montante do acréscimo da indemnização, no

caso de nova D.U.P;

O não exercício do direito de reversão no prazo de 60 dias após a comunicação da

entidade expropriante, ao expropriado e demais interessados conhecidos do projecto de alienação

de parcelas sobrantes, feita por carta ou ofício registado com aviso de recepção.

d) Renovação da D.U.P. com fundamento em prejuízo grave para o interesse público, dentro

de 1 ano após o momento em que tenha nascido o direito de reversão (art. 5º, nº4, al. d));

e) Início da realização de obra contínua em qualquer local do traçado (art. 5º, nº2). De

acordo com o art. 5º nº4, entende-se por obra contínua aquela que tenha configuração geométrica

linear e que, pela sua natureza, é susceptível de execução faseada ao longo do tempo,

correspondendo a um projecto articulado, global e coerente.

9 Ac. do S.T.A. de 23-02-1995, proc. nº 32346: “ II- decorridos 20 anos sobre a data da adjudicação do imóvel

expropriado cessa o direito de reversão, tenha ou não sido possível exercitá-lo (art. 5º nº 4 do C.E.), III- O art. 329º do C.CV. ao prescrever que o prazo de caducidade só começa a correr no momento em que o direito puder legalmente ser exercido respeita apenas aos prazos de caducidade em que não é conhecido o momento a partir do qual se contam”.

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 10

O direito de reversão renasce quando, em caso de obra contínua, os trabalhos forem

suspensos, ou estiverem interrompidos por prazo superior a 2anos. Neste caso, a reversão deve ser

requerida no prazo de 3 anos a contar do final daquele (art.5º, nº9).

5. Caducidade do direito de reversão

O direito de reversão caduca, se não for requerido no prazo de 3 anos a contar da ocorrência

do facto que originou o seu nascimento (art. 5º, nº1, als. a) e b) do C.E., ou do final do facto que

originou o seu renascimento (art. 5º, nº9 do mesmo preceito). Caducando o direito de reversão, fica

o expropriado com o direito de preferência na primeira alienação dos bens, até ao final do prazo de

20 anos sobre a data da adjudicação. O direito de preferência pode cessar através de renúncia

expressa do expropriado ou por meio de renúncia tácita, nos termos previstos para o direito de

reversão, nos nºs 6 e 7 do art. 5º do C.E.10.

O novo regime parece pretender que este direito de preferência dos expropriados só existe

decorridos que estejam 3 anos sobre o facto que origina o direito de reversão; decorrido esse prazo.

Assim, durante esses 3 anos, os expropriados só poderiam requerer a reversão: se o bem fosse

entretanto alienado os expropriados não seriam preferentes. Se considerarmos, que este direito de

preferência é uma específica forma do exercício do direito de reversão, não se encontrando

qualquer justificação para que se retire aos expropriados, neste período, aquele direito de

preferência11.

6. Garantia dos direitos de reversão e de preferência

Tanto o direito de reversão como o direito de preferência nascem quando se verificam os

seus pressupostos legais, não constituindo qualquer objecção o facto de, entretanto, o bem

expropriado ter sido transmitido a terceiro. Quando o bem já tiver sido transmitido a terceiro, a

jurisprudência não é unânime sobre se o recurso do acto que a indefere a reversão deve, ou não, ser

admitido. Nem o direito de preferência nem o direito de reversão têm eficácia real, assim sendo,

não podem ser opostos a terceiros. No entanto, pode o bem ter sido transmitido através de acto

administrativo que ainda não se consolidou na ordem jurídica, contudo, mesmo que já não haja

possibilidade de exercer o direito de reversão, o expropriado tem ainda, interesse em reclamar uma

indemnização.

10 Pedro Elias da Costa, “ Guia de Expropriações por Utilidade Pública…”, cit.,pág. 248. 11 José Viera da Fonseca, “ Principais Linhas inovadoras do Código de Expropriações de 1999”, Revista Jurídica de

Urbanismo e Ambiente”, 1999, nº14, cit., pág. 119.

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 11

Parece-nos, assim, ser preferível a doutrina que defende a admissibilidade de recurso, já que

a transmissão do prédio expropriado não constitui um impedimento absoluto ao exercício do direito

de reversão, nem retira ao expropriado o interesse em impugnar o seu indeferimento12. Deste modo,

caso a entidade competente para decidir não tenha reconhecido o direito de reversão, deverá o

requerente interpor recurso contencioso dessa decisão, devendo ser chamados a intervir nesse

recurso os terceiros adquirentes do bem, a quem o provimento do recurso possa directamente

prejudicar (art. 36º nº1, al. b) da L.P.T.A.). Ao expropriado deverá ser atribuída uma indemnização

correspondente aos danos causados pelo não exercício do seu direito, a ser fixada nos termos gerais

do direito, cabendo a responsabilidade dessa indemnização por pertencer à entidade expropriante13.

7. Aquisição pela via do direito privado e o direito de reversão

A tentativa de aquisição dos bens ou direitos necessários ao desempenho de uma actividade é

caracterizada no código como por via do direito privado. Embora a reversão esteja pensada para as

hipóteses em que tenha havido declaração de utilidade pública e adjudicação do bem expropriado, e

não obstante defendermos que a aquisição do bem pela via do direito privado não faz ainda parte

do procedimento expropriativo propriamente dito, o direito de reversão deve também poder ser

exercido naquelas situações em que o particular, nos termos do art. 11º, tenha cedido o bem pela

via do direito privado. E isto compreende-se na medida em que, a tentativa de aquisição do bem

pela via do direito privado não é qualquer tentativa de aquisição privada do bem, mas uma tentativa

de aquisição que antecede necessariamente um procedimento expropriativo, pelo que o particular

sabe que não chegando nesta fase a acordo com o eventual beneficiário da expropriação, este

lançará mão do processo expropriativo. Trata-se deste modo, de uma aquisição substitutiva da

expropriação e umbilicalmente ligada a ela14.

Porém a doutrina, entre ela, José Vieira da Fonseca, não concorda com esta posição,

referindo que a aquisição pela via do direito privado é um procedimento administrativo, mais

precisamente uma específica fase do procedimento expropriativo. Esta concreta relação jurídico –

procedimental, pode ser qualificada como um sub – procedimento administrativo, porque integra

uma sucessão ordenada de actos e formalidades tendentes à formação, manifestação e execução da

vontade, não só de quem desenvolve uma actividade administrativa (art.1º, nº1 do CPA). A

conclusão é evidente: a aquisição pela via do direito privado é uma aquisição expropriativa,

12 Ac. do S.T.A. de 22-04-1997, C.J.A. nº6, 1997, pág. 43: “ I- A transmissão a terceiro de bem expropriado, pelo

expropriante, não é por si facto impeditivo do exercício pelo proprietário expropriado do direito de reversão. II- Em tal situação assiste-lhe, pois, legitimidade para impugnar contenciosamente a decisão administrativa que lhe tenha negado o direito de reversão”.

13 Pedro Elias da Costa, “ Guia de Expropriações por Utilidade Pública…”, cit.,pág. 249. 14 Fernanda Paula Oliveira, “Direito do urbanismo”, cit., pág. 111.

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 12

efectuada no âmbito de uma relação e procedimento expropriativos, e os vendedores expropriados

são titulares do direito de reversão15.

O legislador preocupou-se em regular a aquisição substitutiva da expropriação para que se

reconheçam ao particular garantias idênticas às que dispõe os particulares que não querendo vender

o bem pela via do direito privado acabam por ser expropriados, designadamente a garantia de que o

preço da venda seja o preço justo (tal como a indemnização o terá de ser). Mal se compreenderia

que o particular que colaborou com as entidades que pretendem prosseguir finalidades públicas,

vendendo-lhes os bens, ficassem menos protegidos do que aqueles, que não colaborando, acabam

por ser expropriados. E esta fundamentação tem tanto mais razão de ser quanto ao abrigo do actual

C.E., se determina expressamente que quando uma determinada entidade pretende adquirir um bem

ao particular para prosseguir um determinado fim de utilidade pública, tem, logo na resolução de

requerer a D.U.P., de identificar essa finalidade, ficando, por isso, a partir de aí vinculado a ela.

Porem se adquirir o bem ao particular pela via do direito privado para uma determinada finalidade

identificada na resolução de requerer a D.U.P. e, posteriormente, o utilizar para um fim diferente,

parece-nos que não deve poder ser recusado ao particular o exercício do direito de reversão, se tal

direito não decorrer de qualquer cláusula do contrato, quanto mais não seja, por cumprimento do

princípio da boa – fé, ou da confiança contratual16.

Não obstante, o S.T.A. já considerou, por várias vezes, não ser este o meio idóneo para

reagir contra o incumprimento, por parte da Administração ou do contraente privado na esfera

jurídica do qual ingressou o bem (apesar de nas hipóteses sub iudicio ter ocorrido um acto de

declaração de utilidade pública, este Tribunal considerou que a celebração posterior de um contrato

de compra e venda em “ moldes privados” para operar a adjudicação do bem veda ao recurso ao

procedimento de reversão)17

15 José Viera da Fonseca,”Principais linhas inovadoras……………….”, cit., pág. 133 e 141. Embora este autor tenha

uma concepção diferente no sentido de que não concorda que a tentativa de aquisição do bem pela via do direito privado já se encontra inserida no procedimento expropriativo, acabará chegará a esta conclusão, nomeadamente de que aquisição do bem pela via do direito privado não afasta o direito de reversão.

16 Fernanda Paula Oliveira, “Direito do urbanismo………………...”, cit., pág. 112. 17 Cfr., Fernanda Paula Oliveira, “ Há expropriar e expropriar………….…(ou como alcançar os mesmos objectivos

sem garantir os mesmo direitos) ”, C.J.A., nº35, Setembro/Outubro, 2002, pág.41 a51.

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 13

8. O procedimento do direito de reversão18

A tramitação do exercício do direito de reversão consta dos artigos 74º a 79º do C.E., e

divide-se em duas fazes: decompõe-se num sub – procedimento administrativo e num sub –

procedimento judicial.

8.1. Sub-procedimento administrativo

No que concerne a este procedimento, este inicia-se com o requerimento de reversão que

deverá ser dirigido à entidade que tenha declarado a utilidade pública da expropriação ou que haja

sucedido na respectiva competência (art.74ºnº1). Segue-se nos termos do art. 75º, a audiência da

entidade beneficiária da expropriação e dos outros interessados (titulares de direitos reais sobre o

prédio a reverter ou sobre os prédios dele desanexados, cujos endereços sejam conhecidos), de

acordo com o artigo 75º. De seguida, a entidade competente emana a decisão de autorização da

reversão ou da recusa. Se o interessado não for notificado de qualquer decisão no prazo de 90 dias,

pode fazer valer o direito de reversão no prazo de um ano mediante acção administrativa comum a

propor no T.C. a autorização da reversão é notificada ao requerente, ao beneficiário da

expropriação e aos interessados cujo endereço seja conhecido sendo ainda publicada por extracto

na IIª série do Diário da República (art.76º).

8.2.Sub-procedimento judicial

O interessado deverá deduzir o pedido de adjudicação perante o T.C. da situação do prédio

ou da sua maior extensão, no prazo de 90 dias a contar da data de notificação da autorização (art.

77º nº1), sendo pressuposto do pedido de adjudicação dos bens, que a reversão tenha sido

autorizada pela entidade competente. Depois sendo o beneficiário da expropriação citado para

deduzir a oposição quanto ao valor das benfeitorias ou deteriorações que eventualmente hajam

ocorrido no prédio a reverter (art. 78º).

Efectuados os depósitos ou restituições a que haja lugar, o juiz adjudica o prédio ao

interessado ou interessados com o ónus ou encargos existentes à data da D.U.P. e que hajam

caducado definitivamente (art. 79º).

18 Fernanda Paula Oliveira, “Direito do urbanismo……………”, págs. 109 e 110; e, em relação ao mesmo assunto,

procedimento e trâmites do direito de reversão, ver, Pedro Elias da Costa, “ Guia de Expropriações por Utilidade Pública…”, cit.,pág. 250 a 256.

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 14

9. Análise de jurisprudência relacionada com o direito de reversão

9.1. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo19

9.1.1. A matéria de facto

Este acórdão tem por base o facto de A. ter interposto recurso de uma sentença do T.A.F.L.,

que julgou procedente a excepção peremptória de caducidade do direito de reversão, que a

recorrente pretendia ver reconhecido na presente acção de reconhecimento de um direito acabando

o tribunal por absolver a Ré do pedido.

Ao nível dos factos ficaram provadas as seguintes situações:

A A. requereu a aprovação e o licenciamento de um projecto de loteamento de para um

terreno da sua propriedade, sendo autorizado o referido loteamento por parte da C.M.C. em 19-04-

1989, com emissão de alvará em 2-06-2008.

Nesse alvará foi estipulado a cedência pela A. à C.M.C. de duas parcelas e nove lotes de

terreno, sendo a primeira parcela destinada a arruamentos e a segunda destinada a fins de interesse

público a definir pela Câmara.

Com a escritura datada de 18-05-1989, outorgada entre a A. e a C.M.C., foi declarado pela

A. fazer uma doação pura e irrevogável ao Município de Cascais, de duas parcelas e nove lotes de

terreno, estes últimos destinados aos fins que a Câmara entender.

Por protocolo outorgado em 9-02-1996 entre a Ré (C. M. C.), a B…SA e a C…SA,

aprovado pela CMC, por deliberação pela Assembleia Municipal em 15-01-1996, foi acordado

promover em conjunto um programa de habitação social traduzido na construção de cerca de 1200

fogos destinados ao realojamento de famílias carenciadas, em terrenos privados e públicos do

Município, e nos restantes 200 fogos a comercializar em venda livre pelas segundas contraentes.

Em 9-10-1996, a CMC aprovou uma permuta sobre os terrenos anteriormente referidos,

para construções no âmbito do PER, a referida permuta passou a englobar designadamente os lotes

10, 11, 17, 18 e 19 cedidos pela A. á Ré (C.M.C.), destinados ao fim de interesse público que a

Câmara entendesse.

Em 21-11-1996, por escritura celebrada entre a CMC e a B…SA, em conformidade com o

referido protocolo inicial, acordaram as partes na troca de terrenos, dos lotes cedidos pela A. á Ré.,

ora foram transmitidos à segunda outorgante, destinados à construção e livres de encargos ou ónus,

por troca com conjunto de outros prédios desta.

19 Ac. do S.T.A. de 27-11-02-2007, proc. nº 01095/06, relator do processo, Fernanda Xavier.

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 15

Em execução do protocolo PER foram construídos 1000 fogos para habitação social e

infra- estruturas de uso colectivo, recebendo a C.M.C. da B….SA e da C…SA, em permuta

terrenos para instalações de equipamentos sociais, sendo posteriormente na conservatória

territorialmente competente os lotes cedidos pela A. à Ré a favor de B…SA, e posteriormente esses

lotes foram vendidos a D, E, F, G, e H …..Lda e posteriormente a terceiros.

Em 19-07-2000, a A. requereu ao Presidente da C.M.C. a reversão da propriedade, cujo

requerimento foi indeferido. Em 29.10.2001 a A. propôs a competente acção judicial.

9.1.2. Conclusões / parecer do TAFL

Nesse tribunal houve um parecer no sentido do provimento do recurso com base em três

fundamentos essenciais: o primeiro, o facto de o direito de reversão se considerar exercido com a

formulação do respectivo pedido, perante a entidade com competência para o apreciar. Neste caso,

tendo o pedido de reversão sido dirigido à entidade administrativa a quem os terrenos foram

cedidos para fins de interesse público, deve entender-se como data do exercício do direito, a 19 - 07

-2000, do referido pedido. O segundo fundamento, é o facto que o exercício do direito de reversão

é de três anos, dado que este é regulado pela lei em vigor à data em que ele é exercido. Ora, em 19-

07-2000, vigorava já o C.E. de 99. O art. 5º nº5, deste mesmo preceito, estabelece para o pedido de

reversão um prazo de 3 anos a contar da ocorrência do facto que a originou. O último fundamento

tem por base o facto gerador do direito de reversão, que é constituído pelo desvio da finalidade

pública da cedência dos terrenos.

O facto de o protocolo assinado entre a C.M.C. e a B…SA, subjacente ao contrato de

permuta celebrado entre as partes, e a realização de construções no âmbito do PER, e o desvio da

finalidade pública, a ter existido apenas se concretizou com a venda efectuada pela B…SA a

terceiros. Este entendimento é contrário à sentença recorrida que considerou que o desvio da

finalidade pública ocorreu com a celebração da permuta dos lotes por outros terrenos propriedade

da B...SA, não tendo então a C.M.C. ,condicionado a afectação daqueles lotes à prossecução de

qualquer fim público, designadamente a habitação social, e por ter sido estipulada a afectação

daqueles terrenos à construção livre de encargos e ónus.

10. Comentário ao presente acórdão

Naquilo que interessa à presente anotação, podemos afirmar que este acórdão coloca várias

questões relacionadas com o direito de reversão que seguidamente depois dá resposta, para chegar

a uma conclusão na sentença final. A primeira questão coloca é a de saber quando é que existe

efectivamente direito de reversão, por desvio da cedência de finalidade de utilidade pública dos

bens em causa, ou seja, em contradição com o princípio da prossecução do interesse público. A

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 16

segunda situação tem a ver com o exercício do direito de reversão, ou seja, quando é que existe

direito de reversão e que lei é que regula esse mesmo direito. A terceira questão que se levanta tem

a ver com a data do exercício do direito de reversão, qual o seu prazo de caducidade, ou seja,

quando é que efectivamente existe caducidade do direito de reversão. A última questão que releva é

se o particular tendo cedido gratuitamente os bens pela via do direito privado, poderá ou não

exercer o direito de reversão. Vejamos atentadamente cada uma das situações.

10.1. O direito de reversão pelo desvio da cedência da finalidade pública

A primeira questão coloca em relevo o facto de saber realmente quando é que ocorreu, e com

que fundamentos, o direito de reversão pelo desvio da cedência da finalidade pública. Antes de

descrevermos este problema em concreto, vejamos o que se entende por direito de reversão. O

direito de reversão é uma garantia do direito fundamental de propriedade privada que pretende

actuar, essencialmente, nas situações em que as posições jurídicas afectadas pela expropriação não

chegaram a ser ou deixaram de estar adstritas aos fins que determinaram a expropriação, bem como

naquelas em que o interesse público que fundamentou a expropriação, de natureza transitória, foi

plenamente satisfeito ou de tal modo alterado que o objecto da expropriação deixou de contribuir

para essa prossecução20.

O direito de reversão por desvio da finalidade pública da cedência rege-se pela lei vigente à

data do exercício desse direito, sendo-lhe aplicável com as necessárias adaptações, o disposto

quanto à reversão no C.E., e no art. 16º nº3 do DL 334/95. Vejamos então se esta afirmação tem

correspondência prática. Para existir este desvio é necessário que haja um desvio também ao que

foi estatuído na D.U.P., esta pode ser definida, como o acto que reconhece determinados bens, e é

necessária à realização de um fim de utilidade pública mais importante do que a expropriação que

lhes era dada. A D.U.P. engloba, no seu conteúdo, dois diferentes actos: a identificação de um fim

concreto de utilidade pública a prosseguir através da figura da expropriação, e ainda a

determinação dos bens necessários à realização daquele fim.

Por outro lado, em qualquer caso, o direito de reversão quando haja desvio da finalidade

pública fundamenta-se na própria CRP (art. 62º), como corolário da protecção da propriedade

privada. Neste caso, a sentença recorrida considerou que esse desvio ocorreu na escritura pública

de permuta dos lotes cedidos gratuitamente pela autora á Ré (Câmara), celebrada em 21-11-1996,

por nela não se ter condicionado a afectação daqueles lotes à prossecução de qualquer fim,

designadamente a habitação social, e, ao invés, se ter estipulado a sua afectação à construção, livre

de ónus e encargos. Para o S.T.A. de acordo com os factos provados considera que o desvio da

20 José Viera da Fonseca,”Principais linhas inovadoras………………..”, cit., pág. 132.

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 17

cedência dos lotes em causa só ocorreu com a venda desses lotes a terceiros, entre Agosto de 1998

e Julho de 1999, sendo que esta consideração, vai ter implicações na decisão final, pelo facto de A.

ainda está em tempo de exigir o direito de reversão, mas á frente aludiremos a esta questão.

10.2.O exercício do direito de reversão

Em relação à segunda questão, que tem a ver com o exercício do direito de reversão, ou seja,

quando é que existe direito de reversão e que lei é que regula esse mesmo direito à data do seu

exercício. De acordo com o art. 5º nº1, als. a) e b) do actual C.E. ,existe direito de reversão se no

prazo de 2 anos após a data da adjudicação, os bens expropriados não foram não foram aplicados

para o fim que determinou a expropriação, e se, entretanto, tiverem cessado as finalidades da

expropriação. Verificamos neste caso que a A. poderia exercer o direito de reversão dos lotes, pois

estão preenchidos os requisitos deste direito, mas a questão que se coloca é a de saber qual a lei que

regula esse direito, pois os factos desde a cedência dos lotes até á permuta e venda decorreu entre

1996 e 1999, qual é então a lei (C.E.) que se aplica. Neste caso o direito de reversão pelo desvio da

finalidade pública, é regulado pela lei vigente à data do exercício desse direito21 e não pela lei

vigente à data da cedência dos lotes, que de acordo com nº3 do art. DL 334/95 de 28 de

Dezembro22. Esta situação está directamente ligada terceira questão sobre a caducidade do direito

de reversão.

O C.E. de 99, no art.5º nº5, refere que a reversão deve ser requerida no prazo de 3 anos a

contar da ocorrência do facto que a originou, sob pena de caducidade, decorrido esse prazo assiste

ao expropriado, até ao final do prazo previsto na alínea a) do nº4, o direito de preferência na

primeira alienação dos bens.

10.3.Data do exercício do direito de reversão e respectivo prazo de caducidade

A terceira questão que se levanta tem com a data do exercício do direito de reversão, qual o

seu prazo de caducidade, qual o dies a quo desse mesmo prazo de caducidade, ou seja, quando é

que efectivamente existe caducidade do direito de reversão. A caducidade pode ser definida como

uma figura jurídica especial, que actua quando determinado direito, devendo ser exercido, dentro

de certo prazo não o seja23.

21 A jurisprudência do S.T.A. tem reiterado de modo pacífico este entendimento.vd., por ex., Ac. de 23-4-1996, Ac.

de 19-1-1995, Ac.01.07.1998. 22 “O cedente tem direito de reversão sobre as parcelas cedidas nos termos dos números anteriores, sempre que haja

desvio de finalidade pública da cedência, aplicando-se com as necessárias adaptações, o disposto quanto à reversão no Código das Expropriações”.

23 João Melo Franco/ Herlânder Antunes Martins, “Dicionário de Conceitos…………….”, cit., pág. 136.

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 18

No acórdão em análise, existe a discordância com a sentença recorrida em dois pontos: qual

a data que a A. exerceu o direito de reversão, e se já passou ou não esse prazo de caducidade.

Quanto à data que exerceu o direito de reversão, o que releva para o prazo de caducidade do direito

de reversão, é a data de entrada na C.M.C., do referido requerimento de A. a pedir a reversão

(19.07.2000), e não a data da instauração da presente acção (29.10.2001), pois o direito de reversão

é sempre exercido primeiro junto da entidade administrativo, havendo recurso ao tribunal para

decidir qualquer litígio (art. 74º nº1 do C.E.).

Quanto ao prazo de caducidade do direito de reversão, à data em que A. exerceu o direito de

reversão (19.07.200), estava já em vigor o C.E. de 99, dispondo no art. 5º nº5 a reversão deve ser

requerida no prazo de 3 anos a contar da ocorrência do facto que a originou, sob pena de

caducidade, logo tanto no C.E. de 91 como no de 99, o prazo de caducidade deste direito conta-se

do facto que originou a reversão, ou seja, no presente caso do desvio da finalidade pública com a

venda dos lotes a terceiros, então à data em que entrou em vigor o novo C.E. o prazo de caducidade

do direito invocado, que era então de 2 anos ainda estava em curso pois este é de 3 anos, sendo um

prazo substantivo aplica-se o art. 297 nº2 do C.C.

10.4. O direito de reversão e aquisição pela via do direito privado

A última questão que releva, é se o particular tendo cedido gratuitamente os bens pela via do

direito privado (art. 11º do C.E.), poderá ou não exercer o direito de reversão. A aquisição privada

de bens traduz-se numa aquisição derivada, ao contrário da expropriação, que se traduz numa

aquisição originária de direitos. Para alguns autores, a consideração da tentativa de aquisição do

bem pela via do direito privado fora do procedimento expropriativo tem, precisamente, a

desvantagem de não permitir fazer funcionar aí, ou seja, quando o bem é adquirido por essa via, o

direito de reversão ,e se o beneficiário da expropriação acabar por utilizar o bem adquirido para

um fim diferente daquele que determinou.

Quanto a nós, embora a reversão esteja pensada para as hipóteses em que tenha havido

D.U.P. e a adjudicação do bem expropriado, e não obstante defendermos que a aquisição do bem

pela via do direito privado, não faz ainda parte do procedimento expropriativo propriamente dito,

entendemos que o direito de reversão deve também poder ser exercido nas situações em que o bem

foi adquirido por essa via. Se uma determinada entidade adquirir o bem pela via do direito privado

para uma determinada finalidade identificada na resolução de requerer a declaração de utilidade

pública, e posteriormente, o utilizar para fim diferente, parece-nos que não deve poder ser recusado

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 19

ao particular o exercício do direito de reversão, se tal direito não decorrer de qualquer cláusula do

contrato, por cumprimento do princípio da boa fé ou da confiança contratual24.

Concluindo, o direito de reversão por desvio da finalidade pública da cedência rege-se pela

lei vigente à data do exercício desse direito, tendo em conta o prazo de caducidade, e a condição

essencial para se exercer o direito de reversão, é a de que o bem relativamente ao qual se pretende

exercer aquele direito, tenha entrado no património do expropriante por via da expropriação por

utilidade pública ou por qualquer via comprovadamente substitutiva dela e/ ou umbilicalmente a

ela ligada.

11. Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (Cessação do Direito de Reversão) 25

11.1. Matéria de facto

Este acórdão tem por bases a seguinte factualidade: A.e B…e respectivas mulheres,

interpuseram recurso de anulação do indeferimento do pedido de reversão de imóveis expropriados,

da autoria do Secretário de Estado Adjunto do Ordenamento do Território, com fundamento na

constituição pelo DL 303/2000, de 28/11, de um direito de usufruto, a favor da “ Fundação para a

Protecção e Gestão Ambiental da Salinas do Samouco” por trinta anos.

Relativamente à matéria de facto ficou provado resumidamente o seguinte:

Em 31-03-1997 foi publicada em D.R. a declaração de utilidade pública urgente da

expropriação de seis parcelas que pertenciam a ambos os recorrentes, cuja finalidade declarada

naquela publicação é declarar a recuperação das salinas do Samouco;

A adjudicação do direito de propriedade à entidade expropriante ocorreu no ano de 1999,

no ano de 2002, foi requerido pelos agora recorrentes ao M.C.O.T.A. a reversão com fundamento

em não aplicação aos fins para os quais se procedera à expropriação;

11.2. Comentário ao acórdão

A grande questão que se levanta neste recurso / acórdão, consiste em determinar se o acto

recorrido que indeferiu pedido de reversão dos ante proprietários das parcelas de terreno

expropriadas, é ilegal por invocar como motivo da impossibilidade da reversão a constituição de

usufruto a favor de entidade diferente da expropriante, ou seja, será que a criação do usufruto

24 Cfr., Fernanda Paula Oliveira, “Coordenar e concertar, em vez de mandar”, Cadernos de Justiça Administrativa, nº39, Maio/ Junho de 2003,cit., págs. 49 e 50.

25 Ac. do S.T.A. de 16-03-2004, proc. nº 062/03, relator Rosendo José…

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 20

causa, por si só, a impossibilidade do direito de reversão. O direito de usufruto é o direito de gozar

temporária e plenamente uma coisa ou direito alheio, sem alterar a sua forma ou substância (art.

1439º C.C.).

De acordo com o nº4 do art. 5º do C.E. de 99 , o direito de reversão cessa quando tenham

decorrido 20 anos sobre a data da adjudicação, quando seja dado aos bens expropriados outro

destino; quando seja dado aos bens expropriados outro destino mediante nova D.U.P.; quando haja

renúncia do expropriado; quando a D.U.P. seja renovada com fundamento em prejuízo grave para o

interesse público, dentro de 1 ano a contar da verificação dos actos previstos no nº1 anterior. Porém

o artigo 78º do DL 303/2000, de 28/1126, que prevê que a reversão tenha lugar mesmo quando o

domínio do prédio tenha sido transmitido a outra entidade, posteriormente à expropriação, indo

contra as causas do art. 5º nº4 do C.E. Na espécie em análise não houve transferência do domínio

publico do Ministério expropriante para outra entidade, mas sim a constituição de um usufruto por

30 anos a favor da fundação, que é uma pessoa pública.

Mas, o que importa é que a transferência de domínio ou apenas a constituição de um encargo

de carácter real, mesmo atípico, como seria o usufruto sobre bens dominais, não é nos termos do

C.E. 99, e tal como nele é regulada a reversão, uma forma de cessação deste direito do expropriado.

Pode concluir-se que o direito de reversão apenas cessa verificada alguma das situações

previstas no art. 5º nº4 C.E., sendo para este efeito irrelevante que exista transferência do domínio,

constituição de direito de propriedade de outro particular por alienação da entidade expropriante

ou, por maioria de razão, a constituição de direito real menor como o usufruto sobre o bem

expropriado.

Concluindo de acordo com toda a fundamentação deste acórdão, o direito de reversão no art.

5º do C.E. de 99, não desaparece pelo facto de o Estado, entidade expropriante ter constituído

através de D.L. um direito de usufruto por vários anos das parcelas expropriadas a favor de uma

Fundação, pessoa jurídica de direito privado, criada pelo próprio Estado. Por outro lado o direito de

reversão apenas cessa nas situações previstas no art. 5º nº4 do C.E., sendo para esse efeito

irrelevante que exista transferência do domínio, constituição de direito de propriedade de outro

particular por alienação da entidade expropriante ou, por maioria de razão, a constituição de direito

real menor como o usufruto sobre o bem expropriado.

26 Este D.L. criou a fundação para a Protecção de Gestão Ambiental da Salinas do Samouco, intuída pelo estado

através dos Ministros do Equipamento Social, do Ambiente, Desenvolvimento Rural…com o fim, de promover a conservação e manutenção daquelas salinas e gerir um modelo de desenvolvimento sustentável para o eco – sistema.

ELISABETE ROCHA EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 21

12. Conclusões

1. O direito de reversão é a principal garantia dos expropriados, é o poder legalmente

conferido ao expropriado de readquirir o bem objecto de expropriação, em regra mediante a

restituição ao beneficiário da expropriação ou à entidade expropriante da indemnização que lhe foi

atribuída ou outro valor, quando o bem não tenha sido aplicado aos fins indicados no acto de

declaração de utilidade pública ou essa aplicação tenha cessado.

2. O direito de reversão só existe nas situações previstas no artigo 5º nº1, alíneas a) e b) do

C.E., sendo um direito específico (garantia específica) dos expropriados e entidades expropriantes

para fazer face à expropriação.

3. A caducidade só cessa de acordo com as situações previstas no artigo 5º nº4, alíneas a) a

c), ou seja, respectivamente quando tenham passado 20 anos sobre a data da adjudicação, pois

como refere José Osvaldo de Ascensão, “ a nossa ordem jurídica é tendencialmente infensa a

onerações perpétuas do direito de propriedade, pelo que referido prazo de 20 anos se justifica por

razões semelhantes às que estão na base da prescrição e usucapião”.

3.1.Cessa ainda o direito de reversão quando, for dada aos bens expropriados outro destino

mediante nova declaração de utilidade pública, sendo manifesto que se constituiu na esfera jurídica

do interessado o direito de reversão dos bens, pois só assim se justifica uma nova declaração de

utilidade pública, mas no caso de aos bens ser atribuído o mesmo destino, mediante nova

declaração de utilidade pública, o expropriado também está impedido de exercer o respectivo

direito de reversão.

3.2.Considera-se como causa extintiva do direito de reversão, a renúncia do expropriado,

devendo ser clara, inequívoca e expressa, podendo abranger parte ou totalidade dos bens

expropriados. Ocorre ainda a cessação quando a declaração de utilidade pública seja renovada, com

fundamento em prejuízo grave para o interesse público, dentro de um ano a contar da verificação

dos factos que compõem o direito de reversão.

4. Quanto à caducidade, a grande alteração entre o C.E. de 91 e o C.E. de 99, é o facto de

que actualmente a reversão deve ser requerida no prazo de 3 anos a contar da data da ocorrência do

facto que a originou sobre pena de caducidade, mas no anterior C.E., esse prazo era de 2 anos.

Podemos concluir que cessação e caducidade, são dois conceitos jurídicos totalmente distintos, pois

a cessação refere-se a um conjunto de situações práticas que se não foram cumpridas o direito de

reaver o bem acaba, já a caducidade, é a extinção automática ou ipso dos efeitos jurídicos do

contrato, em consequência de um facto jurídico srticto sensu a que a lei atribui esse efeito, ou seja,

é uma figura especial que actua quando determinado direito, devendo ser exercido dentro de certo

prazo, senão caduca o direito em agir e exigir. Mas apesar das diferenças práticas do conceito de

VERBOJURIDICO EXPROPRIAÇÕES POR UTILIDADE PÚBLICA – O DIREITO DE REVERSÃO : 22

caducidade e cessação, no direito de reversão ambos são semelhantes, pois estão interligados, pois

têm por base o decurso do tempo, vejamos um exemplo, “…ao direito de reversão caduca, quando

passado 3 anos a contar da ocorrência do facto que a originou….”,(art. 5º, nº5º), já a o direito de

reversão cessa “..quando decorridos 20 anos sobre a data de adjudicação..” (art. 5º nº4, al. a)).

ELISABETE ROCHA

Trabalho realizado no âmbito do 2.º Ciclos de Estudos em Direito Administrativo Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, Julho de 2008

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