expansor colado simplificado: relato de caso clínico · para tentar aumentar a resistência de...

12
52 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008 Caso Clínico Expansor colado simplificado: relato de caso clínico Danilo Furquim Siqueira*, Mariana dos Santos Fernandes**, Fernanda Cepera**, Fausto Silva Bramante***, Silvana Bommarito**** * Doutor em Ortodontia pela FOB-USP, Professor do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado) - área de concentração em Ortodontia da UMESP. ** Mestrandas do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado) - área de concentração em Ortodontia da UMESP. *** Doutor em Ortodontia pela FOB-USP e Professor do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado), área de concentração Ortodontia do UNICEUMA. **** Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela UNIFESP, Professora do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado) - área de concentração em Ortodontia da UMESP. Resumo A expansão rápida da maxila se apre- senta como um dos procedimentos mais utilizados na Ortodontia contemporânea para a correção de problemas transversais no arco superior. Inúmeras modificações foram propostas para tentar adequar esta mecânica as necessidades individuais dos PALAVRAS-CHAVE: Expansão. Atresia maxilar. Mordida aberta anterior. pacientes. Este artigo se propõe a ilustrar e descrever a utilização do expansor cola- do simplificado, um dispositivo simples e eficiente, no tratamento de uma mordida cruzada posterior unilateral funcional as- sociada à mordida aberta anterior, em uma idade precoce.

Upload: trantram

Post on 01-Dec-2018

214 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Page 1: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

52 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Caso Clínico

Expansor colado simplificado: relato de caso clínicoDanilo Furquim Siqueira*, Mariana dos Santos Fernandes**, Fernanda Cepera**,Fausto Silva Bramante***, Silvana Bommarito****

* Doutor em Ortodontia pela FOB-USP, Professor do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado) - área de concentração em Ortodontia da UMESP. ** Mestrandas do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado) - área de concentração em Ortodontia da UMESP. *** Doutor em Ortodontia pela FOB-USP e Professor do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado), área de concentração Ortodontia do UNICEUMA. **** Doutora em Distúrbios da Comunicação Humana pela UNIFESP, Professora do programa de Pós-Graduação em Odontologia (Mestrado) - área de concentração em Ortodontia da UMESP.

ResumoA expansão rápida da maxila se apre-

senta como um dos procedimentos mais utilizados na Ortodontia contemporânea para a correção de problemas transversais no arco superior. Inúmeras modificações foram propostas para tentar adequar esta mecânica as necessidades individuais dos

Palavras-chave: Expansão. Atresia maxilar. Mordida aberta anterior.

pacientes. Este artigo se propõe a ilustrar e descrever a utilização do expansor cola-do simplificado, um dispositivo simples e eficiente, no tratamento de uma mordida cruzada posterior unilateral funcional as-sociada à mordida aberta anterior, em uma idade precoce.

Page 2: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Danilo Furquim Siqueira, Mariana dos Santos Fernandes, Fernanda Cepera, Fausto Silva Bramante, Silvana Bommarito

53Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

INTRoDuÇÃo e ReVIsÃo De LITeRATuRAA Ortodontia e a Ortopedia Facial tem por objetivo a correção

das discrepâncias sagitais, verticais e transversais, seja de natureza dentária, esquelética ou a combinação de ambas, visando o restabe-lecimento das funções estomatognáticas normais, como a sucção, mastigação, a deglutição, a fonação e a respiração e a obtenção de uma oclusão favorável, com condições periodontais satisfatórias e uma melhoria no perfil facial. A mordida cruzada posterior, uma discrepância transversal, observada em 18% das crianças brasilei-ras na fase de dentadura mista5,6,25, pode ser definida como uma re-lação vestibulolingual incorreta entre os dentes póstero-superiores e inferiores, quando em oclusão cêntrica, ou seja, quando as cúspi-des vestibulares dos dentes póstero-superiores ocluem nas fossas centrais dos antagonistas inferiores.

Para correção dessa deficiência, se faz necessário o uso da ex-pansão maxilar, que pode ser lenta ou rápida. Nos casos de de-ficiência real da maxila, os aparelhos para a expansão rápida da maxila (ERM), como o Haas, o Hyrax e o expansor colado4,8,13, são os mais indicados devido à capacidade de liberação de forças inten-sas (forças ortopédicas) sobre o palato e/ou sobre a face palatina dos dentes superiores, para a ruptura da sutura palatina mediana e conseqüentemente a obtenção dos efeitos ortopédicos almejados. Nos casos de envolvimento dentoalveolar, preconiza-se o trata-mento com a expansão lenta da maxila, ou seja, com aparelhos removíveis (mola Coffin, Splint Coffin e com parafuso expansor) ou fixos (bihélice, quadrihélice e arco em “W”) que promovem, quase que em sua totalidade, alterações dentoalveolares. Nos pacientes mais jovens, durante a fase da dentadura decídua, este tipo de ex-pansão pode suscitar a abertura da sutura palatina mediana, além dos efeitos ortodônticos, devido a pouca resistência óssea encon-trada nestes pacientes27.

A ERM teve o seu primeiro relato em 18602, porém, este pro-cedimento foi muito questionado e gerou uma grande polêmica entre os ortodontistas americanos, o que culminou no seu esqueci-mento por um longo período no início deste século. Por outro lado, na Europa, a técnica continuava sendo utilizada e pesquisada por estudiosos como Derichsweller10. Com a grande repercussão dos trabalhos clássicos de Haas13,14,15, a partir da década de 60, a ERM consolidou-se no meio ortodôntico como um procedimento clínico terapêutico seguro, capaz de restabelecer as dimensões transver-sais da maxila, aumentando o perímetro do arco7, em decorrência dos efeitos ortopédicos (abertura da sutura palatina mediana e de outras estruturas faciais adjacentes) e ortodônticos (movimenta-ção vestibular do segmento dentoalveolar póstero-superior).

A partir do primeiro relato feito por Angell2, muitos auto-res4,8,9,11,13,16,17,18,20,21,23,29 propuseram os mais variados tipos de apa-relhos para a ERM, descrevendo as suas vantagens e desvantagens, principalmente em relação ao tipo de ancoragem a ser utilizada, na

tentativa de se obter resultados mais estáveis e com menores efei-tos colaterais para o paciente. Haas13,14,15 e Silva Filho; Capelozza Filho24, preconizaram a utilização do disjuntor dentomucossupor-tado, para a obtenção de uma ancoragem máxima e de uma maior rigidez do aparelho, favorecendo assim a transferência das forças de ativação às bases ósseas e conseqüentemente permitindo maio-res resultados ortopédicos e mais estabilidade da expansão. Bie-derman4, considerando que o acrílico que cobria o palato poderia causar irritações ao tecido mole, devido à impacção de alimentos, descreveu um aparelho mais higiênico, apoiado simplesmente nos dentes (dentossuportado). Com o advento da colagem direta, Co-hen; Silverman8, divulgaram um aparelho para ERM com cobertura de resina e colado nos dentes póstero-superiores (dentossuporta-do). Após a descrição destes aparelhos clássicos, denominados de Haas, Hyrax e expansor colado, alguns autores como Mondro; Litt21, McNamara Jr; Brudon19, Howe17, Hahn; Marchioro16 propuseram modificações dos mesmos.

Apesar de inúmeras alterações nos aparelhos de ERM, este ar-tigo trás uma sugestão de simplificação do aparelho expansor co-lado, por meio de um tratamento realizado em uma paciente com mordida cruzada posterior unilateral funcional e mordida aberta anterior, no primeiro período transitório da dentadura mista.

ReLATo Do CAso CLÍNICoPaciente K. M. C., com 6 anos e 4 meses de idade, do sexo femi-

nino, possuía uma assimetria facial em uma visão frontal, perfil le-vemente convexo e estava no primeiro período transitório da den-tadura mista na avaliação inicial (Fig. 1, 2). Apresentava alterações no sentido vertical e transversal, ou seja, mordida aberta anterior e mordida cruzada posterior unilateral funcional direita, associada a atresia maxilar. Essa alteração caracteriza-se por um desvio fun-cional da mandíbula durante o fechamento. Devido a um contato prematuro há um deslocamento mandibular lateral (máxima inter-cuspidação habitual) levando a um desvio de linha média e a uma mordida cruzada unilateral. Desta forma ocorre uma alteração da relação côndilo-fossa articular, onde no lado da mordida cruzada o côndilo desloca-se para cima e para dentro, enquanto o côndilo de relação oclusal normal gira para baixo e para fora da fossa ar-ticular, desviando a linha média. Quando a mandíbula é colocada em relação cêntrica, sua linha média coincide com a linha média da maxila e com o centro da face e os côndilos são centralizados. Essa assimetria na relação geométrica entre o côndilo e a fossa articular associada às alterações esqueléticas, são algumas razões para que seja feita uma intervenção precoce.

Em decorrência da mordida aberta anterior, causada pelo há-bito de sucção digital, foi solicitada uma avaliação complementar fonoaudiológica e observaram-se as seguintes alterações: diminui-ção de tônus muscular de lábios e língua, interposição de língua

Page 3: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Expansor colado simplificado: relato de caso clínico

54 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

durante deglutição e repouso, sendo esta esperada uma vez que a mordida estava aberta. A paciente possuía uma higiene bucal adequada com dentes em bom estado de conservação, respiração bucal viciosa e alteração da fonação caracterizada pela distorção do fonema / s / por / ∫ /, projeção de língua anterior durante a emissão dos fonemas linguodentais / t / , / d /, /n /, / l / e ceceio anterior durante a emissão dos fonemas fricativos / f /, / s / e / ∫ /. Nesta época houve apenas orientação fonoaudiológica quanto a

importância da não manutenção do distúrbio de hábito (sucção) para que a mesma pudesse obter as devidas condições anatômicas e funcionais orofaciais, para se necessário futuramente fazer a mioterapia orofacial.

Ao exame radiográfico foi verificada uma seqüência favorável de erupção para sua idade cronológica, pois já apresentava os molares e os incisivos centrais inferiores permanentes na cavi-dade bucal (Fig. 3).

Figura 1 - Fotografias extrabucais iniciais - a) frontal, B) lateral.

a B

Figura 2 - Fotografias intrabucais iniciais, evidenciando a mordida cruzada posterior e a mordida aber-ta anterior.

Page 4: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Danilo Furquim Siqueira, Mariana dos Santos Fernandes, Fernanda Cepera, Fausto Silva Bramante, Silvana Bommarito

55Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Figura 3 - Radiografia panorâmica inicial.

Figura 4 - Telerradiografia em norma lateral e traçado inicial.

O plano de tratamento constituiu-se, inicialmente, da Expan-são Rápida da Maxila com um dispositivo ortodôntico dentos-suportado denominado de expansor colado simplificado (Fig. 5). Sua ativação foi realizada pelos pais ou responsáveis com 2/4 de volta cada por dia. Depois de atingido o limite máximo de expansão desejado pelo ortodontista, observou-se clinicamente um diastema entre os incisivos centrais superiores, causado pela separação da sutura palatina mediana. Além da visualização clí-nica, observou-se também esta abertura na radiografia oclusal da maxila (Fig. 6).

Após essa fase ativa da ERM, o mesmo aparelho foi usado como contenção durante 3 meses, período que tende a ocorrer a neoformação óssea na sutura palatina mediana. Foi realizado

um desgaste no canino decíduo (83), porque a paciente man-tinha o hábito de deslocar a mandíbula para a direita, mesmo após a expansão. Após a remoção do aparelho de ERM, foi feita a confecção de uma grade palatina fixa para correção da mordida aberta anterior ocasionada pelo hábito de sucção digital e inter-posição lingual (Fig. 7, 8). Após o seu fechamento, a paciente foi encaminhada para sessões de fonoaudiologia, com a finalidade de adequar o posicionamento lingual durante a fala e a degluti-ção. Neste momento, instalou-se um aparelho removível superior com grade palatina e parafuso expansor como contenção final. O tratamento ativo foi realizado durante 15 meses. A paciente continuou sendo controlada durante 2 anos e oito meses, sendo feita uma nova avaliação para a Ortodontia Corretiva.

Page 5: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Expansor colado simplificado: relato de caso clínico

56 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Figura 7 - Grade palatina fixa.

Figura 8 - Instalação da grade palatina fixa.

Figura 5 - Expansor colado simplificado - a) adaptação no modelo, B) colagem nos den-tes decíduos.

Figura 6 - Radiografia oclusal após a ERM.

a

B

Page 6: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Danilo Furquim Siqueira, Mariana dos Santos Fernandes, Fernanda Cepera, Fausto Silva Bramante, Silvana Bommarito

57Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

DesCRIÇÃo Do APAReLHoO expansor colado simplificado é um dispositivo ortodôntico que

possui um expansor central e deve ser fixado nos caninos, primeiros e segundos molares decíduos. Este aparelho é uma simplificação dos mecanismos descritos por Cohen; Silverman8 e McNamara Jr., Bru-don19, que possui recobrimento oclusal (Fig. 9, 10, 11).

Seguindo o mesmo protocolo descrito por Almeida et al.1, uti-liza-se apenas um modelo de trabalho para a confecção do apa-relho. A estrutura metálica deve ser confeccionada utilizando um fio ortodôntico de 0,9mm, sendo feita a adaptação do parafuso

expansor e os procedimentos de soldagem. O fio contorna os den-tes de ancoragem, envolvendo a face vestibular e a face palatina, unindo-se ao parafuso expansor (Fig. 12).

Este aparelho deve ser colado aos dentes com resina composta fotopolimerizável, a qual é responsável pela resistência e estabilida-de. Esta fase de colagem é de extrema importância e necessita de uma área de trabalho isenta de saliva e com um correto isolamento relativo para não comprometer a função do dispositivo ortodôntico. Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções (Fig. 13).

Figura 9 - Expansor colado com recobrimento oclusal - a) adaptação no modelo de gesso, B) adaptação nos dentes permanentes.

Figura 10 - Expansor colado com recobrimento oclusal - a) inicial, B) pós-expansão imediato, C) 3 meses pós-expansão.

Figura 11 - Radiografias oclusais - a) inicial, B) pós-expansão imediato, C) 3 meses pós-expansão.

a

a

a

B

B

C

C

B

Page 7: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Expansor colado simplificado: relato de caso clínico

58 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Figura 12 - Seqüência de confecção do aparelho em uma fase de dentadura mista.

Figura 13 - Retenções no fio 0,9mm.

Como vantagens deste aparelho pode-se citar a facilidade de higienização, maior conforto ao paciente, a ausência da se-paração e bandagem dos dentes de ancoragem. Além disso, é de fácil confecção, remoção e instalação. Está indicado prefe-rencialmente para pacientes na fase de dentadura decídua ou mista, devido a menor quantidade de força que o dispositivo

deve liberar para romper a sutura palatina mediana. Pode ser utilizado com sucesso em pacientes na fase da dentição perma-nente (Fig. 14, 15), porém, a sua fixação pode ser comprometida devido a maior resistência óssea de pacientes com mais idade e a necessidade de forças maiores, o que poderia causar a queda do aparelho durante a fase de ativação.

a C e

FB D

Page 8: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Danilo Furquim Siqueira, Mariana dos Santos Fernandes, Fernanda Cepera, Fausto Silva Bramante, Silvana Bommarito

59Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Figura 14 - Expansor colado simplificado (visão frontal). a) inicial, B) instalação, C) pós-expansão imediato, D) diastema pós-expansão.

a B

C D

Figura 15 - Expansor colado simplificado (visão oclusal). a) verificação da adaptação, B) instalação, C) pós-expansão imediato, D) remoção do aparelho.

a B

C D

Page 9: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Expansor colado simplificado: relato de caso clínico

60 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

ResuLTADos e DIsCussÃo O tipo de tratamento das deformidades dentoesqueléticas varia

de acordo com a maturação e com o desenvolvimento do pacien-te. Dos tipos de alterações que se apresentam (verticais, sagitais e transversais), sabe-se que a alteração transversal não tem correção espontânea, e uma vez instalada, quanto mais precocemente for corrigida, mais rapidamente se dará o equilíbrio necessário para um bom desenvolvimento craniofacial do paciente, evitando conse-qüências como assimetrias faciais e alterações na articulação tem-poromandibular, atingindo as metas para uma oclusão normal3,18,27.

O aparelho de ERM denominado expansor colado simplificado se mostrou bastante efetivo no tratamento da mordida cruzada posterior unilateral funcional em uma idade precoce, promoven-do alterações esqueléticas, comprovadas radiograficamente pela abertura da sutura palatina mediana, visível pela radiografia oclu-sal. Esta abertura sutural pode ser constatada clinicamente pelo aparecimento de um diastema entre os incisivos centrais superio-res13,14,26,28, caracterizado pela divergência apical e convergência das coroas, que se fecha após alguns meses, em decorrência da maior aproximação das coroas, estimulada pelas fibras transep-

tais26. Estes dados clínicos e radiográficos também foram descritos na literatura por inúmeros autores com a utilização de aparelhos semelhantes1,4,8,9,11,16,17,21,22,24,29.

A intervenção precoce é defendida por Silva Filho; Vallada-res Neto; Almeida27 uma vez que pode propiciar: 1) obtenção de respostas mais favoráveis, com aparelhos simplificados, devido à grande bioelasticidade óssea nas crianças; 2) redirecionamento dos germes do dentes permanentes para posições mais favorá-veis; 3) proporcionar um melhor relacionamento entre as bases ósseas, permitindo o crescimento e o desenvolvimento normais; 4) eliminação das posições inadequadas da ATM, estabelecendo relações simétricas entre o côndilo e a fossa articular; 5) promover uma trajetória mandibular normal; 6) contribuir para a auto-ima-gem mais favorável da criança, principalmente nos casos onde há comprometimento estético. No tratamento descrito anteriormen-te, todos estes fatores foram levados em consideração e os resul-tados obtidos foram considerados satisfatórios, tanto no sentido transversal como no vertical (Fig. 16, 17).

O tratamento com a ERM corrigiu a mordida cruzada poste-rior unilateral funcional, devolvendo a simetria facial a paciente,

Figura 16 - a) fotografia extrabucal, B) fotografia intrabucal frontal.

Figura 17 - Fotografias intrabucais laterais.

Ba

Page 10: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Danilo Furquim Siqueira, Mariana dos Santos Fernandes, Fernanda Cepera, Fausto Silva Bramante, Silvana Bommarito

61Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

uma vez que os côndilos voltaram a posição adequada. Segundo Capelozza; Silva Filho6, a intervenção precoce da mordida cruzada posterior funcional mostra-se relevante, pois a sua persistência durante a fase de crescimento pode resultar em uma assimetria estrutural, tornando o tratamento mais complexo.

Com o término da fase ativa da expansão, o mesmo aparelho utilizado serviu como contenção durante 3 meses, fase esta de neoformação óssea na sutura palatina mediana. Após a remoção deste dispositivo ortodôntico, foi utilizada uma grade palatina fixa que promoveu o fechamento da mordida aberta anterior, principal-mente em decorrência de efeitos dentoalveolares.

As alterações dentárias e esqueléticas decorrentes da ERM15,22 podem ser consideradas desfavoráveis para os pacientes com cres-cimento excessivamente vertical e com mordida aberta anterior, porém, verificando os estudos realizados com amostras analisadas a longo prazo7,12, pode-se concluir que estas alterações cefalomé-tricas, observadas logo após a expansão rápida da maxila, consti-tuem fenômenos temporários, e portanto, não requerem precau-ções quando da aplicação deste procedimento em pacientes com padrão de crescimento predominantemente vertical ou com mor-dida aberta anterior.

Apesar de inúmeros tipos de aparelhos descritos na literatu-ra para a realização da ERM4,8,9,11,13,17,18,19,20,21,22,23,29, optou-se pela utilização do expansor colado simplificado, pelas vantagens que este proporciona (ausência de separadores e bandas, fácil confec-ção, instalação, higienização e boa adaptação) e também porque a paciente não apresentava grande resistência óssea (tratamen-

to em uma idade precoce). Muitos autores afirmam que a idade dos pacientes está diretamente relacionada com a magnitude dos efeitos ortopédicos e ortodônticos, ou seja, nos pacientes mais velhos, onde a resistência óssea apresenta-se maior, serão obser-vados maiores efeitos ortodônticos, em detrimento dos efeitos ortopédicos5,6.

Após o restabelecimento da normalidade vertical e transversal (Fig. 16, 17), foi instalada um aparelho removível superior com pa-rafuso expansor e grade palatina, com a função de permitir o cres-cimento ósseo normal da paciente e impedir o hábito de sucção digital, além de serem feitas as devidas orientações e considerações quanto a importância da não manutenção do distúrbio de hábito, no caso da sucção digital.

Neste caso não houve necessidade de intervenção fonoaudio-lógica antes e durante o tratamento ortodôntico porque todas as alterações apresentadas na avaliação miofuncional orofacial de-corriam da má oclusão30 e também porque para o tratamento da interposição de língua optou-se pela utilização da grade impedido-ra de língua. Na fase de contenção (Fig. 18, 19, 20, 21), a paciente foi encaminhada para mioterapia orofacial a fim de automatizar a posição correta da língua e corrigir as distorções da fala que ainda permaneciam alteradas em função do tempo em que manteve a má oclusão, o que acabou por fazer com que a paciente se habitu-asse a falar com distorções fonêmicas.

Também não houve a necessidade de instalação do aparelho fixo até o momento e a paciente está em acompanhamento há 3 anos, demonstrando a estabilidade do caso.

Figura 18 - Fotografias extrabucais – Fase de contenção.

Page 11: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Expansor colado simplificado: relato de caso clínico

62 Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Figura 19 - Fotografias intrabucais – Fase de contenção.

Figura 20 - Radiografia panorâmica – Fase de contenção.

Figura 21 - Telerradiografia em norma lateral e traçado cefalométrico – Fase de contenção.

Page 12: Expansor colado simplificado: relato de caso clínico · Para tentar aumentar a resistência de colagem, o fio que contorna os dentes de ancoragem deve possuir pequenas retenções

Danilo Furquim Siqueira, Mariana dos Santos Fernandes, Fernanda Cepera, Fausto Silva Bramante, Silvana Bommarito

63Rev. Clín. Ortodon. Dental Press, Maringá, v. 7, n. 1 - fev./mar. 2008

Simplified bonded expander: case report

Rapid maxillary expansion is one of the procedures most often employed in contemporary Orthodontics to correct transverse problems in the maxillary arch. Several modifications have been proposed in an attempt to adapt this mechanics to the individual needs

of patients. This paper presents and describes the utilization of a simplified bonded expander, which is a simple and effective device for treatment of functional unilateral posterior cross bite associated with anterior open bite, at an early age.

key words: Expansion. Maxillary atresia. Anterior open bite.

Abstract

RefeRênciAs

1. ALMEIDA, R. R. et al. Aparelho expansor fixo com cobertura de acrílico: técnica de construção e aspectos clínicos. Rev. Dental Press Ortodon. Ortop. facial, Maringá, v. 5, n. 4, p. 62-71, jul./ago. 2000.

2. ANGELL, E. H. Treatment of irregularity of the permanent or adult teeth. Dental cosmos, Philadelphia, v. 1, p. 540-544, 1860.

3. BARNES, R. E. The early expansion of deciduous arches and its effect on the developing permanent dentition. Am. J. Orthod., St. Louis, v. 42, no. 2, p. 283-292, Feb. 1956.

4. BIEDERMAN, W. A hygienic appliance for rapid expansion. J. Pract. Orthod., Hempstead, v. 2, no. 2, p. 67-70, Feb. 1968.

5. CAPELOZZA FILHO, L.; SILVA FILHO, O. G. Expansão rápida da maxila: considerações gerais e aplicação clínica. Parte I. Rev. Dental Press Ortodon. Ortop. facial, Maringá, v. 2, n. 3, p. 88-102, maio/jun. 1997.

6. CAPELOZZA FILHO, L.; SILVA FILHO, O. G. Expansão rápida da maxila: considerações gerais e aplicação clínica. Parte II. Rev. Dental Press Ortodon. Ortop. facial, Maringá, v. 2, n. 4, p. 86-108, jul./ago. 1997.

7. CHANG, J. Y.; McNAMARA JR., J. A.; HERBERGER, T. A. A longitudinal study of skeletal side effects induced by rapid maxillary expansion. Am. J. Orthod. Dentofacial Orthop., St. Louis, v. 112, no. 3, p. 330-337, Sept. 1997.

8. COHEN, M.; SILVERMAN, E. A new and simple palate splintting device. J. clin. Orthod., Boulder, v. 7, no. 6, p. 368-369, June 1973.

9. DARENDELILER, M. A.; LORENZON, C. Maxillary expander using light, continuous force and autoblocking. J. clin. Orthod., Boulder, v. 30, no. 4, p. 212-216, Apr, 1996.

10. DERICHSWELLER H. La disjonction de la suture palatine mediane. eur. J. Orthod., Oxford, v. 28, n. 2, p. 126-134, mar./apr. 2006.

11. FALTIN JÚNIOR, K.; MOSCATIELLO, V. A. M.; BARROS, E. C. Disjuntor palatino Faltin Jr. Alterações dentofaciais decorrentes da disjunção da sutura palatina mediana. Rev. Dental Press Ortodon. Ortop. facial, Maringá, v. 4, n. 4, p. 5-13, jul./ago. 1999.

12. GARIB, D. G. et al. Longitudinal effects of Rapid Maxillary Expansion. Angle Orthod., Appleton, v. 77, no. 3, p. 442-448, 2007.

13. HAAS, A. J. Rapid expansion of the maxillary dental arch and nasal cavity by opening the midpalatal suture. Angle Orthod., Appleton, v. 31, no. 2, p. 73-90, Apr. 1961.

14. HAAS, A. J. The treatment of maxillary deficiency by opening the midpalatal suture. Angle Orthod., Appleton, v. 35, no. 3, p. 200-217, July 1965.

15. HAAS, A. J. Palatal expansion : just the beginning of dentofacial orthopedics. Am. J. Orthod., St. Louis, v. 57, no. 3, p. 219-255, Mar. 1970.

16. HAHN, L.; MARCHIORO, E. M. O expansor Lariat como alternativa na disjunção palatina: caso clínico. RGO: Revista Ortodontia Gaúcha, Porto Alegre, v. 4, n. 1, p. 35-44, 2000.

17. HOWE, R. P. Palatal expansion using a bonded appliance: report of a case. Am. J. Orthod., St. Louis, v. 83, no. 5, p. 464-468, Dec. 1982.

18. MARTINS, D. R.; HENRIQUES, J. F. C. VELÁSQUEZ, N. Z. Aparelho tipo Hyrax colado : uma outra alternativa para o tratamento da mordida cruzada posterior. Rev. Dental Press Ortodon. Ortop. facial, Maringá, v. 3, n. 5, p. 41-44, set./out. 1998.

danilo Furquim siqueiraRua Costa Aguiar 875 - Ed. Residencial ParkCEP: 04.2040-000 - Ipiranga - São Paulo / SPE-mails: [email protected]

endereço para correspondência

19. McNAMARA JR., J. A.; BRUDON, W.L. Bonded rapid maxillary expansion appliances. In: ______.Orthodontic and orthopedic treatment in the mixed dentition. 2nd ed. Ann Arbor: Needham Press, 1993. cap. 8, p. 145-169.

20. MEMIKOGLU, T. U.; ISERI, H. Nonextraction treatment with a rigid acrylic, bonded rapid maxillary expander. J. clin. Orthod., Boulder, v. 31, no. 2, p. 113-118, Feb. 1997.

21. MONDRO, J. F.; LITT, R. A. An improved direct-bonded palatal expansion appliance. J. clin. Orthod., Boulder, v. 11, no. 3, p. 203-206, Mar. 1977.

22. SARVER, D. M.; JOHNSTON, M. K. Skeletal changes in vertical and anterior displacement of the maxilla with bonded rapid palatal expansion appliance. Am. J. Orthod. Dentofacial Orthop., St. Louis, v. 95, no. 6, p. 462-6, June 1989.

23. SCHNEIDMAN, E.; WILSON, S.; ERKIS, R. Two point rapid palatal expansion: an alternative approach to traditional treatment. Pediatr. Dent., Chicago, v. 12, no. 2, p. 92-97, Apr./May 1990.

24. SILVA FILHO, O. G.; CAPELOZZA FILHO, L. Expansão rápida da maxila: preceitos clínicos. Ortodontia, São Paulo, v. 21, n. 1, p. 61-81, jan./jun. 1988.

25. SILVA FILHO, O. G.; FREITAS, S. F.; CAVASSAN, A. O. Oclusão: escolares de Bauru. Prevalência de oclusão normal e má-oclusão na dentadura mista em escolares de Bauru (São Paulo). Rev. Assoc. Paul. cir. Dent., São Paulo, v. 43, n. 6, p. 287-290, nov./dez. 1989.

26. SILVA FILHO, O. G.; PINHEIRO JÚNIOR, J. M. P.; CAVASSAN, A. O. Comportamento dos incisivos centrais superiores após a expansão rápida da maxila na dentadura mista: um estudo piloto longitudinal radiográfico. Rev. Dental Press Ortodon. Ortop. Maxilar, Maringá, v. 2, n. 1, p. 68-85, jan./fev. 1997.

27. SILVA FILHO, O. G.; VALLADARES NETO, J.; ALMEIDA, R. R. Early correction of posterior crossbite : biomechanical characteristics of the appliances. J. Pedod., Boston, v. 13, no. 3, p. 195-221, 1989.

28. SILVA FILHO, O. G.; VILLAS BOAS, M. C.; CAPELOZZA FILHO, L. Rapid maxillary expansion in the primary and mixed dentitions : a cephalometric evaluation. Am. J. Orthod. Dentofacial Orthop., St. Louis, v. 100, no. 2, p. 171-179, Aug. 1991.

29. SPOLYAR, J. L. The design, fabrication, and use of a full-coverage bonded rapid maxillary expansion appliance. Am. J. Orthod. Dentofacial Orthop., St. Louis, v. 86, no. 2, p. 136-145, Aug. 1984.

30. ZANELATO, A. C. T. et al. Avaliação das funções estomatognáticas nos diferentes tipos de más oclusões. Rev. Odonto, Local, v. 10, n. 20, p. 32-42, jan./dez. 2002.

CoNCLusÃoA ERM realizada com o expansor colado simplificado mostrou-se

como um método efetivo para a correção da mordida cruzada poste-

rior unilateral funcional, resultando na normalização das dimensões transversais superiores. Além disso, proporcionou condições anatômi-cas e funcionais para a correta época de intervenção fonoaudiológica.