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EXIGÊNCIA CONCEPTUAL DO TRABALHO PRÁTICO EM CIÊNCIAS ESTUDO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO SECUNDÁRIO Sílvia Ferreira & Ana Maria Morais [email protected]; [email protected] Instituto de Educação, Universidade de Lisboa

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Comunicação apresentada no XV Encontro Nacional de Educação em Ciências, em março de 2014 na Escola Superior de Educação e Comunicação da Universidade do Algarve.

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Page 1: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

EXIGÊNCIA CONCEPTUAL DO TRABALHO PRÁTICO

EM CIÊNCIASESTUDO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

NO ENSINO SECUNDÁRIO

Sílvia Ferreira & Ana Maria Morais

[email protected]; [email protected]

Instituto de Educação, Universidade de Lisboa

Page 2: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Motivações

Importância de se implementar o trabalho prático no ensinodas ciências.

(e.g. Hofstein & Naaman, 2007; Millar, 2004)

Desde 2007/2008, a componente prática de Biologia eGeologia assumiu um peso significativo na avaliação dosalunos.

(Portaria n.º 1322/2007)

Page 3: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Questões de investigação

Que tipo de trabalho prático está presente em práticaspedagógicas orientadas para o ensino do conceito deosmose?

Qual é o nível de exigência conceptual desse trabalhoprático?

Quais são as incorreções científicas que os professorespodem cometer quando ensinam esse conceito?

Page 4: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário
Page 5: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Exigência conceptual

O QUE do trabalho prático

Conhecimento científico

Capacidades cognitivas

O COMO do trabalho prático

Relação entre discursos: teoria e prática

Exi

gên

cia

con

cep

tualTipo de trabalho prático

Page 6: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Sujeitos do estudo

Professora Rute

• 38 anos de serviço

• Escola Darwin – NUT do Oeste

• Turma de 10º ano (23 alunos, 15,5 anos)

• Unidade ‘Obtenção de matéria’ (13 aulas)

Professora Sara

• 26 anos de serviço

• Escola Mendel – NUT do Oeste

• Turma de 10º ano (23 alunos, 15,8 anos)

• Unidade ‘Obtenção de matéria’ (16 aulas)

Page 7: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

(e.g. Cantu & Herron, 1978)

Conhecimentos científicos

Indicadores Grau 1 Grau 2 Grau 3 Grau 4

Solicitação do trabalho prático

Exploração/

discussão do TP

Perguntas dos alunos no TP

Conclusão do TP

Indicadores de análise

Grau de complexidade:factos, conceitos simples, conceitos

complexos e temas unificadores/ teorias.

Page 8: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Grau 1 Grau 2 Grau 3 Grau 4

Indicador: Exploração/discussão do trabalho prático

Instrumentos de análise

Conhecimentos científicos

É referido conhecimento de baixo nível de complexidade,como factos.

É referido conhecimento de nível de complexidade superior ao do grau 1, como conceitos simples.

É referido conhecimento de nível de complexidade superior ao do grau 2, envolvendo conceitos complexos.

É referido conhecimento de nível de complexidade muito elevado, envolvendo temas unificadores e/ou teorias.

Page 9: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Conhecimentos científicos

Professora Rute - […] Meninos, já começaram a fazer o desenho [esquemada observação ao microscópio]? […] Agora é só fazer uma célula. […Algumas interações depois] Pronto só aqui, nesta pontinha. E tens ali umacélula. Vê bem o vacúolo. […].

(Aula 3, UA14)

Grau 1

Grau 2

Professora Sara - […] Como é que é feita a movimentação da água?Sempre dos locais onde ela está mais concentrada para onde ela estámenos. Quando vocês mergulharam aquele fragmentozinho de epiderme[da pétala de sardinheira] em água salgada, onde é que havia uma maiorconcentração de água, relativamente aos sais? Dentro das células ou naágua? […].

(Aula 3, UA13)

Page 10: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Capacidades cognitivas

Indicadores Grau 1 Grau 2 Grau 3 Grau 4

Solicitação do trabalho prático

Exploração/

discussão do TP

Perguntas dos alunos no TP

Conclusão do TP (Marzano & Kendall, 2007, 2008)

Grau de complexidade de acordo com a Taxonomia

de Marzano e Kendall

Page 11: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Capacidades cognitivas

(Marzano & Kendall, 2007, 2008)

Page 12: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Capacidades cognitivas

Grau 1 Grau 2 Grau 3 Grau 4

As respostas aos alunos apelam à mobilização de capacidades cognitivas com um baixo nível de complexidade, envolvendo processos cognitivos de recuperação.

As respostas aos alunos apelam à mobilização de capacidades cognitivas com um nível de complexidade superior ao do grau 1, envolvendo processos cognitivos de compreensão.

As respostas aos alunos apelam à mobilização de capacidades cognitivas com um nível de complexidade superior ao do grau 2, envolvendo processos cognitivos de análise.

As respostas aos alunos apelam à mobilização de capacidades cognitivas com um nível de complexidade muito elevado, envolvendo processos cognitivos de utilização do conhecimento.

Indicador: Perguntas dos alunos no trabalho prático

Page 13: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Capacidades cognitivas

Grau 1

[…]Professora Sara - A primeira como? A que menos amplia?Aluna – Sim.Professora - Quatro vezes. O que é que tem?Aluna - Quatro por dez?Professora - Não, tens que ver é a ocular, quanto é que ampliava?Aluna - Era dez?Professora - Então é dez vezes quatro.

(Aula 4, UA5)

Grau 2

[Na interpretação dos resultados da atividade laboratorial de observação do movimentoda água através da membrana de células da epiderme de pétalas de sardinheira:]Professora Rute - Ora, vamos lá então explicar as diferenças encontradas nas duaspreparações. […] A B será uma preparação com…em que a…Aluna - Água destilada.Professora - Exato, com água destilada. Como é que podemos explicar a situaçãoocorrida? O que é que sucedeu? Já sabemos que o vacúolo…?Aluno - Aumentou.Professora - Aumentou de tamanho. Porquê? Carlos.Carlos - Então, porque tá num meio…hipotónico. Eh…entrou mais água para ovacúolo. […]

(Aula 4, UA14)

Page 14: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Indicadores C++ C+ C- C- -

Solicitação do trabalho prático

Exploração/

discussão do TP

Perguntas dos alunos no TP

Conclusão do TP

Conceito de classificação de Bernstein

Instrumentos de análise

Relação entre teoria e prática

(Bernstein, 1990, 2000)

Page 15: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Relação entre teoria e prática

C++ C+ C- C- -

O professor centra-se no conhecimento processual a mobilizar no trabalho prático, não sendo feita referência ao conhecimento declarativo já explorado e/ou a explorar.

O professor centra-se quer no conhecimento processual, quer no conhecimento declarativo, mas não estabelece uma relação entre eles.

O professor estabelece uma relação entre o conhecimento processual e o conhecimento declarativo. Contudo, centra-se no conhecimento declarativo.

O professor estabelece uma relação entre o conhecimento processual e o conhecimento declarativo. Nesta relação, a teoria e a prática têm igual estatuto.

Indicador: Exploração/discussão do trabalho prático

Page 16: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Instrumentos de análise

Relação entre teoria e prática

C++

Aluna - A terceira pergunta [do manual: O que pode inferir relativamente à possibilidade de generalizar os resultados das observações?].Professora Sara - Olha o que é que se pode deduzir, concluir…Aluna - Então isso é tipo conclusão?Professora - Sim, o que é que tu podes concluir relativamente à possibilidade de generalizares os resultados, dizerem olha, cá para mim pronto ponto final, cada vez que eu mergulho um tecido orgânico numa solução hipertónica acontece isto, cada vez que eu mergulho um tecido numa solução hipotónica acontece aquilo. Eu posso generalizar? Acontece sempre a mesma coisa? […]

(Aula 4, UA9)

C-

Professora Rute - Então, isto quer dizer que, teoricamente temos de saber o que vai acontecer às células de sardinheira, quando colocadas por exemplo, no meio hipotónico. Que meio hipotónico vamos usar? Ana? Hipo…tónico? Qual será?Ana - Água.Professora - Água. Da torneira?Ana - Água destilada.Professora - Água destilada. O que é que vai acontecer em água destilada? Martim? O que é que prevês?Martim - Como é hipotónica, a concentração do meio extracelular é menor do que o meio intracelular.Professora - Logo?Martim - Logo, um dos vacúolos … […]

(Aula 3, UA10)

Page 17: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

[Na aula de interpretação dos resultados da atividade laboratorial de observação do movimento da água através da membrana de células da epiderme de pétalas de sardinheira:]

Professora Rute - Ora, vamos agora às pétalas…da flor. Ora, nós dissemos que a solução de Ringer era um meio…?Aluno - IsotónicoProfessora - Isotónico. Que é que isso quer dizer, Clara? […]Clara - Que a concentração de soluto e água…Professora - Não é a água. Isto é uma solução…Clara - Ok, que a constituição da solução é equivalente em ambos.Professora - A concentração da solução de Ringer é igual à concentração…Clara - No suco…Professora - No vacúolo, no suco vacuolar. Exatamente. E agora eu gostava de saber se, havendo, sendo isotónica, se não há passagem de solução nem de materiais de…Alunos - Há.Professora - Ora aí está. Então o equilíbrio que existe é…?Alunos - Dinâmico.Professora - Dinâmico. Não é… Quando atinge a concentração não há movimento nenhum através da membrana, parou tudo. Será que é assim?Alunos - Não.Professora - Não é. Ok? Há gente que escreveu isso e que convém compreender. Portanto, a manutenção do tamanho da célula está normal. E agora temos aqui [no Powerpoint]… uma preparação de pétala da sardinheira em água destilada. Ora vamos lá olhar para aqui que foi isto que vocês viram. […] Isto que está aqui a vermelho, corresponde a que parte da célula? Rita.Rita - Vacúolo.Professora - Ao vacúolo. Porquê?[…] (Aula 4 da professora Rute, UA13).

Conhecimentos científicos – Grau 2

Capacidades cognitivas – Grau 2

Relação teoria e prática – C-

Page 18: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Resultados

Tipo de trabalho prático

Professora Rute

• Atividades laboratoriais:• Movimento da água através da membrana de células de pétalas de sardinheira (Pelargonium sp.)

• Osmómetros com ovos de galinha descalcificados• Folhas de alface em meios com diferentes concentrações

• Exercícios de aplicação:• Interpretação de resultados experimentais

Professora Sara

• Atividade laboratorial:• Movimento da água através da membrana de células de pétalas de sardinheira (Pelargonium sp.)

• Exercícios de aplicação:• Interpretação de resultados experimentais

Page 19: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Resultados

Exigência conceptual do trabalho prático nas práticas

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Conhec. Capac. T-P Conhec. Capac. T-P

4/C- -

3/C-

2/C+

1/C++

Professora SaraProfessora Rute

Page 20: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Em que medida as professoras

recontextualizaram a mensagem expressa

no currículo e nos exames de Biologia e

Geologia nas suas práticas, em termos da

exigência conceptual do trabalho prático?

Page 21: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Resultados

Exigência conceptual do trabalho prático no currículo

0%

20%

40%

60%

80%

100%

Bg B10 B11 Gg G10 G11 Bg B10 B11 Gg G10 G11 Bg B10 B11 Gg G10 G11

4/C- -

3/C-

2/C+

1/C++

Conhecimentos científicos

Capacidades cognitivas

Relação entre teoria e prática

(Ferreira & Morais, 2013a)

Page 22: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Resultados

Exigência conceptual do trabalho prático nos exames

(Ferreira & Morais, 2013b)

0%

20%

40%

60%

80%

100%

EN TI Total EN TI Total EN TI Total

G4/ C- -

G3/ C-

G2/ C+

G1/ C++

Conhecimentos científicos

Capacidades cognitivas

Relação entre teoria e prática

Page 23: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

O nível de exigência

conceptual do

trabalho prático sobre

osmose foi ainda mais

baixo quando se

consideraram

as incorreções

científicas.

1928

Page 24: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Resultados

Incorreções científicas

A osmose é apenas um caso particular de difusão simples.

(Peter Agre et al., 2000)

A bicamada fosfolipídica da membrana celular é impermeável à água.

A membrana celular é permeável a iões e a moléculas polares.

Page 25: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Resultados

Incorreções científicas

(Oliveira et al., 2008)

Page 26: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

Ferreira & Morais, 2014

Exigência conceptual do trabalho prático em ciências

Conclusões

O trabalho prático sobre osmose apresentou um baixo nívelde exigência conceptual:

• Baixa complexidade dos conhecimentos científicos;• Baixa complexidade das capacidades cognitivas;• Incorreções científicas;• Atividades laboratoriais ilustrativas.

Os instrumentos construídos e os conceitos envolvidospoderão vir a ser utilizados para apreciar o nível deexigência conceptual do trabalho prático sobre outrastemáticas.

Page 27: Exigência conceptual do trabalho prático em ciências: Estudo de práticas pedagógicas no ensino secundário

EXIGÊNCIA CONCEPTUAL DO TRABALHO PRÁTICO

EM CIÊNCIASESTUDO DE PRÁTICAS PEDAGÓGICAS

NO ENSINO SECUNDÁRIO

Sílvia Ferreira & Ana Maria Morais

[email protected]; [email protected]

Instituto de Educação, Universidade de Lisboa http://essa.ie.ul.pt