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OS ASPECTOS DA (RE)ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO DOCENTE E O

PRESTÍGIO PROFISSIONAL DO EDUCADOR: ALGUMAS IMPLICAÇÕES DO

DISCURSO DE AMANDA GURGEL NA MÍDIA

Márcia Araújo Ribeiro Lima [email protected], mestranda UERJ- FFP São Gonçalo,

bolsista da CAPES

Orientadora: Profª Drª Marcia Soares de Alvarenga

RESUMO

As questões a respeito do prestígio profissional dos educadores vêm sendo tema de debates e preocupações relacionadas às políticas educacionais e de regulação do trabalho docente bem como no cenário midiático que constantemente vem veiculando, não só acontecimentos de rotina, como também as pesquisas sociais, as manifestações e os movimentos dos trabalhadores desse campo, o que, de certa forma, resgata o prestígio profissional desses sujeitos/cidadãos que há muito vem se perdendo no contexto atual. Nesse sentido, a presente comunicação é resultado de estudos, discussões e reflexões realizados durante as aulas do Mestrado da UERJ nas disciplinas Conhecimento, Cultura e Tecnologia no Contexto das Relações Centro Periferia e Seminário de Fundamentação: Processos Formativos e Desigualdades Sociais a respeito das implicações do discurso da professora Amanda Gurgel na Mídia durante movimento de greve dos trabalhadores em educação em Natal no Rio Grande do Norte. O texto apresenta o contexto do discurso da citada professora fazendo confluências com Escosteguy, Castel e Frigotto ao mesmo tempo em que relaciona as questões veiculadas pela mídia com ênfase nas implicações do discurso da docente. As notas conclusivas apontam as críticas feitas pela educadora relacionadas às condições indignas do trabalho do professor bem como à crise de identidade que esses profissionais vivenciam e a volta, mesmo que momentânea, desse prestígio profissional.

PALAVRAS-CHAVE: docência, mídia e prestígio profissional, TIC - Tecnologias da Informação e Comunicação

O CONTEXTO DO DISCURSO

As recentes mudanças dos padrões de organização escolar, avaliação, currículo planejamento,

entre outras, demandam a (re)organização do trabalho docente implicando nos aspectos da

formação continuada dos professores, da carga horária de trabalho que se torna exaustiva e

consequentemente no distanciamento das relações humanas e solidárias no convívio com os

demais colegas na instituição educativa na qual atuam.

Nessa realidade, a (re)organização do trabalho docente é determinada pelas políticas

educacionais demandadas por órgãos internacionais como o Banco Mundial, a UNESCO –

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura e o UNICEF – Fundo

das Nações Unidas para a Infância que exigem dos países em “desenvolvimento” melhorar os

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índices de aproveitamento escolar com investimentos direcionados para a estrutura

educacional e não para os trabalhadores. O que segundo Escosteguy (2001, p.158) se

configura como desintegração social quando afirma:

“De outro lado, a desintegração social e a política do espaço nacional é cada vez mais evidente. Indicativos como a crescente desigualdade social, a inserção de instituições financeiras transnacionais que vão substituindo o Estado no planejamento do desenvolvimento, da esfera pública e de mecanismos de coesão política cultural, entre outros aspectos nos levam a duvidar da pertinência de categorias como nação e Estado para compreender as experiências culturais contemporâneas.”

Diante disso, muitos educadores brasileiros enfrentam três turnos de trabalho em diferentes

instituições a fim de adquirir um salário que possibilite arcar com as despesas de

sobrevivência deixando de lado o exercício da formação continuada por falta de

disponibilidade de tempo para estudar, planejar suas aulas e atender seus alunos.

Dessa forma, as tensões existentes entre a instância superior - Secretaria de Educação o MEC

– Ministério da Educação e a unidade escolar se tornam freqüentes por conta do volume de

atribuições que a escola recebe com metas e prazos determinados para cumprir, a exemplo das

políticas de integração da escola com a comunidade e a construção do projeto político

pedagógico numa prática democrática e participativa, tudo isso com o reforço do discurso

neoliberal de autonomia escolar.

Sobre essa concepção de autonomia, Nóvoa (2003) afirma:“a pedagogia moderna fundou-se na idéia da autonomia da educação. Ainda que este princípio raramente tenha sido levado à prática ele constitui matriz do discurso pedagógico. Hoje, temos de ser capazes de traduzir autonomia em processos de diferenciação pedagógica. A escola não pode ser igual para todas as crianças. É preciso construir percursos escolares diferenciados, no quadro de uma escola comum”.

Nesse contexto, o ofício de professor se modifica a medida que as políticas capitalistas

alteram seus alvos, então, aos docentes compete ser de excelência e protagonistas dessas

práticas responsabilizando-se pelo alcance dessas metas de escolarização bem como pelos

resultados do fracasso escolar, pois essas políticas de regulação do trabalho docente vêm no

formato de receituários homogeneizados, ou seja, igual para todas as escolas, e não incluem,

de forma alguma, as localidades que nem sequer tem escolas.

Reforçando essa concepção Nóvoa (2003) afirma: “os educadores deixam-se tentar muitas

vezes, por discursos miríficos de uma escola que iria transformar o mundo ou salvar as

pessoas. Não vai.”

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A afirmação do autor remete-nos a compreensão de que a profissão de professores e

professoras, sua formação e sua condição de trabalho deveriam ser estratégias de rompimento

com esse ciclo de desigualdade crescente, pois quem tem melhor condição social obtém

educação com mais qualidade e quem recebe essa educação boa, avança socialmente.

Compartilhando dessa mesma opinião, Menezes(2007) afirma:

“o desprestígio e a expectativa de baixa remuneração do trabalho de professor fazem com que os cursos de pedagogia e as licenciaturas sejam os menos disputados nas seleções de entrada nas universidades brasileiras. Acompanho o trabalho magnífico feito na rede publica por professores e professoras, defendo que, por sua qualificação e dedicação eles deveriam ser contratados como tutores na formação prática de novos colegas. No entanto, nessa lógica perversa, eles não são reconhecidos nem pagos por seu empenho ou excelência, já que são “funcionários públicos como os demais”. Assim, muitos dos que têm melhor qualificação cultural e técnico-pedagógica acabam atraídos pelas escolas particulares (que já atendem a alunos de melhor condição econômica e oferecem um ensino um pouco mais qualificado”.

E ainda, Nóvoa (1999, p. 5) enfatiza: “Nas sociedades actuais, os burocratas definem vários problemas sociais e educacionais numa perspectiva gerencial e não numa perspectiva de conteúdo. O excesso dos discursos faz lembrar o final do século XIX, quando os professores eram investidos de todos os poderes (até de ganhar guerras). Mas nessa época havia um consenso social em torno da missão dos professores. Hoje, não há. E o excesso dos discursos tende, apenas, a esconder a pobreza das políticas”.

Por isso, as greves dos trabalhadores em educação continuam se repetindo no movimento

educacional desde 1978, época da ditadura militar no Brasil.

Sobre isso, Oliveira (2005, p.764) reforça:

“nesse sentido, é possível compreender o processo de recuperação das lutas dos trabalhadores da educação por parte do Estado, envolvendo a gestão, a organização e o financiamento da educação, que acaba por forjar novos modelos de regulação das políticas educacionais assentadas na descentralização da execução e na centralização da formulação e do controle sobre os resultados”

Dessa forma, essas políticas de regulação do trabalho docente implicam na perda do prestígio

social dos educadores pois não contemplam salários dignos, condições de estudo, lazer, saúde,

transporte e moradia favoráveis ao enfrentamento das políticas capitalistas e neoliberais,

contempla sim, a atribuição de culpa aos educadores pelos resultados do processo escolar e

educativo se estendendo à responsabilidade pelo avanço social dos alunos oriundos das

classes populares desfavorecidas das políticas de cidadania.

Nesse cenário, embutido no pacote dessas políticas, há também a proposição para o docente

incluir em suas práticas educativas o uso das novas tecnologias que é apresentada como

inovação pedagógica que torna cada vez menor a utilização do quadro-negro, do livro-texto e

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do professor conteudísta. Elas se caracterizam pela interatividade não linearidade da

aprendizagem (é uma teia de conhecimentos e um ensino em rede) e pela capacidade de

simular eventos do mundo social e imaginário. Faria (2001, p.58).

Para Faria (2001, p.58)

“não se trata de substituir o livro pelo texto tecnológico e a fala do docente e os recursos tradicionais pelo fascínio da tecnologia. Não se pode esquecer que os mais poderosos e autênticos recursos da aprendizagem continuam sendo o professor e o aluno que, conjunta e dialeticamente, poderão descobri novos caminhos para a aquisição do saber.”

Diante disso, entende-se que essa mudança de paradígma requer um exercício de estudo,

pesquisa e formação constante por parte dos docentes o que demanda tem po e recursos

financeiros, coisas pouco possíveis de se obter principalmente pela forma como essas políticas

educacionais se apresenta para os educadores.

Mesmo assim, presencia-se na atualidade professores adotando o uso das novas tecnologias

em suas aulas, de forma criativa, autônoma e crítica. Educadores que em meio a tantas

turbulências conseguem exercer um trabalho intelectual, criativo, colaborativo e participativo

interagindo e dialogando com seus alunos recorrendo às tecnologias da comunicação e se

apropriando dessa aparelhagem tecnológica para se lançar em novos desafios e reflexões

sobre sua prática docente e sobre o processo de construção do conhecimento por parte do

aluno.

Assim, nesse contexto muitas vezes não é possível estabelecer aproximações identitárias entre

os professores e o conjunto de trabalhadores da sociedade brasileira justamente pela falta de

consciência de classe causada pelo distanciamento dos professores com os demais

trabalhadores seus sindicatos e suas organizações. Que segundo Escosteguy (2001, p.159):

“São essas esquecidas “formas de participação” na vida cotidiana que contribuem tanto para

preservar as identidades culturais como para adaptá-las às demandas modernas.”

As idéias da autora contribuem para a compreensão de que essa falta de participação dos

educadores nos movimentos culturais de trabalho impedem a comunicação e

consequentemente a constituição de identidades, pois, segundo ela “os processos comunitários

são fenômenos de produção de identidade de reconstituição de sujeitos, de atores

sociais.”(p.150).

Partindo dessa compreensão, constata-se que o ideal é que os grupos de professores exerçam a

prática constante da comunicação como marca cultural de sua classe, pois só assim concebem

as relações que trazem o processo identitário no âmbito da profissão.

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A esse respeito, a comunicação no estudo da autora é relacionada à cultura, ou mais

exatamente, a partir das experiências dos sujeitos sociais.

Como afirma Castel (1999, p.149), “ser assalariado é ocupar quase sempre posições frágeis e incertas: semicondição de assalariado fracionada, condição clandestina de assalariado, condição desprezada de assalariado... Acima do vagabundo, mas abaixo de todos aqueles que têm um status, os assalariados povoam as zonas inferiores e ameaçadas de dissolução da organização social.”

Compreendendo melhor o contexto social dessa questão, entende-se que a profissão professor

insere-se nessa situação de desprestígio social pois essa profissionalização da área

educacional se desenvolveu em meio a uma crise geral do profissionalismo e das profissões. O

que, segundo Tardif (2008, p.250),

“provocou muitos debates, análises e diagnósticos. Houve, assim, uma multiplicação das escolas de pensamento e dos referenciais, provocando uma intensificação do debate entre os profissionais e um aumento dos questionamentos do público com relação ao tipo e ao valor dos saberes nos quais se apóiam os atos profissionais”.

Sobre isso, Abrahão (2000 P.20) explica que: “as características positivas de destacados professores são fruto de uma consistente construção identitária pessoal/profissional. Valores como: amizade e respeito pelos alunos, pelos colegas; afetividade, sinceridade, fraternidade; amor pela profissão, paixão pela educação, utopia/topia, idealismo, crença na educação; responsabilidade, empenho, dedicação, busca de maior competência no fazer pedagógico; simbiose entre vida pessoal e vida profissional, coerência entre o eu pessoal e o eu profissional e uma gama de valores morais, muito claro e forte, são os ingredientes construtores de identidade dos destacados professores”.

A explicação da citada autora é relacionada a um estudo realizado com doze destacados

professores riograndenses revisitados à luz dos ciclos de vida profissional que atuaram/atuam

desempenhando várias atividades de magistério, em diferentes níveis de ensino, bem como no

ensino não-formal e em funções correlatas – de administração, de atividade em associação de

classe, de educação social, de movimentos culturais, de atividades comunitárias – de forma

mais competente em distintas cidades do estado e que deixaram/deixam indelével marca em

gerações de alunos no Rio Grande do Sul.

Por fim, identifica-se no citado estudo, que os professores pesquisados constroem uma forte

identidade com o ofício docente mediante a superação de uma formação calcada num fazer

pedagógico tradicional, pois são profissionais que valorizam a liberdade de pensamento

crítico e o potencial transformativo dos alunos.

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O DISCURSO DE AMANDA GURGEL NA MÍDIA

Em meio a essas turbulências advindas das políticas educacionais, das desigualdades sociais,

do desprestígio profissional e da crise de identidade enfrentada pelos educadores, repercute na

mídia escrita e televisada o pronunciamento proferido pela professora Amanda Gurgel em

10.05.2011 na Assembléia Legislativa do Rio Grande Norte durante período de greve dos

servidores em educação do estado.

O discurso proferido pela professora de 28 anos e apenas 1,57 de altura enfatizou o baixo

salário recebido pelos docentes e principalmente a crise de identidade e a condição indigna

que esses profissionais enfrentam para a atuação em sala de aula.

Na assembléia a professora iniciou seu discurso falando do salário de R$ 930,00, da

responsabilidade colocada nos professores para redenção do país da banalização da crise da

educação, da situação precária da educação como fatalidade e o professor sendo colocado na

sala de aula para ser o redentor do país, ou seja, “o salvador da Pátria.”

No dia 22.05.11 a professora teve a oportunidade de se posicionar a respeito da mesma

problemática durante 23 minutos e 43 segundos no programa Domingão do Faustão. Ao

entrar no palco, a docente foi aplaudida pela platéia e cumprimentada pelo apresentador que

elogiou a consistência do seu discurso feito na Assembléia Legislativa na semana anterior,

momento em que oportuniza enfatizar o tamanho de sua valentia em detrimento do seu porte

pequeno, (seu tamanho) o que era reforçado pelas imagens que focalizava seu rosto e depois

seu corpo por inteiro.

Antes de iniciar a entrevista Faustão apresentou os índices de crianças/adultos alfabetizados

no Brasil nos últimos dois anos bem como os 13% dos brasileiros que largam os estudos nos

primeiros anos da educação básica.

Faustão torna a explicar a fala da professora pontuando a realidade do Rio Grande do Norte e

as relações com a realidade da educação brasileira. Dois milhões e meio de professores e

cinqüenta e três milhões de alunos matriculados.

Após essa introdução, Fausto Silva entrevistou Amanda fazendo perguntas relacionadas ao

salário dos professores do seu estado, da merenda e das condições de trabalho sempre

mostrando imagens de sua fala durante o pronunciamento na Assembléia Legislativa. À

medida que essas imagens iam sendo mostradas, o apresentador ouvia o posicionamento da

docente sem interromper. Momento em que a professora se pronunciou da seguinte forma:

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“Houve um tempo em que eu trabalhava em três horários, estava na rede privada, acabei assumindo o município e tinha uma média de 600/700 alunos. Comecei a dar aula em 2002, tinha 21 anos, estava eufórica, topando tudo. O ápice do problema de saúde foi em 2007 para 2008 quando percebi que estava estafada. Estava em sala de aula com alunos pouquíssimos proficientes. Alunos de sexto ano que não sabiam ler palavras básicas como bola, pato, entendeu? Comecei a me desesperar diante da realidade, não sou alfabetizadora. O que vou fazer se nada do que estou preparada para oferecer eles não estão preparados para receber? Sou professora de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira e Portuguesa de alunos dos ensinos Fundamental II e Médio”.

Nessa afirmação, Amanda enfatizou está recebendo um salário de R$ 930,00, o que não dá

nem para pagar a alimentação entre um intervalo e outro, entre uma escola e outra, e, quando

se alimentam da merenda da escola juntamente com os alunos recebem reclamações, pois a

promotoria fiscaliza para garantir que a merenda seja distribuída somente aos alunos, já que

esse recurso é destinado aos alunos, o que Amanda chama de “merenda alegada”

Reforçando a fala da professora Frigotto (2011, p.07) afirma:

“Os milhões de jovens que freqüentam as escolas públicas têm uma educação mutilada em todas as dimensões e os professores que nela trabalham, humilhados com salários pífios que os levam a fazer três turnos de trabalho, quase sempre em três escolas diferentes. Além disso com a ausência de grande parte do poder público, contratam-se institutos privados que fabricam apostilas esquemáticas com conteúdos e métodos cheios de clichês retirando do professor a autonomia do quê ensinar e como ensinar dentro do projeto pedagógico por eles construídos e dentro de sua realidade”

Na conclusão da entrevista, o apresentador abriu espaço para perguntas da platéia onde três

pessoas indagaram a respeito da repercussão do pronunciamento da professora na mídia, bem

como suas intenções em aproveitar esse momento e se lançar na política. Amanda respondeu

que não estava vaidosa, que apenas estava emprestando sua voz a todos os educadores do

Brasil, e, finalizando, pediu aplausos para os educadores dos municípios e estados brasileiros

que estavam em greve.

Nessa conclusão, o apresentador ainda colocou à disposição dos telespectadores o site abaixo

para votação.

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Após a exposição desse painel, o resultado da enquete realizada pelo programa mostrou que

98% do público que votou, concorda com o discurso da professora, resultado que o

apresentador Fausto Silva aproveitou para anunciar que ia enviar para a Presidente da

Republica Dilma Roussef.

Ainda nessa repercussão, a TV bandeirantes também oportunizou espaço/entrevista com

Amanda numa escola da rede municipal de Natal-RN onde a mesma se posicionava na frente

da lousa, em uma sala de aula sem a presença dos alunos (porque a rede estava sem aulas por

conta da greve) e, nessa posição, a docente ia expondo suas concepções a respeito da greve,

das políticas de educação e da profissão docente. Utilizando disso, a TV fazia recortes de sua

fala e ia mostrando imagens de abordagens feitas nos arredores da escola junto a alunos, pais

e com a secretária de educação a respeito da greve, das problemáticas da educação no estado,

e das aprendizagens dos alunos.

Mediante essas práticas, é importante reforçar que os entrevistados concordaram plenamente

com as concepções da professora, inclusive a secretária de educação que fez questão de

enfatizar que o que vem sendo feito pela educação, tem sido muito pouco tendo em vista o

volume de demandas e necessidades advindas das realidades expostas pela docente.

Dessa forma, a emissora de TV encerrou sua reportagem mostrando imagens da escola vazia e

reforçando o apoio que a professora recebeu da parte da comunidade, dos estudantes e da

mídia.

Já na revista ISTOÉ, de primeiro de junho de 2011, a entrevista com Amanda foi publicada

em duas páginas com uma foto. Nesta, a docente faz pose e, logo abaixo, uma manchete: “A

escola virou um depósito de crianças”, fazendo referência à sua fala a respeito da preocupação

dos dirigentes do país somente em ter a escola como um lugar para mandar as crianças,

enquanto os pais trabalham. “A questão da qualidade do ensino, bem como as condições de

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trabalho para os professores e, muito menos, preocupação com um salário digno para esses

profissionais”.

Assim, não muito diferente das abordagens anteriores, a entrevista veiculada na revista

também versou sobre as mudanças que a divulgação do vídeo na assembléia legislativa de

Natal-RN causou na vida da professora e no cenário da educação nacional.

A publicação foi norteada por perguntas relacionadas à maneira como a docente gasta seu

salário, sobre a aprendizagem de seus alunos, sobre a dinâmica da sala de aula bem como a

respeito da saúde e das condições de trabalho dos educadores.

Durante essa abordagem, a professora considerou como principal problema da educação no

país, a falta de investimento. Nessa consideração, Amanda sugeriu que o governo brasileiro

comece a investir 5% do seu PIB – Produto Interno Bruto na educação ao invés de somente

3%, o que segundo ela, é um dos motivos da rede publica brasileira pagar esse irrisório salário

aos trabalhadores da educação.

ALGUMAS IMPLICAÇÕES

Portanto, mediante essa análise, vê-se que não somente os veículos midiáticos estudados

foram implicados com o discurso da professora, isso se estendeu também aos dirigentes

responsáveis pelas políticas educacionais do país, pois a peregrinação da docente por vários

veículos de comunicação, escritos, falados e televisados durante os meses de maio/junho de

2011, fomentou reflexões aprofundadas acerca da profissão docente, bem como relacionadas à

importante contribuição que a classe trabalhadora em educação tem para significativas

mudanças e avanço das políticas sociais, educacionais do Brasil.

Nessas implicações, vê-se que os veículos midiáticos analisados se preocuparam basicamente

em reforçar o pronunciamento da docente na assembléia legislativa do estado do Rio Grande

do Norte, o que nos remete a compreensão de que a problemática educacional foi amplamente

focalizada nesses veículos, aspecto que se configura, um retorno do prestígio desse

profissional, coisa que não acontece há muito tempo no cenário nacional.

Diante disso, cabe ressaltar o poder da linguagem midiática relacionado às mudanças sociais,

principalmente na dimensão do pensamento crítico dos interlocutores, pois segundo

Guimarães (2110, p. 135)

“esse movimento vai orientando o espectador a se “ver” em relação aos “ outros”. Assim, um conjunto de experiências sociais é reforçado e outro é excluído, conduzindo e orientando comportamentos e posições de sujeitos que devem ser valorizadas e outras evitadas.”

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A afirmação da autora reforça a compreensão de que a repercusão do pronunciamento da

professora Amanda Gurgel na mídia, implicou em diferentes reflexões, posicionamentos e

comportamentos da parte de diversos educadores espalhados pelos estados do Brasil, muitos

começaram a se “ver” nesse cenário ora como incluídos ora como excluídos, iguais ou

desiguais. Tudo isso considera-se um certo resgate acerca das reflexões sobre o prestígio

profissional dos educadores comprovado também pelo prêmio “Brasileiros de Valor 2011”.

oferecido a professora Amanda Gurgel pelo PNBE-Pensamento Nacional de Bases

Empresariais e que não foi aceito por ela mediante carta de 02 de julho de 2011 que circulou

na rede midiática com exposição de motivos justificando o não comparecimento ao evento de

entrega do prêmio.

Ilustrando e comprovando essa compreensão, utiliza-se aqui um trecho da carta publicada por

Amanda: (02.07.2011)

“A minha luta é muito diferente dessas instituições, empresas e personalidades. Minha luta é igual a de milhares de professores da rede pública. É um combate pelo ensino público, gratuito e de qualidade, pela valorização do trabalho docente e para que 10% do Produto Interno Bruto seja destinado imediatamente para a educação. O pressupostos dessa luta são diametralmente diferentes daqueles que norteiam o PNBE. Entidade empresarial fundada no final da década de 1980, esta manteve sempre seu compromisso com a economia de mercado. Assim como esta manteve sempre seu compromisso com a economia de mercado. Assim como o movimento dos professores sou contrária à mercantilização do ensino e ao modelo empreendedorista defendido pelo PNBE. A educação não é mercadoria, mas um direito inalienável de todo ser humano. Ela não é uma atividade que possa ser gerenciada por meio de um modelo empresarial, mas bem público que deve ser administrado de modo eficiente e sem perder de vista sua finalidade.

NOTAS CONCLUSIVAS

Após essa análise, entende-se que mesmo sendo o discurso da professora recheado de críticas

relacionadas à condição indigna dos docentes, à crise de identidade que os mesmos vivem e as

doenças que adquirem durante o exercício da profissão, visualiza-se nesse cenário um foco no

prestígio desse profissional sobre quem vem sendo depositado o futuro do Brasil, prova disso

foi o apoio recebido pela professora vindo da parte de pessoas de diversos estados do Brasil

via acessos ao seu blog com comentários a respeito do seu vídeo que foi postado na rede e

visto quase 1,6 milhão de vezes.

Por isso, identifica-se nessa repercussão midiática o retorno, de certa forma, do prestígio

dessa figura tão importante que é o educador, pois graças a midiatização do problema, a

população pode discuti-lo no mesmo instante em que ocorreu, criando assim condições para

uma tomada de consciência crítica a respeito dessa problemática movimento que nos leva a

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compreender que o aparelho midiático completa a ação de muitas instituições, como os

sindicatos, as famílias e sobretudo as escolas.

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relatos na primeira pessoa. Projeto de Pesquisa. Porto Alegre: 2000.

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http://contextolivre.blogspot.com , acesso em 12.07.2011

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