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CURSO SUPERIOR DE TEOLOGIA DISCIPLINA: EXEGESE BÍBLICA

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  • CURSO SUPERIOR DE TEOLOGIA

    DISCIPLINA: EXEGESE BBLICA

  • CONCEITO GERAL DE EXEGESE BBLICA Introduo

    Comentando Exegese, o professor Jesiel Paulino da Silva afirma que a mesma refere-se ao estudo sistemtico e crtico, mui especialmente histrico-literrio, da Bblia conforme princpios hermenuticos, com o propsito imediato de determinar, com o mximo de preciso, mediante o emprego de certos recursos e instrumentos tcnicos, qual o sentido primitivo que o escritor original tencionou dar ao seu texto, isto , o que o texto quer dizer ou comunicar por si mesmo. a tentativa de escutar a Palavra conforme os destinatrios originais devem t-la ouvido; descobrir qual era a inteno original da Bblia.

    Exegese, sob uma perspectiva de conceituao elementar, tambm definida como comentrio para esclarecimento ou interpretao detalhada de um texto ou palavra - especialmente da Bblia, leis ou gramtica.

    A palavra exegese tem sua origem no termo grego exegesis, que tanto pode significar narrao, guiar, dirigir, governar, descrio ou apresentao, como explicao e interpretao, que, por sua vez, origina-se de exegeomai. Egeomai significa conduzir e ex, respectivamente ek, expressa a idia de para fora. Etimologicamente, o significado proposto para exegese seria conduzir para fora.

  • Exegese , portanto, a exposio, a operao de interpretar. Enquanto a hermenutica a cincia da interpretao, a exegese a aplicao dessa cincia Palavra de Deus. Para se compreender bem a exegese, necessrio saber o que hermenutica, que vem do grego hermeneutik e significa relativo interpretao, que serve para interpretar, hermenutica. A palavra est ligada a Hermes, nome que os gregos davam a Mercrio, de uma palavra da lngua grega que significa interpretao, pela razo de ser ele o mensageiro e intrprete dos deuses. Reverenciava-se debaixo deste nome como deus da eloqncia, e em respeito a isto se representava na figura de um homem de cuja boca saam como pequenas cadeias que parava nas orelhas de outras figuras humanas, que exprimiam aos ouvintes que ele encadeava pela fora do discurso (Dicionrio da fbula Compr, F. Briguiet & Cia., Rio de Janeiro, p. 221).

    Exegese e hermenutica

    Tnue a linha limtrofe entre a exegese e a hermenutica. Haja vista que ambas possuem uma intrnseca relao. Todavia, apesar dessa ntima relao, necessrio serem feitas as devidas distines entre exegese e hermenutica.

    O vocbulo hermenutico se origina da palavra grega Hermeneutike que por sua vez, derivada do verbo ermeneuein, que possui significado similar ao de exegese, isto , interpretar. Ordinariamente trata-se dos princpios que dita as regras gerais ou especficas a serem aplicadas na busca e na determinao do sentido dos textos. E, por sua vez, a exegese, como j fora supracitado, trata-se da aplicao concreta de regras hermenuticas; portanto, ela consiste na explicao propriamente dita do texto.

    A Hermenutica pertence ao grupo de estudos Bibliolgicos, isto , aos estudos centrados na Bblia. Ela naturalmente a Filosofia Sacra, e precede imediatamente a Exegese. A Hermenutica e a Exegese se relacionam na mesma forma que a teoria se relaciona com a prtica, pois a exegese a aplicao metodolgica dos princpios tcnicos hermenuticos.

    Portanto, a hermenutica a cincia da interpretao, e a exegese a extrao dos pensamentos que assistiam ao escritor sagrado quando este redigia determinada poro da Escritura. A exegese como cincia da correta interpretao das Sagradas Escrituras possui suas prprias leis de interpretao, que devem ser entendidas e aplicadas corretamente para se descobrir o sentido exato de determinada passagem bblica.

  • O Exegeta

    Os dicionrios comumente definem o termo exegeta como aquele que se dedica a fazer exegese.

    Partindo de uma perspectiva tcnica de conceituao, e sabendo que exegese uma ao de explicao interpretativa, o exegeta pode ser conceituado como a pessoa que interpreta e explica o sentido de um texto. Essa conceituao evidencia que todo aquele que interpreta e explica um texto pode ser classificado como exegeta, todavia o questionamento se o indivduo um bom ou mau, exegeta. Por isso, melhor restringir e denominar como exegeta to somente aquele que, em um sentido mais profundo, possui a capacitao de conhecer bem o idioma e as circunstncias dos textos no seu contexto original. Porm, apesar de nem todos poderem ser conceituados tecnicamente como exegetas, todos tm o direito de investigar e interpretar por si mesmos a Palavra de Deus.

    O Trabalho do Exegeta

    Na exegese do Antigo Testamento, o estudante encontrar os mais variados temas, os quais geralmente se alternam em um mesmo livro e, at em um mesmo captulo, no apresentando, na maioria das vezes, uma seqncia cronolgica dos fatos e temas, o que dificulta, em alguns casos, seguir a linha de pensamento do autor.

    Os mais variados gneros literrios e as diferentes expresses lingsticas, que encontramos nas Escrituras, devem ser consideradas, se realmente queremos chegar ao verdadeiro sentido das passagens em estudo. Notamos distintos aspectos narrados por diferentes pessoas, com diferentes graus de cultura.

    Sabemos que as expresses detalhadas de uma profecia no se podem ler como se formassem parte de uma narrao potica; tambm teremos de dar uma ateno muito especial s figuras literrias e s sries de simbolismo que certamente sero encontrados.

    Vale ressaltar que nunca deve ser olvidada pelo exegeta cristo a sua obrigatoriedade de conhecer alguns aspectos da exegese sagrada, pois, a partir desse conhecimento que o intrprete adquire maiores chances de esclarecimento no que toca a alguns textos da Sagrada Escritura. Por outro lado, os passos que iremos apresentar, referentes ao trabalho do exegeta

  • cristo, traro, sem dvida, uma viso bem mais abrangente da responsabilidade do intrprete bblico, sobretudo quando ele estiver diante de certos textos complexos das Escrituras. De fato, a tarefa rdua, difcil e exige do exegeta cristo um rigoroso policiamento para que, de forma alguma, ele seja surpreendido pelo subjetivismo na sua anlise textual, mas deve sempre primar pela objetividade e pelo bom senso na sua exegese, a fim de evitar extremismos. Analisemos, pois, os instrumentos de trabalho do exegeta cristo.

    O objetivo da Exegese A exegese tem como objetivo o estudo cuidadoso e sistemtico da Escritura para descobrir o significado original que foi pretendido. A exegese praticamente uma tarefa histrica. a tentativa de escutar a Palavra conforme os destinatrios originais devem t-la ouvido; descobrir qual era a inteno original das palavras da Bblia. Esta a tarefa que freqentemente exige a ajuda do perito, aquela pessoa cujo treinamento a ajudou a conhecer bem o idioma e as circunstncias dos textos no seu mbito original. No necessrio, no entanto, ser perito para fazer boa exegese. Na realidade, todos so exegetas dalgum tipo. A nica questo real se voc vai ser um bom exegeta. Quantas vezes, por exemplo, voc ouviu ou disse: O que Jesus queria dizer com aquilo foi... L naqueles tempos, tinham o costume de...? So expresses exegticas. So empregadas mais freqentemente para explicar as diferenas entre eles e ns por que no edificamos parapeitos em redor das nossas casas, por exemplo, ou para dar uma razo do nosso uso de um texto de uma maneira nova ou diferente por que o aperto da mo freqentemente tomou o lugar do sculo santo. At mesmo quando tais idias no so articuladas, so, na realidade, praticadas o tempo todo de um modo que segue o bom-senso.

    O problema com boa parte disto, no entanto, que tal exegese freqentemente seletiva demais, e que freqentemente as fontes consultadas no so escritas por peritos verdadeiros. Ou seja: so fontes secundrias que tambm empregam outras fontes secundrias, ao invs das fontes primrias. So necessrias umas poucas palavras acerca de cada um destes problemas:

    O problema real com a exegese seletiva que a pessoa freqentemente atribuir suas prprias idias, completamente estranhas, a um texto e, assim, far da Palavra de Deus algo diferente daquilo que Deus realmente disse. Por exemplo, um dos autores deste livro recentemente recebeu uma carta de um evanglico conhecido, que argumentou que o autor no deveria comparecer a uma conferncia juntamente com outra pessoa bem conhecida, cuja ortodoxia era algo suspeita. A razo bblica dada para evitar a conferncia foi 1

  • Tessalonicenses 5.22: Abstende-vos de toda forma do mal. Se, porm, nosso irmo tivesse aprendido a ler a Bblia exegeticamente, no teria usado o texto dessa maneira. Ora, 1Ts 5.22 foi a palavra final de Paulo num pargrafo aos Tessalonicenses a respeito das expresses carismticas na comunidade. No tratem as profecias com desprezo, diz Paulo. Pelo contrrio, testem tudo, e apeguem-se ao que bom, mas evitem todas as formas malignas. Evitar o mal tem a ver com profecias, que, ao serem testadas, revelam-se no serem do Esprito. Fazer este texto significar alguma coisa que Deus no pretendeu abusar do texto, no us-lo. Para evitar erros deste tipo, devemos aprender a pensar exegeticamente, ou seja: comear no passado, l e ento, e fazer assim com todos os textos.

    Conforme logo notaremos, no se comea uma exegese consultando os peritos. Mas quando for necessrio faz-lo, devemos procurar usar as melhores fontes.

    1 - HISTORICIDADE

    1.1. Histria dos princpios da Exegese bblica

    1.1.1. Qual a razo de uma viso panormica da Histria?

    Desde que Deus revelou as Escrituras, tem havido diversos mtodos de estudar a Palavra de Deus. Os intrpretes mais ortodoxos tm encarecido a importncia de uma interpretao literal, outros tm empregado um mtodo alegrico, e ainda outros tm examinado letras e palavras tomadas individualmente como possuindo significado secreto que precisa ser decifrado.

    A partir de uma viso histrica dessas prticas de interpretao, veremos que:

    a) Nosso sistema de interpretao, no o nico que j existiu; b) Os pressupostos de outros mtodos proporcionam uma perspectiva mais equilibrada e

    uma capacidade para um dilogo mais significativo com os que crem de modo diferente;

  • c) Pela observao dos erros dos que nos precederam, podemos conscientizar-nos mais dos possveis perigos quando somos tentados de maneira semelhante.

    1.2. Exegese judaica Antiga

    Um estudo da histria da interpretao bblica comea, em geral, com a obra de Esdras. Ao voltar do exlio na Babilnia, o povo de Israel solicitou a Esdras que lhes lesse o Pentateuco (Ne 8.8).

    Durante o perodo do exlio, os israelitas provavelmente tenham perdido sua compreenso do hebraico, a maioria dos eruditos bblicos supe que Esdras e seus ajudantes traduziam o texto hebraico e o liam em voz alta em aramaico, acrescentando explicaes para esclarecer o significado.

    Os escribas que vieram a seguir tiveram grande cuidado em copiar as Escrituras, crendo que cada letra do texto era a Palavra de Deus inspirada. Esta profunda reverncia pelo texto escriturstico firma suas vantagens e desvantagens. Uma grande vantagem estava em que os textos foram cuidadosamente preservados atravs dos sculos. Uma grande desvantagem foi que os rabinos logo comearam a interpretar a Escritura por outros mtodos que no os meios pelos quais a comunicao normalmente interpretada.

    No tempo de Cristo, a exegese judaica podia classificar-se em quatro tipos principais: literal, midrshica, pesher, e alegrica.

    O mtodo literal de interpretao, referido como peshat, servia de base para outros tipos de interpretaes. Richard Longenerker entende que este tipo de comentrio devia ser conhecido por todos e uma vez que no havia disputas a seu respeito, no era registrado.

    A interpretao midrshica inclua uma variedade de dispositivos hermenuticos. O rabi Hillel considerado como o elaborador das normas bsicas da exegese rabnica que acentuava a comparao de idias, palavras ou frases encontradas em mais de um texto, a relao de princpios gerais com situaes particulares, e a importncia do contexto na interpretao.

    A interpretao pesher existia particularmente entre as comunidades de Qumran. A comunidade acreditava que tudo quanto os antigos profetas escreveram tinha significado proftico velado que devia ser iminentemente cumprido por intermdio de sua comunidade do pacto.

  • A exegese alegrica baseava-se na idia de que o verdadeiro sentido jaz sob o significado literal da Escritura. Filo (20 a.C. a 50 d.C.) acreditava que o significado literal da Escritura representava um nvel imaturo de compreenso; o significado alegrico era para os maduros. Devia usar-se a interpretao alegrica nos seguintes casos:

    a) Se o significado literal diz algo indigno de Deus,

    b) Se a declarao parece ser contraditria a outra declarao da Escritura;

    c) Se o registro alega tratar-se de uma alegoria;

    d) Se as expresses so dplices ou se h emprego de palavras suprfluas;

    e) Se h repetio de algo j conhecido; f) Se uma expresso variada;

    g) Se se empregam sinnimos;

    h) Se for possvel um jogo de palavras; i) Se houver algo anormal em nmero ou tempo (verbal);

    j) Se h presena de smbolos. 1.3. O uso do Antigo Testamento pelo Novo

    Aproximadamente 10% do Novo Testamento constitui-se de citaes diretas, de parfrases do Antigo Testamento ou de aluses a ele. Dos trinta e nove livros do Antigo Testamento, apenas nove no so expressamente mencionados no Novo.

    1.4. O uso que Jesus faz do Antigo Testamento

    Podemos extrair diversas concluses gerais dum exame do uso que Jesus faz do Antigo Testamento. Primeiro, ele foi uniforme no tratar as narrativas histricas como registros fiis do fato. As aluses a Abel, No, Abrao, Isaque, Jac, e Davi, por exemplo, parecem todas intencionais e foram entendidas como referncias a pessoas de carne e osso e a eventos histricos.

  • Segundo, quando Jesus fazia aplicao do registro histrico, ele o extraa do significado normal do texto, contrrio ao sentido alegrico.

    Terceiro Jesus denunciou o modo como os dirigentes religiosos haviam desenvolvido mtodos casusticos que punham parte a prpria Palavra de Deus que eles alegavam estar interpretando, e no lugar dela colocavam suas prprias tradies (Mc 7.6-13; Mt 15.1-9).

    Quarto, os escribas e fariseus, por mais que quisessem acusar a Cristo de erro, nunca o acusaram de usar qualquer Escritura de modo antinatural ou ilegtimo. Mesmo quando Jesus repudiava diretamente os acrscimos e as interpretaes errneas dos fariseus com relao ao Antigo Testamento (Mt 5.21-48), o registro bblico diz-nos que estavam as multides maravilhadas da sua doutrina; porque ele as ensinava como quem tem autoridade, e no como os escribas (Mt 7.28-29).

    Quinto, quando Jesus, vez por outra, usou um texto de um modo que nos parece antinatural, geralmente se tratava de legtima expresso idiomtica hebraica ou aramaica, ou padro de pensamento que no se traduz diretamente para nossa cultura e nosso tempo. Em Mt 27.9-10 encontramos um exemplo disto. Conquanto a passagem no seja citao direta de Jesus, ela esclarece que aquilo que seria considerado inexato por nosso conjunto de normas culturais era praxe hermenutica legtima e aceita naquele tempo. Diz o texto: Ento se cumpriu o que foi dito por intermdio do profeta Jeremias: Tomaram as trinta moedas de prata, preo em que foi estimado aquele a quem alguns dos filhos de Israel avaliaram; e as deram pelo campo do oleiro, assim como me ordenou o Senhor. A citao , em realidade, uma compilao de Jeremias 32.6-9 e Zacarias 11.12-13. Para a nossa maneira de pensar, combinar citaes de dois homens diferentes com referncia somente a um erro de referncia. Contudo, na cultura judaica da poca de Jesus esta era uma praxe hermenutica aceita, entendida pelo autor e igualmente pela audincia. Procedimento comum era agrupar duas ou mais profecias e atribudas ao mais preeminente profeta do grupo (neste caso, Jeremias). Portanto, o que parece erro interpretativo na realidade aplicao hermenutica legtima quando considerada dentro do devido contexto.

    1.5. O uso que os Apstolos fizeram do Antigo Testamento Os apstolos acompanharam seu Senhor e consideraram o Antigo Testamento como a Palavra de Deus inspirada (2Tm 3.16; 2Pe 1.21). Em cinqenta e seis casos, pelo menos, h referncia

  • explcita a Deus como o autor do texto bblico. semelhana de Cristo, eles aceitaram a exatido histrica do Antigo Testamento (At 7.9-50; 13.16-22; Hb 11).

    No obstante, essa afirmao, surge perguntas a respeito do uso que fizeram do Antigo Testamento os escritores do Novo. Tais como: Ao citar o Antigo Testamento, com freqncia o Novo modifica o fraseado primitivo. Como se pode justificar hermeneuticamente tal prtica?

    Trs consideraes so aqui pertinentes. Primeira, diversas verses em hebraico, aramaico e grego do texto bblico circulavam na Palestina no tempo de Cristo, algumas das quais tinham fraseado diferente das outras. Uma citao exata de uma dessas verses podia no ter a mesma redao dos textos dos quais se fazem nossas presentes tradues, no obstante ainda representem interpretao fiel do texto bblico disponvel ao escritor do Novo Testamento.

    Segunda, conforme observa Wenham, no era necessrio que os escritores citassem passagens do Antigo Testamento, palavra por palavra, a menos que alegassem estar citando ipsis verbis, particularmente porque estavam escrevendo numa lngua diferente dos textos originais do Antigo Testamento.

    Terceira, na vida comum, no estar preso citao , geralmente, sinal de que o autor tem domnio da matria; quanto mais seguro est o orador de entender o significado de um autor, tanto menor o medo que ele tem de expor essas idias em palavras que no so exatamente as do autor. Por esses motivos, pois, o fato de que os escritores do Novo Testamento s vezes parafrasearam ou citaram indiretamente o Antigo no indica, de forma alguma, que usaram mtodos interpretativos ilegtimos.

    A segunda pergunta s vezes levantada : O Novo Testamento parece usar partes do Antigo de modo antinatural. Como se justifica hermeneuticamente esta prtica? A discusso de Paulo da palavra descendente em Glatas 3.16 amide usada como exemplo do manuseio de uma passagem do Antigo Testamento, manuseio antinatural e, portanto, ilegtimo. A promessa fora feita a Abrao de que por meio dele todas as naes do mundo seriam abenoadas (Gl 3.8). O versculo 16 diz: Ora, as promessas foram feitas a Abrao e ao seu descendente. No diz: E aos descendentes, como se falando de muitos, porm como de um s: E ao teu descendente, que Cristo. Alguns estudiosos tm suposto, neste caso, que Paulo tomou emprestado de mtodos rabnicos ilegtimos na tentativa de provar seu ponto de vista, j que parece impossvel que uma palavra pudesse ter, simultaneamente, um referente singular e um plural.

  • Contudo, descendente pode ter no singular um sentido coletivo. Paulo est dizendo que as promessas foram feitas a Abrao e sua descendncia, mas o cumprimento de tais promessas, em ltima anlise, s se realiza em Cristo. Na cultura hebraica da poca, a idia de uma figura representativa do grupo (um complexo de pensamento no qual h uma oscilao constante entre o indivduo e o grupo - famlia, tribo ou nao - ao qual ele pertence) era at mais forte do que no sentido coletivo expresso pela idia de descendncia. Havia freqente oscilao entre o rei ou alguma figura representativa dentro da nao, de um lado, e o remanescente eleito ou o Messias, de outro. A natureza da relao no exatamente traduzvel para categorias modernas, mas era a que Paulo e sua audincia entendiam prontamente.

    Em concluso, a vasta maioria das referncias do Novo Testamento ao Antigo interpretam-no literalmente; isto , interpretam-no de acordo com as normas comumente aceitas para interpretar todos os tipos de comunicao - histria como histria, poesia como poesia, e smbolos como smbolos. No se faz tentativa de dividir a mensagem em nveis literais e alegricos. Os poucos exemplos em que os escritores do Novo Testamento parecem interpretar o Antigo de modo antinatural podem, geralmente, ser resolvidos medida que entendemos mais plenamente os mtodos interpretativos dos tempos bblicos. Assim, o prprio Novo Testamento lana a base para o mtodo histrico-gramatical da moderna hermenutica evanglica.

    2 - ESCOLAS EXEGTICAS

    2.1. Exegese Patrstica (100-600 d.C.)

    A despeito da prtica dos apstolos, uma escola de interpretao alegrica dominou a igreja nos sculos que se sucederam. Esta alegorizao derivou-se de um propsito digno - o desejo de entender o Antigo Testamento como documento cristo. Contudo, o mtodo alegrico segundo praticado pelos pais da igreja muitas vezes negligenciou por completo o entendimento de um texto e desenvolveu especulaes que o prprio autor nunca teria reconhecido. Uma vez abandonado o sentido que o autor tinha em mente, conforme expresso por suas prprias palavras e sintaxe, no permaneceu nenhum princpio regulador que governasse a exegese.

  • Quando falamos nos Pais Apostlicos Patrsticos, geralmente nos referimos a alguns autores cristos do fim do primeiro sculo e dos primeiros sculos posteriores, cujos escritos chegaram at ns. Estes escritos em sua grande maioria de natureza incidental (cartas, homlias) so de valor para ns porque, ao lado do Novo Testamento, so fontes mais antigas que possumos como testemunho de f crist.

    Os autores do segundo sculo que, acima de tudo, procuraram defender o cristianismo de acusaes em voga na poca, de procedncia grega e judaica so, em geral, conhecidos como os apologistas. Para estes homens o cristianismo era a nica verdadeira filosofia, substituto perfeito para a filosofia dos gregos e a religio dos judeus, que nada mais podiam fazer do que apresentar respostas insatisfatrias s perguntas cruciais do homem.

    A exegese patrstica fortemente marcada por trs escolas, as quais so: Escola Alexandrina; Escola Antioquiana; e a Escola Ocidental.

    2.2. Escola de Alexandria

    No incio do terceiro sculo d.C., a interpretao bblica foi influenciada especialmente pela escola catequtica de Alexandria. Esta cidade foi um importante local de aprendizado, onde a religio judaica e a filosofia grega se encontraram e exerceram influncia uma sobre a outra. A filosofia Platnica ainda estava em curso nas formas do Neoplatonismo e o Gnosticismo. E no de se admirar que a famosa escola catequtica dessa cidade casse sob o encanto da filosofia popular e se acomodasse sua interpretao da Bblia. O mtodo natural encontrado para harmonizar religio e filosofia foi a interpretao alegrica, visto que:

    a) Os filsofos pagos (Esticos seguidores do filsofo grego Zenon, que morreu em 265 a.C. Zenon ensinava que o mais alto objetivo do ser humano viver de acordo com a sua razo e praticar a virtude. Esta consiste em dominar as paixes, em no sentir-se atrado pelo prazer e em no se deixar vencer pelo sofrimento (At. 17.18-20), j haviam, por um longo tempo, aplicado o mtodo na interpretao de Homero e, assim, mostrado o caminho;

    b) Filo, que tambm era um alexandrino, emprestou ao mtodo o peso da sua autoridade, reduziu-o a um sistema e aplicou-o at mesmo nas mais simples narrativas.

  • Os principais representantes dessa escola foram Clemente de Alexandria e seu discpulo, Orgenes. Ambos consideravam a Bblia como Palavra inspirada de Deus, no sentido mais estrito, e compartilhavam da opinio corrente de que regras especiais tinham de ser aplicadas na interpretao das mensagens divinas. E, embora reconhecessem o sentido literal da Bblia, eram da opinio de que s a interpretao alegrica contribua para o conhecimento real. Clemente de Alexandria foi o primeiro a aplicar o mtodo alegrico interpretao do Novo Testamento assim como do Antigo. Ele props o princpio de que toda Escritura deve ser entendida de forma alegrica. Isso foi um passo frente em relao a outros intrpretes cristos, e constitui a principal caracterstica da posio de Clemente. De acordo com ele, o sentido literal s poderia fornecer uma f elementar, enquanto o sentido alegrico conduziria a um conhecimento real. Seu discpulo, Orgenes, superou-o em cincia e influncia. Foi, sem dvida, o maior telogo de seu tempo. Mas seu mrito principal est na sua obra sobre ceticismo textual ao invs da interpretao bblica. Como intrprete, ele ilustrou o tipo alexandrino de exegese de forma mais sistemtica e extensiva (Gilbert). Em uma de suas obras, forneceu uma teoria detalhada de interpretao. O princpio fundamental dessa obra , que o significado que o Esprito Santo d sempre simples e claro e digno de Deus. Orgenes considerava a Bblia como um meio para a salvao do homem; e porque, de acordo com Plato, o homem consiste de trs partes - corpo, alma e esprito - aceitou um sentido trplice, a saber, o literal, o moral e o mstico ou alegrico. Na sua prxis exegtica, preferia desconsiderar o sentido literal da Escritura, referia-se raramente ao sentido moral e usava constantemente a alegoria - uma vez que s ela produziria o conhecimento real.

    2.3. Escola de Antioquia da Sria

    A escola de Antioquia foi provavelmente fundada por Doroteu e Lcio prximo do fim do terceiro sculo, embora Farrar considere Diodoro, o primeiro presbtero de Antioquia e depois do ano 378, bispo de Tarso, como o real fundador da escola. O ltimo escreveu um tratado sobre os princpios da interpretao. Mas seu maior marco compreendia dois dos seus ilustres discpulos, Teodoro de Mopsustia e Joo Crisstomo. Esses dois homens diferiam grandemente em cada aspecto. Teodoro sustentava vises preferivelmente liberais a respeito da Bblia, enquanto Joo a considerava como sendo, em cada parte, a infalvel Palavra de Deus. A exegese do primeiro era intelectual e dogmtica; a do ltimo, mais espiritual e prtica. Um era famoso como crtico e intrprete; o outro, embora fosse hbil exegeta, ofuscou todos os seus contemporneos como um orador de plpito. Por essa razo, Teodoro foi intitulado o Exegeta, enquanto Joo foi chamado de Crisstomo (boca de ouro) pelo

  • esplendor de sua eloqncia. Eles foram longe rumo ao desenvolvimento da exegese verdadeiramente cientfica, reconhecendo, como o fizeram, a necessidade de se determinar o sentido original da Bblia, a fim de us-la proveitosamente. No somente deram grande valor ao sentido literal da Bblia, mas, conscientemente, rejeitaram o mtodo alegrico de interpretao. No trabalho de exegese, Teodoro superou Crisstomo. Ele tinha um interesse pelo fator humano na Bblia, mas, infelizmente, negava a inspirao divina de alguns dos livros escritursticos. Ao invs do mtodo alegrico, ele defendia a interpretao histrico-gramatical, na qual estava muito frente do seu tempo. Embora reconhecesse o elemento tipolgico na Bblia e tenha encontrado passagens messinicas em alguns dos Salmos, explicou a maioria deles do ponto de vista histrico.

    2.4. Escola Ocidental

    Um tipo intermedirio de exegese surgiu no Ocidente. Ela abrigava alguns elementos da escola alegrica de Alexandria, mas tambm reconhecia alguns dos princpios da escola Siraca. Seu aspecto mais caracterstico, no entanto, se encontra no fato de ter promovido outro elemento, o qual no tinha se feito valer at aquele tempo, a saber, a autoridade da tradio e da Igreja na interpretao da Bblia. O valor normativo foi atribudo ao ensino da Igreja no campo da exegese. Este tipo de exegese foi representado por Hilrio e Ambrsio; mas especialmente por Jernimo e Agostinho. A fama de Jernimo baseada mais na sua traduo da Vulgata do que nas suas interpretaes da Bblia. Ele tinha familiaridade com o hebraico e com o grego, mas sua obra no campo exegtico consiste, primariamente, de um grande nmero de notas lingsticas, histricas e arqueolgicas. Agostinho se diferenciava de Jernimo no fato de seu conhecimento das lnguas originais ser bem deficiente. Isso o mesmo que dizer que ele no foi, primariamente, um exegeta. Ele foi grande em sistematizar as verdades da Bblia, mas no na interpretao da Escritura. Seus princpios Hermenuticos, os quais trabalhou em seu De Doctrina Chrisriana, eram melhores do que sua exegese. Ele advogava que um intrprete deveria ser filolgica, crtica e historicamente equipado para sua tarefa e, acima de tudo, tivesse amor pelo seu autor. Enfatizou a necessidade de se ter considerao pelo sentido literal e de basear o alegrico sobre ele; mas, ao mesmo tempo, entregou-se livremente interpretao alegrica. Alm disso, em casos onde o sentido da Escritura era duvidoso, opinou decididamente pela regula fidei, pela qual tencionava uma declarao de f sucinta da Igreja. Infelizmente, Agostinho tambm adotou um sentido qudruplo da Escritura: histrico, etiolgico, analgico e alegrico. Foi, particularmente, nesse aspecto que ele influenciou a interpretao na Idade Mdia.

  • 2.5. Exegese Medieval (600-1500 d.C.)

    Durante a Idade Mdia, muitos, at mesmo do clero, viviam em profunda ignorncia quanto Bblia. E os que conheciam era devido apenas traduo da Vulgata e aos escritos dos Pais. A Bblia era, geralmente, considerada como um livro cheio de mistrios, os quais s poderiam ser entendidos de uma forma mstica. Nesse perodo, o sentido qudruplo da Escritura (literal, tropolgico, alegrico e analgico) era geralmente aceito, e o princpio de que a interpretao da Bblia tinha de se adaptar tradio e doutrina da Igreja tornou-se estabelecido. Reproduzir os ensinos dos Pais e descobrir os ensinos da Igreja na Bblia eram considerados o pice da sabedoria. A regra de So Benedito foi sabiamente aplicada nos monastrios, e decretado que as Escrituras deveriam ser lidas e, com elas, como explicao final, a exposio dos Pais. Hugo de So Vtor chegou a dizer: Aprenda primeiro as coisas em que voc deve crer e, ento, v Bblia para encontr-las. Nem um nico princpio hermenutico foi desenvolvido nessa poca, e a exegese estava de mos e ps atados pela tradio oral e pela autoridade da Igreja.

    2.6. O Perodo da Reforma

    A Renascena foi de grande importncia para o desenvolvimento dos princpios sadios da Hermenutica. Nos sculos XIV e XV, a ignorncia densa prevaleceu quanto ao contedo da Bblia. Houve doutores de divindade que nunca a haviam lido inteira. E a traduo de Jernimo era a nica forma pela qual a Bblia era conhecida. A Renascena chamou a ateno para a necessidade de se voltar ao original. Reuchlin publicou uma Gramtica Hebraica e um Lxicon Hebraico; e Erasmo publicou a primeira edio crtica do Novo Testamento em Grego.

    Os Reformadores criam na Bblia como sendo a Palavra Inspirada de Deus. Mas, por mais estrita que fosse sua concepo de inspirao, concebiam-na como orgnica ao invs de mecnica. Em certos particulares, revelaram at mesmo uma liberdade notvel ao lidar com as Escrituras. Ao mesmo tempo, consideravam a Bblia como a autoridade suprema e como coorte final de apelo em disputas teolgicas. Em oposio infalibilidade da Igreja, colocaram a infalibilidade da Palavra. Sua posio perfeitamente evidenciada na declarao

  • de que a Igreja no determina o que as Escrituras ensinam, mas as Escrituras determinam o que a Igreja deve ensinar. O carter essencial da sua exegese era o resultado de dois princpios fundamentais: (1) a Escritura a intrprete da Escritura; e (2) todo o entendimento e exposio da Escritura deve estar em conformidade com a analogia da f.

    2.7. Lutero (1483-1546 d.C.)

    Ele prestou nao germnica um grande servio ao traduzir a Bblia para o alemo vernculo. Tambm se engajou no trabalho de exposio, embora somente em uma extenso limitada. Suas regras hermenuticas eram muito melhores do que a sua exegese. Embora no desejasse reconhecer nada alm do sentido literal e falasse desdenhosamente da interpretao alegrica no se afastou inteiramente do mtodo desprezado. Defendeu o direito do julgamento particular; enfatizou a necessidade de se levar em considerao o contexto e as circunstncias histricas; requeria f e discernimento espiritual ao intrprete; e desejava encontrar Cristo em toda parte da Escritura.

    2.8. Melanchthon

    Foi a mo direita de Lutero e seu superior em cincia. Seu grande talento e conhecimento extensivo, tambm de grego e hebraico, foram bem adaptados para transform-lo em um intrprete admirvel. Em sua obra exegtica, avanou os princpios sadios de que (a) as Escrituras devem ser entendidas gramaticalmente antes de serem entendidas teologicamente; e (b) as Escrituras tm apenas um sentido claro e simples.

    2.9. Calvino (1509-1564 d.C.)

    Foi, por consenso, o maior exegeta da Reforma. Suas exposies cobrem quase todos os livros da Bblia, e seu valor ainda reconhecido. Os princpios fundamentais de Lutero e Melanchthon tambm foram os seus, e ele os superou ao ajustar sua prtica com sua teoria. Viu, no mtodo alegrico, um artifcio de Satans para obscurecer o sentido da Escritura.

  • Acreditava firmemente no significado simblico de muito do que se encontra no Antigo Testamento, mas no compartilhava da mesma opinio de Lutero de que Cristo deveria ser encontrado em toda parte da Escritura. Alm disso, reduziu o nmero de Salmos que poderiam ser reconhecidos como messinicos. Insistiu no fato de que os profetas deveriam ser interpretados luz das circunstncias histricas. Como ele via, a excelncia primeira de um expositor consistia de uma brevidade lcida. Alm disso, considerava que a primeira funo de um intrprete deixar o autor dizer o que ele diz, ao invs de atribuir a ele o que pensamos que ele deveria dizer.

    2.10. Catlicos Romanos

    No fizeram nenhum avano exegtico durante o perodo da Reforma. No admitiam o direito do julgamento particular e defendiam, em oposio aos protestantes, a posio de que a Bblia deve ser interpretada em harmonia com a tradio. O Conclio de Trento enfatizou (a) que a autoridade da tradio eclesistica devia ser mantida, (b) que a autoridade suprema tinha de ser atribuda Vulgata, e (c) que era necessrio conformar a interpretao de algum autoridade da Igreja e do consenso unnime dos Pais. Onde esses princpios prevalecem, o desenvolvimento exegtico chega, inevitavelmente, a uma parada repentina.

    2.11. Exegese de Ps-Reforma (1550-1800)

    2.11.1. Confessionalismo

    O Conclio de Trento reuniu-se em vrias ocasies de 1545 a 1563 e elaborou uma lista de decretos expondo os dogmas da igreja catlica romana e criticando o protestantismo. Os protestantes reagiram com o desenvolvimento de credos que definam sua posio. A certa altura, quase todas as cidades importantes tinham seu credo predileto, com a predominncia de amargas controvrsias teolgicas. Os mtodos hermenuticos durante este perodo amide eram deficientes porque a exegese se tornou uma criada da dogmtica, e muitas vezes degenerou-se em mera escolha de texto para comprovao. Ao descrever os telogos daquela poca, Farrar diz que eles liam a Bblia luz do fulgor antinatural do dio teolgico.

  • 2.12. Pietismo

    O pietismo surgiu como reao exegese dogmtica e muitas vezes amarga do perodo confessional. Philipp Jakob Spener (1635- 1705) considerado o lder do reavivamento pietista. Num folheto intitulado Anseios Piedosos ele pedia o fim da controvrsia intil, o retorno ao interesse cristo mtuo e s boas obras; melhor conhecimento da Bblia por parte dos cristos, e melhor preparo espiritual para os ministros.

    A. H. Francke tipificou muitas das caractersticas pedidas pelo folheto de Spener. Alm de ser erudito, lingista e exegeta, ele foi ativo na formao de muitas instituies destinadas ao cuidado dos desamparados e dos enfermos. Alm disso, envolveu-se na organizao do trabalho missionrio para a ndia. O pietismo fez significativas contribuies para o estudo da Escritura, mas no ficou imune s crticas. Nos seus mais sublimes momentos os pietistas uniram um profundo desejo de entender a Palavra de Deus e apropriar-se dela para suas vidas com uma excelente apreciao da interpretao histrico-gramatical. Contudo, muitos pietistas mais recentes; descartaram a base de interpretao histrico-gramatical, e passaram a depender de uma luz interior ou de uma uno do Santo. Essas manifestaes, baseadas em impresses subjetivas e reflexes piedosas, muitas vezes resultaram em interpretaes contraditrias e que pouca relao tinham com o significado do autor.

    2.13. Racionalismo

    O racionalismo, posio filosfica que aceita a razo como a nica autoridade que determina as opes ou curso de ao de algum, surgiu como importante modo de pensar durante este perodo e cedo devia causar profundo efeito sobre a teologia e a hermenutica.

    Durante vrios sculos antes, a igreja havia acentuado a racionalidade da f. Considerava a revelao superior razo como meio de entender a verdade, mas a verdade da revelao foi tida como inerentemente razovel.

  • Lutero estabeleceu distino entre o uso magisterial e o ministerial da razo. Por uso ministerial da razo ele se referia ao emprego da razo humana para ajudar-nos a compreender e a obedecer mais plenamente Palavra de Deus. Por uso magisterial da razo ele se referia ao emprego da razo humana como juiz sobre a Palavra de Deus. Lutero afirmava claramente a primeira e rejeitava a segunda. Durante o perodo que se seguiu Reforma, o uso magisterial da razo comeou a emergir mais plenamente como nunca antes. Surgiu o empirismo, crena de que o nico conhecimento vlido que podemos possuir o obtido atravs dos cinco sentidos, e aliou-se ao racionalismo. A associao do racionalismo com o empirismo significava que: (1) muitos pensadores de nomeada estavam alegando que a razo, e no a revelao devia orientar nosso pensamento e aes; e (2) que a razo seria usada para julgar que partes da revelao eram consideradas aceitveis (que chegaram a incluir somente aquelas partes sujeitas s leis naturais e verificao emprica).

    2.14. Exegese Moderna (1800 at ao Presente)

    2.14.1. Liberalismo

    O racionalismo filosfico lanou a base do liberalismo teolgico. Ao passo que nos sculos anteriores a revelao havia determinado o que a razo devia pensar no final do sculo XIX a razo determinava que partes da revelao (se houvesse alguma) deviam ser aceitas como verdadeiras. Onde nos sculos anteriores a autoria divina da Escritura fora acentuada, agora o foco era sua autoria humana. Alguns autores diziam que vrias partes da Escritura possuam diversos graus de inspirao, e podia ser que os graus inferiores (como detalhes histricos) contivessem erros. Outros escritores, como Schleirmacher, foram alm, negando totalmente o carter sobrenatural da inspirao. Muitos j no mencionavam a inspirao como o processo pelo qual Deus guiou os autores humanos a um produto escriturstico que fosse a sua verdade. Pelo contrrio, a inspirao referia-se capacidade da Bblia (produzida humanamente) de inspirar experincia religiosa.

    Tambm aplicou-se Bblia um naturalismo consumado. Os racionalistas alegavam que tudo o que no estivesse conforme mentalidade instruda devia ser rejeitado. Isto inclua doutrinas como a depravao humana, o inferno, o nascimento virginal, e, com freqncia, at

  • a expiao vicria de Cristo. Os milagres e outros exemplos de interveno divina eram regularmente explicados de forma satisfatria como exemplos de pensamento pr-crtico. Sofrendo a influncia do pensamento de Darwin e de Hegel, a Bblia chegou a ser vista como um registro do desenvolvimento evolucionista da conscincia religiosa de Israel (e mais tarde da igreja), e no como uma revelao do prprio Deus ao homem. Cada um desses pressupostos influenciou profundamente a credibilidade que os intrpretes davam ao texto bblico, e, desse modo, teve importantes implicaes para os mtodos interpretativos. Era freqente a mudana do prprio foco interpretativo: A pergunta dos eruditos j no era Que que Deus diz no texto?, e, sim Que que o texto me diz a respeito do desenvolvimento da conscincia religiosa deste primitivo culto hebraico?

    2.15. Neo-ortodoxia

    A neo-ortodoxia um fenmeno do sculo XX. Ocupa, em alguns aspectos, uma posio intermediria entre os pontos de vista liberal e ortodoxo. Rompe com a opinio liberal de que a Escritura to-s produto do aprofundamento da conscincia religiosa do homem, mas detm-se antes de chegar perspectiva ortodoxa da revelao.

    Os que se encontram dentro dos crculos neo-ortodoxos geralmente crem que a Escritura o testemunho do homem revelao que Deus faz de si prprio. Sustentam que Deus no se revela em palavras, mas apenas por sua presena. Quando algum l as palavras da Escritura e reage com f presena divina, ocorre a revelao. A revelao no considerada como algo ocorrido num ponto histrico, o qual agora nos transmitido nos textos bblicos, mas uma experincia presente que deve fazer-se acompanhar de uma reao existencial pessoal.

    As posies neo-ortodoxas sobre diversos problemas diferem das ortodoxas tradicionais. A infalibilidade ou inerrncia no tem lugar no vocabulrio neo-ortodoxo. A Escritura vista como um compndio de sistemas teolgicos s vezes conflitantes acompanhados por diversos erros fatuais. As histrias bblicas da interao entre o sobrenatural e o natural so vistas como mitos - no no mesmo sentido dos mitos pagos, mas no sentido de que no ensinam histria literal. Os mitos bblicos (como a criao, a queda, a ressurreio) visam a apresentar verdades teolgicas na forma de incidentes histricos. Na interpretao neo-ortodoxa, a queda, por exemplo, informa-nos que o homem, inevitavelmente, corrompe sua natureza moral. A encarnao e a cruz mostram-nos que o homem no pode realizar sua prpria salvao, mas que ela deve vir do alm como ato da graa de Deus.

  • A principal tarefa do intrprete , pois, despir o mito de seus envoltrios histricos a fim de descobrir a verdade existencial que ele contm.

    3 - EXEGESE GRAMATICAL

    No estudo do texto, o intrprete pode proceder da seguinte maneira. Comear com a sentena, com a expresso do pensamento do escritor como uma unidade e, ento, descer aos particulares, interpretao das palavras isoladas e dos conceitos. Trs coisas pedem considerao aqui.

    3.1. A Etimologia das Palavras

    O significado etimolgico das palavras merece ateno em primeiro lugar, porque precede todos os outros significados. Como regra, no aconselhvel que o intrprete deva entregar-se muito s investigaes etimolgicas. Esse trabalho extremamente difcil e pode, ordinariamente, ser deixado para especialistas. Ao mesmo tempo, aconselhvel que o expositor da Escritura note a etimologia estabelecida de uma palavra, uma vez que isso pode ajudar a determinar seu significado real e pode ilumin-lo de uma maneira surpreendente. Tomemos as palavras hebraicas kopher, kippurim e kapporeth, traduzidas respectivamente por resgate, redenes ou expiaes e propiciatrio. Todas elas so derivadas da raiz kaphar, que significa cobrir e contm a idia de uma redeno ou expiao realizada por uma certa cobertura. O pecado ou o pecador coberto pelo sangue expiatrio de Cristo, que foi tipificado pelo sangue dos sacrifcios do Antigo Testamento. Ou, pegue a palavra ekklesia do Novo Testamento, derivada de ek e kalein. Ela uma designao da Igreja, tanto na Septuaginta quanto no Novo Testamento, e aponta para o fato de que essa consiste de um povo chamado, isto , separado do mundo em devoo especial a Deus.

    3.2. Uso corrente das palavras

  • Para interpretar corretamente a Bblia, o intrprete deve ter conhecimento dos significados que as palavras adquiriram no curso do tempo e do sentido em que os autores bblicos as usaram. Pode-se pensar que isso deve ser facilmente feito por meio da consulta a alguns bons lxicos, que geralmente do os significados originais e derivados das palavras e geralmente designam em que sentido elas devem ser usadas em passagens particulares. Na maioria dos casos, isso se aplica perfeitamente. Ao mesmo tempo, necessrio manter em mente que os lxicos no so absolutamente infalveis e menos ainda quando descem aos particulares. Eles simplesmente incorporam os resultados das obras exegticas dos vrios intrpretes que confiaram o julgamento discriminatrio do lexicgrafo e, freqentemente, revelam uma diferena de opinio.

    Se o intrprete tem alguma razo para duvidar do significado de uma palavra, como apresentado no Lxico, ele ter de investigar por si mesmo.

    a) A maioria das palavras tem muitos significados, alguns literais e outros figurados;

    b) O estudo comparativo de palavras anlogas em outras lnguas requer uma discriminao cuidadosa e nem sempre ajuda a fixar o significado exato de uma palavra, uma vez que palavras correspondentes em Lnguas diferentes nem sempre tm, exatamente, o mesmo significado original e derivativo;

    c) No estudo das palavras do Novo Testamento, imperativo que a avaliao do koin escrito e tambm do falado, seja considerada;

    d) No sempre seguro concluir o significado de uma palavra do Novo Testamento a partir do seu significado no grego clssico, uma vez que o Cristianismo acrescentou um novo contedo a muitas palavras.

    Mas, por mais difcil que essa tarefa seja isso no pode deter o intrprete. Se necessrio, ele deve fazer, por si mesmo, um estudo completo de uma palavra. E o nico modo pelo qual ele pode fazer isso pelo mtodo indutivo. Ser sua incumbncia:

    a) Apurar, com a ajuda das concordncias grega e hebraica, onde a palavra encontrada; b) Determinar o significado da palavra em cada uma das conexes em que ocorre;

    c) Fazer isso por meio das ajudas internas em vez das externas. Na busca de tal estudo, os vrios significados de uma palavra iro, gradualmente, se tornar aparentes. No entanto, o intrprete deve tomar cuidado com as concluses precipitadas, e nunca basear sua induo somente numa parte dos dados disponveis.

  • 3.3. Uso de palavras sinnimas

    As palavras sinnimas so aquelas que tm o mesmo significado, ou concordam em um ou mais de seus significados, embora possam diferir em outros. Elas, freqentemente, concordam em seus significados fundamentais, mas expressam diferentes nuanas. O uso de sinnimos contribui para a beleza da linguagem tanto quanto capacita um autor a variar suas expresses.

    As lnguas em que a Bblia foi escrita so tambm ricas em expresses sinnimas e antnimas. de se lamentar que essas no tenham sido retidas, a uma grande extenso, nas tradues. Em alguns casos, isso foi completamente impossvel, mas, em outros, poderia ter sido feito. Mas, embora algumas das mais refinadas distines tenham sido perdidas na traduo, o intrprete nunca pode perd-las de vista. Ele deve atentar para todas as idias relacionadas da Bblia e perceber rapidamente o que elas tm em comum e em que diferem. Essa a condio sine qua non de um conhecimento distintivo da revelao bblica.

    Vejamos alguns exemplos: Em Is 53.2, trs palavras so usadas para expressar a ausncia da glria externa na vida do Servo do Senhor. Lemos: No tinha aparncia nem formosura; olhamo-lo, mas nenhuma beleza havia que nos agradasse (Am. Rev.) A primeira palavra (tho ar) significa forma, com a idia adicional de beleza e, conseqentemente, refere-se forma da beleza corporal. Compare com 1Sm 16.18. A segunda (hadar) designa um ornamento, e, quando aplicada a Deus, descreve majestade. Ela refere-se ao modo como o Senhor apareceu entre os homens e no sua forma fsica. Ele se manifestou em um estado de humilhao. E a terceira (mar eh, de ra ah, ver) refere-se, algumas vezes, a uma aparncia externa que a expresso da, e conseqentemente em harmonia com, a natureza essencial ntima do ser. O significado do profeta parece ser que a aparncia externa do Senhor no era exatamente a que os judeus esperavam de um Messias. O Novo Testamento fornece um belo exemplo em Joo 21.15-17. Quando o Senhor ressurreto indagou pelo amor do Pedro cado, usou duas palavras, a saber, agapao e phileo. A distino entre as duas feita por Trench nas seguintes palavras: A primeira expressa um afeto mais racional de escolha e seleo, a partir do fato de se ver no objeto desse afeto algo que digno de considerao; ou ainda, a partir de um senso de que isso devido pessoa ento considerada, como um benfeitor ou semelhante; enquanto a segunda, sem ser necessariamente um afeto irracional, d menos explicao de si mesmo a si mesmo; mais instintivo, mais de sentimentos ou afeies naturais, implica mais paixo. A primeira, baseada em admirao e respeito, um amor controlado pela vontade e tem um carter duradouro; enquanto que a ltima, baseada na afeio, um amor mais impulsivo e propenso a perder seu fervor. Ento,

  • quando o Senhor colocou primeiramente a questo a Pedro, tu me amas?, ele usou a primeira palavra, agapao. Mas Pedro no ousou responder afirmativamente questo, se ele amava ao Senhor com um amor permanente que alcana seus maiores triunfos nos momentos de tentao. Assim, em resposta, ele usou a segunda palavra, phileo. O Senhor repetiu a questo, e Pedro novamente respondeu da mesma forma. Ento o Salvador desceu at o nvel de Pedro e, em sua terceira questo, usou a segunda palavra, como se ele duvidasse at mesmo do philein de Pedro. No de se admirar que Pedro se entristecesse e fizesse um apelo oniscincia do Senhor.

    As palavras sinnimas tm sempre um significado geral como tambm um distintivo especial; e o expositor no deve prosseguir no princpio de que sempre que essas palavras so usadas, o significado distintivo deve ser enfatizado porque, assim, ele estar sujeito a se encontrar enredado em todos os tipos de interpretaes fantasiosas. O contexto em que a palavra usada, os atributos atribudos a ela e os adjuntos somados a ela devem determinar qual o sentido em que deve ser entendida, se o geral ou o especial.

    3.4. O significado das palavras em seu contexto

    No estudo das palavras isoladas, a questo mais importante no quanto ao significado etimolgico, nem mesmo quanto aos vrios significados que adquiriram gradualmente. A questo essencial quanto ao seu sentido particular no contexto em que ocorre. O intrprete deve determinar se a palavra usada em seu significado geral ou em um de seus significados especiais, se usada no sentido literal ou figurado. No estudo das palavras em seu contexto, o intrprete deve proceder segundo os seguintes princpios:

    3.4.1. A linguagem da Escritura deve ser interpretada de acordo com seu significado gramatical; e o sentido de qualquer expresso, proposio ou declarao deve ser determinado pelas palavras usadas.

    Em ltima anlise, nossa teologia encontra seu fundamento slido apenas no sentido gramatical da Escritura. O conhecimento teolgico ser falho na proporo do seu desvio do significado claro da Bblia. Embora esse princpio seja perfeitamente bvio, repetidamente violado por aqueles que colocam suas idias preconcebidas para sustentar a interpretao da

  • Bblia. Pela exegese forada, eles tentam ajustar o sentido da Escritura s suas opinies ou teorias preferidas.

    3.4.2. Uma palavra pode ter apenas um significado fixo no contexto em que ocorre.

    O desejo de parecer original e profundo e de surpreender as pessoas comuns por meio de exposies fantsticas, as quais elas nunca haviam ouvido, parece, algumas vezes, tentar os intrpretes a se desviarem desse princpio simples de interpretao. Seu perigo e tolice podem ser ilustrados em alguns poucos exemplos.

    3.4.2.1. A palavra grega sarks pode designar

    a) A parte slida de um corpo, exceto os ossos (1Co 15.39; Lc 24.39);

    b) Toda a substncia do corpo, quando sinnimo de soma (At 2.26; Ef 2.15; 5.29);

    c) A natureza animal (sensual) do homem (Jo 1.13; 1Co 10.18);

    d) a natureza humana enquanto dominada pelo pecado, lugar e veculo dos desejos pecaminosos (Rm 7.25; 8.4- 9; G1 5.16, 17). Se um intrprete atribusse todos esses significados palavra como encontrada em Jo 6.53, ele iria, assim, atribuir pecado, em um sentido tico, a Cristo, a quem a Bblia representa como aquele sem pecado.

    3.4.2.2. A palavra hebraica nakar significa

    a) no saber, ser ignorante;

    b) contemplar, olhar para algo como sendo estranho ou como pouco conhecido;

    c) saber, ser familiarizado com. O primeiro e terceiro significados so opostos. Daqui, perfeitamente bvio que se um expositor tivesse de combinar esses vrios significados na interpretao de uma nica passagem como Gn 42.8, o contraste que este versculo contm se perderia e o resultado seria puro absurdo.

  • 3.4.3. Casos em que vrios significados de numa palavra so unidos de tal forma que resultam numa unidade maior que no se choca com o princpio precedente.

    a) Algumas veles uma palavra usada em seu sentido mais geral a fim de incluir seus significados especiais, embora esses no sejam enfatizados.

    Quando Jesus disse aos discpulos em Joo 20.21: Paz seja convosco, ele queria dizer paz no sentido mais amplo - paz com Deus, paz de conscincia, paz entre eles mesmos, etc. E quando Isaas diz em 53.4; Certamente, ele tomou sobre si as nossas dores (literalmente, enfermidades), ele certamente se refere s doenas espirituais, das quais o Servo do Senhor libertaria seu povo. Mas Mateus 8.17 nos diz que essa palavra foi cumprida no ministrio de cura do Salvador. A palavra de Isaas , conseqentemente, tida como no somente significando que o Servo do Senhor libertou seu povo das doenas espirituais, isto , do pecado, mas tambm das enfermidades fsicas resultantes.

    b) H, tambm, casos em que um significado especial de uma palavra inclui outra, o que no se choca com o propsito e contexto da passagem em que se encontra.

    Sob tais circunstncias, perfeitamente legtimo unir os dois. Quando Joo Batista diz Eis o cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, ele usa a palavra (airo) que significa (1) assumir e (2) levar embora. Nessa passagem, o ltimo significado predomina claramente, mas inclui naturalmente o outro. Jesus no poderia conquistar o pecado sem assumi-lo sobre si mesmo.

    c) s vezes, um autor usa uma palavra num sentido sugestivo para indicar muito mais do que ela realmente expressa.

    Isso especialmente feito na sindoque, quando uma parte representa o todo. Quando o Salvador ensina seus discpulos a orarem: D-nos o po de cada dia, a palavra po representa as necessidades da vida em geral. E, quando a Lei diz: No matars, ela probe,

  • de acordo com a interpretao de Jesus, no meramente o assassinato, mas a raiva, o dio e a implacabilidade tambm.

    O intrprete, no entanto, deve ser cuidadoso em no combinar arbitrariamente os vrios significados de uma palavra. Ele pode encontrar casos em que dois ou mais significados de uma palavra aparentemente se adaptam bem de forma semelhante, e ser tentado a tomar a estrada fcil de combin-las. Mas isso no uma boa exegese. Muenscher defende que, em tais casos, o significado que exibe o sentido mais completo e frtil deve ser escolhido. No entanto, melhor suspender o julgamento at que estudos adicionais garantam a escolha definitiva.

    3.4.4. Se uma palavra usada na mesma conexo mais do que uma vez, a suposio natural de que ela tem o mesmo significado em toda parte.

    Um autor no usaria ordinariamente a mesma palavra em dois ou trs diferentes sentidos em uma nica passagem. Porm, h algumas excees regra. O carter da expresso do contexto faz com que seja suficientemente claro o fato de que a palavra no tem o mesmo sentido em ambos os casos. Os seguintes exemplos sero suficientes para ilustrar isso: Mt 8.22, deixa aos mortos o sepultar os seus prprios mortos; Rm 9.6, porque nem todos os de Israel so, de fato, israelitas; 2 Co 5.21, Aquele que no conheceu pecado, ele o fez pecado por ns; para que, nele, fossemos feitos justia de Deus.

    3.4.5. Auxlio interno para a explicao de palavras

    natural que surja a questo quanto ao modo pelo qual um intrprete pode descobrir melhor o significado de uma palavra em uma certa conexo. Consultar um Lxico padro ou alguns bons Comentrios, nem sempre pode ser suficiente, quando assim for, ele ter de recorrer ao uso de auxlio interno. Os seguintes so os mais importantes:

    3.4.5.1. As definies ou explicaes que os prprios autores do s suas palavras constituem um dos mais eficientes auxlios.

  • Ningum melhor do que o autor sabe que sentido particular ele vinculou a uma palavra. Os seguintes exemplos podem servir para ilustrar isso: Gn 24.2, Disse Abrao ao seu mais antigo servo da casa, ao que adicionado como definio, que governava tudo o que possua. Hb 5.14, Mas o alimento slido para os adultos (ou perfeitos), o que explicado pelas seguintes palavras, para aqueles que, pela prtica, tm as suas faculdades exercitadas para discernir no somente o bem, mas tambm o mal.

    3.4.5.2. As passagens paralelas tambm constituem um auxlio importante

    Essas so divididas em duas classes, a saber, verbal e real. Quando a mesma palavra ocorre em contextos similares, ou em referncia ao mesmo assunto geral, o paralelo chamado verbal... Paralelos reais so aquelas passagens similares nas quais a semelhana ou identidade consiste no de palavras ou frases, mas de fatos, assuntos, sentimentos ou doutrinas. Por ora, estamos interessados apenas nos paralelos verbais, que podem servir para explicar uma palavra obscura ou desconhecida.

    Ao ilustrar o uso de passagens paralelas, faremos a distino entre as que so assim chamadas de forma prpria e imprpria.

    a) Paralelos de palavras propriamente assim chamadas.

    Em C1 1.16, lemos: pois, nele (Cristo), foram criadas todas as coisas. vista do fato de que a obra criadora aqui atribuda a Cristo, alguns arriscam a opinio de que a expresso todas as coisas (panta) refere-se a toda a nova criao, embora o contexto favorea a idia de universo. A questo agora levantada se h qualquer passagem na qual a obra da criao atribuda a Cristo, e a possibilidade de uma referncia nova criao excluda. Tal passagem encontrada em 1Co 8.6, onde a frase ta panta usada para todas as coisas criadas, e a obra criadora atribuda igualmente ao Pai e ao Filho. Em Is 9.6, o profeta diz: Porque um menino nos nasceu... e o seu nome ser... Deus Forte (El gibbor). Em Is 10.21, a mesma frase usada em um contexto no qual s pode referir-se Deidade. Joo 9.39 contm a declarao: Eu vim a este mundo para juzo, a fim de que os que no vem vejam, e os que vem se tornem cegos. A palavra krima (juzo) denota geral e completamente um juzo de condenao. Mas a frase final, nesse caso, parecia demandar um significado mais amplo do juzo em geral, e a questo surge se a palavra sempre usada nesse sentido. Rm 11.33 responde a essa questo, pois 1, a mesma palavra, indubitavelmente, tem um significado geral.

  • b) Paralelos de palavras ou frases impropriamente assim chamadas.

    Esses podem ser chamados de paralelos imprprios uma vez que no contm as mesmas palavras, mas, sim, expresses ou palavras sinnimas. Os casos em que uma expresso mais completa em uma passagem do que em outra tambm podem ser assim classificados. Em 2Sm 8.18, lemos: ... Os filhos de Davi, porm, eram seus cohanim (geralmente traduzido por sacerdotes). Gesenius afirma que a palavra sempre significa sacerdotes, enquanto Fuerst afirma que ela pode significar prncipes. A ltima opinio originada da passagem paralela em 1 Cr 18.17, onde, em uma e numerao similar de 2Sm 8, lemos: - Os filhos de Davi, porm, eram os primeiros ao lado do rei [prncipes] (rishonim). Mt 8.24 diz: E eis que sobreveio no mar uma grande seismos. Esta palavra significa realmente terremoto, mas a relao aqui parece apontar para um significado diferente. Isso confirmado pelas passagens paralelas, Mc 4.37 e Lc 8.23, onde a palavra lailaps usada, significando vendaval ou um vento tempestuoso.

    3.5. O uso figurado das palavras

    3.5.1. Principais tropos usados na Escritura

    Na relao presente, no estamos preocupados com as figuras de sintaxe ou de pensamento, mas com as figuras de linguagem que so comumente chamadas de tropos, nas quais uma palavra ou expresso usada em um sentido diferente daquele que lhe prprio. Os principais tropos so a metfora, a metonmia e a sindoque.

    a) A metfora pode ser chamada de comparao no expressa. Ela uma figura de linguagem na qual um objeto assemelhado a outro afirmando ser o outro, ou falando dele como se fosse o outro. As metforas ocorrem freqentemente na Bblia. No Sl 18.2, seis delas so encontradas em um nico versculo. Jesus usou essa figura de linguagem quando disse aos fariseus: Ide dizer a essa raposa, Lc 13.32. H dois tipos de metforas na Bblia que se referem ao Ser Divino e merecem ateno especial: (1) antropopatismo e (2) antropomorfismo. No primeiro, as emoes humanas, paixes e desejos so atribudos a Deus. Cf. Gn 6.6; Dt 13.17; Ef 4.30. No ltimo, os membros do corpo e as atividades fsicas so atribudas a ele. Cf. x 15.16; SL 34.16; Lm 3.56; Zc 14.4; Tg 5.4. Indubitavelmente, h, tambm, uma grande

  • quantidade de metforas na descrio do cu como uma cidade com ruas de ouro e portes de prolas, no qual a rvore da vida produz seus frutos de ms a ms; e na representao do tormento eterno como um verme que no morre, um fogo que no se extingue, e uma labareda de tormento subindo para sempre;

    b) As metonmias tambm so numerosas na Bblia. Essa figura, assim como a sindoque, baseada em relaes em vez de em semelhanas. No caso da metonmia, essa relao mais mental do que fsica. Ela indica relaes como causa e efeito, progenitor e posteridade, sujeito e atributo, sinal e objeto assinalado. Paulo diz em 1Ts 5.19, No apagueis o Esprito, quando se refere s manifestaes especiais do Esprito. E quando na parbola do rico e Lzaro, Abrao diz: Eles tm Moiss e os profetas, Lc 16.29, ele naturalmente queria dizer seus escritos. Em Is 22.22, a chave da casa de Davi transmite a idia de controle sobre a casa real. A circunciso chamada de aliana em At 7.8, porque era um sinal da aliana;

    c) A sindoque assemelha-se, de alguma forma, metonmia, mas a relao na qual encontrada mais fsica do que mental. Nessa figura, h uma certa identidade entre o que expresso e o que se quis dizer. Uma parte expressa pelo todo ou o todo por uma parte; um gnero pela espcie, ou uma espcie por um gnero; um indivduo pela classe ou uma classe pelo indivduo; um plural pelo singular ou um singular pelo plural. Se diz que Jeft foi sepultado nas cidades de Gileade (Jz 12.7 - na edio revista e corrigida), quando, naturalmente, se queria dizer uma cidade apenas. Quando o profeta disse em Dn 12.2: Muitos dos que dormem no p da terra ressuscitaro, ele certamente no pretendia ensinar uma ressurreio parcial. E quando Lucas nos informa em At 27.37 que havia no navio duzentas e setenta e seis almas (na edio revista e corrigida), ele no quis sugerir que havia espritos desencarnados a bordo.

    3.5.2. Auxlio interno para se determinar qual o sentido pretendido, o figurado ou literal

    da maior importncia, para o intrprete, saber se uma palavra foi usada no sentido literal ou figurado. Os judeus, e at mesmo os discpulos, muitas vezes se enganaram seriamente por interpretar literalmente o que Jesus queria dizer de forma figurada. Cf Jo 4.11, 32; 6.52; Mt 16.6-12. No compreender o que Senhor falou figurativamente quando disse Isto () o meu corpo tornou-se at mesmo em uma fonte de diviso nas Igrejas da Reforma. Portanto, de extrema importncia que o intrprete tenha segurana nesse assunto. As seguintes consideraes podem ajud-lo materialmente a resolver essa questo.

  • a) H certos escritos nos quais o uso da linguagem figurada , a priori, impossvel. Entre esses esto as leis e todos os tipos de instrumentos legais, escritos histricos e obras estritamente filosficas e cientficas e as Confisses. Esses almejam, primeiramente, a clareza e a preciso, e a beleza fica em segundo plano;

    b) H uma velha regra Hermenutica, freqentemente repetida, de que as palavras devem ser entendidas no seu sentido literal a no ser que a interpretao literal envolva uma contradio evidente ou um absurdo. Deve-se observar, no entanto, que na prtica isso se torna meramente um apelo ao julgamento racional de cada homem. O que parece ser absurdo ou improvvel para algum pode ser considerado como perfeitamente simples e lgico para outro;

    c) O meio mais importante de se determinar se uma palavra foi usada literal ou figurativamente em uma certa relao encontrado no auxlio interno ao qual j nos referimos. O intrprete deve considerar estritamente o contexto imediato, os adjuntos de uma palavra, o carter do sujeito e dos predicados atribudos a ele, o paralelismo, se presente, e as passagens paralelas.

    3.6. A interpretao do pensamento

    A explicao do pensamento algumas vezes chamada de interpretao lgica. Ela procede da suposio de que a linguagem da Bblia , como qualquer outra linguagem, um produto do esprito humano, desenvolvida sob direo providencial. Os temas que pedem considerao aqui so:

    3.6.1. Expresses idiomticas especiais e figuras de pensamento

    Cada lngua tem certas expresses caractersticas, chamadas idiomatismos. A lngua hebraica no exceo regra e algumas das suas expresses idiomticas foram transportadas para o Novo Testamento. H um uso freqente de hendades. A hendiade exprime uma idia por meio de dois substantivos. No hebraico essa construo comum, mas utilizando verbos. Assim, em hebraico, 1Sm 2.3 l-se: No multipliqueis, falareis. Isso evidentemente significa, no multipliqueis palavras. Na sua defesa diante do Sindrio, Paulo diz: ... no tocante esperana e ressurreio dos mortos sou julgado (At 23.6). O sentido : por causa da esperana da ressurreio.... O argumento de Moiss em objeo sua comisso foi

  • de que ele no era um homem de palavras (que como est em hebraico), isto , um homem eloqente (x 4.10). Em 1Ts 1.3, Paulo fala da firmeza da vossa esperana, quando queria dizer sua esperana firme, esperana caracterizada pela pacincia.

    H tambm vrios tipos de figuras de pensamento que merecem ateno especial.

    a) Algumas figuras promovem uma representao viva da verdade

    Comparao. Quo viva a figura da completa destruio no Sl 2.9: ... e as despedaars como um vaso de oleiro; e a da completa solido em Is 1.8: A filha de Sio deixada como choa na vinha. Cf tambm Sl 102.6; Ct 2.9.

    Alegoria, que meramente uma metfora estendida e deve ser interpretada pelos mesmos princpios gerais. Encontramos exemplos no Sl 80.8-15 e em Jo 10.1-18. Terry faz a seguinte distino entre a alegoria e a parbola: A alegoria um uso figurado e aplicao de algum fato presumvel ou histria, ao passo que a parbola , ela mesma, o fato presumvel ou a histria. A parbola usa palavras em seu sentido literal e sua narrativa nunca ultrapassa os limites do que poderia ter sido fato real. A alegoria continuamente usa as palavras em um sentido metafrico e sua narrativa, embora presumvel em si mesma, manifestamente fictcia.

    b) Outras figuras promovem brevidade de expresso. Elas so o resultado de uma rapidez e energia do pensamento do autor, que denota um desejo de omitir todas as palavras suprfluas.

    Elipse, que consiste na omisso de uma palavra ou palavras necessrias para se completar a construo de uma sentena, mas no requeridas para o entendimento desta. Moiss ora, Volta-te, Senhor! At quando? (tu nos desamparars?) As sentenas curtas, abruptas, revelam a emoo do poeta. Para outros exemplos, cf. 1Co 6.13; 2Co 5.13; x 32.32; Gn 3.22.

    Braquilogia, tambm uma forma de discurso concisa ou abreviada, consiste especialmente na no repetio ou omisso de uma palavra, quando sua repetio ou uso seria necessrio para completar a construo gramatical. Nessa figura, a omisso no to evidente quanto na elipse. Assim Paulo diz em Rm 11.18: No te glories contra os ramos; porm se te gloriares sabe que no s tu que sustentas a raiz, mas a raiz (sustenta) a ti. Note tambm 1Jo 5.9: Se admitimos o testemunho dos homens, o testemunho de Deus maior.

    Zeugma, que consiste de dois substantivos construdos com um verbo, embora apenas um - geralmente o primeiro se ajuste ao verbo. Assim, lemos literalmente em 1Co 3.2: Leite vos

  • dei a beber, no vos dei alimento slido. E em Lc 1.64 lemos a respeito de Zacarias: E sua boca foi imediatamente aberta, e sua lngua (que como est no grego. A ARA acrescentou desimpedida). Ao fornecer as palavras que faltam, o intrprete deve tomar muito cuidado a fim de no mudar o sentido do que foi escrito.

    c) Outras figuras almejam suavizar uma expresso. Elas so explicadas pela delicadeza de sentimento ou modstia do autor.

    O eufemismo consiste em substituir uma palavra que expressa mais acuradamente o que se queria dizer por outra menos ofensiva. Com estas palavras adormeceu (At 7.60).

    A litote afirma algo pela negao do oposto. Assim, o salmista canta: corao compungido e contrito no o desprezars, Deus (Sl 51.17). E Isaas diz: No esmagar a cana quebrada, nem apagar a torcida que fumega (Is 42.3).

    A meiose intimamente relacionada litote. Algumas autoridades associam as duas; outros consideram a litote como uma espcie de meiose. Ela uma figura de linguagem na qual menos dito do que se queria dizer. Cf 1Ts 2.15; 2Ts 3.2; Hb 13.17.

    d) Finalmente, h figuras que do mais nfase a uma expresso, ou a fortalecem. Elas podem ser o resultado de uma indignao justa ou de uma imaginao viva.

    1) A ironia contm censura ou escrnio disfarado de louvor ou elogio. Cf J 12.2; 1Rs 22.15; 1Co 4.6. H casos na Bblia em que a ironia se transforma em sarcasmo. Cf. 1Sm 26.15; 1Rs 18.27; 1Co 4.8;

    2) A epizuxis fortalece uma expresso pela simples repetio de uma palavra (Gn 22.11; 2Sm 16.7; Is 40.1);

    3) A hiprbole ocorre freqentemente e consiste de um exagero retrico (Gn 22.17; Dt 1.28; 2Cr 28.4).

    3.6.2. Ordem das palavras em uma sentena

    Na sentena verbal hebraica, a ordem regular essa: predicado, sujeito, objeto. Se em uma sentena o objeto se encontra em primeiro lugar, ou o sujeito for colocado no comeo ou no

  • fim, altamente provvel que eles sejam enfticos. O primeiro lugar o mais importante da sentena, mas a palavra enftica pode tambm ocupar o ltimo lugar. Harper d as seguintes variaes da ordem usual:

    a) objeto, predicado, sujeito, o qual enfatiza o objeto (1Rs 14.11); b) objeto, sujeito, predicado, o qual, semelhantemente, enfatiza o objeto (Gn 37.16); c) sujeito, objeto, predicado, o qual enfatiza o sujeito (Gn 17.9); d) predicado, objeto, sujeito, o qual tambm enfatiza o sujeito (1Sm 15.33).

    3.6.3. Curso do pensamento em uma seo inteira

    No suficiente que o intrprete fixe sua ateno nas oraes e sentenas separadas; ele deve se familiarizar com o pensamento geral do escritor ou orador. Um nico exemplo pode servir para ilustrar a dificuldade que temos em mente. Em Joo 3, Nicodemos aborda Jesus com as palavras: Rabi, sabemos que s Mestre vindo da parte de Deus; porque ningum pode fazer estes sinais que tu fazes, se Deus no estiver com ele. De que modo a resposta de Jesus no v.3 relacionada a essas palavras? No versculo 4, Nicodemos declara que no entende Jesus. O Senhor responde sua questo nos versculos 5-8? O fariseu repete sua questo no versculo 9 e Jesus expressa, no versculo 10, surpresa quanto sua ignorncia. Por que ele, agora, chama a ateno para o fato de que sabe do que fala: da incredulidade dos judeus, incluindo Nicodemos; e da sua vinda do cu e de sua exaltao futura na cruz para a salvao dos crentes? Os versculos 16-21 tambm contm as palavras de Jesus? Cf. tambm Jo 8.31-37; G1 2.11-21.

    As parbolas merecem uma ateno especial. A palavra parbola derivada do grego paraballo (jogar ou colocar ao lado de), e sugere a idia de colocar alguma coisa ao lado de outra para comparao. Ela denota um mtodo simblico de linguagem, no qual uma verdade moral ou espiritual ilustrada pela analogia da experincia comum. Ela mantm os dois elementos da comparao distintos como interno e externo, e no atribui qualidades e relaes de um ao outro. O Senhor tinha um propsito duplo ao usar as parbolas, a saber, revelar os mistrios do Reino de Deus a seus discpulos e ocult-los daqueles que no tinham olhos para as realidades do mundo espiritual.

    Na interpretao das parbolas, trs elementos devem ser levados em considerao.

  • a) O escopo da parbola ou do assunto a ser ilustrado. de importncia fundamental que o propsito da parbola sobressaia-se claramente na mente do intrprete. Na tentativa de explor-la, ele no deve negligenciar os importantes auxlios oferecidos na Bblia.

    1) A ocasio na qual uma parbola foi introduzida pode ilustrar seu significado e propsito. Mt 20.1ss. explicado por 19.27; Mt 25.14ss, pelo versculo 13; Lc 16.19-31, pelo versculo 14. Cf. tambm Lc 10.29; 15.1,2; e 19.11, para o propsito das parbolas seguintes;

    2) O objeto da parbola pode ser expressamente declarado na introduo, como em Lc 18.1;

    3) Certas expresses no final de uma parbola podem indicar, tambm, o seu propsito. Cf. Mt 13.49; Lc 11.9; 12.21;

    4) Uma parbola similar de importncia similar pode apontar para o assunto a ser ilustrado. Compare Lc 15.3ss. com Mt 18.12ss. O versculo 14 de Mt 18 contm uma sugesto valiosa;

    5) Em muitos casos, no entanto, o intrprete ter de descobrir o propsito da parbola por meio de um estudo cuidadoso do seu contexto.

    b) Representao figurada da parbola. Depois que o escopo da parbola for determinado, a representao figurada pede um exame cuidadoso. A narrativa formal que pretende de uma s vez, revelar e ocultar a verdade deve ser cuidadosamente analisada e toda luz geogrfica, arqueolgica e histrica necessrias devem ser dirigidas a ela;

    c) O objetivo exato da comparao. O objetivo exato da comparao deve ser detectado. H, sempre, algum aspecto especial do Reino de Deus, alguma linha de tarefa particular a ser seguida, ou algum perigo a ser evitado, que a parbola busca exibir e ao qual todo o seu imaginrio subserviente. Enquanto o intrprete no descobrir esse objetivo, ele no pode esperar entender a parbola e no deveria tentar explicar as peculiaridades individuais uma vez que essas s podem ser vistas em sua verdadeira luz quando contempladas em relao idia central. Alm disso, deve-se tomar cuidado em no atribuir um significado espiritual independente a todos os detalhes da parbola.

  • 4 - INTERPRETAO HISTRICA

    Outro instrumento de trabalho do intrprete bblico a exegese histrica. Aqui o autor deve ser interpretado de acordo com o seu contexto histrico. Devemos aplicar ao texto os conhecimentos da poca do autor, fornecidos pela arqueologia, geografia, cronologia e histria geral. Somente assim seremos capazes de entrar no cenrio do texto. No ser necessrio recorrer histria da exegese. Apenas uma pequena observao suficiente para se ver os absurdos e os ultrajantes erros para os quais, aquele que negligencia esse princpio leva dos sinceros, mas ignorantes pesquisadores. Ningum pode apresentar uma narrativa bblica disfarada de nosso dia-a-dia, sem tornar a histria ridcula. Circunstncias histricas so essenciais para a veracidade e vivacidade da narrao.

    Devemos entender e analisar as verdades das Escrituras, sem prejuzo delas, sem elimin-las de sua circunstncia histrica. E ento dar um novo e apropriado significado para o seu propsito prtico. Mas, nunca podemos interpretar as Escrituras sem a exegese histrica, pois esta serve para definir mais precisamente o texto, e para eliminar o material no-histrico alcanado pelo processo exegtico. Em adio, o professor Louis Berkhof argumenta sobre as caractersticas pessoais da Escritura, dizendo:

    Na interpretao histrica de um livro, a pergunta quem o autor? sempre a primeira. Alguns livros da Bblia mencionam seus autores outros no. Mesmo tendo o conhecimento do nome do autor, isso no proporciona ao exegeta todo o material de que necessita. Ter de familiarizar-se com o prprio autor como homem. Isto , seu carter, seu temperamento, sua disposio e modo habitual de pensar. O conhecimento ntimo do autor do livro facilitar a compreenso de suas palavras; habilitar o intrprete a entender, e qui a estabelecer, de um modo conclusivo, como as palavras e expresses nasceram na alma do autor.

    Segundo Berkhof h uma outra questo a levantar e de suma importncia no que toca interpretao bblica, que, antes de qualquer coisa, o exegeta bblico deve procurar saber quem so os personagens que aparecem no livro, pois, conforme opina Berkhof, os autores bblicos costumam introduzir personagens em seus escritos e da maior importncia que o expositor distinga escrupulosamente as palavras do autor das daquelas pessoas que intervm

  • na narrao. Nos livros histricos, a linha de demarcao geralmente to clara que isso no pode ser facilmente negligenciado. Porm, h excees. Por exemplo, muito difcil determinar se as palavras encontradas em Jo 3.16-21 foram ditas por Jesus a Nicodemos, ou se so uma explicao dada por Joo. Nos profetas, as transies sbitas do humano para o divino so, em geral, facilmente reconhecidas pela mudana da terceira para a primeira pessoa, em conexo com o carter do que dito. Cf. Is 5.1,3; Os 9.9,10; Zc 12.8-10; 14.1-3. Algumas vezes pode-se encontrar um dilogo entre o escritor e um suposto oponente. Tais casos requerem um manuseio cuidadoso, uma vez que a falha na distino correta pode resultar em erros graves. Cf. Ml 3.13-16; Rm 3.1-9. A seguinte regra pode ajudar: O escritor do livro deve ser considerado como aquele que fala at que surjam algumas evidncias expressas que indiquem o contrrio. E quando o intrprete souber quem aquele que fala distinto do escritor, ele deve aumentar seu conhecimento sobre ele com todos os meios disponveis. Pessoas como Abrao, Isaque, Jac, Jos, Samuel, J e seus amigos, classes de pessoas como os fariseus, saduceus e escribas, devem ser objeto de estudo especial. Quanto mais se conhea sobre eles, mais suas palavras sero entendidas.

    Em Princpios de Interpretao Bblica, Louis Berkhof afirma que, a interpretao histrica se refere ao contedo material da Bblia, e a mesma parte dos seguintes pressupostos:

    1) A Palavra de Deus teve a sua origem de uma forma histrica e, conseqentemente, s pode ser entendida luz da Histria. Isso no significa que tudo, o que ela contm, possa ser historicamente explicado. Como revelao sobrenatural de Deus, ela, naturalmente, abriga elementos que transcendem os limites do histrico. Significa que os contedos da Bblia so, a um grande grau, historicamente determinados e que, nesse grau, podem ser explicados na Histria;

    2) Uma palavra nunca completamente entendida at ser apreendida como palavra viva, isto , originria da alma do autor. Isso implica a necessidade do que chamado de interpretao psicolgica, que , na verdade, uma subdiviso da interpretao histrica;

    3) impossvel entender um autor e interpretar corretamente suas palavras sem que ele seja visto luz da sua experincia histrica. verdade que um homem, num certo sentido, controla as circunstncias de sua vida e determina seus aspectos; mas igualmente verdadeiro que ele , num grau elevado, o produto do seu ambiente histrico. Por exemplo, ele filho do seu povo, de sua terra e de sua poca;

  • 4) O lugar, o tempo, as circunstncias e a viso prevalecentes do mundo e da vida em geral iro naturalmente alterar os escritos produzidos sob tais condies. Isso tambm se aplica aos livros da Bblia, particularmente aos histricos e aos de carter ocasional. Em toda a extenso da literatura, no h livro que se iguale Bblia em tocar a vida em cada aspecto.

    Em vista desses pressupostos, continua Louis Berkhof, a interpretao histrica faz as seguintes exigncias ao exegeta:

    a) Ele deve buscar conhecer o autor cuja obra quer explicar: sua parentela, seu carter e temperamento, suas caractersticas intelectuais, morais e religiosas e, tambm, as circunstncias externas da sua vida;

    b) Ser sua obrigao reconstruir, tanto quanto possvel, a partir dos dados histricos disponveis e com o auxlio das hipteses histricas, o ambiente no qual os escritos particulares em considerao se originaram; em outras palavras, o mundo do autor. Ele ter de se informar a respeito dos aspectos fsicos da terra onde os livros foram escritos e a respeito do carter e histria, costumes, princpios morais e religio do povo entre o qual e para o qual foram compostos;

    c) Ele deve descobrir a importncia extrema de se considerar as vrias influncias que determinaram mais diretamente o carter dos escritos em considerao, tais como: leitores originais, propsito que o autor tinha em mente, idade do autor, sua estrutura mental e as circunstncias especiais em que comps seu livro;

    d) Alm disso, ele deve se transferir mentalmente para o primeiro sculo da nossa era e para as condies orientais. Ele deve se colocar no ponto de vista do autor e buscar entrar na prpria alma dele, como se vivesse aquela vida e pensasse aqueles pensamentos. Isso significa que ele ter de se proteger contra o erro comum de transferir o autor para os dias atuais e faz-lo falar na lngua do sculo XXI. Se no evitar isso, existe o perigo, como McPheeters o expressa, de que a voz que escuta seja meramente o eco de suas prprias idias (Bible Studente, Vol. III, No. II).

    4.1. Circunstncias geogrficas

  • As circunstncias climticas e geogrficas em geral freqentemente influenciam o pensamento, a linguagem e as representaes de um escritor e deixam uma marca na sua produo literria. importante que intrprete da Bblia entenda o carter das estaes, os ventos dominantes e suas funes, e a diferena de temperatura nos vales, nas montanhas e nos cumes. Ele deve conhecer algo sobre a produo da terra: rvores, arbustos e flores, gros, vegetais e frutas, animais selvagens e domsticos, insetos e pssaros nativos. Montanhas e vales, lagos e rios, cidades e vilas, estradas e plancies - ele deve se familiarizar com eles e com a sua localizao. Como ele pode explicar a afirmao do poeta do orvalho do Hermom, que desce sobre os montes de Sio (Sl 133.3), a no ser que esteja familiarizado com o efeito do pico coberto de neve do Hermon sobre a neblina que constantemente se levanta do desfiladeiro no sop? Como ele pode interpretar expresses como a glria do Lbano e a excelncia do Carmelo e Sarom, se no tiver conhecimento da sua vegetao exuberante e beleza extraordinria? O que pode dizer para explicar o uso das carruagens no reino do norte (1Rs 18.44ss.; 22.29ss.; 2Rs 5.9ss.; 9.16; 10.12, 15), e sua ausncia no reino do sul? Como pode explicar o sucesso de Davi em esquivar-se de Saul embora tenham chegado a uma pequena distncia um do outro, a no ser que entenda a topografia do lugar? Apenas a familiaridade com as estaes iro capacit-lo a interpretar passagens como Ct 2.11, Porque eis que passou o inverno, cessou a chuva e se foi; e Mt 24.20, Orai para que a vossa fuga no se d no inverno.

    4.2. Circunstncias polticas

    A condio poltica de um povo tambm deixa uma profunda impresso sobre sua literatura nacional. A Bblia contm ampla evidncia disso tambm e, por essa razo, absolutamente necessrio que o expositor se informe a respeito da organizao poltica das naes que tiveram grande importncia no cenrio bblico. Sua histria nacional, relacionamentos com outras naes e instituies polticas devem se tornar objeto de um estudo cuidadoso. As mudanas polticas na vida nacional de Israel merecem uma ateno particular.

    Somente a Histria lana uma luz sobre a questo da razo pela qual no se permitiu que Israel perseguisse os moabitas e os filhos de Amom (cf. Dt 2.9, 19). A posio de dependncia de Edom nos dias de Salomo e Josaf explica como esses reis puderam construir uma frota de navios em Eziom-Geber, na terra de Edom (1Rs 9.26; 22.47, 48; 1Cr 18.13; 2Cr 8.17, 18). Passagens como 2Rs 15.19; 16.7 e Is 20.1 so explicadas pelo poder ascendente dos assrios e da extenso gradual de seu imprio, como foi revelado

  • especialmente pelos registros de seus reis. As palavras de Rabsaqu em 2Rs 18.19 e Is 36.4 se tornam luminosas em vista do fato de que houve um partido egpcio influente em Jud durante o reinado de Ezequias (Is 30.1-7). A mudana radical na constituio e posio poltica de Israel deve ser lembrada na interpretao dos escritos ps-exlicos. Passagens como Ed 4.4-6ss; Ne 5.14, 15; Zc 7.3-5; 8.19; Ml 1.8, s podem ser explicadas luz da histria contempornea. Ao mover-se do Antigo Testamento para o Novo, o intrprete ir encontrar uma situao para a qual estar totalmente despreparado, a no ser que tenha estudado o perodo interbblico. Os romanos eram o poder dominante e os idumeus governavam sobre a herana de Jac. Partidos nunca citados no Antigo Testamento ocupavam, ento, o centro do palco. Havia um Sindrio judaico que decidia os assuntos de maior importncia e uma classe de escribas que havia, praticamente, suplantado os sacerdotes como mestres do povo. Consequentemente, todos os tipos de questes so levantadas. Como o estado judeu era constitudo? Por qual ironia da histria os idumeus se tornaram os governadores reconhecidos do povo judeu? Quais as limitaes que a supremacia romana impunha ao governo judeu? Os partidos existentes tinham significado poltico? Se sim, o que almejavam? Um estudo sobre o passado de Israel dar resposta a essas questes. Passagens como

    Mt 2.22, 23; 17.24-27; 22.16-21; 27.2; Jo 4.9 s podem ser explicadas luz da histria.

    4.3. Circunstncias Religiosas

    A vida religiosa de Israel no se deslocou sempre sobre o mesmo plano, no foi sempre caracterizada pela verdadeira espiritualidade. Houve pocas de elevao espiritual logo seguidas por perodos de degradao religiosa e moral. As geraes que serviram a Deus com um esprito humilde e reverente foram repetidamente sucedidas por adoradores de dolos ou por aqueles que buscavam satisfao no culto hipcrita, da boca para fora. A histria da religio de Israel, quando vista como um todo, revela deteriorao ao invs de progresso, degenerao ao invs de evoluo.

    O perodo dos juzes foi uma poca de sincretismo religioso resultante da fuso entre o culto a Jeov e a adorao do baalismo cananeu. Nos dias de Samuel, a ordem proftica comeou a se afirmar e a exercer uma influncia benfica sobre a vida espiritual da nao. O perodo dos reis em Jud foi caracterizado pelos repetidos declnios e restauraes. A adorao nos altos e, s vezes, idolatria flagrante foi o pecado insistente do povo. Durante o mesmo perodo, o pecado tpico do reino do norte era a sua adorao ao bezerro, aumentada nos dias de Acabe

  • pela adorao a Melcarte, o Baal fencio. Depois do exlio, a idolatria era rara em Israel, mas sua religio se degenerou para um formalismo frio e uma ortodoxia morta.

    Essas coisas devem ser levadas em considerao na interpretao das passagens que se referem vida religiosa do povo. Alm disso, o intrprete deve estar familiarizado com as prticas e instituies religiosas de Israel, como foram regulamentadas pela lei Mosaica. Passagens como Jz 8.28, 33; 10.6; 17.6 s podem ser explicadas luz da histria contempornea. Em 1Sm 2.13-17, o prprio escritor oferece uma explicao histrica da maneira pela qual os filhos de Eli desconsideraram a lei. O motivo por que Jeroboo levantou bezerros em D e Betel s pode ser respondido historicamente. A Histria d respostas a questes como por que os reis piedosos e profetas de Jud combatiam constantemente a adorao nos altos, enquanto os profetas de Efraim raramente condenavam essa prtica. Sem o conhecimento histrico necessrio, o expositor achar impossvel entender a palavra do anjo a Mano, porque o menino ser nazireu, consagrado a Deus (Jz 13.7); a referncia de Jeremias ao vale de Hinom como vale da matana (Jr 19.6; comp. 7.31 33); a meno de Miquias aos estatutos de Onri (Mq 6.16); a ordem de Jesus ao leproso de ir e mostrar-se ao sacerdote (Mt 8.4); e sua referncia aos tocadores de flauta, e o povo em alvoroo (Mt 9.23); e aos que vendiam bois, ovelhas e pombas, e tambm os cambistas assentados (Jo 2.14). a histria que o capacitar a explicar expresses como sepultados com ele na morte pelo batismo (Rm 6.4); e, Pois tambm Cristo, nosso Cordeiro pascal, foi imolado (1Co 5.7). O grande significado do conhecimento histrico percebido quando o intrprete depara com uma passagem como 1Co 15.29, que se refere a um costume do qual no temos conhecimento certo.

    5 - EXEGESE TEOLGICA

    5.1. Elementos para a Interpretao Teolgica

  • Os elementos que podem ajudar o expositor na interpretao teolgica so compostos de duas partes: (1) Paralelos Reais ou Paralelos de Idias; e (2) Analogia da F ou da Escritura. Ambos procedem do pressuposto de que a Palavra de Deus uma unidade orgnica na qual todas as partes so mutuamente relacionadas e, juntas, subservientes ao todo da revelao de Deus; e que, em ltima anlise, a Bblia a sua prpria intrprete.

    5.1.1. Paralelos Reais ou Paralelos de Idias

    Paralelos reais, diz Terry, so aquelas passagens similares nas quais a semelhana ou identidade consiste no em palavras ou frases, mas em fatos, assuntos, sentimentos ou doutrinas. No seu uso, o intrprete deve determinar, primeiramente, se as passagens citadas so realmente paralelas, se no so meramente similares at certo grau, mas essencialmente idnticas. Por exemplo, Pv 22.2 e 29.13, embora revelem uma certa similaridade e sejam freqentemente considerados como paralelos, no so realmente paralelos. Os paralelos de idias podem ser divididos em duas classes, paralelos histricos e didticos. A esses podem ser adicionadas as citaes do Antigo Testamento no Novo, as quais, em um certo sentido,