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Rua Teixeira da Silva, 217 – 4º andar - São Paulo/SP – CEP: 04002-905 – Tel: (11) 94221-0426 [email protected] EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA ROSA WEBER, MINISTRA RELATORA DA ADIs 5680 Assunto: Inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 95/2016 que estabeleceu teto para os gastos públicos da União por 20 anos. DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por intermédio do NÚCLEO ESPECIALIZADO DE DEFESA DA DIVERSIDADE E DA IGUALDADE RACIAL (NUDDIR), órgãos com sede no Setor Comercial Sul, Quadra 8, Edifício Venâncio 2000 - Bloco B60, 3º andar, Asa Sul - Brasília - DF - CEP: 70333- 900, neste ato representado por seus Coordenadores abaixo subscritos, vem, com fundamento no artigo 138 do novo Código de Processo Civil c/c o artigo 323, § 3º do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, c/c §2º do artigo 7º, da Lei 9.868/1999, requerer seu ingresso como AMICUS CURIAE nos autos da AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - ADI, em epígrafe, ajuizada pelo PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL) , com vistas a fomentar a pluralização da jurisdição constitucional, em estrita consonância com o postulado democrático, pelas razões a seguir aduzidas. A figura do amicus curiae está assentada no conceito de “amigo da corte”, como podemos observar pelo próprio Glossário Jurídico do site do Supremo Tribunal Federal:

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Rua Teixeira da Silva, 217 – 4º andar - São Paulo/SP – CEP: 04002-905 – Tel: (11) 94221-0426 [email protected]

EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA ROSA WEBER, MINISTRA RELATORA

DA ADIs 5680

Assunto: Inconstitucionalidade da Emenda Constitucional 95/2016 que

estabeleceu teto para os gastos públicos da União por 20 anos.

DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DE SÃO PAULO, por

intermédio do NÚCLEO ESPECIALIZADO DE DEFESA DA DIVERSIDADE E DA

IGUALDADE RACIAL (NUDDIR), órgãos com sede no Setor Comercial Sul, Quadra 8,

Edifício Venâncio 2000 - Bloco B60, 3º andar, Asa Sul - Brasília - DF - CEP: 70333-

900, neste ato representado por seus Coordenadores abaixo subscritos, vem, com

fundamento no artigo 138 do novo Código de Processo Civil c/c o artigo 323, § 3º

do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, c/c §2º do artigo 7º, da Lei

9.868/1999, requerer seu ingresso como

AMICUS CURIAE

nos autos da AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - ADI, em epígrafe,

ajuizada pelo PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE (PSOL) , com vistas a fomentar

a pluralização da jurisdição constitucional, em estrita consonância com o postulado

democrático, pelas razões a seguir aduzidas.

A figura do amicus curiae está assentada no conceito de “amigo da

corte”, como podemos observar pelo próprio Glossário Jurídico do site do Supremo

Tribunal Federal:

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“Amicus Curiae. Descrição do Verbete: "Amigo da Corte".

Intervenção assistencial em processos de controle de

constitucionalidade por parte de entidades que tenham

representatividade adequada para se manifestar nos autos

sobre questão de direito pertinente à controvérsia

constitucional. Não são partes dos processos; atuam apenas

como interessados na causa. Plural: Amici curiae (amigos da

Corte).”1

Os amici curiae prestam apoio à corte nas decisões, pois fornecem

fundamentos técnicos e fáticos para a decisão dos julgadores. Assim, tal figura tem

como característica o conhecimento técnico profundo sobre a matéria sob judice.

Nesse sentido é o entendimento de Alexandre de Moraes:

“A Lei nº. 9.868/99 passou a permitir que o relator,

considerando a relevância da matéria e a representatividade

dos postulantes, possa, por despacho irrecorrível, admitir a

manifestação de outros órgãos ou entidades.

Essa inovação passou a consagrar, no controle abstrato de

constitucionalidade brasileiro, a figura do amicus curiae, ou

“amigo da Corte”, cuja função primordial é juntar aos autos

parecer ou informações com o intuito de trazer à colação

considerações importantes sobre a matéria de direito a ser

discutida pelo Tribunal, bem como acerca dos reflexos de

eventual decisão sobra a inconstitucionalidade da espécie

normativa impugnada.”2

Portanto, o Tribunal deve ser sensível à atuação daqueles que

possuem a capacidade de auxiliar, tecnicamente, o deslinde do caso, ou seja os

amici curiae. Nesse sentido trata o Min. Gilmar Ferreira Mendes, nos ensinamentos

acerca da ação direta de inconstitucionalidade:

1 Supremo Tribunal Federal. Glossário Jurídico. Disponível em

<http://www.stf.jus.br/portal/glossario/verVerbete.asp?letra=A&id=533>, visualizado em 25.02.15. 2 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 17ªed. São Paulo: Atlas, 2005, p. 673.

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“Constitui, todavia, inovação significativa, no âmbito da ação

direta de inconstitucionalidade, a autorização para que o

relator, considerando a relevância da matéria e

representatividade dos postulantes, admita a manifestação

de outros órgãos ou entidades (art. 7º, §2º). Positiva-se,

assim, a figura do amicus curiae no processo de controle de

constitucionalidade, ensejando a possibilidade de o Tribunal

decidir as causas com pleno conhecimento de todas as suas

implicações ou repercussões.”3(grifos nossos)

No mesmo sentido decidiram o Ministro Celso de Mello e a própria

Ministra Rosa Weber, ora relatora:

“EMENTA: [...] PROCESSO OBJETIVO DE CONTROLE

NORMATIVO ABSTRATO - POSSIBILIDADE DE

INTERVENÇÃO DO AMICUS CURIAE: UM FATOR DE

PLURALIZAÇÃO E DE LEGITIMAÇÃO DO DEBATE

CONSTITUCIONAL. - O ordenamento positivo brasileiro

processualizou, na regra inscrita no art. 7º, § 2º, da Lei nº

9.868/99, a figura do amicus curiae, permitindo, em

consequência, que terceiros, desde que investidos de

representatividade adequada, sejam admitidos na relação

processual, para efeito de manifestação sobre a questão de

direito subjacente à própria controvérsia constitucional. A

intervenção do amicus curiae, para legitimar-se, deve apoiar-

se em razões que tornem desejável e útil a sua atuação

processual na causa, em ordem a proporcionar meios que

viabilizem uma adequada resolução do litígio constitucional.

A ideia nuclear que anima os propósitos teleológicos que

motivaram a formulação da norma legal em causa,

viabilizadora da intervenção do amicus curiae no processo

de fiscalização normativa abstrata, tem por objetivo

essencial pluralizar o debate constitucional, permitindo,

desse modo, que o Supremo Tribunal Federal venha a dispor

3 MENDES, Gilmar Ferreira. Jurisdição constitucional: o controle abstrato de normas no Brasil e na

Alemanha. 5ªed, São Paulo: Saraiva, 2005, p. 244

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de todos os elementos informativos possíveis e necessários à

resolução da controvérsia, visando-se, ainda, com tal

abertura procedimental, superar a grave questão pertinente

à legitimidade democrática das decisões emanadas desta

Suprema Corte, quando no desempenho de seu

extraordinário poder de efetuar, em abstrato, o controle

concentrado de constitucionalidade. [...]” 4

“A intervenção de amicus curiae no controle concentrado de

atos normativos primários destina-se a pluralizar e a

legitimar social e democraticamente o debate constitucional,

com o aporte de argumentos e pontos de vista diferenciados,

bem como de informações fáticas e dados técnicos

relevantes à solução da controvérsia jurídica e, inclusive, de

novas alternativas de interpretação da Carta Constitucional,

o que se mostra salutar diante da causa de pedir aberta das

ações diretas. (...)

Como dito, a intervenção dos amici curiae objetiva

enriquecer o debate jurídico-constitucional, mediante o

aporte de novos argumentos, pontos de vista, possibilidades

interpretativas e informações fáticas e técnicas, o que

acentua o respaldo social e democrático da jurisdição

constitucional exercida por esta Corte.”5

Destaque-se que deve existir pertinência temática do caso em

discussão com os estudos ou atuação promovidos por aquele que pretende

ingressar como amicus curiae no processo. No presente feito, a atuação

desenvolvida pelo NÚCLEO DE DEFESA DA DIVERSIDADE E DA IGUALDADE

RACIAL (NUDDIR) da Defensoria Pública de São Paulo justifica sua inclusão na

presente demanda como amicus curiae.

Acerca da pertinência temática tratou o ministro Luiz Fux:

4 Supremo Tribunal Federal. ADI 2.321. Relator Ministro Celso de Mello, dje 10.06.2005. 5 Supremo Tribunal Federal. ADI 4.832. Relatora Ministra Rosa Weber, dje 03.12.2013.

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“O Supremo Tribunal Federal tem entendido que a presença do

amicus curiae no momento em que se julgará a questão

constitucional cuja repercussão geral fora reconhecida não só é

possível como é desejável.

A pertinência do tema a ser julgado por este Tribunal com as

atribuições institucionais do requerente legitima a sua atuação.”6

A presente ADI trata de controvérsia constitucional relevante, em

especial no que se refere à limitação dos gastos públicos federais nos próximos

vinte anos, o que afetará a promoção de políticas públicas pelo Estado brasileiro.

Para que se possa ter uma ideia dos impactos do novo regime

fiscal nas políticas sociais, cumpre mencionar estudo do Departamento

Intersindical de Estatísticas e Estudos socioeconômicos - DIEESE, que fez uma

projeção do teto dos gastos aplicado como se estivesse em vigor no período de

2002 a 2015. No caso da educação, com a nova regra, a redução seria de 47% no

período. Já com relação às despesas de saúde, a redução seria de 27%. Isso

significa, em valores, que a perda na saúde, entre 2002 e 2015, teria sido de R$

295,9 bilhões e, na educação, de R$ 673,6 bilhões, o que corresponderia a um

montante total em torno de R$ 969,5 bilhões.7 De acordo com um estudo do IPEA8,

divulgado no início do mês de outubro de 2016, somente o SUS perderá, com o

novo regime fiscal, cerca de R$ 743 bilhões.

6 Supremo Tribunal Federal. ARE 6664.335. Relator Ministro Luiz Fux, dje 06.06.2014. 7Disponível em:

http://www.dieese.org.br/notatecnica/2016/notaTec161novoRegimeFiscal.pdf

8Disponível em:

<http://www.ipea.gov.br/portal/images/stories/PDFs/nota_tecnica/160920_nt_28_disoc.pdf

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Tais dados, per si, já indicam a inconstitucionalidade da EC 95 de

2016, pois demonstram o atentado que ela consubstancia à lógica principiológica

da vedação do retrocesso social que, no plano do direito positivo, está expressa no

rol das cláusulas pétreas constitucionais (art. 60, § 4.º, inciso IV).

O resultado do julgamento da presente ação é de interesse das

pessoas hipossuficientes atendidas pelas Defensorias Públicas em todo país, tendo

em vista os efeitos nefastos que a redução dos investimentos públicos federais

produzirá para a concretização de direitos sociais básicos dos grupos mais

vulneráveis em todas as instâncias da federação.

Nesse sentido, relembre-se que não foram excluídos do teto de

gastos os percentuais obrigatórios de gastos com a saúde e educação. A

Constituição, como se sabe, exige que os governos apliquem um percentual mínimo

de sua receita em educação e saúde.

A União federal é obrigada a aplicar na saúde ao menos o mesmo

valor do ano anterior mais o percentual de variação do Produto Interno Bruto

(PIB). Estados e Municípios precisam investir 12% e 15%, das receitas de impostos

e recursos oriundos de transferências, respectivamente.

Na educação, a União federal deve gastar 18% do arrecadado, e

Estados e Municípios 25% das receitas de impostos e valores oriundos de

transferências. Prevalecendo o teto, o financiamento do Sistema Único de Saúde

(SUS) nos Estados e Municípios será fortemente atingido, pois cerca de 2/3 das

despesas do Ministério da Saúde são transferidas fundo a fundo para ações de

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atenção básica, média e alta complexidade, assistência farmacêutica, vigilância

epidemiológica e sanitária, entre outras, a cargos dos entes federados.9

Outrossim, antevê-se uma redução brutal das transferências de

recursos da União para o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação – que

promove transferências voluntárias para Estados e Municípios.

A população negra tende a ser especialmente afetada por tais

medidas de austeridade econômica, seja em virtude dos séculos de escravidão e

colonialismo, seja por força da ausência, ao longo do período pós – abolição, de

políticas estatais capazes de prevenir e coibir o gozo de direitos em escalas

variáveis de acordo com a posição ocupada por diferentes grupos racializados em

uma sociedade racialmente estratificada.

Segundos dados do IBGE a população negra constitui cerca de

56% da população brasileira. Muito embora a abolição legal da escravidão já

complete mais de 130 anos, a ótica desumanizadora da população afrodescendente

ainda é hegemônica na sociedade brasileira. A ideia de inferioridade de negros e

negras está na gênese da construção da identidade nacional, de tal modo os

direitos são vivenciados como privilégios e a população afrodescendente se

encontra em uma condição de subcidadania, completamente alijada do gozo de

direitos humanos básicos, como educação, saúde, moradia e trabalho digno.

O racismo é estruturante das relações sociais e situa a população

negra na base da pirâmide social: os afrodescendentes, segundo técnicos da ONU,

são os mais assassinados, os que têm menor nível de instrução, os menores

salários, o menor acesso à saúde, os que morrem mais cedo e os que menos

participam do Produto Interno Bruto (PIB).

A Importância da temática racial no Brasil tem sido reforçada pela

Organização das Nações Unidas que afirmou, em informe concernente à situação

9 https://www.scielo.br/scielo.php?pid=S2359-56392017000100259&script=sci_arttext#fn5

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da discriminação racial no país, que o racismo no Brasil é “estrutural e

institucionalizado” e “permeia todas as áreas da vida”. Os peritos da entidade

concluíram o relatório apontando que o “mito da democracia racial” ainda está

presente na sociedade brasileira e que boa parte dela ainda “nega a existência de

racismo”.10

A negação do racismo aliada ao fato de que este atravessa todas as

esferas da vida social tem o efeito de fazer com que as hierarquias raciais que

perpassam a sociedade e determinam um verdadeiro “apartheid de fato”, ainda que

não legalmente prescrito, sejam culturalmente aceitas como normais, tornando o

seu enfrentamento uma tarefa extremamente árida, porém ainda mais necessária e

urgente.

Dito isto, a emenda constitucional que limitou os gastos públicos

tem um impacto devastador no acesso aos direitos básicos da cidadania pela

população negra. Relembre-se que a expressiva maioria das pessoas negras não

possui plano de saúde, sendo que 78,8% é usuária do SUS11.Por outro lado,

segundo dados da campanha “SUS Sem Racismo”, mulheres negras costumam

receber, em média, menos tempo de atendimento médico que as brancas e

compõem 60% das vítimas da mortalidade materna no Brasil12

10 http://g1.globo.com/mundo/noticia/2014/09/relatorio-apresentado-na-onu-diz-que-brasil-

tem-racismo-institucional.html

11 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento de Apoio

à Gestão Participativa e ao Controle Social. Política Nacional de Saúde Integral da População Negra :

uma política para o SUS. Ministério da Saúde, Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa,

Departamento de Apoio à Gestão Participativa e ao Controle Social. – 3. ed. – Brasília : Editora do

Ministério da Saúde, 2017, p. 22. Ver também: <https://nacoesunidas.org/quase-80-da-populacao-

brasileira-que-depende-do-sus-se-autodeclara-negra/>. 12 Ministério da Saúde. Gravidez, parto e nascimento com saúde, qualidade de vida e bem-estar. Brasília:

Editora do Ministério da Saúde, 2013. Disponível em:

<http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/gravidez_parto_nascimento_saude_qualidade.pdf>.

Acesso em 18 jul. 2015.

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Dessa forma, a redução de investimentos em saúde pública

imposta pela Emenda Constitucional 95, ao reduzir orçamento do SUS, apresenta

grave perspectiva de causar mais prejuízos ao atendimento da população negra e,

consequentemente, mais mortes do grupo.

No que tange ao acesso ao saneamento básico, segundo dados

oficiais do IBGE13, 44,5% da população negra vive em domicílios com a ausência de

pelo menos um serviço de saneamento básico (coleta de lixo, abastecimento de

água por rede e esgotamento sanitário por rede), o que demonstra que o Estado já

falha na garantia deste direito social básico aos (às) negros(as). Por evidente, este

quadro tende a se agravar com a limitação dos recursos públicos federais

necessários a investimentos neste campo ( conforme preconiza a Lei federal nº Lei

Nº 11.445, de 5 de janeiro de 2007), impactando nas condições gerais de saúde e

qualidade de vida da população negra.

Por sua vez, o congelamento do orçamento na área da educação

produzirá, dentre incontáveis impactos prejudiciais, efeito desproporcionais para

os estudantes negros que já ingressaram ou que venham a ingressar nas

universidades públicas por meio das políticas afirmativas de cotas raciais. O

extrato socioeconômico do qual provêm tais estudantes negros – que precisam ser

egressos da rede pública de ensino para fazer juz à reserva de vagas efetivada de

acordo com o critério racial – autoriza inferir a indispensabilidade das políticas de

assistência e permanência estudantil e do orçamento correlato, para que possam

acessar a Universidade, dispor das mínimas condições para realizar os seus

estudos e concluir o ensino superior. As ações afirmativas (Lei 12.711 de 2012)

exigem a contínua ampliação dos investimentos nas universidades e institutos

federais com o objetivo de garantir as condições de permanência dos estudantes

negros beneficiários da política de cotas e o ensino superior público de qualidade.

13 https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-

noticias/releases/25989-pretos-ou-pardos-estao-mais-escolarizados-mas-desigualdade-em-relacao-aos-

brancos-permanece

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Ressalte-se também o impacto da EC 45 de 2016 na precarização

da política pública de Assistência Social, cujo papel para negros(as), que compõem

a maioria da população brasileira e enfrentam óbices diversos para realizar

direitos e acessar políticas públicas em razão do processo histórico e contínuo de

exclusão socioeconômica, cultural, política etc, é crucial.

Indicadores e pesquisas apontam que o público majoritário

atendido no âmbito do SUAS é constituído por mulheres negras (IPEA, 2011). Dos

titulares do Programa Bolsa Família, 73,88% entre homens e mulheres são negros.

Sobre o total geral de beneficiários 14titulares do Programa, 93% dos beneficiários

titulares são mulheres e 68% negras (DATA SOCIAL, 2015).

Os elementos expostos revelam a importância e a pertinência da

participação do Núcleo Especializado da Defensoria Pública de São Paulo na

presente ADI, a fim de contribuir com elementos fáticos e jurídicos que evidenciem

o impacto discriminatório indireto da normativa, ora atacada, para a população

negra.

Com efeito, a EC 95 de 2016 reproduz o racismo institucional ao

afetar desproporcionalmente a população negra, que por razões atinentes à lógica

do racismo estrutural, sempre necessitou com maior intensidade das políticas

públicas para realizar direitos sociais básicos.

O racismo institucional é uma forma de discriminação indireta

que se perfaz, conforme ensina o Prof. Adilson José Moreira, mesmo “...na ausência

objetiva de intenção de discriminar um indivíduo e também em situações nas quais

não há a utilização de formas de diferenciação legalmente vedadas”. E prossegue:

“Ela afeta negativamente membros de um grupo porque atores públicos e privados

14 https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/igualdade-racial/sus-suas-sem-racismo

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não levam em consideração todos os efeitos que uma norma ou prática pode ter no

status social de diferentes segmentos”. 15

Muito embora a intenção não seja relevante para fins de

caracterização da discriminação indireta, mas sim o efeito prejudicial de

determinada norma ou decisão para certos grupos racializados, há uma linha de

continuidade histórica entre as formas de discriminação direta e indireta: “A

discriminação indireta ocorre porque ela perpetua a situação de desvantagem social.

Ela existe em função da tolerância de práticas discriminatórias dentro de uma

sociedade. Se a discriminação direta cria padrões de discriminação que promovem a

estratificação de certos grupos, a discriminação indireta os reproduz quando essa

mesma sociedade permite o tratamento desvantajoso de grupos minoritários”. 16

Todo o impacto prejudicial desproporcional da EC 95 de 2016

para a população negra brasileira sofre agravamento acentuado no grave quadro

de crise sanitária, econômica e política que o país atravessa em razão da pandemia

de COVID-19.

Com efeito, em um cenário de calamidade pública como este, sem

precedentes no período recente, cresce o nível de vulnerabilidade de grupos já

historicamente marginalizados e, na mesma intensidade, as suas demandas por

políticas públicas emergenciais de caráter universal e específico que permitam

prevenir e contingenciar os impactos socioeconômicos e sanitários da pandemia.

De acordo com os dados do Boletim nº 15 da Secretaria de

Vigilância do Ministério da Saúde, Negros e negras somam 43,1% dos

hospitalizados, mas representam mais da metade das mortes, 50,1%, contra 47,7%

de pessoas brancas, de acordo. Tais dados demonstram que o vírus tem se

mostrado mais letal para a população negra e nos permitem deduzir que no

território brasileiro, que reúne a maior população negra fora do continente

15 MOREIRA, Adilson José. O que é discriminação ? Justificando. Casa do Direito. pg. 103.

16 Idem.

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africano, o impacto da COVID-19 reproduzirá e agravará a situação de iniquidade

em saúde pré-existente.

Para os especialistas da ABRASCO – Associação Brasileira de

Saúde Coletiva :“As doenças não são entidades democráticas. Pelo contrário, elas têm

incidências determinadas pela renda, pela idade, pelo gênero e pela raça. Diante da

pandemia provocada pelo coronavírus (SARS2- CoV2), diversos segmentos da

sociedade estão mais expostos e são identificados como grupos de risco, por conta de

comorbidades específicas. A população negra, em sua diversidade, também é um dos

grupos de risco, obviamente com gradações internas, variando tanto por

comorbidades que atingem negras e negros em maior número, caso da hipertensão e

da diabetes e, principalmente, a anemia falciforme, ou mesmo pela letalidade social,

motivada por questões históricas, políticas e sociais estruturantes de nossa

sociedade. A Abrasco ouviu pesquisadores e lideranças sociais para entender esse

cenário e ser um canal dessas demandas.”17

A Organização das Nações Unidas (ONU), através de comunicado

emitido no dia 29 de abril, dirigiu duras críticas ao governo brasileiro, apontando

que o país deveria abandonar imediatamente políticas de austeridade mal

orientadas que estão colocando vidas em risco e aumentar os gastos para combater

a desigualdade e a pobreza exacerbada gerada pela pandemia.

Com efeito, a pandemia de COVID-19 amplia os impactos adversos

da EC 95 de 2016, conforme disse o especialista independente em direitos

humanos e dívida externa, Juan Pablo Bohoslavsky, e o Relator Especial sobre

pobreza extrema, Philip Alston. "Os efeitos são agora dramaticamente visíveis na

crise atual".

A declaração ainda foi endossada pelos relatores da ONU Léo

Heller, Relator Especial sobre os direitos humanos à água potável e saneamento,

17 https://www.abrasco.org.br/site/noticias/sistemas-de-saude/populacao-negra-e-covid-19-

desigualdades-sociais-e-raciais-ainda-mais-expostas/46338/

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Hilal Elver, Relatora Especial sobre o direito à alimentação, Leilani Farha, Relatora

Especial sobre o direito à moradia adequada, Dainius Piras, Relatora Especial sobre

o direito à saúde física e mental; Koumbou Boly Barry, Relatora Especial sobre o

direito à educação, e o Grupo de Trabalho sobre discriminação contra mulheres e

meninas.

"Os cortes de financiamento governamentais violaram os padrões

internacionais de direitos humanos, inclusive na educação, moradia, alimentação,

água e saneamento e igualdade de gênero", afirmaram.

"O sistema de saúde enfraquecido está sobrecarregado e está

colocando em risco dos direitos à vida e a saúde de milhões de brasileiros que estão

seriamente em risco", disseram. E consignaram: "Já é hora de revogar a Emenda

Constitucional 95 e outras medidas de austeridade contrárias ao direito

internacional dos direitos humanos".

Os especialistas fizeram ainda o seguinte apelo: "Em 2018,

pedimos ao Brasil que reconsiderasse seu programa de austeridade econômica e

colocasse os direitos humanos no centro de suas políticas econômicas" (...) "Também

expressamos preocupações específicas sobre os mais atingidos, particularmente

mulheres e crianças vivendo em situação de pobreza, afrodescendentes, populações

rurais e pessoas residindo em assentamentos informais ".18

Desse modo, o inédito contexto pandêmico que atravessa o país e

a denúncia-apelo das Nações Unidas trazem como imperativo humanitário a

necessidade de apreciação urgente, por esta Egrégia Suprema Corte, da

constitucionalidade da EC 95 de 2016, a qual persiste no ordenamento jurídico

18 https://acnudh.org/pt-br/covid-19-politicas-economicas-y-sociales-en-brasil-ponen-en-

riesgo-millones-de-vidas-expertos-onu/

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pátrio como um dispositivo normativo produtor de proscrita discriminação

institucional, que consubstancia óbice à realização de direitos sociais fundamentais

de grupos vulneráveis, sobretudo da população negra.

Os efeitos do “novo” regime fiscal instituído pela EC 45 de 2016

são particularmente agravados no contexto da aguda crise sanitária que o país

atravessa, traduzindo-se em elevados índices de mortalidade para a população

negra.

A Defensoria Pública, nos termos do artigo 134, da Constituição da

República, é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe

a orientação jurídica, a defesa, em todos os graus e instâncias, dos necessitados e a

promoção de Direitos Humanos.

De acordo com a Lei Complementar n.º 80/1994, é função

institucional da Defensoria Pública, entre outras, exercer a defesa dos interesses

individuais e coletivos dos grupos sociais vulneráveis, dentre eles a população

negra.

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo possui em sua

estrutura os Núcleos Especializados de diversas expertises, cabendo aos mesmos

atuar em demandas coletivas, além de prestar suporte, dentro de suas áreas de

especialização, à Defensores/as Públicos/as naturais nas demandas de sua

atribuição.

O Núcleo Especializado de Defesa da Diversidade e da Igualdade

Racial tem como atribuição a defesa e promoção dos direitos da população negra,

de povos indígenas, comunidades tradicionais (quilombolas, caiçaras, caboclas

etc), pessoas LGBTQIA+ e que vivem com HIV-AIDS dentre outros grupos, atuando

no combate a todas as formas de discriminação pautadas em preconceitos e

estereótipos étnico-raciais, sejam elas interpessoais, estruturais ou institucionais.

Nesse contexto, o presente órgão possui atribuição para ingressar com ações

judiciais, inclusive coletivas, nos Tribunais Superiores a fim de garantir uma

uniformidade na interpretação do direito constitucional capaz de resguardar os

direitos fundamentais da população afro-brasileira.

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O presente Núcleo está vinculados à Defensoria Pública do Estado

de São Paulo, tendo sua competência determinada pelo artigo 6º, da Lei Estadual

Complementar nº 988 de 2006 c/c o art. 107 da Lei Complementar 80/94.

Destacamos:

“Art. 6º. (...)

II - propor medidas judiciais e extrajudiciais, para a

tutela de interesses individuais, coletivos e difusos, e

acompanhá-las, agindo isolada ou conjuntamente com

os Defensores Públicos, sem prejuízo da atuação do

Defensor Natural.”

“Art. 107. A Defensoria Pública do Estado poderá atuar

por intermédio de núcleos ou núcleos especializados,

dando-se prioridade, de todo modo, às regiões com

maiores índices de exclusão social e adensamento

populacional. (Redação dada pela Lei Complementar

nº 132, de 2009).”

Assim, a Defensoria Pública de São Paulo, por seu Núcleo ora

postulante, possui fundado interesse e a legitimidade necessária para atuar como

amigo da corte, principalmente em demandas de carater fincanceiro e

orçamentário que se relacionam com modelo de Estado e seu impacto na

promoção de políticas públicas universais e específicas essenciais ao exercício

pleno da cidadania pela população negra.

Como se pode depreender do seguinte despacho proferido em

feito em andamento nessa corte, as Defensorias Públicas dos Estados e órgãos

representativos das Defensorias já foram admitidas como amici curiae:

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“DESPACHO: Tendo em vista a relevância da questão

constitucional discutida na presente ação direta de

inconstitucionalidade e a representatividade das entidades

postulantes, defiro os pedidos formulados pela Associação

Nacional dos Defensores Públicos (Petições 69.528/2011

e 30.800/2012), pela Associação Nacional dos Defensores

Públicos Federais (Petição 72.070/2011), pela Defensoria

do Estado do Rio de Janeiro (Petição 74.111/2011), pela

Associação dos Defensores Públicos do Estado do Rio de

Janeiro (Petição 80.576/2011), pela Associação dos

Advogados de São Paulo (Petição 82.408/2011) e pela

Associação dos Defensores Públicos da Bahia (Petição

30.865/2012), para que possam intervir no feito da

condição de amici curiae. À Secretaria para a inclusão dos

interessados e de seus patronos. Publique-se.”19 (Grifos

nossos.)

Em outras ações em curso perante esse colendo Supremo

Tribunal, Núcleo Especializado da Defensoria Pública de São Paulo já fora admitido

como amigo da corte. Vejamos:

“Admito, na condição de “amicus curiae”, o Núcleo

Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher

– NUDEM, órgão vinculado à Defensoria Pública do Estado

de São Paulo, eis que se acham atendidas, na espécie, as

condições que justificam a intervenção de tal entidade neste

19 Supremo Tribunal Federal. ADI 4.636 – DF. Relator Ministro Gilmar Mendes, dje 6.11.12.

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processo de controle normativo abstrato. Proceda-se, desse

modo, às anotações pertinentes.

2. Assinalo, por necessário, em face de precedentes firmados

por esta Suprema Corte, que o “amicus curiae”, uma vez

formalmente admitido no processo de fiscalização

normativa abstrata, tem o direito de proceder à sustentação

oral de suas razões, observado, no que couber, o § 3º do art.

131 do RISTF, na redação conferida pela Emenda Regimental

nº 15/2004.

Ressalto, ainda, por oportuno, a significativa importância da

intervenção formal do “amicus curiae” nos processos

objetivos de controle concentrado de constitucionalidade,

como tem sido reconhecido pela própria jurisprudência

desta Suprema Corte:

“’AMICUS CURIAE’ – (…) – PLURALIZAÇÃO DO DEBATE

CONSTITUCIONAL E A QUESTÃO DA LEGITIMIDADE

DEMOCRÁTICA DAS DECISÕES DO Supremo Tribunal

Federal Documento assinado digitalmente conforme MP n°

2.200-2/2001 de 24/08/2001, que institui a Infraestrutura

de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil. O documento

pode ser acessado no endereço eletrônico

http://www.stf.jus.br/portal/autenticacao/ sob o número

11693635. ADI 5097 / DF SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

NO EXERCÍCIO DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL –

DOUTRINA – PRECEDENTES – (…) – DISCUSSÃO SOBRE A

(DESEJÁVEL) AMPLIAÇÃO DOS PODERES PROCESSUAIS DO

‘AMICUS CURIAE’ – NECESSIDADE DE VALORIZAR-SE, SOB

PERSPECTIVA EMINENTEMENTE PLURALÍSTICA, O

SENTIDO DEMOCRÁTICO E LEGITIMADOR DA

PARTICIPAÇÃO FORMAL DO ‘AMICUS CURIAE’ NOS

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PROCESSOS DE FISCALIZAÇÃO NORMATIVA ABSTRATA.”

(ADPF 187/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno).20

Ressalte-se que a Defensoria Pública é órgão do sistema de justiça

que está mais próximo da população vulnerável, sendo, na maior parte das vezes,

quem garante acesso à justiça e esse público e dá voz e eco àqueles/as mais

vulneráveis, invisibilizados e invisíveis. Por tal razão, mostra-se também legítima

essa atuação.

Ademais, procura-se ampliar o caráter democrático da decisão

referente a essa ação, que possuirá grande impacto social - notadamente para a

população negra - como ocorre em boa parte dos julgamentos dessa natureza

proferidos pelo Supremo Tribunal Federal.

A recepção do amicus curiae, portanto, reforça a legitimidade do

processo decisório do tribunal, conforme afirmou o ministro Celso de Mello em

decisão monocrática referente à ADI-MC 3268/RJ:

“Impõe-se registrar, neste ponto, que a razão de ser que

primordialmente justifica a intervenção do "amicus curiae" apóia-

se na necessidade de pluralizar o debate em torno da

constitucionalidade, ou não, de determinado ato estatal, em ordem

a conferir maior coeficiente de legitimidade democrática ao

julgamento a ser proferido, pelo Supremo Tribunal Federal, em

sede de fiscalização normativa abstrata (...).”21

As razões acima expostas tornam desejável e útil a atuação

processual pleiteada, uma vez que poderão ser agregados importantes elementos à

adequada solução do litígio. Pluraliza-se, assim, a discussão travada nos autos,

tanto em relação aos sujeitos envolvidos, quanto aos argumentos que contribuirão

para a solução judicial.

20 Despacho preferido pelo Ministro Relator Celso de Mello. Ação Direta de Inconstitucionalidade

5097/DF.

21 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI-MC 3268/RJ, Relator Min. Celso de Mello. Brasília, DF,

despacho 20.10.2004, divulgado no DJ 27.10.2004.

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Posto isso, entendem os requerentes estarem legitimados a

pleitear o ingresso nos autos da presente Ação Direta de Inconstitucionalidade na

qualidade de amicus curiae, utilizando a prerrogativa de apresentar memoriais em

momento oportuno.

Diante do exposto, requer-se a admissão do Núcleo Especializado

de Defesa da Diversidade e da Igualdade Racial (NUDDIR), órgão da Defensoria

Pública do Estado de São Paulo, no processo em epígrafe na qualidade de amicus

curiae, com a consequente permissão para juntar memoriais posteriormente e

sustentar oralmente. Requer, por fim, a intimação e notificação dos atos do

processo.

Termos em que pede deferimento.

São Paulo, 09 de Junho de 2020.

ISADORA BRANDÃO ARAUJO DA SILVA

Defensora Pública Coordenadora do Núcleo Especializado de Defesa da

Diversidade e da Igualdade Racial da Defensoria Pública do Estado de São Paulo

(NUDDIR)

VINICIUS CONCEIÇÃO SILVA SILVA

Defensor Público Coordenador-auxiliar do Núcleo Especializado de Defesa da

Diversidade e da Igualdade Racial da Defensoria Pública do Estado de São Paulo

(NUDDIR)