evoluÇÃo histÓrica da enfermagem e a inserÇÃo masculina

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Disciplina: Gênero e Saúde Professor: Rodrigo Abreu Aula 01 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENFERMAGEM E A INSERÇÃO MASCULINA Para se compreender o porquê das desigualdades existentes nos setores trabalhistas, referentes à categoria gênero, faz-se necessário analisar a historicidade que permeia essa problemática, onde as desigualdades entre homens e mulheres no mundo do trabalho continuam a prevalecer. Essas diferenças, por sua vez, são bem evidentes, por exemplo, na ideia de que existem profissões eminentemente femininas e outras masculinas. Geralmente, a mulher é associada a valores considerados negativos, tais como emoção, fragilidade, resignação. Tais valores como: a mulher é incapaz de usar a razão; não é capaz de lutar contra ocorrências adversas já que se conforma com tudo; é insegura. Estas características são apresentadas como inerentes à mulher, isto é, como algo que a mulher traz desde o nascimento. Já, o homem está atrelado à imagem de provedor, forte viril, o qual sempre subordina a emoção à razão. A enfermagem, então, reflete nitidamente essa desigualdade, quando é considerada uma profissão restrita às mulheres. Assim, pretende-se analisar como a categoria gênero determinou a "feminização" da enfermagem. Para isso, todavia, é imprescindível se reportar para a história da enfermagem, onde se tenta elencar quais as consequências que a divisão sexual do trabalho traz para o próprio exercício da enfermagem. Avaliando a história da enfermagem, percebe-se a ideia nitidamente. Assim, as atividades da enfermagem eram entendidas como afeitas ao sexo feminino, pois historicamente a mulher tem sido vista como possuidora de condições naturais para zelar, promover e ajudar o indivíduo a desenvolver harmoniosamente. Tais "condições naturais" na maioria das vezes, eram identificadas com a sua constituição física e biológica, condicionando seu caráter e sua personalidade, fazendo-a mais meiga, dócil, dedicada e disposta a acalentar as crianças. Ao homem cabia a manutenção da sobrevivência, e à mulher cabia a prática do cuidar. A profissão enfermagem surgiu do desenvolvimento e evolução das práticas de saúde no decorrer dos períodos históricos. As práticas de saúde instintivas foram as primeiras formas de prestação de assistência.

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Page 1: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENFERMAGEM E A INSERÇÃO MASCULINA

Disciplina: Gênero e Saúde

Professor: Rodrigo Abreu

Aula 01

EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENFERMAGEM E A INSERÇÃO MASCULINA

Para se compreender o porquê das desigualdades existentes nos setores trabalhistas,

referentes à categoria gênero, faz-se necessário analisar a historicidade que permeia essa

problemática, onde as desigualdades entre homens e mulheres no mundo do trabalho

continuam a prevalecer. Essas diferenças, por sua vez, são bem evidentes, por exemplo, na

ideia de que existem profissões eminentemente femininas e outras masculinas.

Geralmente, a mulher é associada a valores considerados negativos, tais como emoção,

fragilidade, resignação. Tais valores como: a mulher é incapaz de usar a razão; não é capaz de

lutar contra ocorrências adversas já que se conforma com tudo; é insegura. Estas

características são apresentadas como inerentes à mulher, isto é, como algo que a mulher traz

desde o nascimento. Já, o homem está atrelado à imagem de provedor, forte viril, o qual

sempre subordina a emoção à razão.

A enfermagem, então, reflete nitidamente essa desigualdade, quando é considerada uma

profissão restrita às mulheres. Assim, pretende-se analisar como a categoria gênero

determinou a "feminização" da enfermagem. Para isso, todavia, é imprescindível se reportar

para a história da enfermagem, onde se tenta elencar quais as consequências que a divisão

sexual do trabalho traz para o próprio exercício da enfermagem.

Avaliando a história da enfermagem, percebe-se a ideia nitidamente. Assim, as atividades da

enfermagem eram entendidas como afeitas ao sexo feminino, pois historicamente a mulher

tem sido vista como possuidora de condições naturais para zelar, promover e ajudar o

indivíduo a desenvolver harmoniosamente. Tais "condições naturais" na maioria das vezes,

eram identificadas com a sua constituição física e biológica, condicionando seu caráter e sua

personalidade, fazendo-a mais meiga, dócil, dedicada e disposta a acalentar as crianças.

Ao homem cabia a manutenção da sobrevivência, e à mulher cabia a prática do cuidar.

A profissão enfermagem surgiu do desenvolvimento e evolução das práticas de saúde no decorrer

dos períodos históricos. As práticas de saúde instintivas foram as primeiras formas de prestação de

assistência.

Page 2: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENFERMAGEM E A INSERÇÃO MASCULINA

Na Idade Média, os cuidados aos enfermos ficavam a cargo de religiosas, as quais podem ser

consideradas as primeiras enfermeiras. Só na enfermagem religiosa, as enfermeiras estavam

sujeitas aos determinismos divinos, que a colocara como um ser apropriado a doar, a servir, a

devotar-se, na enfermagem moderna, ela está sujeita aos homens e aos superiores

hierárquicos.

Em decorrência do forte relação da enfermagem com os princípios religiosos, a ocupação das

enfermeiras sempre foi comparada ao papel desempenhado por essas entidades celestiais.

Assim como aos anjos, delega-se à enfermeira o papel de zelar, de guardar e de proteger. Para

isso ele deve estar sempre pronto para servir, embalada por um idealismo solidário, fraterno e

devotado.

Com o processo de medicalização e reforma religiosa no século XIV, as religiosas foram

expulsas das Santas Casas de Misericórdia. Logo, recrutaram-se mulheres tidas como

"reputação duvidosa", leia-se, bêbadas, prostitutas, mendigas, para prestar assistência aos

doentes.

Já na Idade Moderna, no século XIX, Florence Nigthingale, uma aristocrata britânica,

institucionaliza a enfermagem, estabelecendo uma série princípios ético-morais que deveriam

nortear as práticas da enfermagem. Mas é válido salientar que por trás desses parâmetros

existia uma tentativa de subalternização das enfermeiras. Não é a toa que, segundo Lima

(2005), Nigthingale redige uma carta, enquanto reposta aos médicos, afirmando que não se

preocupasse, pois as enfermeiras não queriam ser médicas mulheres. Sobre mais, estavam

cônscias das suas funções.

Ao retornar da guerra, Florence se tornara uma figura popular e conseguira quebrar o

preconceito que existia em torno da participação da mulher no Exército e transformara a visão

da sociedade em relação à enfermagem e ao estabelecimento de uma ocupação útil para a

mulher. Com isso, em 1860, ela fundou uma Escola de Enfermagem, no Hospital St Thomas,

em Londres, berço da moderna Enfermagem cujo modelo é conhecido como sistema de ensino

nightingaleano.

Pode-se perceber, portanto, que em nenhum instante, faz-se menção aos enfermeiros. Pelo

contrário, observa-se uma enorme lacuna no que tange à inserção dos homens na

enfermagem.

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Por conseguinte, ao homem não cabia realizar determinadas atividades profissionais, tais

como a enfermagem. Tanto que é extremamente interessante o fato de que nas guerras, os

homens só ocupavam o posto de enfermeiros quando eram considerados “inaptos” para

exercer outra função; convertendo-se, pois, em uma espécie de castigo.

Durante a guerra, os soldados praticavam a enfermagem em um esforço para salvar vidas de seus

companheiros, porém sem conhecimento científico.

Inserção do Homem na Enfermagem

A inserção do homem na enfermagem no Brasil teve seu início no ano de1890, com a criação da escola

profissional de enfermeiros e enfermeiras, do Hospício nacional de Alienados, atual escola Alfredo

Pinto (UNI-RIO), no Rio de Janeiro sobre a direção da igreja católica, que exercia exclusividade no

tratamento e cuidados aos doentes, juntamente com as irmãs de caridade.

Todos eram subordinados a direção religiosa, porém esse cuidado era apenas de aspecto caritativo,

não tendo preocupação cientifica com a doença, porém a classe médica queria autonomia profissional, o que a

igreja não lhes permitia;

Inicia--se então grande conflito entre a igreja e a classe médica que aliada ao governo, alegavam péssimas

condições de trabalho, e prejudicava a assistência prestada aos doentes.

A igreja foi então substituída, assumindo a direção do hospital o Teixeira Brandão, e este substituem as irmãs de

caridade por enfermeiros e guardas para o cuidado aos doentes homens, e contratou enfermeiras

francesas para os cuidados das mulheres, porém o número de enfermeiras era muito superior aos enfermeiros.

Após a primeira guerra mundial, que determinou a recessão econômica no Brasil, epidemias assolaram o país,

sendo criado departamento Nacional de saúde Pública, dando início à reforma sanitária, criando

saúde Pública, dando início à reforma sanitária, criando-se escolas e serviços de

enfermagem, organizados e dirigidos por enfermeiras, sendo a única oportunidade da época

em que a mulher pode ter o direito à educação.

Origina-se então a escola de enfermagem Anna Nery, com alto nível deformação profissional,

criando reações de defesa aos interesses corporativos,formação profissional.

Com o objetivo de impor limites ao padrão, foi aprovado o regulamento do serviço de saúde do exército,

denominada escola sanitária divisionária, subordinada à diretoria de saúde da guerra, onde apenas

homens com formação militar poderiam exercer a função técnica em saúde.

Page 4: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENFERMAGEM E A INSERÇÃO MASCULINA

Destinada a formação de enfermeiros no corpo de saúde do exército, e subordinada à diretoria

de saúde da guerra, tanto a direção da escola, quanto o ensino aos alunos eram de responsabilidade

dos médicos militares, tendo a duração do curso de um ano, com estágio somente nos hospitais militares.

Foi decretado que o quadro de enfermeiros do exército deveria ser composto apenas por

enfermeiros militares, habilitados em concurso realizado pelo realizado pelo Hospital Central do Exército ou

hospitais de primeira classe, recebendo o posto de enfermeiro de 3º classe, podendo chegar

até enfermeiro 1º classe, excluindo total e legalmente as mulheres dos cuidados aos doentes.

Enfermeiro X Enfermeira

A importância do homem na enfermagem é tão grande quanto à importância da mulher, para manter a arte de

cuidar.

Hoje os homens representam cerca de 20% da população de enfermeiros formados.

Percebemos como é difícil a inserção do homem em uma atividade profissional

predominantemente feminina. Então, além do preconceito que enfrenta no próprio

contexto social, tendo muitas vezes questionada sua própria orientação sexual, acaba

encontrando obstáculos na relação profissional - usuário. Como, por exemplo, no momento

da realização de um exame citopatológico, no qual muitas mulheres se negam a serem

atendidas por um enfermeiro.

Estereótipos e preconceitos fazem parte da trajetória da história da enfermagem, podendo ser

determinados e reforçados pelo fato da enfermagem ser vista como uma profissão de

desempenho basicamente manual e exercida predominantemente por mulheres, o que leva

esta prática profissional a ser socialmente desvalorizada.

Atualmente, há enfermeiros atuando em diversas áreas da assistência, inclusive homens

assumem atividades nas áreas obstétricas e neonatal, embora se reconheça que o preconceito

nessa área ainda exista. Outra peculiaridade é a velocidade com que os homens avançam na

carreira, assumindo posições de comando e chefia em muito menor tempo que a mulher com

igual preparo profissional na enfermagem. Há ainda preconceito de algumas enfermeiras que

não aceitam bem a presença masculina na enfermagem, considerando o homem estranho,

preguiçoso ou menos capacitado. Outro estereótipo que o homem na enfermagem precisa

enfrentar é o rótulo de que todos eles são homossexuais.

Page 5: EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA ENFERMAGEM E A INSERÇÃO MASCULINA

Cabe ressaltar que as entidades de classe têm um papel importante na enfermagem no

sentido de divulgar informações à população sobre a atuação da equipe de enfermagem, a

atuação do enfermeiro, as competências que cabe a esse profissional do ponto de vista

técnico-científico e legal, possibilitando uma maior clareza perante a coletividade social acerca

do que é o enfermeiro e o que ele faz, sua área de atuação ou abrangência e os limites legais

das suas atividades profissionais.

Os profissionais de enfermagem precisam buscar estratégias que rompam suas raízes servis,

assumindo sua competência para enunciar seus próprios preceitos e desse modo integrar-se à

equipe de saúde como parte constituinte da mesma, em igualdade de condições com os outros

profissionais para decidir sobre seu próprio trabalho e sobre o trabalho na saúde.