europa napoleônica

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Texto sobre a Europa Napoleônica que analisa o processo de expansão e domínio do continente e as mudanças decorrentes do período até a época do Congresso de Viena.

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Page 1: Europa Napoleônica

Na conturbada época do Terror, quandoa guilhotina cortou a cabeça decentenas de pessoas, começou

a trajetória do então soldado, NapoleãoBonaparte. Sua meteórica carreira militar, levou-o desde cedo ao comando das tropas france-sas. Enfrentando inimigos mais poderosos, astropas sob o comando de Napoleão obtinhamsurpreendentes vitórias. Servindo à Revoluçãoem etapas diferentes, rapidamente Napoleãoatingiu o posto de general.

Na época do Diretório, comandando um precá-rio exército, pouco numeroso e mal equipado, mas àcusta de uma ferrenha disciplina militar, conseguiu aconquista de boa parte do território italiano.

Depois da vitória na Itália, foi para cima da In-glaterra que era o inimigo mais poderoso da França.Numa investida ousada, Napoleão atacou o Egito —rota de passagem das mercadorias que vinham da Ín-dia para os ingleses.

Na Campanha do Egito não obteve a vitória, masconseguiu um retorno triunfal driblando a poderosa es-quadra inglesa mar Mediterrâneo. Por tudo isso, foi re-cebido como herói em Paris.

“No clima incerto e politicamente fragmenta-do em que governa o Diretório, o único ponto seguroconstitui-se nas vitórias militares, cujos ecos logo che-gam a Paris.

“Povos da Itália: o exércitofrancês vem romper os seusgrilhões; o povo francês éamigo de todos os povos.Tenham confiança em nós.Vossos bens, vossa religião,vossos costumes serãorespeitados. Fazemos a guerracomo adversários generosos esó sentimos rancor contra ostiranos que vos escravizam.”

Napoleão Bonaparte

“Aterrei o abismo monárquico e pus ordem no caos”.Napoleão. 1799

“Aterrei o abismo monárquico e pus ordem no caos”.Napoleão. 1799

Autoria: Edgard Chaves

Page 2: Europa Napoleônica

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Apesar de tudo, e com rapidez, a França am-plia suas fronteiras incorporando Flandres e a parteespanhola de São Domingos. Há grandes problemasmilitares, mas há também homens à altura para resolvê-los. E dentre todos, em primeiríssimo plano Bonaparte, que ultrapassando os Alpes, penetra naItália, onde conduz uma campanha queculmina com uma série de fulgurantesbatalhas estabelecendo não só as basesde um sucesso militar, mas também fixan-do as premissas daquela que seria, depoissua carreira política”. 1

No outono de 1799, o Diretórioagonizava sofrendo ataques dos realistase dos jacobinos. Com o apoio do exércitoe da burguesia, Napoleão invadiu a sessãoda Assembléia e depois de inflamado dis-curso determinou o fim do Diretório, subs-tituindo-o pelo regime do Consulado. Des-tituindo o governo burguês com o Golpedo 18 Brumário, o general respondia aosanseios da própria burguesia. Napoleãoera o homem de maior prestigio na França,representava para todos, a esperança deconsolidação da revolução, depois de uma década deinstabilidade.

De imediato, priorizou a organização internado país estruturando um sistema eficiente de cobrançade impostos, visando coibir o desvio de recursos. Aeficácia do sistema era garantida por um numeroso cor-po de funcionários públicos que vasculhavam o país,

punindo rigorosamente os infratores. Para centralizare desenvolver a economia foi criado o Banco Estatalda França, com o objetivo inicial de canalizar recursospara a criação de indústrias.

Com a Igreja Católica, Napoleão promoveu areaproximação, tornando o catolicismo a principal re-ligião do país. O renascer da Igreja, através daConcordata de 1801, tinha um aspecto nitidamenteideológico, pois estava vinculado à exaltação doregime.

Em 1804, ao mesmo tempo em que se tornouimperador, aprovou o fantástico Código Civil – con-siderado o legado jurídico mais importante, depois doDireito Romano. A nova Constituição preservava a li-berdade de consciência, igualdade perante a lei, direi-to de escolher a profissão, além de assegurar a propri-edade como o direito primordial do cidadão.Paradoxalamente, em relação ao trabalho, estabeleciaa proibição das greves e impedia a associação sindical.

“Ao povo é necessário uma religião. É preciso que esta religião esteja nas mãos do governo. Hoje emdia, cinqüenta bispos emigrados e pagos pela Inglaterra conduzem o clero francês. É necessário destruiresta influência deles; para isso, é indispensável a autoridade do Papa. Dirão que sou papista; eu não sou

coisa alguma; eu era maometano no Egito, serei católico aqui para o bem do povo. Não acredito emreligiões... Mas é idéia de um “Deus”, e levantando as mãos para o céu: “Quem foi que fez tudo isto?” Estávocê muito enganado, o clero sempre existe e existirá enquanto houver no povo um espírito religioso e esteespírito lhe é inerente. Temos visto repúblicas, democracias, tudo que vemos, mas nunca um Estado semreligião, sem culto, sem padres. Não será melhor organizar o culto, disciplinar os padres do que deixar as

coisas como estão? Agora os padres estão pregando contra a República; será bom deportá-los? Não!Porque para isso seria necessário mudar o sistema de governo. O que o torna amado pelo povo, é o seu

respeito pelo culto.” 2

“Na minha carreira en-contrar-se-ão erros, sem dúvi-

da: mas Arcole, Rivoli, asPirâmides, Marengo,

Austerlitz, Iena, Friedland(batalhas) são de granito; odente da inveja nada pode

contra elas”Napoleão

Posse deNapoleão, nopalácio de PetitLuxemburg,pintura deCouder

Autoria: Edgard Chaves

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A liberdade social sob a ótica burguesa foimantida, porém a liberdade política foi praticamenteanulada, com o decreto da censura e o controle daimprensa. No futuro, referindo-se com orgulho aoCódigo Civil, o imperador diria: “Minha verdadeiraglória não é ter ganho 40 batalhas (...) Waterlooapagará a lembrança de tantas vitórias (...) Masaquilo a que nada destruirá, que viverá para sempreserá meu Código Civil”.

“Entre 1799 e 1800, o primeiro-cônsul e seusassessores haviam elaborado um sistema legal in-teiramente novo. Uma década de revoluçãoreformara gradativamente as leis do Antigo Regime,às vezes drástica; o novo Código Civil.- logo co-nhecido como Código Napoleônico - consolidouessas reformas num bloco único de legislação. Ovelho direito consuetudinário do Norte da Françafoi amalgamado ao direito romano do Sul, forman-do uma unidade inconsútil. E criou-se um novocódigo criminal, com juízes para aplicá-lo. Maistarde, o código seria ampliado para regular e trans-formar quase todas as funções da vida francesa.

Com efeito, uma das provisões - a que insistiana divisão igual da propriedade entre os filhos - fezmais do que a Revolução para destruir o poder davelha aristocracia rural da França”.3

EXPANSÃO NA EUROPAEXPANSÃO NA EUROPAEXPANSÃO NA EUROPAEXPANSÃO NA EUROPAEXPANSÃO NA EUROPA

Napoleão deu um tratamento implacável às na-ções absolutistas. Entre 1804 e 1806, a França, sob ocomando do imperador, tornou-se a nação mais pode-rosa da Europa. A primeira investida até que não foimuito feliz, pois a batalha de Trafalgar (1804), com osingleses, resultou na derrota da esquadra francesa, quese viu impedida de cruzar o canal da Mancha. Entretan-to, no continente a superioridade francesa era incon-testável. Como um castelo de cartas se desmanchando,os exércitos inimigos foram se ajoelhando aos pés dastropas napoleônicas. Em dezembro de 1805, foi a vezda Áustria, na batalha de Austerlitz. O embate final foinos lagos gelados, a 100 quilômetros de Viena. Oscanhões bombardeando o gelo derrubavam humilhadossoldados, que se afogavam nas águas congeladas.Após essa vitória dissolveu-se o antigo Sacro ImpérioRomano Germânico, nascendo em seu lugar aConfederação do Reno - reunião de 16 Estadosgermânicos aliados da França napoleônica.

O Tempo da História

1789

REVOLUÇÃOFRANCESA 1799

GOLPE DO

18 BRUMÁRIO

1804

CÓDIGOCIVIL

EXPANSÃO

1806

BLOQUEIOCONTINENTAL 1812

CAMPANHADA

RÚSSIA

1815

DERROTAEM

WATERLOO

Retrato de 1807.Napoleão écoroadoimperadorhereditário daFrança.

Autoria: Edgard Chaves

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aA Prússia, insatisfeita com o fato, preparou-se

para destruir o arrogante Napoleão. Em 1806, em Ienarealizou-se a grande batalha que, mais uma vez, provoua força dos soldados franceses. As tropas napoleônicasrevolucionaram as táticas de guerra, atacando os inimi-gos pelos flancos com o apoio do fogo cerrado doscanhões. Enquanto isso, os prussianos reagiam deforma convencional, lutando em bloco, acreditando nopoder das baionetas.

Os soldados prussianos eram, emsua maioria, camponeses famintos queiam para a guerra empurrados, destituí-dos de um ideal ou um objetivo patrió-tico. O alto comando era formado pornobres corruptos que não abriam mãode suas inúmeras regalias. Do outrolado, os soldados franceses eram re-crutados nas camadas mais humildes,que tinham no exército revolucionário apossibilidade de ascender na hierarquiamilitar. Essas mortais desigualdades aniqui-laram o sonho prussiano. Com a derrota, o imponentereino da Prússia tornou-se mais um Estado vassalo deNapoleão.

Entusiasmado com a vitória em terras austría-cas, o imperador marchou com suas tropas para o lesteeuropeu na intenção de enfrentar os russos. Em fins de1806, já haviam atravessado a Polônia onde encontra-ram um grande destacamento inimigo. O primeiro com-bate foi desfavorável aos franceses. Quando parecia imi-nente a derrota, a cavalaria veio em socorro salvandoos soldados de Napoleão que estavam acuados, semchances de reagir.

Animados com a reação, os soldados francesesforam, com tudo, para cima dos russos, conseguindo avitória em Friedland. Em 1807, Napoleão assinou umacordo de paz com a Rússia e Prússia, reduzindo o ter-ritório prussiano em 30% do seu tamanho anterior. Alio imperador constituiu o ducado de Varsóvia, que ser-

viria de embrião para a futura Polônia. As fronteirasrussas também foram reduzidas para criar um cinturãode segurança entre o império russo e as regiões domi-nadas pela França.

Após esse furacão militar a Europa passou ater outro desenho geopolítico. O território francês au-mentou sensivelmente com a inclusão da Holanda,Sabóia e as terras do Reno. A Suíça e Confederação

do Reno eram dependentes da França, mantidassob o regime de protetorado. Na Itália, a

maior parte dos reinos era subordina-da à autoridade de Napoleão, sem fa-lar no seu casamento com a princesaaustríaca, Maria Luísa, que lhegarantiu direitos no reino da Áustria.À Prússia, foi imposta a deprimentesituação de reduzir o exército a 40

000 soldados. Na Europa continen-tal, só Portugal e Espanha não tinham

sentido a fúria napoleônica. Depois detantas vitórias, faltava somente um inimi-

go – a temível Inglaterra.

BLOQUEIO CONTINENTALBLOQUEIO CONTINENTALBLOQUEIO CONTINENTALBLOQUEIO CONTINENTALBLOQUEIO CONTINENTAL

Resolvido a dar um ponto final no poderio in-glês, Napoleão decretou, em 1806, o famoso “Blo-queio Continental”. O imperador sabia que a Inglater-ra se garantia no ativo comércio com os países euro-peus. Impedindo a venda das mercadorias, obrigava oinimigo a utilizar as reservas de ouro para a compra dealimentos e outros gêneros, não produzidos na Ingla-terra. Os aliados eram subsidiados pelo ouro inglês,que financiava a construção de navios, compra de ar-mas e até calçados utilizados pelos soldados. Com basenessa realidade, Napoleão decidiu isolar os paises eu-ropeus, privando-os do consumo das mercadorias in-glesas.

O eleganteserviço de jantarao qual pertenceo prato daEsfinge eracomposto de 66pratos comvistas do Egito,criteriosamentecopiados dedesenhos feitosno local.

“Eu limpei a Revolução. Edepois sobre o que poderiam

atacar-me de que um historiadornão pudesse defender-me? (...)Enfim, seria a minha ambição?

Ah! sem dúvida, ele encontra-la-áem mim - e muita; mas a maior emais alta que talvez jamais tenhaexistido: a de estabelecer, de con-

sagrar o império da razão e opleno exercício, o inteiro gozo detodas as faculdades humanas”.

Napoleão

Atravessar osAlpes com umenorme exército jáconstitui umaproeza. Chegandoao lado italiano,ainda teriamenergia parainfligir a derrotaaos austríacos.

Autoria: Edgard Chaves

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O Bloqueio Continental visava também prote-ger a indústria francesa, que ainda era muito nova paracompetir com a indústria inglesa. Não foi à toa, que aburguesia deu apoio integral a Napoleão. Se nada acon-tecesse de errado, a França tinha tudo para se tornaruma grande potência industrializada. Para garantir oBloqueio, foi organizado um esquema monstruoso defiscalização em todos os portos da Europa. Napoleãocontava com a fidelidade dos aliados, que a princípio,haviam concordado em colaborar.

Contudo, o plano que parecia perfeito, come-çou a falhar quando os países ibéricos colocaram obs-táculos ao Bloqueio Continental. A Espanha prometiaadesão, mas exigia em troca o domínio de Portugal.Do outro lado, o rei português fazia jogo duplo, acei-tando às escondidas, as mercadorias da Inglaterra. Vi-sando cortar o mal pela raiz, Napoleão decidiu atacara península Ibérica. Na passagem pelo território espa-nhol, forçou a renúncia do rei Fernando VII, entre-gando o trono ao irmão José Bonaparte.

Os franceses contavam com aliados liberais,que deram apoio à invasão, afinal, o atraso ibérico foraprovocado por uma elite conservadora e excessiva-mente religiosa, que contrastava com as idéias liberaise revolucionárias de Napoleão. Derrubando as antigase ultrapassadas monarquias absolutistas, as conquis-tas francesas, inicialmente, estavam associadas àliberdade e transformação.

Em Lisboa, a Família Real e centenas de no-bres não esperaram o ataque das tropas napoleônicas,preferindo a fuga para o Brasil. Como se verá depois,o desdobramento das medidas tomadas por D. João VIem terras brasileiras, marcou profundamente nossahistória. Com a conquista de Portugal, os francesespareciam neutralizar o último país que poderia mantercomércio com a Inglaterra. O problema é que esses

cálculos só funcionaram na teoria, pois, na prática, astropas napoleônicas encontraram uma feroz resistênciaem terras espanholas. A junta rebelde formada emSevilha comandou a reação aos invasores franceses,anulando a força dos 120.000 soldados franceses.Aproveitando a confusão, 14.000 soldados inglesesdesembarcaram na Espanha, renovando o vigor dosrebeldes. Com muito esforço e inúmeras perdas, oimperador conteve a reação espanhola, mas essa vitóriamomentânea não assegurou a definitiva conquista daEspanha. Até o final, Napoleão teria de conviver com aguerrilha, sem conseguir derrotá-la. Mais tarde diria: “aEspanha foi a verdadeira úlcera que carreguei dentrode mim”.

O BLOQUEIO FRACASSAO BLOQUEIO FRACASSAO BLOQUEIO FRACASSAO BLOQUEIO FRACASSAO BLOQUEIO FRACASSA

Em menos de um ano, o Bloqueio Continentaltinha virado uma grande “canoa furada”. Efetivamente,a indústria francesa mostrara-se incapaz de suplantar apoderosa indústria inglesa. Impedida de realizar comér-cio com as nações européias, a Inglaterra voltou-se para

as colônias de Espanha e Portugal, forçando ou “suge-rindo” a assinatura de tratados de livre-comércio. A vindada corte portuguesa para o Brasil ilustra bem essarealidade. Em 1808, o afobado rei D. João VI decretou aAbertura dos Portos às Nações Amigas, claramentebeneficiando a Inglaterra – única nação amiga de Portu-gal.

Com as colônias espanholas na América não foimuito diferente. Empenhado em lutar com as tropas fran-cesas, o rei espanhol terminou esquecendo as colônias,que se beneficiaram do livre-comércio com a Inglater-ra. Mais tarde, não aceitariam a volta ao esquema anti-go, acarretando sérios atritos com a metrópole, desen-cadeando o processo que levaria à independência.

Impressionadoscom a corageme o gêniomilitar deNapoleão, seussoldadosrealizavamverdadeirosmilagres nocampo debatalha.

Dobrando ocabo deTrafalgar, amodesta frota

francesa teve umencontroinesperado - aformidávelesquadrainglesa, senhoraabsoluta dosmares. Seishoras de terríveiscomabates e oexércitonapoleônicosofreu a suaprimeira grandederrota.

Autoria: Edgard Chaves

Page 6: Europa Napoleônica

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aNa Europa, a falta de mercadorias afetava todos

os países, incluindo a França. Por mais que as indústri-as francesas tivessem proteção do governo, era impos-sível, em tempo recorde, conseguir abastecer a Europainteira. Ironicamente, a própria França teve de comprarprodutos ingleses para que seus soldados tivessem asbotas nas frentes de combate. “O próprio governo fran-cês não pode prescindir das mercadorias inglesas. Oexército francês estava vestido com tecido inglês eusava sapatos ingleses. O governo francês, oficial-mente, permitiu a compra de alguns artigos na Ingla-terra ao mesmo tempo em que agentes franceses, portoda a Europa, apreendiam o contrabando inglês,cortavam em pedaços as peças de tecido inglês e quei-mavam em fogueiras as mercadorias inglesas, bara-tas e de excelente qualidade”. 4

O fracasso do bloqueio expôs o impérionapoleônico a inúmeras dissidências,dentre elas a Rússia, que desenvolvia

intenso contrabando com a Inglaterra. O movimentode navios ingleses em águas russas lembrava a épocaanterior ao bloqueio. Em toda a Europa, a realidadeera a mesma. Navios ingleses desembarcando merca-dorias, derrubando na prática o Bloqueio Continental.Com o objetivo de retomar o controle das áreas domi-nadas, o imperador ensejou a maior campanha militarda história.

Foram recrutados soldados em diversos paí-ses para compor a fantástica tropa de 650.000 homens,no intuito de invadir a Rússia. Napoleão acreditavaque o domínio do território russo colocaria o resto docontinente de joelho aos seus pés.

A estratégia se baseava na luta contra os rus-sos nas regiões próximas à fronteira. O exército de650.000 soldados atacaria em bloco, para dizimar aresistência do inimigo. Prevendo dificuldades,Napoleão enviou um grande comboio de suprimentospara abastecer as tropas. As reservas de alimentos dis-poníveis na Rússia, eram muito aquém das necessida-des francesas. No entender de Napoleão, em um mês aRússia estaria dominada.

Com essa expectativa, as tropas napoleônicasinvadiram o território russo em junho de 1812, aprovei-tando das vantagens oferecidas pelo clima ameno doverão. A certeza do sucesso impediu o imperador deenxergar a armadilha que o esperava. Quando abriu osolhos o desastre já era irreversível. A “grande campa-nha” resultou na “grande derrota”.

O primeiro grande problema foi o avanço lentodas tropas. As carroças de alimentos andavam a passode tartaruga, facilitando o recuo das tropas russas.Muitas vilas e plantações foram arrasadas pelospróprios russos, acentuando a falta de alimentos.Inúmeros combatentes do lado francês desertavam, àmedida que a fome aumentava. Afinal, muitos soldadosnão tinham o menor compromisso com a causafrancesa, pois haviam sido recrutados em regiõesdominadas. O grupo de ataque frontal havia se reduzidoa 150.000 soldados que chegaram em Moscou, no mêsde setembro.

O general Kutusov defendeu a cidade abaten-do 70.000 soldados de Napoleão. Após o estrago, ocomandante russo retirou suas tropas para o Norte,enquanto o imperador francês colhia uma suposta vi-tória marchando pelas ruas abandonadas de Moscou.

A Campanha daA Campanha daA Campanha daA Campanha daA Campanha daRússiaRússiaRússiaRússiaRússia

“Envergando as cores nacionais, a águia voará de

“Uma penosa marcha de1500 quilômetros, através deplaníceis geladas e devasta-da, os espera, e 400.000 ho-

mens vão perecer no trajeto,decretando o melancólico fim

do grande exército”.

Autoria: Edgard Chaves

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O trono do czar foi ocupado por Napoleão, quecobrava de Alexandre I o reconhecimento da derrota.A surpreendente resposta do czar foi um novo ataqueàs tropas napoleônicas, completado pelo incêndio quedestruiu 1/3 da cidade acabando com o resto dos su-primentos. Sem poder de reação, os franceses bate-ram em retirada pela rota já devastada pelo avançoanterior. No retorno, enfrentaram um inimigo que nãoestava nos planos de Napoleão. Com efeito, o frio de20° graus negativos sepultou muitos soldados sob aneve, congelando o resto de esperança e o sonho devitória. Do monstruoso exército que invadira a Rússia,apenas 40.000 homens conseguiram ultrapassar a fron-teira da Polônia. O caminho de volta foi uma correriadesordenada, favorecendo a organização das forças ini-migas.

Em outubro de 1813, Áustria, Prússia, Rússiae Inglaterra reuniram 300.000 soldados para cercaro inimigo na batalha de Leipzig. Extenuadas, astropas de Napoleão não puderam suportar apressão, recuando até o território francês. Depoisde vários meses em luta, os aliados vislumbraram avitória com a renúncia do imperador. Em abril de1814, o comandante francês embarcou para a ilhade Elba, onde se esperava que teria o exíliodefinitivo. Para substituí-lo foram buscar o ambiciosoLuís XVIII, que permanecia todo esse tempo,escondido na Inglaterra.

Contam as más línguas, que o rei havia aplau-dido a morte do irmão Luís XVI, apostando que cedoou tarde, teria a sua vez no trono francês. Quando es-tava começando a comemoração no palácio deVersalhes, uma notícia estragou a festa dos nobres dacorte. De forma cinematográfica, Napoleão conseguiufugir de Elba e já se encontrava a poucos quilômetrosde Paris. Tinha como companhia um grupo fiel de sol-dados dispostos a dar a vida pelo general. Depois dereassumir o trono, Napoleão faria o “Governo dos CemDias”.

“Luís XVIII estava longe de ser popular. A mai-oria dos veteranos de Napoleão desprezava-o; os cam-poneses temiam que a restauração da aristocracia lhescustasse os poucos privilégios que a Revolução lhestrouxera; e as classes médias eram contra um regimeque ameaçava sua nova posição. Diante da insatisfa-ção, Napoleão arriscou sua última jogada: a 1° demarço com umas poucas centenas de seguidores de-sembarcou perto de Cannes. As tropas enviadas porLuís para prendê-lo bandearam-se para seu lado e, a20 de março, ele chegou a Paris. Luís fugira e a cida-de aclamou com alegria o seu imperador. Com menosjúbilo, os aliados proclamaram-no fora da lei. Umairresistível invasão da França foi planejada para ju-lho; até então, 200.000 soldados aliados, sob o co-mando de Wellington e do prussiano Blücher, estari-am alertas no oeste dos Países Baixos - a atual Bélgi-

ca”. 5Aproveitando que os aliados não estavam

completamente organizados, o imperador juntouseu exército para o confronto no território belga.Um erro de cálculo permitiu aos prussianos umrecuo organizado até chegarem ao lado das tro-pas inglesas. A união das duas tropas foi fatal

para a derrota de Napoleão. Para ajudar os aliados, umachuva torrencial impediu a chegada da artilharia france-sa. O movimento das tropas levou todos para um localchamado Waterloo, que terminaria por emprestar o nomea essa memorável batalha. Até a invencível Guarda Im-perial foi obrigada a bater em retirada, antes da inevitá-vel derrota. Desprovido de soldados, lutando com tro-pas abatidas na sua condição moral, restava a Napoleãoa dignidade de perder em pé. Dessa vez seria exilado napequena ilha de Santa Helena, onde morreria em 1821.

O mito Napoleão provoca sem dúvida, grandepolêmica. Analisando-se friamente a época, enxerga-mos inicialmente um governante implacável, que repri-miu os inimigos internos, suprimindo quase todas asliberdades individuais.

campanário em campanário até as torres de Notre-Dame”

à esquerda: Oquadro dabatalha deWaterloomostra omomento críticoquando umataque mortalderrotou aGuarda Imperialde Napoleão.

à direita: Oimperadorderrotadodespede-se desua guardaimperial nopalácio deFontainebleau

Autoria: Edgard Chaves

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Após o exíliode Napoleão as po-tências vencedorasse reuniram em Vie-na, com o objetivode jogar uma pá decal em tudo que

lembrasse a Revolução Francesa. Os diplomatasconstruíram uma nova (ou antiga!!) Europa com basenos princípios legitimadores das monarquias absolutas.Para tanto, usaram como fundamento o princípio daLegitimidade, que se contrapôs ao Liberalismoburguês. Como afirma o historiador René Remond: “

A Legitimidade reside no valor reconhecidoda perenidade. É legítimo o regime que dura, querepresenta a tradição, que tem atrás de si uma longahistória. A legitimidade é essencialmente histórica etradicionalista. Essa identificação com o tempo jus-tifica-se, de modo positivo e pragmático: se um regi-me permanece é porque correspondia às necessida-des, é porque encontrou adesão nos espíritos, é por-que foi eficaz, é porque foi capaz de burlar as provasdo tempo”. 7

O clima político de 1815 refletia o choque dosprincípios antagônicos. De um lado, as forças de con-servação - rei e aristocracia, de outro, as forças detransformação - burguesia e camadas populares. Mo-mentaneamente a situação pendia a favor da aristocra-cia. Restava saber por quanto tempo a burguesia e opovo aceitariam essa realidade.

Arquiteto de uma política destinada adefender a Revolução, Napoleão nunca es-queceu a burguesia – que havia apoiado suaascensão ao poder. No continente construiuum imenso império, que se estendeu por todaa Europa, derrubando pelo caminho as ve-lhas e tradicionais estruturas feudais, abrindoespaço para a expansão da burguesia nos pa-íses conquistados. Para reverter essa situa-ção, as forças conservadoras convocaram oCongresso de Viena. Entusiasmados, os líde-res vencedores não viam que a Europa, de-pois do furacão napoleônico, nunca mais se-ria a mesma.

“Enquanto continua o debate sobreNapoleão os historiadores concordam emdois pontos. Primeiro, sua vida foi excepci-onal. Um homem que se fez sozinho, que con-trolou as forças revolucionárias da época eimpôs a sua vontade à história. Napoleão ti-nha o direito de dizer que sua vida era umromance. Sua força, seu gênio militar e secarisma levaram-no à culminância de poder;sua incapacidade de moderar as própriasambições golpeou profundamente a Europa, deformou seus critérios e provocou sua queda. Seu orgulhosem limites, a hibrys dos dramaturgos gregos, teria espantado Sófocles; as dimensões de sua mente e ascomplexidades de sua personalidade teriam intrigado Shakespeare; seu cinismo e sua total falta de es-

crúpulos teriam impressionado Maquiavel.Em segundo lugar, os historiadores concordam em que, ao difundir

suas idéias e as instituições revolucionárias, Napoleão tornou impossívelrestabelecer o Antigo Regime depois da queda do Imperador. A destruiçãodos resquícios feudais, a secularização da sociedade, a transformação doEstado dinástico no moderno Estado Nacional e a ascendência da burgue-sia estavam assegurados. O novo conceito de guerra e o novo espírito donacionalismo também se tornaram parte definitiva do cenário europeu. Nocurso de sucessivas gerações, os métodos da guerra total a serviço do naci-onalismo beligerante destruíram a grandiosa visão napoleônica de umaEuropa unida e subverteram o humanismo liberal que foi o legado essencialda Revolução Francesa”6 .

O Congressode Viena

Autoria: Edgard Chaves

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No Congresso, uma das estrelas maisbrilhantes foi o príncipe Metternich, da Áus-tria. Obstinado, defendeu e aprovou o“Princípio das Compensações”, garantindo umrazoável equilíbrio territorial entre as nações eu-ropéias. O novo mapa do continente assegu-rou vantagens para os quatros grandesvencedores. Inglaterra, Áustria, Prússia eRússia, cada um por seu lado, saíram do encon-tro inflados por várias anexações territoriais.

De início, foram prejudicados os reinose países aliados de Napoleão. O antigo ducadode Varsóvia que era uma espécie de rascunhoda Polônia, foi dividido entre Áustria, Prússia eRússia, que terminou ficando com o maior pe-daço. A Polônia só apareceria novamente nomapa, após a Primeira Guerra Mundial; até lá,estaria nas mãos dos ambiciosos inimigos. OsReinos Italianos do Norte foram loteados pela Áus-tria, que exerceu um controle político na região até aUnificação Italiana, em 1870. O anti-nacionalismo de1815 reverteu a tendência unificadora da época deNapoleão. A mesma deliberação foi imposta aos esta-dos germânicos, desmanchando a Confederação doReno e surgindo em seu lugar a ConfederaçãoGermânica, sob a tutela da Áustria e Prússia. Nessecaso contou bastante a pressão da Inglaterra, que ti-nha medo de conviver com um Estado germânico uni-do e poderoso. Ao longo do século XIX, por diversasvezes, os alemães tentariam a unificação para final-mente, consegui-la em 1870.

A Inglaterra, embora não tenha obtido anexa-ções no continente, saiu do Congresso de Viena comum invejável patrimônio colonial. Na visão do viscon-de de Castlereagh, não valia a pena brigar por miga-lhas na Europa. Com sua esperta atuação, a Inglaterrarecebeu a região do Cabo, as ilhas do Ceilão, Maurícia,Tasmânia, Hong-Kong, Trinidad e Tobago. Conseguiuainda a livre navegação nos mares e a proibição inter-nacional do tráfico de escravos.

O interesse de crescimento econômico ca-nalizava a Inglaterra para a disputa das regiões co-loniais, que os outros países praticamente haviamrejeitado. Curioso notar que os ingleses, durantedécadas, haviam lucrado com o tráfico de escra-vos, vendendo-os a diversas colônias da América.Porém o desenvolvimento de sua indústria, fez daInglaterra uma incansável defensora do fim do trá-fico. Os motivos óbvios revelavam o desejo de au-mentar o mercado consumidor para as produtivasindústrias inglesas.

Mas nem tudo foi unanimidade entre as na-ções vencedoras. A teoria das Compensações foirejeitada pelo czar Alexandre I, da Rússia. Sua in-sistência em ganhar a maior parte dos territóriospoloneses criou obstáculos, dificultando a assina-tura do acordo definitivo. A desunião do grupo deua brecha para o representante da França entrar emcena de forma brilhante.

Tayllerand, diplomata francês de grande habili-dade, argumentou que o equilíbrio europeu dependiada preservação do território francês. Respaldado noPrincípio da Legitimidade, defendeu a permanênciados mesmos limites territoriais que a França tinha antesda Revolução em 1789. Fantástico! O argumento termi-nou emplacando e o diplomata Tayllerand pôde acres-centar ao seu currículo, a inacreditável integridadeterritorial francesa, impedindo que o país fosse dividi-do, como acontecera com os outros derrotados.

Bem ou mal, as decisões do Congresso de Vienaevitaram por quase cem anos, a deflagração de uma novaguerra generalizada. “Fica claro pelo curso das dispu-tas desse período que o material inflamável nas rela-ções internacionais simplesmente não era explosivo obastante para deflagrar uma guerra de grandes pro-porções.

No intervalo deuma sessão doCongresso deViena, o princípeMetternichoferece a seushóspedes ummagnífico baile afantasia.

A Europa do Congresso de Viena

Autoria: Edgard Chaves

Page 10: Europa Napoleônica

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aDas grandes potências, os austríacos e os

prussianos eram muito fracos para contar muito. Osingleses estavam satisfeitos. Por volta de 1815, elestinham obtido uma vitória mais completa do que qual-quer outra potência em toda a história mundial, tendoemergido dos 20 anos de guerra com a França como aúnica economia industrializada, a única potência na-val - em 1840 a marinha britânica tinha quase tantosnavios quanto todas as outras marinhas reunidas - evirtualmente a única potência colonial do mundo.(...)A Rússia, conquanto não tão saciada, tinha somenteambições territoriais limitadas, e nada havia que pu-desse por muito tempo - ou pelo menos assim parecia- atrapalhar o seu avanço”. 8

A SANTA ALIANÇAA SANTA ALIANÇAA SANTA ALIANÇAA SANTA ALIANÇAA SANTA ALIANÇA

Os acontecimentos de 1815, suplantarammomentaneamenteos ideais liberais. Entretanto, asforças de conservação “montavam num animal bravio”sem medir as conseqüências e os riscos da empreitada.Ao dividir a Europa de acordo com seus interesses, osvencedores desprezaram por completo a força doNacionalismo, que havia sido despertado na épocanapoleônica. Era, no mínimo, ingenuidadeachar que italianos, alemães e poloneses iriamse acomodar, abandonando as pretensões deunidade nacional.

Os aliados vencedores criaram a SantaAliança – espécie de braço armado da aristo-cracia. O grupo formado pelas nações vence-doras tinha como objetivo, impedir osurgimento de um novo foco revolucionárioou movimento nacionalista. A estratégia valianão só para o continente europeu, estenden-do-se a qualquer parte do mundo, onde hou-vesse focos revolucionários. A Santa Aliançachegou a interferir de forma repressiva nosmovimentos unificadores da Itália(Carbonários - 1822) e nos reinos germânicos,em 1823. De qualquer forma, envolvendopaíses de interesses opostos, o destino daSanta Aliança era o fracasso. Na tentativa de interven-ção na América Espanhola, na época dos movimentosde independência, teve a oposição da Inglaterra, quefoi veementemente contra a interferência dos “aliados”.Na verdade, a união dos vencedores não era tão frater-na, como parecia a princípio.

Na Europa, a Santa Aliança teve uma atuaçãobastante contraditória. De um lado, atuou reprimindo arevolta espanhola de 1820, mas de outro, fez vista grossaao movimento revolucionário português, revelando-seconivente com a débil Revolução do Porto. Constata-mos então que o Congresso de Viena e as forças deconservação tiveram, em 1815, uma vitória momentâ-nea. Em toda a Europa fermentava o descontentamentoque unia burgueses, pessoas humildes, operários eagitados nacionalistas. Logo em seguida, um novo ven-daval revolucionário varreria o continente europeu. Apartir de 1820, o ‘trem da revolução’ recomeçaria suadevastadora viagem.

1 In. A Revolução Francesa. Grandes Aconte-cimentos da História. Editora Três. Pág. 79.

2 In. Carvalho, Delgado de. História Docu-mental. Editora Record. pág. l78 e 179

3 In. Lucas, Colin. O Império de Bonaparte. AForça da Iniciativa. Coleção Time-Life. Abril Livros.Pág. 15.

4 In. Efimov, N. História Moderna. Centro doLivro Brasileiro. Lisboa. Pág. 87.

5 In. Lucas, Colin. Op. Cit. Coleção Time-Life.Pág. 37.

6 In. Perry, Marvin. Civilização Ocidental. UmaHistória Concisa. Martins Fontes Editora. Pág. 463-464

7 In. O Século XIX. Editora Cultrix. Pág. 18.8 In. Hobsbawm, Eric J. A Era das Revolu-

ções. 1789 - 1748. Editora Paz e Terra. Pág. 124.

Recebendo para o Congresso deViena o Czar Alexandre I e FredericoII da Prússia, o imperador austríaco,Francisco II teria com êles ummundo inteiro a dividir

Autoria: Edgard Chaves