Ética e psicologia forense

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1-Introdução Na estação “cabalista” Parque do Metro de Lisboa, existe uma frase, atribuída a Giles Deleuze: “ A Ética é estar à altura do que nos acontece”. Esta afirmação, na sua simplicidade e latitude, consegue sintetizar, em nosso entender, todo o complexo jogo do indivíduo no mundo. A disposição para a acção (intencionalidade), é o garante da transcendência dos seres humanos, no intuito de se alcançar o livre arbítrio (que não existe na sua totalidade). Para estar à altura dos acontecimentos, devemos estar conscientes de todas as possibilidades a enfrentar, para que com isso, uma acção em potência se desenvolva, no sentido da melhor resolução do fenómeno. Por outro lado, ao vivermos em comunhão com todos os outros seres vivos do planeta, e dado a tendência caótica do livre arbítrio, o ser humano deve-se munir de códigos, para que os seus actos não provoquem a diminuição do livre arbítrio do “outro”. Assim, a frase de Giles Deleuze tem um sentido lato e abstracto característico dos pensadores/filósofos que, sendo muito importante, carece de pragmatismo, que nos ajude a resolver os problemas que, nós humanos, encontramos dia-a-dia. Isto é, conhecer e compreender os princípios abstractos subjacentes aos nossos actos é essencial, no entanto, quando nos encontramos perante uma situação real muitas vezes, necessitamos de orientações, mais específicas, para resolver os dilemas.

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Page 1: Ética e psicologia forense

1-Introdução

Na estação “cabalista” Parque do Metro de Lisboa, existe uma frase, atribuída a Giles

Deleuze: “ A Ética é estar à altura do que nos acontece”. Esta afirmação, na sua simplicidade

e latitude, consegue sintetizar, em nosso entender, todo o complexo jogo do indivíduo no

mundo. A disposição para a acção (intencionalidade), é o garante da transcendência dos seres

humanos, no intuito de se alcançar o livre arbítrio (que não existe na sua totalidade). Para

estar à altura dos acontecimentos, devemos estar conscientes de todas as possibilidades a

enfrentar, para que com isso, uma acção em potência se desenvolva, no sentido da melhor

resolução do fenómeno.

Por outro lado, ao vivermos em comunhão com todos os outros seres vivos do planeta,

e dado a tendência caótica do livre arbítrio, o ser humano deve-se munir de códigos, para que

os seus actos não provoquem a diminuição do livre arbítrio do “outro”.

Assim, a frase de Giles Deleuze tem um sentido lato e abstracto característico dos

pensadores/filósofos que, sendo muito importante, carece de pragmatismo, que nos ajude a

resolver os problemas que, nós humanos, encontramos dia-a-dia. Isto é, conhecer e

compreender os princípios abstractos subjacentes aos nossos actos é essencial, no entanto,

quando nos encontramos perante uma situação real muitas vezes, necessitamos de orientações,

mais específicas, para resolver os dilemas.

Deste modo, com este trabalho, pretendemos elucidar quais as teorias e princípios

básicos que devem reger a prática ética do psicólogo, assim como discriminar quais as áreas

mais propicias ao surgimento, em contextos forenses, de conflitos éticos e, finalmente, sugerir

um orientação para os resolver de forma pragmática e assertiva.

Page 2: Ética e psicologia forense

2-Breve Contextualização da Filosofia Moral

O conceito de Moralidade, em filosofia, pode-se confundir com o termo Ética mas não

pode ser confundido com a noção de “morais sociais”, que são um conjunto de atitudes

morais que podem ser sujeitas a variação regional ou cultural.

Os valores morais, ao serem considerados razões para a acção, são entendidos como

supremos, (ao contrário dos princípios éticos) anulando, desta forma, outras problemáticas

como as legais ou políticas. Assim os valores morais são “Universalizáveis”.

A Ética, por outro lado, é a exploração de valores e princípios, e a forma como eles se

relacionam com as acções em situações diversas - é a ciência da moral. A Ética Médica é um

ramo da Ética que aplica, de forma sistemática, a teoria da moral aos problemas morais,

específicos da praxis médica.

O conflito ético acontece quando, para resolver a mesma situação os indivíduos têm

valores ou princípios que se chocam relativamente à acção a tomar. De facto os conflitos

fazem parte da ética visto que a própria concepção de valor pode diferir, por exemplo: um

médico pode desejar aliviar o sofrimento de um paciente (um objectivo principal da

medicina), mas este pode recusar o tratamento devido à sua religião. O peso relativo de

diferentes valores e os meios para os alcançar podem dar origem, também, a conflitos, por

exemplo: para os estóicos o valor supremo para atingir a felicidade enquanto que para os

epicuristas o prazer era essencial para esse mesmo objectivo, ambos da mesma época e

civilização, grecia helenista.

A Moralidade, nas teorias clássicas, define-se pela consequência de uma acção,

existindo a distinção entre a utilidade de actos individuais e a utilidade ou valor das práticas.

Actualmente, as duas principais teorias que comportam o raciocínio ético são o Utilitarismo e

a Deontologia.

O Utilitarismo advoga, que as acções se devem dirigir para a produção do maior bem-

estar e para o maior número de pessoas possível, sendo desta forma mais clássico.

Por outro lado, a Deontologia preocupa-se essencialmente com os princípios, em

detrimento, das consequências das acções. Os Deontologistas recorrem aos deveres e

obrigações que surgem das relações particulares. Kant o “pai” da deontologia propunha que as

decisões éticas devem ser universais, isto é, ao agirmos de uma forma num caso particular,

dever-se-ia agir similarmente, em todos os casos futuros.

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Page 3: Ética e psicologia forense

Deste modo, verifica-se um antagonismo entre estes dois paradigmas, visto que, no

primeiro, o importante é saber se acção provocará um beneficio à maioria da sociedade

enquanto o segundo se preocupa com deveres gerais para situações particulares, por exemplo:

deve-se gastar recursos financeiros na melhoria do acesso aos cuidados médicos, da minoria

populacional prisional (premissa deontológica) ou direccionar esses recursos para a população

idosa (premissa utilitária)?

Para entender a ética no campo da saúde temos que nos reportar à tradição hipocrática

visto que são os princípios éticos “chave” da medicina Ocidental. O corpus Hipocrático data

por volta IV século a.C. e o juramento de Hipócrates inicia uma longa tradição da ética

médica, tendo o médico como principal princípio, o de não fazer nenhum dano ou mal.

Contudo, este juramento, não faz nenhuma menção à autonomia dos pacientes.

Deste modo, os princípios evoluíram e foram adicionados os seguintes: 1- O da

Beneficência (aplica-se a indivíduos e também a estruturas institucionais, e reporta-se ao

modo como eles beneficiam sociedade em geral); 2- o da Não-Maleficência (a exigência para

não fazer nenhum dano); 3- o da Autonomia (assunção que os pacientes são competentes, para

determinar o seu próprio curso de acção ou tratamento) e; 4- o da Justiça (conceito muito

abrangente que pode incluir igualdade no acesso ao tratamento médico mas também o da

igualdade dos direitos dos pacientes).

Destes princípios pode-se constatar, mais uma vez, a dualidade e conflito entre a

Deontologia (3 e 4) e o Utilitarismo (1 e 2), acrescentando-se o mesmo conflito entre o

modelo de autonomia (os dois últimos) e o modelo paternalista (os dois primeiros).

Da relação de médico-paciente, foram surgindo os conflitos acima referidos, visto que,

a tradição hipocrática propunha que o médico tinha “o poder paternal” em decidir o que era

melhor para um paciente ( ex.: internamento de um paciente que não quer ser tratado). Com a

crescente percepção de que o paciente tem o direito de livre escolha (justiça), sendo

competente para determinar a sua acção (autonomia), a profissão médica (e as outras

profissões de saúde, incluindo a psicologia), têm vindo a aplicar o modelo de autonomia na

relação com o paciente (ex.: os cirurgiões já não podem decidir sobre o destino de órgãos,

sem o consentimento do paciente).

Assim, para aplicar qualquer um destes quatro princípios, é sempre necessário

encontrar um ponto de equilíbrio entre os dois modelos, sendo que, por exemplo, ao aplicar o

princípio de beneficência, deve-se respeitar a autonomia do paciente e verificar o que é

realmente mais importante para o receptor da acção (paciente) e não para o agente (técnico de

saúde).

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Page 4: Ética e psicologia forense

Até aos meados do século XX, a grande maioria dos problemas éticos que surgiam à

biomedicina, eram resolvidos por uma deontologia profissional e na ética de inspiração

hipocrática. Contudo, após o surgimento de três factores históricos [alguns abusos na

experimentação humana; o surgimento das novas tecnologias e, a percepção da insuficiência

dos referenciais éticos tradicionais], surge a Bioética (Archer et al, 1996).

A bioética surgiu assim há cerca de um quarto de século, como um conjunto de

preocupações éticas levantadas por cientistas da área da biológia. Decorrente dos problemas

morais levantados pelo uso das novas tecnologias médicas, a bioética estendeu, também, a sua

preocupação à interdependência dos seres vivos a longo prazo, assim como, da sobrevivência

do homem no nosso planeta. Por isso passou a caracterizar-se por “uma dimensão social, pela

sua natureza transdisicplinar e pluralista, pela abertura à participação do público e pelo

assessoramento de políticas nacionais, num esforço de harmonização internacional” (Archer

et al., 1996).

Para codificar e internacionalizar uma série de princípios éticos, foram elaborados

códigos éticos. As Declarações de Genebra, de Helsínquia, de Siena e, de Madrid, são as mais

importantes e, todos elas se referem aos quatro princípios supracitados (Simon et Wettsein,

1997)

Para além destes códigos internacionais, a maioria das associações profissionais

elaboraram códigos éticos [ex: código ético da American Psychological Association (1991)].

Existem comissões de ética cuja função principal é educar os seus associados sobre os

códigos éticos e proteger o público de práticas pouco éticas. São asseguradas, regularmente,

reuniões da comissão, para processar reclamações formais dirigidas por clientes contra os

associados. Quando uma reclamação é feita, a comissão produz uma investigação e delibera

sobre o caso. Uma decisão pode incluir uma sanção que, normalmente, varia entre uma

reprimenda, suspensão, ou expulsão da ordem profissional.

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Page 5: Ética e psicologia forense

3-A Psicologia Forense

A psicologia diz-se forense devido à sua relação com a justiça e, se pretendemos

definir esta subespecialidde da psicologia diremos que é a interface entre a Psicologia e a

Justiça. A psicologia forense produz e aplica o conhecimento do comportamento humano nos

sistemas judiciais civis e criminais (Hess, A; Weiner, B., 1999). A palavra “forense”, provém

do latim forensis, que significa “no fórum”, onde os tribunais da Roma Antiga ocorriam.

Os psicólogos forenses podem prestar serviços quer de natureza clínica, quer forense,

em processos distintos. Precisam, contudo, como veremos mais adiante, de confrontar as

questões clínicas, éticas e legais envolvidas nesta combinação de papéis, bem como de os

clarificar.

A prática de um psicólogo forense pode incluir: avaliação psicológica e depoimento

pericial sobre aspectos criminais forenses (ex.: violência doméstica, abuso sexual); avaliação

e depoimento sobre questões civis (ex.: custódia de menores, discriminação no local de

trabalho); tratamento especializado de indivíduos envolvidos em questões legais; contacto

com legisladores a propósito de questões políticas que tenham implicações na praxis forense;

análise de questões relacionadas com negligência profissional; responsabilidade civil e tutela;

consulta, avaliação e tratamento de indivíduos com alto risco de comportamentos agressivos

na comunidade, local de trabalho e/ou settings de tratamento; pesquisa e colaboração em

questões de impacto psicológico (ex.: testemunho de crianças); ensino, preparação e

supervisão de estudantes de psicologia ou psicólogos (adaptado de American Board of

Forensic Psychology, 2003).

A prática da psicologia forense tem como principais objectivos, alcançar a maior

individualização possível, exigível num sistema penal moderno, no momento da sua aplicação

a uma pessoa concreta, para se personalizar, ao máximo, a resposta jurídica. Neste contexto

interessa uma profunda compreensão da personalidade do sujeito e não apenas a sua vida

mental. As consequências jurídicas a extrair dessa compreensão implicam a congregação de

diversos saberes, possibilitando um pluralismo de explicações que concorram para o mesmo

objectivo – a adequada administração da Justiça. Daí as perícias interdisciplinares, com

intervenção do psiquiatra, do criminólogo e do psicólogo – artigos 152º, nº2 e 159º, nº3 do

Código Penal Português (Albergaria, P.S., 2001).

Apesar destas definições sobre a psicologia forense, existe uma a falta, na prática, de

consensos sobre o papel do psicólogo forense, originando certa confusão no meio científico.

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Page 6: Ética e psicologia forense

Em todo o mundo existem vários modelos de formação de profissionais desta

subespecialidade da psicologia, que vão desde a psicologia clínica com especificidade forense

até à psicologia da justiça.

A formação para a psicologia da justiça é diferente da formação para a psicologia

forense, visto que a primeira faz a interface entre lei e psicologia, enquanto que a segunda "é

um ramo da psicologia clínica que trata de casos clínicos relacionados com processos

criminais e civis" (Tomkins et Ogloff, 1990).

Na actualidade não existe um modelo, bem estruturado e aceite na generalidade, de

formação do psicologo forense. Contudo, tem-se “formado um consenso que o futuro da

psicologia forense, depende da sua capacidade em aplicar o modelo científico, a questões

psicológicas, relacionadas com a justiça” ( Tomkins et Ogloff, 1990).

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Page 7: Ética e psicologia forense

4-A Ética na Psicologia Forense

Os dilemas éticos são particularmente comuns, quando um psicólogo trabalha em

contextos forenses. O setting terapêutico, nestes contextos, difere dos outros settings

psicológicos. Provavelmente, a maior diferença relaciona-se com a natureza adversa da

actividade legal e, as pressões sobre o psicólogo, para este agir como um advogado

(especialmente na avaliação). Os pacientes em contexto forense, participam muita das vezes,

sem motivação para a avaliação e tratamento psicológico, e estão sempre preocupados acerca

do tipo de serviço que vão receber, se a informação vai ser arquivada e se algum relatório vai

ser lido por mais alguém.

Também podem existir diferenças, entre a instituição empregadora e o psicólogo, em

relação à forma de aplicar princípios como o de consentimento e confidencialidade, e

também, relativamente, à atitude do psicólogo para com o paciente.

Assim, o contexto forense dita que os assuntos éticos devem ser cuidadosamente

analisados pelos profissionais forenses. Acrescentando-se, que o trabalho de um profissional

forense, tem grandes probabilidades de ter escrutínio público e judicial

Por outro lado, dada a confusão, relativamente ao papel do psicólogo forense, referido

no capítulo anterior, e a interdisciplinariedade, deste ramo da psicologia, questiona-se sobre

quais os princípios éticos se devem guiar, os profissionais desta disciplina, e quais as teorias

éticas devem subjazer estes princípios.

O paradigma, mais comum, para aplicar a ética na prática dos profissionais de saúde, é

aquele que se baseia em quatro princípios, como anteriormente foi referido (cf. cap. 2).

Todavia mesmo após uma reflexão superficial, percebe-se que a aplicação destes princípios,

dependem do papel do técnico de saúde em determinada situação. Por exemplo, e como

veremos mais à frente, um psicólogo forense, quando faz uma perícia psicológica, não age

com beneficência, pois não serve os melhores interesses do avaliado (actua sob o melhor

interesse da Justiça). O resultado da avaliação, também, pode ter consequências negativas

para o avaliado ( este pode ser preso devido a essa avaliação), não sendo, assim, aplicado o

princípio da não-malificiência.

Neste contexto, quando o “avaliador forense” (psicólogo ou psiquiatra), está ao

serviço do sistema judicial, em vez do paciente /cliente, a teoria ética deve-se basear na busca

da justiça e não em princípios terapêuticos (Simon et Wettstein, 1997), devendo, contudo,

guiar-se por princípios morais aceites pela sociedade. Quando ao serviço dos interesses da

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Page 8: Ética e psicologia forense

justiça, o psicólogo deverá aderir ao princípio moral geral de dizer a verdade (tanto no caso

subjectivo da honestidade, como no caso objectivo, referindo as limitações da precisão do

testemunho). Outro princípio geral será o de respeitar as pessoas, o que inclui que o avaliador

informe ao avaliado a ausência, entre eles, da relação psicólogo-paciente e de tratamento e, os

limites da confidencialidade dos dados recolhidos.

No entanto, os psicólogos (e psiquiatras) forenses devem seguir regras e princípios

específicos, e não somente, princípios morais gerais. Neste sentido Simon et Wettstein (1997),

adaptaram um guia ético, usado na prática da psiquiatria, à psiquiatria forense que, em nosso

entender, resume de forma muito satisfatória, a forma de agir de um avaliador (seja psiquiatra,

seja psicólogo forense) em todas as situações de avaliação, para que não seja cometido

nenhum comportamento pouco ético: 1) manter a objectividade e neutralidade; 2) respeitar a

autonomia do examinando; 3) proteger a confidencialidade da avaliação forense; 4) obter

consentimento informado para a avaliação forense, excepto se essa avaliação é obrigatória por

lei; 5) interagir verbalmente com o examinando; 6) assegurar que não existe uma relação

pessoal prévia, presente, nem futura com o examinando; 7) não ter contacto sexual com o

examinando; 8) preservar o anonimato relativo do examinador; 9) estabelecer um política de

pagamento, clara e não-contingente, com o litigado; 10) garantir um setting satisfatório para a

avaliação; e 11) definir o tempo da avaliação.

Existem, também, alguns guias éticos, relativos aos contextos forenses, publicados por

associações profissionais. O melhor exemplo, encontrado na nossa pesquisa, é o Speciality

Guidelines for Forensic Psychologists (Committee on Ethical Guidelenes for Forensic

Psychologists, 1991), que amplia, mas não contradiz o código ético dos psicólogos

americanos, publicado pela American Psychological Association (1991). Este guia oferece um

“modelo para uma prática profissional desejável pelos psicólogos” (idem, 1991) e é muito

detalhado, no que diz respeito às obrigações e princípios pelos quais o psicólogo forense se

deve reger. Os temas principais aí tratados são: 1) responsabilidade; 2) competência; 3) o tipo

de relação; 4) confidencialidade e privilégios; 5) métodos e procedimentos; e, 6)

comunicações públicas e profissionais.

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Page 9: Ética e psicologia forense

4.1-Psicoterapeuta versus Avaliador

Um dos debates éticos mais importantes, em psicologia forenses, reporta-se ao papel

que os psicólogos devem adoptar ao trabalhar com os pacientes/clientes, se terapêutico ou

avaliativo. A maioria dos estudiosos, da actualidade, defendem uma clara separação entre o

papel do avaliador e o papel do terapêuta (Day et Whetham, 2000).

Greenberg e Shuman (1997) defendem que os avaliadores forenses, isto é, os que

fazem relatórios psicológicos para os tribunais, diferem dos que fazem terapia a pacientes

ligados ao sistema judicial, em de dez pontos essenciais. Destes, os mais importantes serão

que, os avaliadores trabalham para o advogado (ou tribunal) e não para o cliente, e a

confidencialidade opera-se entre o advogado (ou tribunal) e psicólogo e não entre o

paciente/cliente e psicólogo. Por outro lado, as características da relação também diferem –

enquanto que os terapeutas devem ter uma atitude de apoio, empatia e, de aceitação da pessoa,

o avaliador deve ser neutro, imparcial e objectivo.

Em suma, enquanto que, o papel do terapeuta, visa o desenvolvimento de uma relação

de ajuda, a qual é raramente contenciosa, o papel do avaliador forense tem como objectivo

fornecer uma opinião crítica e imparcial, ao tribunal. Por outras palavras, pode-se afirmar que

o psicoterapeuta procura a história narrativa do paciente enquanto que o avaliador forense

procura a história verídica do litigante (Strasburger et al, 1997).

Um tema de confusão, relacionado com a problemática exposta neste capítulo, é a

distinção entre testemunha especializada (ou perito) e testemunha factual. Uma testemunha

factual fornece dados de observações directas que fez e, não dá opiniões especializadas ou

emite conclusões a partir de relatórios. Assim um terapeuta, que faça um testemunho factual,

reporta-se às observações feitas, durante a terapia, e às conclusões imediatas (tais como

diagnóstico e prognóstico) a partir dessas observações. Um perito (que pode ser um avaliador

forense) é pago para fornecer uma avaliação para ajudar o processo legal, podendo dar

opiniões acerca de questões legais (normalmente participam em julgamentos).

Existem, por vezes ocasiões onde o psicólogo se encontra na eminência de

desempenhar estes dois papeis para um mesmo indivíduo (terapeuta/avaliador forense). Por

exemplo só existe um técnico numa instituição que possa executar estes trabalhos. Todavia o

técnico que decidir esta via “embarca em águas especialmente traiçoeiras” (idem, 1997).

Esta dualidade de funções produzem dilemas éticos que podem ser sumariados desta

forma: 1) o testemunho, em tribunal, de assuntos íntimos surgidos em terapia, podem

provocar dano e mal-estar ao paciente, sendo descurado o princípio de não-maleficiência); 2)

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Page 10: Ética e psicologia forense

se o prognóstico for o de necessidade de tratamento de longo termo, o terapeuta pode

beneficiar directamente deste facto, através do pagamento dos serviços prestados ao doente, o

que não é ético para os psicólogos forenses; 3) por servir a dois “senhores” ao mesmo tempo,

paciente/examinando e lei, a aliança terapêutica, entre terapeuta/paciente, pode ficar

comprometida e o relatório forense, realizado pelo avaliador forense, poderá não ser

imparcial; e na mesma linha do raciocínio anterior, 4) a confidencialidade da relação

terapêutica poderá ficar comprometida, pois durante o testemunho especialista, poderão ser

usados factos surgidos durante as consultas, podendo assim, não ser aplicável o princípio de

confidencialidade (ibidem, 1997).

Devido a este facto, o Speciality Guidelines for Forensic Psychologists (Committee on

Ethical Guidelenes for Forensic Psychologists, 1991) refere no artigo IV D1: “os psicólogos

forenses devem evitar oferecer serviços profissionais a pessoas ligadas ao sistema legal, com

quem tenham uma relação pessoal ou profissional, que é inconsistente com a relação anterior

(tradução livre)”. Na prática é sugerido que os terapeutas devem evitar dar opiniões legais e,

os avaliadores forenses que executaram o relatório a determinada pessoa, não se devem

disponibilizar para fazer terapia a essa mesma pessoa.

Neste ponto gostaríamos de reflectir, brevemente, sobre o caso mediático e actual,

conhecido como “o caso da Casa Pia”. Segundo as notícias dos meios de comunicação, o

psicólogo clínico, responsável pelo acompanhamento psicológico, desde há alguns anos, das

alegadas vítimas de abuso sexual, é o mesmo que dá pareceres sobre a fidelidade dos

testemunhos destes ao tribunal (avaliador, portanto). Podemos depreender que o clínico

responsável executa, tanto o papel de terapeuta como avaliador, o que como já foi referido

não é o mais aconselhável em termos éticos e operacionais. Também, como iremos referir

adiante, o avaliador deveria ter formação específica na área forense, o que não parece ser o

caso, sendo descurado o princípio da justiça.

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Page 11: Ética e psicologia forense

5-A Clínica e a Ética no Setting Forense

Como foi referido no capítulo anterior, os psicólogos forenses, para agir eticamente,

devem tomar uma posição clara acerca do que papel que querem exercer. Para os avaliadores

forenses, o cliente será o tribunal, para os clínicos-forenses (psicólogos clínicos que praticam

a sua profissão em contextos forenses), existem muitas mais responsabilidades para com o

doente, dentro dos limites que iremos referir neste capítulo. Esta distinção ajuda clarificar a

natureza da relação de clínico-forense/paciente e também ajuda a ultrapassar algumas

questões éticas que poderão afectar o profissionalismo do psicólogo.

Neste capítulo, serão então, analisados os possíveis dilemas éticos que poderão surgir,

aos psicólogos clínicos-forenses, que desempenham funções em prisões ou enfermarias de

segurança. Neste papel os psicólogos forenses reconhecem que a sua principal

responsabilidade é a pessoa com quem eles estão a trabalhar.

Nos settings forenses é comum encontrar uma organização paternalista onde é difícil

para o utente destas instituições desenvolverem autonomia, visto que existe uma tendência

imposição, salvo gratas excepções, serem usados modelos de controle e que vêem os

prisioneiros como recipientes passivos dos serviços. Na maior parte destas instituição, existe

uma expectativa de que toda a informação deve ser fornecida e é dado pouco ênfase ao

consentimento, dos utentes dessas instituições (Day et Whetham, 2000).

Assim ao trabalhar neste tipo de settings são criados, aos psicólogos, dilemas sobre a

responsabilidade – Como se consegue gerir de forma equilibrada, as obrigações de

responsabilidade para com o paciente, a profissão e a organização/sistema judicial?

As leis e os códigos éticos são dois mecanismos principais de responsabilização

profissional e foram desenvolvidos para proteger o indivíduo/cliente. Ambos oferecem

directrizes ao psicólogo para este ter um comportamento ético.

No entanto, as Leis são padrões mínimos de comportamento que a sociedade tolerará,

sendo aplicados pelo Estado, enquanto que, os códigos éticos representam, normalmente, os

padrões ideais fixados pela profissão e, servem para regular, educar, e inspirar os profissionais

(são usualmente, aplicados por associações profissionais, conselhos nacionais ou

governamentais, que regulam as profissões). Devido a estas diferenças, existem situações em

que as opiniões legais, podem não coincidir com os códigos éticos profissionais (Remley,

1993). Deste modo foram formados Comissões Éticas para educar os seus membros e

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Page 12: Ética e psicologia forense

protegerem o público de práticas pouco éticas, por parte destes. Estas Comissões têm o poder

de sancionar o profissional.

Os códigos éticos são necessários para assegurar responsabilidade, contudo eles

apresentam numerosas falhas. Corey et al (1998), identificaram vários problemas, no uso

destes códigos, com intuito de uma prática profissional ética e responsável. Por exemplo,

algumas situações não podem ser geridas baseando-se, somente, em códigos éticos; alguns

códigos são vagos, faltando-lhes clareza e precisão, sendo, por isso, de difícil execução.

No fundo, os códigos éticos são directrizes estáticas e não podem garantir um

comportamento ético. Os psicólogos não ficam preparados para um prática ética,

simplesmente aprendendo os códigos éticos. Tanto os códigos éticos, como os legais,

delineiam áreas extremas de comportamento inaceitável e, reforçam as áreas do

comportamento desejável. No entanto, não conseguem substituir as dificuldades que os

psicólogos sentem perante conflitos éticos, visto que, a situação de cada paciente é única e

necessita de uma resposta diferente.

Deste modo, é necessário identificar as aéreas ou situações, onde existem maiores

probabilidades de surgirem conflitos éticos, e encontrar uma forma de orientação menos

estática do que os códigos éticos, para que, desta forma, o psicólogo tenha uma acção correcta

e, se possa proteger de possíveis problemas legais.

5.1-Principais dilemas éticos na prática clínica

As áreas identificadas por Swenson (1997, in Day et Whetham, 2000), que os

psicólogos, em geral e, os forenses em particular, poderão precisar de mais atenção e

orientação são as seguintes:

Violação dos direitos individuais dos clientes/pacientes (relacionados com

sexo, privacidade, etc.);

Fracasso em proteger os outros do seu cliente/paciente (ex.: falha em

informar as autoridades);

Tratamento incompetente (normalmente alegado em casos de suicídio).

Nos códigos éticos, das sociedades e associações profissionais de psicologia, estas

áreas estão abrangidas pelos seguintes tópicos: Confidencialidade, Dever de informar,

Consentimento e, Competência (Day et Whetham, 2000).

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Page 13: Ética e psicologia forense

5.1.1. Confidencialidade

A maioria dos códigos refere a confidencialidade nas relações psicólogo-paciente

(aplicação do princípio da não-maleficência), a menos que haja uma obrigação legal ou social

que tal impeça. Como princípio geral, a confidencialidade não deve ser quebrada sem o

consentimento dos clientes, excepto em circunstâncias nas quais, não o fazer, resultaria um

perigo claro à pessoa ou aos outros (aplicação do princípio da beneficência). A

confidencialidade é um direito essencial, do paciente (Princípio da justiça). Porém, é irreal, o

psicólogo prometer total confidencialidade, particularmente em settings forenses.

As situações que permitem (ou são necessárias) a quebra da confidencialidade são

(Corey et al, 1998):

Quando um cliente constitui um perigo a sí próprio ou aos outros;

Quando um cliente refere uma intenção para cometer um crime;

Quando o psicólogo suspeita de abuso ou negligencia de uma criança, uma

pessoa idosa, um residente de uma instituição ou um deficiente adulto;

Quando um tribunal ordena que o psicólogo possibilite o acesso aos registos.

As informações confidenciais, devem ser divulgadas, sob de certas condições legais;

por exemplo se um cliente indica que terá cometido uma ofensa criminal. Este exemplo

parece não provocar dúvidas, quanto à necessidade de quebra de confidencialidade, contudo,

em muitas situações, existem muitas dificuldades, em discernir e decidir, sobre a quebra ou

manutenção, da confidencialidade. Por exemplo, todas as ameaças verbais, constituem de

facto uma realidade de acção danosa por parte do paciente, para que seja de imediato feito um

relatório e enviar para as autoridades competentes? E se a ameaça não é verbal mas o

psicólogo tem uma palpite forte de que o cliente possa ser homicida ou suicida?

Os códigos éticos oferecem pouca orientação específica, relativamente à decisão a

tomar nestas situações (por exemplo, o que constitui perigo claro, ou uma obrigação social

premente?).

Nós temos uma responsabilidade ética e legal para informar os nossos pacientes, no

começo de qualquer relação profissional, sobre os limites da confidencialidade (aplicação do

princípio da justiça e não-maleficência). Se tal não acontecer é legitimo que os pacientes

assumam que as revelações deles/delas são totalmente confidenciais.

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Page 14: Ética e psicologia forense

5.1.2. Dever de informar

Se um psicólogo determina que um paciente constitui um perigo sério de

comportamentos violentos a outros, é obrigado a proteger as possíveis futuras

vítimas(aplicação do princípio da beneficência). O dever de informar e proteger é o desafio

principal para os terapeutas. Geralmente, o dever para informar e proteger é indicado quando

estas três condições estiverem presentes: 1) existência de uma relação especial entre o

paciente e terapeuta; 2) é realizada uma predição razoável de um comportamento prejudicial

(baseada num história de comportamento violento) e; 3) a potencial vítima pode ser

identificada (Day et Whetham, 2000).

Um exemplo de conflito ético, que pode acontecer relativamente à confidencialidade e

dever para informar é na área de tratamento das perturbações sexuais (ex.: pedofilia).

Enquanto estes pacientes são encorajados a revelarem informações detalhadas acerca das

ofensas, como uma parte integrante do seu tratamento, há o risco do psicólogo violar a

privacidade dos ofensores (violando o princípio da não-maleficência), informando às

autoridades acerca do progresso terapêutico (para decisões de liberdade condicional), ou

informando sobre comportamento de risco (Hess et Weiner, 1999). Nestes casos é necessário

que o psicólogo, discuta com o paciente, antes do início da terapia, os limites da

confidencialidade, para que não seja praticado, um comportamento pouco ético (aplicação do

princípio da autonomia, da justiça e não-maleficência) .

5.1.3. Pacientes suicidas

Tendo a obrigação de informar e proteger os outros, também temos a responsabilidade

de proteger o paciente, quando este é um perigo para si próprio(aplicação do princípio da não-

maleficência e justiça). Mas, como referimos anteriormente, não será qualquer expressão

verbal (ideação suicida) que justificará medidas extremas como a hospitalização (princípio da

autonomia). Nestes casos é necessário que o psicólogo conheça os sinais importantes e use um

julgamento profissional, para determinar se existe um risco suficiente para informar as

autoridades.

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Page 15: Ética e psicologia forense

5.1.4.Consentimento

O tema do consentimento é uma área que realça os conflitos entre éticas profissionais

e as regras de uma organização/instituição. Este conflito, surge às vezes, quando um

psicólogo se encontra integrado numa equipa interdisciplinar, onde, como indivíduos, têm

pouco poder para alterar a política organizacional. Por exemplo, não é por um doente estar

detido, com medida de segurança, que é obrigado a tratamento psicológico, no entanto a

equipa exige que tal se faça (aplicação do princípio da autonomia e da justiça). Éticamente,

quando isto acontece, o psicólogo têm uma responsabilidade para dar passos razoáveis para

solucionar o conflito, inclusive apelar às comissões éticas.

Evidentemente é necessário, também, verificar qual é a capacidade, de determinado

indivíduo, se auto-determinar, o que levanta uma série de outras questões éticas, que não

serão aprofundadas neste trabalho, pois entendemos que não faz parte do objectivo proposto.

5.1.5. Competência

A psicologia forense é uma área especializada. Os relatórios psicológicos têm

frequentemente um papel importante, podendo determinar o que acontece, a um paciente, no

sistema judicial, quer num julgamento, numa condenação, ou libertação da prisão. Os

psicólogos que trabalham em contextos forenses deveriam ter um grau razoável de

conhecimento do sistema judicial (cf. cap.3).

A competência refere-se à capacidade de determinado profissional desempenhar uma

função, tendo para isso uma formação e treino específico. A maior parte do trabalho dos

psicólogos forenses, relaciona-se a populações específicas (ex.: ofensores sexuais, ofensores

violentos, crime relacionado com abuso de substâncias, etc.), devendo estes profissionais

especializados a manterem-se informados, para não surgirem acções que poderão afectar

muitas pessoas (aplicação do princípio da beneficência, não-maleficência e da justiça) Por

exemplo, é difícil opinar, ao juiz, sobre o tipo de condenação, que um pedófilo deverá ter, sem

se estar informado, na literatura, acerca do risco de re-ofensa.

5.2-A Decisão Ética

Em resposta aos assuntos éticos e morais, que nós somos confrontados na nossa

prática, podemos utilizar uma variedade de níveis de sabedoria ou conhecimento moral.

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Page 16: Ética e psicologia forense

Kichener (1996) propôs quatro níveis discretos de raciocínio moral: intuição pessoal,

directrizes éticas desenvolvidas por organizações profissionais, princípios éticos, e teorias

gerais da acção moral. Quando, nem intuição pessoal, nem as directrizes éticas, conseguem

fornecer um solução a nosso assunto ético ou moral, nós precisamos recorrer a princípios mais

abstractos ou teorias. Estes últimos suportam tanto os nossos códigos pessoais como os

profissionais.

Existem quatro princípios fundamentais que formam a base da nossa ética prática (cf.

cap.1), podendo-se acrescentar a Fidelidade ( refere-se à lealdade, confiabilidade e agir em

boa fé ). As teorias gerais de ética (cf. cap.1) podem ser usadas para solucionar problemas

éticos complexos. Porém, mesmo com estes princípios e teorias bem fundamentadas, muitas

das vezes, não é fácil lidar com uma situação, que nos levanta dilemas éticos. Por isso,

achamos útil, usar modelos, que nos ajudem a estruturar o raciocínio moral.

5.3 Modelos de decisão ética

Quando confrontados, com uma situação em que nos é difícil saber qual é a acção

ética mais apropriada, será útil utilizar os modelos de decisão. O formato, em árvore, destes

modelos são úteis, visto que, eles realçam as áreas que se devem considerar, encorajam a

reflexão e consulta, e oferecem um caminho lógico para a decisão.

Corey et al (1998), propuseram um modelo, muito prático, que é útil para lidar com

dilemas éticos. Este modelo tem oito fases, começando com uma fase de reconhecimento de

problema, seguido por consulta das leis pertinentes, códigos profissionais e colegas, antes de

esboçar um método de resolução de problemas. É de referir, que o modelo não deve ser

encarado como uma forma linear ou cognitiva, de obter uma solução, relativamente a

problemas éticos, visto que, ele permite tomar decisões complexas, envolvendo sentimentos,

valores, e intuição pessoal:

5.3.1 Identificação do problema

Normalmente os problemas éticos são complexos e as soluções não costumam ser

simples. O sentimento característico quando estamos perante um dilema ético é a sensação de

ambiguidade. Lembrar que o primeiro passo é reconhecer que o dilema existe, e identificar a

sua natureza específica. Em consulta com o paciente é necessário obter a máxima informação

possível em relação ao assunto

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Page 17: Ética e psicologia forense

5.3.2. Identificar assuntos potencialmente envolvidos

Tendo recolhido toda a informação necessária, clarificado os assuntos essenciais, e

excluído os irrelevantes, avaliado os direitos, responsabilidades, e bem-estar de todos os

envolvidos pela situação, deve-se considerar os cinco princípios morais e aplicá-los à

situação. Pode ser útil hierarquizar (ex.: do mais prioritário ao menos) estes princípios e

raciocinar de que forma estes, podem suportar a resolução do dilema.

5.3.3. Rever os Códigos Éticos mais Relevantes

Pesquisar se os princípios ou regras da nossa organização profissional oferecem

soluções possíveis. Pesquisar se esses códigos são consistentes com os nossos valores e ética.

Se discordar com esses códigos, perceber se existe uma razão lógica, que suporte essa

posição. Também se pode-se pedir, a opinião dessa organização, sobre alguma situação

específica do código ético.

5.3.4. Conhecer as Leis e Regulamentos

É essencial conhecer as leis que se aplicam aos dilemas éticos. Também é necessário

estar informado das regras e regulamentos do local de trabalho.

5.3.5. Obter conselhos

Neste altura, é normalmente necessário, consultar colegas para obter outras

perspectivas do problema. Não discuta o problema com colegas com uma opinião semelhante

à sua. Se o dilema inclui problemas jurídicos, é necessário pedir conselho legais. Aconselha-

se a registar a natureza dessas consultas, incluindo as sugestões dos que foram consultados.

5.3.6. Considerar os cursos de acção prováveis e possíveis.

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Page 18: Ética e psicologia forense

Considerar todas as acções possíveis, mesmo as pouco ortodoxas. Lembrar que uma

alternativa é a ausência de acção. Enquanto se pensa nas diversas possibilidades, discutir estas

opiniões com o paciente e também com outros profissionais.

5.3.7. Enumerar as consequências das várias decisões

Considerar as implicações de cada acção para o paciente, para os outros relacionados

com o paciente, e para nós próprios como terapeutas. É necessário discutir, novamente, com o

paciente acerca das consequências que são mais significativas para este. Usar os cinco

princípios fundamentais como base para avaliar as consequências de cada acção prevista.

5.3.8. Decisão da melhor acção

Para fazer a melhor decisão, considerar a informação recebida das várias fontes. Após

a decisão, deve-se escolher a acção a desenvolver, e avaliar as consequências e perceber se

serão necessárias mais acções. Para a visão mais holística da situação, é necessário envolver,

mais uma vez, o paciente no processo.

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6-Conclusão

Na psicologia forense ainda existem dúvidas acerca do tipo de formação técnica e,

também, acerca do papel que o psicólogo deve desempenhar perante as diversas situações que

se lhe deparam. Porém parece ser óbvio que o clínico que trabalha numa instituição ligada ao

sistema judicial deve evitar a todo custo fazer avaliações dos utentes dessa instituição, para o

tribunal, para que assim não se entre em domínios onde se torna difícil manter um

comportamento ético.

O trabalho em settings forenses levanta muitos conflitos éticos para aqueles que fazem

aconselhamento ou serviços clínicos. A filosofia e a gestão da organização normalmente é

inconsistente com os modelos profissionais, que os psicólogos têm. Deste modo os códigos

éticos são importantes e servem para nos guiarem de forma razoável e aceitável, a prática

ética.

Os códigos identificam áreas tais como confidencialidade, consentimento informado, e

competência, ajudando os profissionais a estarem alerta para conflitos éticos, que poderão

surgir. No entanto, eles dão poucos conselhos específicos, no que se refere a resolver dilemas

éticos.

O problema situa-se na impossibilidade de o comportamento ético ser legislado e não,

na qualidade das directrizes éticas. Para muitas decisões, na prática clínica, os psicólogos

baseiam-se no seu senso de moralidade e dever para agir no interesse do paciente, quando isso

é possível.

Assim numa perspectiva pragmática, um modelo de decisão para temas éticos pode ser

muito útil para resolver conflitos éticos do dia a dia de um psicoterapeuta que actue na área

forense. Primeiro é necessário que o psicoterapeuta identifique com precisão qual é o assunto

ético a resolver, antes de pesquisar as leis e códigos. Depois sugere uma consulta um processo

de resolução de problemas que nos permite aplicar os nossos próprios princípios morais e

identificar as nossas falhas, no que toca a assuntos éticos. Finalmente, é necessário que

estejamos clarificados e confortáveis acerca do nosso trabalho, e assumir a responsabilidade

dos nossos actos.

Se os psicólogos clínicos, que trabalham em contextos forenses, se informarem e

actuarem desta forma, estão no ponto de partida, para estarem à altura dos acontecimentos,

isto é, para praticarem eticamente a psicologia.

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