Ética e avaliação

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2.ª edição 2008 Esse material é parte integrante do Videoaulas on-line do IESDE BRASIL S/A, mais informações www.videoaulasonline.com.br

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Para concursos da Educação.

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Page 1: Ética e Avaliação

2.ª edição2008

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Page 2: Ética e Avaliação

IESDE Brasil S.A. Al. Dr. Carlos de Carvalho, 1.482. CEP: 80730-200 Batel – Curitiba – PR 0800 708 88 88 – www.iesde.com.br

Todos os direitos reservados.

© 2004-2008 – IESDE Brasil S.A. É proibida a reprodução, mesmo parcial, por qualquer processo, sem autoriza-ção por escrito dos autores e do detentor dos direitos autorais.

P345 Albuquerque, Targélia de Souza; Oliveira, Eloiza da Silva Go-mes de. / Avaliação da Educação e da Aprendizagem. /

Targélia de Souza Albuquerque. Eloiza da Silva Gomes de Oliveira.2. ed. — Curitiba : IESDE Brasil S.A., 2008. 340 p.

ISBN: 978-85-387-0124-8

1. Planejamento educacional. 2. Avaliação educacional. 3. Apren-dizagem – avaliação. 4. Formativa. 5. Emancipadora. I. Título.II. Oliveira, Eloiza da Silva Gomes de.

CDD 371.207

Capa: IESDE Brasil S.A.

Imagem da capa: Inmagine

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Page 3: Ética e Avaliação

Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro(PUC-Rio). Graduada em Pedagogia pela Universidade Federal de Pernam-buco (UFPE).

Targélia de Souza Albuquerque

Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professora adjunta, coordenadora do Laboratório de Estudos da Aprendizagem Humana (LEAH) e do Curso de Pedagogia a distância da Faculdade de Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Atua na área de Psicologia, com ênfase em Aprendizagem e Desempenho Acadêmicos.

Eloiza da Silva Gomes de Oliveira

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Page 5: Ética e Avaliação

Sumário

Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção da escola democrática ....................... 15

Pela afirmação total da vida: por uma ética inseparável da prática educativa ... 17

Avaliação compartilhada, dialógica no exercício da pedagogia da autonomia .... 25

A avaliação como estratégia de gestão educacional: da regulação à emancipação ............................................... 33

Para iniciar o diálogo ................................................................................................................ 33

As transformações sociais, o caráter estratégico da educação e a questão da avaliação educacional ............................................................................................................. 37

A avaliação como estratégia de gestão educacional: compreendendo as inter-relações entre sociedade, Estado, políticas educacionais/de avaliação e a escola .................................................................................................................. 40

As políticas públicas de avaliação: uma reflexão crítica sobre o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) .......................................................... 53

Questão importante ................................................................................................................. 54

O SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica .................................. 55

O ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio .................................................................. 65

Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior – SINAES em substituição ao ENC .......................................................................................................... 69

Um olhar crítico sobre as políticas públicas de avaliação: em foco o SAEB ......... 72

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Page 6: Ética e Avaliação

Trajetória da avaliação educacionale da aprendizagem no Brasil: fundamentos e práticas ...................................... 85

Dialogando e refazendo caminhadas ................................................................................ 85

Vocês sabem o que é docimologia? ................................................................................... 87

Linha de tempo (por décadas) – a avaliação educacional/da aprendizagem no Brasil .......................................................................................................... 88

Retomemos a nossa trajetória, adentrando-nos nas décadas de 1990 e nos três primeiros anos do século XXI (1990-2003) ...................................................... 93

Vamos refletir sobre os resultados de grande parte das pesquisas com respeito às concepções e práticas da avaliação da aprendizagem ......................... 95

A avaliação diagnóstica .........................................................................................................102

A avaliação formativa .............................................................................................................105

A avaliação, o currículo e a escola: enfrentamentos e desafios coletivos na construção da avaliação emancipadora ........................111

Colocando os pés no chão da escola e desvelando a avaliação no movimento curricular ......................................................................................................111

As cenas da escola...................................................................................................................113

Silenciamento dos sem-terra no espaço escolar: o que pode/deve e o que não pode/deve entrar na escola ........................................................................................126

Currículo e avaliação: reciprocidade na construção de um conhecimento-solidariedade/emancipação .................................................................132

A avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa e emancipadora I: fundamentos teóricos e metodológicos .....................................................................143

A avaliação emancipatória ...................................................................................................144

Avaliação formativa: uma avaliação a serviço da aprendizagem ..........................147

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A avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa e emancipadora II: autoavaliação e emancipação ............................................................................163

Avaliando com os pés no chão da escola, da sala de aula........................................164

A autoavaliação institucional instrumentaliza a escola para a realização de seu projeto político-pedagógico .................................................................................169

A avaliação da aprendizagem: orientações metodológicas para a prática da avaliação formativa e emancipadora na escola ...........................................................172

A avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa e emancipadora III: introdução ao estudo de técnicas e instrumentos de avaliação da aprendizagem ...................................................................183

A observação como base da avaliação formativa e emancipadora ......................183

Os testes de aproveitamento escolar I: reflexão crítica e orientações metodológicas para a elaboração, aplicação e avaliação .....................................................................203

A avaliação no cotidiano escolar .......................................................................................208

O significado dos testes de aproveitamento escolar como um auxílio à aprendizagem ..............................................................................................................................210

Como avaliar a produção dos alunos e das alunas: experiências na área de Língua Portuguesa ...........................................................................................................213

Os testes de aproveitamento escolar II: mais alguns desafios .............................................................227

A avaliação em Matemática: pontos para discussão ..................................................227

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Page 8: Ética e Avaliação

Algumas pistas para elaboração de testes de aproveitamento escolar .............232

Problematizando as notas escolares e os pareceres avaliativos: é preciso mudar o rumo da história .........243

Historiando... .............................................................................................................................243

Revendo pontos sobre a relação entre desenvolvimento e aprendizagem: colocando em questão os testes e as notas escolares ...............................................248

A avaliação normativa e a avaliação criteriada: elementos para discussão .......270

Os pareceres avaliativos: uma possibilidade de análise crítica, decisão e ressignificação curricular ..................................................................................273

A voz e a vez dos(as) professores(as): um diálogo sobre a avaliação no cotidiano escolar ...........................283

Refazendo o caminho. Um convite aos caminhantes ...............................................285

Algumas preocupações dos alunos sobre a avaliação da aprendizagem ..........298

Dos princípios às práticas: saberes necessários à construção da avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa e emancipadora .........................299

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Page 11: Ética e Avaliação

Apresentação

Caros(as) colegas educadores e educadoras1

Vamos participar juntos(as) de uma fascinante e desafiadora caminhada sobre Avaliação Educacional e Avaliação da Aprendizagem. Temos vários de-safios durante esta trajetória e precisamos estar juntos(as) para enfrentá-los. O nosso curso terá como princípios fundamentais: o diálogo, a participação organizada, a crítica, a autonomia e o conhecimento – solidariedade/emanci-pação articulados a três eixos: ética, política e educação, tendo como norte a (re)criação da educação/da escola substantivamente democrática.

É com os pés no chão da escola, compreendendo-a no bojo das relações entre sociedade, Estado, educação, cultura e currículo, numa perspectiva de totalidade social que, coletivamente, investiremos na ressignificação da avaliação numa perspectiva formativa e emancipadora.

Aprendemos com Paulo Freire que “o sonho de um mundo melhor nasce nas entranhas de seu contrário”. É, portanto, na nossa escola, no trabalho pedagógico coletivo que realizamos com os alunos(as), em cada pensar e agir cotidianos que nos afirmamos como sujeitos sociais constru-tores da qualidade educacional como um bem, como direito, como cida-dania. Pois, como nos ensina Pablo Gentili, “qualidade para poucos não é qualidade, é privilégio”.

Os capítulos desta obra unificam-se com base na “ ética universal do ser humano” de Paulo Freire em íntima articulação com “a ética da libertação” de Enrique Dussel, pois elas oferecem os fundamentos para que possamos fazer rupturas com a cultura da avaliação repressora, seletiva, classificató-ria, produtora da exclusão. Juntos(as) enfrentaremos criticamente e com responsabilidade social as contradições, os conflitos cotidianos, os nossos equívocos e valorizaremos o outro e a outra, como parceiros na luta pela construção de um projeto comunitário de sociedade, de uma proposta

1 A obra, em seu conjunto, procurou garantir o respeito aos educadores e às educadoras, bem como aos edu candos e às educandas, considerando a questão de gênero, no uso também da linguagem. Durante a revisão, percebemos que, em alguns períodos, ficava redundante ou repe titivo ao se usar as palavras no masculino e no feminino e, especialmente, no uso do plural. Concordamos em usar, por exemplo: professores e alunos, para indicar os professores e as professoras e os alunos e as alunas. Isto, não significa privilegiar o gênero masculino.

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pedagógica – práxis emancipadora pois comprometidos com a vida, com a pro-dução de uma existência humana digna, fraterna e justa.

Nesta perspectiva, defendemos que uma avaliação formativa e emancipadora deve ser construída por todos(as) que fazem a escola, afirmando-se em cada gesto, tempo e espaço dentro e fora da sala de aula, ultrapassando os limites ins-titucionais e ganhando força comunitária, articulando outras escolas, movimen-tos sociais, coparticipando das lutas democráticas, nos mais diversos recantos deste nosso país e quiçá do mundo.

O nosso curso alia-se a vários educadores críticos, cujas referências estão explícitas durante toda a obra, objetivando estimular o debate, o estudo e, em especial, contribuir com a construção do diálogo crítico sobre esta área tão com-plexa: a avaliação educacional e da aprendizagem.

Como nos lembra Philippe Perrenoudi “a avaliação inspira paixões”. Apaixo-nada pela escola, pela área da avaliação, entrego a vocês esta obra – um trabalho coletivo – sob a minha responsabilidade como autora, mas que contou com a valiosa contribuição, competência e o incansável esforço humano da equipe pe-dagógica, administrativa, de direção técnica e produção, no sentido mais amplo – dos profissionais do IESDE.

A construção de cada capítulo contou direta ou indiretamente com a partici-pação de vários professores e alunos, por meio de depoimentos pessoais e cole-tivos, de relatos de experiências, entrevistas e resultados de pesquisas, nos quais eles foram seus principais sujeitos. O capítulo X, especialmente, amplia o diálogo sobre a avaliação no cotidiano escolar, garantindo a vez e a voz dos educadores vinculados ao IESDE e de outras regiões do país.

O conjunto da obra reúne doze capítulos e doze aulas produzidas em vídeo, que se intercomplementam, articulando fundamentos e práticas, dispostos a seguir.

Capítulo I – Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção �da escola democrática. (Aula 01).

Capítulo II – A avaliação como estratégia de gestão educacional: da regu- �lação à emancipação. (Aula 02).

Capítulo III – As políticas públicas de avaliação: uma reflexão crítica sobre �o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica. (Aula 03).

Capítulo IV – Trajetória da avaliação educacional e da aprendizagem no �Brasil: fundamentos e práticas. (Aula 04).

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Capítulo V – A avaliação, o currículo e a escola: enfrentamentos e desafios �coletivos na construção da avaliação emancipadora. (Aula 05).

Capítulo VI – A avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa e �emancipadora I: fundamentos teóricos e metodológicos. (Aula 06).

Capítulo VII – Avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa e �emancipadora II: autoavaliação e emancipação. (Aula 07).

Capítulo VIII – Avaliação da aprendizagem numa perspectiva formativa �e emancipadora III: introdução ao estudo de técnicas e instrumentos de avaliação da aprendizagem. (Aula 08).

Capítulo IX – Os testes de aproveitamento escolar I: reflexão crítica e orienta- �ções metodológicas para a elaboração, aplicação e avaliação. (Aula 09).

Capítulo X – Os testes de aproveitamento escolar II: mais alguns desafios. �(Aula 10).

Capítulo XI – Problematizando as notas escolares e os pareceres avaliati- �vos: é preciso mudar o rumo da história. (Aula 11).

Capítulo XII - A voz e a vez dos(as) professores(as): um diálogo sobre a �avaliação no cotidiano escolar. (Aula 12).

Conto com vocês, contem comigo. Fraternalmente,

Targélia de Souza Albuquerque

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Targélia de Souza AlbuquerqueO sonho de um mundo melhor nasce das entranhas de seu contrário1.

Paulo Freire

Durante muitos anos de caminhadas educativas, colocando os pés no chão da escola, venho constatando que inúmeras pegadas de alunos(as) que saem da escola – aprovados ou não – deixam profundas marcas na história social deste país e na história de vida de cada ser humano que por lá passou. Histórias de exclusão, de desvalorização dos saberes, de expe-riências feitas, de projetos pedagógicos antidemocráticos, mas também, histórias de lutas emancipadoras, de anúncio de transformação, de tenta-tivas e de sonhos. E, em cada história, de uma forma ou de outra, a ques-tão da avaliação faz-se presente.

Propomos ampliar a discussão sobre ética e avaliação, à luz dos ensina-mentos de Freire (2000a; 2000b; 2000c; 2000d; 1999; 1996; 1987 entre várias obras) e de Dussel (2000), especialmente, procurando construir pistas, trilhas, quiçá caminhos, para fortalecermos a luta pela (re)criação da escola pública popular substantivamente democrática.

Dussel (2000) fala da ética da libertação, de afirmação total da vida humana, como exigência de toda libertação e Freire (2000b), de uma ética universal do ser humano. Ambos compreendem a avaliação crítica direta-mente articulada à questão da ética, como práxis social transformadora, como uma das condições fundamentais para a construção de uma socie-dade digna, fraterna e justa, do ponto de vista dos excluídos e das excluí-das, de todos os seres humanos apartados, ao longo da história de nosso plane ta, de seus direitos de cidadania, de humanização.

Com certeza, a questão da ética é crucial em todos os momentos da ação pedagógica e de nossas vidas. A avaliação é para a ética um movimento –

1 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Indignação. 2000, p. 133.

Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção da escola democrática

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Avaliação da Educação e da Aprendizagem

uma pulsão vital – e a ética é para a avaliação, o seu fundamento e a finalidade de sua existência – sua direção social.

Para Freire (2000b), os homens e as mulheres em relação uns com os outros e com o mundo, fazem-se seres éticos. Mas a grande questão é a defesa e a preser-vação da ética, pois da mesma forma que pudemos construí-la, somos capazes de transgredi-la.

Precisamos estar em constante vigilância para não desrespeitar a rigorosida-de ética e resvalar para a sua negação, como alerta Freire (2000b). Para ele, a possibilidade de desvio ético “não pode receber outra designação senão a de transgressão” (FREIRE, 2000, p. 66). Um novo projeto de sociedade exige a mu-dança da cara da escola.

Paulo Freire não nos deixa esquecer que “o sonho de um mundo melhor nasce das entranhas de seu contrário”. Isto significa ter esperança, investir no que fazer, construir um novo projeto de sociedade em que a mudança da “cara” da escola, da educação é condição fundamental. Este é um dos nossos desafios e compromissos éticos.

Esperança e ética crítica, de mãos dadas, criam possibilidades de avaliar o mundo, a nossa existência no mundo, e nos mobilizam para enfrentar questiona-mentos sobre:

Por que mundo estamos lutando? �

Que sociedade queremos construir? �

Como recriar a escola numa perspectiva democrática? �

Como faremos para realizar a nossa vocação humana de � ser mais, na acep-ção freireana, num mundo cujas forças hegemônicas transgridem a ética e nos ensinam a ser menos, visando controlar o planeta, nossos corpos, nossas mentes – nossas vidas?

Precisamos convocar a ética para o centro dos debates, como enfatiza Roit-man (2000, p. 8). Não podemos esperar mais para refletir sobre o conteúdo nu-clear da ética, que é a vida humana.

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Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção da escola democrática

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Pela afirmação total da vida: por uma ética inseparável da prática educativa

Ethos e ética: situados no mundo podemos criticá-lo e reconstruí-lo

Alguns autores, entre eles Casali (1995, p. 235), vão chamar a atenção para a diferença entre ethos e ética. Ethos é um plexo de atitudes ou uma estrutura modal de habitar o mundo. O ethos pertence a um povo, a uma cultura, a um grupo, mas no limite é o caráter pessoal de cada pessoa. A ética é um momento do ethos, o momento temático ou explícito do já vivido em nível do ethos.

Para Japiassu e Marcondes (2003, p. 90), ética vem do grego “ethike, de ethi-kós: que diz respeito aos costumes”. Eles a definem como “parte da Filosofia prá-tica”, cujo objetivo é elaborar uma reflexão sobre a finalidade e o sentido da vida humana, os fundamentos da obrigação e do dever, natureza do bem e do mal, o valor da consciência moral etc. Explicam que a ética está fundada num estudo metafísico do conjunto de regras de conduta consideradas como universalmen-te válidas. Estabelecem uma diferença entre moral e ética, explicando que “dife-rentemente da moral, a ética está mais preocupada em detectar princípios de uma vida conforme a sabedoria filosófica, em elaborar uma reflexão sobre as raízes de se desejar a justiça e a harmonia e sobre os meios de alcançá-las”.

Para Chauí (1998, p. 1)

embora ta ethé e mores signifiquem o mesmo, isto é, costumes e modos de agir de uma sociedade, no singular, ethos é o caráter ou temperamento individual que deve ser educado para os valores da sociedade e ta éthiké é uma parte da Filosofia que se dedica às coisas referentes ao caráter e à conduta dos indivíduos e por isso volta-se para a análise dos próprios valores propostos por uma sociedade e para a compreensão das condutas humanas indivi-duais e coletivas, indagando sobre seu sentido, sua origem, seus fundamentos e finalidades. (apud Rios, 2001, p. 101)

Rios (2001, p. 101) afirma: “no ethos manifesta-se um aspecto fundamental da existência humana: a criação de valores. Valorizar é relacionar-se com o mundo, não se mostrando indiferente a ele, dando-lhe significação[...]”. Para esta autora, a ética, historicamente, passa a designar “não mais o costume”, mas a sua pro-blematização, o seu questionamento crítico: “a busca de seu fundamento, dos princípios que o sustentam[...]”.

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Avaliação da Educação e da Aprendizagem

É fundamental compreendermos que estamos situados histórica e cultural-mente no mundo. É, portanto, no ethos que se manifestam os valores, que se criam modos de conceber e praticar a vida, nele a própria existência humana é produzida ou negada.

Os seres humanos tornam-se seres éticos na relação uns com os outros, mediatizados pelo mundo.

Nós, educadores tornamo-nos seres éticos, à medida que problematizamos a sociedade, a educação, a escola, a nossa atuação como sujeitos históricos em relação uns com os outros, como construtores de um mundo melhor, que afir-memos a produção da existência digna, fraterna e justa.

Demonstraremos ao longo deste estudo a necessidade de uma ética crítica não só teorizada, mas praticada na escola, fundamentando a sua proposta edu-cacional e orientando as suas práticas pedagógicas/avaliativas, comprometidas com a democratização da própria escola e da sociedade.

A ética e a construção de um novo projeto social de uma nova escola

É imperativo ético compreender a conjuntura política atual em suas múltiplas contradições sociais, as forças hegemônicas que regem as políticas neoliberais da globalização de mercado, compreendendo os movimentos de resistência antiglobalização; a questão educacional, em especial da avaliação como estraté-gia política de controle estatal, para desconstruir visões, conhecimentos e pro-jetos já instalados e aceitos com naturalidade, investindo na criação do conheci-mento emancipação-solidariedade, como reafirma Santos (2000).

Devemos investir, coletivamente, com toda a nossa coragem, discernimento e vontade, agregando forças, aliando-nos às massas excluídas, para a construção de um novo projeto de sociedade, calcado na autonomia, na participação, na emancipação, na substantividade democrática.

A construção deste novo projeto social, do qual a educação/a escola pública popular substantivamente democrática é condição sine qua non, torna a ética inse-parável da avaliação, transformando-a em seu suporte estratégico do fazer crítico.

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Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção da escola democrática

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A (re)criação da escola substantivamente democráticaPara Freire (2000d, p. 101-102), a discussão sobre ética e educação democrá-

tica está diretamente articulada à criação e recriação da escola que deve ser um dos principais locus de realização desta educação de qualidade. Ressaltamos que qualidade para poucos não é qualidade: é privilégio. Portanto, esta quali-dade a que nos referimos deve estar substantivada de democracia. Destacamos, para efeitos de discussão, alguns pontos que acreditamos fundamentais para se compreender criticamente a questão da avaliação para a escola democrática:

chamamento e acolhida do povo: o povo vai à escola para participar cole- �tivamente de seu projeto pedagógico e ter ingerência nas suas decisões; participação do povo no cuidado da coisa pública; sentido de pertinência/identidade social; democratização do acesso e permanência, com o com-promisso, com o atendimento às necessidades básicas de aprendizagem dos educandos e das educandas;

a escola se constrói no diálogo, na conscientização: problematização e �inserção crítica na realidade/na escola, através da superação do conser-vadorismo e criação da práxis transformadora: participação democrática da comunidade escolar – direção, coordenação, coletivo de professores(as), alunos(as), funcionários(as), entre outros – nos processos de gestão, de-senvolvimento e avaliação das ações pedagógicas dentro e fora de sala de aula, fundada no respeito à autonomia e à dignidade individual e coletiva. Democratização do poder dentro e fora da sala de aula. Implementação da gestão colegiada, investimento na formação de um coletivo pedagó-gico forte, em que todos os membros da escola tornem-se parceiros da construção do ensino e da aprendizagem da educação emancipadora;

currículo como prática social de significação, articulando conteúdos e prá- �ticas pedagógicas à realidade dos educandos(as): profundo respeito aos saberes de experiência feitos; reorientação curricular garantindo a partici-pação de todos(as) os envolvidos(as) no processo; transformação da escola em núcleo de aprendizagem, de criticidade dos saberes hegemonicamen-te instituídos, de produção de novos conhecimentos plenos de eticidade e solidariedade. Em síntese, a educação, que move a escola porque é a sua seiva vital, precisa garantir a articulação entre vida – realidade concreta – e as várias dimensões do conhecimento sistematizado;

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Avaliação da Educação e da Aprendizagem

formação permanente dos professores(as), indissociável do movimento �de reorientação curricular: necessidade de formação permanente dos professores(as), numa perspectiva interdisciplinar, garantindo-lhes a elaboração de uma tela crítica para leitura da realidade e autonomia na ela-boração de projetos pedagógicos; problematização das relações sociais in-tra e extra-escolares, visando à superação dos preconceitos de raça, classe e sexo, entre outros, e radicalização da democracia para garantir a todos(as) os(as) alunos(as) o direito a uma educação de qualidade; abertura constante a novos saberes socialmente construídos, com estudos das novas tecnolo-gias, e sua utilização no ensino; acompanhamento crítico das novas exigên-cias sociais, recriando e criando práticas pedagógicas democráticas;

articulação com os movimentos sociais em programas, projetos, práticas �educativas de educação de jovens e adultos(as): estimulação à participa-ção organizada dos movimentos sociais populares em projetos educacio-nais emancipadores. A escola como locus de sistematização dos desejos, dos sonhos e das iniciativas populares; reconhecimento de que a escola não é o único espaço de veiculação do conhecimento, mas que ela só reali-za educação, através de suas práticas pedagógicas que garantam aos seus alunos e alunas a formação do sujeito popular crítico, consciente de suas possibilidades de atuação no contexto social;

transformação da escola em centro cultural de articulação social, como �espaço do fazer ciência, arte, política, tecnologia, comunicação em várias linguagens, do fazer alegria, curiosidade, do construir uma convivência solidária pela crítica e superação dos conflitos.

Para que possamos construir a substantividade democrática, precisamos avaliar não só a retórica conservadora hegemônica, mas cada uma de nossas ações dentro e fora da escola, compreendendo-nos como sujeitos capazes de transformar as nossas práticas pedagógicas autocráticas e de investir nos pro-cessos de participação e organização social humanizadores. Nesta perspectiva, ética e avaliação não só exercem uma força mobilizadora nos debates sobre a qualidade da educação, como também são motores da dialética de sua própria construção.

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Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção da escola democrática

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Ética e avaliação são inseparáveis das práticas educativas

Conhecer, problematizar, desenvolver questionamentos críticos para inter-pretar fundamentos, construir princípios norteadores para uma avaliação ética crítica são desafios de todos(as) os(as) educadores(as) que se comprometem com a reconstrução coletiva e emancipadora da escola brasileira.

Isto significa rejeitar e criticar radicalmente a ética do mercado e investir na ética universal do ser humano, na ética da libertação. Como afirma Freire (2000b, p. 17):

Falo da ética que condena o cinismo do discurso neoliberal, das posições quietistas[...], que condena a exploração da força do trabalho humano, que condena acusar por ouvir dizer [...], falsear a verdade, iludir o incauto, golpear o fraco e indefeso, soterrar o sonho e a utopia, prometer sabendo que não cumprirá a promessa, testemunhar mentirosamente, falar mal dos outros pelo gosto de falar mal [...]. A ética de que falo é a que se sabe traída e negada nos comportamentos grosseiramente imorais como na perversão hipócrita da pureza em puritanismo. A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifestação discriminatória de raça, de gênero, de classe. É por esta ética, inseparável da prática educativa [...] que devemos lutar.

A avaliação como ação política: segregação ou qualidade social?

Temos clareza de que a avaliação, como ação política, precisa estar compro-metida com a qualidade social, constituindo-se como prática educativa liberta-dora, combativa da exclusão, do sofrimento, dos preconceitos, das discrimina-ções de raça, classe, gênero, religião, entre outras, em favor dos(as) excluídos(as), dos povos vitimados. O seu maior significado está em fortalecer o movimento que leva à democratização da sociedade, nele intervindo sempre que necessário para garantir a educação como um bem civilizatório, como direito de cidadania, de desenvolvimento pleno da existência humana digna, fraterna e justa.

Construir uma perspectiva democrática de avaliação com vistas à qualidade social é anunciar uma perspectiva de educação/de escola calcada em princípios democráticos e emancipatórios. Explicitar esta visão torna-se indispensável para poder compreender e tornar práxis uma avaliação que supere a regulação e se afirme como emancipação.

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Avaliação da Educação e da Aprendizagem

Existem múltiplos olhares sobre a avaliação, dependendo dos interesses em jogo, das forças sociais que a movem. Ela pode ser construída para reafirmar o compromisso com a produção da vida humana, com projetos democráticos para a qualidade social, ou servir para implementar um projeto que negue parcial ou radicalmente esta ética, transformando-se em mais um mecanismo seletivo ou em estratégia de gestão de políticas excludentes, classificatórias, nas mãos da globalização de mercado.

Freire (2000b, p. 16-17) faz um contraponto entre a ética de mercado e a ética do ponto de vista dos excluídos, reafirmando a sua defesa por esta: “mas é pre-ciso deixar claro de que a ética de que falo não é a ética menor, restrita do mer-cado, que se curva obediente aos interesses do lucro (...). Não falo, obviamente, desta ética. Falo, pelo contrário, da ética universal do ser humano.”

Para Freire (2000c) e Dussel (2000), faz parte do domínio da ética universal do ser humano/da ética da libertação, a luta em favor dos povos famintos e destro-çados, a briga em favor dos direitos humanos, onde quer que ela se trave. Freire (2000b, p. 129-130) explicita alguns desses direitos: de ir e vir, de comer, de vestir, de dizer a palavra, de amar, de escolher, de estudar, de trabalhar, de crer, de ter segurança, de ter paz. “A ética de que falo é a que se sabe afrontada na manifes-tação discriminatória de raça, de gênero, de classe”. (Freire, 2000b, p. 17)

A ética deve fazer parte do nosso cotidiano, integrada na história dos povos e das nações

Esta ética deve fazer parte do nosso cotidiano, das nossas pequenas ações e das grandes decisões. Ela é construída entre múltiplas contradições sociais e muitas inquietações pessoais, precisa resistir e se reconstruir a cada momento em face das pressões do mercado e dos mais variados tipos de transgressões éticas. Precisa integrar a história dos povos e das nações. Este é um desafio ético que precisamos enfrentar.

A ética e a avaliação tecem-se no diálogo da teoria com a prática

Ética e avaliação intercomplementam-se dialeticamente: uma é fundamento da outra enquanto se materializam num projeto de emancipação humana/social.

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A questão da avaliação crítica permanente passa a ser visceral na realização da própria ética, assim como não se pode conceber uma avaliação emancipadora des vinculada de seus princípios éticos.

A avaliação, nesta perspectiva, permite-nos compreender como a avaliação educacional da aprendizagem se constrói histórica e culturalmente, pela inter-venção concreta dos homens e mulheres em relação uns com os outros, media-tizados pelo mundo. A avaliação faz-se no tensionamento das relações humanas e sociais e atua como um dos motores da dialética da própria vida. Precisamos estar bem atentos aos sistemas avaliativos que orientam nossos olhares para o mundo, para nós mesmos e para o outro.

Homens e mulheres: seres capazes de problematizar, de avaliar, de fazer opções, de transformar

Freire (1987) coloca a questão da avaliação crítica como nuclear nas suas obras. Considerando que o homem e a mulher são seres inconclusos, ele os con-cebe como seres capazes de avaliar criticamente sua presença no mundo, como seres de opção, capazes de transformar-se e de recriar a história.

É transgressão da ética...Afirmamos que a avaliação, enquanto práxis democrática, é um dos funda-

mentos da educação emancipadora; que quaisquer mecanismo, instrumento, estratégia política de avaliação que dificultem, neguem, excluam a possibilidade dos(as) educandos(as) de apreender e aprender criticamente o conhecimento, de ressignificá-lo com autonomia, com liberdade, são transgressões da ética e estão negando a cada criança, jovem, adulto(a) o direito civilizatório de uma educação de qualidade, substantivamente democrática, em outras palavras: estão negando a vida a eles e a elas – o seu direito à vida.

Nesse sentido, a avaliação deve promover aprendizagens que criem vida, nas sociedades, nas comunidades, nas famílias, nas escolas, nos mais diversos recan-tos deste planeta, deve ativar práticas educativas que produzam conhecimento do mundo e um bem querer ao outro e à outra, a alegria da convivência: da par-ticipação, do brincar, da curiosidade epistemológica, da investigação, do falar e ser ouvido(a), do avaliar sem medo de ser punido(a); aprendizagens que tornem a vida plena de dignidade, justiça e solidariedade.

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Destacamos a seguir algumas questões relacionadas à avaliação, propostas por Paulo Freire em muitas de suas obras, para dialogarmos sobre a estreita vinculação entre ética e avaliação, e usufruirmos dos seus ensinamentos para mudar a cara da escola, democratizando nossas práticas educativas e humani-zando-nos cada vez mais, procurando sempre lembrar que um mundo melhor, uma escola melhor e seres melhores nascem das entranhas de seus contrários.

Os alunos(as) são tratados pela escola como seres abstratos. A organiza- �ção curricular desconhece “seus saberes de experiência feitos” – sua histó-ria e sua cultura. “Toda esta sabedoria que essa criançada popular tinha e continua tendo, estava à margem das preocupações da escola e não valia coisa nenhuma para a avaliação da escola com relação à posição do edu-cando nela.” (FREIRE; GUIMARÃES, 1982, p. 28).

Freire chama a atenção para a necessidade de uma aproximação cultural e afetiva do(a) aluno(a) para observar criticamente suas condições de entrada na escola, “seus saberes de experiência feitos” com a finalidade de suprir as aprendi-zagens e não de rotulá-lo como inferior ou de predestinar o seu fracasso.

A escola estimula uma corrida pedagógica. Há um jogo de inclusão, em �que geralmente vencem os alunos mais fortes, cujas experiências de clas-se social são mais valorizadas pela escola. O prêmio – as notas altas. Assim, é claro que, à partida, eu estava com tudo para ganhar nessa corrida! É que a nossa escola não deixou de ser nunca uma pista de corrida, onde alguns chegam na frente, outros atrás, e outros abandonam, porque não conseguem ir nessa corrida, nessa direção, vendo que a sua realidade fica toda fora, não? (FREIRE; GUIMARÃES, 1982 p. 29-30).

Um currículo homogeneizante e critérios de avaliação classificatórios re- �forçam os mecanismos seletivos dentro e fora da escola. Freire explica que os condicionamentos de classe social que se expressam na organização do currículo, refletem-se, também, na elaboração dos critérios de avalia-ção homogeneizantes – “éramos colocados todos diante de uma mesma régua – sob a justificativa de avaliar a todos igualmente, com os mesmos instrumentos”. A avaliação exerce a função discriminatória, classificatória. Neste jogo, os vencedores seguem em frente e os perdedores são repro-vados pela escola e, em muitos casos se evadem. Freire convoca os educa-dores e as educadoras – a escola – a democratizar seus processos de ava-liação, pois muitos alunos que são limitados pela escola, já descobriram o

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mundo e nele demonstram liderança. Ele nos fala da democratização dos critérios de avaliação: democratizando mais seus critérios de avaliação do saber, a escola deveria preocupar-se com preencher certas lacunas de expe-riência das crianças, ajudando-as a superar obstáculos em seu processo de conhecer (FREIRE, 2000a, p. 22-23).

Assim como o aluno e a aluna são considerados objetos da avaliação e não �os seus próprios sujeitos, os professores e as professoras são submetidos a esse mesmo processo. Muitas escolas continuam reforçando uma pedago-gia autoritária, colocando nas mãos dos professores a decisão pela apro-vação ou reprovação do educando e da educanda, alijando-os do direito de participar do seu processo de aprender e avaliar. Isto também acontece com os professores, quando são submetidos a um processo de avaliação. Freire (2000b, p. 130) afirma que “os sistemas de avaliação pedagógica de alunos e de professores vêm assumindo cada vez mais como discursos verticais de cima para baixo, mas insistindo em passar por democráticos”.

O autor pontua que a questão não é a de ficar contra a avaliação, mas de resistir aos métodos silenciadores com que ela vem sendo às vezes realizada. A questão que se coloca a nós é lutar em favor da compreensão e da prática da educação enquanto instrumento de apreciação do que fazer de sujeitos críticos a serviço, por isso mesmo, da libertação e não da domestificação. Avaliação em que se estimule o “falar a” como caminho do “falar com”. (grifo nosso).

Avaliação compartilhada, dialógica no exercício da pedagogia da autonomia

Freire (1999, p. 47) explica como a avaliação compartilhada, dialógica, na qual os alunos e os professores são sujeitos coparticipantes, contribui com o processo de construção do conhecimento, possibilitando ao aluno compreender critica-mente o seu processo de aprendizagem, reconstruindo-o quando necessário.

Minha experiência vinha me ensinando que o educando precisa se assumir como tal, mas, assumir-se como educando significa reconhecer-se como sujeito que é capaz de conhecer e que quer conhecer em relação com outro sujeito igualmente capaz de conhecer, o educador e, entre os dois, possibilitando a tarefa de ambos, o objeto do conhecimento [...]. O educando se reconhece conhecendo os objetos, descobrindo que é capaz de conhecer, assistindo à imersão dos significados em cujo processo se vai tornando também significador crítico...

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Todas essas questões estão, de uma forma ou de outra, referenciadas à ques-tão da ética como um dos fundamentos de uma pedagogia da autonomia. A avalia ção faz parte do fazer pedagógico. Reconstruir a avaliação não é apenas um desafio a ser enfrentado pelos educadores e pelas educadoras comunitaria-mente com os educandos e as educandas, é sobretudo uma exigência ética para democratizar a escola. Segundo Freire (2000b, p. 71).

[...] ao pensar sobre o dever que tenho, como professor, de respeitar a dificuldade do educando, sua autonomia, sua identidade em processo, devo pensar também, como já salientei, em como ter uma prática educativa em que aquele respeito, que sei dever ter ao educando, se realize em lugar de ser negado. Isto exige de mim uma reflexão crítica permanentemente sobre minha prática através da qual vou fazendo a avaliação do meu próprio fazer com os educandos. O ideal é que, cedo ou tarde, se invente uma forma pela qual os educandos possam participar da avaliação. É que o trabalho do professor é o trabalho do professor com os alunos e não do professor consigo mesmo. (grifo nosso)

Para ampliar a participação dos educadores e dos educandos nos processos de avaliação, em diferentes tempos e espaços sociais/pedagógicos, Freire (1987, 1999 e 2000a) propõe a realização de seminários de avaliação.

Freire (1987) destaca em Pedagogia do Oprimido, a importância desses semi-nários para a “significação conscientizadora da realidade”, relacionando-a com a investigação dos temas geradores e os vários momentos do processo investigati-vo/educativo. Aborda, em várias de suas obras, a sua relevância para a análise crí-tica dos achados da investigação de campo, para o processo de decodificação da realidade, “compartilhamento” de visões de mundo e de interpretações das com-preensões individuais e coletivas que possibilitam “um novo sentido codificador” e consequente ressignificação e intervenção criadora – práxis emancipadora.

Ele explica a função do seminário avaliativo: a de possibilitar a análise crítica dos dados – descodificação da realidade, ativando o processo pedagógico de aprendizagem da própria investigação participativa; garantindo a vez e a voz dos pesquisadores auxiliares – “representantes do povo”; reorientando, ressig-nificando, plenificando o processo de participação coletiva: substantivamente democrática (FREIRE, 1987, p. 106).

Esta proposta de seminários de avaliação pode fornecer subsídios relevantes para a elaboração da proposta pedagógica da escola, seu acompanhamento, e consequentes reorientações de suas práticas pedagógicas, além de fundamen-tarem, tanto do ponto de vista epistemológico, como teórico-prático, o plane-jamento didático, desde o seu aspecto formal até a sua concretização como práxis, através das ações cotidianas sistematicamente refletidas e ressignificadas (FREIRE, 2000c, p. 102).

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Por tudo o que foi discutido neste texto, e em especial pelas contribuições freireanas, defendemos uma avaliação que contribua com a escola democrática, fundamentada nos seguintes princípios:

a avaliação é ação político-ética; é práxis transformadora. A sua base é o conhe- �cimento – emancipação/solidariedade. Ela se faz no e para o coletivo pedagó-gico, é prática comunitária. O respeito à autonomia e à dignidade de cada ser humano não são concessões, mas uma exigência ética deste trabalho;

a avaliação articula-se a um projeto de sociedade, de educação, de escola. �É imperativo ético construir comunitariamente estes projetos, explicitan-do os conteúdos e as direções das lutas pela construção de uma sociedade democrática, digna, fraterna e justa. A avaliação deve ser um dos motores de sua realização, nessa perspectiva;

a avaliação fundamenta-se na relação dialógica e precisa realizar-se nela �– ser diálogo. É um processo de comunicação social – e faz-se na relação com o outro, como aprendizagem de leitura crítica de mundo e da pre-sença de cada um(a) no mundo, para recriá-lo. A rigorosidade teórica e metodológica estão submetidas à rigorosidade ética, na concretização do pensar e do fazer avaliativos;

a avaliação orienta o currículo e a prática pedagógica na escola. A avalia- �ção que garante a participação e o diálogo crítico fundamenta a reorien-tação curricular e a reconstrução de práticas pedagógicas numa pers-pectiva emancipadora. As vozes, tanto dos professores como dos alunos, devem ser ouvidas no processo de organização do currículo e do traba-lho pedagógico escolar, dos quais a avaliação é parte. A avaliação crítica tece toda a prática pedagógica escolar, contribuindo com os processos emanci patórios e a democracia na escola. A autoavaliação criteriosa é um passo na conquista da autonomia;

a avaliação é uma força criadora do aprender e do ensinar. Ela é uma decla- �ração de compromisso com a aprendizagem dos alunos e das alunas, coparticipando com outras práticas pedagógicas do processo de cons-trução e ressignificação do conhecimento. A avaliação integra a unidade dinâmica e dialética da reflexão–ação–reflexão: práxis transformadora. É problematizadora, desafiadora, estimuladora da “curiosidade episte-mológica”. É ação colaborativa dos(as) professores(as) com os seus alunos/as suas alunas e entre os próprios pares, visando à compreensão do pro-cesso de aprendizagem e sua efetiva concretização;

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a avaliação é � querer bem, pleno de respeito e generosidade. É um ato de amor, de humildade e de coragem. É, portanto, indispensável que a ava-liação produza vida, libertação, condenando todo tipo de violência, que humilha, destrata e exclui. A avaliação na (e da) prática pedagógica, nessa perspectiva, conduz a seu aperfeiçoamento contínuo, ao ensino de melhor qualidade. Ela estimula educadores e alunos, todos os que fazem a escola, a desejá-la como algo que produz o bem comum. Ela é produtora de ale-gria, de participação na aula, de vontade de aprender e de estar na escola. Ela coparticipa da escola democrática.

A ética e a avaliação, em suas interfaces e articulações, constituem-se como fundamentos da construção da escola numa perspectiva democrática. À medida que este tema é incorporado pela escola como uma discusão necessária, come-çam a surgir mudanças significativas nas práticas pedagógicas de sala de aula e na organização do trabalho pedagógico da própria instituição, pois os educado-res, as educadoras, os educandos e as educandas transformam-se em sujeitos históricos, com autonomia para a recriação do projeto político-pedagógico e concretização de novas reorientações curriculares críticas – criadoras de conhe-cimentos e práticas emancipadoras e solidárias.

Texto complementar

Segunda carta: do direito e do dever de mudar o mundo

(FREIRE, 2000c, p. 26-28)

Se alguém, ao ler este texto, me perguntar, com irônico sorriso, se acho que, para mudar o Brasil, basta que nos entreguemos ao cansaço de cons-tantemente afirmar que mudar é possível e que os seres humanos não são puros espectadores, mas atores também da história, direi que não. Mas direi também que mudar implica saber que fazê-lo é possível.

É certo que mulheres e homens podem mudar o mundo para melhor, para fazê-lo menos injusto, mas a partir da realidade concreta a que “chegam” em sua geração. E não fundadas ou fundados em devaneios, falsos sonhos sem raízes, puras ilusões.

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O que não é, porém, possível é sequer pensar em transformar o mundo sem sonho, sem utopia ou sem projeto. As puras ilusões são os sonhos falsos de quem, não importa que pleno ou plena de boas intenções, faz a proposta de quimeras que, por isso mesmo, não podem realizar-se. A transformação do mundo necessita tanto do sonho quanto a indispensável autenticidade deste depende da lealdade de quem sonha às condições históricas, mate-riais, aos níveis de desenvolvimento tecnológico, científico do contexto do sonhador. Os sonhos são projetos pelos quais se luta. Sua realização não se verifica facilmente, sem obstáculos. Implica, pelo contrário, avanços, recuos, marchas às vezes demoradas. Implica luta. Na verdade, a transformação do mundo a que o sonho aspira é um ato político e seria uma ingenuidade não reconhecer que os sonhos têm seus contra-sonhos. É que o momento de que uma geração faz parte, porque histórico, revela marcas antigas que envolvem compreensões da realidade, interesses de grupos, de classes, preconceitos, gestação de ideologias que se vêm perpetuando em contradição com aspec-tos mais modernos. Não há hoje, por isso mesmo, que não tenha “presenças” que, de há muito, perduram no clima cultural que caracteriza a atualidade concreta. Daí a natureza contraditória e processual de toda realidade.

[...] Precisamente porque a reação imobilizante faz parte da atualidade é que ela, de um lado, tem eficácia, de outro, pode ser contestada. A luta ideoló-gica, política, pedagógica e ética a lhe ser dada por quem se posiciona numa opção progressista não escolhe lugar nem hora. Tanto se verifica em casa, nas relações de pais, mães, filhos, filhas, quanto na escola, não importa o seu grau, ou nas relações de trabalho. O fundamental, se sou coerentemente pro-gressista, é testemunhar, como pai, como professor, como empregador, como empregado, como jornalista, como soldado, cientista, pesquisador ou artista, como mulher, mãe ou filha, pouco importa, o meu respeito à dignidade do outro ou da outra. Ao seu direito de ser em relação com o seu direito de ter.

Possivelmente, um dos saberes fundamentais mais requeridos para o exercício de um tal testemunho é o que se expressa na certeza de que mudar é difícil, mas é possível. É o que nos faz recusar qualquer posição fatalista que empresta a este ou àquele fator condicionante um poder determinante, diante do qual nada se pode fazer.

Por grande que seja a força condicionante da economia sobre o nosso com-portamento individual e social, não posso aceitar a minha total passividade perante ela. Na medida em que aceitamos que a economia ou a tecnologia ou

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a ciência, pouco importa, exerce sobre nós um poder irrecorrível não temos outro caminho senão renunciar à nossa capacidade de pensar, de conjectu-rar, de comparar, de escolher, de decidir, de projetar, de sonhar. Reduzida à ação de viabilizar o já determinado à política, perde o sentido da luta pela con-cretização de sonhos diferentes. Esgota-se a eticidade de nossa presença no mundo. É neste sentido que, reconhecendo embora a indiscutível importância da forma como a sociedade organiza sua produção para entender como esta-mos sendo, não me é possível, pelo menos a mim, desconhecer ou minimizar a capacidade reflexiva, decisória, do ser humano. O fato mesmo de se ter ele tor-nado apto a reconhecer quão condicionado ou influenciado é pelas estruturas econômicas o fez também capaz de intervir na realidade condicionante. Quer dizer, saber-se condicionado e não fatalistamente submetido a este ou àquele destino abre o caminho à sua intervenção no mundo. O contrário da interven-ção é a adequação, a acomodação ou a pura adaptação à realidade que não é assim contestada. É neste sentido que entre nós, mulheres e homens, a adap-tação é um momento apenas do processo de intervenção no mundo. É nisso que se funda a diferença primordial entre condicionamento e determinação. Só é possível, inclusive, falar em ética se há, escolha que advém da capacida-de de comparar, se há responsabilidade assumida. É por estas mesmas razões que nego a desproblematização do futuro a que sempre faço referência e que implica sua inexorabilidade. A desproblematização do futuro, numa compre-ensão mecanicista da história, de direita ou de esquerda, leva necessariamente à morte ou à negação autoritária do sonho, da utopia, da esperança. É que, na inteligência mecanicista, portanto determinista da história o futuro é já sabido. A luta por um futuro já conhecido a priori prescinde de esperança. A despro-blematização do futuro, não importa em nome de que, é uma ruptura com a natureza humana, social e historicamente constituindo-se.

O futuro não nos faz. Nós é que nos refazemos na luta para fazê-lo.

Dicas de estudoHá um site que disponibiliza diversos vídeos sobre educação, bastante enri-

quecedores. Disponível em: <http://midiaseducacao-videos.blogspot.com/>.

Alguns vídeos são sobre Paulo Freire, nos quais você terá oportunidade de conhecer melhor as suas ideias e ver o próprio Freire enunciando-as.

Sugerimos: Paulo Freire Contemporâneo (partes I, II e III).

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Atividades1. Considerando o projeto político-pedagógico (PPP) da escola, procure definir

como os professores podem participar da construção do mesmo.

2. Descreva uma prática avaliativa que, de algum modo, contribua para a ética universal do ser humano e para a recriação da escola numa perspectiva de-mocrática.

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Ética e avaliação: uma discussão necessária para a construção da escola democrática1. Espera-se que o aluno destaque, na elaboração da resposta, aspectos

como: a participação coletiva, envolvendo os demais professores e os outros segmentos da escola; o cuidado com a instituição escolar e a coisa pública; a ética como princípio de atuação profissional; a partici-pação baseada na democracia e no diálogo; a superação do conserva-dorismo e a criação da práxis transformadora; o respeito à autonomia e à dignidade individual e coletiva, a articulação do projeto político- -pedagógico com a realidade e os movimentos sociais; a transforma-ção da escola em centro cultural de articulação social, entre outros.

2. O aluno pode descrever qualquer prática avaliativa em que estejam presentes os cuidados com a ética, as práticas educativas libertadoras e de combate à exclusão, os procedimentos democráticos, a preocu-pação efetiva com a aprendizagem, a participação ativa dos alunos no processo avaliativo, a inserção de práticas que levem à problematiza-ção e à transformação, entre outras características.

Gabarito

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