Ética do fim de vida
DESCRIPTION
Slides usados em aula na UC "Ética e Deontologia" do CLE da ESELTRANSCRIPT
Problemas éticos no fim devida
João Veiga
2013
Ética do fim de vida
A vida e a morte no limiar do novo século– A nova realidade:
Avanços da higiene e medicina - A esperança média de vida
aumentou drasticamente no mundo ocidental;
A institucionalização da morte – cerca de 70% morre em
instituições;
Rituais da morte e do luto – tabu;
Referência à morte - obscenidade, depravação.
Ditadura da técnica » fazer tudo o que a ciência permite;
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 2
Ética do fim de vida: rever conceitos
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 3
Tratamento que não tem boa probabilidade de tervalor terapêutico, isto é, quando agrega riscoscrescentes sem um benefício associado
Futilidade
Encarniçamento terapêutico (distanásia)– Prolongar a vida de modo artificial, sem perspectiva de cura
ou melhoria clínica
Ética do fim de vida: rever conceitos
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 4
Dificuldades:- Porquê 1%? Será que o caso que estamos a analisar “cai” no 1%?- Os critérios são meramente médicos?- Não é tido em conta a hierarquia de valores e os objectivos de vida dopaciente?- Os objectivos das profissões de saúde (teleologia) devem impor-se àcomunidade?
Como definir objectivamente futilidade médica:algumas questões– Quantitativamente:
Probabilidade de menos de 1% de sucesso (in.SCHNEIDERMAN, Lawrence; JACKER, Nancy; JONSEN, Albert – Medical Futility: Its Meaning andEthical Implications. Annals of Internal Medicine. 153(1990) pp. 949-954)
– Qualitativamente: Preserva uma vida permanentemente inconsciente e não
consegue por fim a dependência total de cuidados intensivos (in.Ibid.)
Ética do fim de vida: discussão
Como definir objectivamente futilidade: algumasquestões:– Com base em indicadores de “Qualidade de vida”:
Utilização de indicadores (e.g. Quality-Adjusted Life-Years)?
– Com base em critérios económicos: Quanto custa o tratamento? O que deixa de ser feito?
– Respeito intransigente pela vontade manifestada pelodoente (ou representante legal)? Autonomia como principio primordial (teorias libertárias)?
– O critério “idade”: A transição para o encarniçamento terapêutico pode ser
condicionada pela idade?
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 5
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 6
Ética do fim de vida: discussão
O problema ético
Recusa em abreviar a vida emquaisquer condições devido aoseu carácter sagrado
Respeito intransigente pelaautonomia do doente (actual ouanteriormente expresso)
Que orientação seguir?
O consenso sobre a condenação da obstinação terapêutica é um avanço considerável no respeito
pela autonomia do doente
Ética do fim de vida: discussão
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 7
Alguns elementos relevantes para a reflexão
ética:
– Papa Pio XII (1957) – Rejeição dos “meios extraordinários” (amesma doutrina que serviu para legitimar o conceito de mortecerebral);
– Conselho da Europa (1974) - O prolongamento da vida nãodeve impor-se à diminuição do sofrimento;
– Ordem dos Enfermeiros (1998) - Código – permitir que avontade do doente terminal seja respeitada (“advogado dodoente”);
– International Council of Nursing (2000) - Código –Compatibilização da ciência e tecnologia com a dignidade dapessoa.
Ética do fim de vida: discussão
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 8
Possibilidade de manifestação antecipada de vontade
A morte pode não ficar a dever-se à doença de base
A cessação do uso da tecnologia (terapêuticaincluída) pode ocorrer por duas razões:
Inutilidade terapêutica; Pedido do paciente.
Ética do fim de vida: Suicídio assistido
Conceito: fornecer os meios para que o doentepossa por termo a sua vida sem que no acto (depor termo à vida) haja participação de terceiros.
– Alguns exemplos:
Suíça (art. 115ª CPS de 1918):– Crime se a motivação for egoísta;
– Sem assistência médica no acto.
– Associação DIGNITAS promove o “turismo suicida” na Suíça
Estado Federal Oregon - Oregon's Death withDignity Act (1997):
– Baseado num referendo (49% contra e 51% a favor);
– Prescrição médica de fármacos que permitem o suicídio;
– Proibição da eutanásia.
– 35% os fármacos para cometer suicídio não são utilizados.05-06-2013
João Veiga - Ética e Deontologia 9
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 10
Ética do fim de vida: Suicídio assistido
In. http://www.oregon.gov/DHS/ph/pas/docs/year12.pdf
Ética do fim de vida: Suicídio assistido
Argumentos de oposição
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 11
Éticos:- Santidade da vida (posição das religiões do Livro; moralbudista);- O sofrimento do suicida compromete a sua autonomia;- A autonomia não implica autocracia (o ser humano não é donoda sua identidade pessoal » a existência implica relação);- Razão (condição de liberdade) não significa superação definitude.
Jurídicos:- A vida é considerada um bem indisponível;- A ajuda ao suicídio é punida com pena de prisão até 6 anos.
Ética do fim de vida: Eutanásia
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 12
Definição actual:“ … morte de uma pessoa, a seu pedido, por outra pessoa que acolhe o pedido e pratica um acto intencional destinado a produzir a morte” (Daniel Serrão)
Eutanásia:– A Etimologia:
“eu” ( bom) e “thanatos” (morte): boa morte; morte doce e semsofrimento;
– A história: Esparta: abandono dos recém-nascidos com malformações;
Ilha de Cós: era oferecido veneno aos velhos, após uma festa;
Platão: a medicina deve ocupar-se dos bem constituídos de corpoe alma e deixar morrer aqueles cujo corpo é mal constituído(Republica);
Thomas More: defende a prática (sem utilizar a palavra) nacelebre obra “Utopia”.
Ética do fim de vida: Eutanásia
A situação internacional:
– Legalizada:
Holanda desde 2001 (tolerada desde 1984, mas nãolegal);
Bélgica desde 2002;
Luxemburgo desde Março 2009.
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 13
A legalização foi precedida de umlongo debate, iniciado nos anos 60.
Ética do fim de vida: Eutanásia
Critérios para a eutanásia, segundo a leiHolandesa (artigo 2º):
– Convencimento que o pedido voluntário e bem considerado;
– Ter a convicção que o sofrimento do doente é permanente e
insuportável;
– Informação ao doente sobre a sua situação e perspectivas;
– Doente teve a convicção que não havia outra solução razoável
para a sua situação;
– Consulta de outro médico (pelo menos um) e tem a opinião
por escrito.
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 14
Ética do fim de vida: Eutanásia
Terminação da Vida a pedido 1990* 1995* 2005* 2010**
Terminação da vida a pedido 1.9 2.6 1.8 ?
Eutanásia 1.7 2.4 1.7 2910
Suicídio assistido 0.2 0.2 0.1 182
Sem pedido explícito 0.8 0.7 0.4 ?
Estimativa de mortes (Eut. e SA) 2700 3600 2425 3136
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 15
*van der Heide, Agnes, Onwuteaka-Philipsen, Bregje D., Rurup, Mette L., Buiting, Hilde M., van Delden, JohannesJ. M., Hanssen-de Wolf, Johanna E., . . . van der Wal, Gerrit. (2007). End-of-life practices in the Netherlandsunder the Euthanasia Act. The New England Journal Of Medicine, 356(19), 1957-1965.
*SANTOS, L. F. d. (2009). Ajudas-me a morrer? A morte assistida na cultura ocidental do século XXI.Lisboa, Sextante Editora.
**Regional euthanasia review committees annual report 2010
*estimativa em função número total de mortes
** valores absolutos
De 2009 para 2010 houve um aumento de 19%
Ética do fim de vida: Eutanásia
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 16
Causas**:– Cancro » 2,548
– Doença Cardio-vascular » 158
– Doença neurológica » 75
– Outras » 237
– Causas múltiplas » 118
*SANTOS, L. F. d. (2009). Ajudas-me a morrer? A morte assistida na cultura ocidental do século XXI.Lisboa, Sextante Editora.
**Regional euthanasia review committees annual report 2010
Cerca de 1/3 dos pedidos são rejeitados*
Ética do fim de vida: Eutanásia
Principais argumentos a favor:– O respeito pelas pessoas exige que se considerem as suas
escolhas autónomas, desde que essas escolhas não colidamcom os interesses dos outros;
– O exercício da autonomia implica que o sujeito assuma aresponsabilidade pela sua própria vida;
– A forma e o tempo de morrer são uma escolha pessoal;
– Respeito pelos princípios da Beneficência e Não-malificência:promover o bem (da pessoa) e não fazer mal;
– Respeitar a dignidade humana » razões de grande sofrimento.
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 17
Ética do fim de vida: Eutanásia
Principais argumentos contra:
– Santidade da vida – violação da lei divina;
– A vida é um valor absoluto (Direito Fundamental);
– Risco de “slippery slope” (encosta escorregadia) – o que vem
de seguida?;
– A autonomia está afectada pelo sofrimento, pelo medo, pelo
desespero etc.;
– Há formas de minorar o sofrimento que demovem o pedido de
eutanásia;
– A eutanásia e o resultado de uma sociedade egoísta e
indiferente;
– É proibida pela generalidade dos códigos das associações de
profissionais de saúde.
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 18
Ética do fim de vida: Eutanásia
Numa perspectiva legal:– Crime de homicídio:
Por compaixão (art 133º CP) » atenua a culpa (PP até 5 anos);
A pedido da vítima (art 134º CP) » atenua a culpa (PP até 3 anos).
– Incitamento e ajuda ao suicídio (artº 135 CP)
Pena agravada se for menor de 16 anos ou tiver discernimentodiminuído (PP até 5 anos).
Numa perspectiva deontológica:– Artigo 82º - dos direitos à vida e à qualidade de vida;
– Artigo 87ª - do respeito pelo doente terminal.
05-06-2013 João Veiga - Ética e Deontologia 19
Enunciado de posição do Conselho Jurisdicional da OE sobre Eutanásia - Leitura obrigatória