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CLAUDIO GALVÃO DE OLIVAES ESTUDOS ANATÔMICO E CLÍNICO DA TÉCNICA DE ANULOPLASTIA VALVAR MITRAL POR PLICATURA EXTERNA EM CÃES Dissertação apresentada à Universidade de Franca, como exigência parcial para a obtenção do título de Mestre em Cirurgia e Anestesiologia Veterinária. Orientador: Prof. Dr. James Newton Bizetto Meira de Andrade. FRANCA 2010

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CLAUDIO GALVÃO DE OLIVAES

ESTUDOS ANATÔMICO E CLÍNICO DA TÉCNICA DE

ANULOPLASTIA VALVAR MITRAL POR PLICATURA EXTERNA EM

CÃES

Dissertação apresentada à Universidade de

Franca, como exigência parcial para a

obtenção do título de Mestre em Cirurgia e

Anestesiologia Veterinária.

Orientador: Prof. Dr. James Newton Bizetto

Meira de Andrade.

FRANCA

2010

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CLAUDIO GALVÃO DE OLIVAES

ESTUDOS ANATÔMICO E CLÍNICO DA TÉCNICA DE ANULOPLASTIA

VALVAR MITRAL POR PLICATURA EXTERNA EM CÃES

COMISSÃO JULGADORA DO PROGRAMA DE MESTRADO EM CIRURGIA E

ANESTESIOLOGIA VETERINÁRIA

Presidente: Prof. Dr. James Newton Bizetto Meira de Andrade

Universidade de Franca

Titular 1: Prof. Dr. Gregório Corrêa Guimarães

Universidade Federal de Lavras

Titular 2: Profa. Dra. Celina Tie Nishimori Duque

Universidade de Franca

Franca, 05/02/2010

DEDICADA a Fred, Zé, Apolo, Feijão, Bilico, Araci de Almeida,

Bili, Alface, Spoty e Cabrito.

AGRADECIMENTOS

À minha família por acreditar no meu potencial e me apoiar por toda a minha vida;

a Jessica pelo amor incondicional;

ao meu orientador, Prof. Dr. James Newton Bizetto Meira de Andrade, por todos os

ensinamentos e por toda a ajuda;

a Frankito, pela ajuda com as fotos;

aos amigos do mestrado, companheiros em todas as horas;

aos professores da UNIFRAN, que também se tornaram amigos.

“Penso que cumprir a vida

Seja simplesmente

Compreender a marcha

E ir tocando em frente” Almir Sater/Renato Teixeira

“Hoje só acredito

No pulsar das minhas veias

E aquela luz que havia

Em cada ponto de partida

Há muito me deixou” Graco/Caio Silvio

RESUMO

OLIVAES, Claudio Galvão de. Estudos anatômico e clínico da técnica de anuloplastia

valvar mitral por plicatura externa em cães. 2010. 54f. Dissertação (Mestrado em Cirurgia

e Anestesiologia Veterinária) – Universidade de Franca, Franca.

A degeneração mixomatosa da valva mitral é a principal afecção cardíaca canina, podendo

levar à insuficiência cardíaca (IC), com baixa sobrevida. Esta doença apresenta curso crônico

e acomete, principalmente, animais idosos. O tratamento clínico visa à melhora dos sinais

clínicos provocados pela IC, sendo, portanto, paliativo. A única forma de interromper a

progressão da doença é a melhora da função valvar, por meio de reparo cirúrgico ou

substituição valvar. Neste trabalho foi utilizada a técnica de anuloplastia valvar mitral por

plicatura externa, com o intuito de se avaliar a redução do diâmetro do anel mitral, por meio

de estudos anatômico e clínico. No estudo anatômico utilizaram-se seis cadáveres de cães que

foram a óbito devido a causas não relacionadas ao sistema cardiovascular e no estudo clínico

utilizaram-se quatro cães acometidos pela degeneração mixomatosa da valva mitral. A técnica

de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa consistiu na realização de sutura em padrão

de Lembert, em dois planos, na parede livre do ventrículo esquerdo, ventral e paralelamente

ao sulco átrio-ventricular. No estudo anatômico, houve redução significativa nos diâmetros

látero-lateral e septo-parietal do anel mitral, de 12,35% e 23,45%, respectivamente. No estudo

clínico, dois cães apresentaram redução no jato de regurgitação mitral, de grau severo para

leve a moderado, constatado pelo ecodopplercardiograma, sendo que um deles melhorou

clinicamente e o outro foi a óbito 48 horas após o procedimento devido à insuficiência renal.

Os demais foram a óbito durante o procedimento devido à hemorragia causada pela plicatura.

Deste modo, a técnica estudada mostrou-se eficaz na redução da regurgitação mitral, porém

parece ser mais indicada em cães com IC de grau II do que nos cães com IC grau III.

Palavras-chave: valva mitral; degeneração mixomatosa; insuficiência cardíaca congestiva;

anuloplastia; cães.

ABSTRACT

OLIVAES, Claudio Galvão de. Estudos anatômico e clínico da técnica de anuloplastia

valvar mitral por plicatura externa em cães. 2010. 54f. Dissertação (Mestrado em Cirurgia

e Anestesiologia Veterinária) – Universidade de Franca, Franca.

The myxomatous mitral valve degeneration is the main cardiac disease in dogs which can lead

to congestive heart failure (CHF), with low survival. This illness presents a chronic course,

and it affects aging dogs mainly. The clinical treatment is palliative, aiming at only the

improvement in the clinical signs caused by CHF. The only way to interrupt its progression is

improving the valvar function, by surgical repair or valvar replacement. In this study the

technique of mitral valvar annuloplasty by external plication for reduction of the mitral

annulus was evaluated by both anatomical and clinical studies. For the anatomical study six

corpses of dogs that had died due to causes unrelated to the cardiovascular system were

included, and four dogs with myxomatous mitral valve degeneration were used for the clinical

study. The surgical technique consists of a buttressed double row running suture in the left

ventricular free wall, ventral and parallel to the atrioventricular groove. In the anatomical

study, there was a significant reduction in the lateral and septo-parietal diameter of the mitral

annulus, 12.35% and 23.45% respectively. In the clinical study, two dogs presented mitral

regurgitation jets reduction, from severe to mild-to-moderate jets, evidenced by the

echodopplercardiography. One of them improved clinically and the other died 48h after

surgery due to acute renal failure, and the remained two dogs died during the procedure due to

hemorrhage caused for the plication. In this way, the studied technique revealed efficient in

mitral regurgitation reduction, however it seems to be more indicated in dogs with CHF

degree II than in dogs with CHF degree III.

Key words: mitral valve; myxomatous disease; congestive heart failure; annuloplasty; dogs.

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

AE – átrio esquerdo

AE:Ao – relação átrio esquerdo/aorta

Ao – aorta

CEC – circulação extracorpórea

CEP – comissão de ética em pesquisa

DIVEd – diâmetro do ventrículo esquerdo em diástole (imagens do ecocardiograma)

DMVM – degeneração mixomatosa da valva mitral

DVEd – diâmetro do ventrículo esquerdo em diástole (ao longo do texto)

DVEs – diâmetro do ventrículo esquerdo em sístole

ECG – eletrocardiograma

EIC – espaço intercostal

FE – fração de encurtamento

Fej – fração de ejeção

IC – insuficiência cardíaca

iECA – inibidor da enzima conversora de angiotensina

ISACHC – international small animal cardiac health council

VVd – volume ventricular diastólico

VVs – volume ventricular sistólico

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 10

1 REVISÃO DA LITERATURA .......................................................................................... 11

1.1 PREVALÊNCIA ............................................................................................................. 11

1.2 PATOGENIA .................................................................................................................. 12

1.3 DIAGNÓSTICO ............................................................................................................. 13

1.4 TRATAMENTO ............................................................................................................. 15

CAPÍTULO 1: ESTUDO ANATÔMICO ............................................................................ 18

2 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................ 19

3 RESULTADOS .................................................................................................................... 24

4 DISCUSSÃO ........................................................................................................................ 26

5 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 27

CAPÍTULO 2: ESTUDO CLÍNICO ..................................................................................... 28

6 MATERIAL E MÉTODOS ................................................................................................ 29

6.1 EXAME FÍSICO ............................................................................................................. 29

6.2 ELETROCARDIOGRAMA (ECG) ............................................................................... 30

6.3 ECODOPPLERCARDIOGRAMA ................................................................................ 30

6.4 PREPARO DO PACIENTE ........................................................................................... 32

6.5 TÉCNICA OPERATÓRIA ............................................................................................. 33

7 RESULTADOS .................................................................................................................... 34

8 DISCUSSÃO ........................................................................................................................ 44

9 CONCLUSÃO ...................................................................................................................... 47

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 48

10

INTRODUÇÃO

A degeneração mixomatosa da valva mitral (DMVM) é a afecção cardíaca de maior

prevalência em cães. Esta doença tem curso crônico e progride, na maioria das vezes, para

insuficiência cardíaca (IC).

Nos últimos anos, houve considerável melhora na qualidade de vida dos cães, devido a

diversos fatores, como nutrição mais adequada, protocolos de vacinação cumpridos

corretamente, tratamento médico veterinário apropriado, entre outros. Com isso, elevou-se a

expectativa de vida desses animais, aumentando a incidência de doenças geriátricas nessa

espécie, dentre as quais se inclui a DMVM.

A terapia clínica para esta afecção envolve o controle da IC resultante da DMVM,

mesmo assim, os animais apresentam baixa sobrevida após o estabelecimento da mesma.

Deste modo, para ocorrer interrupção da progressão da doença faz-se necessário o reparo ou a

substituição da valva mitral por meio cirúrgico, o que requer o uso de circulação

extracorpórea (CEC). Na medicina veterinária, a CEC ainda não é utilizada de forma rotineira

devido a diversos fatores, como por exemplo, à alta taxa de mortalidade do procedimento.

Logo, o advento de uma técnica cirúrgica que promova melhora na função valvar e que

dispense a utilização da CEC é de extrema relevância para o tratamento da DMVM.

Sendo assim, objetivou-se, com este trabalho, avaliar a viabilidade da técnica de

anuloplastia valvar mitral por plicatura externa no tratamento da DMVM, por meio da

realização de estudo anatômico em cadáveres de cães e de estudo clínico em animais

acometidos pela doença.

11

1 REVISÃO DA LITERATURA

1.1 PREVALÊNCIA

A DMVM é uma afecção de progressão lenta, a qual, geralmente, evolui para IC, cujo

tratamento é paliativo com tempo médio de sobrevida de um ano (SISSON; KVART;

DARKE, 1999). De acordo com Bonnett et al. (1997), cerca de 7% da população canina

morre devido à IC.

As alterações valvares adquiridas fazem parte de um importante grupo de doenças

cardíacas que afetam os cães. Dentre elas a DMVM, também conhecida como endocardiose

mitral ou fibrose crônica da valva mitral, é a alteração cardíaca mais comum em cães (MUZZI

et al., 2000; CORDEIRO; MARTIN, 2002; LOMBARD; JÖNS; BUSSADORI, 2006), sendo

responsável por cerca de 80% de todas as cardiopatias caninas (HÄGGSTRÖM; KVART;

PEDERSEN, 2005).

A DMVM acomete, principalmente, cães de raças pequenas, com maior prevalência

em poodle, chihuahua, dachshund, cavalier king charles spaniel, schnauzer, pinscher, cocker

spaniel e whippet (DARKE, 1987; MUZZI et al., 2000; HÄGGSTRÖM; KVART;

PEDERSEN, 2005). A incidência da DMVM aumenta com a idade, sendo descritas alterações

histopatológicas em 5% dos cães com menos de um ano de idade. Esta porcentagem aumenta

para 75% em animais com mais de 12 anos de idade (BUCHANAN, 1977).

A etiologia ainda é desconhecida (MUZZI et al., 2000; BELERENIAN et al., 2009),

embora alguns autores tenham sugerido diferentes mecanismos de desencadeamento da

afecção como, por exemplo, fatores genéticos, prolapso valvar mitral (MUZZI et al., 2000),

endocardite bacteriana e traumatismo torácico (NAZARETH, 2006).

12

1.2 PATOGENIA

As alterações patológicas causadas pela DMVM incluem alongamento das cordoalhas

tendíneas, prolapso da valva em sentido ao átrio e espessamento dos folhetos, cujas

extremidades tomam forma arredondada e irregular, ocasionando má coaptação das bordas

livres (WHITNEY, 1974; BUCHANAN, 1977; KOGURE, 1980). Com a progressão da

doença, as superfícies da valva ficam cada vez mais espessas e irregulares e atingem outras

partes dos folhetos (WHITNEY, 1974), podendo haver ruptura de cordoalha tendínea

(KOGURE, 1980; BONAGURA, 1994); dilatação do anel valvar; fibrose dos músculos

papilares; dilatação, fibrose ou ruptura do átrio esquerdo; e fibrose e hipertrofia excêntrica do

ventrículo esquerdo (MUZZI et al., 2000). A má coaptação das bordas livres dos folhetos

valvares pode ocasionar regurgitação mitral, sendo este volume pequeno nas fases iniciais da

doença (MUZZI et al., 2000; HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). Porém, em

estádios mais avançados, há ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona, com

sobrecarga volumétrica, dilatação atrial esquerda e dilatação do anel valvar. O aumento da

pressão atrial esquerda resulta em congestão venosa pulmonar e edema. A sobrecarga de

volume promove o remodelamento ventricular esquerdo, com hipertrofia excêntrica e

disfunção ventricular esquerda (HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005).

Microscopicamente, há proliferação mixomatosa da valva, em cuja camada esponjosa

ocorre grande deposição de glicosaminoglicanas (WHITNEY, 1974; BUCHANAN, 1977;

KOGURE, 1980), com desarranjo e fragmentação das fibras colágenas (CORCORAN et al.,

2002; HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). De acordo com Corcoran et al. (2002),

as células endoteliais que recobrem as áreas afetadas tornam-se polimórficas, podendo perder

completamente o endotélio e expor a matriz extracelular. Segundo Buchanan (1977), as

alterações atingem apenas a valva mitral em 62% dos casos, mas podem envolver as demais

valvas cardíacas, sendo reportada a incidência de 32,5% para as valvas mitral e tricúspide e

1,3% para envolvimento isolado da tricúspide. Em casos avançados, pode haver

arterioesclerose intramural e múltiplos microinfartos (JÖNSSON, 1972; FALK; JÖNSSON,

2000).

13

1.3 DIAGNÓSTICO

O diagnóstico da DMVM é realizado por meio de exames clínico e complementares,

como eletrocardiograma, exame radiográfico e ecodopplercardiograma (MUZZI et al., 2000).

As manifestações clínicas dependem da fase da doença. Em estádios iniciais, que

podem perdurar por anos, os animais se apresentam assintomáticos e suspeita-se da doença

devido à presença de sopro sistólico de regurgitação no foco mitral (MUZZI et al., 2000;

HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). A progressão da afecção pode suscitar tosse

seca, devido à compressão bronquial causada pelo aumento do átrio esquerdo; estresse

respiratório e tosse produtiva, ocasionados pelo edema pulmonar; fraqueza, decorrente da

diminuição do débito cardíaco; insuficiência cardíaca direita, nos casos em que a valva

tricúspide estiver acometida, bem como quando ocorrer hipertensão pulmonar, manifestada

por ascite e efusão pleural. Pode ocorrer ainda morte súbita, por edema pulmonar fulminante

ou fibrilação ventricular (HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). Ademais, episódios

de síncope, associados à taquiarritmias ou a períodos agudos de tosse (denominados de

desmaios tussígenos), podem ser observados em alguns casos (MUZZI et al., 2000).

No exame físico, a principal observação é o sopro sistólico de regurgitação apical

esquerdo, cuja intensidade aumenta com a progressão da doença (MORAIS; PEREIRA, 2001;

HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). À medida que ocorre descompensação, a

frequência cardíaca se eleva e poderão ser detectadas arritmias. Em casos de edema pulmonar,

ausculta-se crepitação pulmonar (HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). Outros

achados que podem ocorrer nos quadros mais graves de IC são fadiga, cianose, tempo de

perfusão capilar aumentado e mucosas pálidas (MUZZI et al., 2000).

O eletrocardiograma é inespecífico e de pouco valor para o diagnóstico da DMVM

(MUZZI et al., 2000), podendo estar normal ou evidenciar arritmias tais como taquicardia

sinusal, taquicardia supraventricular, fibrilação atrial, flutter atrial, complexos ventriculares e

supraventriculares prematuros (MUZZI et al., 2000; HÄGGSTRÖM; PEDERSEN; KVART,

2004). Alguns cães apresentam prolongamento da duração da onda P, do complexo QRS e

aumento da amplitude da onda R, que são sugestivos de dilatação atrial e ventricular

esquerdas, respectivamente (MUZZI et al., 2000; SOARES; LARSSON, 2007). As alterações

de onda P decorrentes de aumento atrial moderado a grave aparecem em apenas 40% dos

cães, enquanto as alterações eletrocardiográficas sugestivas de aumento de ventrículo

14

esquerdo ocorrem em menos de 50% dos indivíduos que apresentam dilatação importante

(SOARES; LARSSON, 2007).

Alterações eletrocardiográficas raramente encontradas são aquelas sugestivas de

aumento de câmaras direitas, secundário à hipertensão pulmonar, quais sejam, amplitude da

onda P aumentada, indicando aumento de átrio direito, e presença de onda S nas derivações

CV6LU (V4), CV6LL (V2), DI, DII, DIII e aVF, indicando aumento ventricular direito

(SOARES; LARSSON, 2007).

Radiografias torácicas látero-laterais e ventro-dorsais podem revelar sobrecargas das

câmaras afetadas, especialmente do átrio esquerdo, além de compressão dos brônquios e

presença de edema pulmonar (HÄGGSTRÖM; PEDERSEN; KVART, 2004). Segundo Muzzi

et al. (2000), na fase inicial do edema pulmonar, observa-se padrão intersticial, que progride

para padrão alveolar com distribuição peri-hilar. Na radiografia látero-lateral, pode-se

observar aumento do átrio esquerdo, com consequente elevação do brônquio principal

esquerdo, aumento do diâmetro das veias pulmonares e edema pulmonar. Na projeção ventro-

dorsal, pode-se observar aumento do ventrículo e átrio esquerdos. Soares, Larsson e Pinto

(2004) ressaltaram que a severidade da regurgitação mitral geralmente corresponde ao grau de

dilatação atrial, observado ao exame radiográfico.

Alterações morfológicas causadas pela DMVM podem ser observadas ao exame

ecocardiográfico (HÄGGSTRÖM; PEDERSEN; KVART, 2004). Este exame apresenta

especial valor no diagnóstico de doença cardiovascular devido à possibilidade de distinção

entre fluido e tecido mole, de definir as relações espaciais entre as estruturas e de detecção e

quantificação do movimento do coração (THOMAS, 1984). No modo bidimensional, pode-se

observar espessamento dos folhetos, prolapso valvar e aumento do átrio esquerdo. No modo

Doppler, pulsátil ou contínuo, pode-se notar a presença de onda A maior que onda E, devido à

dilatação do átrio esquerdo que, ao se contrair, ejeta maior volume de sangue no ventrículo

esquerdo. O modo Doppler colorido revela a presença de jato de regurgitação no átrio

esquerdo, que pode ser quantificado para avaliar a gravidade da regurgitação, conforme a

porcentagem do volume regurgitante em relação ao átrio esquerdo. No modo M, pode-se

caracterizar sobrecarga e disfunção do ventrículo esquerdo em casos mais avançados (MUZZI

et al., 2000). Ainda, pelo ecodopplercardiograma, podem-se calcular os índices de volume

sistólico e diastólico e observar complicações secundárias à DMVM, como ruptura de cordas

tendíneas, ruptura de átrio esquerdo e tamponamento cardíaco (BONAGURA, 1994; MUZZI

et al., 2000).

15

1.4 TRATAMENTO

Os objetivos da terapia clínica para o tratamento da insuficiência cardíaca causada pela

DMVM são reduzir as consequências da sobrecarga de volume, pela redução da pré-carga e

da pós-carga; reduzir o esforço do miocárdio; e retardar a sobrecarga de volume mediada pelo

remodelamento cardíaco (LOMBARD; JÖNS; BUSSADORI, 2006).

O tratamento preconizado atualmente envolve terapia da IC pela administração de

inibidores da enzima conversora de angiotensina (iECAs), diuréticos, digitálicos, dieta

hipossódica e antiarrítmicos (HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). Nos últimos

anos, instituiu-se no tratamento da IC a utilização do pimobendan, novo fármaco classificado

como “inodilatador”, devido a seus efeitos inotrópico e vasodilatador. Diferente dos

digitálicos, inotrópicos tradicionais, o pimobendam apresenta a vantagem de atuar como um

inotrópico positivo sem aumentar os requerimentos energéticos nem o consumo de oxigênio

pelo miocárdio. Em estudo realizado com este fármaco, observou-se melhora na qualidade de

vida e no tempo de sobrevivência dos animais, quando comparado aos iECAs (LOMBARD;

JÖNS; BUSSADORI, 2006).

Entretanto, sabe-se que nenhuma terapia clínica é capaz de mudar o curso da doença,

inibir ou prevenir a degeneração valvar, atrasar o aparecimento dos sinais clínicos e tampouco

aumentar a sobrevivência em animais assintomáticos (KVART et al., 2002; HÄGGSTRÖM;

PEDERSEN; KVART, 2004; HÄGGSTRÖM; KVART; PEDERSEN, 2005). Deste modo,

apenas em animais com IC a terapia clínica pode aumentar a sobrevida (HÄGGSTRÖM;

KVART; PEDERSEN, 2005). De acordo com Sisson, Kvart e Darke (1999), mesmo quando a

medicação for otimizada, a sobrevida média é de um ano após o aparecimento da IC.

Assim, a única forma de interromper a progressão da doença seria a melhora da função

valvar por meio de reparo cirúrgico ou troca valvar. De acordo com Häggström, Pedersen e

Kvart (2004) e Griffiths, Orton e Boon (2004), esta terapia deveria ser realizada antes do

aparecimento dos sinais clínicos da doença.

Em seres humanos a correção cirúrgica é rotineiramente realizada, por meio de

substituição valvar por prótese biológica ou mecânica, ou por diferentes técnicas de reparo

valvar, como a ressecção quadrática dos folhetos, a plicatura dos folhetos, a anastomose

margem a margem (técnica de Alfieri), a anuloplastia com anel rígido ou maleável, entre

outras (DURAN; UBAGO, 1976; CARPENTIER, 1983; BRAILE et al., 1994; ALFIERI;

ROBICSEK, 2003). Segundo Alfieri (2003), 25% dos pacientes humanos são submetidos à

16

técnica de anastomose margem a margem como parte do processo de reconstrução valvar.

Ressalta-se que o índice de pacientes que não necessitam ser submetidos a reoperações é de

90% quando utilizada esta técnica. Contudo, quando não se utiliza algum procedimento de

anuloplastia esse mesmo índice cai para 70%. Kotoulas et al. (2008) reforçaram que está bem

documentada a superioridade do reparo valvar mitral em comparação à substituição completa

da valva e, atualmente, o reparo valvar é o “padrão ouro” para correção da regurgitação mitral

secundária à patologias mixomatosas em seres humanos.

Griffiths, Orton e Boon (2004) realizaram diferentes técnicas de reparo valvar,

incluindo a anuloplastia circunferencial, substituição da cordoalha tendínea, fenestração da

cordoalha e do músculo papilar e reparo margem a margem em cães com DMVM ou com

displasia mitral. Esses autores concluíram que o reparo mitral resolveu a IC em cães com

regurgitação mitral severa, particularmente naqueles com mais de 10 kg, tratados em menos

de seis meses desde o início da IC e com índice de volume diastólico inferior a 250 mm2/m

3 e

índice de volume sistólico inferior a 70 mm2/m

3.

Todas as técnicas descritas, no entanto, são realizadas com CEC, a qual é de difícil

acesso na medicina veterinária, devido ao custo elevado, à aquisição da tecnologia e à alta

taxa de mortalidade do procedimento (BELERENIAN et al., 2009). Deste modo, a

possibilidade de se fazer uma valvoplastia corretiva sem CEC poderia diminuir o tempo

cirúrgico e os problemas associados a ela.

Em 1909, Bertrand Bernheim foi o primeiro cirurgião a realizar uma sutura

circunferencial paralelamente ao ramo circunflexo da artéria coronária, porém com a intenção

de criar uma estenose mitral em modelo experimental canino. Somente em 1954 John Borrie

realizou sutura externa ao redor do anel mitral em carneiros, com o propósito de investigar o

potencial desta técnica na correção da regurgitação mitral (ROBICSEK, 2003).

Com base nesses fatos, Buchanan e Sammarco (1998) propuseram uma técnica de

anuloplastia circunferencial por sutura externa do anel mitral, em cães com DMVM,

observando redução no grau de regurgitação, porém com baixa sobrevida. O procedimento

caracteriza-se pela realização de sutura em bolsa de tabaco ao redor de todo o anel mitral,

inclusive na sua porção interna, ao redor do folheto septal. A manobra gera grande dificuldade

técnica, sendo necessária a introdução de cateter, através do qual se passa o fio de sutura, que

envolve o seio coronário, o átrio direito e a artéria coronária esquerda. A técnica proposta

apresentou mortalidade trans-operatória e pós-operatória imediata elevadas (60%). A

mortalidade trans-operatória foi ocasionada por hemorragias, sendo que, de 15 animais

operados, seis morreram por hemorragia atrial esquerda, do seio coronariano ou da coronária

17

esquerda. Três animais morreram no pós-operatório devido à compressão coronariana causada

pela sutura.

Em 2003, Kollár et al. realizaram plicatura subanular em um modelo experimental

canino, observando redução de 17% da circunferência e do diâmetro do anel e redução de

31% da área do anel mitral, sem alterações hemodinâmicas ou arritmias. A técnica consistiu

na aplicação de sutura contínua, em padrão Lembert, amparada por esponjas de teflon,

aplicada em dois sentidos, paralelamente à junção átrio-ventricular. A sutura foi iniciada à

direita do ramo interventricular subsinuoso e finalizada à esquerda do ramo intermédio da

artéria circunflexa. Os autores, no entanto, não realizaram acompanhamento pós-operatório.

Belerenian et al. (2007, 2009) descreveram técnica semelhante, porém com algumas

alterações nos locais das suturas. Nela, os parâmetros anatômicos utilizados para a realização

da sutura foram a fossa pericárdica, caudalmente, e o ângulo formado pela artéria circunflexa

e o ramo interventricular paraconal, cranialmente, sendo que a fossa pericárdica está

normalmente alinhada com o ramo interventricular subsinuoso. Os autores frisaram a

necessidade de, após cerrar o nó da sutura, aguardar 20 minutos para poder avaliar a

estabilidade hemodinâmica do paciente e comprovar que nenhuma artéria coronária foi

obstruída.

CAPÍTULO 1: ESTUDO ANATÔMICO

19

2 MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados seis cadáveres de cães, que foram a óbito devido a causas não

relacionadas ao sistema cardiovascular e que apresentavam o coração em bom estado de

preservação.

Realizou-se tricotomia no hemitórax esquerdo, com o intuito de realizar a toracotomia

através do quinto espaço intercostal (EIC). A pele foi incisada, paralela e caudalmente à

quinta costela. Em seguida foi realizada a incisão do tecido subcutâneo e dos músculos

cutâneo do tronco e grande dorsal, expondo-se os músculos serrátil dorsal cranial, serrátil

ventral torácico e oblíquo abdominal externo. As fibras do músculo serrátil dorsal cranial

foram separadas por dissecção romba, paralelamente às mesmas. Os músculos serrátil ventral

torácico e oblíquo abdominal externo foram incisados paralelamente às suas fibras e o

músculo intercostal externo foi isolado mediante dissecção romba e em seguida incisado. O

mesmo procedimento foi aplicado no músculo intercostal interno, expondo-se a pleura

parietal. Foi feita pequena incisão na pleura, ampliando-se até próximo da junção costo-

condral. O afastador de Finochietto foi introduzido no centro da incisão, com o qual se

promoveu o afastamento das costelas.

Ato contínuo, foram identificados o ramo interventricular paraconal da artéria

coronária esquerda, o ramo interventricular subsinuoso, o ramo intermédio da artéria

circunflexa e os ramos descendentes caudal (podendo existir um ou dois ramos) e cranial da

artéria circunflexa, quando presente (Figura 1), com o intuito de definir corretamente o local

da realização da plicatura.

20

Figura 1 – Circulação coronariana na parede ventricular esquerda. Em 1, ramo

intermédio da artéria circunflexa; em 2, ramos descendentes caudais da artéria

circunflexa; em 3, ramo interventricular subsinuoso

Fonte (com permissão): GÓMEZ; ORTEGA; RUIZ, 2009.

O pericárdio foi incisado paralela e dorsalmente ao nervo frênico (Figura 2). Com o

coração exposto, foi aplicada dupla sutura, em padrão Lembert, uma paralela à outra, na

superfície do miocárdio do ventrículo esquerdo, cerca de cinco milímetros ventral e

paralelamente ao sulco átrio-ventricular, utilizando fio de poliéster 2-0 com duas agulhas de

15 mm1. Os pontos foram iniciados caudalmente ao ramo intermédio da artéria circunflexa e

foram finalizados caudalmente ao ramo descendente cranial da artéria circunflexa, quando

este estava presente, ou então caudalmente ao ramo interventricular paraconal da artéria

coronária esquerda. A sutura era realizada de tal maneira que o fio passava sob os ramos

coronarianos (Figura 3). Entre o fio de sutura e o miocárdio foram colocadas esponjas de

feltro2 (Figura 4), sendo, em seguida, cerrado o nó (Figura 5).

1 Ethibond Excel Cardiovascular – Johnson & Johnson – Divisão Ethicon.

2 Biocron patch inorgânico de feltro – Biomedical Equipamentos e Produtos Médico-Cirúrgicos Ltda, São Paulo, SP.

21

Figura 2 – Incisão do pericárdio em coração de cadáver de cão para realização de anuloplastia valvar

mitral, paralela e dorsalmente ao nervo frênico, que é indicado pela seta

Figura 3 – Aplicação dos primeiros pontos da dupla sutura em padrão Lembert para realização de

anuloplastia valvar mitral em coração de cadáver de cão. Notar a passagem do fio sob o ramo intermédio

da artéria circunflexa

22

Figura 4 – Dupla sutura de Lembert em coração de cadáver de cão para realização de anuloplastia valvar

mitral, iniciando-se caudalmente ao ramo intermédio da artéria circunflexa e emergindo caudalmente ao

ramo descendente cranial da artéria circunflexa. Observar as esponjas de feltro entre o fio de sutura e o

miocárdio

Figura 5 – Coração de cadáver de cão com dupla sutura de Lembert para realização de anuloplastia

valvar mitral. Observar o nó cerrado e plicatura finalizada

23

Posteriormente às suturas, realizou-se a remoção de algumas costelas com o auxílio de

um costótomo, visando facilitar a retirada do coração da cavidade torácica. Este foi excisado

pelos grandes vasos de sua base e o átrio esquerdo foi cuidadosamente retirado, incisando-se

próximo ao sulco átrio-ventricular, para exposição do anel mitral. Em seguida, foram

mensurados os diâmetros látero-lateral e septo-parietal do anel mitral com o auxílio de um

paquímetro digital3 (Figura 6), correspondendo aos respectivos diâmetros com a presença da

plicatura, ou seja, momento 0 (M0). A sutura do anel mitral foi, então, removida e foram

realizadas novas medidas dos diâmetros látero-lateral e septo-parietal, sendo que estes valores

correspondiam aos respectivos diâmetros sem plicatura, ou seja, momento 1 (M1). Os valores

foram registrados em milímetros e tabulados.

Figura 6 – Aferição do diâmetro septo-parietal do anel mitral em coração excisado de cão

submetido à anuloplastia valvar mitral por plicatura externa, utilizando-se um paquímetro digital.

A porção septal está indicada pela seta branca e a parietal, pela seta preta

Os dados foram submetidos à análise estatística pelo programa de computador Jandel

SigmaStat for Windows®

. Foram calculadas as médias e os desvios-padrão dos valores em M0

e M1. Os dados foram comparados estatisticamente pela análise de variância de uma via com

medidas repetidas, seguida pelo teste Student-Newman-Keuls, com nível de significância de

5% (p < 0,05).

3 Digital Caliper – Digimess, São Paulo, SP.

24

O grau de dificuldade em se realizar a sutura foi avaliado subjetivamente, quanto ao

acesso e ao local onde seria realizada a sutura, em relação aos ramos coronarianos

descendentes.

3 RESULTADOS

Pela avaliação subjetiva do grau de dificuldade de acesso ao local cirúrgico, constatou-

se que o campo operatório foi bastante limitado pelo acesso intercostal, devido ao

posicionamento do coração, à sobreposição dos lobos pulmonares e à localização dos ramos

coronarianos, além da sobreposição da aurícula esquerda à área da sutura. Entretanto, foi

possível o afastamento dos lobos pulmonares e da aurícula esquerda, permitindo a

visibilização da área cardíaca onde seria realizada a sutura. Para identificação de todos os

ramos coronarianos da parede livre do ventrículo esquerdo foi necessário girar o coração, no

sentido horário observando-se a partir do ápice, para localizar o ramo interventricular

paraconal da artéria coronária esquerda e no sentido anti-horário, para os ramos descendente

caudal e interventricular subsinuoso. Os ramos intermédio e descendente cranial da artéria

circunflexa, que eram as referências para a realização da sutura, puderam ser visibilizados

sem a necessidade de rotação do coração.

A anuloplastia pôde ser realizada sem grandes dificuldades, uma vez que não havia

movimentação cardíaca, devido à ausência de batimentos, atentando-se ao fato de se evitar

atingir os ramos coronarianos no momento da passagem da agulha pelo miocárdio.

Houve redução estatística (p < 0,05) para ambas as medidas entre M0 e M1 (Figura 7).

A redução média para o diâmetro látero-lateral foi da ordem de 12,35%, passando de 17,40

mm sem plicatura para 15,25 mm com plicatura. Para o diâmetro septo-parietal houve redução

de 23,45%, passando de 16,37 mm sem plicatura para 12,53 mm com plicatura. Os valores

individuais, médias e desvios-padrão dos diâmetros estão descritos nas Tabelas 1 e 2.

25

Figura 7 – Aferição do diâmetro septo-parietal do anel mitral de coração excisado de cadáver de cão com a

plicatura anular externa, aferindo-se o valor de 20,41 mm (A) e após a retirada da sutura, aferindo-se o valor

de 22,92 mm (B). Notar a redução ocasionada pela plicatura, evidenciada pelo maior diâmetro após a retirada

dos pontos

Tabela 1 – Valores individuais, médias e desvios-padrão em milímetros (mm) do diâmetro látero-lateral do

anel mitral de corações excisados de cães sem (M1) e com (M0) a plicatura utilizada na realização da

anuloplastia valvar mitral. (p = 0,004)

Cão Diâmetro látero-lateral (mm)

M1 M0

1 17,84 13,97

2 18,06 16,21

3 16,54 15,21

4 14,81 13,91

5 19,68 16,91

6 17,47 15,32

Média 17,40 15,25

Desvio-padrão 1,63 1,19

Tabela 2 – Valores individuais, médias e desvios-padrão em milímetros (mm) do diâmetro septo-parietal do

anel mitral de corações excisados de cães sem (M1) e com (M0) a plicatura utilizada na realização da

anuloplastia valvar mitral. (p = 0,003)

Cão Diâmetro septo-parietal (mm)

M1 M0

1 12,54 9,13

2 17,39 10,18

3 15,34 11,39

4 13,82 11,20

5 22,92 20,41

6 16,22 12,87

Média 16,37 12,53

Desvio-padrão 3,63 4,05

26

4 DISCUSSÃO

A anuloplastia mitral por plicatura externa é uma técnica ainda pouco estudada, com

literatura escassa.

Neste estudo, a técnica de anuloplastia mitral por plicatura externa foi capaz de reduzir

o diâmetro do anel mitral em cadáveres de cães. A redução média foi de 12,35%, para o

diâmetro látero-lateral, passando de 17,40 ± 1,63 mm sem plicatura para 15,25 ± 1,19 mm

com plicatura, e de 23,45% para o diâmetro septo-parietal, que passou de 16,37 ± 3,63 mm

sem plicatura para 12,53 mm ± 4,05 com plicatura. Kubrusly et al. (2009) relataram redução

de 13,4% no diâmetro septo-parietal em corações excisados de suínos, o que sugere que

corações de maior tamanho e consequentemente maior massa muscular tenham uma redução

menor neste diâmetro com a utilização da técnica de anuloplastia externa. Já Kollár et al.

(2003), realizando técnica similar em modelo experimental canino obtiveram redução de 17%

da circunferência e do diâmetro do anel, porém os autores não citam qual diâmetro foi aferido.

Belerenian et al. (2009), estudando dez corações de cães que foram a óbito por insuficiência

mitral relataram redução máxima do diâmetro septo-parietal de 2,5 cm, enquanto no nosso

experimento a redução máxima para o mesmo diâmetro foi de 7,21 cm, evidenciando a

eficácia da técnica utilizada.

Gómez, Ortega e Ruiz (2009) descreveram a circulação coronária da região da

realização da anuloplastia valvar mitral, asseverando que a posição e o número dos ramos

coronarianos é variável, não podendo assim ser padronizado o número de pontos a serem

realizados para melhorar a coaptação dos folhetos da valva mitral. Os autores afirmam que o

ramo intermédio da artéria circunflexa, o qual denominaram ramo lateral da circunflexa,

indica o local onde se encontra a comissura crânio-lateral da valva mitral, devendo ser ali a

referência para o término da realização da plicatura. Para o início da sutura, os autores

consideraram a fossa pericárdica, a qual coincide com a comissura látero-caudal da valva

mitral, como sendo o local ideal para o início da sutura. Naquele estudo a fossa pericárdica

estava caudal ou alinhada com o ramo interventricular subsinuoso da artéria coronária em

60% dos casos e os autores indicaram este local como referência para o início da sutura, o

que, de acordo com os mesmos, aumenta o número de pontos necessários para se realizar a

plicatura.

27

Em nossos estudos, foram utilizados como referências para o início da sutura e para

seu término, respectivamente, os ramos intermédio da artéria circunflexa (a sutura se iniciava

caudalmente a este) e o ramo descendente cranial da artéria circunflexa, quando presente, ou o

ramo interventricular paraconal (a sutura terminava caudalmente a eles). Este posicionamento

da sutura envolveu uma área menor e, consequentemente, um menor número de pontos,

comprometendo menos ramos coronarianos. Além disso, a porção onde foi aplicada a sutura

foi mais cranial do que a relatada por Gómez, Ortega e Ruiz (2009), o que facilitou o acesso e

a realização da sutura. Apesar da área menor envolvida, houve redução significativa do

diâmetro do anel mitral, o que, de acordo com Kubrusly et al. (2009) poderia ser suficiente

para diminuir o grau de regurgitação em seres humanos.

5 CONCLUSÕES

A anuloplastia mitral por plicatura externa foi capaz de reduzir o diâmetro do anel

mitral em cadáveres de cães, com envolvimento de uma pequena área da parede livre do

ventrículo esquerdo. Sugere-se a realização de estudos in vivo, para se avaliar os benefícios e

riscos do procedimento.

CAPÍTULO 2: ESTUDO CLÍNICO

29

6 MATERIAL E MÉTODOS

Foram utilizados quatro cães portadores de DMVM, que pertenciam às classes II e IIIa

da classificação funcional da IC segundo a International Small Animal Cardiac Health

Council – ISACHC (MILLER; TILLEY, 1995; MORAIS; PEREIRA, 2002) – (Anexo A), nos

quais o recurso medicamentoso havia sido maximizado. Os animais foram oriundos da rotina

do Hospital Veterinário da Universidade de Franca. O consentimento dos proprietários para a

realização do procedimento cirúrgico foi obtido mediante assinatura de Termo de

Autorização, no qual foi dada ciência da incerteza dos benefícios do procedimento.

Neste estudo, os critérios de inclusão envolveram a presença de IC de classes II ou

IIIa, ocasionada por DMVM; a ausência de outras enfermidades sistêmicas; a ausência de

outras afecções cardíacas, exceto a regurgitação tricúspide e hipertensão pulmonar secundária;

a ausência de arritmias graves, como fibrilação atrial e taquicardia ventricular; e a ausência

de choque cardiogênico e de edema pulmonar no momento da cirurgia.

Os animais foram submetidos ao exame físico, à eletrocardiografia e à

ecodopplercardiografia, um dia antes e dois, sete, 15 e 30 dias após o procedimento cirúrgico

e a exame radiográfico pré-operatório.

Com o intuito de se avaliar a evolução do paciente após a cirurgia, foi introduzido na

pesquisa um questionário de avaliação da qualidade de vida relacionada com a saúde cardíaca,

proposto por Freeman et al. (2005), no qual o proprietário atribuía uma nota de acordo com os

sinais clínicos do animal (Anexo B).

Este estudo, protocolado sob o número 019/07A foi aprovado pela Comissão de Ética

em Pesquisa (CEP) da Universidade de Franca – SP.

6.1 EXAME FÍSICO

Os animais foram avaliados clinicamente quanto aos seguintes aspectos: coloração de

mucosas (oral e oculares), tempo de preenchimento capilar, frequência respiratória, frequência

cardíaca, auscultação cárdio-pulmonar e temperatura retal.

30

6.2 ELETROCARDIOGRAMA (ECG)

Os eletrocardiogramas foram realizados por meio de eletrocardiografia

computadorizada4.

Os eletrodos foram conectados por meio de garras metálicas presas à pele na região

das articulações úmero-rádio-ulnar e fêmoro-tíbio-patelar, para as derivações de membros, e

na região torácica, para as derivações pré-cordiais, como descrição citada por Tilley (1992).

Foram registradas as derivações bipolares DI, DII e DIII, as derivações unipolares

aumentadas aVR, aVL e aVF e as derivações pré-cordiais unipolares V4, V2, rV2 e V10. A

velocidade utilizada foi de 50 mm/s e o aparelho calibrado para 1mV= 1cm (N).

Avaliaram-se frequência e ritmo cardíacos, duração (s) e amplitude (mV) da onda P e

do complexo QRS, duração (s) dos intervalos PR e QT, nivelamento do segmento ST,

polaridade da onda T e eixo elétrico do QRS. As medidas foram realizadas na derivação II.

Durante a cirurgia realizou-se monitoração com registro constante do ECG por meio

de eletrocardiografia computadorizada.

6.3 ECODOPPLERCARDIOGRAMA

Realizou-se ecocardiografia bidimensional e em modo M e ecodopplercardiografia

pulsátil, contínua e colorida5. Os animais foram posicionados sobre uma mesa dotada de

colchão fenestrado, permitindo o posicionamento adequado dos transdutores.

Foi realizada tricotomia nos hemitórax direito e esquerdo e aplicado gel aderente para

melhorar a condução das ondas de ultrassom. Com o animal em decúbito lateral direito,

posicionou-se o transdutor na janela ecocardiográfica paraesternal direita, localizada entre o

terceiro e sexto espaços intercostais direitos, entre o esterno e a articulação costo-condral.

Foram obtidas as imagens do eixo longo e do eixo curto e realizadas as medidas

ecocardiográficas.

A partir do eixo longo foram obtidas as visões quatro câmaras e trato de saída do

4 Módulo para aquisição de ECG para computador TEB/ECGPC. Tecnologia Eletrônica Brasileira, São Paulo, SP, processo FAPESP nº 2007/02364-9. 5 EnVisor, Performance 2007 – Philips Medical Systems Ltda, processo FAPESP nº 2007/02364-9.

31

ventrículo esquerdo e, quando no eixo curto, foram observados os cortes nos níveis apical,

papilar, cordal, mitral e aórtico. As imagens foram inicialmente obtidas em modo-B,

avaliando-se as relações anatômicas entre as estruturas, a contratilidade, os aspectos morfo-

funcionais valvares, a presença de jatos de regurgitação com o Doppler colorido e o gradiente

de pressão da valva pulmonar.

Esta posição também serviu de orientação para a obtenção das imagens em modo-M.

Com exposição simultânea de ambos os modos na tela, foram realizadas as medidas em

modo-M. No corte eixo longo trato de saída do ventrículo esquerdo foram medidos o átrio

esquerdo e a aorta e foi calculada a relação átrio esquerdo/aorta (AE:Ao). Esta medida foi

também realizada pelo modo bidimensional, quando não se pôde alinhar adequadamente o

cursor, perpendicularmente a essas estruturas. Na visão eixo longo quatro câmaras, quando a

linha do cursor foi direcionada no nível das cordas tendíneas, perpendicularmente ao septo

interventricular e à parede livre do ventrículo esquerdo, obtiveram-se as medidas do diâmetro

ventricular esquerdo em diástole (DVEd) e sístole (DVEs). A partir dessas medidas foram

obtidos os índices de função miocárdica como a fração de ejeção (Fej) e a fração de

encurtamento (FE). Os volumes ventriculares diastólico (VVd) e sistólico (VVs) foram

calculados pela fórmula de Teichholz6 (TEICHHOLZ et al., 1976). Os índices de volume

diastólico e sistólico foram calculados dividindo-se os respectivos volumes pela área de

superfície corporal.

Pela janela paraesternal caudal esquerda (apical), em modo bidimensional, foram

observadas as relações anatômicas entre as estruturas cardíacas, os aspectos morfo-funcionais

valvares, a contratilidade miocárdica, a presença de jatos de regurgitação e foi calculado o

gradiente de pressão da valva aórtica.

O jato de regurgitação mitral foi avaliado semi-quantitativamente, relacionando seu

tamanho com o átrio esquerdo, classificando-o em leve (menor que 20% da área atrial),

moderado (de 20 a 50% da área atrial) e severo (maior que 50% do átrio esquerdo), conforme

citado por Boon (1998).

A função diastólica foi avaliada pelo influxo mitral, medindo-se a velocidade de pico

das ondas E e A, a relação E/A e o tempo de relaxamento isovolumétrico (OYAMA, 2004).

6 V = (D

3 x 7) / (2,4 + D), onde V = volume e D = dimensão interna mensurada.

32

6.4 PREPARO DO PACIENTE

Para a realização da cirurgia, os animais foram submetidos a jejum alimentar de oito

horas e hídrico de duas horas. Foi realizada uma ampla tricotomia no hemitórax esquerdo e

canulou-se a veia cefálica, para a realização da fluidoterapia utilizando-se ringer com lactato,

numa taxa de infusão de 5 ml/kg/h.

Para a medicação pré-anestésica foram administrados midazolam7 (0,2 mg/kg) e

morfina8 (0,3 mg/kg), pela via intramuscular, associados na mesma seringa. Quinze minutos

depois a anestesia foi induzida pela injeção intravenosa de propofol9 (5 mg/kg).

Após a intubação oro-traqueal, procedeu-se anestesia inalatória com isoflurano10

,

administrado em diluição com oxigênio a 100%, em circuito anestésico com reinalação

parcial de gases.

Imediatamente após a estabilização do plano anestésico foi realizado bloqueio

anestésico dos nervos intercostais, com 0,5 ml de bupivacaína11

a 0,5% sem vasoconstritor, no

sexto espaço intercostal e em dois espaços cranial e caudalmente ao local da incisão

(SKARDA, 1996).

Durante o procedimento anestésico foram monitorados frequência e ritmo cardíacos,

por meio de eletrocardiografia computadorizada; frequência e amplitude respiratórias, pressão

parcial de CO2 ao final da expiração (ETCO2) e oximetria de pulso (SpO2), por meio de

oxicapnógrafo12

; pressão venosa central (PVC), pela canulação da veia jugular; e pressão

arterial média (PAM), pelo método invasivo, canulando a artéria metatársica dorsal conectada

a um esfigmomanômetro.

7 Dormire 15 mg – Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP.

8 Dimorf 10 mg – Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP.

9 Propovan – Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP.

10 Isoforine – Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP.

11 Neocaína a 0,5% – Cristália Produtos Químicos e Farmacêuticos Ltda, Itapira, SP.

12 Dixtal DX 7100, São Paulo, SP.

33

6.5 TÉCNICA OPERATÓRIA

Após a avaliação radiográfica dos animais, devido ao deslocamento da silhueta

cardíaca ocasionado pela cardiomegalia, optou-se por realizar a abordagem pelo sexto espaço

intercostal, a qual se mostrou mais adequada para o acesso à região miocárdica a receber a

sutura.

Procedeu-se a anti-sepsia local e a colocação dos campos cirúrgicos. Foi realizada

toracotomia lateral esquerda no sexto espaço intercostal. A pele foi incisada, paralela e

caudalmente à sexta costela. Em seguida se realizou a incisão do tecido subcutâneo e dos

músculos cutâneo do tronco e grande dorsal, expondo-se os músculos serrátil dorsal cranial,

serrátil ventral torácico e oblíquo abdominal externo. As fibras do músculo serrátil dorsal

cranial foram separadas por dissecção romba, paralelamente às mesmas. Os músculos serrátil

ventral torácico e oblíquo abdominal externo foram incisados paralelamente às suas fibras e o

músculo intercostal externo foi isolado mediante dissecção romba e em seguida incisado. O

mesmo procedimento foi aplicado no músculo intercostal interno, expondo-se a pleura

parietal. Foi feita pequena incisão na pleura, ampliando-se até próximo da junção costo-

condral. Aplicaram-se compressas umedecidas nas bordas expostas e um afastador de

Finochietto foi colocado no centro da incisão para promover o afastamento das costelas.

Ato contínuo, foram identificados o ramo interventricular paraconal da artéria

coronária esquerda, o ramo interventricular subsinuoso, o ramo intermédio da artéria

circunflexa e os ramos descendentes caudal (podendo existir um ou dois ramos) e cranial da

artéria circunflexa (quando presente), com o intuito de definir corretamente o local da

realização da plicatura.

O pericárdio foi incisado paralela e dorsalmente ao nervo frênico. Com o coração

exposto, foi aplicada dupla sutura em padrão Lembert, uma paralela à outra, na superfície do

miocárdio do ventrículo esquerdo, cerca de cinco milímetros ventral e paralelamente ao sulco

átrio-ventricular, com fio de poliéster 2-0 com duas agulhas de 15 mm13

. Os pontos foram

iniciados caudalmente ao ramo intermédio da artéria circunflexa e foram finalizados

caudalmente ao ramo descendente cranial da artéria circunflexa, quando este estava presente,

ou então caudalmente ao ramo interventricular paraconal da artéria coronária esquerda. A

sutura era realizada de tal maneira que o fio passava sob os ramos coronarianos. Entre o fio de

13

Ethibond Excel Cardiovascular – Johnson & Johnson – Divisão Ethicon.

34

sutura e o miocárdio foram colocadas esponjas de feltro14

, sendo, em seguida, cerrado o nó.

A região do pericárdio foi, em seguida, lavada com compressas umedecidas com

solução fisiológica. O pericárdio não foi suturado. Para a síntese da cavidade torácica,

utilizou-se uma sutura interrompida simples, com fio poliglactina 910 2-015

, envolvendo os

arcos costais. Os músculos serráteis e o grande dorsal foram suturados mediante sutura

contínua simples, com o mesmo fio. O músculo cutâneo do tronco foi suturado juntamente

com o plano celular subcutâneo, por meio de uma sutura de Cushing, com poliglactina 910

2-0. A pele recebeu sutura interrompida simples, com fio mononylon 3-016

. Após cerrar os

pontos de pele, a pressão negativa foi restaurada por meio de aspiração do ar remanescente na

cavidade torácica através de um cateter conectado a uma torneira de três vias.

Ao final da cirurgia foi realizado novo bloqueio infiltrativo local na linha de incisão

com bupivacaína 0,5% (0,5 mg/kg).

7 RESULTADOS

O primeiro animal, cão da raça poodle, macho, com sete anos de idade, pesando 5,8 kg

encontrava-se com IC de classe II e apresentava tosse há mais de um ano e respiração

ofegante. A tosse era constante e refratária à medicação utilizada na ocasião, que consistia de

maleato de enalapril e furosemida. O escore do animal, dado pelo proprietário de acordo com

questionário de avaliação da qualidade de vida relacionada com a saúde cardíaca, era de oito.

Ao exame físico, o animal apresentou coloração de mucosas normais, tempo de

preenchimento capilar de dois segundos, frequência respiratória aumentada, taquicardia e

sopro de regurgitação em foco mitral, de grau IV/VI. O exame radiográfico revelou aumento

da silhueta cardíaca, devido a aumento do átrio esquerdo, além de opacidade na região

pulmonar hilar.

Ao eletrocardiograma observou-se arritmia sinusal respiratória, com sobrecarga

ventricular esquerda e ondas T de amplitude elevada, sugestivo de hipóxia do miocárdio. Os

valores eletrocardiográficos estão reportados na Tabela 3.

14

Biocron patch inorgânico de feltro – Biomedical Equipamentos e Produtos Médico-Cirúrgicos Ltda, São Paulo, SP. 15 Vicryl – Johnson & Johnson – Divisão Ethicon. 16 Mononylon – Johnson & Johnson – Divisão Ethicon.

35 Tabela 3 – Parâmetros eletrocardiográficos de cão da raça poodle, macho, sete anos de idade, 5,8 kg, com

DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa. SD = sem desnivelamento

Parâmetros Dados

Frequência cardíaca (bpm) 108

Ritmo cardíaco arritmia sinusal

Duração de onda P (ms) 40

Amplitude de onda P (mV) 0,3

Duração do QRS (ms) 57

Amplitude de onda R (mV) 2,5

Intervalo PR – duração (ms) 83

Intervalo QT – duração (ms) 207

Segmento ST SD

Polaridade da onda T negativa, > 1/4 R

Eixo elétrico QRS + 60º

O ecocardiograma demonstrou aumento de átrio esquerdo moderado a severo (Figura

8), aumento do diâmetro ventricular esquerdo em diástole, com função ventricular preservada,

com fração de encurtamento (FE) de 59,4% (Figura 9) e espessamento da valva mitral, com

jato severo de regurgitação (Figura 10). Os valores ecodopplercardiográficos são apresentados

na Tabela 4.

Figura 8 – Imagem ecocardiográfica em modo M da aorta (Ao) e átrio esquerdo (AE) de cão da raça

poodle, macho, sete anos de idade, 5,8 kg, com DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral

por plicatura externa, revelando aumento do átrio esquerdo

36

Figura 9 – Ecocardiografia em modo M do ventrículo esquerdo de cão da raça poodle, macho,

sete anos de idade, 5,8 kg, com DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por

plicatura externa, revelando aumento do diâmetro ventricular esquerdo em diástole (DIVEd) e da

fração de encurtamento (59,4%)

Figura 10 – Ecocardiograma bidimensional com Doppler colorido de cão da raça poodle, macho,

sete anos de idade, 5,8 kg, com DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por

plicatura externa, revelando jato severo de regurgitação mitral (mosaico de cores), o qual

preenchia 100% da superfície atrial esquerda

37 Tabela 4 – Valores ecodopplercardiográficos de cão da raça poodle, macho, sete anos de idade, 5,8 kg, com

DMVM, antes do procedimento cirúrgico de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa

Parâmetros Dados

Átrio esquerdo (AE) 1,1 cm

Aorta (Ao) 2,2cm

Relação AE:Ao 2,0

Diâmetro ventrículo esquerdo diástole 3,85 cm

Diâmetro ventrículo esquerdo sístole 1,56 cm

Fração de ejeção 90%

Fração de encurtamento 59,4%

Volume ventricular diastólico 57,2 mL

Volume ventricular sistólico 3,79 mL

Índice de volume diastólico 172,28 mm3/m

2

Índice de volume sistólico 11,41 mm3/m

2

Gradiente de pressão pulmonar 0,8 mmHg

Gradiente de pressão aórtico 1,2 mmHg

Neste cão, ao se realizar a aplicação do nó cirúrgico, houve rompimento do miocárdio,

que se encontrava bastante friável. A ruptura foi ocasionada pela sutura, e se originou a partir

da porção interna do miocárdio. Houve hemorragia incontrolável e óbito trans-operatório do

animal.

O segundo cão, poodle, fêmea com 15 anos de idade, pesando 4,1 kg, encontrava-se

com IC de classe IIIa, refratária à terapia, que já havia sido otimizada, apresentando síncopes

e episódios frequentes de recidiva de edema pulmonar e tosse constante. O escore do animal,

dado pelo proprietário de acordo com questionário de avaliação da qualidade de vida

relacionada com a saúde cardíaca, era de 16.

Ao exame físico pré-operatório, o animal apresentou coloração de mucosas normais,

tempo de preenchimento capilar de dois segundos, frequência respiratória aumentada,

taquicardia e sopro de regurgitação em foco mitral, de grau V/VI.

O exame radiográfico revelou aumento da silhueta cardíaca, devido a aumento do átrio

esquerdo e o eletrocardiograma pré-operatório demonstrou ritmo sinusal, sem alterações.

O ecodopplercardiograma pré-operatório mostrou espessamento e prolapso dos

folhetos da valva mitral, com jato severo de regurgitação mitral (Figura 11A), aumento de

átrio esquerdo e função miocárdica preservada.

Ao se realizar a anuloplastia mitral neste cão, observou-se, no momento em que foi

cerrado o nó, o desaparecimento do frêmito, pela palpação direta sobre o átrio esquerdo.

Entretanto, houve, simultaneamente, grande infradesnivelamento de ST, caracterizando

infarto agudo do miocárdio. Optou-se então, pela remoção da plicatura. Esta foi refeita em

seguida, aplicando-se menor tensão ao nó, promovendo-se redução do frêmito, sem, no

entanto provocar infradesnivelamento de ST.

38

Após a cirurgia, o animal apresentou-se clinicamente melhor, reduzindo o escore

cardíaco para quatro na primeira semana, seis na segunda semana, dois na terceira semana e

seis na quarta semana de pós-operatório.

O exame ecodopplercardiográfico realizado dois dias após o procedimento

demonstrou redução no jato de regurgitação para moderado, assim mantendo-se ao longo do

período avaliado (Figura 11 B).

Figura 11 – Ecocardiograma bidimensional com Doppler colorido de cão poodle, fêmea, 15 anos de idade,

4,1 kg, com DMVM. A) Antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa, revelando jato

severo de regurgitação mitral (mosaico de cores), observar preenchimento superior a 50% da superfície atrial

esquerda. B) Dois dias após a cirurgia, notar diminuição no jato de regurgitação mitral

Ao eletrocardiograma observou-se redução da amplitude de onda R e aumento da

amplitude da onda T, dois e sete dias após o procedimento (Figura 12). Houve taquicardia

sinusal e desvio do eixo elétrico do QRS em todos os momentos avaliados após a cirurgia. Os

valores eletrocardiográficos são apresentados na Tabela 5.

39

Figura 12 – Eletrocardiograma de cão poodle, fêmea, 15 anos de idade, 4,1 kg, com DMVM. A) Pré-

operatório. B) Dois dias após cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa. Notar aumento na

amplitude da onda T e diminuição na amplitude da onda R. C) 15 dias após a cirurgia, evidenciando retorno

aos parâmetros eletrocardiográficos normais. DII, 50 mm/s, N

Tabela 5 – Parâmetros eletrocardiográficos de cão poodle, fêmea, 15 anos de idade, 4,1 kg, com DMVM, antes

da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa e dois, sete, 15 e 30 dias após o procedimento.

SD= sem desnivelamento

Parâmetros Pré-operatório 2 dias 7 dias 15 dias 30 dias

Frequência cardíaca (bpm) 162 197 184 198 190

Ritmo cardíaco sinusal taquicardia

sinusal

taquicardia

sinusal

taquicardia

sinusal

taquicardia

sinusal

Duração de onda P (ms) 50 50 53 50 53

Amplitude de onda P (mV) 0,41 0,39 0,42 0,40 0,40

Duração do QRS (ms) 53 63 57 53 57

Amplitude de onda R (mV) 1,36 0,88 0,91 1,31 1,28

Intervalo PR – duração (ms) 67 60 67 70 63

Intervalo QT – duração (ms) 187 207 167 170 173

Segmento ST SD SD SD SD SD

Polaridade da onda T negativa,

< 1/4 R

negativa,

> 1/4 R

positiva,

> 1/4 R

negativa,

< 1/4 R

negativa,

< 1/4 R

Eixo elétrico QRS + 50° 0° + 15° + 15° + 15°

40

O terceiro cão, pinscher, macho, com 13 anos de idade, pesando 6 kg encontrava-se

com IC de classe IIIa, refratária à terapia, que já havia sido otimizada, apresentando episódios

frequentes de recidiva de edema pulmonar, tosse constante e ascite. O escore do animal, dado

pelo proprietário de acordo com questionário de avaliação da qualidade de vida relacionada

com a saúde cardíaca, era de 74.

Ao exame físico pré-operatório, o animal apresentou coloração de mucosas pálidas,

tempo de preenchimento capilar aumentado, frequência respiratória aumentada, taquicardia e

sopro de regurgitação em foco mitral e tricúspide de grau V/VI.

O exame radiográfico revelou aumento da silhueta cardíaca, devido a aumento do átrio

esquerdo e o eletrocardiograma pré-operatório demonstrou ritmo sinusal, com sobrecarga

ventricular esquerda (Tabela 6).

Tabela 6 – Parâmetros eletrocardiográficos de cão pinscher, macho, 13 anos de idade, 6 kg, com DMVM, antes

da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa e dois dias após o procedimento. SD = sem

desnivelamento

Parâmetros Pré-operatório 2 dias

Frequência cardíaca (bpm) 168 117

Ritmo cardíaco sinusal sinusal

Duração de onda P (ms) 47 40

Amplitude de onda P (mV) 0,33 0,22

Duração do QRS (ms) 63 63

Amplitude de onda R (mV) > 2,5 1,80

Intervalo PR – duração (ms) 87 97

Intervalo QT – duração (ms) 183 113

Segmento ST SD SD

Polaridade da onda T negativa,

< 1/4 R

isoelétrica,

< 1/4 R

Eixo elétrico QRS + 60° + 70°

O ecodopplercardiograma pré-operatório revelou espessamento e prolapso dos

folhetos da valva mitral, jato severo de regurgitação mitral (Figura 13A) e tricúspide, com

aumento severo de átrio esquerdo, função miocárdica levemente diminuída, com FE = 41%

(Tabela 7), aumento do diâmetro do ventrículo direito (Figura 14), aplanamento do septo

interventricular e hipertensão pulmonar, da ordem de 50 mmHg.

O procedimento cirúrgico permitiu a redução do jato de regurgitação mitral para grau

moderado (Figura 13B), sem ocasionar infradesnivelamento de ST. Entretanto, o animal

apresentou hipotensão durante o período transoperatório, com quadro de insuficiência renal

aguda e óbito 48 horas após a cirurgia.

41

Figura 13 – Ecocardiograma bidimensional com Doppler colorido de cão pinscher, macho, 13 anos de idade,

6 kg, com DMVM. A) antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa, revelando jato

severo de regurgitação mitral (mosaico de cores), o qual preenchia quase 100% da superfície atrial esquerda.

B) dois dias após a cirurgia, demonstrando grande diminuição no jato de regurgitação mitral

Tabela 7 – Valores ecodopplercardiográficos de cão pinscher, macho, 13 anos de idade, 6 kg, com DMVM,

antes do procedimento cirúrgico de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa

Parâmetros Dados

Átrio esquerdo (AE) 2,69 cm

Aorta (Ao) 1,07 cm

Relação AE:Ao 2,50

Diâmetro ventrículo esquerdo diástole 2,54 cm

Diâmetro ventrículo esquerdo sístole 1,50 cm

Fração de encurtamento 41,1%

Fração de ejeção 0,741

Volume ventricular diastólico 23,2 mL

Volume ventricular sistólico 6,01 mL

Índice de volume diastólico 67,44 mm3/m

2

Índice de volume sistólico 17,47 mm3/m

2

Gradiente de pressão pulmonar 1,69 mmHg

Gradiente de pressão aórtico 7 mmHg

Onda E 105 cm/s

Onda A 83,6 cm/s

Relação E/A 1,25

Tempo de relaxamento isovolumétrico 0,011 s

42

Figura 14 – Ecocardiograma em modo M de cão pinscher, macho, 13 anos de idade, 6 kg, com

DMVM, realizado antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa, revelando

aumento no diâmetro ventricular direito. VD, ventrículo direito. VE, ventrículo esquerdo

O quarto cão, maltês, macho, com oito anos de idade, pesando 4,3 kg encontrava-se

com IC de classe IIIa, refratária à terapia, que já havia sido otimizada, apresentando episódios

de tosse constante. O escore do animal, dado pelo proprietário de acordo com questionário de

avaliação da qualidade de vida relacionada com a saúde cardíaca, era de 41.

Ao exame físico pré-operatório, o animal apresentou coloração de mucosas normais,

tempo de preenchimento capilar de dois segundos, frequência respiratória aumentada,

taquicardia e sopro de regurgitação em foco mitral, de grau IV/VI.

O exame radiográfico revelou aumento da silhueta cardíaca, devido a aumento do átrio

esquerdo e o eletrocardiograma pré-operatório apresentou ritmo sinusal, com sobrecarga de

ventrículo esquerdo (Tabela 8).

43

Tabela 8 – Parâmetros eletrocardiográficos de cão da raça maltês, macho, oito anos de idade, 4,3 kg, com

DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa. SD = sem desnivelamento

Parâmetros Dados

Frequência cardíaca (bpm) 132

Ritmo cardíaco sinusal

Duração de onda P (ms) 70

Amplitude de onda P (mV) 0,43

Duração do QRS (ms) 73

Amplitude de onda R (mV) 3,77

Intervalo PR – duração (ms) 123

Intervalo QT – duração (ms) 243

Segmento ST SD

Polaridade da onda T negativa, < 1/4 R

Eixo elétrico QRS + 70º

O ecodopplercardiograma pré-operatório revelou espessamento e prolapso dos

folhetos da valva mitral, jato severo de regurgitação mitral, aumento severo de átrio esquerdo

(Figura 15) e função miocárdica levemente diminuída. Os valores ecodopplercardiográficos

estão apresentados na Tabela 9.

Figura 15 – Ecocardiograma bidimensional de cão maltês, macho, oito anos de idade, 4,3 kg, com

DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa. Notar aumento

severo de átrio esquerdo (AE). Ao, aorta

44 Tabela 9 – Valores ecodopplercardiográficos de cão da raça maltês, macho, oito anos de idade, 4,3 kg, com

DMVM, antes da cirurgia de anuloplastia valvar mitral por plicatura externa

Parâmetros Dados

Átrio esquerdo (AE) 3,80 cm

Aorta (Ao) 1,01 cm

Relação AE:Ao 3,75

Diâmetro ventrículo esquerdo diástole 3,72 cm

Diâmetro ventrículo esquerdo sístole 1,96 cm

Fração de encurtamento 47,3 %

Fração de ejeção 0,794

Volume ventricular diastólico 59 mL

Volume ventricular sistólico 12,1 mL

Índice de volume diastólico 206,29 mm3/m

2

Índice de volume sistólico 42,30 mm3/m

2

Gradiente de pressão pulmonar 1,44 mmHg

Gradiente de pressão aórtico 1,87 mmHg

Onda E 120 cm/s

Onda A 59,4 cm/s

Relação E/A 2.01

Tempo de relaxamento isovolumétrico 0,054 s

Durante o procedimento cirúrgico, no momento de cerramento do nó da sutura,

ocorreu rompimento do miocárdio, que estava bastante friável, ocasionando hemorragia

intensa e o animal foi a óbito logo em seguida.

8 DISCUSSÃO

A DMVM é a afecção cardíaca mais comum em cães, podendo ser considerada uma

doença relativamente benigna, devido à sua progressão lenta e ao fato de alguns cães nunca

desenvolverem sinais clínicos de IC e irem a óbito por outras razões (BORGARELLI et al.,

2008). Entretanto em alguns casos ela culmina em IC e quando isto ocorre, o prognóstico é

desfavorável e o tempo médio de sobrevida é baixo. De acordo com Sisson, Kvart e Darke

(1999), a sobrevida é de cerca de um ano, mesmo com a terapia otimizada. Já Borgarelli et al.

(2008), estudando 558 cães de diferentes raças, portadores de DMVM, relataram o tempo

médio de sobrevida em torno de nove meses para cães em IC classe III do ISACHC e de 33

meses para cães em classe II.

Segundo Borgarelli et al. (2008), algumas variáveis podem auxiliar na determinação

da evolução da doença e de seu prognóstico. Dentre elas, a relação AE/Ao maior que 1,7 foi a

variável que melhor se correlacionou com o baixo tempo de sobrevida, em casos de óbito

45

exclusivamente por causa cardíaca. Neste estudo, todos os animais apresentaram relação

AE/Ao maior que 1,7. Apesar de um dos cães se encontrar em IC classe II do ISACHC, este

apresentava aumento de átrio esquerdo moderado a severo e tosse crônica, refratária à

medicação, tendo sido solicitada pelo proprietário a alternativa cirúrgica.

Neste estudo, a anuloplastia valvar mitral por plicatura externa ocasionou a redução do

jato de regurgitação mitral, de grau severo para graus leve a moderado em dois animais, sendo

que um deles apresentou boa evolução clínica. De acordo com Muzzi et al. (2000) o

mapeamento colorido da área de jato de regurgitação mitral é um método quantitativo simples

e confiável para a determinação da severidade do grau de regurgitação mitral. Esta, por sua

vez, está diretamente ligada ao tamanho do átrio esquerdo, que é um indicador da severidade

da doença e do prognóstico desfavorável (BORGARELLI et al., 2008), exceto quando há

ruptura de cordoalha tendínea, onde ocorre regurgitação mitral severa e o átrio esquerdo pode

se apresentar normal ou apenas levemente aumentado (KITTLESON, 2008).

Belerenian et al. (2009) realizaram a anuloplastia mitral por plicatura externa em cinco

cães com DMVM e em um cão com displasia mitral congênita, com diminuição ou

desaparecimento do jato de regurgitação mitral, avaliado durante o período trans-operatório,

por ecodopplercardiografia transesofágica, com óbito de um animal, 48 hs após o

procedimento cirúrgico. Os demais cães apresentaram melhora clínica e evoluíram para a

classe I do ISACHC. Entretanto, todos os animais apresentavam-se em classe funcional II de

IC antes do procedimento. No estudo aqui apresentado, três animais se encontravam em IC

classe III do ISACHC, o que pode ter contribuído para a alta mortalidade relacionada com a

cirurgia. De fato, um destes cães apresentou o coração bastante friável, tendo ocorrido ruptura

do miocárdio. Outro animal apresentou hipotensão durante o período operatório, o que,

segundo Cowgill (2003), pode ter contribuído para a ocorrência de insuficiência renal aguda e

óbito 48 hs após a cirurgia. Já o óbito do primeiro animal foi atribuído, além do

comprometimento miocárdico relacionado com a enfermidade, ao baixo domínio da técnica

cirúrgica, no início da pesquisa. Deste modo, o procedimento cirúrgico estudado parece estar

mais indicado para cães com IC de classe II do ISACHC do que para cães em classe III.

Não obstante, Orton17

, realizando o mesmo procedimento em oito cães com IC severa,

observou óbito em seis animais, possivelmente devido ao comprometimento coronariano e

hipofunção contrátil do ventrículo esquerdo no pós-operatório (informação verbal). Em nosso

estudo foi observado no eletrocardiograma aumento da amplitude da onda T após a cirurgia, o

que pode ter sido causado devido à hipóxia do miocárdio. Porém esta alteração foi transitória,

17 Comunicação pessoal de E. Christopher Orton em 2008.

46

retornando ao normal 15 dias após a cirurgia, de acordo com o observado por Andrade et al.

(2005) ao realizar plicatura na parede livre do ventrículo esquerdo.

Outras técnicas foram propostas, com taxas de óbito elevadas, como por exemplo, a

anuloplastia circunferencial por sutura externa do anel mitral, descrita por Buchanan e

Sammarco (1998), cuja mortalidade trans-operatória e pós-operatória imediata foi de 60%.

Griffiths, Orton e Boon (2004) obtiveram êxito na resolução da IC em cães com insuficiência

mitral causada por DMVM ou por displasia mitral, mediante diferentes técnicas de reparo

valvar. No entanto, a taxa de mortalidade foi de 33,3%, sendo ainda, necessária a circulação

extracorpórea. Os autores enfatizam a importância de se realizar a cirurgia no início da IC,

devido à maior chance de sucesso.

Apesar da mortalidade elevada, um dos animais deste estudo apresentou melhora

clínica no período pós-operatório avaliado, com diminuição no escore determinado pelo

proprietário por meio do questionário de avaliação da qualidade de vida relacionada com a

saúde cardíaca. Neste cão, o escore passou de 16 para quatro na primeira semana, seis na

segunda semana, dois na terceira semana e seis na quarta semana de pós-operatório.

Marcondes-Santos et al. (2007) relataram uma melhora no escore, de 13,8 ± 8,8 para 6,0 ±

6,6, após a adição de carvedilol à terapia convencional, em cães com IC causada por DMVM.

Apesar da subjetividade do questionário, evidenciada pela diferença nos escores pré-

operatórios dos animais, pois são comparadas as respostas de diferentes proprietários, ele se

revelou bastante importante no acompanhamento da melhora clínica de cada animal

individualmente. Segundo Freeman et al. (2005) há uma correlação significante entre o escore

determinado pelo proprietário por meio deste questionário e a classe funcional da IC de

acordo com o ISACHC. A melhora dos sinais clínicos desse cão foi atribuída ao procedimento

cirúrgico, uma vez que não se modificou a terapia medicamentosa.

A melhora clínica foi acompanhada pela diminuição do jato de regurgitação mitral,

porém a relação AE/Ao e os demais índices ecocardiográficos avaliados mantiveram-se

próximos dos valores pré-operatórios. Entretanto, o período de um mês de avaliação pode não

ter sido suficiente para a diminuição da hipertrofia excêntrica, a exemplo do que se observa

após correção cirúrgica de duto arterioso persistente (KITTLESON, 1998).

47

9 CONCLUSÕES

Com este estudo concluiu-se que a técnica de anuloplastia valvar mitral por plicatura

externa foi capaz de ocasionar a redução do jato de regurgitação mitral, bem como melhora

clínica em cão com DMVM. Entretanto, a mortalidade foi elevada, demonstrando que a

referida técnica é um procedimento de risco alto em cães com IC avançada, ou seja, aqueles

pertencentes à classe III do ISACHC.

48

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crônica em cães. Veterinária Notícias, Uberlândia, v. 13, n. 1, p. 9-15, 2007.

TEICHHOLZ, L. E. et al. Problems in echocardiographic volume determinations:

echocardiographic-angiographic correlations in the presence of absence of asynergy. The

American Journal of Cardiology, Riverton, v. 37, n. 1, p. 7-11, 1976.

THOMAS, W. P. Two-dimensional, real-time echocardiography in the dog: technique and

anatomic validation. Veterinary Radiology, [S.l.], v. 25, n. 2, p. 50-64, 1984.

TILLEY, L. P. Essentials of canine and feline electrocardiography. 3. ed. Philadelphia:

Lea & Febiger, 1992.

WHITNEY, J. G. Observations on the effect of age on the severity of heart valve lesions in

the dog. The Journal of Small Animal Practice, [S.l.], v. 15, n. 8, p. 511-522, 1974.

53

ANEXO A

Classificação funcional da insuficiência cardíaca segundo a ISACHC

I. Assintomático

Ia. Sinais de doença cardíaca, sem cardiomegalia

Ib. Sinais de doença cardíaca, com cardiomegalia

II. Insuficiência cardíaca leve a moderada

Sinais clínicos de insuficiência cardíaca são

evidentes em repouso ou com exercícios leves,

comprometendo a qualidade de vida

III. Insuficiência cardíaca severa

Sinais clínicos de insuficiência cardíaca são

imediatamente óbvios

IIIa. Terapia em casa é possível

IIIb. Hospitalização é recomendável (choque

cardiogênico, edema pulmonar ou efusão pleural

graves, ascite refratária)

Fonte: MORAIS; PEREIRA, 2002.

54

ANEXO B

Questionário de Avaliação da Saúde Cardíaca

Os proprietários eram questionados sobre sua percepção acerca do grau dos sinais clínicos da doença

cardíaca que afetaram seu cão nos sete dias anteriores. Para cada item era dado um escore que variava de 0 a 5,

onde 0 correspondia à ausência, 1, levemente e 5 muito evidentes. As respostas a cada item eram somadas para

se obter um escore geral.

Qual foi o impacto da doença cardíaca no conforto do seu cão nos últimos sete dias, em relação

aos seguintes acontecimentos?

Escores: de 0 a 5 , onde 0 corresponde à ausência, 1, a levemente e 5 corresponde a muito.

Evento Escore

1. Respiração ofegante

2. Tosse

3. Ocorrência de barulho ao respirar

4. Cansaço, fadiga

5. Dificuldade em realizar atividades físicas de lazer (brincar, rolar, etc.)

6. Limitação das atividades preferidas devido à restrição de exercício

7. Sentar-se ou deitar ao caminhar

8. Dificuldade de caminhar em subidas ou escadas

9. Ocorrência de colapso/desmaios

10. Dificuldade de se manter confortável

11. Dificuldade de dormir à noite

12. Alimentar-se menos que o normal

13. Mudando de alimentação, come mais?

14. Aumento de micção dentro de casa

15. Vômitos

16. Limitação de atividades conjuntas com a família (não pode subir escadas,

não consegue subir no sofá ou na cama, etc)

17. Irritação ao tocá-lo

18. Depressão

Adaptado de: FREEMAN et al. (2005).

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