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Antônio Neves de Mesquita Rute

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Antônio Neves de Mesquita

Rute

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Introdução

1. O Livro e Sua Posição no Cânone Hebraico

2. Ambiente e Data do Livro

3. Condições da Época do Livro

4. Esboço do Livro

5. Discussão do Livro

1) Fome e imigração de Elimeleque

2) Noemi e Rute voltam a Judá

3) Um regresso triste

4) Muito vale um bom parente

5) Desobriga de um dever

6) Um casamento feliz

7) Um bom costume

8) Nasce o avô de Davi

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INTRODUÇÃO

Incluímos o livro de Rute no período dos juízes, porque efetivamente pertence a este período,

mesmo que não trate de qualquer juizado de Israel. Ele reflete uma época, tal como

conhecemos a dos juizes, e por muitos é considerado como um feliz epílogo da Idade Média

dos israelitas. Realmente, o livro de Rute nos coloca face a face com um drama de família e

um certo número de costumes que muito recomendam a nação israelita. Por meio dele

podemos ver que nem tudo era idolatria, sexualismo e carnificina. Havia muita coisa boa em

Israel e Rute nos dá uma idéia clara. Agradecemos à Providência divina a existência deste livro,

porque sem ele estaríamos impossibilitados de fazer um juízo escorreito da situação geral na

Palestina de Israel. Já agora, estamos habilitados a dizer que, no meio de muito pecado e

incredulidade, havia gente que vivia e morria por Jeová e sua Religião.

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1. O Livro e Sua Posição no Cânone Hebraico

Na Septuaginta e na Vulgata e mesmo em outras edições da Bíblia, o livro de Rute aparece

entre o de Juizes e Samuel. Os colecionadores dos livros sagrados, infere-se, entenderam que

Rute pertence ao período dos Juizes de Israel. Este livro, posto junto com o de Juizes e os

primeiros capítulos de Samuel, se nos afigura um manancial, um oásis de espiritualidade e

ordem no meio de tanta desordem e carnalidade. Por isso fica muito bem entre os dois. Nele

não se vêem armas nem proclamações de brigas domésticas ou estrangeiras. É a vida simples e

pacata de um povo que quer viver, trabalhar e adorar seu Deus, mantendo as tradições

familiares. A vida do povo continuava imperturbável, cada qual cuidando das suas terras,

semeando e colhendo, comendo e pagando os seus dízimos ao Senhor, que os havia tirado da

terra do Egito. O casamento de Boaz com Rute é o evento mais lindo e tocante de tudo que se

poderia esperar de uma era primitiva. Simples, sem os enfeites de eras industriais, um

romance a moda primitiva. Uma maravilha de simplicidade e beleza e ao mesmo tempo

fidelidade aos princípios que norteavam a família hebraica. É o livro dos contrastes. O de

Juízes, cheio de crueldade, matanças em grosso brigas por isto e por aquilo, cidades

destruídas, milhares de mortos insepultos, um mundo em ruínas. Em Rute, nada disso se vê.

Tudo é paz e harmonia.

Por sua relação com a dinastia de Davi, alguns códigos incluem este livro entre os Hagiógrafos,

na terceira edição do Cânone hebraico. O Talmude coloca-o no primeiro lugar nesta coleção

imediatamente antes dos Salmos. Como veio parar entre os proféticos, ou chamados

primeiros profetas, Josué a Reis, não sabemos. Deve ter havido justos motivos para o incluir

entre os pré-proféticos. De nossa parte, achamos que aqui é o seu lugar, pois ele nos dá a

medida da vida israelita, num período turbulento, como a dizer-nos que nem tudo estava

perdido. O livro tem ainda uma profunda relação com a Teocracia, pois nos dá a origem da

família de Davi, de quem veio a linhagem real, que tão de perto nos fala da realeza do Messias

na nação hebraica. Está, pois, plenamente justificada sua presença entre os primeiros

profetas, segundo o cânone hebraico.

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2. Ambiente e Data do Livro

Os fatos narrados no livro ocorreram incontestavelmente durante o período dos juizes, mas a

ocasião exata não sabemos. O período, como vimos, compreende 350 anos, tempo suficiente

para um desenvolvimento muito além, superior àquele que o livro nos mostra. Ele reflete uma

época muito anterior a Samuel, mas alguns comentadores o colocam na era desse juiz e

sacerdote. Boaz era o avô de Davi, e parece a alguns que a genealogia de Davi, aqui incluída, é

prova bastante para se dar ao livro uma data após o aparecimento desse rei. Não parece que

o escopo do autor do livro seja Pôr em evidência o rei Davi; isso ocorreria de qualquer

maneira. Josefo coloca o livro nos tempos de Eli, quando ainda não se conhecia Davi, nem

estava ele nas cogitações do juiz ou de seu sucessor (Antig. 5, 9, 1). Salmom, pai de Boaz, era

marido de Raabe, a mulher salva em Jericó, por haver protegido os espias mandados por

Josué. Isto também não é motivo para fazer recuar a idade do livro aos tempos de Josué, pois

que o historiador tem de ater-se a fatos, mais do que a épocas. Nas genealogias há certas

lacunas que poucos fatos explicam. Mateus inclui (1:1-5), na sua genealogia de Jesus, Salmom,

marido de Raabe, como o elemento básico desta história. Por isso não vamos incluir a data do

livro na era de Salmom. Então a que data deve ser atribuído o livro? Por que não aceitar a

opinião de Josefo e incluir o livro em 1070 ou mesmo um pouco antes? Isso nos levaria a

colocá-lo no tempo de Samuel, talvez, Já para o fim do seu ministério, quando Saul foi

escolhido rei, ou pouco depois. Saul foi proclamado rei em 1044, pela cronologia aceita pelo

autor. Samuel já estava velho quando se deu esta proclamação (I Sam. 8), pelo menos foi

assim considerado pelos anciões de Israel. Poderia ainda escrever um livro, se a isso se

dedicasse. Poderia tê-lo escrito antes também. (1) A nosso ver, pois, mesmo aceitando o

ponto de vista de Josefo, o livro deve corresponder ao fim do período dos juízes, como a dizer-

nos que nem todas as coisas eram como estavam registradas neste último livro. Que houvesse

essa intenção por parte do escritor, ignoramos, mas que estivesse na mente divina, admitimos.

O ambiente nos tempos de Eli não era ainda muito agradável. Persistia alguma turbulência,

embora a história de Ana, mãe de Samuel, já nos dê mostras da espiritualidade reinante em

muitas famílias. Parece-nos até, que o espírito belicoso era mais próprio dos homens, que da

família. Seja o livro um pouco posterior a Josué ou do tempo de Eli, pouco importa para a sua

credibilidade, pois sempre foi tido pelos judeus, em todas as épocas, como livro inspirado.

(1) A aparente dificuldade de colocar o livro antes de Davi é a sua cronologia. Quem quer

que escrevesse no tempo de Samuel, não poderia dar o nome de Jessé e Davi.

Admitimos que um escriba, posteriormente, incluísse estes nomes no fim do livro.

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3. Condições da Época do Livro

Não se podendo dizer quando o livro foi escrito, muito menos se conhece a época quando se

deram os acontecimentos relatados. Havia secas periódicas na Palestina. Houve seca nos dias

de Jacó, que o levou a imigrar para o Egito. Houve seca nos dias de Elias, embora provocada

pelos pecados de Acabe. Era uma região parecida com o nosso Nordeste, com suas secas

cíclicas. Por isso não se pode dizer quando aconteceu a mudança da heroína do livro, mesmo

porque nós não temos uma relação dos flagelos cósmicos que teriam visitado Israel. Por um

lado, parece-nos ser uma data muito antiga, quando ainda os costumes, impostos por Moisés,

estariam vívidos na mente do povo. Isso, entretanto, não basta porque certos costumes se

transmitiram por longas eras e só se transformaram quando mudou a estrutura civil dessa

nação. A narrativa retrata as condições sociais da época e a situação do povo. Como já vimos,

porém, estas condições não tiveram data certa e as ocorrências que o livro nos mostra tanto

poderiam acontecer depois de Josué, como nos dias de Eli ou Samuel.

A terra de Noemi era muito pobre. Belém fica encravada na encosta da montanha de Judá.

Terra estéril, que nada produz seus habitantes valendo-se de pequenos anteparos da encosta,

conseguindo um pouco de verduras e cereais. Não seria necessária uma seca de muitos anos

para causar a imigração de uma família. Por outro lado, o lugar para onde foram ficava perto

de Belém, e, se houvesse uma seca geral e grave, Moabe, que ficava do lado leste do Jordão,

abaixo dos territórios dados às duas e meia tribos de Israel, teria sido também atingida.

Ficamos assim sem saber em que época ocorreu o flagelo que teria levado Elimeleque e família

à terra dos parentes moabitas.

O drama relatado no livro é simples. Havia um homem em Belém chamado Elimeleque, nome

composto de Eli (Deus) e Meleque (rei), portanto, Deus é rei. Pertencia à família hezronita.

Não era um pobre peão, pois possuía uma fazenda que foi provavelmente vendida antes da

viagem. O autor visitou este lugar e procurou imaginar, como em tantos outros casos, a

situação de Elimeleque, deixado as suas terras, pobres, é certo, mas suas, para ir mourejar em

Moabe, terra de estranhos. Elimeleque morreu lá e também morreram os dois filhos,

deixando uma viúva, com duas noras muito afetuosas. Tendo chovido na Palestina, Noemi

planejou voltar, deixando as duas noras em Moabe. O resto da história se desenvolve ao redor

de uma delas que não quis ficar, e acompanhou Noemi, a sogra querida.

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4. Esboço do Livro

Quase não há esboço. A história é uma canção ocorrida e sem rodeios. Mas, como faz parte

da natureza do estudo dar um esboço, aqui vai um para cumprir o dever.

1. A fome obriga Elimeleque, sua mulher e filhos a emigrarem - 1:1-5.

2. Noemi e Rute decidem voltar a Judá - 1:6-18.

3. Um regresso triste - 1:19-22.

4. Um bom parente - 2:1-22.

5. Desobriga de um dever - 3:1-18.

6. Um casamento feliz - 4:1-6.

7. Um costume bom - 4:7-12.

8. Nasce o avô de Davi - 13-22.

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5. Discussão do Livro

1) Fome e imigraçõo de Elimeleque (1:1-5).

"Nos dias em que os juízes governavam, houve uma fome na terra" (v. 1). Este verso coloca o

episódio do livro numa época certa, mesmo que não tivesse sido escrito nela . Pertence, pois,

ao período dos juízes. Nós acabamos de estudar este livro; estamos mais ou menos familiares

com a situação em que estes homens governavam. Uns por façanhas, como Sansão, outros

por ganância de poder, como Abimeleque (cap. 9), alguns por outros motivos ou intenções.

Nesta época, Elimeleque, sua mulher e filhos dirigem-se para Moabe, provavelmente uma

pequena região. O uso da palavra campo não parece indicar a grande terra dos moabitas.

Possivelmente seria a região rica e bem regada junto ao Arnom, perto dos rubenitas. Assim

sendo. Elimeleque estava junto da família mesmo em terra estranlha. Havia dois filhos que se

teriam unido aos pais para o cultivo de um bom pedaço de terra.

O nome de um era Malom, que significa "delicado", o do outro, Quilom, que significa "fraco".

Noemi significa "agradável", gentil. Família de quatro pessoas, bem comportadas, família

caseira e unida, seria um estímulo aos seus aparentados moabitas, cujos costumes eram bem

diferentes, pelo que sabemos das suas crônicas religiosas (Núm. 25). Os dois rapazes, solteiros

que eram, casaram com moabitas. O casamento com moabitas não estava totalmente

proibido porque eles não eram considerados como os cananeus. Apenas não podiam ser

admitidos no templo ou na religião, a menos que fossem circuncidados. No tempo de

Herodes, o Grande, muitos moabitas se infiltraram em Israel e, para poderem gozar dos

benefícios da religião e da sociedade, não hesitaram em se deixar circuncidar. As mulheres se

chamavam Orfa e Rute. O nome da primeira significa bondosa ou a que vira as costas. O da

segunda significa rosa. Depois morreram Elimeleque e os dois filhos, deixando três viúvas em

terra estranha. Rute era a esposa de Malom, talvez o mais velho. O Targum diz que ela era

filha de Eglom, rei dos moabitas (Jul. 3:14). Se o Targum estiver certo e este Eglom, pai de

Rute, for o Eglom de Juízes 3:14, então temos um ponto certo sobre a data do livro dos juízes.

Mas não parece proceder a idéia expressa pelo Targum. A morte dos dois rapazes tem sido

atribuída ao seu casamento com estranhas, o que não nos parece certo. Houve muitos

casamentos com mulheres de fora da comunidade hebraica, mas não nos consta que os

homens tivessem morrido por isso. Os nomes dos rapazes ("delicado" ou "definhamento" e

outro "consunção" ou fraco) nada indicam quanto à sua morte. Morreram prematuramente,

sem que se saiba por que. De qualquer modo, tinha razão Noemi em dizer que o Senhor havia

descarregado a sua mão sobre ela.

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5. Discussão do Livro

2) Noemi e Rute voltam a Judá (vv. 6-18).

Ouviram que tinha chovido em Israel e o Senhor se lembrara do Seu povo. Então Noemi

decidiu voltar à sua terra. Os laços de amizade com as duas noras eram muito fortes e elas

não queriam separar-se dela. Foi um gesto muito tocante. Como é que duas estrangeiras, de

costumes diferentes, e, por que não dizer, de índoles diferentes, se uniram assim à sua sogra?

Noemi não queria que elas a acompanhassem. As duas insistiram em acompanhar a sogra. A

expressão de Noemi, que cada uma voltasse a "terra de sua mãe", quando deveria ter dito

"terra de seus pais", é significativa. Dá a entender que, sendo sogra, só podia pensar nas mães

das noras. Parece que o pai de Rute ainda vivia, pois foi lembrado por Boaz (2:11).

"O Senhor vos dê que acheis descanso, cada uma em casa de seu marido. E Noemi beijou-as,

em despedida (v. 9). Eram moças e bem podiam encontrar rapazes que as quisessem. Elas

responderam, chorando em altas vozes: "Não, iremos contigo ao teu povo." Noemi insistiu

com elas para voltarem às suas casas e a seus deuses. Deus poderia dar-lhes descanso

(benevolência significa descanso) enquanto em Judá talvez não tivessem isso. É interessante

notar que o nome Jeová, aqui traduzido Senhor, já era conhecido das moças, e até o seria

entre os moabitas, de modo geral. Em hebraico menuchah significa lugar de descanso e é

sinônimo de descanso em vista de promessa. Noemi alega mais que, não tendo outros filhos,

não estava na obrigação de os dar às viúvas, conforme preceitua Deuteronômio 25:5,

conferido com Mateus 22:23-33. Foi em virtude dessa lei, que Boaz veio a casar com Rute. Se

essa lei existia em Moabe não se sabe, mas é possível que não. Existia em Israel, e Noemi está

pensando em termos de israelita.

Noemi sente-se amargurada por causa das noras, em não poder dar-lhes outros maridos (v.

13). "A mim me amarga o ter o Senhor descarregado contra mim a sua mão." Noemi sente-se

frustrada na sua vida. Acha que Deus foi severo com ela, levando-lhe o marido e os dois filhos

e deixando-a agora com duas noras, que não queriam separar-se dela. Não sabia que isto

estava de antemão planejado. Havia outro plano a ser realizado em Israel, mas, como de nada

sabia, falava como quem fala para o seu momento. Então voltaram a chorar as três. Orfa com

um beijo se despediu da sogra para ir ao seu povo e aos seus deuses. Rute, porém, se apegou

à sua sogra e a não deixou. A resolução de Rute era inabalável e a sua linguagem não podia

deixar qualquer dúvida, tornando-se até um modelo de decisão e amor: "Onde quer que

morreres, morrerei eu, e ali serei sepultada. Assim rne faça o Senhor, e outro tanto se outra

coisa que não seja a morte me separar de ti" (v. 17). Que linda linguagem, que belas imagens

de pensamentos de uma moabita! Vendo, pois Noemi que a moça de todo estava decidida a

jogar sua sorte com a sogra, deixou de instar com ela. Amizades verdadeiras são raras, mas

quando se encontram, constituem uma riqueza. Que mais poderia Noemi esperar da terra

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estranha, onde perdeu o marido e os filhos? Se ela voltasse rica e cheia de "amigos", isso

ainda não compensaria a amizade sincera de uma jovem de outra linhagem, e de outra

religião, de outros costumes. Aliás, pela leitura, vê-se claro que Rute já tinha adotado a Jeová

como o seu Deus. Os deuses antigos da sua família ficavam para trás. Deus, por sua vez, não

deixaria de honrar uma fé como a desta moça. E honrou-a dando-lhe um marido ideal e uma

linhagem como nunca ela poderia ter em sua terra. Assim Deus, o bom Deus, galardoa os que

lhe obedecem e o seguem.

3) Um regresso triste (vv. 19-22).

"Assim, pois, foram-se ambas, até que chegaram a Belém." A viagem não era muito comprida,

mas também não era muito curta. Uns 80 quilômetros, se tanto. Se voltassem pelo sul do Mar

Morto, teriam de dar uma grande volta e subir pelo deserto de Judá, uma viagem perigosa e

cansativa. Voltando pelo caminho que nos parece mais lógico, atravessariam o território de

Rúben e de Gade e passariam o Jordão, no vau de Jericó. Dali para Belém era um salto, viagem

de um dia e meio. Não sabemos qual teria sido o caminho, mas podemos crer que o curso

aqui proposto foi o seguido por elas. Basta imaginar duas mulheres sozinhas, com as trouxas à

cabeça, andando de vila em vila, parando aqui e ali para se alimentar e para dormir, em

estalagens nem sempre muito confortáveis e seguras. Que de heroísmo e coragem!

Certamente já estavam seguras de que o Deus de Israel as guardaria. Doutra sorte nem teriam

ânimo para a viagem. Atualmente há boas estradas, mas, naqueles longínquos tempos, nada

disso havia. Agora se vai de automóvel, por uma estrada asfaltada, do antigo território dos

rubenitas até Jerusalém e a viagem se faz em poucas horas. Então não seria assim. Era um

tempo em que nem havia reis em Israel e cada qual fazia o que bem parecia aos seus olhos

(Juí. 21:25).

Finalmente chegaram a Belém-Efrata, assim chamada antigamente. Toda a cidade se

alvoroçou (comoveu) (v. 19). Não era para menos. Depois de dez anos de ausência, voltava

uma antiga belemita, desfilhada e viúva, acompanhada de uma estranha, que logo foi

apresentada como sendo a sua nora, também viúva. Então se diria: "Que houve, que todas

estas mulheres ficaram viúvas?" Somos levados a crer que a família de Elimeleque era muito

conhecida, e ele era um lavrador, talvez bem situado financeiramente. Possivelmente, o

parente Boaz estaria por ali e se alegraria com a volta da parenta, que talvez ele nem pensasse

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voltaria. O serviço de correio naqueles tempos era coisa muito rara e só existia para os

negócios do Estado. Os particulares, quando se mudavam, morriam na lembrança dos que

ficavam. Assim Boaz teria ficado alegre ao saber da volta da sua parenta. As mulheres diziam

(eram as mulheres porque o verbo hebraico está na forma feminina) : "Não é esta Noemi?

Ela respondia: "Não me chameis Noemi e sim MARA, porque amarga tem sido a minha vida. O

substantivo Mara - amargo ou amarga - veio de Êxodo 15:23, quando os israelitas não

puderam beber as águas, de amargas que eram. Noemi se considerava de vida amarga, pois

com grande amargura o Todo-Poderoso a tinha afligido. O nome divino El-Elion, muito antigo,

e que sempre denotava poder para socorrer, fora contrário a Noemi, pois, lhe levara o marido

e os dois filhos. Coitada de Noemi! "Ditosa eu parti, porém o Senhor (Jeová) me fez voltar

pobre." Era ditosa porque era casada com um homem bom e tinha dois filhos, que, parece,

eram o seu consolo. Voltava agora sem nada, Então não era mais Noemi, porém MARA. A sua

queixa é admissível numa mulher que não tinha, como muita gente ainda hoje não tem,

ciência dos caminhos de Deus, que do mal pode tirar o bem. "Todas as coisas contribuem para

o bem dos que amam Deus". Isso ela não sabia. Chegava à sua cidade no princípio da sega da

cevada, que vinha um pouco antes da cega do trigo. Isto deveria ser em abril de um ano que

não se sabe.

4) Muito vale um bom parente (2:1-22).

Noemi tinha um parente da parte de seu marido. A palavra aqui significa apenas "conhecido"

(Veja 3:2; Prov. 7:4; e refs.). Para ela, Boaz era parente e estava legalmente na obrigação de

resgatar a família destroçada em Moabe. O que pensaria Noemi não sabemos. Todavia, ela

conhecia os costumes de sua terra e sabia que, ele sendo bom e senhor de muitos bens não

deixaria a parenta passar fome. Já era um consolo para a pobre MARA.

Rute pede à sogra para ir rabiscar nas searas. Havia uma lei em Israel que impedia os

segadores apanharem as espigas caídas no ato de cortar o trigo ou a cevada (Deut. 24:19-22 e

Lev. 19:9-16) e sacudirem a oliveira. Tudo que ficava era ara os pobres. O autor chama a esta

doutrina, a proibição de ser pobre em Israel, no seu comentário sobre Deuteronômio

enquanto os segadores avançavam no corte do trigo ou da cevada, os pobres vinham atrás e

apanhavam o que ficava solto na terra. Este costume ainda vigora em certos lugares da

Espanha e de Portugal, onde os pobres mandam seu trigo para moinhos e as azeitonas para o

lagar do azeite, e por todo o ano têm o que comer. Bendito costume ou lei! Pois foi baseada

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nesta lei que Rute, não sabemos como a conhecia, pediu a Noemi para ir rabiscar no campo,

onde a deixassem. Naturalmente havia muitos que ignoravam a lei. Ou faziam de conta que

não existia. Para sua felicidade, Rute foi rabiscar justamente no campo de Boaz, homem rico e

bom, e seu parente, pois era da família de Elimeleque (v. 3).

Boaz foi visitar os seus segadores e saudou-os com aquele modo tão bíblico: "O Senhor seja

convosco". Eles responderam: "O Senhor te abençoe". Assim, com esta linguagem, que bem

denota o sentimento religioso do grupo, Rute estava segura (Veja Sal. 129:8). Aí Boaz

perguntou: "De quem é esta moça?" O empregado respondeu: "Esta é a moça moabita que

voltou com Noemi do país de Moabe" (v. 6). Boaz tinha tomado conhecimento da volta de

Noemi, mas não tinha conhecido a moça. Ela havia entrado no campo com a permissão do

encarregado dos trabalhadores. Estava na rebusca desde a manhã até aquela hora, talvez sem

comer ou beber, pois os moços não poderiam avançar e oferecer comida a uma estranha.

"Então disse Boaz a Rute: "Escuta, filha minha, não vás colher em outro campo. . ." (v. 8). Era

um achado para uma jovem desamparada, encontrar quem a protegesse. E acrescentou mais,

que tomasse cuidado e seguisse os segadores, pois já havia dado ordens no sentido de não a

molestarem (v. 9). Disse mais ainda: "Quando tiveres sede, vai aos vasos, e bebe do que os

moços tiverem tirado" (v. 9). Era costume, a cabaça ou odre do vinho seguir na frente dos

trabalhadores e, sempre que tinham sede, iam ao odre e bebiam. Este privilégio foi agora

estendido a Rute que deveria ter-se sentido outra. Inclinou-se, à moda oriental, e disse: "Por

que achei eu graça aos teus olhos, para que faças caso de mim, sendo eu estrangeira?" Ele

então lhe responde que já sabia de como havia sido boa para a sua sogra depois da morte do

marido, etc. Rute estava, começando a colher os frutos da sua benignidade e amor a Noemi e

no seu coração deveria estar muito grata a seu Deus, o Deus de Israel. O colóquio ainda

continuou até a hora de comer. Deveria ser meio-dia. Era costume a comida se levada aos

campos, de modo que os trabalhadores não perdessem tempo, para ir às suas casas fazer as

refeições. Depois de comer, descansavam e trabalhavam o resto do dia. Rute foi convidada a

comer. Ela se assentou ao lado dos segadores e comeu até se fartar, e ainda sobejou. Boaz foi

quem cuidou dela e animou a molhar o pão no vinho, uma espécie de molho azedo chamado

homez, muito usado então (v. 14). Uma cortesia que só se fazia a amigos. Lembramo-nos de

Judas, molhando o pão no molho do cabrito da Ceia (Mat. 26:23). Era atitude de pessoa da

intimidade. Depois do almoço, ela se levantou para continuar a rabiscar e Boaz deu ordens aos

servos para deixarem, de propósito, entre as gavelas, bastante para ela, como se lê: "Tirai dos

molhos algumas espigas e deixai-as ficar, para que ela as colha, e não a repreendais." Ficou

apanhando até a tarde, debulhou no moinho de Boaz as espigas apanhadas e conseguiu quase

uma efa de cevada. A lei de Deuteronômio 24:19 estava sendo cumprida.

Voltou para casa feliz com cerca 22 litros de cevada debulhada para não fazer muito volume.

Ela apanhou mais do que qualquer respigador era capaz de fazer, pois foi favorecida com os

punhados de espigas, deixados cair de propósito, para que os apanhasse. Não tendo vasilha

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para levar a cevada, arregaçou o vestido comprido e fez uma espécie de avental e aí carregou a

semente.

Rute voltou à cidade com a carga de cevada e com o resto da comida que sobejou

depois de fartar-se. Noemi admirou-se de que voltasse assim tão fornecida de cereal e

perguntou-lhe: "Onde trabalhaste?" Ela contou a história do senhor, em cujo campo havia

rabiscado, e disse o seu nome. Noemi entendeu logo tudo. As coisas estavam se

encaminhando para um feliz desenlace. Então disse: "Bendito seja ele do Senhor que não tem

deixado de mostrar a sua beneficiência, nem para com os vivos nem para com os mortos.

Disse-lhe mais Noemi: Esse homem é parente nosso um dos nossos remidores". O termo em

hebraico quer dizer "próximo", que vale por "remidor". Havia a doutrina dos remidores,

goeles, do verbo Gaal. Portanto, parece ter chegado um "póximo" que era quem tinha a

incumbência de remir a família. Veja-se Deuteronômio 25:5-12. Disse mais Noemi à sua nora

que seria bom ela se apegar às servas de Boaz, para não ir rabiscar noutro campo. Assim

passou Rute a ficar com as moças de Boaz até que a sega acabou. Levou algum tempo, porque

depois da cega da cevada vinha a do trigo, uns 15 dias depois. Portanto, uns dois meses para

mais. Durante esse tempo Rute teria apanhado bastante para o resto do ano. Era assim que

os pobres em Israel viviam, do rabisco do trigo, da cevada, das uvas e das azeitonas. Ninguém

era pobre. Noémi teria compreendido que Boaz seria o mishpachah da família, o remidor.

Rute não teria compreendido tudo isso, porque estava um tanto alheia aos costumes de Israel,

mas Noemi logo entendeu o caminho que as coisas estavam tomando.

5) Desobriga de um dever (3:1-18).

Neste capítulo, temos as demarches de Noemi, digamos assim, para ser realizado um ideal: o

de conseguir um lar para Rute, a boa moabita. Noemi sabia dos deveres e das obrigações dos

remidores e, dentro desse Conto, se movimenta, orientando a nora, até ver realizado o ideal.

Veremos isso melhor no desdobramento deste capítulo. Os direitos a Boaz eram de Noemi, e

não da nora, mas aquela de bom grado abriu mão do que era seu em favor da nora.

Pela morte de Elimeleque e depois de Malom, a família estava liquidada, a não ser que

um parente cumprisse o dever para com o morto. "Disse-lhe Noemi, sua sogra: Minha filha,

não te hei de buscar descanso, para que fiques bem?" Boaz era não apenas um dos remidores

(porque havia outro mais chegado), mas um homem que já tinha demonstrado "benevolência"

para com as viúvas. Então Noemi estuda um meio de fazer compreender a Boaz de que teria

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um dever a cumprir. Naquela noite ele iria padejar a cevada e seria uma noite de muita

animação. Sabia que um vento favorável sopraria, elemento base para limpar a cevada ou o

trigo pragana. Enchiam-se os cestos e as mulheres os levantariam e despejariam e na queda a

pragana era levada pelo vento, ficando o cereal limpo. É o que Noemi chama "limpar a cevada

na eira" (v. 2). Havia comidas e bebidas. Era uma festa.

"Lava-te, pois, unge-te, e veste os teus melhores vestidos, e desce à eira..." (v. 3). Ela não

deveria dar-se a conhecer. Entraria no meio das moças que trabalhavam e aguardaria a hora

de "fazer o trabalho". De noite, sem muita luz, qualquer moça se esconderia no meio da

multidão. Então, depois de comer e beber e ficar alegre, como era a norma, ela deveria ver o

lugar onde Boaz se iria deitar. Todos dormiam na eira, na primavera, temperatura fresca, era

uma festa. Então, quando Boaz adormecesse, Rute iria "de mansinho", lhe descobriria os pés,

e se deitaria perto. Quando ele acordasse e visse uma mulher deitada aos seus pés, saberia o

que fazer. "Tudo quanto me disseres fazerei" responde a moça. O luto já tinha passado e os

costumes da época permitiam estas coisas. No Ocidente, isso seria escandaloso, mas não no

Oriente. Não era costume uma mulher procurar um homem. Caso isso acontecesse, deveria

haver um motivo superior. Portanto, fiquem advertidos os leitores: Noemi não aconselhou

qualquer ato menos recomendável. Depois disso, logo Boaz veria o que estava por detrás de

tudo.

Então Rute foi para a eira ao lusco-fusco e fez tal como Noemi tinha ensinado. Depois que

Boaz se deitou, meio contente do vinho, ela foi de mansinho e deitou-se aos seus pés. Pela

meia-noite, ele acordou, porque os pés estavam descobertos, e a frescura da noite os esfriaria

ainda mais, e descobriu uma mulher deitada junto dele (v. 8). "Perguntou ele: Quem és tu?"

Ela respondeu: "Sou Rute, tua serva; estende a tua capa sobre a tua serva, porque tu és o

remidor." Literalmente: "Estende a tua asa". O Targum considera esta atitude como um

pedido de casamento (Ez. 16:8), pois era isso mesmo que Rute estava fazendo. Boaz não se

irritou: ao contrário, aceitou a situação tal qual era e disse: "Bendita sejas tu do Senhor, minha

filha. Melhor a tua última benevolência do que a primeira." Isto é, quando ela deixou sua terra

e sua família, acompanhando uma viúva para terra estranha, tinha feito uma benevolência

muito grande. Agora, porém, tinha feito outra maior: advertir o "resgatador" do seu dever.

Ela poderia ter ido após jovens ricos ou pobres, mas preferiu um homem de meia-idade para o

casamento. Ele deu umas palavras de encorajamento à moça (v. 11), prometendo que faria

como tinha dito. Pediu que ficasse por aquela noite (v. 13), e depois se decidiria. Havia um

"remidor" mais próximo do que ele e a este cabia, o direito de resgate. Se ele não quisesse,

então era a vez de Boaz.

"Ficou, pois, deitada a seus pés até pela manhã", sendo ainda escuro. Antes que se pudessem

ver um ao outro, ele levantou-se para que não se soubesse da vinda de uma mulher à eira.

Pediu o manto da moça e despejou nele seis medidas de cevada e mandou-a para casa de sua

sogra. Noemi viu que tudo estava sendo encaminhado como esperava. Deu um conselho a

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nora para que esperrasse até ver como ficavam as coisas, pois ele "não Descansará, enquanto

não tiver concluído hoje este negócio", disse ela. Boaz sabia que Rute era tida como mulher

virtuosa e não descansaria enquanto não resolvesse o assunto.

6) Um casamento feliz (4:1-6).

Não sabemos em que altura ficaria a eira, mas deveria ser numa planura, perto da cidade, um

pouco abaixo. Belém fica, como já vimos, na encosta dos montes de Judá, umas seis milhas de

Jerusalém. Vai-se atualmente por uma estreita estrada, onde mal trafegam dois carros juntos.

Logo pela manhã, Boaz subiu à porta da cidade (v. :L). Assentou-se ali porque o primeiro

remidor deveria passar por lá e então o negócio seria decidido. O resgatador de que Boaz

tinha falado ia passando: "Vem cá, e senta-te aqui." Não temos o nome deste personagem.

Talvez o cronista não o conhecesse. "Então Boaz tomou dez homens dentre os anciãos da

cidade e lhes disse: "Assentai-vos aqui. E eles se assentaram." A porta da cidade era o lugar

onde se discutiam os negócios públicos. Ali estavam os anciãos, que eram, ordinariamente, os

juizes. Boaz apresentou o negócio, dizendo que aquela parte da fazenda de Elimeleque, nosso

irmão, que tinha morrido, deveria ser resgatada. Admite-se que Elimeleque tivesse vendido a

sua terra antes de imigrar e agora a obtivesse de volta, em virtude da lei do Jubileu, quando

todas as propriedades vendidas voltavam ao seu primitivo dono (Deut. 15; Lev. 25). De

qualquer modo, a terra estava agora à venda (v. 3), e quem comprasse a terra, compraria ou

ficaria com a dona, segundo a lei de Moisés. "Compra-a, na presença dos que estão sentados

aqui, e na presença dos anciãos de meu povo..." (v. 4). Pensam alguns que Noemi, premida

pela necessidade, teria vendido a terra logo que voltou, e, neste caso, o remidor deveria

comprá-la da mão do dono. Outros, como já vimos, entendem que Elimeleque teria vendido

tudo e agora a terra tinha voltado ao poder de Noemi, que a vendeu. A linguagem de Boaz

indica que a terra estava para ser resgatada, e este resgate tanto pode incluir uma compra

real, como um meio de fazer a terra passar para a mão do resgatador. Caso esse parente

próximo não quisesse, então Boaz aceitaria o negócio. Quem comprasse a fazenda tinha de

casar com a viúva, pois ele diz: "No dia em que comprares o campo da mão de Noemi, também

tomarás a Rute" (v. 5). O direito era de Noemi, mas esta o transferiu a Rute, por ser mais

moça. Estava assim o negócio proposto diante dos juízes da cidade, e as dez testemunhas

seria a escritura pública. Tudo muito simples e muito bonito. Agora, nós vamos a um cartório

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com duas testemunhas, lavra-se o ato num grosso livro e depois, manda-se o traslado ao

cartório de Registro e só então o novo dono é dono mesmo. Palavra não vale. Boaz foi

incisivo: "No dia que comprares o campo da mão de Noemi, também tomarás a Rute, a

moabita, que foi mulher do falecido, para suscitar o nome dele na sua herança." Não era

apenas comprar a terra, era também receber a dona dela.

Então disse o resgatador: "Para mim não a poderei resgatar para que não prejudique a minha.

Redime-a tu." Julgam os autores do Targum que o outro resgatador seria casado, e, portanto,

não poderia casar com Rute. Isso, entretanto, não o exoneraria da obrigação. Estava livre

Boaz para levar adiante o seu plano, que não era tanto seu, mas da viúva.

7) Um bom costume (vv. 7-12).

"O costume outrora era assim", diz o texto, e por isso pensa-se que o livro foi escrito muito

tempo depois do ocorrido, o que deve ser o caso. Então o resgatador que desistisse do seu

direito tirava o sapato (a sandália) e o dava ao resgatador, como a dizer que agora o novo

dono podia pisar a terra, que o desistente deixou de receber por livre e expontânea vontade

(v. 8). Assim, perante as testemunhas, Boaz declara que não só resgatava a propriedade, mas

tomava Rute como sua esposa. Tudo que tinha pertencido a Elimeleque era agora seu.

"Ao que todo povo que estava na porta e os anciãos responderam: "Somos testemunhas." O

Senhor faça a esta mulher, que entra na tua casa, como a Raquel, como a Léia", e continuaram

a fazer e desejar os melhores efeitos daquele momento. Estava, pois, Rute casada com Boaz.

Feliz casamento, como havia sido desejado. O texto nada mais diz,

Então tomou a Rute como sua mulher perante a cidade de Belém, depois das mais

ricas evocações da antiga casa de Abraão e Jacó, de Perez, de Itamar e outros. Raquel estava

sepultada ali mesmo na sua capela, e era testemunha de que os seus descendentes ainda se

lembraram dela.

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8) Nasce o avô de Davi (4:13-33).

Nós, de uma cultura e de um ambiente diferentes, sentimos dificuldades em nos adaptar a

costumes como os que vigoravam em Israel naqueles primitivos tempos. Todavia,

confessamos que nos sentimos orgulhosos da maneira altamente moral e familiar como as

coisas eram feitas nos tempos dos juízes de Israel. O Livro de Rute é uma espécie de consolo

que nos veio da divina Providência, face aos descalabros dos juízes e de sua época. A

impressão que o leitor menos avisado tem é que tudo estava deteriorado, tudo eram brigas e

matanças, domínios estrangeiros e que mais de ruim se poderia dizer.

"Assim tomou Boaz a Rute e ela lhe foi por mulher e ela teve um filho." A cidade de Belém se

alvoroçou. O caso de Elimeleque e sua viúva deveria ter agitado o pequeno lugar. O desenlace

dos direitos de resgate, por parte de dois parentes próximos, muito teria comovido os mais

antigos, por verem vindicados os ensinos de Moisés, que, apesar de tantos sobressaltos,

continuavam a vigorar. Até nós, velho estudioso das leis de Moisés, nos sentimos orgulhosos

por tal desenlace. Nasceu o menino, e deram-lhe o nome de OBEDE (servindo).

A história de Rute, a estrangeira, está agora ligada a de Tamar, nora de Judá (Gên. 38), cujo

filho Pérez, filho de um conúbio incestuoso, foi constituído a raiz do tronco, de onde deveria

vir o Messias. Assim, Tamar, cananita, deu à luz Pérez, Pérez gerou Hezrom, este, a Rão, este a

Aminadabe, este a Nasom, este a Salmom, este a Boaz, este a Obede, este a Jessé e este a

Davi. Pela linha materna, temos Tamar, cananita, Raabe, a meretriz, salva por sua lealdade aos

filhos de Jacó, portanto, cananita também, e agora Rute a moabita. Todas na linhagem do

Messias. Portanto, três estrangeiras entraram na árvore genealógica de Jesus (Veja Mat. 1:1-

3). Tudo nos parece muito estranho, mas por que não avançar um pouco, para dizer que, se o

Messias era judeu, sua linhagem era estrangeira, pelo lado materno? Desse modo sua vida

estava ligada ao estranho, como uma profecia, e, por meio dele, judeus e gregos teriam igual

acesso ao céu. Não teria sido com outro fim, que o cronista nos deu a genealogia de Jesus,

partindo de Pérez até Davi.