estudo epidemiolgico da poxvirose bovina no estado … · 2006. 11. 27. · 2.1. família...

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1 1. INTRODUÇÃO As poxviroses são doenças causadas por vírus da família Poxviridae, que acometem o homem e os animais. Tipicamente ocorre nas poxviroses a presença de lesões difusas na pele e mucosas que progridem de máculas para pápulas, vesículas e pústulas antes de formar crostas e cicatrizar (ACHA e SZYFRES, 1986). Nos últimos cinco anos, inúmeros casos de doença pústulo-vesicular ocorreram em diversas fazendas nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais acometendo o gado bovino leiteiro e pessoas, principalmente retireiros e seus familiares, nos quais as características clínicas descritas favoreciam a possibilidade da doença ser causada por um vírus da família Poxviridae, posteriormente comprovada por diagnóstico laboratorial. Na ocasião, DAMASO et al. (2000) isolaram e caracterizaram molecularmente o vírus Cantagalo (CTGV) de espécimens clínicos de bovinos na cidade de Cantagalo no Estado do Rio de Janeiro, TRINDADE et al. (2003), isolaram o vírus Araçatuba na cidade de Araçatuba no Estado de São Paulo e LEITE (2003), o vírus Passatempo em Passatempo no Estado de Minas Gerais. A partir de 2002, têm sido observado surtos de doença pústulo-vesicular no gado leiteiro e pessoas de fazendas leiteiras no Sul do Estado do Espírito Santo, com características clínicas semelhantes aos casos descritos nos Estados do Rio de

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    1. INTRODUÇÃO

    As poxviroses são doenças causadas por vírus da família Poxviridae, que acometem o homem e os animais. Tipicamente ocorre nas poxviroses a presença de

    lesões difusas na pele e mucosas que progridem de máculas para pápulas,

    vesículas e pústulas antes de formar crostas e cicatrizar (ACHA e SZYFRES, 1986).

    Nos últimos cinco anos, inúmeros casos de doença pústulo-vesicular

    ocorreram em diversas fazendas nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas

    Gerais acometendo o gado bovino leiteiro e pessoas, principalmente retireiros e seus

    familiares, nos quais as características clínicas descritas favoreciam a possibilidade

    da doença ser causada por um vírus da família Poxviridae, posteriormente

    comprovada por diagnóstico laboratorial. Na ocasião, DAMASO et al. (2000)

    isolaram e caracterizaram molecularmente o vírus Cantagalo (CTGV) de espécimens

    clínicos de bovinos na cidade de Cantagalo no Estado do Rio de Janeiro,

    TRINDADE et al. (2003), isolaram o vírus Araçatuba na cidade de Araçatuba no

    Estado de São Paulo e LEITE (2003), o vírus Passatempo em Passatempo no

    Estado de Minas Gerais.

    A partir de 2002, têm sido observado surtos de doença pústulo-vesicular no

    gado leiteiro e pessoas de fazendas leiteiras no Sul do Estado do Espírito Santo,

    com características clínicas semelhantes aos casos descritos nos Estados do Rio de

  • 2

    Janeiro, São Paulo e Minas Gerais. Esses surtos vêm causando grandes prejuízos

    econômicos na agropecuária da região, onde em algumas propriedades 100% dos

    bovinos foram acometidos, bem como a importância na saúde pública, como uma

    zoonose, com ocorrência de casos humanos que necessitaram de hospitalização,

    justificando uma pesquisa de investigação mais detalhada do problema em pauta.

    Objetivou-se, neste trabalho, realizar um estudo epidemiológico dos surtos

    das poxviroses no gado leiteiro e casos humanos do Estado do Espírito Santo,

    identificando molecularmente o agente causador, bem como a adoção e divulgação

    das medidas de controle da doença junto aos órgãos responsáveis pela Sanidade

    Animal, Saúde Pública e aos proprietários de gado leiteiro.

  • 3

    2. REVISÃO DE LITERATURA

    2.1. Família Poxviridae

    Os vírus DNA classificados na família Poxviridae são os maiores e mais

    complexos vírus conhecidos, os quais se replicam no citoplasma de células de

    hospedeiros vertebrados e invertebrados. A família abrange um grande grupo de

    patógenos de importância médica e veterinária (MOSS, 1996).

    A doença pústulo-vesicular típica de poxvírus é conhecida como “varíola” e

    se caracteriza clinicamente pelo aparecimento de lesões difusas na pele e mucosas,

    que progridem de máculas para pápulas, vesículas e pústulas antes de formar

    crostas e cicatrizar. A maioria das lesões contém células com múltiplas inclusões

    intracitoplasmáticas denominadas “pocks” que representam o local de replicação

    viral nas células infectadas (TRIPARTHY et al., 1981, ACHA e SZYFRES, 1986).

    A historia dos poxvírus tem sido predominada pelo Variola virus (VARV), o

    agente etiológico da varíola humana, que acompanhou o homem por muitos séculos

    causando mortes e lesões graves e irreversíveis (GUIDO e ESPER, 2002).

    Atualmente, o VARV vem tendo importância mundial, pelo temor do seu uso, como

    arma biológica (SCHATZMAYR, 2001, SILVA, 2001).

  • 4

    Um outro exemplo de poxvírus muito estudado é o Vaccinia virus, que vem

    sendo objeto de estudo intensivo como vetor para introdução de genes imunizantes

    ativos, como vacinas de vírus vivo para uma variedade de doenças em humanos e

    animais domésticos (BROOKS et al., 2000).

    2.1.1. Classificação

    A família Poxviridae é subdividida em duas subfamílias, com base no

    espectro dos hospedeiros vertebrados ou insetos: Chordopoxvirinae (poxviroses de

    vertebrados) e Entomopoxvirinae (poxviroses de insetos) (Tabela 1).

    A subfamília Chordopoxvirinae é subdividida em oito (08) gêneros

    (Orthopoxvirus, Parapoxvirus, Avipoxvirus, Capripoxvirus, Leporipoxvirus,

    Suipoxvirus, Molluscipoxvirus e Yatapoxvirus), e os membros de cada gênero

    exibem uma morfologia e uma gama de hospedeiros semelhantes, bem como

    alguma relação antigênica. As principais espécies de cada gênero, hospedeiro e

    distribuição geográfica estão apresentadas nas Tabelas 2 a 6. Existem outros

    poxvírus que ainda não estão bem classificados, incluindo os novos vírus que são

    descobertos constantemente, como os isolados de lagartos, rãs, cervos, cangurus,

    entre outros. (MURPHY et al., 1999).

    Tabela 1. Estrutura Taxonômica da família Poxviridae.

    Família Poxviridae Subfamília Chordopoxvirinae

    Gênero Orthopoxvirus Gênero Parapoxvirus Gênero Avipoxvirus Gênero Capripoxvirus Gênero Leporipoxvirus Gênero Suipoxvirus Gênero Molluscipoxvirus Gênero Yatapoxvirus

    Subfamília Entomopoxvirinae

    Gênero Entomopoxvirus A Gênero Entomopoxvirus B Gênero Entomopoxvirus C

    (ESPOSITO et al., 2005)

  • 5

    Tabela 2. Gênero Orthopoxvirus: Vírus, abreviações, hospedeiros e distribuição geográfica.

    Vírus Abreviação Principais Hospedeiros

    Distribuição Geográfica

    Camelpox virus

    CMLV

    Camelo

    Ásia e África

    Cowpox virus CPXV Bovino, humano, felino e roedor

    Europa e Ásia

    Ectromelia virus ECTV Camundongo Europa

    Monkeypox virus MPXV Macaco, Roedor e Humano

    África

    Raccoonpox virus RCNV Guaxinim América do Norte

    Taterapox virus GBLV Gerbilo África

    Vaccinia virus VACV Humano, Bovino, Búfalo, suíno e Coelho

    Mundial

    Buffalopox virus BPXV Búfalo, Bovino e Humano Índia

    Rabbitpox virus RPXV Coelho EUA e Holanda

    Variola virus VARV Humano Erradicado

    Volepox virus VPXV Camundongo da Califórnia Califórnia

    Uasin Gishu virus UGV Cavalo África

    (Adaptado de ESPOSITO et al., 2005)

    Tabela 3. Gênero Parapoxvirus: Vírus, abreviações, hospedeiros e distribuição geográfica.

    Vírus Abreviação Principais Hospedeiros

    Distribuição Geográfica

    Orf virus ORFV Ovino, Caprino, Humano Mundial

    Pseudocowpox virus ou

    Paravaccinia vírus

    PCPV

    Bovino e Humano

    Mundial

    Bovine papular stomatitis virus

    BPSV Bovino e Humano Mundial

    Parapoxvirus of red deer in New Zealand

    PVNZ Cervo vermelho Nova Zelândia

    Auzduk disease virus - Camelo África e Ásia

    Sealpox virus - Foca e Humano Mundial

    (Adaptado de ESPOSITO et al., 2005).

  • 6

    Tabela 4. Gênero Avipoxvirus: vírus, abreviações, hospedeiros e distribuição geográfica.

    Vírus Abreviação Principais Hospedeiros

    Distribuição Geográfica

    Canarypox virus CNPV Canário, aves Mundial

    Fowlpox virus FWPV Aves Mundial

    Juncopox virus JNPV Aves Mundial

    Mynahpox virus MYPV Aves Mundial

    Pigeonpox virus PGPV Pombo, aves Mundial

    Psittacinepox virus PSPV Psitacídeos, aves Mundial

    Quailpox virus QUPV Codornizes, aves Mundial

    Sparrowpox virus SRPV Pardal, aves Mundial

    Starlingpox virus SLPV Aves Mundial

    Turkeypox virus TKPV Peru, aves Mundial

    (Adaptado de ESPOSITO et al., 2005)

    Tabela 5. Gênero Capripoxvirus: Vírus, Abreviações, hospedeiros e distribuição geográfica.

    Vírus Abreviação Principais Hospedeiros

    Distribuição Geográfica

    Goatpox virus GTPV Cabra Ásia e África

    Sheeppox virus SPPV Carneiro Ásia e África

    Lumpy skin disease virus LSDV Bovino África

    (Adaptado de ESPOSITO et al., 2005)

  • 7

    Tabela 6. Gêneros Leporipoxvirus, Suipoxvirus, Molluscipoxvirus, Yatapoxvirus: Vírus, abreviações, hospedeiros e distribuição geográfica.

    Gênero Vírus Abreviação Principais Hospedeiros

    Distribuição Geográfica

    Leporipoxvirus

    Hare fibroma virus

    FIBV

    Lebre (Lepus

    capensis)

    Europa

    Myxoma virus MYXV

    Lebre e coelho

    América do Sul e EUA

    Fibroma virus -

    Lebre e coelho

    EUA

    Squirrel fibroma

    virus SFV

    Esquilo (Sciurus sp)

    EUA

    Suipoxvirus

    Swinepox virus

    SWPV

    Suíno

    Mundial

    Molluscipoxvirus

    Molluscum

    contagiosum virus MOCV

    Humano

    Mundial

    Yatapoxvirus Tanapox virus TANV

    Roedor e Humano

    África

    Yaba monkey tumor virus YMTV

    Macaco e Humano

    África

    (Adaptado de ESPOSITO et al., 2005)

    Os gêneros Orthopoxvirus e Parapoxvirus destacam-se como os principais

    causadores de poxviroses em humanos e animais domésticos, como demonstrado

    nas Tabelas 2 e 3.

    2.1.2. Estrutura e composição dos poxvírus

    Os vírions dos poxvírus são os maiores, de importância médica e veterinária, descritos pela microscopia. As aparências das partículas virais variam de acordo

    com o método de preparação, mas a maioria dos poxvírus, quando observados por

    microscopia eletrônica, se apresentam como partículas em forma retangular

    medindo aproximadamente 250 X 200 X 200 nm. Em contraste, os vírus do gênero

    Parapoxvirus, Entomopoxvirus A e Entomopoxvirus B são ovóides e medem

    aproximadamente 260 X 160 nm (Tabela 7 e Figura 1). (MOSS, 2001)

  • 8

    Tabela 7. Família Poxviridae: Morfologia e tamanho do genoma.

    Subfamília Gênero Morfologia Tamanho aproximando

    Genoma Chordopoxvirinae

    Orthopoxvirus Retangular 200 Kbp

    Parapoxvirus

    Ovóide

    140 Kbp

    Avipoxvirus

    Retangular

    260 Kbp

    Capripoxvirus

    Retangular

    150 Kbp

    Leporipoxvirus

    Retangular

    160 Kbp

    Suipoxvirus

    Retangular

    170 Kbp

    Molluscipoxvirus

    Retangular

    180 Kbp

    Yatapoxvirus

    Retangular

    145 Kbp

    Entomopoxvirinae

    Entomopoxvirus A

    Ovóide

    260 -370 Kbp

    Entomopoxvirus B

    Ovóide

    236 Kbp

    Entomopoxvirus C

    Retangular

    250 -380 Kbp (Adaptado de MOSS, 2001)

    Figura 1. Micrografia eletrônica do Orthopoxvirus e Parapoxvirus

    A B

    A – Orthopoxvirus

    B – Parapoxvirus

    (SCHATZMAYR et al., 2000)

  • 9

    A estrutura dos poxvírus é complexa e carece de simetria icosaédrica ou

    helicoidal exibida por outros vírus, sendo envelopado por uma dupla membrana

    lipoprotéica. A maioria dos poxvírus é formada por uma camada externa de

    estruturas protéicas tubulares, arranjadas irregularmente, conferido uma aparência

    característica. Em contraste, os membros do gênero Parapoxvirus são cobertos por

    longos e finos túbulos protéicos que, por causa da superposição desses túbulos,

    parecem ser arranjados na forma cruzada, assemelhando-se a uma esfera de fios. A

    parte interior inclui um cerne bicôncavo e dois corpúsculos laterais de natureza

    desconhecida. O cerne contém o DNA viral e diversas proteínas virais (Figura 2).

    (MURPHY et al., 1999).

    Figura 2. Diagrama da estrutura do vírion dos gêneros Orthopoxvirus e Parapoxvirus.

    Membrana do cerne

    )

    Membrana Externa

    Envelope

    Corpúsculo Lateral

    Superfície Tubular

    Membr

    Membrana Externa Envelope

    Corpúsculo Lateral

    Superfície Tubular

    A – Gênero: Orthopoxvirus

    (adaptado de FENNER, 1996)

    A composição química d

    principais componentes dos vírio

    lipídeos e DNA, correspondendo

    dos vírions. Algumas das proteí

    constituem em colesterol e fosfoli

    O cerne contém um gran

    com tamanho variando de 130–

    capacidade de codificar aproxi

    enzimas envolvidas no process

    Cerne (DNA e

    proteínas virais)

    ana do cerne

    B – Gênero: Parapox

    os poxvírus assemelha-se a de uma

    ns do Vaccinia virus, por exemplo, sã

    90%, 5%, 3,2%, respectivamente da

    nas são glicosiladas ou fosforiladas,

    pídios. (MOSS, 1996).

    de genoma viral de DNA de filamento

    380kbp, rico em bases de adenina e

    madamente duzentas (200) proteína

    o de síntese do ácido nucléico e c

    Cerne (DNA e

    proteínas virais

    virus

    bactéria. Os

    o proteínas,

    composição

    e os lipídios

    linear duplo

    timina, com

    s, incluindo

    omponentes

  • 10

    estruturais dos vírus. A seqüência completa do genoma é conhecida em vários

    poxvírus como o VARV e o VACV (BROOKS et al., 2000).

    2.1.3. Replicação dos poxvírus

    Os poxvírus são peculiares entre os vírus DNA, visto que todo ciclo de replicação ocorre no citoplasma das células infectadas. As células infectadas

    apresentam muitas inclusões intracitoplasmática denominadas “pocks”, que

    representam o local de replicação viral (TRIPARTHY et al., 1981).

    O ciclo de replicação dos poxvírus está esquematizado na Figura 3 e

    descrito abaixo nas alíneas a, b e c, sendo representado pelo Vaccinia virus, que é o

    protótipo dos poxvírus em termos de estrutura e replicação.

    Figura 3. Ciclo de replicação do Vaccinia virus.

    Cerne

    Envoltório mRNA intermediário

    Desnudamento Penetração Replicação Adsorção

    Fatores de transcrição

    tardios

    DNA-polimerase mRNA tardio

    RNA-polimerase

    Enzima de formação do capsídeo Poli(A)-polimerase

    Fatores de transcrição intermediários mRNA inicial

    Fator de transcrição

    RNA-polimerase

    Fatores nucleares ?

    Envoltório de Golgi Maturação

    (EEV) (IMV) (IEV) Liberação

    (adaptado de MOSS, 1996)

    Enzimas tardias Fatores de transcrição

    iniciais Proteínas estruturais

    Organi- zação

  • 11

    a) Etapas 1, 2, 3 e 4 - Fixação, penetração e desnudamento do vírus:

    A partícula viral estabelece contato com a superfície celular e, a seguir,

    funde-se com a membrana celular, liberando o cerne no citoplasma. No interior dos

    poxvírus encontramos a RNA-polimerase viral que transcreve metade do genoma

    viral em mRNA precoce. Esses mRNAs após serem transcritos no interior do cerne

    do vírus são liberados no citoplasma da célula. A proteína de “desnudamento”

    produzida após a infecção viral libera o DNA viral dos cernes, finalizando a primeira

    parte do ciclo de replicação.

    b) Etapas 5, 6 e 7 – Replicação do DNA viral e síntese de proteínas virais:

    Entre as proteínas iniciais produzidas após a infecção pelo vírus, destacam-

    se a DNA-polimerase e a Timidina-quinase que são enzimas envolvidas na

    replicação viral. A replicação inicia-se logo após o processo de desnudamento,

    ocorrendo em regiões distintas do citoplasma, que aparecem como “fábricas” ou

    corpúsculos de inclusão em micrografias eletrônicas. Ocorre a transcrição de

    mRNAs intermediários, que cuja expressão precede temporariamente a dos

    mRNAs tardios. O mRNA viral tardio é traduzido em grandes quantidades de

    proteínas estruturais e em pequenas quantidades de outras proteínas e enzimas

    virais (BROOKS et al., 2000).

    c) Etapas 8, 9, 10, 11 e 12 - Maturação e liberação:

    As proteínas estruturais organizam-se para acondicionar o DNA, formando

    as partículas virais, chamadas de vírions maduros intracelulares infectivos (IMV),

    que são transportados pelos microtúbulos até o Complexo de Golgi, onde podem

    adquirir as membranas do Complexo, formando os vírus envelopados intracelulares

    (IEV); chegando à periferia da célula, fundem-se com a membrana citoplasmática

    da célula, resultando na liberação dos vírus envelopados extracelulares (EEV)

    (MOSS, 1996).

  • 12

    2.1.4. Mecanismos de evasão dos poxvírus

    Os poxvírus são especialmente adaptados para interferir na resposta imune

    do hospedeiro. Em primeiro, por possuírem um genoma com capacidade de codificar

    150 – 200 proteínas, facilitando a codificação de proteínas que interfere na resposta

    imune do hospedeiro. E em segundo, por não dependerem dos mecanismos de

    transcrição da célula, pois codificam as enzimas e fatores necessários para a sua

    transcrição viral. Essas propriedades contribuem para a habilidade dos poxvírus de

    interferir na expressão dos genes do hospedeiro sem afetar a expressão dos genes

    virais (MOSS e SHISLER, 2001).

    Recentemente, descobriu-se que vários genes dos poxvírus assemelham-se

    a genes de mamíferos, que codificam proteínas semelhantes e/ou homólogas ao do

    hospedeiro, tornando-se passíveis de inibir os mecanismos de defesa do

    hospedeiro. Os exemplos incluem os homólogos com o receptor do fator de necrose

    tumoral, o receptor do interferon gama e o receptor de interleucina-1, que funcionam

    interrompendo as redes de complemento e outras citocinas importantes para

    resposta imune do hospedeiro (BOWIE et al., 2000).

    OIE e PICKUP (2001), descobriram que os poxvírus possuem a capacidade

    de interferir na regulação da ativação do NF-kB (Fator Nuclear kB) do hospedeiro,

    interferindo indiretamente na resposta imune inata e adquirida, pois o NF-kB abrange

    uma série de fatores de transcrição que regulam a expressão de numerosos genes

    que codificam proteínas que são elementos essenciais para resposta imune inata e

    adquirida do hospedeiro.

    2.2. Poxviroses Bovina As lesões associadas as poxviroses ocorrem principalmente nas tetas e

    úbere de bovinos, apresentando-se principalmente nas formas proliferativas,

    ulcerativas e crostosas, abrindo porta para infecções secundárias. Essas lesões são

    dolorosas e geralmente não são diferenciadas de outras lesões nas tetas do bovino

    (TIMMS et al., 1998).

    O conhecimento sobre a epidemiologia e a história natural dos poxvírus e as

    suas conseqüências clínicas em bovinos tem evoluído nos últimos anos, mas

    continua sendo objeto de especulações. Roedores, felinos e bovinos são os

  • 13

    prováveis reservatórios desses agentes, servindo de fonte de infecção para outros

    animais e para o homem (WELBLEN, 2002).

    A transmissão geralmente ocorre pelas mãos dos ordenhadores ou pelo

    equipamento de ordenha, bem como pela inalação de partículas contaminadas. A

    penetração do vírus ocorre em lesões pré-existentes na pele, principalmente nas

    tetas e úbere (BLOOD e RADOSTITS, 1991).

    Os poxvírus geralmente são resistentes as condições ambientais, ao calor,

    dessecação, desinfetantes e são capazes de manter sua infectividade em restos

    celulares por muitos anos (MURPHY et al., 1999).

    As perdas econômicas resultam da inconveniência na hora da ordenha, por

    causa da sensibilidade das tetas, infecções secundárias como mastite, gastos com

    medicamentos e assistência veterinária (LIEBERMANN, 1999).

    No Brasil, poxviroses em bovinos foram descritas no Rio de Janeiro (SILVA

    e MORAES, 1960) e Minas Gerais (REIS et al.; 1970) e vários outros casos foram

    descritos ao longo dos anos (WELBLEN, 2002). Os mais recentes foram o que

    ocorreram no Estado do Rio de Janeiro acometendo o gado leiteiro e os

    ordenhadores (DAMASO et al., 2000, SCHATZMAYR et al., 2000, FERNANDES,

    2003), Mato Grosso do Sul (FAGLIARI et al., 1999), São Paulo (TRINDADE et al.,

    2003) e Minas Gerais (LOBATO et al, 2004). 2.2.1. Varíola Bovina A varíola bovina ou varíola dos bovinos é uma doença de pele contagiosa e

    benigna de bovinos causada pelo Cowpox virus (CPXV), caracterizada pelo

    aparecimento de lesões pustulosas tipicamente nas tetas e úbere, raramente

    generalizada (MURPHY et al., 1999).

    A síndrome clínica ocorria de forma benigna e esporádica, restrita aos países

    da Europa e Ásia, mas a incidência parece ter diminuído, a ponto de ser rara nessas

    regiões. Em um rebanho atingido, a morbidade varia de acordo com as condições de

    higiene, cuidados com saúde e imunidade dos animais, causando perdas

    econômicas pela dificuldade no momento da ordenha, gasto com assistência

    veterinária, casos de mastite e assistência médica com os ordenhadores que

    geralmente são acometidos (WELBLEN, 2002).

  • 14

    A transmissão ocorre principalmente através das mãos dos ordenhadores e

    das ventosas das ordenhadeiras, sendo a transmissão por artrópodes uma opção

    ainda não confirmada. É uma zoonose quase que restrita aos ordenhadores, que

    são acometidos durante a ordenha e na manipulação com os animais doentes. A

    disseminação de um rebanho para outro ocorre provavelmente pela introdução de

    novos animais ou pelas mãos dos ordenhadores, onde os animais acometidos

    geram uma imunidade protetora, que pode permanecer por vários anos (MURPHY et

    al., 1999).

    A porta de entrada dos vírus são as soluções de continuidade nas tetas e

    úbere, onde após um período de incubação de 03 a 06 dias, há formação de um

    eritema roseolar, seguido de pápulas firmes e em relevo de cor clara, com uma zona

    de hiperemia em torno da base. Posteriormente ocorre a formação da vesícula e

    pústula amarelada com uma dura crosta, vermelha e aderida, medindo 1 a 2 cm,

    antes da cicatrização (BLOOD e RADOSTITS, 1991).

    Na fase inicial do desenvolvimento da doença pode ser observado febre

    prodrômica irregular e uma dor à pressão da teta e úbere, não permanecendo

    durante a cicatrização da lesão (LIEBERMANN, 1999).

    As lesões são principalmente observadas no período de vesícula, mas que

    logo se rompem pela ação mecânica da ordenha, formando uma úlcera que progride

    para o estágio de crosta, que geralmente são poucas por tetas, que podem não

    permanecer em vacas que estão sendo ordenhadas, sendo substituídas por uma

    ulceração profunda (MURPHY et al., 1999).

    As lesões normalmente estão localizadas nas tetas e úbere, podendo em

    casos mais graves, acometer partes interna da coxa e raramente o períneo, vulva e

    boca, abrindo porta para uma infecção secundária. O desenvolvimento da dor

    interfere na liberação do leite, dificultando a ordenha e facilitando o aparecimento de

    mastite (BLOOD e RADOSTITS, 1991).

    O prognóstico é bom, mas em geral as lesões permanecem de 3 a 10

    semanas, de acordo com as medidas de controle das infecções secundárias

    (LIEBERMANN, 1999). No diagnóstico diferencial da varíola bovina deve-se levar em consideração

    as seguintes patologias: Pseudovaríola; Mamilite ulcerativa bovina; Impetigo do

    úbere; Fibropapiloma da teta; lesões pelo Vaccinia virus; Febre aftosa; Lesões

    traumáticas; Lesões químicas. (LIEBERMANN, 1999).

  • 15

    O CPXV pode causar infecções em bovinos, humanos, animais de

    zoológicos e animais domésticos, com distribuição dos casos nas regiões da Europa

    e Ásia (FENNER, 1996). No Brasil, ainda não temos relato de isolamento do CPXV

    de bovinos e humanos (TRINDADE et al., 2003).

    2.2.2. Pseudovaríola A pseudovaríola bovina em bovinos, varíola mamária bovina ou “nódulos dos ordenhadores” em humanos é causada pelo Pseucowpox virus ou Paravaccinia virus

    (Vírus da Pseudovaríola-PCPV), do gênero Parapoxvirus, apresentando

    características morfológicas diferentes do gênero Orthopoxvirus (ESPOSITO et al,

    2005).

    A forma de transmissão e disseminação são as mesmas apresentadas na

    Varíola bovina, diferindo no contexto de distribuição, na qual a Pseudovaríola tem

    distribuição mundial. A morbidade varia de 60 a 100% no gado bovino leiteiro,

    acometendo principalmente vacas recém paridas ou introduzidas no rebanho.

    O PCPV ocorre como infecções endêmicas em bovinos em muitos paises do

    mundo (MURPHY et al., 1999).

    O período médio de incubação é de seis dias, tendo como principal porta de

    entrada as soluções de continuidade na pele da teta e úbere. Inicialmente aparece

    um ligeiro edema ou eritema, ao qual segue a formação de uma película de

    exsudato brilhante que em 48 horas há formação de uma pápula. As pápulas

    formam finas escaras que cicatrizam, sem haver a formação de vesículas

    amareladas, como na varíola bovina. Os sintomas clínicos são variáveis,

    caracterizado por lesões crônicas ou agudas, podendo existir até 10 (dez) lesões por

    teta. (LIEBERMANN, 1999).

    As lesões agudas iniciam-se como eritema no local de replicação do vírus,

    progredindo para vesícula ou pústula que se rompem em 48h, formando finas

    escaras, que cicatrizam dando origem as crostas, que medem 0,5 a 2,5 cm de

    diâmetro. Após 10 dias elas se soltam deixando uma lesão anelada em forma de

    ferradura. A doença desaparece em média de 20 dias após os primeiros sintomas.

    As lesões crônicas também se iniciam como eritema, mas logo progridem para

    crostas cinza-amareladas, moles e escamosas, que são desgastadas pela ordenha,

    que podem persistir por meses. (BLOOD e RADOSTITS, 1991).

  • 16

    No diagnóstico diferencial da Pseudovaríola bovina devem ser consideradas

    as seguintes patologias: Varíola Bovina; Mamilite ulcerativa bovina; Impetigo do

    úbere; Fibropapiloma da teta; lesões pelo Vaccinia virus; Febre aftosa; Lesões

    traumáticas; Lesões químicas. (MURPHY et al., 1999).

    2.2.3. Doença causada pelo Vaccinia virus

    O Vaccinia virus (Vírus vaccínia-VACV) faz parte do gênero Orthopoxvirus, que

    se originou provavelmente em isolado do vírus da varíola bovina. Sendo utilizado

    inicialmente para produzir vacinas contra a varíola humana (GUIDO e ESPER,

    2002).

    Nas décadas de 60 e 70, época de intensa vacinação com VACV, eram

    comuns os relatos de surtos do VACV em animais domésticos, como bovinos,

    porcos e búfalos que eram contaminados pelas pessoas recém vacinadas que, por

    sua vez, transmitiam o vírus às pessoas em contato com as lesões (LUM et al.,1967,

    TOPCIU et al.,1976). Com a interrupção da vacinação, os surtos desapareceram,

    confirmando a suposição consenso na literatura de que o VACV não teria um

    reservatório animal, não permanecendo dessa forma na natureza (FENNER et al.,

    1989). A exceção ocorreu na Índia, com aparecimento de surtos de Buffalopox virus

    (BPXV), agente causal de uma zoonose de grande importância econômica,

    detectada até os dias de hoje (KOLHAPURE et al., 1997).

    Os primeiros relatos foram descritos nas décadas de vacinação antivariólica

    no Egito e na Índia, onde criações de búfalos eram afetadas. As lesões nas tetas e

    úberes dos búfalos eram transmitidas para vacas e para mãos e braços de

    ordenhadores, de forma semelhante às lesões por CPXV e VACV. Nos anos 80

    comprovou-se que o BPXV é uma cepa do VACV, derivada provavelmente de cepas

    vacinais utilizadas na profilaxia da varíola naqueles países e que, de alguma forma,

    o vírus se estabeleceu na natureza encontrando algum reservatório animal

    (DUMBELL e RICHARDSON, 1993).

    O BPXV era considerado apenas uma exceção à regra. Contudo, a

    caracterização do vírus Cantagalo (DAMASO et al., 2000) e do vírus Araçatuba

    (TRINDADE et al.,2003) no Brasil, como causadores de infecções em bovinos e

  • 17

    ordenhadores, reforçaram a idéia de que o VACV pode realmente se estabelecer na

    natureza.

    Através de métodos moleculares, foi traçada a origem do vírus Cantagalo,

    como uma cepa vacinal (VACV-IOC), produzida no Instituto Oswaldo Cruz-RJ e

    utilizada na campanha da Organização Mundial de Saúde (OMS) para a erradicação

    da varíola no Brasil nos anos 60 e 70 (DAMASO et al., 2000); e o vírus Araçatuba

    como uma nova cepa do VACV ou um desdobramento do vírus Cantagalo

    (TRINDADE et al.,2003) 2.2.4. Estomatite Papular dos Bovinos A estomatite papular dos bovinos ou estomatite papulosa dos bovinos é uma

    doença viral infecciosa benigna, com distribuição mundial, caracterizada por lesões

    ulcerativas ou erosivas da mucosa oral de bovinos. É causada pelo Bovine papular

    stomatitis virus (Vírus da estomatite papular dos bovinos - BPSV), pertencente ao

    gênero Parapoxvirus. A sua importância baseia-se no seu diagnóstico diferencial e

    como abertura de porta para infecções secundárias. (MOSS, 1996).

    O Bovine papular stomatitis virus tem distribuição mundial, acometendo bovinos, mas também podem acometer o homem. A transmissão ocorre através de

    contato direto ou através de alimentos contaminados, ocorrendo principalmente na

    primavera e no verão, após ação de fatores estressantes para os animais (MURPHY

    et al., 1999). A morbidade pode alcançar 100%, principalmente na faixa etária de duas

    semanas a dois anos de idade, induzindo uma imunidade baixa e pouco duradoura,

    podendo ocorrer recidivas da infecção (BLOOD e RADOSTITS, 1991)

    As lesões iniciam-se como pequenas pápulas no local de penetração do vírus,

    adquirem coloração vermelho escuro, expandindo-se para periferia, e com aspecto

    arredondado. À medida que a lesão se expande, o centro fica cinza-acastanhado,

    coberto por um tecido necrótico, que se apresentam em crostas quando as lesões

    são externas (LIEBERMANN, 1999).

    As lesões estão confinadas ao focinho, narinas, mucosa da boca e

    ocasionalmente na mucosa do esôfago. Na boca as lesões acometem toda

    superfície interna, sendo mais comum nos lábios e próximo aos dentes. As lesões

    individuais cicatrizam de 04 (quatro) a 07 (sete) dias, podendo permanecer por

  • 18

    várias semanas, além de favorecer a entrada para infecções secundárias. O animal

    pode apresentar febre baixa (39,5 °C), anorexia transitória, ptialismo e perda de

    peso (BLOOD e RADOSTITS, 1991).

    2.2.5. Dermatose Nodular dos Bovinos A Dermatose Nodular dos Bovinos, Doença da Pele Granulosa ou “Lumpy Skin Disease” é uma doença de evolução aguda, subaguda ou inaparente que afeta

    os bovinos; caracterizada por febre e aparecimento de nódulos cutâneos

    circunscritos que podem necrosar. A musculatura esquelética e mucosa do aparelho

    digestivo e respiratório também podem ser acometidas (LIEBERMANN, 1999).

    O agente etiológico da dermatose nodular dos bovinos é o Lumpy skin

    disease virus (Vírus da dermatose nodular dos bovinos), pertencente ao gênero

    Capripoxvirus, com características morfológicas semelhantes ao Vaccinia virus

    (MURPHY et al.,1999).

    O hospedeiro natural da Lumpy skin disease virus é o bovino e os hospedeiros experimentais são os ovinos, caprinos, girafas e antílopes. A

    distribuição geográfica da doença esta restrita na África, Egito e Israel, com

    morbidade variando entre 5 a 85% e mortalidade entre 1 a 10% (MURPHY et

    al.,1999).

    A transmissão ainda é desconhecida, sendo os artrópodes os principais

    suspeitos. O vírus tem sido encontrado na pele, lesões cutâneas, crostas, saliva,

    secreção nasal, leite, sêmen, músculo e linfonodos de animais acometidos. O

    período de incubação médio é de 12 dias, febre (40 - 41 °C) com duração de 4 a 14

    dias, e surgimento de tumorações ou nódulos na pele medindo entre 1 a 5 cm,

    generalizado em todo o corpo. (LIEBERMANN, 1999).

    O animal apresenta abatimento, anorex salivação excessiva, secreção

    oculonasal e agalaxia; nódulos na pele, no te

    aumento significativo dos linfonodos, podendo

    tamanho normal. Podem-se observar complicaçõ

    aborto, infecção intra-uterina. As lesões podem

    1999).

    14ia,

    13

    cido subcutâneo e musculatura; o

    atingir em até quatro vezes o

    es como mastite, tendinite, artrite,

    durar semanas. (LIEBERMANN,

  • 19

    2.3. Diagnóstico O diagnóstico das poxviroses é realizado clínico e laboratorialmente. O diagnóstico clínico geralmente não é suficiente, tornando-se necessário estabelecer

    um diagnóstico laboratorial específico (IKETANI et al., 2002).

    Os testes para o diagnóstico específico das poxviroses são geralmente de

    três princípios:

    1) Através da demonstração da partícula viral, antígeno viral ou ácido nucléico;

    2) Através da demonstração do anticorpo viral;

    3) Visualização das inclusões intracitoplasmaticas.(MURPHY et al.,1999).

    2.3.1. Isolamento Viral As lesões cutâneas e o líquido vesicular constituem as amostras de escolha para o isolamento do vírus. Os poxvírus são estáveis e permanecem viáveis em

    amostras clínicas durante várias semanas, mesmo sem qualquer refrigeração

    (BROOKS et al., 2000).

    O isolamento do vírus é efetuado por inoculação do líquido vesicular ou

    macerado de crostas na membrana corioalantóide de ovo embrionário (MCA) ou em

    cultura de células de origem humana e de primatas, que são as mais susceptíveis

    (WELBLEN, 2002). Fibroblastos de embrião de galinha (CEF), células epitelióides do

    carcinoma laríngeo humano (HEp-2), células fibroblastóides de rim de hamster baby

    (BHK-21), Células do glioma de rato (C6), células epitelióides do túbulo distal de rim

    canino (MDCK), células fibroblastóides de rim de macaco verde africano (Vero),

    células epitelióides de rim de macaco verde africano (BSC-40) e fibroblastos de

    embrião de camundongos normais NIH/3T3 são as principais linhagens de células

    utilizadas no isolamento dos poxvírus (DAMASO et al., 2000).

    2.3.2. Microscopia Eletrônica A microscopia eletrônica é um instrumento utilizado na diferenciação dos agentes, levando-se em conta o tamanho e a morfologia viral, a qual pode ser

    realizada de material clínico direto ou de cultura celular (BROOKS et al., 2000).

  • 20

    Os Orthopoxvivus possuem a forma retangular, medem 220-450nm de

    comprimento por 140-260nm de largura, mas não podem ser distinguidos uns dos

    outros à microscopia eletrônica, devido a seu tamanho e morfologia semelhantes.

    Entretanto, podem ser facilmente diferenciados dos Parapoxvirus que são ovóides e

    medem 250-300nm de comprimento por 150-190nm de largura (SCHATZMAYR et

    al., 2000).

    2.3.3. Sorologia O diagnóstico sorológico baseia-se na detecção de anticorpos através de técnicas laboratoriais como: Ensaio imunoenzimático (ELISA), Inibição da

    Hemaglutinação (HI), Imunofluorescência (IF) e Soroneutralização Viral (SN),

    distinguindo entre os gêneros, mas nenhum desses testes distingue os vírus do

    gênero Orthopoxvirus uns dos outros (FENNER, 1996, KURODA, et al., 1999).

    2.3.4. Diagnóstico histopatológico

    É realizada uma incisão tomando como amostra a escara e o tecido

    subjacente, enviando ao laboratório em solução de formalina a 10%, onde após

    preparo das amostras serão observadas as inclusões intracitoplasmaticas, que são

    patognomônicas (MURPHY et al.,1999).

    2.3.5. Técnicas Moleculares As técnicas de biologia molecular de diagnóstico são utilizadas para caracterizar molecularmente o agente etiológico. A reação em cadeia da polimerase

    (PCR), constitui uma das principais técnicas de diagnóstico molecular na

    determinação dos agentes etiológicos das poxviroses (ROPP et al.,1995, MEYER et

    al.,1997).

    A técnica de PCR, desenvolvida nos anos 80 por Kary Mullis, consiste na

    amplificação específica de um curto segmento definido de ácido desoxirribonucléico

    (DNA) in vitro usando uma DNA polimerase, um molde de DNA genômico, desoxi-

    nuclotídeos-trifosfatos (dNTP`s – adenina, guanina, citosina e timina) e iniciadores

  • 21

    (primers) ou oligonucleotídeos flanqueando o segmento a ser amplificado (MEYER

    et al.,1994).

    A técnica de PCR possibilita a reprodução de milhares de cópias de um

    determinado fragmento de DNA molde, a partir de amostras de diferentes materiais

    como líquido vesicular, crostas, escaras das lesões e do isolado da cultura celular

    (ROPP et al.,1995).

    2.3.6. Caracterização Molecular de Orthopoxvirus A caracterização molecular de um Orthopoxvirus pode ocorrer a partir de

    genes ou regiões subgenômicas conservadas do DNA viral, como os genes Timidina

    Quinase (TK), Corpúsculo de Inclusão do Tipo Acidofílico (ATI), Hemaglutinina (HA)

    (DA FONSECA, et al., 2002)

    O gene da hemaglutinina (HA) é um gene não estrutural que codifica uma

    glicoproteína do envelope viral na fase final da infecção por Orthopoxvirus.

    (DAMASO et al., 2000).

    A proteína do corpúsculo de inclusão citoplasmática do tipo acidofilíca é

    codificada pelo gene ATI, molecularmente caracterizada em várias espécies de

    Orthopoxvirus, porem alguns Orthopoxvirus podem não possuir esse gene

    (ULAETO, et al., 1996).

    O gene TK é um gene altamente conservado no genoma dos Orthopoxvirus,

    sendo responsável em codificar a timidina-quinase, uma enzima participante do

    metabolismo de ácidos nucléicos. Esse gene tem sido utilizado amplamente para

    caracterização molecular de Orthopoxvirus (TRINDADE, et al 2003).

    2.4. Prevenção e Controle O tratamento das poxviroses bovina é sintomático, com uso de

    antibioticoterapia tópica ou sistêmica, e uso de soluções iodofórmicas para

    prevenção das infecções secundárias e agravamento das lesões (BLOOD e

    RADOSTITS, 1991).

    A prevenção e o controle consistem basicamente nas medidas de higiene na

    ordenha. Pois, não se dispõe de vacinas eficientes contra as poxviroses em bovinos

    e pouco se sabe sobre o papel do colostro ou imunidade passiva neste grupo de

  • 22

    enfermidades (ACHA e SZYFRES, 1986). A imunidade adquirida por uma infecção

    prévia com o Vaccinia virus ou Cowpox virus não protege os animais do

    Pseudocowpox virus (WELBLEN, 2002).

    A prevenção da disseminação é difícil, pois o vírus é transmitido por contato

    direto e indireto, entretanto para minimizar a disseminação deve-se:

    1. Realizar a desinfecção correta das ordenhadeiras e antissepsia das mãos dos

    ordenhadores;

    2. Evitar o trabalho de ordenhadores de outras propriedades;

    3. Lavar as tetas com água e sabão, bem como a imersão em solução de tintura

    alcoólica de um desinfetante, antes da ordenha;

    4. Ordenhar por último os animais com lesões, gerando uma linha de ordenha;

    5. Examinar os tetos e o úbere antes da aquisição de animais de reposição;

    6. Manter as tetas e úberes sadios;

    7. Higienizar todas as instalações;

    8. Não realizar o transporte dos animais doentes para outra propriedade;

    9. Realizar a quarentena dos animais recém adquiridos;

    (Adaptado BLOOD e RADOSTITS,1991).

    2.5. Infecção zoonótica humana por poxvírus Os vírus da família Poxviridae são epiteliotrópicos e comumente produzem

    lesões cutâneas no homem e animais. Dentre os oito (08) gêneros da família

    Poxviridae os Orthopoxvirus, os Parapoxvirus e os Yatapoxvirus são os mais

    conhecidos causadores de zoonoses humanas (Tabela 8). A maioria desses casos

    tem caráter ocupacional, esporádico, baixa morbidade e com lesões cutâneas. A

    exceção é o Monkeypox, com significante morbidade e mortalidade entre crianças.

    (JONES, 2004).

  • 23

    Tabela 8. Principais vírus da família Poxviridae causadores de infecção zooonótica.

    Gênero Vírus Abreviação Doença Cowpox virus CPXV Cowpox ou Varíola Bovina

    Monkeypox virus MPXV Monkeypox ou Varíola dos macacos

    Buffalopox virus BPXV Buffalopox ou Varíola dos Búfalos

    Vaccinia virus VACV Lesão localizada Cantagalo virus

    (Similar ao Vaccinia virus)

    - Lesão localizada

    Araçatuba virus (Similar ao Vaccinia

    virus)

    - Lesão localizada

    Orthopoxvirus

    Passatempo virus (Similar ao Vaccinia

    virus)

    - Lesão localizada

    Orf virus ORFV Dermatite pustular contagiosa

    Pseudocowpox virus ou Paravaccinia

    vírus

    PCPV Pseudocowpox ou Nódulo dos ordenhadores

    Bovine papular stomatitis virus

    BPSV Estomatite papular dos bovinos

    Parapoxvirus

    Sealpox virus

    - Sealpox

    Yatapoxvirus Tanapox virus TANV Tanapox

    Os casos de infecção zoonótica humana por poxvírus possuem em comum o

    aparecimento de lesões cutâneas após um período de incubação variável, com

    lesões que progridem de máculas para pápulas, podem desenvolver pústulas antes

    de formar crostas e cicatrizar. Geralmente observam-se poucas lesões cutâneas,

    usualmente associadas com febre, adenopatia e graus variáveis de prostração

    (BAXBY e BENNETT, 1997).

    2.5.1. Monkeypox

    Monkeypox ou varíola dos macacos é causada pelo Monkeypox virus, uma

    poxvirose caracterizada por lesões pústulo-vesiculares na pele e mucosa,

    principalmente dos animais, podendo acometer os humanos, tendo como principais

    reservatórios os esquilos e outros roedores. A monkeypox humana é uma zoonose

    viral rara, endêmica na África Central e Ocidental, que recentemente emergiu nos

  • 24

    Estados Unidos da América, caracterizando a primeira ocorrência da monkeypox

    humana no hemisfério ocidental. (Di GIULIO e ECKBURG, 2004).

    Após 1997, o monkeypox humano atraiu pouca atenção mundial. Entretanto

    em maio de 2003, o CDC/Atlanta/EUA recebeu relatórios da região Central dos EUA,

    sobre 81 casos de pacientes que desenvolveram febre e rash cutâneo após o

    contato com cães da pradaria domesticados e outros mamíferos. Dos 81 casos, 32

    foram confirmados laboratorialmente como Monkeypox humano, uma doença nunca

    relatada previamente no hemisfério ocidental (Di GIULIO e ECKBURG, 2004).

    As investigações identificaram uma remessa internacional de

    aproximadamente 800 pequenos mamíferos, como esquilos (Funisciurus spp,

    Heliosciurus spp), ratos gigantes da Gambia (Cricetomys spp), porcos-espinho

    (Atherurus spp) e ratos (Graphiurus spp, Hybomys spp) de Ghana para o Texas,

    como a fonte mais provável para a introdução de MPXV nos EUA, pois foram

    encontrados 06 animais infectados por MPXV. (CDC, 2003)

    2.5.2. Varíola Bovina A varíola bovina ou cowpox é causa pelo CPXV, que acometem os bovinos e

    o homem, com característica zoonótica extremamente rara e restrita aos países da

    Europa e Ásia. Embora originalmente descrita como infecção adquirida pelos

    ordenhadores do gado bovino leiteiro, existem casos de infecção humana

    resultantes do contato com roedores (WOLFS et al, 2002).

    O período de incubação da varíola bovina no homem é de aproximadamente

    07 (sete) dias. Inicialmente observa-se um abrupto aumento da temperatura, mal

    estar generalizado, associado com cefaléia, adenopatia regional, mialgia e algumas

    vezes náusea e vômito. As lesões cutâneas geralmente aparecem nas mãos e na

    face, iniciando com pápulas vermelhas, frequentemente solitárias que se

    transformam em pústulas com posterior formação de escaras enegrecidas, como

    observadas nas lesões do Antraz. Ocasionalmente desenvolvem-se lesões oculares,

    podendo causar cegueira, mas com baixa letalidade. (BAXBY et al, 1994).

    A infecção pelo Cowpox virus confere uma imunidade contra a varíola

    humana, fato explorado inicialmente por Edward Jenner em 1796 na Inglaterra,

    quando vacinou com sucesso uma criança contra varíola humana, utilizando material

  • 25

    da varíola bovina de um ordenhador. Contudo a imunidade decresce com o tempo, e

    uma segunda infecção pelo Cowpox vírus pode ocorrer (JONES, 2004).

    2.5.3. Buffalopox O Buffalopox ou varíola do búfalo é uma doença endêmica no rebanho

    bufalino da Índia, ocasionada pelo BPXV, provavelmente uma subespécie do VACV.

    A doença nos búfalos, e por vezes nos bovinos, é indistinguível clinicamente da

    varíola bovina, podendo ser transmitida aos seres humanos, com aparecimento de

    lesões localizadas, semelhantes ao cowpox, mas menos severa (KOLHAPURE et

    al., 1997).

    Recentes surtos sugerem a existência de infecção subclínica, em que

    evidências sorológicas de anticorpos neutralizantes para BPXV têm sido

    encontradas em crianças que nunca tiveram contato com animais infectados.

    Algumas crianças têm desenvolvido lesões generalizadas quando em contato com

    familiares com BPXV, sugerindo a transmissão pessoa a pessoa (KOLHAPURE et

    al., 1997).

    2.5.4. Cantagalo virus, Araçatuba virus e Passatempo virus Nos últimos cinco anos, inúmeros casos de doença pústulo-vesicular

    ocorreram em diversas fazendas nos Estados do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas

    Gerais, acometendo o gado bovino leiteiro e pessoas, principalmente retireiros e

    seus familiares, nos quais as características clínicas e o diagnóstico laboratorial

    identificaram cepas de Vaccinia-like virus, da família Poxviridae como causador dos

    surtos. Na ocasião DAMASO et al. (2000), isolaram e caracterizaram

    molecularmente de lesões dos bovinos o Cantagalo virus (CTGV) na cidade de

    Cantagalo no Estado do Rio de Janeiro; TRINDADE et al. (2003), o Araçatuba virus

    na cidade de Araçatuba no Estado de São Paulo; LEITE (2003), o Passatempo virus

    em Passatempo no Estado de Minas Gerais e NAGASSE-SUGAHARA et al. (2004),

    o Vaccinia-like virus como causador de surtos de poxvirose em humanos nos

    Estados de Minas Gerais, São Paulo e Goiás.

    Como descrito no item 2.2.3. a origem do Cantagalo virus, através de

    métodos moleculares, foi traçada à cepa vacinal (VACV-IOC), produzida no Instituto

  • 26

    Oswaldo Cruz-RJ e utilizada na campanha da Organização Mundial de Saúde

    (OMS) para a erradicação da varíola no Brasil nos anos 60 e 70 (DAMASO et al.,

    2000). Determinou-se que tanto o Araçatuba virus e o Passatempo virus seriam

    novas cepa do VACV ou desdobramento do vírus Cantagalo (TRINDADE et al.,

    2003, LEITE, 2003), reforçando a idéia de que o VACV pode realmente se

    estabelecer na natureza, como observado com BPXV.

    As lesões cutâneas em humanos causadas pelos Cantagalo virus, Araçatuba virus, Passatempo virus e os outros Vaccinia-like virus são semelhantes

    às causadas pelo CPXV. (TRINDADE et al., 2003, LEITE, 2003, NAGASSE-

    SUGAHARA et al., 2004).

    2.5.5. Dermatite pustular contagiosa, Nódulo dos Ordenhadores, Estomatite papular bovina A Dermatite pustular contagiosa é uma doença que acomete os ovinos e caprinos e o Nódulo dos Ordenhadores e a Estomatite papular bovina acomete

    principalmente os bovinos, mas o vírus pode ser transmitido ao homem através do

    contato direto com os animais infectados. É considerada uma doença humana

    ocupacional, onde a transmissão pessoa a pessoa ocorre raramente.

    O período de incubação varia de 03 a 07 dias, com aparecimento de pápulas

    eritrematosas que progridem para formação de escaras, que cicatrizam após 06 a 08

    semanas. As características clínicas são similares, com aparecimento de lesões

    solitárias e em poucos casos generalizadas, usualmente na mão ou braço,

    facilmente reconhecidas em trabalhadores de áreas endêmicas. Contudo, lesões

    atípicas podem ser confundidas com antraz, cowpox, lesões herpéticas, granuloma

    piogênico e carcinoma de células escamosas. A cegueira tem sido relatada como

    complicação da Dermatite pustular contagiosa. (BOWMAN et al,1981; HANSEN et

    al, 1997; YIRREL e VESTEY, 1994)

    2.5.6. Sealpox Sealpox ou varíola das focas é uma poxvirose que acomete principalmente as focas, podendo ser transmitidas ao homem, causando lesões semelhantes as da

    Dermatite Pustular Contagiosa. Os casos humanos descritos na literatura são de

  • 27

    tratadores de focas agredidos por animais infectados como as focas do porto (Phoca

    vitulina) e as focas acinzentadas (Halichoerus grypus). Recentemente um técnico em

    animais marinhos da costa da Escócia apresentou o desenvolvimento de lesões

    semelhantes a da dermatite pustular contagiosa, após a mordida de uma foca

    acinzentada. O diagnóstico laboratorial pelo PCR confirmou a presença do Sealpox

    virus como o agente causador do sealpox, descartando o Orf virus (JONES, 2004)

    2.5.7. Tanapox Tanapox é uma infecção cutânea muito comum em regiões da África, sobretudo no Quênia e no Zaire, causada pelo Tanapox virus, um vírus que foi

    isolado pela primeira vez em 1962 no Quênia. É uma doença febril e está associada

    com uma ou duas lesões muito semelhante a do monkeypox, o que a torna

    importante no diagnóstico diferencial. Ocorre em todas as idades, principalmente

    entre os tratadores de animais, mas acredita-se que a transmissão por artrópodes

    contaminados seja possível. (JEZEK et al, 1985)

    O tanapox começa com um período febril de 3 a 4 dias, podendo incluir

    cefaléia intensa, prostração e adenopatia regional. Em geral, as lesões iniciam-se

    como pápulas que evoluem para uma necrose central, sem a formação de pústula,

    que cicatrizam em 4 a 7 semanas. Um recente caso foi relatado na Europa em um

    turista que retornara de uma viagem à África. (STICH et al, 2002)

  • 28

    3. MATERIAL E MÉTODOS

    3.1. Distribuição das amostras Os espécimens clínicos foram coletados em 28 propriedades de gado de

    leite, com notificação de casos de doença pústulo-vesicular em bovinos e/ou

    pessoas, distribuídas em oito (8) municípios (Alegre, Atílio Vivacgua, Cachoeiro do

    Itapemirim, Castelo, Itapemirim, Piúma, Presidente Kennedy e Rio Novo do Sul)

    todos localizados no Sul do Estado do Espírito Santo, no período de agosto de 2002

    a maio de 2005.

    Os dados referentes às propriedades, aos animais e aos humanos foram

    anotados em planilhas de dados (em anexo).

    3.2. Coleta dos espécimens clínicos Todas as amostras foram identificadas quanto à procedência, data, origem animal ou humana, tipo e local da lesão, idade, sexo, raça, sadio ou doente. Após a

    identificação, as amostras foram transportadas refrigeradas ao Laboratório de

    Sanidade Animal (LSA)/CCTA/UENF, e armazenadas a –20 oC.

  • 29

    3.2.1. Crostas das lesões

    As crostas das lesões de animais e ordenhadores foram coletadas com

    auxílio de uma pinça e acondicionadas em recipientes estéreis para posterior

    transporte. Foram coletadas um total de 50 amostras de crostas, sendo 3 de

    ordenhadores e 47 de bovinos de leite.

    3.2.2. Sangue

    As amostras de sangue de bovinos e ordenhadores (adultos e jovens),

    doentes e sadios, foram coletadas em tubos vacuette (Greiner Bio-one) com ativador

    de coágulo e gel separador para posterior obtenção do soro no Laboratório de

    Virologia Veterinária LSA/CCTA/UENF. Foram coletadas um total de 200 amostras

    de sangue de bovinos (100 bovinos clinicamente doentes e 100 clinicamente sadios)

    e 91 amostras de sangue humana, sendo 89 de ordenhadores (67 clinicamente

    doentes e 22 clinicamente sadios) e 2 doentes não ordenhadores

    3.3. Isolamento viral O isolamento viral, a partir das crostas, foi realizado no Laboratório de Vírus do Departamento de Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da

    Universidade Federal de Minas Gerais, em Belo Horizonte/MG.

    3.3.1. Suspensão de crostas Cada amostra de crosta foi macerada em Solução Salina Tamponada (PBS) 0,01M pH 7.2 acrescido com gentamicina (100mg/L), anfotericina B (5mg/L) e

    penicilina potássica ou sódica (400.000 U/L). A maceração ocorreu com auxílio de

    um gral e areia fina lavada e autoclavada. A suspensão obtida foi coletada e

    centrifugada a 2790 x g a 4 °C por 5 minutos em Microcentrífuga EPPENDORF, para

    coleta do sobrenadante e armazenamento em freezer -70 °C.

  • 30

    3.3.2. Multiplicação viral em membrana corialantóide de ovos embrionados Um volume de 100 µL do sobrenadante obtido do macerado de cada crosta, com auxílio de uma seringa de 1 mL e agulha 13 x 0,4 mm, foi inoculado na

    membrana corialantóide de ovos embrionados de galinha (MCA) com 10 dias de

    vida. Para a inoculação em membrana corialantóide realizou-se o deslocamento da

    câmara de ar dos ovos com auxílio do ovoscópio; os ovos encontravam-se

    previamente limpos e desinfectados com tintura de iodo 2%. Os ovos foram

    acondicionados em estufa umedecida a 37 °C durante 72 horas e transferidos para

    câmara fria a 4 °C por 12 horas. As MCA`s foram retiradas assepticamente dos ovos,

    coletando-se a região com presença de lesões do tipo “pocks”, e armazenadas a -70

    °C.

    3.3.3. Multiplicação viral em células Vero Cada amostra de MCA com lesão do tipo “pocks” foi macerada em Solução Salina Tamponada (PBS) 0,01M pH 7.2 acrescido com gentamicina (100mg/L),

    anfotericina B (5mg/L) e penicilina potássica ou sódica (400.000 U/L). A maceração

    ocorreu com auxílio de um gral e areia fina autoclavada. A suspensão obtida foi

    coletada e centrifugada a 2790 x g a 4 °C por 5 minutos em Microcentrífuga

    EPPENDORF para obter a suspensão viral.

    Células Vero cultivadas em monocamada nas garrafas de cultivo celular de

    50 mL (75 cm2)foram infectadas com 100 µL da suspensão viral diluída em 1 mL de

    meio Auto-pow (MEM – Meio mínimo de Eagle autoclavável da GibcoBRL), acrescido

    de gentamicina (50mg/L), anfotericina B (2,5mg/L) e penicilina potássica ou sódica

    (200.000 U/L). Após o período de 1 hora de adsorção em estufa a 37 °C,

    acrescentou-se 4 mL de meio Auto-pow (MEM – Meio mínimo de Eagle autoclavável

    da GibcoBRL), suplementado com 1% de soro fetal bovino (SFB) e com antibióticos

    gentamicina (50mg/L), anfotericina B (2,5mg/L) e penicilina potássica ou sódica

    (200.000 U/L). A garrafa foi mantida em estufa 37 °C até o aparecimento de efeito

    citopático (ECP) em forma de placa de lise.

    Após o aparecimento do ECP, o meio foi descartado da garrafa e as células

    desprendidas com auxilio de um raspador. As células desprendidas foram diluídas

    em Solução Salina Tamponada (PBS) 0,01M pH 7.2 e centrifugadas a 251 x g a 4 °C

  • 31

    por 5 minutos em Microcentrífuga EPPENDORF. O sobrenadante foi desprezado e o

    sedimento (extrato celular) foi armazenado a -70 °C.

    3.4. Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) para Orthopoxvirus

    A técnica de PCR para Orthopoxvirus, a partir do DNA viral extraído do

    extrato celular, foi realizada no Laboratório de Vírus do Departamento de

    Microbiologia do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas

    Gerais, em Belo Horizonte/MG.

    3.4.1. Extração de DNA viral

    As extrações de DNA viral foram realizadas através da técnica do

    Fenol/Clorofórmio a partir dos extratos celulares (item 3.3.3) como descrito por

    FONSECA (1998).

    3.4.2. Amplificação dos genes ATI e TK As regiões codificadoras do gene ATI e TK foram amplificadas por meio da reação de polimerase em cadeia (PCR), utilizando uma mistura padrão, contendo

    30ng de DNA viral extraído, 20 pmoles de iniciadores específicos, 20 mM de

    nucleotídeos (dATP, dCTP, dGTP, dTTP), 10 µL de tampão Taq polimerase 10X, 1,5

    mM de MgCl2, 2,5 U de Taq polimerase (Promega, USA) e H2O Mili Q estéril, em um

    total de 20 µL de reação. As amostras foram cobertas com óleo mineral estéril e o

    processamento foi realizado em aparelho Perkin Elmer Cetus (Perkin, USA) modelo

    N 801-150 conforme descrito por LEITE (2003).

    Os oligonucleotídeos utilizados como iniciadores para a reação de PCR do

    gene ATI foram desenhados por MEYER et al (1997), a partir da região codificadora

    do gene ATI do Cowpox vírus:

    • ATI up: 5’ AATACAAGGAGGATCT 3’

    • ATI low: 5’ CTTAACTTTTTCTTTCT 3’

    As reações de PCR do gene ATI foram programadas com base na

    metodologia descrita por MEYER et al (1997):

  • 32

    • 01 ciclo de 94 °C por 5 minutos, 43 °C por 1 minuto e 72 °C por 2 minutos;

    • 30 ciclos de 94 °C por 1 minuto, 43 °C por 1 minuto e 72 °C por 2 minutos;

    • 01 ciclo de 94 °C por 1 minuto, 43 °C por 1 minuto e 72 °C por 15 minutos.

    Os oligonucleotídeos utilizados como iniciadores para a reação de PCR para

    o gene TK foram desenhados por FONSECA et al (1998):

    • TK up: 5’ GCGAGGATCCAACGGCGGACATATTCAG 3’

    • TK low: 5’ GCAGAAGCTTTGAGTCGATGTAACAC 3’

    As reações de PCR do gene TK foram programadas com base na

    metodologia descrita por MARQUES et al (2001):

    • 01 ciclo de 95 °C por 5 minutos, 45 °C por 1 minuto e 72 °C por 2 minutos;

    • 30 ciclos de 95 °C por 1 minuto, 45 °C por 1 minuto e 72 °C por 2 minutos;

    • 01 ciclo de 94 °C por 1 minuto, 45 °C por 1 minuto e 72 °C por 15 minutos.

    Os fragmentos amplificados foram fracionados eletroforeticamente em gel de

    agarose 1%, acrescido de 0,5 µg/mL de brometo de etídio, sob voltagem de 110 V.

    Os fragmentos foram analisados e fotografados.

    3.5. Soroneutralização para Orthopoxvirus

    A neutralização utilizando os soros inativados a 56 °C por 1 hora dos

    bovinos, ordenhadores e não ordenhadores clinicamente doentes e sadios foi

    realizada em placas de 6 poços, sendo que para cada soro utilizou-se um poço com

    500.000 células VERO implantadas. O vírus utilizado foi o Vaccinia virus WR, diluído

    a 10-6 em meio Auto-pow (MEM – Meio mínimo de Eagle autoclavável da GibcoBRL),

    acrescido de gentamicina (50mg/L), anfotericina B (2,5mg/L) e penicilina potássica

    ou sódica (200.000 U/L). Os soros foram diluídos em meio Auto-pow, acrescido de

    gentamicina (50mg/L), anfotericina B (2,5mg/L) e penicilina potássica ou sódica

    (200.000 U/L), nas diluições de 1:20, 1:40, 1:80, 1:160, 1:320, 1:640.

    Para cada diluição de soro utilizou-se 300 µL do soro e 300 µL do vírus

    diluído a 10-6, preparando um mistura de 600 µl que foi mantida sob agitação a 37 °C

    por 1 hora, para posterior inoculação em células.

    As placas contendo células inoculadas, foram incubadas a 37 °C por 01 hora

    para a adsorção viral, em seguida acrescentou-se meio Auto-pow (MEM – Meio

    mínimo de Eagle autoclavável da GibcoBRL), suplementado com 1% SFB e

  • 33

    acrescido de gentamicina (50mg/L), anfotericina B (2,5mg/L) e penicilina potássica

    ou sódica (200.000 U/L), retornando a estufa a 37 °C até o aparecimento de ECP.

    Após o aparecimento de ECP as placas foram retiradas da estufa, o meio foi

    desprezado e as células foram fixadas em solução de formol 10% por 30 min e

    corados com solução de cristal violeta por 15 min.

    O titulo de cada soro foi obtido a partir da maior diluição onde houve redução

    de 50% do número de placas de lise com relação as placas produzidas no controle

    de vírus. O controle de vírus consistiu na utilização de uma placa inoculada com 300

    µL do vírus diluído a 10-6 e 300 µL de meio Auto-pow (MEM – Meio mínimo de Eagle

    autoclavável da GibcoBRL) com 1% de SFB e acrescido de gentamicina (50mg/L),

    anfotericina B (2,5mg/L) e penicilina potássica ou sódica (200.000 U/L).

    3.6. Divulgação e controle do surto

    Estabeleceu-se uma parceria técnica entre a Universidade Estadual do Norte

    Fluminense Darcy Ribeiro (UENF), Universidade Federal do Espírito Santo (UFES),

    Instituto de Defesa Agropecuário e Florestal do ES (IDAF-ES) e Secretaria de Estado

    da Saúde, possibilitando, desta forma, a distribuição das informações sobre o surto e

    a identificação dos casos, envolvendo os produtores, a comunidade rural, os Postos

    de Saúde e os órgãos de Defesa Sanitária e Sanidade Animal do Estado do Espírito

    Santo.

  • 34

    4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

    Os resultados obtidos a partir do estudo do surto de poxvirose bovina e

    humana no Estado do Espírito Santo estão sendo apresentados e discutidos em

    tópicos.

    4.1. Distribuição geográfica dos casos de poxvirose bovina e humana

    Os casos de poxvirose bovina e humanas notificados e estudados no Estado

    do Espírito Santo ocorreram no período de agosto de 2002 a maio de 2005 em 28

    propriedades de gado de leite de oito municípios (Alegre, Atílio Vivacqua, Cachoeiro

    do Itapemirim, Castelo, Itapemirim, Piúma, Presidente Kennedy e Rio Novo do Sul),

    localizados no Sul do Estado, como mostra a Tabela 9 e a Figura 4.

    Todos os oito (8) municípios encontram-se localizados na região Sul do

    Estado, próximos aos Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, onde foram

    notificados surtos de poxviroses bovina e humana, como descrito por DAMASO et al

    (2000) e LOBATO et al (2004). Essa proximidade favorece o acometimento, nos

    outros 29 municípios do Sul do Espírito Santo, principalmente os 17 municípios que

    se encontram sob risco iminente da doença, por terem divisas com os municípios já

    acometidos, uma vez que a principal forma de disseminação da doença baseia-se na

  • 35

    comercialização informal de bovinos sem o acompanhamento dos órgãos

    fiscalizadores, como o IDAF-ES, prática essa comum entre as propriedades

    visitadas. Além disso, a utilização da mesma mão-de-obra (ordenhador) entre

    propriedades vizinhas, certamente contribuiu na disseminação da doença, tornado-

    se necessário à aplicação imediata de ações de controle e profilaxia da doença,

    restringindo-se ao máximo a sua disseminação.

    Figura 4. Distribuição geográfica dos casos de poxvirose bovina e humana nos municípios do Estado do Espírito Santo, no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    BA

    Casos de Poxvirose Bovina e Humana

    Municípios

    A. Alegre B. Atílio Vivacqua C. Cachoeiro de Itapemirim D. Castelo E. Itapemirim F. Piúma G. Presidente Kennedy H. Rio Novo do Sul

    MG

    RJ

    Oceano Atlântico

  • 36

    Tabela 9. Localização geográfica dos municípios do Estado do Espírito Santo com casos de poxvirose bovina e humana, no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Coordenadas

    Município Latitude Longitude

    Altura

    Alegre -20:45:49 Sul -41:31:59 Oeste 254

    Atílio Vivacqua -20:54:51 Sul -41:11:54 Oeste 85

    Cachoeiro de Itapemirim -20:50:56 Sul -41:06:46 Oeste 36

    Castelo -20:36:13 Sul -41:11:05 Oeste 100

    Itapemirim -21:00:40 Sul -40:50:02 Oeste 20

    Piúma -20:50:16 Sul -40:43:19 Oeste 2

    Presidente Kennedy -21:05:56 Sul -41:02:48 Oeste 55

    Rio Novo do Sul -20:51:45 Sul -41:56:11 Oeste 70

    Fonte: IBGE Ao comparamos a Tabela 10 com os dados do IBGE (2000) sobre produção

    de leite nos municípios e no Estado do ES, observamos que umas das principais

    regiões produtoras de leite do Espírito Santo, responsável por mais de 42% da

    produção de leite do Estado, já se encontra acometida pela doença, principalmente

    os municípios de Alegre, Cachoeiro de Itapemirim e Presidente Kennedy, que foram

    os mais acometidos, e que juntos representam mais de 33% da produção de leite do

    Sul do Espírito Santo.

    4.2. Características epidemiológicas da poxvirose bovina

    Observa-se, na Tabela 10, que 28 propriedades de 08 dos 78 municípios

    localizados no Estado do Espírito Santo foram acometidas com a poxvirose bovina,

    onde as porcentagens da incidência clínica da poxvirose no gado leiteiro, variaram

    entre 10,2 e 100% com média de 52,7%, demonstrando a alta morbidade do vírus e

    o caráter epidêmico da doença, mesmo em propriedades com diferentes sistemas de

    manejos, como na fazenda G04, possuidora de um grande rebanho leiteiro.

    Os municípios mais acometidos foram Alegre, Cachoeiro de Itapemirim e

    Presidente Kennedy, possuindo 78,6% (n=22) das 28 propriedades acometidas no

    Estado do Espírito Santo.

  • 37

    Tabela 10. Incidência clínica da poxvirose no gado leiteiro em propriedades localizadas no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Município Propriedade Leiteira

    N° Bovino de leite

    N° bovinos clinicamente doentes

    *Incidência Clínica - %

    A01 58 44 75,9 A02 40 35 87,5 A03 45 35 77,8 A04 30 28 93,3 A05 13 12 92,3 A06 34 23 67,6 A07 12 12 100 A08 50 30 60 A09 60 50 83,3 A10 40 30 75

    Alegre

    A11 25 10 40 Atílio

    Vivacqua

    B01

    08

    04

    50

    C01

    212

    80

    37,7 C02 70 35 50 C03 60 20 33,3 C04 30 27 90 C05 40 36 90 C06 26 03 11,5

    Cachoeiro de Itapemirim

    C07 60 10 16,6

    Castelo

    D01

    30

    30

    100

    Itapemirim

    E01

    32

    28

    87,5

    Piúma

    F01

    30

    06

    20

    G01

    48

    30

    62,5 G02 80 40 50 G03 256 103 40,2

    Presidente Kennedy

    G04 170 80 47

    H01

    49

    05

    10,2

    Rio Novo do Sul H02 12 08 66,7

    Total

    28

    1620

    854

    52,7

    * Os cálculos das incidências foram realizadas no momento da visita em cada propriedade. An°:Propriedades localizadas em Alegre; Bn°:Propriedade localizada em Atílio Vivacqua, Cn°:Propriedades localizadas em Cachoeiro de Itapemirim, Dn°:Propriedade localizada em Castelo, En°:Propriedade localizada em Itapemirim, Fn°:Propriedade localizada em Piúma, Gn°:Propriedades localizadas em Presidente Kennedy, Hn°:Propriedades localizadas em Rio Novo do Sul.

  • 38

    Tabela 11. Incidência clínica x sistema de higienização e antissepsia das tetas e das mãos dos ordenhadores nas propriedades com poxvirose no gado leiteiro no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005. Propriedade *Sistema de Higienização

    e Antissepsia das tetas *Sistema de Higienização e Antissepsia das mãos

    dos ordenhadores

    Incidência Clínica - %

    A01 não não 75,9 A02 não não 87,5 A03 não sim 77,8 A04 não não 93,3 A05 não não 92,3 A06 não não 67,6 A07 não não 100 A08 não não 60 A09 não não 83,3 A10 não não 75 A11 sim sim 40 B01 não não 50 C01 sim sim 37,7 C02 sim sim 50 C03 sim sim 33,3 C04 não não 90 C05 não não 90 C06 sim sim 11,5 C07 sim sim 16,6 D01 não não 100 E01 não não 87,5 F01 não não 20 G01 não não 62,5 G02 não não 50 G03 não sim 40,2 G04 não não 47 H01 sim sim 10,2 H02 não não 66,7

    * Informações obtidas a partir dos responsáveis pelas propriedades. An°:Propriedades localizadas em Alegre; Bn°:Propriedade localizada em Atílio Vivacqua, Cn°:Propriedades localizadas em Cachoeiro de Itapemirim, Dn°:Propriedade localizada em Castelo, En°:Propriedade localizada em Itapemirim, Fn°:Propriedade localizada em Piúma, Gn°:Propriedades localizadas em Presidente Kennedy, Hn°:Propriedades localizadas em Rio Novo do Sul.

    Essa variação dos valores de incidência clínica observada em nosso estudo

    entre as propriedades, pode estar diretamente relacionada às medidas de higiene

    durante a ordenha. As propriedades que possuíam um sistema de higienização,

    antissepsia das tetas e das mãos dos ordenhadores, antes e após a ordenha, como

    na fazenda H01, tiveram uma das menores taxas de incidência, como mostrado na

    Tabela 11. Esses dados corroboram com a descrição de WELBLEN (2002), sobre a

  • 39

    transmissão das poxviroses bovinas, ocorrer principalmente por contato direto com

    as mãos do ordenhador e os equipamentos de ordenha.

    Tabela 12. Distribuição mensal do início da poxvirose no gado leiteiro nas propriedades no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Município Propriedade Mês Ano A01 maio 2003 A02 abril 2003 A03 maio 2003 A04 maio 2003 A05 maio 2003 A06 maio 2003 A07 maio 2003 A08 setembro 2002 A09 setembro 2002 A10 dezembro 2002

    Alegre

    A11 janeiro 2003 Atílio Vivacqua B01 maio 2005

    C01 agosto 2002 C02 agosto 2002 C03 agosto 2002 C04 setembro 2002 C05 agosto 2002 C06 outubro 2002

    Cachoeiro de Itapemirim

    C07 setembro 2002 Castelo D01 outubro 2003

    Itapemirim E01 setembro 2002 Piúma F01 outubro 2002

    G01 agosto 2002 G02 setembro 2002 G03 agosto 2002

    Presidente Kennedy

    G04 agosto 2002 H01 setembro 2002

    Rio Novo do Sul H02 outubro 2002 An°:Propriedades localizadas em Alegre; Bn°:Propriedade localizada em Atílio Vivacqua, Cn°:Propriedades localizadas em Cachoeiro de Itapemirim, Dn°:Propriedade localizada em Castelo, En°:Propriedade localizada em Itapemirim, Fn°:Propriedade localizada em Piúma, Gn°:Propriedades localizadas em Presidente Kennedy, Hn°:Propriedades localizadas em Rio Novo do Sul.

    Ao analisarmos a Tabela 12, detectamos que as primeiras propriedades

    acometidas pela poxvirose foram as localizadas em Presidente Kennedy e

    Cachoeiro de Itapemirim, e que a maioria dos casos de poxvirose bovina no gado

    leiteiro no Sul do Espírito Santo teve início entre os meses de maio e setembro,

    sugerindo um caráter sazonal da doença, principalmente no período seco no Estado.

  • 40

    A rápida disseminação da doença dentro da propriedade e para outras

    propriedades, os altos valores de incidência clínica e o possível caráter sazonal da

    doença no gado leiteiro do Espírito Santo, estão de acordo com o que fora relatado

    por LOBATO et al (2004), no gado leiteiro de Minas Gerais.

    4.3. Quadro clínico da poxvirose no gado leiteiro.

    O quadro clínico da poxvirose no gado leiteiro do Sul do Espírito Santo

    consistiu-se basicamente de lesões pústulo-vesiculares cutâneas dolorosas,

    geralmente múltiplas, localizadas principalmente nas tetas, com 94,85% dos animais

    apresentando lesões restritas nas tetas, como mostra a Tabela 13.

    Tabela 13. Distribuição dos casos de poxviroses segundo localização das lesões no gado leiteiro nas propriedades localizadas no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Localização da lesão N° de bovinos % Teta 810 94,85

    Úbere e Teta 43 5,03 Face 01 0,12 Total 854 100

    Na fase inicial do desenvolvimento da doença, observou-se uma febre

    prodrômica irregular e uma dor à pressão da teta e úbere, as vesículas eram

    facilmente observadas, mas logo se rompiam, provavelmente pela ação mecânica da

    ordenha, formando uma ulceração que progredia para crosta, que cicatrizava em

    média de 20 dias após os primeiros sinais.

    As Figuras 5.A., 5.B., 5.C, 5.D. e 5.E., demonstram as etapas de

    desenvolvimento das lesões da poxvirose bovina, em que as lesões progrediam de

    pápula para pústula-vesicular, e rapidamente se transformavam em ulceração de

    borda irregular, com contornos eritemato-edematoso, formando crostas antes de

    cicatrizar. O quadro clínico da poxvirose bovina do gado leiteiro no Espírito Santo é

    compatível com outras poxviroses bovinas, como descrito por TIMMS et al. (1998) e

    MURPHY et al. (1999), mas com rápida disseminação.

  • 41

    For Figura 5. Lesões pústulo-vesiculares ulcerativaspoxvirose no Sul do Espírito Santo. 5.A. Formavesícula; 5.C. Múltiplas úlceras irregulares nas teLesão em processo de cicatrização.

    Figura 5.C. ltiplas Úlceras

    Figura 5.A. Pápula

    FiguraCic

    nas tetas do gadção de pápula; 5.B.tas; 5.D. Formação d

    Figura 5.B. Vesícula

    5.E. Lesão atrizando

    Figura 5.D. mação de crosta

    o leiteiro com Formação de e crosta; 5.E.

  • 42

    Tabela 14. Produção de leite x Incidência clínica da poxvirose no gado leiteiro em propriedades localizadas no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Município Propriedade Leiteira

    Incidência Clínica %

    * Queda na Produção de Leite - %

    A01

    75,9

    50

    A02 87,5 40 A03 77,8 40 A04 93,3 50 A05 92,3 50 A06 67,6 30 A07 100 60 A08 60 50 A09 83,3 50 A10 75 30

    Alegre

    A11 40 30 Atílio

    Vivacqua

    B01

    50

    40

    C01

    37,7

    20 C02 50 30 C03 33,3 20 C04 90 60 C05 90 60 C06 11,5 5

    Cachoeiro de

    Itapemirim

    C07 16,6 20

    Castelo

    D01

    100

    60

    Itapemirim

    E01

    87,5

    60

    Piúma

    F01

    20

    10

    G01

    62,5

    30 G02 50 30 G03 40,2 30

    Presidente Kennedy

    G04 47 30

    H01

    10,2

    5

    Rio Novo do Sul H02 66,7 30

    Total 28 52,7 36,4

    *: A porcentagem de queda na produção de leite foi obtida a partir das informações dos responsáveis pelas propriedades. An°:Propriedades localizadas em Alegre; Bn°:Propriedade localizada em Atílio Vivacqua, Cn°:Propriedades localizadas em Cachoeiro de Itapemirim, Dn°:Propriedade localizada em Castelo, En°:Propriedade localizada em Itapemirim, Fn°:Propriedade localizada em Piúma, Gn°:Propriedades localizadas em Presidente Kennedy, Hn°:Propriedades localizadas em Rio Novo do Sul.

  • 43

    Os dados apresentados na Tabela 14, baseiam-se nas informações da

    queda da produção leiteira fornecidas pelos responsáveis pelas propriedades, os

    quais mostram a queda na produção de leite das propriedades leiteiras acometidas

    com a poxvirose bovina, gerando grandes perdas econômicas, uma vez que as

    mesmas vivem da produção e comercialização do leite. Além da perda econômica

    com a queda na produção de leite, as propriedades tiveram prejuízos econômicos

    com gastos com medicamentos, honorários de médicos veterinários e dificuldade na

    contratação de ordenhadores, pois os mesmos estavam receosos com a doença ou

    já estavam acometidos pela mesma.

    Tabela 15. Distribuição dos casos de poxviroses do gado leiteiro, segundo idade e raça, em propriedades localizadas no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Faixa Etária em anos 02-04 05-07 08-10 11-14 Total

    Raça n° % n° % n° % n° % n° % Mestiça 139 100 343 94,23 215 83,98 59 62,10 756 88,52

    Holandesa - - 10 2,75 24 9,38 22 23,16 56 6,56

    Girolanda - - 05 1,37 17 6,64 10 10,53 32 3,75

    Parda Suíça - - 06 1,65 - - - - 06 0,70

    Patuá - - - - - 04 4,21 04 0,47

    Total 139 16,28 364 42,62 256 29,98 95 11,12 854 100

    Considerando os dados da Tabela 15, 42,62% dos animais acometidos

    estavam dentro da faixa etária de 05 a 07 anos de idade, e 88,52% dos animais

    eram animais mestiços, mas com acometimentos nas várias faixas etárias e raças

    de bovino de leite. Esses dados estão de acordo com o padrão zootécnico do gado

    leiteiro do Sul do Espírito Santo, que segundo o IBGE (2000) e o IDAF-ES (Instituto

    Estadual de Defesa Agropecuária e Florestal do Espírito Santo) a faixa etária

    predominante é a de 05 a 10 anos, predominando animais mestiços e da raça

    holandesa. Com isso não podemos afirmar que exista diferenças de acometimento

    da doença entre as raças leiteiras e as faixas etárias acometidas, e sim com relação

    ao seu tipo de exploração, em que todos os animais eram bovinos leiteiros,

    destinados à produção de leite.

  • 44

    4.4. Características epidemiológicas da poxvirose humana Foram notificados e estudados 69 casos de poxvirose humana no Estado do

    Espírito Santo, onde todos ocorreram no mesmo período e nas mesmas

    propriedades dos casos de poxvirose bovina, como descritas no item 4.2. Dos 69

    casos, 97,1% (67 indivíduos) exerciam trabalho pecuário e rural, com a função

    principal de ordenhador do gado bovino leiteiro, como mostrado na Tabela 16.

    Os outros dois casos foram de familiares dos ordenhadores. No primeiro

    caso, a de uma senhora de 34 anos, do lar e esposa de ordenhador. Relatou que

    não teve contato com os animais doentes e que contraiu a doença durante a

    lavagem das roupas do marido que estava clinicamente doente. No segundo caso,

    uma menina de 05 anos, filha de ordenhador doente, contraiu a doença ao perfurar a

    mão com a agulha utilizada pelo pai para romper a vesícula da sua mão, segundo

    relato dos pais.

    Esses dados demonstram que essa poxvirose é uma doença ocupacional

    com caráter zoonótico, como em outras infecções zoonóticas humanas por poxvírus

    descritas por JONES (2004).

    Tabela 16. Distribuição dos casos de poxvirose humana, segundo ocupação, nas propriedades leiteiras localizadas no Sul do Estado do Espírito Santo, visitadas no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Principal Ocupação N° %

    Ordenhador do gado bovino leiteiro 67 97,10

    Do lar e esposa de ordenhador 01 1,45

    Filha de ordenhador 01 1,45

    Total 69 100

    Quando se observa a Tabela 17, verifica-se que os valores de incidência

    clínica da poxvirose entre os ordenhadores variaram de 0 a 100% com média de

    75,28%, valores que demonstram a alta morbidade do vírus e o caráter epidêmico da

    doença entre ordenhadores, com valores maiores que nos bovinos, justificado pelo

    caráter ocupacional da doença, levando o homem a um contato maior e em mais

    vezes com os animais doentes, aumentando as possibilidades de transmissão.

    Observa-se também que somente as propriedades A03 e G03, das 28 propriedades

    com casos de poxvirose bovina, não apresentaram casos humanos, isso pode ser

  • 45

    explicado em parte pelo uso de luvas pelos ordenhadores no momento da ordenha

    dos animais doentes, e pela sistematização de antissepsia e assepsia durante e

    após a ordenha, como demonstrado na Tabela 11. Tabela 17. Incidência clínica da poxvirose nos ordenhadores de gado leiteiro no Sul do Estado do Espírito Santo, no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Município Propriedade Leiteira

    N° ordenhadores

    N° ordenhadores clinicamente doentes

    Incidência Clínica - %

    A01

    03

    03

    100

    A02 04 02 50 A03 03 0 0 A04 02 02 100 A05 02 02 100 A06 01 01 100 A07 04 04 100 A08 06 03 50 A09 03 03 100 A10 01 01 100

    Alegre

    A11 02 01 50 Atílio

    Vivacqua

    B01

    03

    03

    100

    C01

    04

    04

    100 C02 05 04 80 C03 04 02 50 C04 04 04 100 C05 03 01 33,3 C06 02 02 100

    Cachoeiro de Itapemirim

    C07 05 05 100

    Castelo

    D01

    04

    04

    100

    Itapemirim

    E01

    02

    02

    100

    Piúma

    F01

    06

    04

    66,6

    G01

    02

    02

    100 G02 02 01 100 G03 02 0 0

    Presidente Kennedy

    G04 02 02 100

    H01

    04

    01

    25

    Rio Novo do Sul H02 04 04 100

    Total

    28

    89

    67

    75,28

    * Os cálculos das incidências foram realizadas no momento da visita em cada propriedade. An°:Propriedades localizadas em Alegre; Bn°:Propriedade localizada em Atílio Vivacqua, Cn°:Propriedades localizadas em Cachoeiro de Itapemirim, Dn°:Propriedade localizada em Castelo, En°:Propriedade localizada em Itapemirim, Fn°:Propriedade localizada em Piúma, Gn°:Propriedades localizadas em Presidente Kennedy, Hn°:Propriedades localizadas em Rio Novo do Sul.

  • 46

    4.5. Quadro clínico da poxvirose em humanos

    Lesões na pele, febre (igual ou superior 39°C), linfoadenomegalia

    regionalizado e mialgia foram os sinais e sintomas apresentados em 100% dos

    doentes. Com relação às lesões na pele, 100% dos indivíduos referiram ter tido

    vesículas com posterior formação de crostas.

    Segundo relato dos doentes, a fase inicial do desenvolvimento da doença

    apresentava-se uma febre prodrômica irregular igual ou superior 39°C, que durava

    de 03 a 07 dias, com mialgia, fraqueza muscular e linfoadenomegalia regional. As

    lesões iniciavam-se com prurido, dor e formações pústulo-vesiculares principalmente

    nas mãos, como demonstra a Tabela 18 e as Figuras 6.A., 6.B., 6.C., 6.D., 6.E., 6.F.

    Formavam crostas e cicatrizavam 15 a 30 dias após o seu aparecimento. Alguns

    casos necessitaram de hospitalização, mas todos evoluíram para cura, em torno de

    20 a 30 dias.

    O quadro clínico dessa poxvirose é compatível com o quadro clínico do

    Cowpox virus em humanos, descrito por BAXBY et al (1994), mas com maior

    virulência, como os ocasionados por Vaccinia-like virus, em surtos de poxviroses,

    descritos por (DAMASO et al., 2000, TRINDADE et al., 2003, LEITE, 2003 e

    NAGASSE-SUGAHARA et al., 2004).

    Tabela 18. Distribuição dos casos de poxviroses, segundo localização das lesões nos ordenhadores do Sul do Estado do Espírito Santo, no período de agosto de 2002 a maio de 2005.

    Localização da lesão N° de ordenhadores % Mão 57 85,01

    Mão e Braço 06 8,95 Mão e Perna 02 3,02 Mão e Boca 01 1,51

    Mão e Escroto 01 1,51 Total 67 100

    Na Tabela 18 verifica-se, que 100% apresentaram lesões nas mãos. Dentre

    esses, 85,01% apresentaram lesões somente na mão. O restante apresentava além

    das lesões nas mãos, lesões no braço, na perna, boca e escroto; indicando a mão

    como local inicial e disseminador do vírus para as outras partes do corpo.

  • 47

    L

    L

    L L

    L

    Figura 6. Lesões pústulo-vesiculares ulcerativas nas mãpoxvirose no Sul do Espírito Santo. 6.A. Lesão com 10 diavesícula; 6.C. Lesão com 20 dias; 6.D. Lesão com 20 dias6.F. Lesão com 20 dias

    Figura 6.B. esão 15 dias

    Figura 6.A. esão 10 dias

    Figura 6.C. esão 20 dias

    L

    Figura 6.E.

    esões 20 dias

    Figura 6.D. esão 20 dias

    os;

    Figura 5.F. esão 20 dias

    s de ordenhadores com ; 6.B. Lesão com 15 dias 6.E. Lesões com 20 dias;

  • 48

    Comparando as Tabelas 13 e 18, pode-se observar que a região mais

    acometida dos animais é a teta e dos ordenhadores as mãos, evidenciando que

    essa seria a principal forma de disseminação do bovino ao homem e do homem aos

    animais, uma vez que o ordenhador trabalha em contato direto com a teta. Esses

    dados corroboram com os dados de TIMMS et al. (1998) e WELBLEN (2002), para

    as outras poxviroses bovinas do gado leiteiro e zoonoticas para homem.

    Tabela 19. Distribuição dos casos de poxviroses, segundo idade e sexo dos ordenhadores do Sul do Estado do Espírito Santo, no período agosto de 2002 a maio de 2005. Sexo Masculino Feminino Total Faixa etária n° % n° % n° % % acumulada

    10 - 14

    07

    10,94

    00

    -

    7

    10,45

    10,45

    15 - 19 07 10,94 01 33,33 8 11,94 22,39 20 - 24 09 14,06 01 33,33 10 14,92 37,31 25 - 29 12 18,75 00 - 12 17,91 55,22 30 - 34 06 9,38 00 - 6 8,96 64,18 35 - 39 13 20,32 01 33,33 14 20,89 85,07 40 - 44 05 7,81 00 - 5 7,46 92,53 45 - 49 01 1,56 00 - 1 1,49 94,02 50 - 54 01 1,56 00 - 1 1,49 95,51 55 - 59 01 1,56 00 - 1 1,49 97 60 - 64

    02 3,12 00 - 2 3,00 100

    Total 64 95,52 03 4,48 67 100 100 Quando se observa a Tabela 19, verifica-se que os casos ocorreram em

    indivíduos de 10 a 64 anos, sendo que 92,53% concentraram-se em indivíduos com

    menos de 44 anos, principalmente na faixa etária de 35 a 39 anos correspondente a

    20,89% dos casos. Quanto ao sexo, 95,52% se deram em indivíduos do sexo

    masculino. Esses dados refletem e estão de acordo com o perfil do trabalhador

    pecuarista do Espírito Santo, que em sua maioria são homens na faixa etária de 25

    a 39 anos, segundo censo demográfico do IBGE em 2000.

    4.6. Isolamento viral em MCA e células Vero Coletou-se um total de 50 amostras de crostas, nos diferentes municípios acometidos, sendo 03 de ordenhadores e 47 de bovinos de leite. Todas as 50

    amostras foram maceradas e inoculadas na membrana corialantóide de ovos

  • 49

    embrionados de galinha (MCA) com 10 dias de vida (MCA`s), onde, após 72 horas,

    todas as MCA`s apresentaram lesões brancas e opacas, não hemorrágicas,

    característica de infecção por Orthopoxvirus, como descrito por FENNER et al