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1 Estudo em Túnel de Vento da Cobertura do Estádio Beira-Rio, Porto Alegre Acir Mércio Loredo-Souza, Marcelo Maia Rocha, Mario Gustavo Klaus Oliveira, Gustavo Menna Barreto Klein, Maria Cristina Dolz Bênia, Guilherme Martins Siqueira Pesquisadores do Laboratório de Aerodinâmica das Construções, Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil. [email protected] Charles A. Simon, Luiz Eduardo Pillar da Silva Diretores da Simon Engenharia, Porto Alegre, RS, Brasil, [email protected] Resumo: Este trabalho apresenta a descrição do estudo, em modelo reduzido, das ações estática e dinâmica do vento sobre a nova cobertura do Estádio Beira-Rio, a ser construída na cidade de Porto Alegre, RS. A análise dinâmica foi realizada a partir de registros dinâmicos de pressões, integrados em alta freqüência, com o método HFPI (high frequency pressure integration method). O HFPI é um método de análise que combina pressões dinâmicas, medidas experimentalmente em túnel de vento, com um modelo dinâmico teórico-numérico da estrutura, permitindo uma estimativa das amplitudes de deslocamentos, velocidades e acelerações que ocorrerão em resposta às flutuações das pressões aerodinâmicas. O método compreende, portanto, as possíveis amplificações dinâmicas decorrentes de efeitos ressonantes, associados tanto à turbulência atmosférica quanto ao desprendimento de vórtices, que podem produzir na estrutura esforços maiores do que aqueles estimados em uma análise estática convencional. Maiores níveis de segurança e confiabilidade são atingidos quando a consideração criteriosa dos efeitos do vento é feita a partir da etapa de concepção, podendo inclusive levar a alterações arquitetônicas na forma externa da construção. Este processo preventivo é, geralmente, o de menor custo e o de maior eficiência. O ensaio em túnel de vento do modelo do Estádio Beira-Rio foi realizado na fase de projeto. O solicitante foi Sport Club Internacional e os ensaios realizados no Laboratório de Aerodinâmica das Construções da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. O trabalho apresenta a análise dos principais resultados do estudo, bem como evidencia os benefícios da utilização do túnel de vento como ferramenta de projeto para estruturas, coberturas e fechamentos, viabilizando a construção de edificações com arrojados projetos arquitetônicos. Palavras-chave: Vento, Estrutura Metálica, Cobertura, Estádio, Túnel de Vento, Vibrações. CONSTRUMETAL – CONGRESSO LATINO-AMERICANO DA CONSTRUÇÃO METÁLICA São Paulo – Brasil – 31 de agosto a 02 de setembro 2010

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Estudo em Túnel de Vento da Cobertura do Estádio Beira-Rio,

Porto Alegre

Acir Mércio Loredo-Souza, Marcelo Maia Rocha, Mario Gustavo Klaus Oliveira,

Gustavo Menna Barreto Klein, Maria Cristina Dolz Bênia, Guilherme Martins Siqueira

Pesquisadores do Laboratório de Aerodinâmica das Construções, Universidade

Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil. [email protected]

Charles A. Simon, Luiz Eduardo Pillar da Silva

Diretores da Simon Engenharia, Porto Alegre, RS, Brasil, [email protected]

Resumo:

Este trabalho apresenta a descrição do estudo, em modelo reduzido, das ações estática

e dinâmica do vento sobre a nova cobertura do Estádio Beira-Rio, a ser construída na cidade

de Porto Alegre, RS. A análise dinâmica foi realizada a partir de registros dinâmicos de

pressões, integrados em alta freqüência, com o método HFPI (high frequency pressure

integration method). O HFPI é um método de análise que combina pressões dinâmicas,

medidas experimentalmente em túnel de vento, com um modelo dinâmico teórico-numérico

da estrutura, permitindo uma estimativa das amplitudes de deslocamentos, velocidades e

acelerações que ocorrerão em resposta às flutuações das pressões aerodinâmicas. O método

compreende, portanto, as possíveis amplificações dinâmicas decorrentes de efeitos

ressonantes, associados tanto à turbulência atmosférica quanto ao desprendimento de vórtices,

que podem produzir na estrutura esforços maiores do que aqueles estimados em uma análise

estática convencional.

Maiores níveis de segurança e confiabilidade são atingidos quando a consideração

criteriosa dos efeitos do vento é feita a partir da etapa de concepção, podendo inclusive levar a

alterações arquitetônicas na forma externa da construção. Este processo preventivo é,

geralmente, o de menor custo e o de maior eficiência. O ensaio em túnel de vento do modelo

do Estádio Beira-Rio foi realizado na fase de projeto. O solicitante foi Sport Club

Internacional e os ensaios realizados no Laboratório de Aerodinâmica das Construções da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS. O trabalho apresenta a análise

dos principais resultados do estudo, bem como evidencia os benefícios da utilização do túnel

de vento como ferramenta de projeto para estruturas, coberturas e fechamentos, viabilizando a

construção de edificações com arrojados projetos arquitetônicos.

Palavras-chave:

Vento, Estrutura Metálica, Cobertura, Estádio, Túnel de Vento, Vibrações.

CONSTRUMETAL – CONGRESSO LATINO-AMERICANO DA CONSTRUÇÃO METÁLICASão Paulo – Brasil – 31 de agosto a 02 de setembro 2010

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1 Introdução

A primeira parte deste trabalho apresenta a descrição do estudo, em modelo reduzido,

da ação estática do vento sobre a Nova Cobertura do Estádio Beira-Rio, a ser construída em

Porto Alegre, RS, e mostrada na figura 1. A segunda parte do trabalho apresenta a descrição

do estudo da ação dinâmica do vento. Esta análise dinâmica foi realizada a partir de registros

dinâmicos de pressões, integrados em alta freqüência, com o método HFPI (high frequency

pressure integration method). O HFPI é um método de análise que combina pressões

dinâmicas, medidas experimentalmente em túnel de vento, com um modelo dinâmico teórico-

numérico da estrutura, permitindo uma estimativa das amplitudes de deslocamentos,

velocidades e acelerações que ocorrerão em resposta às flutuações das pressões

aerodinâmicas. O método compreende, portanto, as possíveis amplificações dinâmicas

decorrentes de efeitos ressonantes, associados tanto à turbulência atmosférica quanto ao

desprendimento de vórtices, que podem produzir na estrutura esforços maiores do que aqueles

estimados em uma análise estática convencional.

Figura 1 – Perspectiva artística da Nova Cobertura do Estádio Beira-Rio.

A estrutura tem características que a classificam como cobertura isolada e, portanto,

está sujeita aos fenômenos aerodinâmicos inerentes a este tipo de edificação. Para coberturas

isoladas o vetor velocidade do vento, em um dado instante, pode ter uma direção inclinada no

plano vertical, pela composição da velocidade média, horizontal, com a componente vertical

da turbulência. Assim, para intervalos de tempo de alguns segundos, o vento pode soprar com

uma inclinação que se situa entre +10o e -10

o. Estes limites podem inclusive ser ultrapassados

em temporais com turbulência muito elevada (Blessmann, 1990). Do ponto de vista

aerodinâmico, para coberturas isoladas, pode-se considerar o vento soprando horizontalmente

e a cobertura girando de +10o e -10

o (isto não é válido para coberturas sobre paredes). A

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conseqüência prática deste fenômeno é que diferentes padrões de carregamento são

fisicamente possíveis de ocorrer na mesma estrutura, para a mesma direção do vento médio

incidente.

Neste estudo foram determinados distintos padrões de carregamento para ventos

oriundos de tormentas EPS (Blessmann, 1995), tomando como base fatores de pico medidos

nos ensaios em túnel de vento e admitindo correlações distintas entre as pressões medidas na

face externa e interna. Valores distintos podem ser utilizados, caso justificados (Ginger e

Letchford, 1992). Também foram apresentadas sugestões de padrões de carregamento para

um vento simulando uma tormenta TS tipo micro-explosão (Blessmann, 1995 e Fujita, 1985).

Os resultados apresentados são válidos somente para a configuração arquitetônica final

solicitada para o estudo, ou seja, a cobertura completa. O estudo específico da ação do vento

na cobertura para etapas construtivas e construção parcial da mesma não foi solicitado.

Configurações distintas da cobertura estudada, incluindo a construção parcial da cobertura,

podem alterar significativamente os padrões de carregamento apresentados.

É importante salientar que durante o presente estudo, em virtude de respostas

ressonantes excessivas, foi alterada a estrutura da cobertura inicialmente proposta. Além de

uma pequena redução do vão em balanço, as alterações compreenderam a inclusão de

elementos de travamento adicionais, conforme projeto da Simon Engenharia, o que

aproximadamente dobrou a freqüência fundamental de vibração livre (primeiro modo) e,

portanto, resultou em uma estrutura notavelmente mais rígida. Neste trabalho são

apresentados, para fins comparativos, os resultados obtidos com as duas versões da estrutura.

Por razões de sigilo nesta etapa do processo, apenas resultados ilustrativos são

apresentados. Os resultados definitivos podem ser obtidos diretamente com o Sport Club

Internacional, solicitante do estudo.

Maiores níveis de segurança e confiabilidade são atingidos quando a consideração

criteriosa dos efeitos do vento é feita a partir da etapa de concepção, podendo inclusive levar a

alterações arquitetônicas na forma externa da construção. Este processo preventivo é,

geralmente, o de menor custo e o de maior eficiência. O ensaio em túnel de vento do modelo

da cobertura do Estádio Beira-Rio foi realizado na fase de projeto da referida estrutura. Os

ensaios foram realizados no Laboratório de Aerodinâmica das Construções da Universidade

Federal do Rio Grande do Sul (Blessmann, 1982 e Cook, 1990).

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2 Programa Experimental

Foi construído um modelo reduzido da cobertura, em escala 1/500, para medição das

pressões nas faces externa e interna da cobertura. A face externa da cobertura foi

instrumentada com 956 tomadas de pressão e na face interna da cobertura foram colocadas

528 tomadas de pressão, perfazendo um total de 1.484 tomadas de pressão. Fotografias do

modelo ensaiado são mostradas na figura 2.

As tomadas foram posicionadas de modo a possibilitar um levantamento da

distribuição das pressões ao longo de toda a edificação. As pressões instantâneas foram

medidas a cada 15o de incidência do vento, com um total de 41.552 medidas de pressão,

considerando-se ensaios adicionais com a simulação detalhada da topografia local.

A cobertura é constituída por 65 módulos, os quais foram divididos em zonas,

correspondentes às zonas de atuação dos coeficientes de forma C, obtidos no estudo.

Foram simulados todos os detalhes significativos da edificação real para que as

condições de semelhança geométrica fossem preservadas. Algumas simplificações foram

realizadas no modelo para que certos detalhes arquitetônicos não afetassem localmente as

medidas em determinadas tomadas de pressão, principalmente devido aos efeitos do número

de Reynolds (Re) na distribuição de pressões sobre superfícies curvas.

Figura 2 – Fotografias do modelo reduzido da nova cobertura do Estádio Beira-

Rio no interior do túnel de vento.

As pressões externas em superfícies curvas dependem da localização dos pontos de

separação do escoamento, os quais variam com a velocidade do vento, características de sua

turbulência, dimensões e relação entre as dimensões da edificação, curvatura da superfície

externa da cobertura e sua rugosidade. A distribuição das pressões adimensionais sobre

modelos reduzidos é garantida, portanto, pela preservação de Re nos ensaios, além da

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colocação, no caso de superfícies curvas, de um determinado tipo de rugosidade na superfície

da cobertura do modelo que provoque transição no regime de escoamento para um Re

equivalente. Um aumento da turbulência do escoamento provoca efeito semelhante ao de um

aumento na rugosidade superficial, porém devem ser verificadas as conseqüências das

alterações nas escalas da turbulência.

O número de Reynolds influencia a forma do escoamento e, conseqüentemente, a

distribuição de pressões e a força exercida sobre o sólido imerso no escoamento. O número de

Reynolds é definido como Re = V l / , sendo V a velocidade do vento, l uma dimensão

característica e a viscosidade cinemática do ar, a qual pode ser considerada

aproximadamente constante para pequenas variações de temperatura. Então, para uma

determinada dimensão característica l, Re depende fundamentalmente da velocidade, ou seja,

quando se varia a velocidade, Re sofre uma variação equivalente. O efeito da variação do

coeficiente de arrasto Ca com Re para um cilindro de secção circular é indicado de forma

qualitativa na figura 3 (Scruton e Rogers, 1971) a qual também mostra a diferença entre os

valores de Ca para corpos com arestas vivas e com superfícies curvas. É interessante ressaltar

que em certos casos forças maiores podem resultar de velocidades menores conforme o valor

de Ca. Além disso, tanto a rugosidade da superfície do corpo em estudo quanto a turbulência

do escoamento incidente, causam alterações na referida curva Ca x Re. Desta forma,

extrapolações de dados obtidos para superfícies curvas específicas, sejam chaminés, tubos,

torres ou coberturas, não são recomendadas.

Os ensaios foram realizados no túnel de vento Prof. Joaquim Blessmann da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Blessmann, 1982 e Cook, 1990), mostrado na

figura 4. Trata-se de um túnel de vento de camada limite de retorno fechado, projetado

especificamente para ensaios estáticos e dinâmicos de modelos de construções civis. Este

túnel permite a simulação das principais características de ventos naturais. Tem relação

“comprimento / altura” da câmara de ensaios superior a 10. A velocidade do escoamento de ar

nesta câmara, com vento uniforme e sem modelos, ultrapassa 160 km/h. A simulação correta

das principais características do vento natural em túneis de vento é requisito básico para

aplicações em Engenharia Civil (Davenport e Isyumov, 1967), sem a qual os resultados

obtidos podem se afastar consideravelmente da realidade.

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Figura 3 – Influência da variação do número de Reynolds sobre o coeficiente de

arrasto de acordo com a forma da seção transversal. Os números 1, 2 e 3 na última

figura representam rugosidades diferentes da superfície da seção circular e têm efeito

semelhante ao de uma variação da turbulência no escoamento incidente.

Figura 4 - Túnel de Vento Professor Joaquim Blessmann do LAC/UFRGS.

De acordo com as características da rugosidade do terreno em torno do

empreendimento (Categorias I a IV da NBR-6123(1988)), foram simulados dois tipos de

vento, com perfis potenciais de velocidades médias de expoentes p iguais a 0,11 (rugosidade

representativa da Categoria I) e 0,23 (rugosidade entre as Categorias III e IV). Para alguns

ângulos de incidência do vento foi utilizado um vento mais turbulento para os ensaios, dentro

das características dos terrenos de entorno, para satisfazer os requisitos de número de

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Reynolds descritos no item anterior. As características das rugosidades dos terrenos citados

são as seguintes:

Categoria I: Superfícies lisas de grandes dimensões, com mais de 5km de extensão,

medida na direção e sentido do vento incidente.

Exemplos:

mar calmo*;

lagos e rios;

pântanos sem vegetação.

*Para mar agitado o valor do expoente p para uma hora pode chegar a 0,15, em ventos

violentos. Em geral, p = 0,12.

Categoria II – terreno aberto em nível ou aproximadamente em nível, com poucos

obstáculos isolados tais como árvores e edificações baixas.

Exemplos:

zonas costeiras planas;

pântanos com vegetação rala;

campos de aviação;

pradarias e charnecas;

fazendas sem sebes ou muros.

A cota média do topo dos obstáculos é considerada inferior ou igual a 1,0m.

Categoria III – terreno plano ou ondulado com obstáculos, tais como sebes e muros,

poucos quebra-ventos de árvores, edificações baixas e esparsas.

Exemplos:

granjas e casas de campo, com exceção das partes com matos;

fazendas com sebes e/ou muros;

subúrbios a considerável distância do centro, com casas baixas e esparsas;

A cota média do topo dos obstáculos é considerada igual a 3,0m.

Categoria IV – terreno coberto por obstáculos numerosos e pouco espaçados, em zona

florestal, industrial ou urbanizada.

Exemplos:

zonas de parques e bosques com muitas árvores;

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cidades pequenas e seus arredores;

subúrbios densamente construídos de grandes cidades;

áreas industriais plena ou parcialmente desenvolvidas.

A cota média do topo dos obstáculos é considerada igual a 10m. Esta categoria inclui

também zonas com obstáculos maiores e que ainda não possam ser consideradas na Categoria

V.

Os ventos simulados englobam a gama de rugosidades existentes. Considerando-se as

características do local em estudo e do terreno próximo ao Estádio Beira-Rio, optou-se por

testar o modelo para ventos incidentes com estas características. Em torno do modelo

instrumentado foram reproduzidas as características topográficas do terreno, na escala do

modelo, para que as condições de escoamento correspondessem o mais fielmente possível às

condições reais às quais a edificação testada estará sujeita depois de concluída. Com o correr

dos anos há tendência de aumento da rugosidade das zonas construídas devido a prováveis

futuras urbanizações, o que poderá causar alguma redução nos esforços estáticos em algumas

zonas da edificação. Por outro lado, possíveis efeitos dinâmicos nocivos podem ocorrer pela

construção futura de outras edificações nas cercanias imediatas da edificação em estudo.

Na recomposição do carregamento é permitida a utilização de rugosidades distintas,

desde que devidamente justificadas através de um estudo específico. Este estudo deve

considerar a possibilidade de transições nas rugosidades dos terrenos mais afastados.

As principais características dos ventos simulados podem ser obtidas de Loredo-

Souza, A.M. e Rocha, M.M. (2009), apresentando os perfis verticais das velocidades médias,

em porcentagem da velocidade média no eixo longitudinal do túnel (pontos experimentais e

curva potencial teórica), intensidades (I1) e macro-escalas (L1) das componentes

longitudinais da turbulência [ESDU, 1982].

As pressões no modelo foram registradas por meio de transdutores elétricos de

pressão. Um exemplo de registro das pressões é mostrado na figura 5. Foram registradas as

pressões para cada ponto de medição indicado, sendo obtidos os valores mínimos, médios,

máximos e rms dos coeficientes de pressão. As figuras 6, 7 e 8 apresentam graficamente

alguns dos carregamentos, em [kPa].

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Figura 5 - Registro da variação da pressão ao longo do tempo, a partir dos

transdutores elétricos de pressão, para a tomada 610 e ângulo de incidência do vento de

90° (Vento com expoente p=0,11).

Figura 6 – Exemplo de diagrama com distribuição de pressões [kPa].

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Figura 7 – Exemplo de diagrama com distribuição de pressões [kPa].

Figura 8 – Exemplo de diagrama com distribuição de pressões [kPa].

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3 A Técnica Experimental HFPI

Diferentemente de uma simples análise de pressões médias, no método de integração

de pressões em alta freqüência (High Frequency Pressure Integration - HFPI) são

diretamente utilizadas as pressões medidas através de sensores eletrônicos e registradas

através de um sistema de aquisição de dados. Os registros de pressões consistem, portanto, em

um grande número de séries temporais correlacionadas, que incorporam as densidades

espectrais e funções de coerência corretas para o vento natural simulado. As pressões

aerodinâmicas no modelo foram, portanto, registradas por meio destes transdutores elétricos,

conforme já mostrado na figura 5.

Resulta, portanto, que a admitância aerodinâmica, uma função dependente da

freqüência que transforma a flutuação da velocidade do vento em uma flutuação de força

aerodinâmica, está automaticamente considerada na integração. Esta função de admitância

reflete, entre outros aspectos, as correlações da flutuação de pressões para a região da

edificação onde estas pressões estão sendo integradas. Por exemplo, para uma região de

integração correspondente a um pavimento de edifício alto, a admitância aerodinâmica

incorpora as correlações entre as flutuações de pressão a barlavento e sotavento, que não

seriam consideradas se fossem utilizados coeficientes de pressão média aplicados a uma

velocidade de rajada.

A integração de pressões, embora matematicamente simples, requer maciço trabalho

de processamento numérico. Ressalta-se que o esforço computacional é muito grande, já que

as pressões medidas em 1.484 tomadas são convertidas em três componentes de força atuando

em 12.735 nós (estrutura inicial) ou 10.684 nós (estrutura aperfeiçoada). Estas pressões são

descritas como séries temporais com 8.192 pontos, e, portanto levarão a respostas estruturais

(em deslocamentos) também em 8.192 instantes de tempo, sobre os quais são estimadas

estatísticas tais como deslocamento médio, rms, picos máximos e mínimos.

As propriedades dinâmicas foram fornecidas pelos projetistas e são ilustradas nas

figuras 9a e 10a (estrutura inicialmente proposta) e figuras 9b e 10b (estrutura aperfeiçoada).

Consideram-se relevantes os modos que podem ser excitados pela flutuação das forças e

momentos resultantes da integração de pressões. A NBR-6123 – “Forças devidas ao vento em

edificações” recomenda que sejam analisadas dinamicamente todas as estruturas com

freqüência fundamental de vibração livre inferior a 1Hz. Isto se justifica pelo baixo conteúdo

de energia apresentado pela turbulência atmosférica acima desta freqüência. A partir deste

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critério, pode-se concluir que são relevantes todos os modos de vibração associados a

freqüências próximas ou inferiores a 1Hz.

O cálculo da resposta dinâmica é feito através do método de Superposição Modal, que

faz uso da distribuição de massa e das formas modais e freqüências naturais de vibração livre

fornecidas pelos projetistas. Para tanto as forças são convertidas em forças modais, através de

uma projeção algébrica que utiliza as formas modais fornecidas. Esta projeção resulta em

equações diferenciais de equilíbrio dinâmico escalares desacopladas, uma para cada modo de

vibração, cujas soluções são obtidas por um método numérico, como por exemplo, o Método

de Duhamel, e posteriormente superpostas para compor a solução final. Seguindo os mesmos

critérios que embasam o Capítulo 9 da NBR-6123, o cálculo da resposta estrutural é feito por

superposição de respostas modais.

(a) (b)

Figura 9 – Formas modais do primeiro modo e respectivas frequencias de

vibração livre para (a) a estrutura inicialmente proposta e (b) a estrutura aperfeiçoada.

(a) (b)

Figura 10 – Formas modais do segundo modo e respectivas e frequencias de

vibração livre para (a) estrutura inicialmente proposta e (b)estrutura aperfeiçoada.

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4 Conclusões

Do ponto de vista do estudo estático, os valores dos coeficientes de pressão para a

cobertura do Estádio Beira-Rio, obtidos nos ensaios em túnel de vento, são coerentes do ponto

de vista aerodinâmico com relação à forma da edificação estudada e de sua vizinhança.

Contudo, os resultados obtidos são válidos somente para a configuração arquitetônica final

solicitada para o estudo, ou seja, a cobertura completa, e para ventos EPS. Os estudos

específicos da ação do vento na cobertura para etapas construtivas e construção parcial da

mesma, bem como para outros tipos de escoamento, não foram solicitados. Configurações

distintas da cobertura estudada, incluindo a construção parcial da cobertura, podem alterar

significativamente os padrões de carregamento apresentados.

Com relação ao estudo da resposta dinâmica, em virtude da grande quantidade de

dados que representam os resultados, foi necessária sua apresentação de forma sintetizada por

estatísticas de deslocamentos modais e estatísticas de deslocamentos resultantes

(superpostos). São particularmente relevantes os valores máximos observados na direção Z

(vertical). Para a estrutura originalmente proposta o maior deslocamento vertical é de 1,13m

com o vento na direção 90o. Após as modificações introduzidas pelos projetistas, esta

amplitude foi reduzida para aproximadamente um terço, para 0,39m com o vento incidindo a

60o. Esta redução drástica se deve ao aumento expressivo da rigidez estrutural, que fez a

freqüência fundamental aumentar de 0,77Hz para 1,5Hz, portanto fora do alcance de efeitos

ressonantes pela turbulência atmosférica.

Foram calculadas as respostas estruturais em cada modo de vibração. A maior

amplitude para a estrutura aperfeiçoada, igual a 0,25m, ocorre no oitavo modo e representa,

portanto, a principal contribuição para o valor total superposto de 0,39m. Este oitavo modo

consiste em um deslocamento vertical predominante para todos os nós da estrutura. Ressalta-

se, contudo, que esta resposta estrutural é quasi-estática, já que a freqüência natural de

1,84Hz associada não implica em efeitos ressonantes.

Finalmente, conclui-se este trabalho com a constatação de que as modificações

introduzidas pelos projetistas na estrutura, e o conseqüente aumento das freqüências

fundamentais de vibração livre, reduziram a possibilidade de efeitos ressonantes devidos às

flutuações de pressão aerodinâmica. Conseqüentemente, o dimensionamento estrutural

realizado com os carregamentos estáticos fornecidos pelo LAC na primeira fase do estudo

resulta ser adequado e suficiente para a configuração construtiva referente à cobertura

completa.

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5 Agradecimentos

Os autores agradecem a atenção dispensada pelo Sport Club Internacional, pela Hype

Studio e pela Santini & Rocha Arquitetos, bem como pela Vanguarda Sistemas Estruturais

Abertos Engenharia.

6 Referências Bibliográficas

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