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ARTIGO * PALAVRAS-CHAVE: Cultura gerencial de empresas ru- rais, estratégias empresariais, administração estratégica. CULTURA GERENCIAL E " ESTRATEGIAS EMPRESARIAIS: " UM ESTUDO EM EMPRESAS AGROPECUARIAS • German Torres Salazar Doutor em Administração pela USP e Professor de Teoria Geral da Administração da Escola Superior de Agricultura de Lavras, MG. * RESUMO: Este trabalho estuda a influência da cultura gerencial dos proprietários-administradores sobre as estra- tégias empresariais em empresas rurais. O estudo foi reali- zado em 35 dentre as maiores empresas agropecuárias no Sul e na Zona da Mata do estado de Minas Gerais. O levan- tamento de dados foi realizado através de entrevistas. O tra- tamento estatístico dos dados demonstrou, a nível de signi- ficância de 5%, que existe influência da cultura gerencial sobre a implementação e operacionalização das estratégias empresariais. 28 Revista de Administração de Empresas ----------- ----- * ABSTRACT: This paper approaches the relationship between management culture and business strategies in farms. This study was brought about in 35 big farms from South and Zona da Mata of the State of Minas Gerais. The statistical analysis at 5% leoel of significance demonstrates that exists relationship between management culture and implementation of business strategies. * KEY WORDS: Management culture, business strategies, strategic administration. São Paulo, 32(5):28-37 Nov./Dez.1992

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Page 1: ESTUDO EM EMPRESAS AGROPECUARIAS...voltado para um fim, formado por partes inter-relacionadas. Em vez de ter uma visão separada das várias partes de uma organização, a visão sistêmica

ARTIGO

* PALAVRAS-CHAVE: Cultura gerencial de empresas ru-rais, estratégias empresariais, administração estratégica.

CULTURA GERENCIAL E"ESTRATEGIAS EMPRESARIAIS:

"UM ESTUDO EM EMPRESAS AGROPECUARIAS

• German Torres SalazarDoutor em Administração pela USP e Professor de TeoriaGeral da Administração da Escola Superior de Agriculturade Lavras, MG.

* RESUMO: Este trabalho estuda a influência da culturagerencial dos proprietários-administradores sobre as estra-tégias empresariais em empresas rurais. O estudo foi reali-zado em 35 dentre as maiores empresas agropecuárias noSul e na Zona da Mata do estado de Minas Gerais. O levan-tamento de dados foi realizado através de entrevistas. O tra-tamento estatístico dos dados demonstrou, a nível de signi-ficância de 5%, que existe influência da cultura gerencialsobre a implementação e operacionalização das estratégiasempresariais.

28 Revista de Administração de Empresas

----------- -----

* ABSTRACT: This paper approaches the relationshipbetween management culture and business strategies infarms. This study was brought about in 35 big farms fromSouth and Zona da Mata of the State of Minas Gerais. Thestatistical analysis at 5% leoel of significance demonstratesthat exists relationship between management culture andimplementation of business strategies.

* KEY WORDS: Management culture, business strategies,strategic administration.

São Paulo, 32(5):28-37 Nov./Dez.1992

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CULTURA GERENCIAL E ESTRATÉGIAS EMPRESARIAIS ...

INTRODUÇÃO

A observação comum e a pesquisa emadministração demonstram, ambas, queos empresários rurais apresentam com-portamento gerencial que não é livre devalores pessoais. Isto é, eles têm prefe-rência por certos tipos de comportamen-to. A observação comum revela, porexemplo, que os empresários rurais ado-tam a estratégia empresarial de sobrevi-vência. A pesquisa em administração evi-dencia que esse tipo de estratégia é ado-tado pelo empresário quando não existeoutra alternativa, ou seja, apenas quandoo ambiente e a empresa estão em situaçãoinadequada. Assim, se os preços dos in-sumos das produções pecuária e/ouagrícola aumentarem, os empresários ru-rais vão diminuir imediatamente a suaprodução. Eles adotam essa estratégia desobrevivência por receio das conseqüên-cias financeiras decorrentes da falta de li-quidez e rentabilidade.

Neste trabalho, discute-se o sistema deculturas gerenciais dos administradoresrurais que determinam sua preferênciapor assumir um tipo específico de estra-tégia operacional. Em outras palavras,discute-se a correlação do sistema de va-lores gerenciais (cultura gerencial) e a co-ordenação operacional e empresarial faceao ambiente inflacionário brasileiro. Aessa correlação chamar-se-á administra-ção rural estratégica.

CONCEITOS E DEFINIÇOES1.Administração estratégica

De acordo com Caj', "as transformaçõesna sociedade brasileira, as mudanças econô-micas e as variáveis tecnológicas foram fato-res que estimularam o desenvolvimento denovas formas de administração, entre asquais a busca de flexibilidade e oportunida-des estratégicas". Essas novas formas deadministração induzem os proprietá-rios-administradores a administrarem aempresa não só para dentro, mas tam-bém para fora. Administrar para dentrosignifica que o gerente limitar-se-á a to-mar decisões que facilitem o trabalhoprodutivo (teoria clássica da administra-ção) e o aumento da satisfação e motiva-ção do trabalhador (teoria neoc1ássicadaadministração). Administrar para fora

significa que o proprietário-administra-dor preocupar-se-á com o ambiente emque sua empresa está inserida. Isto é, aadministração terá necessidade de infor-mações sobre a inflação, a política, osconcorrentes dentro e fora do país, asnovas tecnologias etc.

• • • • • • • • • • • • • • • • • • • •Percebeu-se que os

administradores precisavam clarear ecompreender de modo mais eficaz o

lado humano das organizações,isto é, "as pessoas".

• • • •• • •• • • ••• • • • • • • •Portanto, administração estratégica

não é só administrar para dentro (coorde-nação operacional de produção, marke-ting, pessoal etc.), mas também adminis-trar para fora: uma postura empresarialque encare com sucesso o ambiente detransformações. Assim sendo, as atitudesdo administrador-proprietário serão de"empreendedor" empenhado nos investi-mentos em novos produtos, bem comonos fatores e recursos disponíveis. Paratanto, o administrador-proprietário deve-rá possuir sentido de qualidade de toda aempresa e reconhecimento da pressãoexercida pelo ambiente externo.

2.Elementos da administração estratégica

Pelo exposto anteriormente, adminis-trar estrategicamente, em suma, envolveadaptação a mudanças. Isto é, o proprie-tário-administrador não pode dedicar oseu tempo apenas aos problemas de hoje,mas também aos de amanhã. Ele deve an-tecipar o amanhã e preparar-se para ele.No entanto, o objetivo do proprietário-ad-ministrador não é determinar o amanhã,mas a direção que se pretende seguir, istoé, buscará acompanhar uma linha geralpara se adaptar às mudanças, às transfor-mações, às novas tecnologias etc.

Quando o proprietário-administradorseleciona uma determinada estratégia emsintonia com seu sistema de valores, im-plica a especificação dos elementos daadministração estratégica, a saber: objeti-vos, estratégias e fatores externos.

© 1992, Revista de Administração de Empresas / EAESP / FGV, São Paulo, Brasil.

1. GAJ, Luis. Administrafã~ Es-tratégica. São Paulo, Ed. Atica,1987, p. 11.

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l1~nARTIGO

EO quehá no

ambiente?

o objetivo é o alvo (situação) ou pontoquantificado, com prazo de realização,que se pretende alcançar através do es-forço e/ou estratégia operacional. Aquise determina para onde a empresa devedirigir seu esforço.

A estratégia é o ajustamento da empre-sa ao seu ambiente, é a açãoIinstrumentousado pela empresa para conseguir o seuobjetivo.

O conjunto de todos os fatores exter-nos à empresa chama-se ambiente em-presarial que, de forma direta ou indire-ta, proporciona ou recebe influência daempresa.

Convencionalmente, os elementos daadministração estratégica são operacio-nalizados através do conhecimento, porparte do proprietário-administrador, das:

• Oportunidades: forças ambientais in-controláveis pela empresa, que podemfavorecer a sua ação estratégica, desdeque conhecidas e aproveitadas satisfa-toriamente;

Os componentes primáriosda estratégia empresarial

Objetos da empresa

I \f1

O quetemos naempresa?: Análise

I ambiental,

Análiseorganizacional

I \Oportunidades, ameaças,

restrições, coações econtingências

\Pontos fortes e pontos fracos,

recursos disponíveis,capacidade e habilidades

I--O que fazer?Como compatibilizar todas as variáveis envolvidas?

3D

Fonte: CHIAVENATO, J. Administração: teoria, processo e prática. São Paulo, McGraw Hill, 1985.

• Ameaças: forças ambientais incontrolá-veis pela empresa, que criam obstácu-los à sua ação estratégica, mas que po-derão ou não ser evitadas desde queconhecidas em tempo hábil;

• Ponto forte: diferenciação conseguidapela empresa, que lhe proporcionavantagem operacional no ambiente em-presarial e é variável controlável pelaempresa;

• Ponto fraco: situação inadequada da cul-tura da empresa, que lhe proporcionadesvantagem operacional no ambienteempresarial,mas é variável controlável.

A inter-relação dos conceitos discuti-dos acima é demonstrada na figura 1. Naparte superior esquerda dessa figura, lê-se: "Oque há no ambiente?" No ambientehá oportunidades (do mercado), bemcomo as restrições, limitações e ameaças.Na parte superior direita, lê-se: "O quetemos na empresa?" Na empresa temosos recursos (trabalho, capital etc.), cultu-ras e habilidades administrativas, bemcomo pontos fortes e fracos.

MODELO TEÓRICOPROPOSTO

1.Delimitação teórica do problema

A evolução do estado da arte em orga-nizações configurou-se em quatro teoriasabrangentes: clássica, neoclássica, de sis-temas e contemporânea.

Cada uma focaliza um aspecto das or-ganizações, tal cornomostrado na figura 2.

As teorias clássica,neoclássicae de siste-mas focalizam o que têm as organizações(coluna2 da figura 2).Já a teoriacontempo-rânea, chamada de administração estratégi-ca,enfatizao ambiente e a organização.

A teoria clássicadeu ênfase à organiza-ção (estrutura) e métodos que possibili-tasse a realização do trabalho produtivo.

Conseqüentemente, ressaltou-se a pro-dutividade, a máquina, a organização e oexercícioda supervisão operacional.

Os estudos da teoria clássica concen-tram-se tambérn na análise das atividadesdas organizações, isto é, o conhecimentoda estrutura da departamentalização, dadivisão da propriedade e da administra-ção, bem como o exercício da autoridadeetc.A teoria clássicavisava, portanto, atra-

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vés de princípios administrativos, a che-gar à eficiência no funcionamento das or-ganizações, como explicam os autoresclássicos mais destacados: Frederick Wins-low Taylor, Henri Fayol e Max Weber.

A teoria neoclássica empenhou-se namelhoria das condições de vida do ho-mem. O objetivo era conseguir um traba-lhador realizado. Essa teoria surgiu por-que os administradores verificaram que ateoria clássica não conseguia uma eficiên-cia completa entre a produção física e amotivação do trabalho. Percebeu-se queos administradores precisavam clarear ecompreender de modo mais eficaz o ladohumano das organizações, isto é, "as pes-soas". Os autores mais destacados foramM.P. Follet, C. Barnard, E.Mayo, E. Mas-low, McGregor, Herzberg e McClellandentre outros.

A teoria de sistemas procurou ver a or-ganização como um sistema unificadovoltado para um fim, formado por partesinter-relacionadas. Em vez de ter umavisão separada das várias partes de umaorganização, a visão sistêmica é, para osadministradores, uma forma de se consi-derar uma organização como um todo.

Assim sendo, o diretor da produção ouoperações, por exemplo, gostaria de ter

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lotes de produção longos e sem interrup-ção, produzindo de forma padronizadapara manter o máximo de eficiência acustos baixos. O diretor comercial, poroutro lado, gostaria de fazer entregasoportunas de uma grande variedade deprodutos, podendo, portanto, solicitaruma programação de produção flexívelque possa atender a clientela. O diretorde produção ou operações orientado paraa teoria de sistemas só tomaria decisõesde programação da produção após teridentificado seu efeito sobre os outros se-tores e sobre a organização.

A administração estratégica surgiu por-que as organizações estão sendo cada vezmais influenciadas pelo ambiente externo.

Os componentes de ação direta do am-biente empresarial (fregueses, fornecedo-res, bancos, órgãos públicos etc.) têm rela-ções diretas e constantes com a organiza-ção. Os componentes de ação indireta(cultura, tecnologia, economia, políticaetc.) também se fazem sentir de forma di-reta, por exemplo, a inflação, as greves etc.

Desta forma, o ambiente externo induzos administradores a se anteciparem àsmudanças futuras do ambiente. Os admi-nistradores mais eficazes planejam a fimde se preparar para as mudanças poten-

Oque têm

2

Comportamentohumano

Estrutura

Processos

Fonte: Adaptado de DONNELY, James H. Fundamental ot Management Functions. Behavior Madels.São Paulo, Atlas, 1988.

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CUL TURA GERENCIAL E ESTRATÉGIAS EMPRESARIAIS ...

ciais do ambiente empresarial. Outros re-agem às mudanças à medida em que elasvão ocorrendo, olhando-as em termos depalpites e intuições. Assim, a administra-ção estratégica é responsabilidade dosadministradores de cúpula que ficammais expostos aos fatores externos e têma incumbência de agir diante deles.

A figura 3 mostra o organograma deuma empresa, representando a estruturada organização. As setas indicam os ór-gãos centrais sobre os quais as teoriasclássica, neoclássica, sistêmica e estratégi-ca deram maior ênfase a seus estudos epesquisas científicas.

Neste trabalho, focaliza-se apenas aadministração estratégica. Nosso proble-ma, então, limita-se a como a cultura ge-rencial do proprietário-administrador in-fluencia a implementação e coordenaçãooperacional de estratégias empresariais.

2. Embasamento teórico do problema

Handy comenta: "qualquer pessoa quetenha dispensado algum tempo a qualquer va-riedade de organizações, ou que tenha traba-lhado em mais de duas ou três ficará impres-sionada pelas atmosferas diversas, as formasde fazer as coisas, os níveis diversos de ener-gia, de liberdade individual, de tipos de perso-nalidade etc." Assim sendo, pode-se dizerque as organizações possuem culturas di-versas, isto é, conjuntos de valores, nor-mas e crenças refletidas em diferentescomportamentos. Isto é, nas organiza-ções, há crenças acerca da forma em queo trabalho deve ser organizado, como aautoridade deve ser exercida, como aspessoas serão recompensadas e controla-das, como agir com as outras organiza-ções e como visualizar o futuro.

O conceito de cultura acima referidoimplica conhecer os subsistemas desseconjunto de valores e crenças. Tentare-mos abordar quatro subsistemas:• A cultura do poder: poder implica o

centro de decisões. Então, a cultura dopoder depende de uma fonte central depoder. Esse centro exerce controle so-bre a organização através de laços fun-cionais, envolvendo poder e influênciadifundindo-se a partir dele, sem regrasou procedimentos burocráticos.

• A cultura de papéis: esta cultura fincasua força em funções ou especialida-des, que operacionalizam-se com suas

próprias regras. As regras e procedi-mentos são os métodos principais deinfluência. Nesta cultura predominamais a racionalidade que a personali-dade individual. Isto é, o papel ou des-crição do trabalho, freqüentemente,possui mais importância que a pessoaque o desempenha, daí advém que asregras e procedimentos são os métodosprincipais da influência.

• A cultura da tarefa: cultura de equipe,isto é, existe facilidade de relacionamen-to de trabalho no grupo. Nas grandesempresas, os líderes de equipe brigampelos recursos disponíveis, apelando eempregando todo tipo de influência.

• A cultura da pessoa: como o nome in-dica é uma cultura onde o indivíduo éo ponto central, portanto,a estruturada organização é a menor possível. Ocontrato psicológico (conjunto de ex-pectativas) afirma que a organização ésubordinada ao indivíduo e dele de-pende para existir.

Handy sugere que as definições desubsistemas de cultura acima enunciadosforam feitas de forma impressionista.'Não foram definidas com rigor, mas po-dem expressar um conjunto de valores.

O inter-relacionamento da cultura ge-rencial (lI) e a administração estratégica (I)é mostrado na figura 4. O círculo 11repre-senta o sistema de valores e crenças tidocomo cultura gerencial envolvente dos cír-culos III e IV,onde se operacionaliza a ad-ministração estratégica (retângulo 1).

Uma inter-relação da cultura gerenciale a estratégia empresarial, se prevalecer ocontrato psicológico da cultura da pes-soa, deve resultar num empresário satis-feito. Mas, o que é um empresário satis-feito? Para começar, pode-se dizer, emprimeiro lugar, que todo empresário en-contra-se fortemente motivado para so-breviver, embora a teoria econômica en-sine que as aspirações da firma relacio-nam-se com um ímpeto básico de lucro.Então, a alternativa entre sobrevivência elucro gera a inter-relação da cultura ge-rencial e estratégias empresariais.

METODOLOGIA

A unidade de pesquisa foi definidacomo o estrategista (proprietário-admi-

2. HANDY, Charles B. ComoCompreender as Organizações.Rio de Janeiro, Zahar Editores,1978, p. 200.

3. HANDY, Charles B. Idem, ibi-dem.

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jJ!J~ARTIGO

nistrador). A população de estrategistasfoi formada por produtores rurais das re-giões Sul e Zona da Mata do estado deMinas Gerais.

Para o estudo, extraiu-se uma amostraaleatória de três produtores (dos dezmaiores) de cada uma das seguintes cida-des: Alfenas, Barbacena, Cataguases,Guaxupé, Itajubá, Juiz de Fora, Leopoldi-na, Oliveira, Poços de Caldas, Pouso Ale-gre, São João Del Rei, Três corações, Ubá,Varginha e Viçosa.

A definição de maiores produtores uti-lizada nesta pesquisa foi a daqueles demaior renda classificados e identificados

pelos escritórios locais da EMATER (Em-presa de Assistência Técnica e ExtensãoRural) em cada uma das 16 cidades.

O levantamento de dados foi realizadoatravés de entrevistas com os proprietá-rios-administradores (sorteados) compo-nentes da amostra.

RESULTADOS E ANÁLISE

1.Resultados

A tabela 1 apresenta o tratamento es-tatístico dos dados para se chegar ao tes-te X2 de Friedman. Esse teste constituiuma aproximação não paramétrica, que

Administração estratég1ca (I)e cultura gerencial (11)

• Vocação da empresa• Estratégia competitiva• Estratégia de crescimento• Produtos e mercados futuros• Recursos e competência necessários• Sistema de valores• Questões críticas• Etc.

(11)

Orientação estratégica ,~..__

PlanejamentoEstratáqia

atual estratégia

Fonte: DEGEN, R. J. "Efeitos do Plano de Estabilização Econômica do Govemo sobre a Estratégia Empresarial". Revista de Administração de Empresas. São Paulo, 26(3):7-46,1986.

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Administração estratégíca Decisão

Sistemas deInformações Controle Ação

gerencialAnálise doambiente Coordenação operacional

AnáliseInterna

Pontosfortes

Oportunidades.•••• ambientais....,.IlH 1..-----......---.1• Economia

• Governo• Mercado• Concorrentes• Clientes• Tecnologia• Etc.

Pontosfracos

1111'"

UI''''Ameaçasambientais

• Vendas• Produção• Finanças-Investimentos- Etc.

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CUL TURA GERENCIAL E ESTRATÉGIAS EMPRESARIAIS",

permite verificar diferenças numa amos-tra de respondentes que tenham sidomensurados sob, pelo menos, duas condi-ções distintas,

Foram atribuídos postos do X2 deFriedman às variáveis:Xl = Diversificação produtiva. O nível foimensurado pelo número de produtos

agrícolas produzidos na fazenda.X2 = Estratégia financeira. Foi mensuradada seguinte forma:

Estratégias empresariais e cultura gerencial

Proprietário- Diversificação Estratégia Estratégia Porcentagem de OutrosAdministrador produtiva financeira de investimento área cultivada empreendimentos

nº X1 X2 X3 X4 X5

Nível Posto Nível Posto Nível Posto Nível Posto Nível Posto

4 2 2 2 2 1

2 2 2 2 2 3 1 2 O 2

3 4 3 1 2 2 2

4 6 2 2 2 2 3 1

5 8 2 2 3 1 3 O 2

6 6 3 3 3 O 2

7' 4 3 3 3 1 O 2

8 4 3 3 2 2 O 2

9 7 2 2 3 3 1 O 2

10 5 3 3 1 2 1

11 6 2 2 2 2 2 O 2

12 5 1 3 1 3 1 1 2 O 2

13 2 2 3 1 3 1 2 2 O 2

14 5 3 1 2 2 3 O 2

15 5 2 2 3 1 2 1

16 4 2 2 2 2 2 O 2

17 3 2 2 2 2 2 2 O 2

18 3 2 3 1 3 2 O 2

19 3 2 3 1 3 1 2 O 2

20 3 2 2 2 O 2 2 2

21 7 3 2 2 3 1

22 5 3 2 2 3 1

23 6 1 3 3 1 2

24 3 2 3 2 2

25 6 1 3 1 2 3 1 1 1

26 5 2 2 1 2 2 O 2

27 4 3 1 2 2

28 5 3 2 2 2

29 5 3 2 2 2

30 4 3 3 2 1

31 4 3 2 2 2 O 2

32 8 1 2 2 3 1 2 2 1

33 3 2 3 3 1 2 2

34 5 2 2 2 2 2 2

35 7 1 2 2 2 2 1 2

Somatório 43 48 54 60 51

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Fontes de receita: créditos a receber, ven-das imediatas de produtos, financiamen-tos bancários.Se o proprietário-administrador utiliza

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~~~ ARTIGO

apenas, digamos, vendas imediatas deprodutos, atribui-se o algarismo 1; casoutilize duas fontes de receita, o algarismo2 e assim por diante.X3 = Percentagem de área cultivada. Se afazenda cultiva, digamos, menos que45%de sua área, atribui-se o algarismo 1,se cultiva por volta de 46 a 55%, atribui-se o algarismo 2, se cultiva mais de 56%,o algarismo 3.X4 = Outros empreendimentos.Se,além da atividade agropecuária, o pro-prietário-administrador possui outra ativi-dade produtiva é atribuído o algarismo 1,caso não tenha, é atribuído o algarismo o.

A avaliação dos tipos de culturas ge-renciais:YI = cultura do poder;Y2 = cultura de papéis;Y3= cultura da tarefa;Y4 = cultura da pessoa.

Atribui-se posto a e b:a. Cultura da pessoa para os proprietá-rios-administradores de maior algarismo(caso da variável XI' considerou-se atétrês culturas, nº 2).b. Para outras culturas.

Para se obter X2, aplicou-se a seguintefórmula:

1 .X2

= NK (P+1) (I R2) - 3N (K - 1) '"

'" 12 (43z+48~542+602+51)2-3(35)(3)35 (2) (3)

)0: ~ (1.849+2.304+2.91543.600+2.601)-315315 .

X2 = 0,038 (10.668) - 315

X2 = 405.384 - 315 '" 90,384

Graus de liberdade: 2 - 1 = 1X2 obtido = 90,384X (tabelado) = 3,841Nível de significância:p = 0,05

Portanto, segundo o jargão estatístico,rejeitamos a hipótese nula e aceitamos ahipótese experimental.

Acabamos de reunir, com isso, sufici-entes provas de que as culturas geren-ciais influenciam a implementação e co-

36

ordenação de estratégias empresariais desobrevivência.

2. Análise:

A aceitação da hipótese experimentalexpressa que a cultura gerencial da pes-soa induz os proprietários-administrado-res à adoção de estratégias empresariaisde sobrevivência.

Os proprietários-administradorespreocupam-se, de maneira acentuada,com as necessidades e valores pessoaisde terceiros: os gerentes de bancos, deempresas fornecedoras de insumos, decooperativas e com os próprios trabalha-dores. Eles não privilegiam as necessida-des e valores empresariais e! ou empre-endedores, pois preferem as estratégiasadministrativas do pricing às do costing.

As estratégias de produção mantêm aestrutura básica dos produtos, café egado leiteiro, aprimorada pelos produto-res-proprietários de fazendas maiores. Jáos produtores-proprietários de fazendasmenores operacionalizam, além dessa es-trutura básica, atividades produtoras dediversificação, embora pouco significati-vas, tal como mostrado na tabela 2.

As estratégias administrativas imple-mentadas pelos proprietários-administra-dores não privilegiam a administração docapital de giro. Os problemas de liquidezdas empresas agropecuárias são resolvidosapenas com vendas de produtos (sembar-ganha do preço) sempre que necessário.Os produtores maiores utilizam mais osempréstimos bancários que os menores.

Os produtores maiores enfatizam a ad-ministraçãoda produção em função da po-lítica do costing (administração de custos),enquanto os menores enfatizam a políticado pricing (administraçãodas receitas).Poristo os produtores maiores têm gado leitei-ro, de maior produtividade e grandes in-vestimentos;os menorespossuem rebanhosde raçasmistase de baixaprodutividade.

A cultura gerencial da pessoa induz osproprietários-administradores das em-presas menores ao comportamento deprivilegiar mais os pontos fracos que osfortes. No entanto, os produtores maioresrealizam investimentos tanto nas ativida-des agropecuárias quanto em atividadescomerciais - supermercado, postos de ga-solina, concessionária de veículos etc.(Ver tabela 3.)

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CUL TURA GERENCIAL E ESTRATÉGIAS EMPRESARIAIS ...

Estratégias produtivas e administrativas das empresas rurais

Estratégia Tamanho médio Porcentagem Porcentagem Adm. capital de girode produção da fazenda de área cultivada de pastagens Liquidez Invest .real

1. Café, gado leiteiro, 8 produtores por: somente 50% dosmilho, feijão, batata 8 3550ha 40% • venda de seus produtos produtorese arroz • empréstimos bancários

2. Café, gado leiteiro, milho, 8 produtores por: 100%feijão, batata, arroz, cana, 8 2215ha 50% • venda de seus produtos dos prod utoresgado de corte: zebu, suínos • empréstimos não

3. Café, gado leiteiro, milho, 19 produtores: apenas 30%feijão, batata, urucum, arroz, 19 700ha 70% • venda de seus produtos dos produtorescana, mandioca, frango,eqüinos,e piscicultura

o fato de privilegiar mais os pontosfracos que os fortes, deve-se à falta deaparelhagem organizacional e contábil,fazendo com que as decisões fossem to-madas de forma não racional. Essas deci-sões resultam de informações pessoais deterceiros e não da análise e síntese inter-na da empresa. Daí advém a possibilida-de dos proprietários-administradores en-contrarem dificuldades, preferindo desis-tir (mesmo com altos custos) diante deexpectativas difíceis a resolver gerencial-mente e de forma racional seus proble-mas empresanais.

CONCLUSÃO

A cultura gerencial dos proprietários-administradores de empresas rurais con-duz à implementação de estratégias desobrevivência no setor agropecuário. O

BIBLIOGRAFIASUPLEMENTAR

Pontos fortes e fracosdos proprietários-administradores rurais

Descrição dospontos

Porcentagemde produtores

Dificuldades de comercialização e falta de recursos financeiros

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Artigo recebido pela Redação da RAE e aprovado para publicação em dezembro/91.

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