estudo da variabilidade nos genes envolvidos nos
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I
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA VEGETAL
Andreia Sofia Reis Carvalho
Mestrado em Biologia Molecular e Genética
Dissertação orientada por:
Professora Doutora Maria Helena Caria
Professora Doutora Ângela Inácio
2019
Estudo da variabilidade nos genes envolvidos nos mecanismos
de stresse oxidante ligados à perda auditiva em São Tomé e
Príncipe e comparação com a sua distribuição na população
Portuguesa
II
Agradecimentos
Gostaria de agradecer em primeiro lugar à minha orientadora externa, a Professora Doutora
Ângela Inácio, por toda ajuda, disponibilidade e orientação dada durante todo este percurso no Instituto
Bento da Rocha Cabral, sem o seu apoio e incentivo nunca teria chegado até aqui.
À minha orientadora interna, a Professora Doutora Helena Caria por toda a ajuda, paciência e
por me proporcionar todas as condições para a realização deste trabalho em colaboração com o Grupo
de Investigação no âmbito do projeto “Saúde para todas as especialidades”.
Não posso deixar de agradecer ao Professor Doutor Manuel Bicho, Diretor do Laboratório de
Genética da Faculdade de Medicina de Lisboa (FMUL), a oportunidade e esclarecimentos dados ao
longo da realização deste trabalho.
Agradeço igualmente a todas as colaboradoras do laboratório de genética da FMUL,
nomeadamente à Doutora Joana Ferreira, pela disponibilidade demonstrada.
Quero ainda agradecer aos meus colegas de laboratório Laura Aguiar, Raquel Carrilho, Sara
Hassam, Denise Brito, Francisca Paixão e Alvaro Chao. Sem vocês este caminho não teria sido possível.
Obrigada pela paciência, pelos sorrisos e por todos os ensinamentos que me transmitiram.
O meu agradecimento ao Instituto de Investigação Bento da Rocha Cabral e seus funcionários.
Não menos importante quero agradecer à Rita, que sempre esteve lá. Obrigada Marta, foste um
grande apoio neste processo.
Obrigada aos meus pais pela ajuda e apoio ao longo da vida académica. Obrigada também á
minha irmã por tudo.
Por fim, obrigada à avó Anabela, pois sem ela, hoje não estaria aqui.
III
Resumo
A audição é o sentido responsável pela captação, condução e codificação das ondas sonoras em
impulsos nervosos. A perda auditiva (PA) condiciona a integração dos indivíduos na sociedade.
O presente trabalho teve como principal objetivo o estudo da variabilidade em genes envolvidos
em mecanismos de stresse oxidante e a sua associação com a PA em São Tomé e Príncipe (STP). Os
genes em estudo foram MTHFR, CβS, GST (GSM1 e GSTT1) e NOS3. Para a deteção dos
polimorfismos 844ins68 pb do gene CβS, M1*0 e T1*0 dos genes GST e do VNTR no intrão 4 do gene
NOS3 foi usada a técnica PCR. Para a deteção do polimorfismo C677T do gene MTHFR foi usada a
técnica do RFLP. Os dados estatísticos foram realizados no programa estatístico SPSS, sendo o nível de
significância estatístico estabelecido para p <0,05.
Numa primeira fase foi realizado um estudo populacional, entre as populações portuguesa e a
de STP, a fim de perceber se diferentes contextos genómicos no que diz respeito ao stresse oxidante
poderiam justificar as elevadas taxas de PA em STP. Os resultados da análise populacional mostraram
diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos e dos alelos para todos os genes,
verificando-se em maioria uma maior frequência dos alelos e genótipos, associados ao stresse oxidante
em STP. Contudo, os estudos de associação com a PA na população de STP não mostrou diferenças
estatísticas, com exceção do alelo ins do gene CβS que se revelou protetor em relação à doença. Os
estudos de epistasia mostraram ainda uma associação entre a combinação de genótipos 4b4b do gene
eNOS e CC do gene MTHFR com a PA.
Conclui-se que, apesar da maior incidência das variantes polimórficas em STP, relativamente à
população portuguesa, esta parece não justificar a grande prevalência de PA na população africana.
Palavras-chave: Perda Auditiva, Stresse Oxidante, São Tomé e Príncipe, Estudos
Populacionais, Estudos de Associação
IV
Abstract
Hearing is the sense responsible for capturing, conducting and encoding sound waves in nerve
impulses. Hearing loss (HL) has consequences in the integration of individuals into society.
The present work had as main objective the study of the genetic variability in genes involved in
mechanisms of oxidative stress and its association with HL in São Tomé and Príncipe (STP). The genes
under study were MTHFR, CβS, GST (GSM1 and GSTT1) and NOS3. PCR was used for the analysis
of the polymorphisms: 844ins68 bp in CβS, M1 * 0 and T1 * 0 of GST and VNTR in intron 4 of the
NOS3 gene. For the C677T polymorphism of the MTHFR gene, the RFLP technique was used.
Statistical analyses were performed in the SPSS statistical program, and the level of statistical
significance was established as p <0.05.
In a first phase of this work, a population study was carried out, between the Portuguese and the
STP populations, in order to understand if different genomic contexts with respect to the oxidative stress
could justify the high HL levels in STP. The results of the population analysis showed statistically
significant differences in the distribution of genotypes and alleles for all genes, with a higher frequency
of alleles and genotypes associated with oxidative stress in STP. However, the association studies with
HL in the STP population did not reveal statistical differences, except for the ins allele of the CβS gene
that was protective against the disease. Epistasis studies also showed an association between the
combination of 4b4b genotypes of the eNOS gene and CC of the MTHFR gene with HL.
It is concluded that, despite the higher incidence of polymorphic variants in STP, relative to the
Portuguese population, this does not seem to justify the high prevalence of HL in the African population.
key words: Hearing Loss, Oxidant Stress, Sao Tome and Principe, Population Studies,
Association Studies
V
Lista de Comunicações
Laura Aguiar, Ildegário Semente, Andreia Carvalho, Cristina Caroça, Helena Caria, Paula
Faustino, Manuel Bicho, Ângela Inácio. “Genotypic differences between southwestern European and
African populations: a comparative study in eNOS, G6PD, GSTM1, GSTT1 and CYB5R3 genes”.
Sociedade Portuguesa de Genética Humana (Oral). Porto, 2018.
Laura Aguiar, Ildegário Semente, Andreia Carvalho, Joana Ferreira, Helena Caria, Albertino
Damasceno, Paula Faustino, Ângela Inácio, Manuel Bicho.” Diferenças genotípicas entre o sudoeste da
Europa e África: Um estudo comparativo em genes relacionados com a hipertensão”. 13º Congresso
Português de Hipertensão e Risco Cardiovascular Global.Vilamoura, 2019.
VI
Índice
Agradecimentos ................................................................................................................................ III
Resumo ............................................................................................................................................ III
Abstrat ............................................................................................................................................. IV
Lista de Comunicações ...................................................................................................................... V
Índice de Tabelas .......................................................................................................................... VIII
Índice de Figuras ............................................................................................................................. IX
Abreviaturas e Acrónimos .................................................................................................................. X
1.Introdução........................................................................................................................................1
1.1. Perda Auditiva .............................................................................................................................1
1.2. O Ouvido Humano .......................................................................................................................1
1.3. As Principais Causas de Perda Auditiva Neurossensorial ..............................................................2
1.4. Stresse Oxidante e Perda Auditiva Neurossensorial ......................................................................3
1.4.1. Metabolismo da Homocisteína...................................................................................................4
1.4.2.Metileno Tetrahidrofolato Redutase e Perda Auditiva .................................................................5
1.4.3. Cistationina β-Sintase e Perda Auditiva .....................................................................................5
1.4.4. Gluatationa S-Transferase e Perda Auditiva ...............................................................................6
1.4.5. Sintase do Óxido Nítrico e Perda Auditiva .................................................................................6
1.4.5. 1 Relação do Metabolismo do Óxido Nítrico com o Metabolismo da Homocisteína ...................7
1.4.6. Glucose-6-Fosfato Desidrogenase (G6PD) e Perda Auditiva ......................................................7
1.5. Epistasia ......................................................................................................................................7
1.6. Genética Populacional ..................................................................................................................7
2. Objetivos ........................................................................................................................................9
3. Metodologia .................................................................................................................................. 10
3.1. Seleção da Amostra Populacional ............................................................................................... 10
3.2. Análise Genética ........................................................................................................................ 10
3.2.1. Amplificação dos Fragmentos de DNA a Estudar .................................................................... 10
3.2.2. Genotipagem ........................................................................................................................... 12
3.3. Tratamento Estatístico ................................................................................................................ 12
3.3.1 Estudo Populacional ................................................................................................................. 12
3.3.2 Estudos de Associação ............................................................................................................. 12
3.3.2.1 Análise Isolada ...................................................................................................................... 13
3.3.2.2 Análise Epistática .................................................................................................................. 13
4. Resultados .................................................................................................................................... 14
4.1. Caraterização da População em Estudo ....................................................................................... 14
4.1.1. Caraterização da População quanto à Infeção por Malária ........................................................ 14
4.1.2. Caraterização da População quanto à Presença da Mutação Drepanocítica ............................... 14
VII
4.1.3. Caraterização da População quanto à Perda Auditiva ............................................................... 14
4.1.3.1. Caraterização da População quanto à gravidade na Perda Auditiva ........................................ 14
4.1.3.2 Caraterização da População quanto à lateralidade na Perda Auditiva ...................................... 15
4.2. Estudo Populacional das Distribuições Genotípicas e Alélicas nos Genes MTHFR, CβS, GST (M1
e T1) NOS3 e G6PD em STP e Portugal ........................................................................................... 16
4.2.1. Caraterização das Populações em Estudo ................................................................................. 16
4.2.1.1. Estudo do Gene MTHFR nas Populações de STP e Portuguesa ............................................. 16
4.2.1.2. Estudo do Gene CβS nas Populações de STP e Portuguesa ................................................... 17
4.2.1.3. Estudo do Gene GSTM1 nas Populações de STP e Portuguesa .............................................. 17
4.2.1.4. Estudo do Gene GSTT1 nas Populações de STP e Portuguesa. .............................................. 18
4.2.1.5. Estudo do Gene NOS3 nas Populações de STP e Portuguesa ................................................. 18
4.2.1.6 Estudo do Gene G6PD nas Populações de STP e Portuguesa.................................................. 19
4.3 Análise isolada dos genes MTHFR, CβS, GST (M1 e T1) e NOS3 .............................................. 19
4.3.1. Análise do Polimorfismo C677T do Gene MTHFR.................................................................. 19
4.3.2. Análise do Polimorfismo de Inserção de 68 pb no exão 8 do Gene CβS ................................... 20
4.3.3. Análise dos Polimorfismos nos Genes GST (M1 e T1) ............................................................ 21
4.3.4.Análise do Polimorfismo VNTR do Gene NOS3 ...................................................................... 22
4.4 Estudo de Relações Epistáticas .................................................................................................... 22
5. Discussão e Conclusão .................................................................................................................. 24
Referências Bibliográficas ................................................................................................................ 27
Anexos ............................................................................................................................................. 33
Anexo 1 ............................................................................................................................................ 33
Anexos 2 .......................................................................................................................................... 34
Anexos 3 .......................................................................................................................................... 35
Anexos 4 .......................................................................................................................................... 36
VIII
Índice de Tabelas
Tabela 3.1 Polimorfismo, primers, condições de amplificação e tamanho esperado dos
fragmentos……………………………………………………………………………………………..11
Tabela 3.2 Condições de Restrição e Possíveis Tamanhos dos Fragmentos do Polimorfismo
MTHFR………………………………………………………………………………….….................12
Tabela 4.1. Frequência e número de indivíduos do sexo masculino e feminino quanto ao grau de
severidade na PA…………………………………………………………………...…….....................15
Tabela 4.2. Média e desvio padrão das idades nas diferentes categorias de gravidade da PA e no grupo
de controlo………………………………………………………………….………………………….15
Tabela 4.3. Frequência e número de indivíduos do sexo masculino e feminino relativamente à
lateralidade na PA………………………………………………...........................................................15
Tabela 4.4 Média e desvio padrão das idades na PA unilateral e bilateral…………………………….16
Tabela 4.5 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo C677T nas populações de STP e
Portuguesa…………………………………………………...................................................................16
Tabela 4.6 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo C677T do gene MTHFR nas
populações de STP e Portuguesa…………………………………………….…………………………16
Tabela 4.7 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo de inserção de 68 pb do gene CβS
na população de STP e Portuguesa…………………………………..…………………………………17
Tabela 4.8 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo de inserção de 68 pb no intrão 8 do
gene CβS na população de STP e Portuguesa………………………………………….........................17
Tabela 4.9 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (M1*0) e não nulo (M1*1) do gene
GSTM1 nas populações de STP e Portuguesa…………………………..………...……………………17
Tabela 4.10 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (T1*0) e não nulo (T1*1) do gene
GSTT1 nas populações de STP e Portuguesa…………………………………………………………..18
Tabela 4.11 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo VNTR do gene NOS3 nas
populações de STP e Portuguesa………………………………………………...……….....................18
Tabela 4.12 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo VNTR do gene NOS3 nas populações
de STP e Portuguesa……………………………………………………………...................................19
Tabela 4.13 Distribuição das frequências genotípicas da variante A+ do gene G6PD nas populações de
STP e Portuguesa………………………………………………………………………………………19
Tabela 4.14 Distribuição das frequências alélicas da variante A+ do Gene G6PD nas populações de STP
e Portuguesas……………………………...…………………………....................................................19
Tabela 4.15 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo C677T do gene
MTHFR………………………...……………………………................................................................20
Tabela 4.16 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo C677T na população ouvinte e na
população surda………………………………………………………………………………………..20
IX
Tabela 4.17 Distribuição das frequências genotípicas de ins68 pb no intrão 8 do gene CβS na população
ouvinte e na população surda…………………………………………………………………………...20
Tabela 4.18 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo de ins68 pb no intrão 8 do gene CβS
na população ouvinte e na população surda…………………………………………………………….21
Tabela 4.19 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (M1*0) e não nulo (M1*1) do
gene GSTM1 na população ouvinte e na população surda……………………………………………..21
Tabela 4.20 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (T1*0) e não nulos (T1*1) do
gene GSTT1 na população ouvinte e na população surda………………………………………………22
Tabela 4.21 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo VNTR do gene NOS3 na
população ouvinte e na população com PA…………………………………………………………….22
Tabela 4.22 Distribuição das frequências alélicas no polimosfismo VNTR do gene NOS3 na população
ouvinte e na população não ouvinte……………………………………………………………………22
Tabela 4.23 Associação significativa entre os genótipos dos genes MTHFR e NOS3 com a PA……..23
Índice de Figuras
Figura 1.1 Esquema representativo do ouvido humano………………………………………………….2
Figura 1. 2 Esquema simplificado do metabolismo da hcy………………………………………………5
X
Abreviaturas e Acrónimos
5-MTHF: 5- Metilenotetrahidrofolato
5,10-MTHF: 5,10- Metilenotetrahidrofolato
CAT: Catalase
CβS: Cistationina β-Sintase
CSE: γ-Cistationase
Cys: Cisteína
Cx26: Conexina 26
Cx 30: Conexina 30
dB: Decibéis
DMSO : Dimetilsufóxido
DNA: Desoxyribonucleic acid
eNOS: Sintase do Óxido Nítrico endotelial
GJB2: Gap Junction β2
GJB6: Gap Junction β6
GPx: Glutationa Peroxidase
GSH: Forma Reduzida de Glutationa
GSSG: Forma Oxidada da Glutationa
GST: Glutationa S-Transferase
GSTM1: Transferase da Glutationa, Família mu
GSTT1: Transferase da Glutationa, família theta
G6PD: Glucose-6-fosfato Desidrogenase
Hcy: Homocisteína
Hz: Hertz
Met: Metionina
MS: Metionina Transferase
MTHFR: Metilenotetrahidrofolato Redutase
OMS: Organização Mundial de Saúde
OR: Odds Ratio
PA: Perda Auditiva
PCR: Polymerase Chain Reaction
RFLP: Restriction Fragment Length Polymorphism
ERO: Espécies Reativas de Oxigénio
SAM: S-Adenosil Metionina
SAH: S-Adenosil Homocisteína
SN: Sistema Nervoso
SOD: Superóxido Dismutase
STP: São Tomé e Príncipe
THF: Tetrahidrofolato
VNTR: Variable Number Tandem Repeat
XO: Xantina Oxidase
1
1.Introdução
1.1. Perda Auditiva
A audição é um sentido importante para a integração dos indivíduos na sociedade, sendo que a
perda da mesma contribui para o isolamento social e profissional, depressão, baixo rendimento escolar,
comprometimento no desenvolvimento da fala, bem como na qualidade de vida em geral1.
A surdez é a perda parcial ou total da audição, dificultando a compreensão e a comunicação da
pessoa afetada, podendo ter causas genéticas ou ambientais. O tipo de perda auditiva (PA) pode ser
classificada como:1) surdez por condução, que ocorre quando lesão no ouvido externo e/ou médio, que
tem como função conduzir o som até ao ouvido interno; 2) surdez neurossensorial, que ocorre quando
há lesão no ouvido interno, impedindo a propagação do estímulo sonoro ao sistema nervoso (SN); 3)
surdez mista, a combinação das duas últimas em simultâneo, neste caso, existem lesões tanto no ouvido
externo e/ou médio como no ouvido interno2.
Quanto à gravidade, a surdez pode ser categorizada através dos limiares de decibéis (dB)
audíveis obtidos no ouvido menos surdo. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS),
considera-se uma audição normal entre os limiares de 0 a 25 dB, surdez ligeira entre os limiares de 26
a 40 dB, surdez moderada entre os limiares de 41 a 60 dB, surdez severa entre os limiares de 61 a 80 dB
e surdez profunda acima do limiar dos 81 dB3. Assim, quando se pretende caracterizar uma perda
auditiva, o correto é classificá-la de acordo com o seu tipo (condução, neurossensorial ou mista) e
gravidade (leve, moderada, severa ou profunda)2.
Dados da OMS de 2018 revelam a existência de 466 milhões de indivíduos com deficiência
auditiva, correspondendo a 5% da população mundial, dos quais 34 milhões são crianças, prevendo-se
que em 2050 existam mais de 900 milhões de indivíduos com perda auditiva incapacitante. A maioria
destes indivíduos são oriundos de países subdesenvolvidos localizados no Sul da Ásia e na África
Subsariana4,5.Em 2010, nasce em Portugal, a partir do departamento de Otorrinolaringologia da CUF
Infante Santo, uma série de ações humanitárias em São Tomé e Príncipe (STP), no âmbito do projeto
“Saúde para todas as especialidades”, tendo-se verificado uma elevada prevalência de surdez
neurossensorial, com as crianças a formarem o grupo mais afetado, sendo que parte delas não tinha
aquisição de linguagem oral e apresentavam surdez bilateral profunda6.
1.2. O Ouvido Humano
O ouvido humano (Figura 1.1) é o órgão responsável pela audição. O ouvido externo é
constituído pelo pavilhão auricular e pelo canal auditivo, sendo que é nesta zona que são captadas as
ondas e enviadas através do canal auditivo para o tímpano. O ouvido médio, cavidade preenchida por
ar, é constituído pelo tímpano e por três ossículos (martelo, bigorna e estribo) que vibram com a onda
sonora. O martelo liga-se fixamente à bigorna que por sua vez se liga de forma flexível ao estribo.
Quando a onda sonora chega aos ossículos, estes vibram transmitindo-a ao ouvido interno. O ouvido
interno é constituído pela cóclea, com funções na audição e pelo sistema vestibular, responsável pelo
equilíbrio. Algumas células do interior da cóclea estão modificadas de maneira a formar o órgão de
Corti (Figura 1.1). Este é composto por três fiadas de células, uma mais externa, outra com células de
sustentação e uma fiada de células ciliadas internas especializadas na transdução do sinal mecânico em
potencial de ação o qual é transmitido ao córtex cerebral e percebido como som7.
2
Figura 1.1 Esquema representativo do ouvido humano. O canal auditivo (juntamente com o pavilhão auricular) formam o ouvido externo. O ouvido médio é constituído pelo tímpano e por três ossículos: martelo, bigorna e estribo, que juntos formam o mecanismo de condução do som. O ouvido interno é constituído pela cóclea, cujas células do interior estão modificadas de maneira a formar o orgão de Corti que transforma a vibração em impulso nervoso (Adaptado de Caroça, 2017)
1.3. As Principais Causas de Perda Auditiva Neurossensorial
Existem inúmeros fatores de risco que originam perda auditiva, podendo estes ser inerentes ao
sexo, à idade, à etnia ou ao ambiente circundante7. Da sua etiologia, sabe-se que 50% dos casos são de
causa genética, 25% de causas ambientais e os restantes 25% de causas idiopáticas. Relativamente às
causas ambientais, alguns estudos indicam que doenças infeciosas, como a rubéola ou a malária possam
estar na origem da surdez neurossensorial. A rubéola é uma infeção causada por um vírus. Uma das
consequências mais frequentes da infeção por rubéola (60% dos casos) é a PA congénita8, que ocorre
quando a mulher grávida é infetada no primeiro trimestre de gravidez. A malária é uma doença causada
pelo mosquito anófeles que transmite o parasita Plasmodium spp. A toxicidade do medicamento
antimalárico é uma causa amplamente divulgada na PA, no entanto o efeito do próprio parasita em si na
PA não é muito claro9,10.
A PA pode ocorrer como um sintoma isolado – perda auditiva não sindrómica – ou associada a
uma variedade de sintomas, compondo quadros clínicos de síndromes genéticas – perda auditiva
sindrómica. A perda auditiva genética sindrómica é classificada em autossómica dominante (ex:
Síndrome de Penred) ou em autossómica recessiva (ex: Síndrome de Usher), sendo esta forma a mais
prevalente (70% dos casos)11,12. Mais de metade dos casos de surdez não sindrómica autossómicos
recessivos são devidos a mutações no locus DFNB1 - o primeiro locus descoberto como sendo
responsável pela PA autossómica recessiva não sindrómica. Este locus localizado no cromossoma 13
codifica para 2 genes – GJB2 e GJB6 – que pertencem ao mesmo cluster e codificam 2 proteínas
3
altamente conservadas (conexinas) que formam canais intercelulares (gap junction). O gene GJB2
codifica a conexina 26 (Cx 26) e o gene GJB6 codifica a conexina 30 (Cx 30). Estas conexinas são
amplamente expressas em vários tipos de células e tecidos13. No ouvido interno, são encontradas nas
células sensoriais epiteliais do órgão de Corti13. No gene GJB2 existe a predominância da mutação
35delG, presente em 60% a 75% dos casos de surdez; enquanto no gene GJB6 existe a predominância
de duas grandes deleções de centenas de pb - del (GJB6-D13S1830) e del (GJB6-D13S1854) sendo
encontradas frequentemente em associação com a mutação 35delG do gene GJB214,15.
Estudos16–18 revelam que mutações no gene GJB2 não desempenham um papel significativo na
etiologia da PA nas populações da África Subsariana ou nas suas populações descendentes. Outros
estudos17,19,20 realizados em STP, mostram que o papel das mutações no gene GJB2 na surdez
neurossensorial sindrómica parece ser pouco significativo21. A acrescentar, o papel das grandes deleções
no gene GJB6 na surdez não sindrómica em STP não é significativo21. Neste sentido, os dados remetem
para a possível existência de outras variantes genéticas patológicas em STP7.
1.4. Stresse Oxidante e Perda Auditiva Neurossensorial
As células que compõem os tecidos e órgãos do corpo humano são expostos, de forma constante
a ataques de natureza oxidante que podem provir de fontes endógenas, como processos metabólicos e/ou
de sinalização celular, ou exógenas, por meio de exposição a xenobiontes, como agentes químicos
oxidantes, radiações ionizantes e ultra-violeta22,23.
O stresse oxidante pode ser definido como uma condição biológica na qual ocorre desequilíbrio
entre a produção de espécies reativas de oxigénio (ERO) e a sua remoção através de sistemas
antioxidantes. As ERO, quando em baixas concentrações, têm um papel importante em funções
biológicas como a sinalização, migração e divisão celular, no entanto se houver um desvio nas
concentrações destas, o seu aumento pode originar efeitos nefastos para o organismo, como lesões no
DNA, oxidação lipídica ou desnaturação de proteínas24. Entre as ERO responsáveis pelas inúmeras
lesões, podemos destacar o radical superóxido (O-2), o peroxinitrito (ONOO-) e o radical hidroxilo (OH-
), o mais reativo25. Do metabolismo destes destacam-se o peróxido de hidrogénio (H2O2) e o ácido
hipocloroso (HOCl)26,27. De forma a equilibrar a quantidade excessiva de ERO e dos seus metabolitos,
o organismo possui sistemas antioxidantes, que estão organizados em três níveis: 1) sistemas que atuam
no sentido de prevenir a formação de ERO, por ação de inibidores de enzimas que catalisam essas
reações; 2) compostos antioxidantes não enzimáticos como a vitamina A ou a vitamina C que
“aprisionam” as ERO diminuindo a sua toxicidade (este nível só entra em ação, no caso do primeiro
sistema falhar); 3) sistemas de reparação que reconhecem e decompõem moléculas de DNA danificadas,
proteínas que sofreram desnaturação, entre outros (este sistema atua no caso de os dois sistemas
anteriores falharem)28–30.
A cóclea é um órgão que produz níveis significativos de ERO, os quais aumentam para níveis
prejudicais quando há redução nas atividades enzimáticas dos sistemas antioxidantes. O metabolismo
oxidante tem sido associado a diversas patologias, uma vez que pode afetar vários locais do organismo.
Lesões e apoptose nas células ciliadas do ouvido interno podem ocorrer como resultado do aumento de
ERO31. Clerici e Yang32 estudaram os efeitos da produção de ERO na função coclear, tendo demonstrado
que a produção destes no espaço perilinfático (Figura 1.2) pode prejudicar gravemente a produção e
transmissão do impulso nervoso. Mais recentemente Gul33 e colaboradores mostraram que a presença
de ERO na perilinfa do ouvido interno induz a PA neurossensorial ao causar lesões nas células ciliadas32–
34.
4
1.4.1. Metabolismo da Homocisteína
A homocisteína (hcy) é um aminoácido não essencial, sulfídrico, derivado da metionina (met),
proveniente da dieta ou do metabolismo da via biossintética que converte a met a cisteína (cys) (Figura
1.2). Nesta via, a hcy forma-se num processo onde ocorre a conjugação da met com ATP, resultando na
S-adenil metionina (SAM), seguida de uma reação de desmetilação, formando a S-adenosil
homocisteína (SAH) com posterior hidrólise para libertar a adenosina e hcy35–37. A hcy pode ser
convertida irreversivelmente a cys, através da via da transulfuração. Nesta via aproximadamente 50%
da hcy é convertida irreversivelmente a ciy, reação catalisada pela cistationina-β sintase (CβS) que tem
como cofator a vitamina B6. Nesta reação a hcy liga-se à serina formando a cistationina, seguidamente,
a enzima γ-cistationase (CSE) dependente do cofator vitamina B6, vai hidrolisar a cistationina,
originando cys e α-cetobutitato35–37. A cys é posteriormente convertida em glutationa (GSH), que possui
um grupo tiol, agente com grande poder redutor. A GSH pode existir sob duas formas: oxidada (GSSG)
ou reduzida (GSH). A ação da enzima glutationa S-transferase (GST) facilita a formação e estabilização
do anião tiol (GS-), promovendo a ligação da GSH a um substrato eletrofílico. A presença da GSH, em
quantidade adequada, é essencial na função protetora contra radicais livres e xenobióticos38.
A hcy pode no entanto, em alternativa à transulfuração, ser remetilada a met através da enzima
5-metiltetrahidrofolato-homocisteína, também designada por metionina sintase (MS), tendo como
cofator a vitamina B12. Simultaneamente, a MS converte a 5-metiltetrahidrofolato (forma circulante do
folato reduzido-5-MTHF) a tetrahidrofolato (THF). A formação de 5-MTHF requer a redução de 5,10-
metil tetrahidrofolato (5,10-MTHF) a 5-MTHF que é catalisado pela enzima metileno tetrahidrofolato
redutase (MTHFR). Assim, a concentração de hcy depende das atividades enzimáticas de CβS e
MTHFR. Deficiências nestas enzimas originam acumulação de hcy intracelular, que ao não ser
metabolizada pode comprometer o funcionamento das células endoteliais e da matriz coclear, na medida
em que o aumento dos níveis de hcy originam a formação de H2O2, que por sua vez diminui a atividade
da GPx, SOD e CAT, que são as principais enzimas antioxidantes39.
5
Figura 1. 2 Esquema simplificado do metabolismo da hcy. A hcy surge por desmetilação durante o metabolismo da met via SAM (S-adenosil metionina) e SAH (S-adenosil homocisteína). Depois de formada pode ser metabolizada por remetilação a met através de uma reação catalisada pela enzima MS (metionina sintase) e pelo cofator vitamina B12. A MS requer, como substrato a 5-MTHFR, que é catalizada pela enzima metilenotetrahidrofolato redutase (MTHFR). A hcy pode ainda ser metabolizada a cys pela via de transulfuração, através de uma reação catalisada pela CβS e pelo cofator vitamina B6. A ação da enzima GST promove a ligação da GSH, um agente com grande poder redutor, a um substrato eletrofílico essencial na proteção contra compostos xenobíoticos (Adaptado de: http://lpi.oregonstate.edu/es/mic/vitaminas/folato).
1.4.2.Metileno Tetrahidrofolato Redutase e Perda Auditiva
O gene MTHFR é expresso em vários órgãos e tecidos, nomeadamente no fígado, eritrócitos,
rins e cóclea. O gene que codifica a enzima localiza-se no cromossoma 1, na região 1p36.3. A sequência
do DNA é de 2,2 kb e contém 11 exões. Os alelos referentes aos polimorfismos C677T e A1298C são
os mais frequentes e estão associados a hiperhomocisteinémia40. No que se refere à alteração C677T
(rs1801133), esta é caracterizada por uma substituição C→T (ala→val) na posição 677 do gene,
tornando a enzima termolábil. Esta alteração leva a uma redução de 30% na atividade enzimática nos
indivíduos heterozigóticos e 60% nos indivíduos homozigóticos41.
Martinez-Vega31 e seus colaboradores indicam que a presença do alelo T está associado ao
aumento do risco de PA não sendo claro se esta alteração está associada à PA isoladamente31.
1.4.3. Cistationina β-Sintase e Perda Auditiva
O gene que codifica a enzima CβS está localizado no cromossoma 21, na região 21q22.3. A
sequência de DNA é de 23,7 kb e contém 17 exões. Este gene é expresso em todos os tecidos, mas
6
maioritariamente no fígado42. Uma das mutações mais frequentes envolve a inserção de 68 pb (844ins68)
que duplica a região intrão7/ exão 8.
Embora o mecanismo exato pelo qual o alelo 844ins68 afeta a função da enzima CβS não esteja
perfeitamente esclarecido, foi mencionado que a presença deste alelo aumenta a atividade enzimática.
1.4.4. Gluatationa S-Transferase e Perda Auditiva
As enzimas GST estão codificadas numa família de genes de enzimas responsáveis por catalisar
a conjugação da forma reduzida de glutationa (GSH) a substratos xenobióticos, indutores de stresse
oxidante. As GST humanas, expressas em todos os tecidos, podem ser divididas em cinco classes
principais: alfa, mu, pi, theta e zeta43–45.
Nos seres humanos o gene GSTM1 (classe mu) está localizado no cromossoma 1, na região
1p13.3. A sequencia de DNA é de 20 Kb, é constituído por 7 exões e possui 3 formas alélicas,
GSTM1*A, GSTM1*B e GSTM1*0. Os alelos GSTM1*A e GSTM1*B diferem num nucleótido, de
C→T, na posição 534, resultando na troca de uma lisina por uma aspargina, não tendo implicações
funcionais. O alelo GSTM1*0 é um alelo nulo resultante de uma deleção que compromete a transcrição
de RNAm e consequentemente a produção da enzima. Assim, o GSTM1*A e GSTM1*B possuem um
fenótipo ativo e o GSTM1*0 é responsável pelo fenótipo nulo que leva à ausência da atividade
enzimática46.
Nos seres humanos o gene GSTT1 (classe theta) está localizado no cromossoma 22, na região
22q11.2. A sequencia de DNA é de 20 kb constituído por 5 exões e possui 2 formas alélicas, GSTT1*1
e GSTT1*0. O alelo GSTT1*1 corresponde à forma alélica funcional enquanto o alelo GSTT1*0,
corresponde a uma forma não funcional ou nula. O alelo nulo é responsável pelo fenótipo nulo que leva
à ausência da atividade enzimática45,47.
A existência de genótipos nulos comprometem a conjunção do GSH com metabolitos ou toxinas
oxidantes. Sabe-se também que níveis elevados de ERO modulam a expressão e atividade de enzimas
antioxidantes, incluindo as GST, o que promove a diminuição dos níveis de GSH, originando lesões nas
células da cóclea e consequentemente PA48,49.
1.4.5. Sintase do Óxido Nítrico e Perda Auditiva
A sintase endotelial do óxido nítrico (eNOS) é a principal enzima responsável pela síntese de
óxido nítrico (NO) no endotélio vascular, o qual tem um papel vasoprotetor, antioxidante, intervindo no
metabolismo de substâncias endógenas e exógenas50. O NO é sintetizado a partir do aminoácido L-
arginina, sendo para isso necessária a presença de O2, NADPH e do cofator tetrahidrobiopterina (BH4).
A enzima eNOS é codificada pelo gene NOS3, localizado no cromossoma 7, na região 7q35-36. A
sequência de DNA é de 4,4 kb e contém 26 exões50. Foram já caracterizados vários polimorfismos no
gene NOS3, incluindo polimorfismos de base única (SNPs), inserções/deleções e repetições de número
variável em tandem (VNTR). Existe um VNTR descrito com repetições de 27 pb, localizada no intrão
4, sendo os alelos mais frequentes o alelo 4b (5 repetições) e o alelo 4a (4 repetições), embora outros
alelos mais raros tenham já sido relatados51.O alelo 4a está associado a baixa produção de nitrato
plamático, em que os indivíduos homozigóticos para o referido alelo apresentam uma redução de 20%
na concentração dos compostos do NO em comparação com os indivíduos com genótipo 4b4b, bem
como a diminuição da expressão da proteína eNOS52.
O stresse oxidante é considerado um dos principais mecanismos da redução de disponibilidade
de NO50-55 uma vez que num processo denominado desacoplamento da eNOS leva à produção de O-2 em
vez de NO. Um dos principais determinantes do desacoplamento da eNOS é a perda de
biodisponibilidade do cofator BH4, promovida pelas ERO50,53,54.
7
Trabalhos de Xiaorui55 e seus colaboradores demonstraram a existência de eNOS no endotélio
dos vasos das células ciliadas internas e externas do órgão de Corti e trabalhos de Popa56 detetaram a
presença de eNOS nas células ciliadas e de suporte.
Estudos de Lubos e colaboradores57 sugerem que o alelo 4a contribui para a PA, devido à baixa
biodisponibilidade de NO.
1.4.5.1 Relação do Metabolismo do Óxido Nítrico com o Metabolismo da Homocisteína
Sabe-se que as propriedades vasodilatadoras das células endoteliais são alteradas em condições
de hiperhomocisteinemia, especificamente no que se refere à produção de NO, uma vez que que a
oxidação da hcy origina ERO que inativam a enzima e NOS335,58.
1.4.6. Glucose-6-Fosfato Desidrogenase (G6PD) e Perda Auditiva
A G6PD é uma enzima citoplasmática expressa em todos os tecidos, mas a sua deficiência
manifesta-se essencialmente nos eritrócitos59. Catalisa o primeiro passo da via das pentoses fosfato,
transformando a glicose-6-fosfato em 6-fosfogluconato com redução do NADP a NADPH, o qual, está
estreitamente relacionado com o metabolismo da glutationa, mantendo esta no seu estado reduzido
(GSH). De facto, o NADPH formado irá atuar no ciclo da glutationa, uma vez que a glutationa redutase
irá necessitar de NADPH para reduzir a GSSG a GSH59. Também, para que ocorra síntese de NO é
necessária a presença do cofator NADPH. Alterações na atividade da G6PD afetam a produção de
NADPH, o que origina a diminuição da produção de NO e consequentemente a redução da sua
biodisponibilidade e aumento do stresse oxidante72,87.
O gene que codifica a enzima G6PD localiza-se no cromossoma X, na região Xq28. A sequência
de DNA é de 20 kb e contém 13 exões. As diversas mutações no gene G6PD resultam em diferentes
proteínas com níveis de atividade enzimática variáveis, associadas a um largo espetro de fenótipos
bioquímicos e clínicos. As variáveis mais frequentes denominam-se do tipo A, enquanto o tipo B
corresponde ao alelo normal. As variantes do tipo A são predominantemente encontradas na população
africana, onde a malária é endémica. Por exemplo, uma substituição de A→G na posição 376
(rs1050829, ou variante A+) causa uma redução de 15% da atividade enzimática. A substituição de
G→A na posição 202 (rs1050828, ou variante A-) causa uma redução de 85% da atividade enzimática
A variante A- é tipicamente definida pela presença tanto do alelo rs1050829 como do alelo
rs105082859,60. A icterícia neonatal e a anemia hemolítica aguda são as manifestações clínicas mais
frequentes da variante A-, havendo estudos que associam esta enzimopatia à PA neurossensorial 21. De
facto, uma das consequências da icterícia neonatal é o elevado nível plasmático de bilirrubina, o qual
induz toxicidade originando danos no sistema auditivo e consequentemente PA61.
1.5. Epistasia
A epistasia descreve a interação entre dois ou mais genes que não fazem parte do mesmo locus,
a interação tem uma consequência fenotípica, e um dos genes pode modificar a expressão do (s) outro
(s) (epistasia antagonista), ou por outro lado pode reforçar a expressão do outro gene (epistasia
sinérgica)62,63. Os estudos epistáticos permitem obter mais informações acerca de como os genes afetam
a suscetibilidade a doenças e assim avançar com descobertas nomeadamente na área da medicina63. No
presente trabalho pretendeu-se testar a associação entre a PA com a interação entre 2 genes candidatos.
1.6. Genética Populacional
A diversidade genética das populações africanas atuais é o resultado de uma história antiga e
complexa. A chegada de exploradores e comerciantes portugueses à costa subsaariana durante o século
8
XV representou um capítulo novo na história do continente africano. Um exemplo é a história do
povoamento de STP. Este arquipélago é constituído por um grupo de ilhas de origem vulcânica,
localizadas na zona equatorial africana, com aproximadamente 187 000 habitantes e uma área total de
1001 km2. O isolamento de STP em relação aos outros países do continente africano gerou uma
diversidade biológica singular, contribuindo para isso, o facto de não ter fronteiras terrestres, mas
situar-se relativamente próximo das costas do Gabão, Guiné Equatorial, Camarões e Nigéria 64–66.
As ilhas de STP permaneceram desabitadas até 1470, ano em que os navegadores portugueses
João de Santarém e Pêro Escobar, numa tentativa de alcançar a rota marítima para a Índia, descobriram
as ilhas. A colonização teve início no final do século XV, liderada por Álvaro Caminha, tendo sido feita
em conjunto com cristãos novos que tinham sido expulsos de Portugal pela Inquisição. A localização
estratégica das ilhas permitiu o estabelecimento de importantes portos para os portugueses nos séculos
seguintes64–66.
Durante o século XVII e XVIII, STP viveu-se um período de enorme despovoamento e a
atividade local destinava-se quase exclusivamente ao negócio de escravos e mantimentos para os
nativos. Apesar deste período de estagnação que afetou STP, o país acabou por recuperar a economia e
a população com a introdução do café, em 1787, e do cacau, em 1821, levando a que muitas famílias
portuguesas fossem viver para STP. Em 1876 a escravatura foi abolida, contudo o trabalho escravo
continuou por várias décadas, sendo a mão-de-obra originária de diferentes regiões da costa ocidental
do continente africano até à independência em 1975. Assim, as raízes dos são-tomenses remontam aos
escravos trazidos para as ilhas durante o período inicial de ocupação, que entraram em STP em massa
desde o início do século XIX, para suprir as necessidades das emergentes economias de café e cacau.
As populações são as unidades sobre as quais se medem as variações genéticas e evoluem
quando ocorre uma alteração no seu fundo genético, ou no conjunto de alelos que a caracteriza. STP foi
ao longo dos séculos, colonizado, recebeu escravos e sofreu despovoamentos, tendo sido por isso alvo
de fatores relevantes na alteração do seu fundo genético, como as migrações e a deriva genética.
9
2. Objetivos
O presente estudo tem como objetivo principal verificar se polimorfismos genéticos em genes
que codificam para proteínas envolvidas no processo de stresse oxidante, influenciam a suscetibilidade
para a surdez neurosensorial em STP.
Mais especificamente pretende-se numa fase inicial testar a existência de diferenças nas
distribuições genótipicas e alélicas em genes relacionados com o stresse oxidante, entre a população
Portuguesa e a população de STP. Numa segunda fase pretende-se perceber se as diferenças encontradas
poderão estar a contribuir para as elevadas frequências de Perda Auditiva em STP. Com esse fim serão
realizados estudos de associação na população de STP, entre as variantes genéticas e a perda auditiva.
Os polimorfismos em estudo são:
a) Substituição C677T no gene MTHFR;
b) Inserção de 68 pb no intrão 8 no gene CβS;
c) Deleção das isoformas GSTM1 e GSTT1;
d) VNTR no intrão 4 no gene NOS3;
10
3. Metodologia
3.1. Seleção da Amostra Populacional
Este estudo incide sobre uma amostra de 316 indivíduos de STP constituída por 2 grupos, um
de 136 indivíduos com PA (ligeira, moderada, severa ou profunda) em pelo menos um dos ouvidos e
outro grupo de 180 indivíduos, que corresponde ao grupo controlo, com audição normal em ambos os
ouvidos.
Todos os participantes responderam a um questionário de forma a caraterizar na história clínica
os fatores de risco. Dos fatores de risco constam a história familiar de PA, consanguinidade, historial
pré- e peri natal, conhecimento de infeção por malária, infeção por rubéola e outros agentes. O estado
de audição foi avaliado através de audiogramas (entre 200 Hz e 8000 Hz).
Do estudo foram excluídos indivíduos com menos de 2 anos e mais de 35 anos. Foram também
excluídos indivíduos com PA por condução ou mista de causas identificadas, indivíduos que
apresentavam atrasos no desenvolvimento psicomotor e indivíduos que tiveram complicações neonatais.
3.2. Análise Genética
3.2.1. Amplificação dos Fragmentos de DNA a Estudar
A amplificação dos fragmentos de DNA foi efetuada pela reação de PCR (Polymerase Chain
Reaction) que consiste numa série de ciclos, cada um dos quais constituído por um conjunto de reações
efetuadas a diferentes temperaturas. Cada ciclo de PCR envolve a desnaturação do DNA, o
emparelhamento (annealing) de primers e a síntese de DNA. Para tal, utilizou-se um termociclador
(GenoSmart2, VWR) e as condições de amplificação descritas (Tabela 3.1). Amplificaram-se
fragmentos dos genes MTHFR, CβS, GST (GSTM1 e GSTT1) e NOS3.
11
Tabela 3.1 Polimorfismo, primers, condições de amplificação e tamanho esperado dos fragmentos
Gene (polimorfismo) Primers Condições de
PCR
Mistura
Reacional
Tamanho
dos
fragmentos
MTHFR
(C677T)
5’TGAAGGAGAAGGTGTCTGCGGGA 3’
5’AGGACGGTGCGGTGAGAGTG 3’
35 Ciclos
Desnaturação
30 seg a 94ºC
Annealing
30 seg. a 61ºC
Extensão
45 seg. a 72ºC
Extensão final
7 min. a 72ºC
Primer F: 1 µl
(10pmol/µl)
Primer R: 1µl
(10pmol/µl)
Master mix*:
12,5 µl
H2O: 3 µl
DMSO: 2,5 µl
DNA: 5 µl
V. final: 25µl
198 pb
CβS
(ins68pb)
5’GCAGTTGTTAACGGCGGTATTG 3’
5’ GCCGGGCTCTGGACTCGACCTA 3’
40 Ciclos
Desnaturação
30 seg a 94ºC
Annealing
30 seg a 6ºC
Extensão
40 seg a 72ºC
Extensão final
10 min a 72ºC
Primer F: 1µl
(10pmol/µl)
Primer R: 1µl
(10pmol/µl)
Master mix*:
12,5 µl
H2O: 5,5 µl
DNA: 5 µl
V. final: 25 µl
Sem
inserção 252
pb
Com
inserção
320 pb
GST (T1 e M1)
(nulo/não nulo)
Primer 1 (GSTM1):
5’GCCATCTTGTGCTACATTGCCCG3’
Primer 2 (GSTM1):
5’ATCTTCTCCTCTTCTGTCTCCCC 3’
Primer 3 (GSTM4):
5’TTCTGGATTGTAGCAGATCATGCCC 3’
Primer 4 (GSTT1):
5’TTCCTTACTGGTCCTCACATCTC 3’
Primer 5 (GSTT1):
5’TCACCGGATCATGGCCAGCA3’
40 Ciclos
Desnaturação
45 seg a 94ºC
Annealing
45 seg a 58ºC
Extensão
45 seg a 72ºC
Extensão final
5 min a 72ºC
Primer F: 1µl
(10pmol/µl)
Primer R: 1µl
(10pmol/µl)
Master mix*:
12,5 µl
H2O: 5,5 µl
DNA: 5µL
V.final: 25 µl
GSTM1-
230pb
GSTM4 -
157 pb
GSTT1- 480
pb
NOS3
(VNTR do intrão 4)
5’AGGCCCTATGGTAGTGCCTT 3’
5’TCTCTTAGTGCTGTGGTCAC 3’
35 Ciclos
Desnaturação:
30 seg. a 94ºC
Annealing:
30 seg. a 55ºC
Extensão:
45 seg. a 72ºC
Extensão final:
5 min. a 72ºC
Primer F: 1 µl
(10pmol/µl)
Primer R: 1µl
(10pmol/µl)
Master mix*:
12,5 µl
H2O: 5,5µl
DNA: 5µl
V. final: 25 µl
Variante a
393 pb
Variante b
420 pb
*Dream Taq Green PCR Master Mix 2x - Thermo Scientific
A confirmação da amplificação foi efetuada por eletroforese em gel de agarose. Os géis foram
feitos a uma concentração de agarose a 3% para o gene MTHFR e de 2% para os genes CβS, GST (M1
e T1) e NOS3 e feitos num volume de 120 ml de TAE 1x concentrado (TAE 10x: 20 mM Tris-Acetato,
1 mM EDTA, pH 8) e uma concentração de brometo de etídeo de 10 mg/ml. Para os polimorfismos
NOS3 e MTHFR, a eletroforese foi realizada a 120 V durante 90 minutos, para os polimorfismos GST
(M1 e T1) a eletroforese foi realizada a 120 V durante 60 minutos e para o polimorfismo CβS a
12
eletroforese foi realizada a 130 V durante 50 minutos. Um transiluminador (GenoSmart, VWR) foi
utilizado para visualizar o perfil de migração.
3.2.2. Genotipagem
Dos polimorfismos estudados, quatro – nos genes NOS3, CβS, GST (M1 e T1) - são detetados
por variação do tamanho do produto amplificado, sendo apenas necessário recorrer à técnica do PCR e
eletroforese. Os tamanhos esperados encontram-se descritos na Tabela 2.1. O polimorfismo MTHFR é
um polimorfismo de um único nucleótido, pelo que a genotipagem é efetuada recorrendo à técnica de
RFLP (Restriction Frangment Length Polymorphism), a qual consiste numa restrição enzimática que
permite discriminar os alelos através do padrão de migração dos fragmentos de restrição obtidos em
eletroforese de gel de agarose. O gel de 2 a 3%, foi feito com 120 ml de TAE 1x concentrado (TAE 10x:
20 mM Tris-Acetato, 1 mM EDTA, pH 8) e 10 mg/ml de brometo de etídio. A restrição foi efetuada
num termociclador (GenoSmart2, VWR) nas condições descritas na (Tabela 3.2) e a eletroforese
realizada a 130 V durante 60 minutos. O perfil eletroforético foi visualizado num transiluminador
(GenoSmart, VWR).
Tabela 3.2 Condições de Restrições e Possíveis Tamanhos dos Fragmentos do Polimorfismo MTHFR
Gene Polimorfismo Componentes Condições da
Restrição
Tamanho dos
fragmentos
MTHFR
C677T
Enzima: 1µl Hinf I (5U/µl)
Tampão R+: 2 µl 10X buffer
H2O: 12 µl
Produto de PCR: 10 µl
V. final: 25 µl
18 h, 37ºC
CC -198 pb
CT -198, 175 e 23 pb
TT -175 e 23 pb
3.3. Tratamento Estatístico
3.3.1 Estudo Populacional
Para a realização do estudo populacional foi analisada uma população africana (STP) e uma
população do Sul da Europa (Portugal). Para os genes MTHFR, CβS, GST (M1 e T1), NOS3 e G6PD
foram comparadas as frequências genotípicas observadas com as frequências esperadas em equilíbrio
Hardy-Weinberg, utilizando o teste do Qui-quadrado (ꭓ 2). Para avaliar a existência de diferença
significativa na distribuição dos genótipos e dos alelos entre as populações africana e portuguesa foi
realizado o teste do ꭓ 2. O teste estatístico aplicado aos genes CβS e G6PD foi o teste exato Monte-Carlo
(uma vez que existiam em ambos os casos mais de 20% de células com frequência esperada inferior a
5). Todos os resultados foram obtidos usando o programa estatístico SPSS 25, sendo o nível de
significância estatística estabelecido para p <0,05.
3.3.2 Estudos de Associação
Neste trabalho foram realizados estudos de associação entre as variantes genéticas e a PA,
usando o teste de ꭓ2 e de Fisher, sendo o nível de significância estatística estabelecido para p <0,05.
A análise foi inicialmente realizada com foco em cada variante isoladamente – análise isolada -
e posteriormente com foco numa combinação de genótipos de 2 genes – análise epistática.
13
3.3.2.1 Análise Isolada
Para cada polimorfismo, utilizou-se o teste do ꭓ2 para testar se a população estava em equilíbrio
Hardy-Weinberg.
Compararam-se as distribuições das frequências genotípicas e alélicas entre o grupo com PA e
o grupo de controlo, utilizando o teste do ꭓ2 para todos os genes exceto para o gene GSTT1, no qual foi
usado o teste de Fisher uma vez que uma célula esperava uma contagem menor que 5 sendo o nível de
significância estatística estabelecido para p <0,05. O nível de proteção ou risco foi avaliado através de
Odds Ratio (OR).
A avaliação da normalidade da variável idade foi efetuada através do teste Kolmogorov-
Smirnov. Para testar se havia diferenças na idade relativamente à gravidade na PA utilizou-se o teste
ANOVA.
3.3.2.2 Análise Epistática
Foi realizado o teste do ꭓ2 de modo a estudar a associação entre uma combinação de genótipos
para 2 genes e o fenótipo em estudo. Foram analisadas todas as combinações possíveis de genótipos
entre 2 genes, num universo de 6 genes. O nível de proteção ou risco foi avaliado através de OR, sendo
o nível de significância estatística estabelecido para p <0,05.
14
4. Resultados
4.1. Caraterização da População em Estudo
A população estudada é constituída por 316 indivíduos com idades compreendidas entre os 2 os
35 anos, com uma média de 17,4 anos e desvio padrão de 9,7 anos, dos quais 172 (54,4%) são do sexo
masculino e 144 (45,6%) são do sexo feminino.
4.1.1. Caraterização da População quanto à Infeção por Malária
Dentro da população de 316 indivíduos, 194 (61,4%) já tinham contraído malária, os quais
apresentaram em média 20,6 anos de idade com desvio padrão de 9,0 anos. Destes, 83 (42,8%) são do
sexo masculino e 111 (57,2%) são do sexo feminino. Cento e treze (35,8%) indivíduos nunca contraíram
malária, e apresentaram uma média de 12,3 anos de idade com desvio padrão de 8,4 anos. Destes, 58
(51,3%) são do sexo masculino e 55 (48,7%) são do sexo feminino; os restantes 9 (2,8%) indivíduos
não souberam responder à questão, os quais apresentaram média de 10,4 anos de idade, com desvio
padrão de 6,9 anos. Destes, 6 (66,7%) são do sexo feminino e 3 (33,3%) são do sexo masculino. A
infeção por malária não apresenta diferenças estatisticamente significativas relativamente ao sexo
(F=1,750; p=0,193). Existem diferenças estatisticamente significativas no que diz respeito à idade entre
os indivíduos que já tinham contraído malária e os que nunca contraíram (t=7,910; p <0,001).
4.1.2. Caraterização da População quanto à Presença da Mutação Drepanocítica
Dentro da população de 316 indivíduos, 5 (3,3%) indivíduos têm mutação para a drepanocitose,
apresentando uma média de 17,4 anos de idade com desvio padrão de 9,6 anos. Dentro destes, 3 (60,0%)
são do sexo masculino e 2 (40,0%) são do sexo feminino. Os restantes 311 (96,7%) indivíduos não têm
mutação para a drepanocitose, e apresentam uma média de 16,8 anos de idade com desvio padrão de
13,8 anos. Destes, 170 (54,7%) são do sexo masculino e 141 (45,3%) são do sexo feminino. A presença
da mutação drepanocítica não está associada ao sexo (F=0,427; p=0,663) nem à idade (t=0,140;
p=0,889).
4.1.3. Caraterização da População quanto à Perda Auditiva
Na população de 316 indivíduos, 180 (56,9%) são ouvintes e 136 (43,1%) têm PA (unilateral
ou bilateral). Dentro do grupo de ouvintes, 87 (48,3%) são do sexo masculino e 93 (51,7%) são do sexo
feminino. Dentro do grupo de indivíduos com PA, 57 (41,9%) são do sexo masculino e 79 (58,1%) são
do sexo feminino. A presença de PA não apresenta diferenças estatisticamente significativas
relativamente ao sexo (F=1,238; p= 0,266). Não existem diferenças estatisticamente significativas na
idade entre os individuo ouvintes e os indivíduos com PA (t= 53,315; p=0,427).
4.1.3.1. Caraterização da População quanto à gravidade na Perda Auditiva
Na população constituída por 316 indivíduos, 180 (70,9%) têm audição normal bilateral e 136
(43,0%) indivíduos têm PA. Destes, 37 (27,2%) indivíduos têm PA ligeira, 23 (17,0%) indivíduos têm
PA moderada, 21 (15,4%) indivíduos têm PA severa e 55 (40,4%) indivíduos têm PA profunda.
15
Tabela 4.1. Frequência e número de indivíduos do sexo masculino e feminino quanto ao grau de severidade na PA
Controlo
(n=180)
(%)
PA Ligeira
(n=37) (%)
PA
Moderada
(n=23) (%)
PA Severa
(n=21) (%)
PA
Profunda
(n=55) (%)
Valor de
p*
Feminino
Masculino
93 (51,7%)
87 (48,3%)
27 (73,0%)
10 (27,0%)
9 (39,1%)
14 (60,9%)
15 (71,4%)
6 ( 28,6%)
28 (50,9%)
27 (49,1%) 0,032
*F
A severidade na PA apresenta diferenças estatisticamente significativas relativamente ao sexo
(ꭓ 2 = 10,575; p=0,032).
Tabela 4.2. Média e desvio padrão das idades nas diferentes categorias de severidade da PA e no grupo de controlo
Controlos
(n=180)
(μ;σ)
PA
Ligeira
(n=37)
(μ;σ)
PA
Moderada
(n=23)
(μ;σ)
PA
Severa
(n=21)
(μ;σ)
PA
Profunda
(n=55)
(μ;σ)
Valor de
p*
Idade 17,78; 9,77 18,00;
9,45 16,57; 10,29
18,00;
10,18 15,87; 9,66 0,735
*ANOVA μ: média,σ:Desvio Padrão
Quanto à idade, não existem diferenças significativas entre os grupos e a gravidade de PA.
4.1.3.2 Caraterização da População quanto à lateralidade na Perda Auditiva
Da amostra de 136 indivíduos com PA 44 (32,4%) têm PA unilateral e 92 (67,6%) têm PA
bilateral.
A lateralidade na PA não apresenta diferenças estatisticamente significativas relativamente ao
sexo (ꭓ2 =1,650; p=0,438) (tabela 4.3).
4.3. Frequência e número de indivíduos do sexo masculino e feminino relativamente à lateralidade na PA
PA Unilateral
(n=44) (%) PA Bilateral (n=92) (%) Valor de p*
Feminino
Masculino
27 (61,4%) 17 (38,6%)
52 (56,5%) 40 (43,5%)
0,202
*t
Não existem diferenças estatisticamente significativas na idade quanto à lateralidade na PA
(t=100,207; p=0,202) (tabela 4.4).
16
Tabela 4.4 Média e desvio padrão das idades na PA unilateral e bilateral
PA unilateral (n=44)
(μ, σ)
PA bilateral (n=92)
(μ, σ)
Idade 20,09; 9,28 15,37;9,61
4.2. Estudo Populacional das Distribuições Genotípicas e Alélicas nos Genes MTHFR, CβS, GST
(M1 e T1) NOS3 e G6PD em STP e Portugal
4.2.1. Caraterização das Populações em Estudo
Para este estudo foi realizado uma comparação das frequências genotípicas e alélicas em genes
envolvidos no stresse oxidante, entre uma população do Sul da Europa – Portugal - e uma população
africana – STP. A população de STP encontra-se caracterizada no capítulo 3.1. A população portuguesa
é constituída por 178 indivíduos, destes 92 (51,7%) são do sexo feminino e 86 (48,3%) são do sexo
masculino com uma média de 54,3 anos e um desvio padrão de 12,1 anos.
Os genes analisados foram: MTHFR, CβS,GSTM1, GSTT1, NOS3 e G6PD.
4.2.1.1. Estudo do Gene MTHFR nas Populações de STP e Portuguesa
Um exemplo representativo da obtenção de dados relativos à genotipagem do gene MTHFR
encontra-se no Anexo 1. De referir que neste caso, a enzima de restrição Hinf I corta o alelo T.
Para o gene MTHFR a população de STP não está em equilíbrio Hardy-Weinberg (ꭓ 2 = 38,315;
p <0,001), já a população portuguesa está em equilíbrio Hardy-Weinberg ( ꭓ 2 = 0,542; p=0,461). Foram
calculadas as frequências genotípicas e alélicas para as duas populações, tendo-se observado a existência
de diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos e dos alelos do gene MTHFR
nas populações de STP e Portuguesa, como mostram as Tabelas 4.5 e 4.6, respetivamente.
Tabela 4.5 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo C677T nas populações de STP e Portuguesa
MTHFR STP (n=129)
(%) Portugal (n=120) (%) Valor de p*
CC
CT
TT
109 (84,5%)
15 (11,6%)
5 (3,9%)
61 (50,8%)
52 (43,3%)
7 (5,8%)
<0,001
*ꭓ2
Tabela 4.6 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo C677T do gene MTHFR nas populações de STP e Portuguesa
Alelos STP (n=258) (%) Portugal (n=240) (%) Valor de p*
C
T
233 (90,3%)
25 (9,7%)
174 (72,5%)
66 (27,5%)
<0,001
* ꭓ2
μ média, σ desvio padrão;
17
4.2.1.2. Estudo do Gene CβS nas Populações de STP e Portuguesa
Um exemplo representativo da obtenção de dados relativos à genotipagem do gene CβS
encontra-se no Anexo 2.
Para o gene CβS as populações de STP e Portugal não se encontram em equilíbrio Hardy-
Weinberg (ꭓ2=2,011; p <0,001; (ꭓ2=162,070; p <0,001).
Foram calculadas as frequências genotípicas e alélicas para as mesmas populações, tendo-se
verificado a existência de diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos e dos
alelos do gene CβS nas populações, como mostram as Tabelas 4.7 e 4.8, respetivamente.
Tabela 4.7 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo de inserção de 68 pb do gene CβS na população de STP e Portuguesa
CβS STP (n=85) (%) Portugal (n=114) (%) Valor de p*
del/del
ins/del
ins/ins
33 (38,8%)
43 (50,6%)
9 (10,6%)
112 (98,2%)
0 (0,0%)
2 (1,8%)
<0,001
*Teste exato Monte-Carlo
Tabela 4.8 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo de inserção de 68 pb no intrão 8 do gene CβS na população de STP e Portuguesa
Alelos STP
(n=170) (%) Portugal
(n=228) (%) Valor de p*
del ins
109 (64,1 %) 61 (35, 9%)
224 (98,2%) 4 (1,8%)
<0,001
*ꭓ2
4.2.1.3. Estudo do Gene GSTM1 nas Populações de STP e Portuguesa
Um exemplo representativo da obtenção de dados relativos à genotipagem do gene GSTM1
encontra-se no Anexo 3.
Para o gene GSTM1 não pode ser calculado o equilíbrio Hardy-Weinberg nem as frequências
alélicas uma vez que não se consegue distinguir um homozigótico não nulo de um heterozigótico.
Foram calculadas as frequências genotípicas para as mesmas populações, tendo-se verificado a
existência de diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos do gene GSTM1
nas populações de STP e Portuguesa, como mostra a Tabela 4.9, sendo mais frequente a presença de
genótipo nulo (M1*0) na população Africana do que na população Portuguesa.
Tabela 4.9 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (M1*0) e não nulo (M1*1) do gene GSTM1 nas populações de STP e Portuguesa
GSTM1 STP (n=126) (%) Portugal (n=107) (%) Valor de p*
M1*1
M1*0
27 (21,4%)
99 (78,6%)
61(57,1%)
46 (42,9%) <0,001
*ꭓ2
18
4.2.1.4. Estudo do Gene GSTT1 nas Populações de STP e Portuguesa.
Um exemplo representativo da obtenção de dados relativos à genotipagem do gene GSTT1
encontra-se no Anexo 3.
Para o gene GSTT1 também não foi possível calcular o equilíbrio Hardy-Weinberg nem as
frequências alélicas uma vez que não se consegue distinguir um homozigótico não nulo de
heterozigótico.
Foram calculadas as frequências genotípicas para as mesmas populações, tendo-se verificado a
existência de diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos do gene GSTT1
nas populações de STP e Portuguesa, como mostra a Tabela 4.10, sendo mais frequente a presença de
genótipo nulo (T1*0) na população Africana do que na população Portuguesa.
Tabela 4.10 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (T1*0) e não nulo (T1*1) do gene GSTT1 nas populações de STP e Portuguesa
GSTT1 STP (n=126) (%) Portugal (n=107) (%) Valor de p*
T1*1
T1*0
3 (2,4%)
123 (97,6%)
99 (92,5%)
8 (7,5%)
<0,001
*ꭓ2
4.2.1.5. Estudo do Gene NOS3 nas Populações de STP e Portuguesa
Um exemplo representativo da obtenção de dados relativos à genotipagem do gene NOS3
encontra-se no Anexo 4.
Para o gene NOS3, a população de STP não se encontra em equilíbrio Hardy-Weinberg
(ꭓ2=15,079; p <0,001); já a população portuguesa encontram-se em equilíbrio Hardy-Weinberg e
ꭓ2=0,692; p=0,405).
Foram calculadas as frequências genotípicas e alélicas para as duas populações, tendo-se
observado a existência de diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos e dos
alelos nas populações de STP e Portuguesa, como mostram as Tabelas 4.11 e 4.12, respetivamente.
Tabela 4.11 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo VNTR do gene NOS3 nas populações de STP e Portuguesa
NOS3 STP (n=53) (%) Portugal (n=157) (%) Valor de p*
4b4b
4b4a
4a4a
23 (43,4%)
24 (45,3%)
6 (11,3%)
106 (67,5%)
46 (29,3%)
5 (3,2%)
0,003
*ꭓ2
19
Tabela 4.12 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo VNTR do gene NOS3 nas populações de STP e
Portuguesa
4.2.1.6 Estudo do Gene G6PD nas Populações de STP e Portuguesa
Para o gene G6PD as populações de STP e portuguesa não estão em equilíbrio Hardy-Weinberg
(ꭓ2= 24,557; p <0,001; ꭓ2=81,112; p <0,001, respetivamente).
Foram calculadas as frequências genotípicas e alélicas para as mesmas populações, tendo-se
observado a existência de diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos e dos
alelos do gene G6PD, como mostram as Tabelas 4.13 e 4.14, respetivamente.
Tabela 4.13 Distribuição das frequências genotípicas da variante A+ do gene G6PD nas populações de STP e Portuguesa
G6PD STP (n=178) (%) Portugal (n=140) (%) Valor de p*
AA/A
AG
GG/G
94 (52,8%)
42 (23,6%)
42 (23,6%)
137 (97,9%)
2 (1,4%)
1 (0,7%)
<0,001
*Teste exato Monte-Carlo
Tabela 4.14 Distribuição das frequências alélicas da variante A+ do Gene G6PD nas populações de STP e Portuguesas
Alelos STP (n=270) (%) Portugal (n=260) (%) Valor de p*
A
G
173 (64,1%)
97 (35,9%)
256 (98,5%)
4 (1,5%) <0,001
*ꭓ2
4.3 Estudos de associação para os genes MTHFR, CβS, GST (M1 e T1) e NOS3
4.3.1. Análise do Polimorfismo C677T do Gene MTHFR
Para o gene MTHFR, foi possível obter resultados para 230 indivíduos da amostra tendo sido
calculadas as frequências genotípicas e alélicas e comparadas as suas distribuições entre a população
ouvinte e a população com PA, não se observando diferenças estatisticamente significativas, como
mostram as Tabelas 4.15 e 4.16 respetivamente.
As populações ouvinte e surda não estão em equilíbrio Hardy-Weinberg (ꭓ2 =38,315 p <0,001)
(ꭓ2 = 50,767; p <0,001) para o polimorfismo em análise.
NOS3 STP (n=106) (%) Portugal (n=314) (%) Valor de p*
4b
4a
70 (66,0%)
36 (40,0%)
258 (82,2%)
56 (17,8%)
0,001
*ꭓ2
20
Tabela 4.15 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo C677T do gene do gene MTHFR
Genótipo População Ouvinte
(n=129) (%)
População Surda
(n=101) (%) Valor de p*
CC
CT
TT
109 (84,5%)
15 (11,6%)
5 (3,9%)
88 (87,1%)
9 (8,9%)
4 (4,0%)
0,799
*ꭓ2
Tabela 4.16 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo C677T na população ouvinte e na população surda
Alelos População Ouvinte
(n=258) (%)
População Surda
(n=202) (%) Valor de p*
C
T
233 (90,3%)
25 (9,7%)
185 (91,6%)
17 (8,4%) 0,637
*ꭓ2
4.3.2. Análise do Polimorfismo de Inserção de 68 pb no intrão 8 do Gene CβS
Para o gene CβS, foi possível obter resultados para 154 indivíduos da amostra tendo sido
calculadas as frequências genotípicas e alélicas e comparadas as suas distribuições entre a população
ouvinte e a população com PA, observando-se diferenças estatisticamente significativa na distribuições
dos genótipos e alelos do gene CβS, como mostram as Tabelas 4.17 e 4.18. As populações ouvinte e
surda não estão em equilíbrio Hardy-Weinberg (ꭓ2 = 2,011; p <0,001 e ꭓ2 = 17,969; p < 0,001,
respetivamente) para o polimorfismo em análise.
Tabela 4.17 Distribuição das frequências genotípicas de ins68 pb no intrão 8 do gene CβS na população ouvinte e na população surda
Genótipo População Ouvinte
(n=85) (%)
População Surda
(n=69) (%) Valor de p*
del/del
del/ins
ins/ins
33 (38,8%)
43 (50,6%)
9 (10,6%)
42 (60,9%)
22 (31,9%)
5 (7,2%)
0,024
*ꭓ2
Através do teste Odds Ratio (OR) verificou-se que a presença do alelo ins representa um fator
de proteção para o desenvolvimento da PA (OR=0,41; IC= [0,2127-0,7824]) (Tabela 4.18).
21
Tabela 4.18 Distribuição das frequências alélicas do polimorfismo de ins68 pb no intrão 8 do gene CβS na população ouvinte e na população surda
Alelos População Ouvinte
(n=170) (%)
População Surda
(n=138) (%) Valor de p*
del
ins
109 (64,1%)
61 (35,9%)
106 (76,8%)
32 (23,2%) 0,007
*ꭓ2
4.3.3. Análise dos Polimorfismos nos Genes GST (M1 e T1)
Para o gene GSTM1 foi possível obter resultados para 244 indivíduos da amostra tendo sido
calculadas as frequências genotípicas e comparadas as suas distribuições entre a população ouvinte e a
população com PA, não se observando diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos
genótipos, como mostra a Tabela 4.19.
Não foi possível calcular as frequências alélicas nem o equilíbrio Hardy-Weinberg uma vez que
não se consegue distinguir um homozigótico não nulo de um heterozigótico.
Tabela 4.19 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (M1*0) e não nulo (M1*1) do gene GSTM1 na
população ouvinte e na população surda
Genótipo (GSTM1) População Ouvinte
(n=126) (%)
População Surda
(n=118) (%) Valor de p*
M1*1
M1*0
27 (21,4%)
99 (78,6%)
33 (27,9%)
85 (72,1%)
0,236
*ꭓ2
Para o gene GSTT1, foi possível obter resultados para 244 indivíduos da amostra tendo sido
calculadas as frequências genotípicas e comparadas as distribuições entre a população ouvinte e a
população com PA, não se observando diferenças estatisticamente significativas, como mostra a Tabela
4.20.
Não foi possível calcular as frequências alélicas nem o equilíbrio Hardy-Weinberg uma vez que
não se consegue distinguir um homozigótico não nulo de um heterozigótico.
22
Tabela 4.20 Distribuição das frequências genotípicas dos alelos nulos (T1*0) e não nulos (T1*1) do gene GSTT1 na população ouvinte e na população surda
Genótipo (GSTT1) População Ouvinte
(n= 126) (%)
População Surda (n=
118) (%) Valor de p*
T1*1
T1*0
3 (2,4%)
123 (97,6%)
7 (5,9%)
111 (94,1%)
0,204
*F
4.3.4.Análise do Polimorfismo VNTR do Gene NOS3
Para o gene NOS3, foi possível obter resultados para 75 indivíduos da amostra tendo sido
calculadas as frequências genotípicas e alélicas e comparadas as suas distribuições entre a população
ouvinte e a população com PA. Tanto a população com PA como a população ouvinte não se encontram
em equilíbrio de Hardy-Weinberg, (ꭓ2= 15,079; p <0,001 e ꭓ 2= 31460; p < 0,001 respetivamente) para
o polimorfismo em análise.
Não se observaram diferenças estatisticamente significativas na distribuição dos genótipos e dos
alelos do gene NOS3, como mostram as Tabela 4.21 e 4.22, respetivamente.
Tabela 4.21 Distribuição das frequências genotípicas do polimorfismo VNTR do gene NOS3 na população ouvinte e na população com PA
Genótipo População Ouvinte
(n=53) (%)
População Surda
(n=22) (%) Valor de p*
4b4b
4b4a
4a4a
23 (43,4%)
24 (45,3%)
6 (11,3%)
8 (36,4%)
12 (54,5%)
2 (9,1%)
0,765
*ꭓ2
Tabela 4.22 Distribuição das frequências alélicas no polimosfismo VNTR do gene NOS3 na população ouvinte e na população não ouvinte
Alelo População Ouvinte
(n=106) (%)
População Surda
(n=44) (%) Valor de p*
4b
4a
70 (66,0%)
36 (34,0%)
28 (63,6%)
16 (36,4%) 0,778
*ꭓ2
4.4 Estudo de Relações Epistáticas
Foram realizados estudos de associação para todas as combinações possíveis de genótipos entre
2 genes e o fenótipo PA.
Apenas obtivemos um resultado com associação significância à PA (Tabela 4.23) referente à
combinação dos genótipos CC-4b4b (MTHFR-NOS3), o qual representa um fator de risco.
23
Tabela 4.23 Associação significativa entre os genótipos dos genes MTHFR e NOS3 com a PA
Combinações Ouvintes (n=32)
(%) Surdos (n=10) (%) Valor de p* OR [IC,95%]
0
1
25 (78,1%)
7 (21,9%)
3 (30,0%)
7 (70,0%)
0,008
8,333
[1,697-40,911]
* F
0 - Combinações MTHFR-NOS3 (CC-4b4a | CC-4 a4a| CT-4b4b | CT-4b4a |CT-4 a4a | TT-4b4b| TT-4b4a |
TT-4a4a)
1 – Combinação MTHFR-NOS3 (CC-4b4b).
24
5. Discussão e Conclusão
O presente estudo é o primeiro que incide sobre stresse oxidante associado à PA neurossensorial
que se realiza em STP, pretendendo ser um contributo para o estudo da etiologia genética nesta condição.
Este trabalho teve como objetivo estudar as diferenças nas distribuições genótipicas e alélicas de genes
relacionados com o stresse oxidante, entre duas populações sujeitas a diferentes pressões ambientais e
perceber se estas diferenças poderiam estar a contribuir para a etiologia da PA neurossensorial.
Atualmente sabe-se que as condições ambientais existentes em África exerceram, ao longo do
tempo processos adaptativos que conduziram à seleção de determinados alelos72,73. Fatores climáticos,
como a temperatura e a humidade têm sido descritos como tendo um papel importante na determinação
da distribuição dos alelos em África67,68. STP é um país equatorial com elevadas temperaturas (variando
entre os 22ºC e os 30ºC) e humidade (variando entre os 30% e os 100%). A perda de calor por
transpiração é certamente essencial nos ambientes quentes e húmidos de STP74. Assim, nestas condições,
a perda excessiva de sódio pode comprometer a sobrevivência humana, por isso em climas tropicais a
avidez pelo sal e a sua conservação renal são essenciais. Assim, durante a história evolutiva, a seleção
de alelos compensatórios da perda de sódio poderá ter ocorrido. Aqui coloca-se a hipótese para esta
população de que a seleção desses alelos compensatórios em conjunto com a elevada frequência de
patologias, como a hipertensão67, a malária68, a SIDA/HIV69 ou a Rubéola8, todas estas promotoras de
desequilíbrios oxidantes, poderão através de um efeito cumulativo ou mesmo sinergético elevar os
efeitos do stresse oxidante e explicar a elevada prevalência de PA. O stresse oxidante desempenha um
papel critico na disfunção auditiva, uma vez que ativa as vias de apoptose em situações de exposição ao
ruído e, pode aumentar a suscetibilidade à exposição a drogas ototóxicas como os aminoglicosídeos ou
os antimaláricos1. Está descrito que lesões nas células ciliadas do ouvido interno podem resultar dum
efeito mediado por ERO59.
Numa primeira fase fez-se uma análise comparativa entre uma população africana de STP e uma
população do Sul da Europa - Portugal, tendo-se observado diferenças estatisticamente significativas na
distribuição dos genótipos e dos alelos dos genes MTHFR, CβS, GST (M1 e T1), NOS3 e G6PD,
verificando-se, com exceção para o gene MTHFR, uma maior frequência dos alelos e genótipos
associados ao stresse oxidante em STP.
Para o gene MTHFR, a presença do alelo C677T está associado a uma atividade enzimática
reduzida, comprometendo assim a via de remetilação da hcy e consequentemente provocando o aumento
de ERO39. Tal com os resultados deste trabalho mostram (Tabela 4.6), a frequência do alelo C677T é
frequentemente relatada como sendo elevada na Europa70,71 e baixa na África70,71,72. As razões para as
diferenças na distribuição do alelo C677T ainda não são claras, podendo envolver fatores genéticos e
ambientais73.
O alelo ins68 no gene CβS diminui a atividade da enzima42 e consequentemente a via de
transsulfuração, promovendo a conversão de hcy a cys42,74,75. Está descrito que o alelo ins68 é comum
entre os caucasianos, encontra-se ausente nos asiáticos e tem a sua maior prevalência na população
africana, indicando que esta variante surgiu, possivelmente, antes da divergência de africanos de não
africanos76. Os resultados deste trabalho mostram a existência de uma maior frequência do genótipo
ins/ins e do alelo ins68 na população africana (Tabelas 4.7 e 4.8), podendo a prevalência elevada deste
alelo nas populações africanas ser resultado do facto de a inserção neutralizar o efeito de uma outra
variante, a variante T833C ao transpor o processamento do mRNA e “resgatar” o transcrito selvagem
do alelo mutado76. Portanto, especula-se que o fenótipo de homocistinúria devido à deficiência de CβS
associada à variante T833C possa ter sido reduzida ou mesmo suprimida durante a evolução pela
variante ins6877.
Os genes GST, expressos em todos os tecidos, codificam enzimas responsáveis por catalisar a
conjugação da forma reduzida de glutationa a substratos xenobióticos, indutores de stresse oxidante48.
25
As formas alélicas GSTM1*0 e GSTT1*0 correspondem à ausência total de enzima e consequente
acumulação de xenobióticos e aumento de ERO49. Neste trabalho foram observadas diferenças
estatisticamente significativas na distribuição dos alelos nulos M1*0 e T1*0 entre as populações
portuguesa e africana (Tabelas 4.9 e 4.10, respetivamente), verificando-se uma maior incidência dos
alelos nulos na população Africana. Um estudo de Piacentini e seus colaboradores78 mostra que a
frequência dos alelos M1*0 e T1*0 tem uma incidência elevada na população mundial e grande
heterogeneidade inter populacional. O mesmo estudo78 refere frequências para o alelo M1*0 em
Espanha (44,7%) e muito semelhantes à portuguesas obtidas neste trabalho (42,9%)79,80. O estudo mostra
ainda frequências entre 22,9% a 60,8% para as populações africanas, um pouco abaixo das obtidas em
STP (76,3%). Relativamente ao alelo T1*0, o estudo indica frequências entre 10,4% a 42,5% para a
população europeia, um pouco acima dos 7,5% obtidos para Portugal neste trabalho.
Surpreendentemente, a frequência de 93,7% para a população de STP está bem acima do intervalo
referenciado para as populações africanas (19,7% a 44,9%). Estas elevadas frequências de STP são
muito interessantes e merecem uma atenção redobrada em estudos futuros.
O gene NOS3 codifica a enzima eNOS, a principal enzima responsável pela síntese de óxido
nítrico no endotélio vascular, o qual em condições próximas da homeostasia atua como antioxidante50.
Neste trabalho, foram observadas diferenças estatisticamente significativas na distribuição das
frequências genotípicas e alélicas do polimorfismo VNTR, tendo o genótipo 4a4a e o alelo 4a uma maior
prevalência na população africana do que na população portuguesa (Tabelas 4.11 e 4.12,
respetivamente). A presença do alelo 4a está associado à produção de baixos níveis de NO, uma vez que
a enzima eNOS é menos expressa originando o desequilíbrio da homeostasia e consequentemente
aprodução de ERO52,81. A perda de sódio através da transpiração em climas tropicais pode comprometer
a contratilidade cardíaca e pressão arterial. A seleção dos alelos compensatórios como o alelo 4a do gene
NOS3, pode ter conferido uma vantagem de contexto ambiental da evolução humana em África82,83, uma
vez que o NO é um vasodilatador, a sua baixa produção aumenta a pressão arterial.
Também, a G6PD é determinante na produção de NO uma vez que um dos componentes
essenciais para a sua produção é o cofator NADPH, que é catalizado pela G6PD. Assim, fatores que
determinam alterações na atividade desta enzima, como a presença do alelo G na variante A+, afetam a
produção de NADPH e consequentemente a produção de NO, podendo também explicar a seleção desta
variante nas populações africanas, como se verifica nos resultados (Tabela 4.13). Outro fator
determinante na seleção desta variante foi certamente a malária, visto que a presença do alelo G em
heterozigotia e em hemizigotia nas regiões endémicas para a malária, confere proteção84–86. De facto, a
prevalência desta enzimopatia em Portugal87 é baixa, sendo a sua frequências mais elevada em África,
o que aliás mostram os resultados deste trabalho, verificando uma diferença estatisticamente
significativa na distribuição dos genótipos e dos alelos, sendo o genótipo GG e o alelo G mais
prevalentes em STP do que em Portugal (Tabelas 4.13 e 4.14).
Tendo em consideração os vários movimentos populacionais que ocorreram em STP, neste
trabalho, poder-se-ia questionar acerca do efeito das migrações no fundo genético desta população,
levantando assim a dúvida acerca da influência predominante dos fatores ambientais na distribuição dos
alelos e genótipos na população. Contudo, um estudo realizado em 200265 estimou que os europeus,
maioritariamente portugueses contribuíram apenas com 10% da composição genética da atual população
de STP, o que nos leva concluir que não terá sido este um fator preponderante a considerar.
Numa segunda fase do trabalho estudaram-se os mesmos polimorfismos (com exceção da
variante A+ do gene G6PD, já estudada por uma colega), analisando-se a distribuição das frequências
genotípicas e alélicas na população de STP entre o grupo de controlo e o grupo com PA, não se tendo
verificado diferenças estatísticas para os polimorfismos C677T do gene MTHFR, GST (M1 e T1) e
VNTR do gene NOS3. Relativamente ao polimorfismo ins68pb do gene CβS os resultados mostraram
uma diferença estatisticamente significativa na distribuição dos genótipos e dos alelos (Tabelas 4.17 e
26
4.18, respetivamente) existindo uma maior prevalência quer do genótipo ins/ins quer do alelo ins68pb
na população ouvinte do que na população com PA, verificando-se que a presença do alelo acima
referido confere proteção no desenvolvimento da PA (OR=0,41). Embora esteja descrito que este alelo
afete a função da enzima, diminuindo a sua atividade42, a presença do mesmo não parece estar associada
ao desenvolvimento da PA. De facto existem trabalhos que questionam as consequências funcionais
deste polimorfismo. Estudos de Tsai88 e seus colaboradores mostram que a inserção de 68 pb origina
um local de splicing alternativo que elimina toda a região inserida, permitindo assim a formação de um
transcrito de mRNA normal e consequentemente uma enzima CβS totalmente funcional88.
Quando se realizaram estudos de epistasia obteve-se uma associação entre a combinação de
genótipos 4b4b do gene NOS3 e CC do gene MTHFR com a PA como mostra a Tabela 4.23. Ambos
os alelos estão tradicionalmente associados a condições protetoras em relação ao stresse oxidante50,89.
Contudo, existem estudos que revelaram que células endoteliais contendo o alelo 4b apresentam maior
quantidade de siRNA, resultando em níveis reduzidos de mRNA da eNOS em relação às células
contendo o alelo 4a90. Por outro lado, sabe-se que em certas condições de excesso de stresse oxidante,
ocorre um fenómeno chamado de desacoplamento da eNOS no qual há redução da biodisponibilidade
de NO50,53,54. Isto acontece pois ao invés da produção de NO há produção de níveis elevados O -2. Pode
ser que num ambiente propício ao stresse oxidante, conferido pelo contexto genómico enriquecido em
alelos de risco e a elevada frequência de patologias geradoras de stresse oxidante, o desacoplamento da
eNOS possa ter ocorrido e o NO passe a ter um papel oxidante. O facto do genótipo CC ser também
protetor poderá evidenciar um caso de epistasia antagonista, no qual um dos genes pode alterar a
expressão de outro gene. A epistasia é um mecanismo importante quando se tentam encontrar fatores
genéticos que expliquem a variabilidade fenotípica interindividual de determinadas patologias.
Apesar das evidências sugeridas na literatura, este trabalho demonstra que não é a seleção de
alelos que confere stresse oxidante em África, a principal responsável pela elevada frequência de PA.
Outros investigadores21 sugerem que outras doenças como a malária, a rubéola ou a medicação
antimalárica tomada durante a gestação, possam estar associadas à elevada incidência de PA, sugerindo
uma origem congénita.
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32
Anexos
Anexo 1 - Análise do Polimorfismo C677T do Gene MTHFR.
Figura 1.1. Gel de agarose com perfil eletroforético dos fragmentos de restrição obtidos após amplificação de uma região
do gene MTHFR. Poço 1: marcador de peso molecular 50 pb (50 pb DNA Ladder, Invitrogen), poços 2 e 4: Genótipo CT. poços 3,5,6 e 7: Genótipo CC, poço 8: Genótipo TT.
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Anexo 2 – Análise do Polimorfismo de Inserção de 68 pb no exão 8 do Gene CβS
Figura 2.1. Gel de agarose com perfil eletroforétio de uma amplificação da região contendo a inserção de 68 pb no intrão 8
no gene CβS. Poço 1: marcador de peso molecular 50 pb (50 pb DNA NZYDNA Ladder VI.), poços 2, 3, 7, 8, 9, 11 e 13: Genótipo del/del. poços 4, 5, 6 e 10: Genótipo del/ins. poço 12: Genótipo ins/ins.
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Anexo 3 - Análise dos polimorfismos nos genes GST (M1 e T1)
Figura 3.1. Gel de Agarose com Perfil eletroforético de uma reação de PCR Multiplex para os polimorfismos dos genes
das GSTM1 e GSTT1. Poço 1 – Marcador de peso molecular 50 pb (DNA ladder 50pb plus, Thermo Scientific), poços 2, 3 e 5: Genótipo /M1*1/T1*0, poços e 7: Genótipos /M1*0/T1*0, poços 4,9: Genótipo M1*0/T1*1, poços 10,11,12 e 13: Genótipo /M1*1/T1*1, poço 14: CN.
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Anexo 4 - Análise do Polimorfismo VNTR do Gene NOS3
Figura 4.1. Gel de agarose com perfil eletroforético de uma amplificação da região contendo o VNTR do intrão do gene
NOS3. Poço 1: marcador de peso molecular 100 pb (100 pb DNA Ladder Invitrogen), poços 3, 5, 7, 8, 11 Genótipo 4b4a, poços 4, 6, 9,: Genótipo 4b4b, poço 12: Genótipo 4a4a, poço 10: CN