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EDITORIAL

Esta edição traz as principais palestras proferidas no Goetheanum por ocasião do VII Congresso de Pedagogia Waldorf em Dornach, na Suíça. Como não foi fácil compilar este material esta edição chegará com atraso às mãos dos leitores, mas em compensação, no próximo número os colegas receberão, em íntegra, a transcrição das palestras proferidas por Johannes Külh no II Congresso Brasil de Pedagogia Waldorf.

A Coordenação do Periódico

OITAVO CONGRESSO MUNDIAL DE PROFESSORES E EDUCADORES

24 a 29 de março de 2008

Goetheanum, Dornach – Suíça

Introdução

A Antropologia Geral, a Metodologia e Didática e os Colóquios Seminarísticos haviam sido dados. Uma pequena comunidade, com menos de trinta ouvintes, foi testemunha dessa hora de nascimento da arte de educar que, tal como o nascimento de um ser humano na Terra, aconteceu em silêncio, quase escondido. A última palestra dessa série foi dada em 5 de setembro de 1919.

Em 7 de setembro houve um ato festivo para a abertura da escola Waldorf, Emíl Molt e Rudolf Steiner, ambos fizeram alocuções. Da alocução do último eu gostaria de apresentar, como introdução à edição das palestras do Oitavo Congresso Mundial de Professores e Educadores, como um lema, a seguinte citação:

E assim nós tentamos, no curso que antecedeu ao nosso empreendimento Waldorf, e que foi dado aos professores, fundar uma antropologia, uma ciência da educação que pode tornar-se uma arte da educação, ciência da humanidade, que possa ressuscitar o vivo no ser humano a partir do morto. (...) Procuramos uma ciência que não é apenas ciência, que é vida e percepção, e que no momento em que flui para dentro dos Homens como sabedoria, ao mesmo tempo desenvolve força, para viver nela com amor para, com vontade de atuar, fluir para um trabalho mergulhado no calor anímico, trabalho que se expande em especial sobre o que é vivo, sobre o ser humano em desenvolvimento. (Realçado por CW).

Com isso está esquematizado o programa do atual Congresso Mundial de Professores e Educadores.Fizemos a experiência, depois de poder organizar pela terceira vez um tal congresso: o que realmente une na arte

de educar, na pedagogia de Rudolf Steiner assim como ela vive agora no mundo nas escolas Waldorf, escolas Rudolf Steiner e nos incontáveis jardins de infância, o que é compreendido além de todos os limites e todas as nações, é exatamente essa Antropologia, essa ciência da educação, que Steiner fundou em 1919. Nós, durante esses dias, queremos exercitá-la ainda mais. Há quatro anos, nós exercitávamos nessa Antropologia a gênese e o surgimento da atividade da fantasia. A segunda palestra da Antropologia Geral foi usada como base. (O conteúdo destas conferências encontra-se disponível na livraria do Goetheanum em língua alemã.) Dessa vez queremos focar em especial a décima primeira palestra da Antropologia Geral, na qual Steiner fala a frase profética: ‘aquilo que podemos proporcionar de melhor na educação é a educação da vontade e uma parte da educação da índole’. Nos textos que se seguem o leitor atencioso poderá assimilar o que os diferentes palestrantes apresentaram em relação a isso.

Novo nesse congresso é que, dessa vez, também cientistas podem se apresentar no âmbito ampliado da Antropologia, com diferentes contribuições significativas. Essas contribuições os senhores também encontram neste periódico.

Fixamos como meta: tomar a sério a ciência da educação de Rudolf Steiner como fonte viva, e convidamos as ciências convencionais a se posicionarem sem preconceitos. – Por acaso não falamos a mesma linguagem de maneiras diferentes? Nesta direção será dado o primeiro passo modesto. Outros passos seguirão.

Desejamos aos participantes do congresso um pós-preparo frutífero no caminho para casa, geralmente distante. Que aquilo que foi ouvido possa continuar atuando na forma escrita.

Pelo Congresso Internacional do Movimento Waldorf

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‘Círculo de Haia’Pelo colegiado de professores da Sessão Pedagógica no Goetheanum

Christof Wiechert

FORMAR A VONTADE, DESPERTAR O INTELECTO

Christof Wiechert

O século 20 e o início do século 21 trouxeram uma torrente de pedagogias que se dedicam ao princípio da igualdade e, ao um mesmo tempo, da seleção. Esse paradoxo ainda pesa bastante sobre a prática pedagógica: chances iguais para cada um a fim de participar da seleção e realmente ser ‘selecionado’.

Através do estudo de Pisa surgiu a consciência do infeliz encadeamento de seleção e desigualdade de chances em alguns países onde existem sistemas escolares com diferentes formas de incentivo. O princípio da seleção, porém, continua não sendo questionado, pois se apresenta como instrumento prático para adaptar as pessoas às condições econômicas.

Lentamente surgem movimentos que não mais abordam a seleção, a escolha a partir da igualdade, mas que individualizam esse âmbito. A harmonização do sistema educacional europeu tem contribuído nesse sentido. Hoje é possível ‘comprovar competências individuais’ que qualificam o ser humano através do seu próprio desenvolvimento.

Se isso é realizado através de portfólio ou através de um processo de equivalência não vai ser discutido aqui. Importante é o fato de um caminho individual poder levar a um reconhecimento quando forem cumpridas determinadas exigências. É um primeiro, mas importante passo para a individualização do sistema educacional.

Isso sempre foi almejado pelas escolas da pedagogia Waldorf que buscam respeitar o individual na criança, isto é, seu modo de ser, fazer jus as suas predisposições. O homem no seu vir a ser deve ser formado. Durante essa formação são processadas intervenções em sua esfera de liberdade, o que é inevitável. Essa interferência que é realizada pelos pedagogos requer compreensão, responsabilidade assim como discrição.

Qual é a compreensão exigida? A compreensão do homem em seu estado de vir a ser. Por exemplo, que a criança ao ir para escola ainda precisa crescer. Assim como a compreensão de que um crescimento saudável é premissa, que o ‘input’ anímico (portanto, aquilo que é ensinado) não deve atuar sobre o crescimento de forma a interferir ou mesmo impedi-lo.

Quando Rudolf Steiner fez essa exigência ainda não havia a compreensão científica para tal. Confiava-se nas afirmações de Steiner e a prática o confirmava. Hoje existe uma literatura bastante abrangente sobre esse tema. Através das pesquisas neurológicas chegou-se à possibilidade de descrever detalhadamente experiências da alma e suas atuações físicas.

Isso compreende todo o sistema de ‘educação’, pois está completamente baseado na confluência do ‘input’ e o efeito que isso causa.

Esse ‘input’ é constituído por sinais do meio ambiente que são transpostos para o biológico. Na pesquisa temos apenas os resultados físicos. Mas, realmente, nesse caso acontece uma transformação no âmbito da alma.

‘Os efeitos dos sinais do meio ambiente, assimilados pelo cérebro, sobre a regulamentação dos genes não ficam por conta do acaso. Através das células nervosas dos cinco órgãos dos sentidos serão recebidos de pronto pelo sistema de enredeamento das células nervosas na grande crosta periférica do cérebro e do sistema límbico. (O sistema límbico é um sistema neural celular bem unido com a grande crosta periférica cerebral nervosa e é ativo como centro para a inteligência emocional). Quais os genes que são ativados através de estímulos exteriores, por exemplo, através de vivências interpessoais bem como através de determinadas outras situações, (realçado por Christof Wiechert) depende de como o sistema das células nervosas da grande crosta cerebral e o sistema límbico ‘avaliam’ os sinais captados. Situações que forem avaliadas como perigosas para o próprio organismo ativam uma outra ‘orquestra’ de genes do que situações que forem avaliadas como agradáveis, interessantes ou como desafios vencíveis.

Situações de perigo levam a ativar genes nos centros de alarme do cérebro, especialmente no (Hirnstamm) assim como no hipotálamo. No Hirnstamm chega-se a ativar genes no caso de medo e perigo (por exemplo, chega-se a ativar um gene de nome Hydroxilase-tyrosin) cuja proteína tem como conseqüência a prontidão de substâncias de alarme. Essas substâncias de alarme por sua vez chamam modificações no corpo inteiro inclusive a ativação de outros genes. Em situações de perigo extremo chega-se a ativar no hipotálamo um gene de estresse central de nome gene CRH (Cortocotropin-Releasing-Hormon-Gen). A proteína desse gene (proteína CRH), semelhante à noradrenalina – tem uma atuação intensiva sobre inúmeras funções do corpo dentro e fora do cérebro. O reconhecimento dos efeitos de situações negativas do meio ambiente sobre a ativação de genes próprios do corpo é assegurado por um incontável número de estudos científicos no âmbito da pesquisa do stress.’

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Isso é parte do capítulo final do livro de Joachim Bauer ‘A memória do corpo’. Realmente aqui não se trata de educação escolar. Mas toda parte de escolarização não se realiza também através de ‘determinadas vivências interpessoais’? De fato o autor dedicou a esse capítulo um outro livro no qual, a partir do ponto de vista neurológico, é apresentado um ensino salutar, inclusive com um horário de aula ‘salutar’ (Joachim Bauer ‘Um louvor à escola’). Mas a base psicológica anímica é apresentada insistentemente. Estaríamos totalmente errados se concluíssemos a partir disso que a parte anímica possa ser declarada nula biologicamente. Antes o contrário: o anímico assume totalmente seus direitos porque também surge no campo físico.

Em todo caso deve ser lembrado que representa uma abertura significativa quando é apontado para a saúde ou a sua fragilização através do ensino. Realmente, por questão de sinceridade, precisa ser dito, que realmente foi Rudolf Steiner que em linguagem científica, já no início do século 20, apontou para esse fato. Ele, porém, ainda o fez de outra forma que até pode ser equiparada a uma mudança de paradigmas na educação.

De forma bem explícita ele diz que a ancoragem saudável da aprendizagem surge quando a aprendizagem é ancorada na vontade e no sentimento. Quando há uma aprendizagem dessa forma, então, vontade e sentimento acordam o intelecto. Nessa seqüência é possível pensar em uma atuação positiva, e não danosa, sobre o físico na educação.

Concretamente isto significa: que o entusiasmo por um a matéria de ensino, o realmente ‘praticar’ a matéria de ensino, traz curiosidade e desperta a aprendizagem no âmbito da compreensão. Há tempos, era normal que crianças aprendessem os cálculos com as tabuadas (sorobam). Também no material elaborado por Montessori existe essa compreensão. Na arte de educar de Steiner, porém, isso tem um método. Aprendemos os cálculos através de manipulações manuais (os ‘montinhos de sementes de sabugueiro’), as crianças devem escrever, antes de terem aprendido a leitura, a gramática é representada através de um jogo de relações bem elaborado. Uma peça de teatro a ser apresentada não é decorada previamente, porém ao representar, ao executar o texto é interiorizado. E quando ensinamos química ou física nas classes mais altas de ensino fundamental e nas mais baixas do ensino médio as experiências estão em primeiro lugar. A partir delas seguem as mais variadas considerações, e não somente no fim da aula ‘se ainda sobrar tempo’. Uma contemplação de arte, que faça sentido, também consiste em orientar os alunos para eles próprios tentarem o desenho ou a pintura.

Também as orientações de Steiner, para se registrar num documento, a próprio punho, as matérias elaboradas (no caderno de época), têm esse caráter: o ser ativo durante a aprendizagem leva ao aprender. Nesse sentido o caderno de época é o precursor da idéia do portfólio. Todas essas qualidades serão reforçadas realmente através do exercício artístico ou artístico-artesanal. Pois, o exercitar já fortalece a vontade. É clássica, nesse sentido, a exigência de Steiner de que os principiantes – indiferente se meninos ou meninas – devem fazer tricô, pois é bom, desperta o pensar. Uma aula de artesanato, uma jardinagem não devem apenas ser consideradas à luz da educação da vontade, porém também à luz da ativação da inteligência, segundo Steiner, “o atuar com significado”. De fato a ciência oficial o tem confirmado muitas vezes; a atividade manual torna maior a capacidade de compreensão, abarca o todo, o homem pensante-atuante.

Seria um mal-entendido de caráter trágico, se esse princípio de educação fosse considerado e condenado pelos críticos como sendo ‘a pedagogia da sonolência’. A maioria de todas as pesquisas dos neurologistas aponta para essa base da educação como sendo a mais justificada. (Wolfgang M. Auer, ‘Mundo dos Sentidos’)

Agora é justificada a pergunta, de como era antigamente quando a aprendizagem ainda tinha caráter bem reservado, autoritário e (às vezes) com desprezo ao ser humano? Quando escola, sobretudo, era uma instituição de decorar a matéria? As crianças também iam à escola sem ficar doentes nem levar danos anímicos?

Muitos fatores aqui se juntam. Um deles será colocado em evidência aqui. A relação para com a natureza, com o meio ambiente natural em décadas e séculos anteriores era bem diferente do que hoje. Na sociedade pós-moderna, de maneira extraordinária e em alta velocidade, nós nos ‘desnaturamos’, isto é, nos afastamos da natureza como provedora de força de vida. Pode-se supor que até três gerações atrás o ambiente natural, o ar, a qualidade da água, o tempo de vida, a vivência e o sofrimento com as estações do ano, a alimentação ainda simples, mas ‘forte’, eram realidades que mantinham a saúde. Essa vitalidade elementar foi-se perdendo às custas da força da consciência que teve de ser conquistada com muita energia.

Um clássico médico de família, que durante toda sua vida acompanhou gerações de moradores de uma ilha, escreveu em seu diário quando o milagre econômico dos anos 60 do século passado começou a atuar: “desde a vigência do sistema de 8 horas de trabalho por dia, desde o enorme esforço de vida nos escritórios, surgem sintomas de doenças totalmente diferentes que me deixam sem saber o que fazer. Os seres humanos se tornaram diferentes, desde que o cerne da vida, o duro trabalho não existe mais. E essas pessoas esperam que as ajudemos”. (Walter Kropachek, ‘Dias e Noites em Helgoland’.)

Hoje, as forças da consciência, já na tenra infância, são tão fortes que de fato a saúde não consegue manter o devido equilíbrio, quando não forem tomadas medidas de precaução. Consciência é como uma brasa forte e é necessário um forno mais forte ainda que a suporte. Em outras palavras, força de consciência precisa de lastro que a suporte. Esse é um dos desafios da educação moderna; como lidar com a sobrecarga de forças de consciência? Pois

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essas tornam fracas as crianças, elas fazem com que a educação hoje realmente possa atuar de forma a tornar doente. Fato é que muitos indícios apontam nessa direção.

Recordando o antigo tesouro das sagas gregas, onde se diz nas lendas antigas que o deus solar Hélio, que conduz a carruagem solar, atrelada a cavalos fogosos, todos os dias pelo céu, tinha um filho sobre a Terra. Esse se chamava Phaethon e aqui na Terra fazia-se troça dele porque não se acreditava na sua origem divina. Ele foi se queixar com o seu pai pedindo uma prova de ser seu verdadeiro filho. Ele exige do pai, apenas uma vez, poder dirigir a carruagem solar pelo céu. O pai retorce-se, pois sabe que o jovem não está treinado para isso, mas ele não pode negar o desejo ao filho. Phaethon, certa manhã, sobe na carruagem, os cavalos sentem a mão insegura e a catástrofe segue o seu caminho. A metade da Terra é incendiada, pois a carruagem solar abandona a trilha prescrita. Phaethon tomba da carruagem e se estatela sobre a Terra.

Uma imagem bem dramática. Verdade é que ‘sol’ já muito cedo foi relacionado à luz da inteligência, às fontes inteligentes da vida, sim, à força criadora da palavra. Aqui vemos tratar-se de alguém que ainda não está apto, alguém que ainda não pode suportar a força do sol, da inteligência, do despertar criador, que surge com essas forças e elas acabam com ele. Resumindo, as forças de luz precisam ser ‘contidas’.

Na indicação de Rudolf Steiner isto significa que, na educação, parte-se por tanto tempo da vontade enquanto a compreensão ainda se encontra em estado de dependência. Fazendo jus a isso, jaz na educação uma força sanativa autônoma. Crianças educadas assim não apenas se tornam ajuizadas através do ensino, inteligentes e acordadas, porém recebem uma ‘reserva de saúde’ que não precisa ser apenas física.

O novo ramo da psicologia, a pesquisa da resiliência, chegou a fazer a pergunta, quais os fatores que possibilitam que, mesmo a partir de uma situação inicialmente inapropriada, mesmo assim o ser humano possa continuar a se desenvolver? Na pesquisa da resiliência fala-se da capacidade de resistência física da criança frente aos riscos do desenvolvimento biológico, psicológico e psico-social.

Tem-se certeza de que essa capacidade, de não ser perturbado pelos fatores acima mencionados, de não apresentar distúrbios psicossomáticos ou puramente físicos na vida futura, não vem da massa hereditária. Seja como for, existe um certo consenso sobre o surgimento da resiliência. Quando forem preenchidos determinados fatores mínimos, uma criança pode desenvolver essa resiliência. Esses fatores são:

Uma relação emocional positiva estável com no mínimo uma pessoa de contato. Um estilo educacional autoritário que se destaca através da valorização e aceitação e de um comportamento

estruturado. Modelos de papéis positivos, viver segundo exemplos. Contatos positivos com os pares. Experiências positivas nas instituições educacionais.

Essa listagem é digna de nota por dois motivos (Rutte,Werner em ‘Handbook of Early Childhood Intervention’): Primeiramente, apresenta que a educação desempenha um papel na saúde. A educação é responsável em alto grau por essa resiliência, isto é, pela permanência da saúde no ser humano. É necessária uma mudança no pensar científico, quando se trata de educação. Um pensar, que não só respeite a aprendizagem e as competências necessárias para tal, porém um pensar que carregue a responsabilidade diante desses fatos, sobretudo na educação em sua totalidade, da pré-escola até o segundo grau ou até a Matura.

(Que a situação na sociedade pós-moderna é dramática nesse quesito mostra o livro editado na Inglaterra ‘Toxid Childhood’ de Sue Palmer, 2006).

Durante décadas a escola Waldorf foi levemente menosprezada na oficialidade por ter sido tão crítica em relação ao desleixo quanto ao uso de meios eletrônicos pelas crianças. Quem for honesto na discussão científica, baseada nos fatos, precisa hoje dizer que as escolas Waldorf tinham razão.

A mudança de paradigma na educação proposta por Steiner é que se comece a educar as crianças lá onde é possível alcançá-las, em sua vontade e em sua capacidade de entusiasmo, este é um procedimento que atua de forma salutar e isso também irá se manifestar como o procedimento correto na educação.

E só quando o pensar se emancipar da sua dependência de exemplos é possível abrir mão disso. Quando é esse momento? O momento surge quando o aluno tiver tendências e alegrias em processos de pensar que apenas vêm dele e emergem dele o que Steiner chama de capacidade de julgamento.

O segundo motivo que torna interessante a pesquisa da resiliência é a imitação. A imitação (modelos de atuações, exemplos) é importante na educação e exerce a sua parte na formação da resiliência. Há décadas podia-se perguntar por que essa exigência educacional tão enaltecida por Steiner não encontrava nenhuma consideração na ciência educacional. Só depois da descoberta do espelhamento neural começa a espalhar-se a compreensão, mas precisou de anos até que fosse atingido pela ciência educacional. Já nos anos 70 do século passado o descobridor do espelhamento dos neurônios, o canadense Albert Bandura publicou a sua descoberta essencial em sua obra principal, “Aprender pelo Modelo”. Isso significa que no sistema neural humano descobriram-se estruturas que desdobram a aprendizagem em alto grau a partir da imitação: primeiro a percepção exterior do movimento e do exemplo humano

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(por exemplo, aprender a andar!), e finalmente até a imitação do portador do pensamento por excelência, da palavra falada.

Voltando ao ponto de partida

Através desse método de Steiner, de ancorar a aprendizagem na criança lá onde a criança pode reagir por si própria, por estar totalmente presente em sua prontidão para a ação, na sua vontade para a ação, a educação não se torna ‘ofensiva à saúde’, porém, sanadora. É uma ação dupla, pois Steiner acrescenta que a capacidade de entusiasmo, o ser humano torácico, parcialmente também está livre para as influências educacionais. Porém, apenas parcialmente. Como isto pode ser compreendido? Nós todos educamos crianças, nós todos sabemos que elas são facilmente entusiasmadas, muito facilmente influenciáveis. Minha capacidade de entusiasmo por uma determinada matéria seguramente vai atuar sobre os alunos. Portanto, isso significa que as crianças não estão totalmente presentes, não estão totalmente livres. É verdade que a capacidade de entusiasmar-se está presente, porém, ela se individualizará brevemente conforme a capacidade e o talento do aluno. Enquanto isso não acontece, é grande a possibilidade de influenciá-lo.

Isso nos leva à pergunta da responsabilidade ética frente à criança a ser educada. Quem, por sua vez, já observou a educação em uma sociedade sob um regime totalitário há de perceber, com susto, que eles obtêm muito ‘sucesso’: porque se reconheceu a lei da possibilidade de formação através da vontade e da índole. Nós o chamamos de doutrinação. Cada ser humano livre percebe que isso é indigno ao ser humano, observando tais métodos educacionais. Mas significa que, quem educa em liberdade, constantemente precisa provar a si próprio o quão sincero é naquilo que quer dos seus alunos. Quão abnegado eu sou no meu entusiasmo? Estou transmitindo o mundo ou a mim próprio?

E quando for despertada a compreensão, ‘o espírito na cabeça’, quando os alunos começam a ativar e usar livremente a sua inteligência, então surge a próxima exigência ética para o professor; ele se torna parceiro de seus alunos, mas novamente exemplo. Exemplo de um ser humano que individualizou o seu pensar de tal maneira que ele apresenta a matéria de ensino com total domínio dela. Ele pessoalmente é o matemático, ele é o literário, ele é o historiador, o pintor etc. A pessoa a ensinar tornou-se o pensamento personificado de uma disciplina. Com isso os alunos, de forma nova, podem se entusiasmar, agora, porém, com o seu próprio pensar, com suas próprias preferências. Essa é a prática da educação para a liberdade.

Mas nesse caminho podem esperar muitas contrariedades, contrariedades em relação ao governo, contrariedades para escrever as provas, adversidades da situação financeira da própria escola ou do país, tudo isso existe em grande escala e na verdade em toda a parte. Isso nos pode deprimir e desencadear a pergunta: – Nós verdadeiramente conseguiremos fazer jus a essas grandes idéias da arte de educar também nas situações mais difíceis?

Essa pergunta não deve ser respondida facilmente, se estamos conscientes do quão difícil é realmente a situação em muitos países do mundo. Que seja ousado dizer: – É possível responder essa questão se nos compenetramos com toda força que temos com esse pensamento da arte de educar. Pensamentos são realidades, se tornam mais ainda quando o pensamento, quando a idéia se torna ideal. No meio do primeiro capítulo de “Como alcançar o conhecimento dos mundos superiores” Steiner o expressa com estas palavras:

Toda idéia que não se torna um ideal teu, mata em tua alma uma força; toda idéia, porém, que se torna ideal cria em ti forças vitais.

São essas as forças vitais de que nós necessitamos em toda parte e sob todas as condições que o mundo mantém preparado para nós. A arte de educar pode doar as forças vitais para que, diante das crianças, não nos tornemos Phaethon, porém Prometheu, pois ele construiu novos mundos.

ATIVIDADE ARTÍSTICA

• RESSONÂNCIAS INDIVIDUAIS• NOVOS CAMINHOS

Claus-Peter Röh

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Olhando para as crianças que temos hoje no primeiro ano, a partir da perspectiva da trimembração do ser humano, vemos as forças dos membros e da cabeça em posição polar.

A partir do seu homem-membros já bem desenvolvido, muitas crianças exibem uma alegria intensa na movimentação. Isso pode resultar numa força considerável de vontade e energia, contudo, pode desencadear grande inquietação e distração.

Outras crianças, desde a tenra idade, são fortemente tomadas pelas capacidades intelectuais do pensar assim que elas são acordadas e capazes de questionar e refletir sobre os fatos. Por outro lado, correm perigo, devido a seu estado sensorial e pensamental muito acordado, de perder a capacidade de imitar espontaneamente e a capacidade dos movimentos acompanhados interiormente. Desse modo, para essas crianças, por exemplo, na atividade do desenhar muitas vezes não é fácil executar uma linha com impulso até o final.

Na amplitude dessa polaridade, entre cabeça e membros, muitas crianças estão apenas no início do caminho de chegar animicamente a si mesmas. Aquelas crianças que ainda lutam por sua saúde físico-etérica e por um chegar ao centro de sua alma, podem tender à insegurança e à timidez.

Se formos desafiados por essas tendências de desenvolvimento a perceber ainda mais atenciosamente e a refletir sobre cada individualidade da criança, essa preocupação com os fenômenos exteriores apresentados leva à interioridade e à espiritualidade invisível do jovem ser humano. O que busca a individualidade da criança através das unilateralidades ainda existentes? Qual o direcionamento interno que eu como educador carrego para dentro da classe, para atuar de forma sanante e harmonizadora sobre a relação da cabeça, centro-tórax e membros?

Enquanto os membros do ser humano ao nascer, ainda são bem pouco desenvolvidos, mas acordados, descreve Rudolf Steiner o espírito da cabeça polar a isso:

“Este é o principal segredo do homem: seu espírito-cabeça, ao nascer, está muito, muito desenvolvido, porém dorme... Na verdade nós precisamos apenas desenvolver o homem-membros e uma parte do homem torácico. Assim o homem-membros e o homem-torácico assumem então a tarefa de despertar o homem-cabeça... O que de melhor podemos fazer através da educação é exatamente educar a vontade e educar uma parte da índole”. (1) (Antropologia geral como base da pedagogia 11º palestra, sétimo parágrafo).

Enquanto nós despertamos a espiritualidade ainda adormecida na cabeça da criança não com o intelecto, porém a partir de baixo, pela vontade, pelas forças vitais e pela parte anímica do homem mediano, incluímos o ser humano como um todo no processo da aprendizagem. Por meio disso toda aprendizagem recebe uma qualidade mais profunda e mais rica. Isso seja esclarecido por meio de um exemplo: De manhã cedo a professora abre a porta da classe do segundo ano. No chão, diante da lousa, está desenhada a metade de uma grande e bela forma a ser espelhada. Mal as primeiras crianças entram na sala de aula, elas, de pronto, são atraídas pela forma e logo, em pares, começam a realizar a forma espelhada. Uma criança segue a linha traçada, a outra espelha as curvas. Em seguida trocam de papéis. Chama a atenção a transformação das crianças no momento em que abordam a tarefa pela vontade: A partir de um impulso interno se erguem, por um lado, concentrados na linha e em seus passos. Ao mesmo tempo erguem todo o seu corpo e executam com leveza natural movimentos tateantes com as mãos buscando o equilíbrio (como ao balancear). Assim percebem, ao lado da concentração sobre o próprio passo, paralelamente o entorno e o movimento espelhado da outra criança. Ponto e circunferência, homem-cabeça e homem-membros estão entremeados em harmonia nessa tarefa através da força de vontade e da entrega concentrada da criança. As quatro qualidades que, segundo Anton Cechov, (Cechov, Michael Anton – em “A Arte de Representar”) descrevem uma obra de arte, nós as encontramos novamente nesse âmbito pedagógico:

Leveza – Forma – Conjunto – e Beleza

Na aula subseqüente ao andar da forma segue o espelhamento no ar com as mãos e finalmente, a própria execução sobre a grande folha. Através desse trabalho “de baixo”, a partir da vontade surgem não somente formas claramente traçadas, mas belas obras. Também as crianças fortemente impregnadas pela atividade pensamental, dessa forma elaboram uma compreensão mais ampliada e mais profunda. Às vezes, são elas que durante ou depois da execução da tarefa trazem idéias de como uma forma poderia ser ampliada no próximo dia. Através da atividade artística podem transformar-se de “espectador” exterior em “partícipe” e em “co-desenvolvedor”.

O terceiro significado determinante do “caminho da vontade” descrito está na atuação sanadora sobre o jovem ser humano: Saúde, do ponto de vista da salutogênese da pedagogia Waldorf, não é apenas o contrário de doença, porém, é um “estado de equilíbrio pelo qual constantemente temos de ter um cuidado orgânico para manter” ( Steiner, Rudolf, O Significado Pedagógico do Conhecimento do Ser Humano Saudável e Doente, pal. 26.09.1921 GA304)

Exatamente no trabalho do ensino fundamental descrito torna-se especialmente evidente a busca por esse equilíbrio, pois, em cada dia escolar, lidamos com as forças etérico-espirituais de formação dos órgãos, forças estas que se tornam livres a partir da troca dos dentes: se utilizamos precocemente essas forças ao desafiar o intelecto da

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criança, de forma unilateral, “então são consideradas as forças do organismo que endurecem o ser humano interiormente... especialmente as forças que depositam sais, as forças que depositam cálcio, as forças que plasmam os nossos ossos...” (Steiner, Rudolf – Vida Espiritual presente e Educação, 7a palestra Ilkley GA 307). Ao se separar a jovem criança escolar, no pensar espelhado e no refletir da vida do entorno e dos seres do mundo, ela vivencia um empobrecimento anímico. Pelo contrário, vivenciamos a riqueza anímica quando uma classe inteira, com grande alegria e força, pega com naturalidade os lápis de cor para desenhar uma imagem ou uma forma nova. Numa educação salutar, buscamos nem o empobrecimento unilateral, o pensar que cedo demais endurece, nem a unilateralidade da atividade artística, porém um respirar constante entre atividade global artística e o pensar, o compreender:

“Através do manuseio artístico nos tornamos ricos interiormente e sentimos a necessidade de gastar essa riqueza. Então o artístico-pictórico se transfere por si só para o desenvolvimento de conceitos e idéias mais pobres... E se, após ter trabalhado artisticamente com as crianças, se desenvolve o intelectual a partir do artístico, então essa atividade artística tem a medida certa para intervir de tal forma no corpo físico, que não seja demasiadamente forte, mas solidifique o corpo da maneira correta.

– Os senhores até retêm o crescimento das crianças quando elas forem demasiadamente intelectualizadas. Caso contrário os senhores liberam o crescimento da criança, quando todo o intelectualismo for ensinado a partir do artístico. (Idem acima).

Observando as crianças nas diferentes formas de respiração descritas, entre a atividade da vontade e do artístico e o pensar refletido, logo se apresentará que cada criança desenvolve essa respiração de forma bem individual: por exemplo, há algum tempo atrás uma menina do terceiro ano chamou a atenção porque devido a uma inquietação interior dificilmente conseguia entrar no âmbito do social da classe. Enquanto, nas situações no pátio e nas pausas essa inquietação persistia, nas aulas de pintura apresentava uma crescente alegria, em especial na execução de delicadas passagens de cores. Através desse relampejar na sua atividade artística de “ressonância individual” mostrou a seus professores atrás da fachada das dificuldades diárias uma outra capacidade, uma capacidade do futuro do ser humano. Realmente nos próximos anos escolares ela superou a sua grande inquietude interior a ponto de, cada vez melhor, encontrar o fluxo de aprendizagem e do social na classe. Se nós descobrimos, no caminho “da vontade”, da atividade artística, descrito, o relampejar da “ressonância individual”, temos, de um lado, a possibilidade de ampliar e de transformar a nossa imagem individual da criança.

Do outro lado, a vivência de que no processo vivo da aula, geralmente, de pronto, podem surgir “ressonâncias individuais” e transformar o andamento do planejamento das aulas. A coragem de encontrar caminhos novos está lá, onde, a partir do encontro profundo com a individualidade do aluno, surge um novo alimento.

APRENDER É O CAMINHO DO REI PARA A LIBERDADE

Hartwig Schiller

Isso é claro para muitas pessoas que têm encontrado a sua expressão na formulação “educar para a liberdade” e semelhantes. Muitos acreditam que o segredo da liberdade está ligado à força emancipadora do saber. Na palavra do “iluminismo” essa concepção tem a sua expressão e de um certo ponto de vista naturalmente também é correta.

O saber cria novos e ampliados horizontes, leva para fora do âmbito fechado limitado e local, e se coloca em um mundo maior. Com certeza tem a ver com o caráter do saber que por sua vez pode novamente conduzir para a estreiteza de concepção e pontos de vista especializados. É definido e quantificado. E por esta razão, de maneira nenhuma é garantia de emancipação, autodeterminação e capacidade de responsabilidade.

De mais a mais, no decorrer do tempo, evidencia-se que a sabedoria alcançada numa determinada fase da vida sempre é provisória, falha e imperfeita. As conseqüências de tal deficiência são previsões errôneas, enganos e ações erradas. O ser humano que se determina através do seu saber permanece manipulável. A ação libertadora do saber é limitada e duvidosa.

Aprender é o selo da condição humana

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Com o aprender é diferente. Nesse caso não se trata de uma propriedade quantificável, porém, muito mais de um processo de qualificação. O Homem que aprende é um ser que se transforma, que muda. Isso vale em especial para o âmbito da aprendizagem que não é de ante-mão determinado por motivações como a busca por utilitarismo, comodidades e conveniências. A aprendizagem com uma adaptação inteligente às condições de vida é uma capacidade que já surge no reino animal.

Aprendizagem humana vai, além disso. Pode, além de ser utilitária, incluir em seu foco de interesse o belo e o bom. Pode desenvolver a dimensão moral. Nesse caso, a aprendizagem é auto-educação. O ser humano faz algo que leva para além do âmbito da pura necessidade. Nesse caso o que ele faz, somente ele pode fazê-lo. Nenhum outro, nenhuma força sobre a Terra pode forçar o ser humano para a aprendizagem livre, aberta para a dimensão moral. Aprendizagem é atividade primordial, livre. A aprendizagem não depende de uma meta fixada e não de um determinado programa. Isso sempre conduziria para algo fechado e limitado. Aprendizagem, porém, diz respeito diretamente ao próprio processo do vir a ser homem. Aprendizagem, por esta razão, é o acontecimento central do mistério da educação.

Si próprio, arte e educação

O segredo da educação é como esse procedimento pode ser iniciado. Tudo aquilo que for fixado, previamente metodizado, canonizado não é aproveitável. A educação precisa tornar-se arte para poder aproximar-se da vida anímica viva do aluno. A fim de desenvolver essa arte muito é necessário, mas um é central: o reconhecimento de que toda educação é auto-educação.

Essa compreensão tem derrubado muita coisa que é pensada sobre educação e sobre escola. Ela percebe que sempre são aqueles que são educados – e não os educadores – aqueles que realizam em si próprios a transformação através da aprendizagem. Isso vale para qualquer idade e para qualquer âmbito de aprendizagem. É o próprio aluno que, com uma visão interna das relações quantitativas realiza uma operação matemática nos moldes correspondentes, é o próprio aluno que julga uma personalidade histórica conforme o seu acesso e, ao mesmo tempo, é o próprio recém-nascido que se adéqua em sua expressão de vida à situação de seus pais ou educadores.

Os pedagogos “ensinam” apenas, isto é, eles apresentam as coisas com ou sem sentido, ricas em espírito ou sem espírito, materiais apropriados ou não, cenários e condições de aprendizagem. É o próprio aluno que tem de se encontrar nestes cenários. Conforme for, ele encontra algo que lhe convém, que lhe vem ao encontro, que lhe agrada, que desperta o seu interesse. A arte do educador consiste em prever onde e como o interesse do aluno pode ser despertado, onde ele pode retomar o fio da meada. Essa é a educação que desperta. Ela exige a arte da regência. O professor tem que achar peças apropriadas, estilos, cenas, cenários apropriados, caminhos de encenação. Tanto faz em que matéria. Todo o resto fazem os alunos. Eles mesmos se põem a caminho e começam a aprender. Ao aprender, eles próprios se educam.

Eles lutam com a matéria, lutam contra a própria limitação, ocupam-se com cansaço, gosto e desgosto, viajam com a matéria de ensino para o universo de perspectivas do mundo, do espírito e da alma. São exigidas e desenvolvidas habilidades de movimento, de alma e de caráter. Esta é a realidade do ensino. A aprendizagem constitui a dignidade do ser humano, dá-lhe o presente da vivência da liberdade.

Vida e aprendizagem

No decorrer da vida a aprendizagem toma diferentes formas. Aprender no começo da vida é outra coisa do que no seu fim. O começo da vida é marcado por dedicação natural, simpatia e sociabilidade. Nenhuma criança nasce sem sociabilidade e dedicação, nem é concebida sem estas. Na porta do nascimento a sociabilidade do começo da vida é até garantida por um cordão umbilical. Se for tudo bem, em volta do berço encontra-se toda uma reunião de pais, amigos, avós e parentes. No seu nascimento o ser humano é recebido por uma comunidade simpatizante. A atmosfera é determinada por alegria, simpatia, participação e prontidão. Se tudo for bem.

No fim da vida a imagem é totalmente diferente. Na morte cada um está sozinho, mesmo estando em companhia. Mas esse caso é menos freqüente do que a companhia intacta no nascimento. Se alguém viveu em companhia, ela o deixa para trás. O fim da vida torna solitário. Quando alguém atinge uma idade avançada, então aqueles que determinaram sua vida já se foram antes dele. Ele fica sozinho com as suas lembranças. Ninguém do seu grupo de experiências vem e o anima espontaneamente para uma atividade. A paz pertence à velhice, o silêncio e a contemplação da vida vivida, do passado. A velhice tem saudades do calor, da tranqüilidade e da doação. Se no nascimento existe um excesso de forças de vida, de vitalidade e de vontade, a velhice está relacionada à predominância das forças da consciência.

A polaridade entre nascimento e morte é muito bem expressa na relação do rezar e abençoar. Rezar é uma reunião de forças volitivas em direção a uma experiência espiritual mais elevada. Abençoar é o fluir de forças de

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sabedoria em direção a algo carente de ajuda. A culminação de forças volitivas no portal do nascimento necessita de formação, isto é, de cultivo humano. As forças da consciência que nesta época ainda estão resguardadas precisam ser cuidadosamente despertadas para poderem desenvolver-se humanamente cheias de vida. A vontade precisa ser desenvolvida humanamente, o espírito da cabeça precisa ser despertado com a perspectiva de consciência cheia de sabedoria.

 DAS VANTAGENS E DESVANTAGENS DA PESQUISA CEREBRAL PARA A

PEDAGOGIA 

 Christian Rittelmyer

1. Pesquisa cerebral e pedagogia

A pesquisa do cérebro trouxe numerosos conhecimentos que são significativos para a compreensão da educação e da formação. Alguns resultados de pesquisa confirmam, na verdade, apenas aquilo que já se sabe da pedagogia ou se imagina saber; mesmo assim são importantes por prestarem auxílio à argumentação nas discussões de política educacional e também para precisar o saber propriamente dito. Outras investigações abrem perspectivas novas de conhecimento, em parte surpreendentes, sobre as bases orgânicas do desenvolvimento humano.

Pertence aos conhecimentos mais importantes a descoberta da dependência do meio ambiente na estruturação do cérebro humano. Com isso entende-se que a arquitetura cerebral, em especial na infância, mas também na idade adulta pode modificar-se constantemente e na verdade, depende das experiências e atividades espirituais desse indivíduo. (A pesquisa cerebral confirma afirmações de Rudolf Steiner que foram publicadas na literatura pedagógica básica, “A Educação da Criança do ponto de vista da Ciência Espiritual” publicado em 1909. Compare, em relação a isso, bem como também nas seguintes explanações, de Ch. Rittelmeyer: Antropologia Pedagógica do Corpo. Predisposições Biológicas da Educação e Formação.) Seres humanos, portanto, formam, até um determinado ponto, novas estruturas desse órgão, eles incentivam determinadas áreas cerebrais e abandonam outras, sempre em conformidade com seus interesses e atividades. Nesse caso não se trata apenas da formação de novas interligações de sinapses entre as células cerebrais de áreas que forem especialmente incentivadas (por exemplo, através de uma atividade de artesanato). Como pesquisas mais recentes afirmam, determinadas experiências ativam também uma nova formação de células, ao menos em algumas regiões do cérebro (nesse caso trata-se da assim chamada neurogênese, por exemplo, células olfativas como reação a um novo perfume). Nós somos, de certa forma, artistas plásticos do nosso cérebro a vida inteira e assim também participamos da estruturação de uma predisposição orgânica importante para maiores e menores capacidades complexas emocionais e espirituais. Essa plasticidade do cérebro propõe um meio ambiente multifacetado, porém, ordenado para não sobrecarregar a criança, uma educação que forma ao mesmo tempo a cabeça, o coração e a mão. Somente através destas experiências “globais” o ser humano, a partir de sua organização cerebral, é posto na condição de poder reagir a desafios de forma diferenciada, socialmente adequada e criativa. E não por último, as atividades físicas e as emoções, conforme a leitura da pesquisa cerebral, são determinantes para que experiências de aprendizagem também possam manifestar-se organicamente no cérebro. Assim sendo, essa pesquisa contradiz a pesquisa intelectualista, isto é, interpretações cognitivistas que com exigências de “jogging cerebral”, “Pisa-powertraining” ou outras indicações superficiais “neuro-didáticas”. Antes a pesquisa cerebral mostra sem dúvidas,que uma aprendizagem de instrução limitada em processos pensamentais não leva a uma “armazenagem” duradoura do aprendizado. Experiências sensoriais múltiplas, alegrias e decepções, admiração e mal-estar são elementos constitutivos da aprendizagem e da formação cerebral. A multiplicidade de experiências ordenadas, as experiências com atividades artísticas e outras atividades criativas formam a riqueza básica de associações vividas no meio ambiente, riqueza que também produz uma estrutura cerebral rica em associações, que por sua parte parece ser uma condição orgânica para o pensar criativo e culturas de sentimentos complexos. Um meio educacional e de socialização que favorece experiências canalizadas, também leva ao empobrecimento dos caminhos cerebrais, da paisagem neurológica.

A compreensão da plasticidade do cérebro levou a uma série de pesquisas pedagógicas significativas. Assim, por exemplo, a psicologia dos meios de comunicação e pesquisas cerebrais possibilitaram interessantes interpretações de uma cultura, que cunhou a preferência dos meios de comunicação da televisão na vida dos jovens. A predominância desses meios de comunicação visuais, especialmente se acompanhada de um empobrecimento da competência

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literária, leva com grande probabilidade a uma “mudança”, baseada nesta cultura, da estrutura cerebral dos jovens: regiões cerebrais que são determinantes para as capacidades da fala e da literatura, empobrecem, enquanto certas áreas motoras e visuais são mais ricamente estruturadas (um exemplo muito citado para esses efeitos é a descoberta do aumento da representação cerebral do polegar do jovem que freqüentemente emite mensagens de SMS). Que conseqüências uma tal modificação da estruturação tem, por exemplo, para a competência lingüística dos jovens indicada no estudo da PISA, como também para o desenvolvimento da atividade de fantasia, torna-se evidente. Segundo a opinião do pesquisador cerebral Wolf Singer, justamente a fala com as suas hierarquias implícitas e figuras sintáticas, mas também a mímica, gestos e movimentos no espaço e na interação social, experiências manuais na escola e o intercâmbio emocional com outras pessoas concretas são, por exemplo, importantes mestres de obra para a promoção da formação cerebral competente. A predominância dos meios de comunicação de tela na vida de muitas crianças e com isso o conseqüente isolamento social - como demonstrou a pesquisa psicológica – também do ponto de vista orgânico, são inimigos da formação porque limitam as chances de desenvolvimento dos jovens.

Do ponto de vista pedagógico também é significativa a percepção da estrutura cerebral individual de cada criança – mesmo no caso de gêmeos monozigóticos. O motivo também aqui é a dependência da experiência na estruturação individual do cérebro humano. Nenhum cérebro se assemelha exatamente a outro na verdade também pelo fato de não existir ambiente de experiências idêntico para seres humanos. (O “Ambiente de Experiência” obvia-mente sempre precisa ser visto na relação com cada individualidade, de cuja perspectiva então recebe seus contornos especiais.) Níveis de desenvolvimentos de diferentes crianças numa determinada idade também podem ser esclarecidos com tais efeitos de estruturas cerebrais diferenciadas como conseqüência de experiências específicas – o que fala a favor de um estar acordado bem desenvolvido do educador para esses passos de desenvolvimento individual da criança, e contra uma constatação muito rápida do que uma criança precisa saber numa determinada idade. Nisso é possível enxergar um argumento importante contra a generalização e tecnocratização de processos educacionais: por exemplo, os rendimentos dos alunos, por esta razão, não devem ser avaliados de maneira única e serem expostos a qualquer programa básico sem serem abordados e estimulados individualmente. Essa concepção diz respeito, na Alemanha, à crescente alfabetização precoce das crianças. A atual euforia desenfreada por este pretenso estímulo precoce é acompanhada significativamente por pesquisas que atestam um melhor rendimento do ensino básico de crianças alfabetizadas mais tarde (idade aproximada de seis anos) do que as crianças alfabetizadas mais cedo (aproximadamente 5 anos) ou que não puderam levantar vantagens gerais de uma escolarização precoce. Uma supervisão internacional da British Association for Early Chilhood Education (Associação britânica para a educação na infância) chegou ao resultado de que uma alfabetização antes dos 6 anos não traz vantagens para as capacidades lingüísticas e matemáticas das crianças. Estudos mais recentes da psicologia cerebral de Philip Shaw e seus colaboradores mostraram que crianças com um tempo de desenvolvimento desacelerado na pré-escola e nos primeiros anos escolares, mais tarde freqüentemente apresentaram uma camada cefálica mais grossa no neocortex e melhores rendimentos intelectuais do que crianças com desenvolvimento acelerado, que pode ser provocado por uma intensa “aceleração precoce”. Um empobrecimento dessas regiões cerebrais tem conseqüências, segundo os pesquisadores, não só para o rendimento das “três grandes competências básicas” (ler, escrever e calcular), porém, também para as capacidades de rendimento na assimilação e integração das impressões sensoriais. A partir disso os resultados da pesquisa de David Shore e seus colaboradores pode tornar compreensível que, crianças apenas podem aprender justamente a integração de diferentes impressões de percepção mais complexas, na idade de dez anos, quando se lhes oferece para isso espaço suficiente para o desenvolvimento. Crianças, segundo os resultados de pesquisas empíricas sobre o desenvolvimento da percepção, de diversos autores, precisam poder desenvolver um “caminho” de aprendizagem que se oriente nas suas capacidades de rendimento e que não tenha preceitos curriculares preestabelecidos.

Numerosos trabalhos de pesquisas parecem ser de alta relevância pedagógica, mesmo que sejam antes indicações do que resultados já bem seguros. A esta categoria pertencem, por exemplo, descobertas de que uma parte considerável da aprendizagem atuante a longo prazo acontece no sono – que está atada a uma boa arquitetura do sono, como, entre outros, foi pesquisado por Maximiliano Moser do ponto de vista da cronobiologia. No sono profundo, é que as experiências diurnas, “armazenadas temporariamente” na memória de curto prazo, são transferidas do hipocampo para o neocortex – acontece uma espécie de comunicação entre esses dois órgãos cerebrais onde, aquilo que foi captado durante o dia, é encaixado nas experiências armazenadas e dessa maneira é ordenado, ou melhor, é estruturado (até hoje não está claro “quem” determina essa comunicação). Em contato com pesquisas psicológicas dos meios de comunicação, que constataram distúrbios da arquitetura do sono naqueles que assistem muita TV (mais de 3 horas por dia) como também um acúmulo da síndrome de déficit de atenção – hiperativismo (SDAH), torna-se especialmente evidente a dramática situação da descoberta dos psicólogos do cérebro. Contra esses distúrbios de atenção causados por excesso de TV e outros fatores de estresse igualmente co-responsáveis , são então receitados, absurdamente, medicamentos como a ritalina, que segundo pesquisas recentes, a longo prazo, por sua vez causam conseqüências negativas no jovem cérebro. Percebe-se nesses exemplos que a pesquisa cerebral em contato com outros resultados de pesquisas pode tornar claro o perigo a que crianças são expostas pela indústria da cultura moderna.

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Por mais prestimosas que sejam as indicações, que os pedagogos podem extrair da pesquisa do cérebro, tão crítico, na verdade precisa ser considerado o reverso, perigoso para a pedagogia, dessa disciplina de pesquisa. Ele é caracterizado por três problemas: pela falta de reflexão histórica de seus protagonistas e adeptos; pela problemática metodologia e filosofia de numerosos experimentos e a conseqüente estruturação das imagens do ser humano baseado nisso e, finalmente, pelo seu estreitamento do olhar do ponto de vista do centro neural: A cabeça, e em especial o cérebro que nela se encontra, reside como uma espécie de Luiz XIV sobre o resto do corpo, os soldados rasos nesse panóptico antropológico. Algumas indicações podem elucidar esse problema.

 2. Problemas básicos da pesquisa cerebral

a) A auto-confirmação histórica insuficiente

Quem se ocupar da história científica há de descobrir que questionamentos e conceitos centrais de determinadas disciplinas freqüentemente espelham modelos de pensar e de interpretação que são características não só das ciências como da cultura em geral. Aqui se pode falar de “gramática histórica” que dirige o pensar e o sentir do ser humano, sem que isso se torne consciente. Isso dá ensejo para controlar criteriosamente a preferência histórica por determinadas disciplinas, conhecimentos e pontos de vista, quando se quer compreender a direção social mais profunda que se articula nisso.

Aqui não é o lugar para uma abordagem mais profunda. Enquanto isso gostaria de externar uma tese da pesquisa cerebral, porque diz respeito a um problema com conseqüências para a pedagogia. Observando melhor os conceitos favoritos das revistas e periódicos, que devem caracterizar uma ‘educação adequada ao cérebro’, então se percebe uma analogização nítida do homem com a máquina. Aí, fala-se de “computadores de bordo” (em vez de cérebro); fala-se das ligações em rede das células nervosas na tenra idade através de incentivos intelectuais precoces; dos “módulos cranianos”, da interligação das células cranianas na idade do bebê, do “layout neural” do cérebro, de “update da aprendizagem”, de “hardware neural” e de “software da aprendizagem”. Da “capacidade de memória da criança” e da “placa rígida no cérebro” fala-se da mesma forma como se fala de “pista expressa de dados neurais”, e da “ligação de cabos dos módulos cranianos”. Em um número crescente de teorias e relatos jornalísticos, indicações de estética, criatividade, resultados de aprendizagem não planejados, capacidades morais e processos abertos de aprendizagem são substituídos por uma metafórica que iguala as crianças às máquinas: predomina o “information – processing approach of education”. Segundo os seguidores dessa técnica temos “máquinas de aprendizagem” sob a calota craniana, eles relatam que devido aos meios visuais as “ligações neurais no crânio de toda essa geração PC devem ser realinhados”, e assim por diante.

Isso não é apenas linguagem jornalística alemã, um número considerável de pesquisadores de cérebro iniciou esse linguajar tecnicista. Totalmente cegos para aquilo que se apresenta como fenômeno no cérebro, levaram para a discussão o conceito de enredeamento (NT – ligações para a rede elétrica e ligações da rede elétrica) de células nervosas – “patetices mecanicistas” como Friedrich Nietzsche chamava estas formas de pensar e de falar. Assim em crianças com distúrbios lingüísticos são diagnosticados “distúrbios de micro enredeamento”, ficamos conhecendo “bebês como circuitos de regulação”. Os “neurônios funcionam em compasso regular” em vez de fazer o intercâmbio de sinais ou impulsos em um ritmo comum, o “enredeamento de sinapses” ocupa o lugar do conceito de ligações de células nervosas, os “módulos” ou “cluster” substituem unidades orgânicas.

Essa mecanização da imagem do mundo, de maneira alguma é típica somente para uma grande parte dos pesquisadores do cérebro, porém, tornou-se hábito cultural em geral. Dessa forma, por exemplo, Suzanne Wickum-Glinski mostra que, a exemplo dos símbolos do corpo na literatura contemporânea para crianças e jovens, as “metáforas de máquinas”, desde 1980, foram usadas nesse gênero literário (especialmente em livros técnicos). Aqui os nervos são denominados de rede de comunicação ou cabos telefônicos, o olho é uma máquina fotográfica ou câmara viva, o sentido do tato como máquina de apalpar, o rim como filtro ou instalação sanitária, o baço como engolidor de lixo, a cartilagem como amortecedor, as juntas como joystick (controlador de jogo), o coração como bomba de alto rendimento ou motor, o fígado se torna o laboratório central, e assim por diante.

Uma direção semelhante de mecanização das imagens do homem também acontece em filmes (como Batman ou Guerra nas Estrelas), nos brinquedos infantis ou em ‘Comics’. Assim a série X-Men, mostra uma mistura singular de homem e máquina. A indústria de brinquedos oferece um rico repertório de homens tecnificados ou ‘homens-máquina’ e não por último também os vídeos e jogos Ciberspace-Action favorecem essas figuras freqüentemente militarísticas. Ao mesmo tempo, assim me parece, está em andamento uma rápida destruição da imagem humanística do homem – redução das relações do masculino e feminino para ‘relação-benefício’ sexual em um número não desprezível de programas de TV noturnos e o chamado pós-moderno do “sujeito que está morrendo”, o questionamento da individualidade humana, em resumo: a interpretação construtivista do mundo pertence a esse contexto. Tanto a controvérsia da teoria da neurologia sobre a liberdade da vontade (veja parágrafo seguinte) como também a metáfora mecanicista da pesquisa cerebral surgem num tal contexto como sintomas de um contexto cultural

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muito mais profundo, a que numerosos pesquisadores do cérebro e seus serviços pedagógicos submissos prestam aplausos – em vez de esclarecê-los de forma auto-reflexiva e desenvolver outros paradigmas na pesquisa do cérebro.

 b) A problemática metodológica e filosófica da pesquisa neurológica e a partir daí o resultado das imagens do

homem

De forma provocadora, e por isso como incentivo para a discussão, atuou a afirmação de alguns pesquisadores de cérebro (como Wolf Singer e Gerhard Roth) que o ser humano não possui vontade livre. Colocando uma tarefa de decisão para pessoas de pesquisa, e observando a sua atividade cerebral antes da experiência e durante a mesma, surgem freqüentemente, um pouco antes da ativação do (suposto) momento decisivo, das camadas mais profundas no cérebro impulsos de ativação, que supostamente falam de uma “decisão prévia” não consciente do cérebro. Isto é, de maneira bem simplificada, o tipo de argumentação da afirmação acima mencionada.

Já do ponto de vista metodológico de pesquisa esses “reconhecimentos”, porém, levantam uma série de problemas. Como as pessoas da experiência são observadas num ambiente de aparelhos, como no caso o ímã de ressonância da tomografia ou sob a touca limitante do EEG, é de se perguntar se decisões “livres” sob tais condições realmente podem ser esperadas – ou se com os resultados dessas medições produzem-se artefatos metódicos. Examinando ainda o que os críticos da idéia da liberdade humana entendem por “vontade”, via de regra se descobre uma surpreendente ingenuidade na definição desse conceito até hoje não esclarecido na psicologia (por exemplo, na simples equiparação de “vontade” e “decisão consciente” ou ser de opinião, que atos livres de vontade podem ser localizados no neocórtex). Alguns pesquisadores, cujos resultados foram interpretados dessa forma ingênua, entrementes, advertiram expressamente contra uma tomada de decisão rápida demais.

Muito mais ampla, entrementes, foi apresentada a crítica filosófica do postulado da falta de liberdade da vontade. Que nesse caso conceitos tais como, responsabilidade ou culpa, perderiam seu significado, se processos de decisão sempre fossem inconscientes ou fossem previamente executados pelo cérebro e não fossem iniciados através de uma parcela mínima e temporária de decisão livre do indivíduo. São conseqüências preocupantes e de grande alcance para as instituições como o nosso sistema jurídico, para a filosofia ou a pedagogia. Dessa forma, por exemplo, as metas da pedagogia moderna segundo as quais as crianças devem se desenvolver em seres humanos com capacidade de decisão, autônomos e ajuizados, seriam desmascaradas como imagem enganadora. Realmente para certos pedagogos no lugar da “pedagogia apropriada para crianças” praticamente surge a “pedagogia apropriada para o cérebro” – nesse caso o cérebro se torna o endereçado central da procura por educação.

Independente da acusação, de que tais hipóteses deterministas de certos pesquisadores de cérebro articulam tendências de naturalização, as quais também são observadas como fenômenos do espírito do tempo muito além da pesquisa de cérebro (compare as reflexões acima mencionadas), também essa posição é acusada de grande déficit de capacidade de refletir. Assim comenta, por exemplo, o filósofo Peter Bieri as conclusões neurológicas das interpretações deterministas com a seguinte observação: “O que vem por aí como uma refutação, dura com uma pedra, da liberdade da vontade empírica é um pedaço de metafísica aventureira”. Se bem enxergo, a presente discussão se desenvolve, principalmente, não em direção à confrontação dura, porém, na posição moderada. Uma vontade livre ou um indivíduo que atua livremente, assim dizem esses dessa posição moderada, a filosofia já eliminou de qualquer jeito, dessa forma, os pesquisadores do cérebro encontrariam todas as portas abertas. Outros críticos se erguem, porém, contra postulados deterministas e constatam “jogos de palavras” diferenciados (que já Immanuel Kant formulou basicamente com vistas para o problema da liberdade): para a ciência natural seriam necessários modelos de esclarecimento causais e deterministas (não considerando determinados âmbitos parciais como a física quântica), mas que não devem ser simplesmente transmitidos para a questão científica espiritual em relação à liberdade humana sem que se incorra com isso em erros de categorias. Como mencionado, as lacunas metodológicas de muitos estudos já não permitem conclusões sobre o tema da vontade livre - são no âmbito da “gramática histórica” antes determinadas cosmovisões que nem sequer são apresentadas, porém, se tornam papagaiadas pelo homem. A filósofa Petra Gehring apresentou acertadamente esse inconveniente com um olhar sobre as bonitas imagens coloridas dos neurologistas para o metabolismo do cérebro com o título de um artigo crítico: “pisca-se, pensa-se. Os processos da neurociência que dão visões e visões mundiais.”

A discussão seguramente não acaba com tais conclusões. Indubitavelmente, contudo, ela incentivou um outro nível de pesquisa e de argumentação do que aquele favorecido por determinados pesquisadores de cérebros até agora. Mais premente, enquanto isso, do que uma análise dessa discussão parece-me a discussão de um outro problema, justamente em vista da importância pedagógica da pesquisa do cérebro. A suposta observação da atividade do espírito no cérebro, que ainda na verdade é um processo metabólico – isto é processo de circulação sanguínea, que tem a implicação peculiar de esquecer quase completamente o corpo abaixo da cabeça. Mas a nossa atividade espiritual se realiza realmente apenas na cabeça? Muitos pesquisadores de cérebro partem visivelmente disso. “A aprendizagem acontece na cabeça” assim fala decididamente Manfred Spitzer em seu livro. “Todo saber reside na arquitetura funcional do cérebro. Todas as funções do pensar baseiam-se em processos neurais”, enfatiza Wolf Singer em 2006 numa palestra na Universidade de Göttingen. Por outro lado, o psicólogo Erwin Strauss na segunda edição dos seu

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estudo “Do sentido dos sentimentos” (1956) colocou em um título de um capítulo a afirmação “O homem pensa, não o cérebro”. Quem aqui persegue a pista certa?

 c) quem pensa e julga – o ser humano ou o cérebro?

– O perigo do estreitamento do ponto de vista neurocêntrico

Para responder a essa questão, apresento primeiramente alguns conhecimentos obtidos em relação ao projeto amplo de pesquisa da atuação da arquitetura das escolas sobre os jovens.  (N.T. – Já publicados em Periódicos da FEWB). Como acontece a percepção de uma fachada da construção de uma escola, ou de uma determinada cor, (isso é especialmente importante para nosso tema) e como se chega a determinados julgamentos daquilo que foi percebido? É um processo que só se realiza no cérebro? Como mostram as nossas pesquisas, não é o caso. Toda a percepção de espaço construído e estruturado causa efeitos sobre diferentes órgãos de sentidos, portanto sobre a ação conjunta, por exemplo, dos sentidos da audição, da visão e do equilíbrio. Nesse momento se une a percepção através dos assim chamados sentidos dirigidos para fora (p. ex. sentido da visão ou audição) com a percepção simultânea do próprio corpo através dos sentidos assim chamados sentidos dirigidos para dentro (p. ex. sentido do movimento próprio ou sentido da temperatura). A percepção da arquitetura, portanto, é interpretada a partir da corporalidade do ser humano como um todo, em especial exige uma análise do entrosamento das diferentes qualidades sensoriais (assim chamadas sinestésicas), pelas quais compreendemos estruturas arquitetônicas (geralmente inconscientemente), pois a impressão de uma construção é essencialmente cunhada pelo conjunto dos sentidos ativados respectivamente. Nós pudemos, em nossa pesquisa psicológica da arquitetura, perceber, por exemplo, que alguns estudantes num ambiente com cores “quentes” (como o laranja amarelado) reagiam com uma leve elevação da temperatura da pele, com cores frias (azul esbranquiçado) reagiam com um leve abaixamento da temperatura. Essas áreas mais quentes ou mais frias correspon-dem também aos ambientes provocados por diferentes cores e arranjos espaciais. Seguramente esse registro das cores no cérebro leva a um impulso “periférico” (região torácica) onde a circulação sanguínea é acelerada ou diminuída. A mudança de temperatura causada é transmitida ao cérebro através de receptores termais unindo-se com a impressão do objeto em si. Impressão “externa” (visual) e “interna” (térmica) se unem, portanto, na qualidade sinestésica da construção. Somente essa interação de sentidos dirigidos para dentro e para fora leva a uma qualificação da arquitetura vista em simpática ou antipática (“é fria demais”; “quente demais – me oprime” etc.).

Como nesse exemplo o sentido de temperatura e o sentido da visão atuam conjuntamente no julgamento, assim atuam conjuntamente em toda a percepção de construções, entre outros, também os sentidos da visão, do movimento próprio e do equilíbrio, por exemplo, provocados por movimentos especiais do olhar do observador de uma fachada que, por sua vez são exigidos pela forma da fachada em questão. Nós em verdade, apalpamos objetos visuais, sem o perceber, com movimentos dos olhos sempre aos solavancos (as chamadas sacadas de olhar). É possível visualizar, com o auxílio de aparelhos de medição, o movimento dos olhos provocado por certas formas de construção. Os sensores do nosso sentido do movimento próprio nos músculos e tendões dos globos oculares “enviam” cada um dos modelos de movimento ao cérebro – a vivência inconsciente do movimento no próprio corpo se une com a impressão visual da construção.  Assim surge no corpo inteiro do observador, por exemplo, a impressão da forma da construção “vivificante” ou “tediosa”. Fachadas com curvas ascendentes e descendentes, com planos inclinados etc. atuam freqüentemente de forma vivificante porque os movimentos do olhar seguem essas diferentes formas do ambiente e assim percorrem as mais variadas direções. Fachadas em forma de caixa parecem, ao contrário, em geral tediosas, estáticas, sem vida, pois predominam movimentos horizontais e verticais dos olhos (NT – ver do mesmo autor: Estruturar Escolas Positivamente para o Olhar – ver periódico).

Reconhece-se que julgamentos como por exemplo, “essa construção parece instável” ou “esse ambiente atua sobre mim de forma fria” não vem somente do cérebro, porém, de processos relacionados ao corpo inteiro (Como Atuam Construções Escolares Sobre Crianças e Jovens? – Arte de educar 96) Quão importante são processos da periferia do corpo para a formação de julgamento no “centro”, mostra-se em numerosas pesquisas mais recentes, mesmo em atividades imaginativas. Assim, por exemplo, o pesquisador italiano Vezio Ruggieri pôde mostrar que mesmo a representação de objetos distantes ou próximos estão relacionados a leves movimentos de acomodação dos olhos, como se realizam no enxergar real desses objetos (“acomodação próxima e distante”). Ruggieri, tal como psicólogos suecos, pôde provar que ao olhar para rostos com caretas, mas também para rostos com um sorriso ou expressões preocupadas, por parte dos espectadores acontecem atividades delicadíssimas, não perceptíveis exteriormente, exatamente em tais músculos da face que necessitamos ativar a fim de produzirmos nós mesmos as caretas observadas. Imitações equivalentes e fenômenos de ressonância também outros pesquisadores descobriram e, em parte reconduziram aos assim chamados neurônios de espelhamento. (NT – porque eu sinto o que tu sentes). Reagimos, portanto, de forma fisionômica, mesmo que invisível para outros, quando olhamos para as formas de expressão mímicas dos outros. Pesquisas desse gênero mostram que processos de percepção e de julgamento sempre vêm acompanhados de processos fisiológicos do corpo inteiro que são espelhados pelo “sistema sensório interno” para dentro do cérebro e lá são unidos com a impressão visual ou acústica como percepção de fenômenos vivenciados.

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Apenas essa atividade corporal conjunta perfaz a vivência da percepção, que, portanto, de maneira alguma é um simples processo cerebral.

Que significado antropológico pode ter essa “ressonância corporal”? Em uma palestra da “Antropologia Geral” Rudolf Steiner em 19/8/1919 apontou para a percepção julgadora que emana de atividades de diversos órgãos sensoriais: “Quando o ser humano percebe um círculo colorido, ele diz simplesmente: Eu vejo a cor e também vejo a curvatura do círculo, a forma do círculo. Na verdade são misturadas duas coisas bem distintas. Pela atividade propriamente dita do olho, pela atividade separada do olho, os senhores enxergam de pronto, primeiramente a cor. A forma circular os senhores só percebem quando no subconsciente se servem do sentido do movimento e inconscientemente no corpo etérico, no corpo astral realizam uma forma circular e, então, elevam isso até o nível do conhecimento. E quandoo círculo, que os senhores assimilaram pelo sentido do movimento, se eleva ao nível do conhecimento, só então o círculo reconhecido se une com a cor percebida. Os senhores, portanto, extraem a forma de todo o seu organismo, no momento que apelam ao sentido do movimento expandido por todo seu corpo... É um ato complicado, esse ato de ver, a percepção da forma colorida... Os senhores olhariam indiferentes o círculo vermelho se não percebessem por meio de um caminho bem diferente o vermelho e por um caminho bem diferente a forma circular. Mas os senhores não olham indiferentes, porque percebem de dois lados – a cor pelos olhos, a forma com o auxílio do sentido do movimento – e, durante a vida, são interiormente conclamados a juntar essas duas coisas. Nesse caso julgamos. Agora compreendam o julgamento como um processo vivo em seu próprio corpo que acontece pelo fato de os sentidos analisarem os membros do mundo e os apresentarem para os senhores...”

Essa participação do corpo inteiro, (isto é, do completo sistema sensorial) em nossas percepções, eu, em outro lugar, expliquei através de um modelo de ressonância que aqui será explicado pela atuação da cor acima mencionado. Segundo esse modelo, as cores (e num sentido mais amplo qualquer objeto da percepção exterior) são registradas pelo centro nervoso central: a impressão visual atinge o cérebro através do olho e do nervo da visão. Se apenas ele fosse registrado no sistema central, esse seria provavelmente um acontecimento qualquer registrado indiferentemente pelo olhar – um “olhar indiferente” sobre os fenômenos. A percepção engajada que avalia, que acentua (por exemplo, segundo a qualidade de vivência de cores frias ou quentes), segundo esse modelo somente se realiza porque um impulso nervoso central tem conseqüências periféricas, onde, por exemplo, a circulação sanguínea é ativada e com isso se eleva a temperatura da pele. Por meio do órgão do sentido da temperatura (calórico) esse processo periférico é “espelhado de volta” a áreas correspondentes do cérebro. O corpo periférico funciona, portanto, como uma espécie de corpo de ressonância semelhante ao corpo de ressonância do violino que transforma primeiramente as vibrações das cordas em sons. De forma semelhante, percepções são configuradas através da ativação sinestésica do sistema sensorial completo que engajado em tal amplitude cósmica nos possibilita um julgamento do nosso mundo, diferenciado, acentuado, rejeitando ou aceitando, caloroso ou frio. Uma formação de sentidos neuro-anatômico que se manifesta em todos os sentidos é, por esta razão, ao mesmo tempo formadora dos nossos órgãos de julgamento. Com isso também o estreitamento do ponto de vista torna-se evidente para numerosos pesquisadores do cérebro: o “aceleramento” dos assim chamados neurônios de espelhamento ao olhar para uma pessoa que chora é possivelmente menos um espelhamento da observação de tais fenômenos mímicos do que a própria percepção física mimética e sinestésica por eles ativados. Nós próprios reconstruímos a fisionomia oposta,mesmo imperceptivelmente, repetimos o fisionômico e só através disso chegamos à situação de olhar para tal rosto, não “indiferente”, porém, participativo e julgando. Mesmo esses exemplos podem evidenciar que não é possível deixar de formar o homem como um todo e não limitar o olhar pedagógico à pesquisas de processos cerebrais ou capacidades cognitivas.