estrutura econÔmico-produtiva e a dinÂmica urbano ... · são carlos, são domingos, são joão...
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ESTRUTURA ECONÔMICO-PRODUTIVA E A DINÂMICA URBANO-
REGIONAL DE CHAPECÓ – SC, BRASIL
EDUARDO VON DENTZ1
Resumo: Com a possibilidade de retomada do crescimento econômico, após a crise mundial que
antecedeu a década de 1970, observou-se a reestruturação econômico-produtiva de diferentes setores
da economia ocorrendo em diferentes partes do mundo. Neste sentido, constata-se o crescimento em
diferentes porções do território brasileiro, de complexos econômicos-produtivos ligados, sobretudo, a
agropecuária e a indústria. Neste contexto, o município de Chapecó e o seu entorno, no Oeste
catarinense, é um claro exemplo de onde emergiram diferentes cadeias produtivas e complexos
agroindustriais, ou seja, diferentes segmentos de agronegócios. Trata-se de uma cidade situada numa
região na qual a formação econômica e social (MARX e ENGELS, 2011), ou mesmo a formação
socioespacial denominada por Santos (1977), é decorrente da Pequena Produção Mercantil (PPM),
datada, principalmente, da segunda metade do século XX, que se reestruturou e se reinventou, com
diversos financiadores especialmente o Estado, resultando nas diferentes cadeias produtivas do
agronegócio e nos complexos agroindustriais (CAIs) (ESPÍNDOLA, 1999) que estão sediados em
Chapecó, mas com filiais em outros importantes centros urbanos da região Oeste catarinense. Trata-
se, portanto, de mudanças que tornaram Chapecó uma cidade portadora de uma estrutura econômico-
produtiva capaz de concentrar, segundo a estimativa populacional do IBGE (2017), mais de 213 mil
habitantes, sendo a maior cidade da mesorregião Oeste catarinense, que segundo o IBGE (2017)
cresce, em termos populacionais, em média 2,2% ao ano. Além disso, segundo dados da Secretaria
de Estado e planejamento de Santa Catarina, no ano de 2015, 1,9% do PIB chapecoense estava ligado
à agropecuária, 24,8% à indústria, 15% ao comércio, 22,6% à administração pública e impostos e
37,5% ao segmento de prestação de serviços. Esses dados, por sua vez, demonstram que embora a
constituição dos complexos agroindustriais, baseados nos diversos agronegócios em potencial na
região de Chapecó tenham sido os principais propulsores da economia chapecoense por longas
décadas, atualmente a participação da prestação de serviços e administração pública e impostos
apresentam-se como setores dinâmicos que centralizam mais de metade do PIB do município.
Portanto, o objetivo principal do presente artigo é desvendar a estrutura econômico-produtiva de
Chapecó e sua capacidade de impacto na dinâmica urbano-regional, considerando que essa cidade
serve funcionalmente como centralidade urbana para centenas de municípios da região.
Metodologicamente, utiliza-se quatro passos para a elaboração do artigo, a saber: 1) levantamento
bibliográfico e de dados, 2) trabalhos de campo e visitas técnicas, 3) organização e tabulação dos
dados e informações coletadas e 4) análise dos dados.
Palavras chave: Urbano-regional; Agronegócios; Estrutura produtiva; Chapecó.
Abstract: With the possibility of recapture of economic growth, after the world crisis that preceded the
1970s, saw the economic-productive restructuring of different sectors of the economy occurring in
different parts of the world. This sense, vitrificated the growth in different parts of the Brazilian territory,
of economic-productive complexes linked, principally, to agriculture and industry. In this context, the
municipality of Chapecó and its around, in the West of Santa Catarina, is a clear example of where
different productive chains and agroindustry complexes emerged, that is, different segments of
agribusiness. It is a city located in a region where the economic and social formation (MARX and
ENGELS, 2011), or even the socio-spatial formation denominated by Snatos (1977), is derived of the
Small Commercial Production (PPM) of the second part of the twentieth century, which was restructured
1 Acadêmico do curso de pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Bolsista de doutorado CNPq. E-mail de contato: [email protected].
and reinvented, with several financiers, especially the State, resulting in the different agribusiness
production chains and the agroindustry complexes (ESPÍNDOLA, 1999) which are located in Chapecó,
but with branches in other important urban centers of the West region Santa Catarina. It is therefore a
question of changes that made Chapecó a city with an economic and productive structure capable of
concentrating, according to the IBGE population estimate (2017), more than 213 thousand peoples,
being the largest city in the West of Santa Catarina, that according IBGE (2017) grows, in terms
populationally, in media 2,2% per year. In addition, according to data from the Secretariat of State and
Planning of Santa Catarina, in 2015, 1,9% of Chapeco’s PIB was linked to agriculture, 24,8% to industry,
15% to commerce, 22,6% to public administration and taxes, and 37,5% to the service rendering
segment. These dates, on the other hand, demonstrate that although the agroindustry complexes, based
on the various potential agribusiness in the Chapecó region, have been the main propellant principally
of the Chapecó economy for decades, nowadays the participation of public services and administration
and taxes are presented as dynamic sectors that centralize more than half of the municipality’s PIB.
Therefore, the main objective of this article is to uncover the economic-productive structure of Chapecó
and its capacity of impact in the urban-regional dynamics, considering that this city serves functionally
as urban centrality for hundreds of municipalities of the region. Methodologically, four steps are used
for the elaboration of the article, namely: 1) bibliographical and data collection, 2) fieldwork and technical
visits, 3) organization and tabulation of data and information collected, and 4) data analysis.
Key words: Urban-regional; Agribusiness; Productive structure; Chapecó.
1. Introdução
A caracterização da mesorregião Oeste de Santa Catarina e de Chapecó (Mapa
1), seu principal centro urbano, requer um olhar para a história da ocupação quando
se pretende compreender a estrutura produtiva desse espaço. Chapecó está inserida
num contexto que reflete, por diferentes aspectos, sua importância em relação ao
Oeste de Santa Catarina. Ainda assim, é válido mencionar que há uma pujança
produtiva, em torno dos agronegócios (grãos e carnes) e uma distribuição de
pequenas cidades (de até 70 mil habitantes) no Oeste catarinense que contribuem
para que Chapecó se destaque do ponto de vista econômico, populacional e de oferta
de serviços em escala regional.
Neste sentido, em termos gerais, atualmente a mesorregião Oeste de Santa
Catarina é constituída por 118 municípios2 e possui uma população que ultrapassa os
2 Abelardo Luz, Água Doce, Águas de Chapecó, Águas Frias, Alto Bela Vista, Anchieta, Arabutã, Arroio Trinta, Arvoredo, Bandeirante, Barra Bonita, Belmonte, Bom Jesus, Bom Jesus do Oeste, Caçador, Caibi, Calmon, Campo Erê, Capinzal, Catanduvas, Caxambu do Sul, Chapecó, Concórdia, Cordilheira Alta, Coronel Freitas, Coronel Martins, Cunha Porã, Cunhataí, Descanso, Dionísio Cerqueira, Entre Rios, Erval Velho, Faxinal dos Guedes, Flor do Sertão, Formosa do Sul, Fraiburgo, Galvão, Guaraciaba, Guarujá do Sul, Guatambu, Herval d'Oeste, Ibiam, Ibicaré, Iomerê, Ipira, Iporã do Oeste, Ipuaçu, Ipumirim, Iraceminha, Irani, Irati, Itá, Itapiranga, Jaborá, Jardinópolis, Joaçaba, Jupiá, Lacerdópolis, Lajeado Grande, Lebon Régis, Lindóia do Sul, Luzerna, Macieira, Maravilha, Marema, Matos Costa, Modelo, Mondaí, Nova Erechim, Nova Itaberaba, Novo Horizonte, Ouro, Ouro Verde, Paial, Palma Sola, Palmitos, Paraíso, Passos Maia, Peritiba, Pinhalzinho, Pinheiro Preto, Piratuba, Planalto Alegre, Ponte
1,2 milhões de habitantes (IBGE, 2010), o que representa cerca de 20% da população
total do estado de Santa Catarina3. Desse total, considerando uma média estabelecida
para toda a mesorregião, pode-se afirmar que em torno de 75% da população vive
nas cidades. Em algumas cidades como Chapecó, Xanxerê, Pinhalzinho, dentre
outras, essa porcentagem se aproxima dos 90%. Já do ponto de vista econômico, o
Oeste catarinense foi responsável, em 2010, por 19,2% do Produto Interno Bruto (PIB)
de Santa Catarina. A renda per capita da mesorregião é de R$ 20,5 mil, o que significa,
no escopo das seis mesorregiões do estado de Santa Catarina, a terceira melhor
renda per capita do estado, ficando atrás somente do Norte catarinense e do Vale do
Itajaí (IBGE, 2010).
Neste contexto, cabe enfatizar que a cidade de Chapecó (Mapa 1) desponta
como o principal centro dinâmico econômico-urbano da região. Pode-se dizer que nos
últimos vinte anos a cidade de Chapecó passou por transformações importantes, de
cunho econômico-estrutural, fazendo com que se configure, atualmente, não apenas
como o principal centro urbano da mesorregião Oeste catarinense, mas também como
um importante centro receptor de investimentos nos complexos transformadores dos
agronegócios (carnes e grãos) e no setor imobiliário-empresarial. Dessa forma,
segundo o (IBGE, 2017), a soma em valores monetários de todos os bens e serviços
finais produzidos em Chapecó alcançou um total de R$ 7,7 bilhões, no ano de 2015.
Nesta ótica, no período 2011-2015 o PIB de Chapecó (9,6%) apresentou um
ritmo de crescimento superior à média estadual (9,4%) e pouco inferior à média
nacional (10,4%) – considerando crescimento do PIB em valores correntes. Ao mesmo
tempo, esse crescimento significou a elevação de sua participação de 3,06% em 2011,
Serrada, Presidente Castelo Branco, Princesa, Quilombo, Rio das Antas, Riqueza, Romelândia, Saltinho, Salto Veloso, Santa Helena, Santa Terezinha do Progresso, Santiago do Sul, São Bernardino, São Carlos, São Domingos, São João do Oeste, São José do Cedro, São Lourenço do Oeste, São Miguel da Boa Vista, São Miguel do Oeste, Saudades, Seara, Serra Alta, Sul Brasil, Tangará, Tigrinhos, Treze Tílias, Tunápolis, União do Oeste, Vargeão, Vargem Bonita, Videira, Xanxerê, Xavantina, Xaxim. 3 Na mesorregião Oeste catarinense, apenas o município de Chapecó ultrapassa os 100 mil habitantes, chegando a pouco mais de 216 mil. Entre 70 mil e 100 mil habitantes, aparecem Caçador e Concórdia. Entre 40 mil e 70 mil habitantes aparecem São Miguel do Oeste, Videira e Xanxerê. Entre 20 mil e 40 mil habitantes aparecem Fraiburgo, Herval d’Oeste, Joaçaba, Maravilha, São Lourenço do Oeste e Xaxim. Os demais municípios possuem população ainda menor, sendo que a grande maioria fica abaixo dos 10 mil habitantes.
para 3,08% do PIB catarinense em 2015 (IBGE, 2017). Ao fracionar o valor total do
PIB de Chapecó (Mapa 1) nas principais áreas da economia do município,
considerando os dados de 2015, a Secretaria de Estado do Planejamento de Santa
Catarina, aponta que 1,9% do PIB esteve ligado à agropecuária, 24,8% à indústria,
15% ao comércio e 35,7% ao segmento de prestação de serviços. A administração
pública e os impostos representaram 22,6%.
Mapa 1: Localização da mesorregião Oeste de SC e suas principais cidades, com destaque para Chapecó.
Fonte: Base cartográfica do IBGE, 2010.
Neste contexto, o objetivo do presente artigo é desvendar a estrutura
econômico-produtiva de Chapecó e sua funcionalidade na dinâmica urbano-regional.
Para tanto, buscou-se levantar dados no IBGE, na Epagri/Cepa e no MAPA. Com
relação as fontes secundárias, destacam-se artigos em periódicos indexados, teses,
dissertações, livros e sítios de entidades empresariais e governamentais acessados
via internet. Ademais, visando atingir o objetivo anteposto, dividiu-se, além dessa
introdução, o artigo em três partes: 1) processo de ocupação e transformações rurais-
urbanas em Chapecó e região; 2) dinâmica econômico-produtiva e a funcionalidade
regional de Chapecó; 3) considerações finais.
2. Processo de ocupação e transformações rurais-urbanas em Chapecó e região
Diferentemente das demais regiões do estado de Santa Catarina, a região
Oeste foi efetivamente ocupada a partir do início do século XX. Empresas de
colonização multinacionais (Southern Brazil Lumber and Colonizations), nacionais
(Sociedade Territorial Mosele, Eberle, Ahrons e Cia) e de capital comercial de Porto
Alegre (Bertaso), dentre outras, retalharam o Oeste catarinense em pequenos lotes
geralmente de 20 a 30 ha. Na sua grande maioria, os lotes foram vendidos aos
imigrantes italianos e alemães oriundos do RS4 (Espíndola, 1999; von Dentz e
Espíndola, 2019).
Ao adquirirem os lotes, na primeira metade do século XX, os imigrantes
contavam com a comercialização da erva-mate e da madeira, como atividades iniciais
de obtenção de renda e para a sobrevivência. Tanto a madeira quanto a erva-mate
faziam parte da vegetação natural da região, que eram facilmente comercializadas com
os estados do RS, PR e SP, mas também com a Argentina. No entanto, Espíndola
(1999) chama atenção para o fato de que, além do ciclo da madeira e da erva-mate,
se desenvolviam nas propriedades rurais plantações de feijão, trigo, milho, soja,
mandioca e a criação de galinhas, porcos e outros animais. Manifestavam-se, dessa
maneira, duas maneiras de existência da Pequena Produção, isto é, de um lado, as
4 De modo geral, do ponto de vista natural, o território de Santa Catarina pode ser caracterizado por
apresentar um altiplano levemente inclinado na sua porção Oeste e uma área que se desdobra numa borda do planalto até o mar, na sua porção Leste (PELUSO Jr, 1990). A primeira etapa de ocupação do território catarinense é marcada por duas correntes de povoamento, começadas em meados do século XVII, com a chegada dos vicentistas paulistas entrando pelo Norte e indo em direção ao Sul do estado; e a outra corrente de ocupação ocorreu no planalto e deslocava-se para os campos meridionais. A segunda etapa de ocupação ocorreu no século XVIII, com a instalação de milhares de açorianos e madeirenses. Tratou-se da maior intervenção geopolítica e geoeconômica do governo de Portugal no Sul do Brasil (MAMIGONIAN, 1999). A terceira etapa de povoamento, ocorrida a partir dos anos 1820, refere-se às colônias de povoamento próximo de Rio Negro e São Pedro de Alcântara. As colônias como a de Dona Francisca e a colônia Blumenau, no médio vale do rio Itajaí-Açu e as colônias italianas no Sul do estado também se consolidaram nesse período. O Oeste do estado teve seu processo de ocupação iniciado no início do século XX.
famílias especializavam-se num determinado bem que seria entregue ao comércio
local/nacional e internacional; de outro, os pequenos produtores fabricavam seus
instrumentos de trabalho, praticavam a agricultura de subsistência.
No entanto, na medida em que aumentava a comercialização dos produtos
agrícolas dessa região catarinense, os produtores viam na comercialização da
produção a oportunidade de aumentar os ganhos. Segundo von Dentz e Espíndola
(2019), a partir de 1950, o que conceitualmente pode ser chamado de Pequena
Produção Mercantil, começou a passar por profundas transformações de ordem
técnica e econômica. Esse processo de transformação amplia-se nos anos 1960 com
os financiamentos para compra de insumos, máquinas, formação de cooperativas e
consolidação das agroindústrias que emergiram na região (Sadia, Perdigão, Chapecó,
Seara, dentre outras)5.
De modo geral, o processo de modernização da agropecuária do Oeste
catarinense, apoiado pelas políticas de crédito subsidiado, política tecnológica e
fundiária, foram fundamentais para criar um novo uso do tempo e da terra, para com
isso forjar o surgimento de diferentes agronegócios. Com os agronegócios, houve
aumento da produção agropecuária, ampliação dos ganhos de escala, diversificação
das atividades produtivas e a consolidação da região como produtora de alimentos.
Com isso, criou-se uma geração de produtores dos agronegócios que passaram a
orientar-se pela incorporação de sementes melhoradas geneticamente, melhoria das
pastagens, no manejo zootécnico, na introdução de novos processos e produtos,
dentre outros (Espíndola, 2016; von Dentz e Espíndola, 2019).
Esse processo de modernização continuou até 1990, quando a abertura
comercial – que eliminou a proteção aos setores dos agronegócios –, a
sobrevalorização cambial, a redução de tarifas de importação (Medeiros, 2009), a
desnacionalização de diferentes segmentos dos agronegócios e o achatamento do
sistema de crédito agropecuário; forçou os agronegócios do Oeste catarinense a um
intenso processo de reestruturação técnico-econômica (Espíndola, 2002). Dentre as
5 Outras transformações ainda foram visíveis. Dentre elas, destacam-se a redução da população rural, o aumento da safra de grãos e da área plantada de diversas culturas e da criação de suínos, aves, etc.
principais mudanças ocorridas, destacam-se: a instalação de equipamentos
automatizados para as áreas de abate, a adoção de insumos químicos nos processos
de mistura e maturação, o lançamento de novos produtos com maior valor agregado,
a diversificação dos investimentos, as alterações patrimoniais e a especialização6 e
diversificação7 das atividades produtivas no setor alimentar da região.
3. Dinâmica econômico-produtiva e a funcionalidade regional de Chapecó
Desde quando o Oeste catarinense foi dividido do ponto de vista político-
administrativo, Chapecó foi um dos primeiros municípios a ser delimitado, o que do
ponto de vista temporal, lhe dá alguma vantagem em relação aos demais municípios
da região. Ademais, Chapecó encontra-se localizado em uma posição geográfica
(Mapa 1) estratégica na mesorregião Oeste de Santa Catarina, situando-se numa
posição central da região. Possui área territorial de 626 km², mas como já
demonstrado, serve de centralidade de serviços (públicos e privados) com atividades
ligadas à saúde, educação, comércio, eventos, empresas corporativas, bancos,
aeroporto, dentre outros; para toda a região. Neste sentido, exerce o papel de
centralidade urbana de maneira ainda mais acentuada sobre os municípios de Coronel
Freitas, Cordilheira Alta, Arvoredo, Seara, Caxambu do Sul, Planalto Alegre, Nova
Erechim, Águas Frias, Palmitos, Quilombo, dentre outros.
Em termos de população, a estimativa do IBGE (2018) apontou Chapecó com
um total de 216.654 habitantes. O Censo IBGE (2010) aponta que aproximadamente
91,6% da população do município reside na cidade, enquanto 8,4% reside na área
rural. Conforme aponta a tabela 1, em dezessete anos, de 1991 a 2018, considerando
a estimativa do IBGE, a população de Chapecó duplicou. Esse dado, em si, já
demonstra a capacidade de Chapecó se configurar no que Corrêa (1989) denomina
de economia de aglomeração, ou seja, das vantagens locacionais resultantes da
presença, em um mesmo local, de atividades que, estando isoladas, não teriam estas
6 A Cooperativa Aurora reduziu o número de integrados de suínos de 8.662, em 1990, para 5.947, em 1999. Já a Sadia diminuiu o número de integrados de suínos de 14.182 para 4.890, no mesmo período (GOULARTI FILHO, 2007). 7 As diversificações das atividades ocorreram, por exemplo, na Cooperativa Aurora, que passou a investir na industrialização de sucos e na cadeia produtiva de leite (SOUZA, 2014).
vantagens. Para Corrêa (1989), pode-se ainda utilizar a expressão economias
externas de aglomeração, pois as vantagens obtidas não são internas a cada
atividade, mas externas a elas. A cidade de Chapecó, por reunir inúmeras atividades
econômicas, constitui-se em exemplo claro de economias de aglomeração: as
atividades locacionais centrais são exemplos, como o shopping center, as
revendedoras de veículos e autopeças, serviços públicos (saúde, educação e
aeroporto), encontradas em uma definida cidade e/ou localidade.
Tabela 1: Evolução da população do município de Chapecó – 1991 a 2018.
Ano 1991 2000 2010 2018
População 109.961 146.967 183.530 216.654 Fonte: Censos e estimativa (IBGE), 2010 e 2018.
No entanto, num contexto mais amplo, é pertinente inferir que a economia
brasileira possui diversos ramos produtivos, sendo que desde os anos 1980 a
estrutura econômica em escala nacional vem sofrendo modificações em função da
abertura comercial, das taxas baixas de crescimento – principalmente dos anos 1990
–, da sobre desvalorização do real, da redução do número de empregos e do saldo
negativo da balança comercial. Em escala estadual, na qual insere-se a estrutura
produtiva de Chapecó, pode-se dizer que os setores produtivos partiram para um
processo de reestruturação técnico-econômica, o que implica em mudanças nas
inovações e em processamento de produtos. O processo de inovação das estruturas
produtivas, iniciado nos anos 1990, se acentuou nos anos 2000, o que resultou na
ampliação do Valor Adicionado Bruto das atividades produtivas, tal como a ponta o
Gráfico 1.
Gráfico 1: Participação das atividades econômicas no Valor Bruto da Produção (VAB) a preços correntes – Chapecó (2002-2016) em mil reais.
Fonte: Sistema Sidra (IBGE, 2016).
Diferentemente do que acontece para o estado de Santa Catarina, no qual o
VAB da indústria chegou a 35% do VAB total em 2016, para Chapecó o VAB da
indústria alcança os 27%, no mesmo ano. Isso não significa, no entanto, que a
indústria de Chapecó não seja importante para a composição do seu PIB. Ao contrário,
no decorrer do tempo que aparece no gráfico 1, o setor industrial do município sempre
esteve próximo aos 30% do VAB total, o que requer maior atenção analítica, já que a
indústria é o setor que mais investe em progresso técnico e transformação de
produtos. Além disso, o destaque deve ser dado ao setor de serviços, que se manteve
na margem dos 50% do VAB total do município. Esse setor remonta à sinalização feita
anteriormente da centralidade exercida por Chapecó (economia de aglomeração –
Corrêa, 1989) numa série de setores de serviços, principalmente nos setores
automotivo, comércio varejista, aeroporto e comércio de bens de consumo em geral.
2002 2004 2006 2008 2010 2012 2014 2016
Administração pública 174860 220765 290636 376175 467064 570758 765465 931394
Serviços 691123 934946 1176776 1651310 2361302 2976567 3899933 4179370
Indústria 340595 504272 610585 910590 1073571 1456341 2260383 1937686
Agropecuária 67680 83606 84786 124561 115657 109212 132368 223220
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
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ação
po
r se
tor
Mil reaisAgropecuária Indústria Serviços Administração pública
Além disso, há o setor de administração pública, que no gráfico 1 flutuou em
torno dos 10% de participação no VAB total do município e, por fim, a agropecuária
que ficou entre 2% e 5% de participação no VAB total do município. Contudo, embora
o setor agropecuário tenha aproximadamente 5% do VAB das atividades econômicas
de Chapecó, esse dado precisa ser relativizado, haja vista que muitos setores da
indústria e dos serviços, mesmo que caracterizados enquanto indústria e/ou serviços,
estão totalmente atrelados aos diversos segmentos produtivos da agropecuária
(agronegócios). Um exemplo disso, atrelado à indústria que ocorre em Chapecó, são
os agronegócios de carnes, nos quais a produção é processada em complexos (agro)
industriais de modo a obter o produto final, mas a matéria prima de origem agrícola
e/ou pecuária não é contabilizada enquanto produto da agropecuária, mas sim da
indústria. Por outro lado, no caso do setor de serviços, existem inúmeros
estabelecimentos comerciais na cidade que visam a venda de máquinas e
implementos agrícolas voltados totalmente para a agropecuária, no entanto, esses
produtos são contabilizados como parte do setor de serviços. Com esses exemplos,
vale a ressalva de que a importância do setor agropecuário extrapola os apenas 5%
do VAB apontados no gráfico 1.
No entanto, não é a relativização dos 5% do VAB agropecuário que reduz a
importância da indústria na estrutura produtiva do município. Pelo contrário, como
indicou Marx ao sustentar sua perspectiva na busca de entender a realidade no viés
do real-concreto (Marx e Engels, 2011), os dados mostram que Chapecó, dada a
relevância já sinalizada no setor agroindustrial, no ano de 2016 registrou 14.422
estabelecimentos empresariais. No mesmo ano, as empresas de micro e pequeno
porte representavam 99% dos negócios do município. Outrossim, entre 2011 e 2016,
o estoque de empresas registrou uma taxa média anual de crescimento de 2,2% ao
ano, resultando no incremento de 1.496 empresas em relação de 2011 para 2016
(SEBRAE/SC, 2018).
Dessas empresas, considerando os dados de 2016, 1,3% eram empresas
ligadas ao setor agropecuário, 19,3% ligadas ao setor industrial, 35,5% ligados ao
setor de comercial e 43,8% ligadas à prestação de serviços (SEBRA/SC, 2018). Além
disso, de acordo com a Secretaria de Estado da Fazenda de Santa Catarina, do
período entre 2011 e 2016, os setores que mais cresceram foram da indústria de
transformação (83,6%), eletricidade e gás (92,2%), reparação de veículos
automotores e motocicletas (85,2%), alojamento e alimentação (61,5%), atividades
administrativas e serviços complementares (213,7%), educação (207%), cultura e
esportes (159,5%).
Em termos gerais, em 2011 Chapecó possuía 29 empresas exportadoras,
tendo alcançado 54 em 2016. Os principais países que Chapecó exportou, em 2017,
foram: Chile, Argentina, Estados Unidos, Uruguai, Colômbia, Paraguai, Hon Kong,
Nicarágua, Israel, Honduras e México. Além disso, das empresas exportadoras de
Chapecó, as que mais cresceram foram aquelas que exportaram até US$ 1 milhão
(SEBRAE/SC, 2018). Desse modo, denota-se a importância da empresa de pequeno
porte na estrutura produtiva do município e ao mesmo tempo, o crescimento ocorrido
entre o período dos anos 2000 até 2016.
4. Considerações Finais
O crescimento significativo do PIB do município de Chapecó a preços
correntes, que em 2002 era de 1.489.338 (mil reais) e alcançou a marca de 8.317.903
(mil reais) em 2016, em grande parte, é resultado das políticas de governo adotadas
a partir de 2003 com o governo Lula. O incentivo do Estado, através da concessão de
crédito bancário via bancos públicos e privados, alinhado ao aumento do poder de
consumo da população, impulsionou o crescimento econômico e a diversificação
produtivas em cidades interioranas de médio porte, como Chapecó. Por essas razões,
o PIB cresceu de forma acelerada no período 2002-2016.
Assim, de acordo com Goularti Filho (2007), na divisão econômica de Santa
Catarina, a região Oeste do estado ficou estabelecida como forte produtora de
alimentos. Chapecó confirma isso no momento em que se demonstra forte atuação
das agroindústrias de carnes na sua estrutura produtiva. Em termos gerais, como
aponta Espíndola (2018), a diversificação produtiva e o crescimento econômico aqui
apontados, não se desenvolveram apenas em função dos incentivos que ocorreram
no governo Lula, mas também em função da crise dos anos 1990, pois nesse período
os setores produtivos se viram obrigados a desenvolver estratégias de investimento
visando a manutenção de seu desempenho produtivo e competitivo. De modo geral,
as empresas, dos diversos ramos da economia, adotaram três estratégias: a) redução
dos custos produtivos, b) ampliação ou (re) localização dos investimentos, e c)
redefinições patrimoniais.
A parte disso, a estrutura urbana de Chapecó, com a gama de serviços
especializados oferecidos à população regional, destacando-se o aeroporto, se
configura no que denominou-se de economia de aglomeração, haja vista que torna-
se funcional à uma gama de serviços demandados por uma estrutura urbano-regional
pujante, que carece de tipos de serviços que só podem ser encontrados, em escala
regional, na cidade de Chapecó. Sobre esse aspecto, embora aqui entende-se que o
objetivo foi atendido, pode-se fazer outro estudo; outra análise.
5. Referências bibliográficas
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